1 universidade estadual do oeste do paranÁ...

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1 UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ CAMPUS DE MARECHAL CÂNDIDO RONDON CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, EDUCAÇÃO E LETRAS CCHEL COLEGIADO DO CURSO DE HISTÓRIA CAREM ALINE DE OLIVEIRA SOBRE EXPLORAÇÃO E ALTERNATIVAS NA TRAJETÓRIA DE TRABALHADORES: ENTRE O CAMPO E A MODA-BEBÊ (TERRA ROXA-PR, 1990-2013) Marechal Cândido Rondon 2013

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANAacute CAMPUS DE MARECHAL CAcircNDIDO RONDON

CENTRO DE CIEcircNCIAS HUMANAS EDUCACcedilAtildeO E LETRAS ndash CCHEL COLEGIADO DO CURSO DE HISTOacuteRIA

CAREM ALINE DE OLIVEIRA

SOBRE EXPLORACcedilAtildeO E ALTERNATIVAS NA TRAJETOacuteRIA DE TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA-BEBEcirc

(TERRA ROXA-PR 1990-2013)

Marechal Cacircndido Rondon

2013

2

UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANAacute CAMPUS DE MARECHAL CAcircNDIDO RONDON

CENTRO DE CIEcircNCIAS HUMANAS EDUCACcedilAtildeO E LETRAS ndash CCHEL COLEGIADO DO CURSO DE HISTOacuteRIA

CAREM ALINE DE OLIVEIRA

SOBRE EXPLORACcedilAtildeO E ALTERNATIVAS NA TRAJETOacuteRIA DE

TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA-BEBEcirc (TERRA ROXA-PR 1990-2013)

Trabalho de Conclusatildeo de Curso ndash TCC sob a orientaccedilatildeo da Drordf Sheille Soares de Freitas apresentado agrave Banca Examinadora como requisito baacutesico para obtenccedilatildeo do tiacutetulo de Licenciatura Plena em Histoacuteria pela Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Campus De Marechal Cacircndido Rondon

Marechal Cacircndido Rondon 2013

3

4

5

Aos meus pais Agnaldo e Marley

Que abdicam de seus sonhos para realizar os meus

6

AGRADECIMENTOS

Com especial carinho aos meus Pais Agnaldo e Marley trabalhadores que

apesar da difiacutecil situaccedilatildeo fizeram o possiacutevel e o impossiacutevel para que eu pudesse chegar

ateacute este momento Eacute imensuraacutevel a gratidatildeo e orgulho que nutro por vocecircs pois sei de

toda luta e determinaccedilatildeo para verem a filha formada Obrigada por todo o incentivo

ldquopuxotildees de orelhardquo apoio dedicaccedilatildeo e amor

Agradeccedilo aos amigos velhos e novos que iratildeo fazer parte das minhas melhores

lembranccedilas do ldquotempo de faculdaderdquo Em especial Simone Tineneu Dan Tonho Popi

Vassoura Elaine Julius Keka Emer Nayara Luana Paulo e Tati Alegraram as

minhas noites com momentos de descontraccedilatildeo no bar e rodas de violatildeo Por muitas

vezes foram estes momentos que recarregaram as baterias e deram forccedilas para

continuar

Aacute Vania Marilia e Marcos (Xequereu) companheiros do movimento estudantil

que me ensinaram muito durante toda essa caminhada foram nossas discussotildees que

potencializaram minhas inquietaccedilotildees e a vontade de lutar

Aacute Cintia amiga e companheira durante toda a graduaccedilatildeo por todas as risadas

todo apoio as conversas sobre tantas coisas as comilanccedilas as reclamaccedilotildees e claro por

todos os momentos de procrastinaccedilatildeo

Aacute minhas queridas amigas de infacircncia Aline Luciana Suzani Simone e Fran

que mesmo longe sempre estiveram presentes compartilhando anguacutestias e vitoacuterias

Aacute minha tia Elza que contribuiu de inuacutemeras formas para minha moradia em

Marechal Cacircndido Rondon

Aacute minha orientadora Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas por todo aprendizado

dedicaccedilatildeo e compreensatildeo

Aos trabalhadores que gentilmente me receberam em suas casas compartilhando

suas experiecircncias para a realizaccedilatildeo desse trabalho

Ao meu companheiro Marcos antes de qualquer coisa melhor amigo por toda

cobranccedila ajuda paciecircncia e amor

7

RESUMO

Este Trabalho de Conclusatildeo de Curso tem a intenccedilatildeo de problematizar analisar e investigar as relaccedilotildees de trabalho que marcam a trajetoacuteria de trabalhadores que compuseram praacuteticas no processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa-PR discutindo o modo como se relacionaram nem sempre amistosamente com as accedilotildees do poder puacuteblico municipal e com a participaccedilatildeo empresarial do ramo ldquomoda bebecircrdquo na cidade A pesquisa abordaraacute as trecircs uacuteltimas deacutecadas pelo fato de esse ser um momento histoacuterico importante pela intensificaccedilatildeo da exploraccedilatildeo industrial em Terra Roxa Essa temporalidade eacute significativa no processo de mudanccedila e produccedilatildeo de relaccedilotildees de trabalho na cidade envolvendo o setor de vestuaacuterio e a produccedilatildeo de alternativas por trabalhadores muitas vezes advindo do meio rural Propomos investigar as condiccedilotildees de vida dos trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam este mercado de trabalho bem como relacionar as memoacuterias e accedilotildees produzidas tanto para o trabalho como para a vida em Terra Roxa Para isso destacamos o trabalho com as fontes orais jornais fichas de cursos profissionalizantes e iacutendices estatiacutesticos como documentaccedilatildeo a ser privilegiada nessa pesquisa O interesse foi manter o diaacutelogo com as evidecircncias e quando necessaacuterio ampliar a anaacutelise de fontes ou mesmo revendo os caminhos da investigaccedilatildeo Esse encaminhamento considera que o conhecimento histoacuterico exige essa construccedilatildeo ao longo da pesquisa como tambeacutem o compromisso com as questotildees em foco

Palavras-chave Trabalhadores Relaccedilotildees de Trabalho Induacutestrias

8

Sumaacuterio INTRODUCcedilAtildeO 9

CAPIacuteTULO 1TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc 15

CAPIacuteTULO 2TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES 31

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 51

FONTES 53

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS 55

9

INTRODUCcedilAtildeO

A escolha dos sujeitos e do tema deste estudo (os trabalhadores atualmente

vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa- PR) eacute resultado de minha

trajetoacuteria de vida trabalho e acadecircmica

Primeiro de vida e trabalho porque o trabalho na induacutestria de moda bebecirc jaacute fez

parte de minha atividade profissional por algum tempo Deste modo pude conviver com

outros trabalhadores observar e ouvir suas avaliaccedilotildees sobre suas condiccedilotildees de vida

motivaccedilotildees interesses e conflitos que perpassam esse ambiente de trabalho o que me

instigou a pesquisar o tema De forma que muitas das interpretaccedilotildees e avaliaccedilotildees que os

trabalhadores indicam em suas narrativas atraveacutes das entrevistas feitas jaacute ouvi dos

meus familiares como da minha proacutepria matildee Pois grande parte deles reside em Terra

Roxa e trabalha na induacutestria de moda bebecirc

Segundo como acadecircmica e pesquisadora porque este trabalho de conclusatildeo de

curso eacute continuidade de uma iniciaccedilatildeo cientifica voluntaacuteria (PIC-V) e as questotildees que

estatildeo aqui sendo levantadas eacute uma continuidade das indagaccedilotildees que surgiram a partir de

um diaacutelogo inicial com as fontes feitas nesta pesquisa anterior1

O objetivo central da pesquisa foi investigar as condiccedilotildees de vida de

trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de vestuaacuterio moda bebecirc no municiacutepio de

Terra Roxa-PR problematizando suas relaccedilotildees de trabalho e como se inserem e

interpretam este mercado de trabalho dando visibilidade a estes sujeitos e suas accedilotildees na

cidade

O municiacutepio possui atualmente entre macro e micro cerca de 113 empresas que

produzem em torno de 9 milhotildees de peccedilas envolvendo aproximadamente 2500

trabalhadores empregados diretamente o que segundo a noccedilatildeo do poder publico

municipal ldquodinamiza a geraccedilatildeo de emprego e renda do municiacutepiordquo2 Como podemos

1 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 2 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013

10

perceber em uma reportagem do jornal online Gazeta do Povo intitulada ldquoEm Terra

Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojasrdquo

A cadeia da confecccedilatildeo infantil mudou os rumos da cidade de 17 mil habitantes e a vida de muitos paranaenses Maria do Carmo 42 anos eacute um exemplo Ateacute os 38 anos ela trabalhava nos Campos Gerais onde plantava eucalipto Hoje o cenaacuterio eacute o mesmo um siacutetio mas agora ela natildeo lida diretamente com a terra Maria atua no setor de corte de roupas e tambeacutem dirige o ocircnibus que transporta funcionaacuterios da empresa Baby Doces Momentos confecccedilatildeo localizada em um siacutetio de cinco alqueires que produz cerca de 20 mil peccedilas ao mecircs ldquoAgora me sinto melhor Antes trabalhava no sol com uma bomba de 20 litros nas costas para pulverizar e plantarrdquo conta3

A partir do trecho acima percebemos que ao avaliar a dinacircmica industrial no

municiacutepio a reportagem aponta a relaccedilatildeo com a produccedilatildeo e experiecircncia dos trabalhos

no meio rural evidentemente para positivar a expansatildeo desse ramo de induacutestria de

vestuaacuterio como salvaccedilatildeo da cidade jaacute que estas empresas ldquodinamiza a geraccedilatildeo de

emprego e renda do municiacutepiordquo

Eacute importante entender a dimensatildeo dessa estrutura empresarial industrial em

Terra Roxa pois esta historicidade vai abrir caminhos a serem problematizados ao

longo deste trabalho

Para desenvolver esta pesquisa pautamo-nos na dinacircmica que integra a reflexatildeo

da problemaacutetica e o processo de levantamento e anaacutelise de fontes Esse

encaminhamento inspira-se na indicaccedilatildeo de Thompson sobre o diaacutelogo necessaacuterio e

constante entre teoria e evidecircncias histoacutericas4

Segundo Thompson

O interrogador eacute a loacutegica histoacuterica o conteuacutedo da interrogaccedilatildeo eacute uma hipoacutetese o interrogado eacute a evidecircncia com suas propriedades determinadas O objeto do conhecimento histoacuterico eacute a histoacuteria lsquorealrsquo cujas evidecircncias devem ser necessariamente incompletas e imperfeitas5

3 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no-paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 4 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma criacutetica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar Editores 1981 5 IBIDEM p 49

11

Isso quer dizer que os historiadores podem selecionar essa ou aquela evidecircncia

propor novas perguntas mas isso natildeo significa que os proacuteprios acontecimentos passados

se modifiquem nem tampouco que seja um agregado de histoacuterias separadas Embora

essa interpretaccedilatildeo do processo histoacuterico surja em resposta agrave pergunta formulada nossa

produccedilatildeo natildeo inventa o processo e natildeo pode modificar o ldquostatus ontoloacutegicordquo do

passado

Eacute nesta perspectiva de anaacutelise que conduziremos este pesquisa Cabe contudo

salientar a contribuiccedilatildeo que esta nos proporciona para a compreensatildeo que proponho

sobre as relaccedilotildees de trabalho experiecircncias e interpretaccedilotildees dos trabalhadores nas

induacutestrias de confecccedilatildeo de moda bebecirc em Terra Roxa Para tanto pensaremos a histoacuteria

em um duplo sentido como experiecircncia humana e como a proacutepria narraccedilatildeo dessas

experiecircncias as interpretaccedilotildees e projeccedilotildees das quais o investigador vai utilizar6

A investigaccedilatildeo neste sentido estaacute relacionada com as problemaacuteticas que o

pesquisador se coloca no presente que envolvem sua experiecircncia de vida e as

concepccedilotildees da qual parte

Pretendo entender a partir das experiecircncias narradas por esses trabalhadores

como eles se inserem e interpretam este mercado de trabalho e fazem prospecccedilotildees

Segundo Thompson

Se determos a histoacuteria num determinado ponto natildeo haacute classe mas simplesmente uma multidatildeo de indiviacuteduos com amontoado de experiecircncias Mas se examinarmos esses homens durante um periacuteodo adequado de mudanccedilas sociais observaremos padrotildees em suas relaccedilotildees sua ideias e instituiccedilotildees A classe eacute definida pelos homens enquanto vivem sua proacutepria histoacuteria e ao final esta eacute sua definiccedilatildeo7

Neste sentido para entendermos os trabalhadores eacute necessaacuteria uma serie de

observaccedilotildees e anaacutelises que se expressam em suas praacuteticas cotidianas como eles

vivenciam e se portam perante sua dinacircmica de trabalho o que possibilita sua formaccedilatildeo

cultural e social

Para esse processo interpretativo utilizamos cinco entrevistas que realizei com

trabalhadores no intuito de potencializar as elaboraccedilotildees construiacutedas por esses sujeitos

sobre as motivaccedilotildees interesses e conflitos ou seja memoacuterias produzidas sobre

6 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987 7 THOMPSON E P ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12

12

trajetoacuterias e experiecircncia social compartilhada nas relaccedilotildees dentro e fora das induacutestrias

de vestuaacuterio na cidade

Como um dos meacutetodos de pesquisa foi trabalhar com fontes orais considero

importante apontar algumas dificuldades que encontrei ao realizar algumas entrevistas

Mesmo o municiacutepio empregando mais de 2500 trabalhadores na induacutestria de confecccedilatildeo

minha principal dificuldade foi encontrar trabalhadores que se dispusessem a realizar as

entrevistas

Aqueles que aceitavam soacute concordavam em produzir a entrevista quando

algueacutem muito proacuteximo deles me apresentava O fato de alguns trabalhadores aceitarem

natildeo excluiu a desconfianccedila e inseguranccedila que estes possuiacuteam em relaccedilatildeo agraves entrevistas

Desta forma a inseguranccedila dos trabalhadores sobre se poderiam falar ou natildeo a

respeito de suas relaccedilotildees de trabalho juntamente com a minha falta de experiecircncia em

saber lidar com essas inseguranccedilas prejudicaram o desenvolvimento das entrevistas

As respostas ficaram limitadas ao roteiro muitas vezes limitadas ao ldquosimrdquo ou ao ldquonatildeordquo

Pois aleacutem da timidez ao saberem que estatildeo sendo gravados ainda tive que lidar com o

receio dos entrevistados ao exporem sua trajetoacuteria e condiccedilotildees de vida

As entrevistas orais natildeo foram produto de teacutecnica mas das relaccedilotildees que

consegui desenvolver com esses trabalhadores Portanto o meacutetodo de utilizar fontes

orais consiste em trabalhar com a subjetividade dos indiviacuteduos lidando com as questotildees

postas pelos entrevistados a partir de minhas proacuteprias questotildees

Neste sentido o diaacutelogo com Alessandro Portelli e com outros autores ajudou a

compreender que essa relaccedilatildeo entre entrevistado e entrevistador natildeo eacute um objetivo

muito faacutecil de ser alcanccedilado pois as pessoas reinterpretam e datildeo novos significados aos

acontecimentos passados em funccedilatildeo do que vive no presente ou espera viver Ou ainda

encobrem sentimentos e interpretaccedilotildees por censura repressatildeo temores ou pela pouca

disposiccedilatildeo em falar8

Ao utilizar a fonte oral foi importante dialogar com a produccedilatildeo de Alessandro

Portelli o qual contribuiu para a construccedilatildeo de um procedimento de anaacutelise para a

produccedilatildeo das fontes orais e do olhar lanccedilado sobre esse material O uso de tal fonte na

pesquisa permitiu o enfrentamento da dinacircmica contraditoacuteria de valores e praacuteticas que

compotildeem escolhas pressotildees e expectativas desses sujeitos sociais

8 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 p33

13

Nesse sentido permite maior visibilidade poliacutetica da classe trabalhadora com

suas divisotildees e processos de identificaccedilatildeo na condiccedilatildeo de classe compartilhada

produzindo assim uma interpretaccedilatildeo histoacuterica comprometida com o potencial de luta e

intervenccedilatildeo social desses trabalhadores Essa investigaccedilatildeo tambeacutem traz como

enfrentamento lidar com os limites dessa fonte como as dificuldades de conseguir a

aceitaccedilatildeo da gravaccedilatildeo da entrevista e contatar trabalhadores9

O intuito de usarmos a fonte oral nesta pesquisa inspira-se nesta perspectiva de

Portelli Buscamos o trabalho com as entrevista natildeo como confirmaccedilatildeo de uma ldquoteserdquo

inicial mas sim com a intenccedilatildeo de dar visibilidade agraves interpretaccedilotildees construiacutedas pelos

trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa

Para tal associamos essa documentaccedilatildeo com mateacuterias jornaliacutesticas e fichas de

inscriccedilatildeo em cursos (de corte costura e bordado) na Escola do trabalho na cidade Aleacutem

da interpretaccedilatildeo de iacutendices estatiacutesticos sobre empregabilidade atividades econocircmicas

etc

O presente trabalho estaacute estruturado em dois capiacutetulos No primeiro capiacutetulo

busquei analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agrave

induacutestria de moda bebecirc a fim de compreender os motivos que levam esses sujeitos a

perceber a expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de

melhoria e mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas e na permanecircncia em Terra Roxa

No segundo capiacutetulo busco discutir a partir das experiecircncias cotidianas e das

relaccedilotildees de trabalho desses sujeitos as possibilidades e limites das expectativas que

estes trabalhadores estabelecem em relaccedilatildeo ao trabalho na induacutestria de moda bebecirc tal

qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre o

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa10

Essa intenccedilatildeo tenta se distanciar de determinados campos analiacuteticos que

sustentam essa expansatildeo industrial como sinocircnimo de desenvolvimento arraigados

na promoccedilatildeo de certos projetos empresariais e na historicidade progressista de alguns

processos de expansatildeo urbana Ao fazer esse distanciamento o interesse eacute ampliar o

9 PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 10 As induacutestrias de Terra Roxa estatildeo inseridas no Arranjo Produtivo Local (APL) criado em 2004 para oferecer subsiacutedios e aperfeiccediloamento aos empresaacuterios O APL da moda bebecirc visa entre outros aspectos maior eficiecircncia de inserccedilatildeo dos produtos da induacutestria de vestuaacuterio no mercado maior poder de negociaccedilatildeo de preccedilo da mateacuteria-prima atraccedilatildeo de novos prestadores de serviccedilos ao municiacutepio e otimizaccedilatildeo de custos com a qualificaccedilatildeo da matildeo de obra Esse assessoramento procura oferecer ao empresariado condiccedilotildees de mercado e apoio para fixaccedilatildeo em determinadas regiotildees

14

campo de anaacutelise apresentando contradiccedilotildees e tensotildees nesse percurso dirigindo atenccedilatildeo

aos trabalhadores mais do que agrave faacutebrica e ao sistema produtivo por ele mesmo11

Ao realizar esta pesquisa minha preocupaccedilatildeo se pauta em mostrar que estes

sujeitos satildeo seres conscientes de sua posiccedilatildeo enquanto sujeitos sociais e procuro

ressaltar que estes trabalhadores fazem parte deste processo histoacuterico enquanto

indiviacuteduos ativos mesmo que indiretamente intervenham nos rumos e ritmo dessa

expansatildeo industrial

Assim busquei com este trabalho explorar a partir das narrativas dos

trabalhadores e de suas experiecircncias entender natildeo somente estes sujeitos mas as

expectativas que estes constroem e as relaccedilotildees que estabelecem com o trabalho para a

promoccedilatildeo de seus interesses

11 O trabalho de Godoy procura fazer um percurso acadecircmico das nuances e alteraccedilotildees na abordagem do universo fabril Assim como Paoli Sader e Telles recolocam alguns enfrentamentos - na percepccedilatildeo de suas atuaccedilotildees e construccedilatildeo de sentidos - para aqueles que procuram perceber os trabalhadores neste cenaacuterio operaacuterio brasileiro Ver -GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 -PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198

15

CAPIacuteTULO 1

TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc

[] Com o tempo depois que essas empresas dede crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram mais faacuteceis neacute []12

Neste capiacutetulo vamos analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente

estatildeo ou que em algum momento de suas vidas estiveram vinculados agraves induacutestrias de

confecccedilatildeo de moda bebecirc do municiacutepio de Terra Roxa- PR mas que trazem em sua

trajetoacuteria uma relaccedilatildeo com o trabalho moradia e valores advindo do campo O objetivo

eacute problematizar suas avaliaccedilotildees frente agrave ldquoexpansatildeordquo industrial do municiacutepio e como essa

dialoga com seus interesses e necessidades

Ao analisarmos algumas entrevistas de trabalhadores vinculados a estas

induacutestrias foi comum encontrar assim como na narrativa citada na epiacutegrafe deste

capiacutetulo narrativas nesta perspectiva na qual os empregos gerados pela industrializaccedilatildeo

satildeo interpretados como possibilidade de melhoria na condiccedilatildeo de vida dos

trabalhadores Percebemos assim que o municiacutepio estaacute constantemente sendo indicado

como um grande polo de empregos mas essa indicaccedilatildeo natildeo resume as ponderaccedilotildees que

fazem sobre a presenccedila industrial em Terra Roxa - porque tambeacutem apontam elementos

que contradizem essa presenccedila

Buscaremos entatildeo dialogar com as fontes orais produzidas com trabalhadores

que se relacionaram com induacutestria de confecccedilatildeo procurando discutir tambeacutem alguns

trabalhos acadecircmicos que analisam praacuteticas dos trabalhadores em Terra Roxa A fim de

compreender a trajetoacuteria destes sujeitos e os motivos que os levam a perceber a

expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de melhoria e

mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas

Para compreendermos melhor estas interpretaccedilotildees fez-se necessaacuterio analisar o

percurso de relaccedilotildees e experiecircncias que construiacuteram Para isso foi importante

12 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

16

dimensionar a cidade na deacutecada de 1970 Momento em que se intensificou a mudanccedila

destes trabalhadores do campo para a cidade (ou ainda para outras regiotildees) ou seja este

foi um periacuteodo de mudanccedilas marcantes nas relaccedilotildees de trabalho onde morar e como

viver natildeo soacute no municiacutepio mas possiacutevel de identificar em outras cidades brasileiras

No trabalho de Ana Ameacutelia Camarano e Ricardo Abramovay haacute o interesse em

apresentar os movimentos migratoacuterios que respondem pelo processo de esvaziamento

da populaccedilatildeo rural no Brasil Os autores observam que ateacute 1980 houve um crescimento

absoluto do saldo populacional que deixou as aacutereas rurais brasileiras Aproximadamente

40 da populaccedilatildeo que vivia nas aacutereas rurais no comeccedilo dos anos 70 migraram nessa

deacutecada O fluxo que deixou o campo nos anos 80 tambeacutem foi expressivo 13 de todos

os que viviam no meio rural em 1980 saiacuteram durante esse periacuteodo o que representou

aproximadamente 13 milhotildees de pessoas13

Em termos nacionais a intensidade do movimento de desruralizaccedilatildeo segundo

os autores parece natildeo ter diminuiacutedo muito nos uacuteltimos 50 anos Entre 1950 e 1980 as

aacutereas rurais das regiotildees Sudeste e Sul forneceram um volume expressivo de novos

moradores para as aacutereas urbanas14 Para os autores como realizavam a pesquisa em fins

da deacutecada de 1990 suas impressotildees indicavam uma continuidade desse processo

Desde 1950 a cada 10 anos um em cada trecircs brasileiros vivendo no meio rural opta pela emigraccedilatildeo Os anos 90 natildeo arrefeceram em muito esta tendecircncia se as taxas de evasatildeo do meio rural observadas entre 1990 e 1995 persistirem pelo restante da deacutecada quase 30 dos brasileiros que entatildeo viviam no campo em 1990 teratildeo mudado seu local de residecircncia na virada do milecircnio15

Ainda que os autores analisem no campo da geografia demograacutefica apoiando-se

na noccedilatildeo de ecircxodo rural estes trazem ldquoo modo de vida no campordquo como incocircmodo para

a realizaccedilatildeo da pesquisa traduzido nas movimentaccedilotildees desses brasileiros entre o campo

e a cidade alteraccedilotildees natildeo soacute espaciais mas no modo como vivem e enfrentam

determinadas relaccedilotildees de poder

Estes se movimentam de acordo com as expectativas e interesses que produzem

como necessidades reorganizando as relaccedilotildees de trabalho e modos de vida diante de

pressotildees de reestruturaccedilatildeo da produccedilatildeo e da ocupaccedilatildeo das aacutereas rurais brasileiras da

13 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 14 IBIDEM 15 IBIDEM p 6

17

segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual

natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na

promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo

De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970

aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do

municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as

principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos

Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio

exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX

Graacutefico 1

Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)

Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e

principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a

distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando

Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de

1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea

urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave

expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de

vestuaacuterio moda bebecirc

16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013

18

Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no

municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo

urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e

insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo

na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e

incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola

em moldes capitalistas na cidade 17

A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas

unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha

o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade

em muitos casos diretamente com o consumidor

Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que

discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em

Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo

provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que

Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18

No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da

populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente

ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da

maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio

alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo

aponta um processo tranquilo

17

GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18

FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9

19

As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos

oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute

mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise

- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o

cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que

A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19

A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o

trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe

quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar

com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de

banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe

pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo

Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um

grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir

ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados

da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia

por um nuacutemero reduzido de vagas

Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo

saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por

um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria

condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses

19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33

20

trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de

induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade

Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu

entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria

seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas

vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece

Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20

A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves

induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos

perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas

de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para

Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida

Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como

citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este

processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de

Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande

decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio

Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do

IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que

formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho

atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores

mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que

permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram

como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras

atividades tambeacutem inconstantes

A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em

2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que

residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo

por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos

20

JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

21

sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)

estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos

produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no

transporte e venda de mercadorias21

O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os

trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira

produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no

contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria

e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas

Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua

forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de

escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma

grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de

mercadorias criminalizado como contrabando

O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online

Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o

narcotraacuteficordquo aponta que

Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122

A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida

com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que

almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores

apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os

21

CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013

22

oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando

permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute

associada a comprar roupas e tecircnis de marca

O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a

intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda

de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre

alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para

frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc

No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses

trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego

Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso

Frederico afirma que

Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23

A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da

agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em

segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees

No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este

processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas

nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica

quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo

Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24

23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

23

Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo

para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O

trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do

patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo

lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos

trabalhadores pela induacutestria ele me diz que

Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25

Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural

da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas

relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar

com essa nova dinacircmica

Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo

visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas

vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se

aproxima da percepccedilatildeo de Carlos

Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26

Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para

ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes

se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio

trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as

ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que

pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha

25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11

24

trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem

trabalho

Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe

complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho

pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida

que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram

Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no

campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e

trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte

das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave

trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a

perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura

Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27

Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de

alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute

registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses

trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas

A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade

de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As

oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um

maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa

condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos

desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor

a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado

O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos

Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo

Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa

27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10

25

Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28

Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas

anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do

empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da

cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram

nesse processo

O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho

financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para

empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a

demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de

trabalhadores agrave disposiccedilatildeo

Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no

municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do

empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor

produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que

A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29

Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos

gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por

ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e

possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio

A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees

municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno

28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM

26

desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos

proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e

do APL do vestuaacuterio na cidade 31

No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi

substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e

mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e

vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa

aacutereardquo

Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do

Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos

profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes

tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o

interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo

de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores

tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo

foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal

finalidade

De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho

rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da

folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo

A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como

Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes

Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o

municiacutepio de Terra Roxa

30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

27

Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34

O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de

trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda

continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila

tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de

garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno

dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o

campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre

os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal

As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma

alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida

ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores

possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -

com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou

outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por

perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista

dentre outros natildeo os oferece

Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes

trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de

classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de

melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no

ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a

trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em

outra cidade ela me disse que

Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35

34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

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Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave

mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem

organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de

novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar

com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as

expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita

vantagem assimrdquo

Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para

Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se

demo na faacutebricardquo36

Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram

trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar

mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia

com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando

pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que

Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37

Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter

voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no

campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em

Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que

natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar

36 IDEM 37 IDEM

29

As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila

pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com

a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma

mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila

natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na

narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do

casal

Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas

construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril

Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho

na faacutebrica ela me disse que

Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38

Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que

gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as

dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores

preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica

ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na

avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em

conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho

O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como

Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos

indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em

casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria

Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista

Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim

38 IDEM

30

de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por

menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes

oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc

como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado

na Escola do Trabalho

Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o

tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram

mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias

permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas

relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais

Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns

trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de

compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas

tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa

39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

31

CAPIacuteTULO 2

TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40

Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa

natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O

municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande

polo de empregos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de

investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade

de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um

grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41

Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo

como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem

indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e

aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de

desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente

O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de

julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do

Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para

bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda

afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um

terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio

A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral

retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o

40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013

32

processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no

ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir

Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa

fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda

bebecirc pra terra roxa

Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43

A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande

destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da

cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra

Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o

municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo

queacuterdquo

No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves

transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que

este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo

sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em

resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores

Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa

industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo

enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa

Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20

principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a

43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

33

janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos

registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores

vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e

desligamento nesses setores

Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa

Meses Jan de 2003 a Jan de 2011

CBO ndash Frequumlecircncia

Admissotildees Desligamentos

Saldo

1ordm Emp

Reemp

Reint

C Prz Det

Transf

Total

Disp sem J Causa

Disp com J Causa

A Pedido

Term Contr

Aposent

Morte

Term C Prz Deter

Transf

Total

Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da

confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390

Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443

Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie

271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109

Costureira de peccedilas sob encomenda

171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em

geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio

varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina

60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio

em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina

bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas

34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27

Trabalhador agropecuaacuterio em geral

19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador

de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5

Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39

Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie

6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras

10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente

administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio

32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa

24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27

Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013

34

Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

35

Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

36

mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

37

curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

38

Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

41

que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

42

Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

45

Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

46

Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

2

UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANAacute CAMPUS DE MARECHAL CAcircNDIDO RONDON

CENTRO DE CIEcircNCIAS HUMANAS EDUCACcedilAtildeO E LETRAS ndash CCHEL COLEGIADO DO CURSO DE HISTOacuteRIA

CAREM ALINE DE OLIVEIRA

SOBRE EXPLORACcedilAtildeO E ALTERNATIVAS NA TRAJETOacuteRIA DE

TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA-BEBEcirc (TERRA ROXA-PR 1990-2013)

Trabalho de Conclusatildeo de Curso ndash TCC sob a orientaccedilatildeo da Drordf Sheille Soares de Freitas apresentado agrave Banca Examinadora como requisito baacutesico para obtenccedilatildeo do tiacutetulo de Licenciatura Plena em Histoacuteria pela Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Campus De Marechal Cacircndido Rondon

Marechal Cacircndido Rondon 2013

3

4

5

Aos meus pais Agnaldo e Marley

Que abdicam de seus sonhos para realizar os meus

6

AGRADECIMENTOS

Com especial carinho aos meus Pais Agnaldo e Marley trabalhadores que

apesar da difiacutecil situaccedilatildeo fizeram o possiacutevel e o impossiacutevel para que eu pudesse chegar

ateacute este momento Eacute imensuraacutevel a gratidatildeo e orgulho que nutro por vocecircs pois sei de

toda luta e determinaccedilatildeo para verem a filha formada Obrigada por todo o incentivo

ldquopuxotildees de orelhardquo apoio dedicaccedilatildeo e amor

Agradeccedilo aos amigos velhos e novos que iratildeo fazer parte das minhas melhores

lembranccedilas do ldquotempo de faculdaderdquo Em especial Simone Tineneu Dan Tonho Popi

Vassoura Elaine Julius Keka Emer Nayara Luana Paulo e Tati Alegraram as

minhas noites com momentos de descontraccedilatildeo no bar e rodas de violatildeo Por muitas

vezes foram estes momentos que recarregaram as baterias e deram forccedilas para

continuar

Aacute Vania Marilia e Marcos (Xequereu) companheiros do movimento estudantil

que me ensinaram muito durante toda essa caminhada foram nossas discussotildees que

potencializaram minhas inquietaccedilotildees e a vontade de lutar

Aacute Cintia amiga e companheira durante toda a graduaccedilatildeo por todas as risadas

todo apoio as conversas sobre tantas coisas as comilanccedilas as reclamaccedilotildees e claro por

todos os momentos de procrastinaccedilatildeo

Aacute minhas queridas amigas de infacircncia Aline Luciana Suzani Simone e Fran

que mesmo longe sempre estiveram presentes compartilhando anguacutestias e vitoacuterias

Aacute minha tia Elza que contribuiu de inuacutemeras formas para minha moradia em

Marechal Cacircndido Rondon

Aacute minha orientadora Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas por todo aprendizado

dedicaccedilatildeo e compreensatildeo

Aos trabalhadores que gentilmente me receberam em suas casas compartilhando

suas experiecircncias para a realizaccedilatildeo desse trabalho

Ao meu companheiro Marcos antes de qualquer coisa melhor amigo por toda

cobranccedila ajuda paciecircncia e amor

7

RESUMO

Este Trabalho de Conclusatildeo de Curso tem a intenccedilatildeo de problematizar analisar e investigar as relaccedilotildees de trabalho que marcam a trajetoacuteria de trabalhadores que compuseram praacuteticas no processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa-PR discutindo o modo como se relacionaram nem sempre amistosamente com as accedilotildees do poder puacuteblico municipal e com a participaccedilatildeo empresarial do ramo ldquomoda bebecircrdquo na cidade A pesquisa abordaraacute as trecircs uacuteltimas deacutecadas pelo fato de esse ser um momento histoacuterico importante pela intensificaccedilatildeo da exploraccedilatildeo industrial em Terra Roxa Essa temporalidade eacute significativa no processo de mudanccedila e produccedilatildeo de relaccedilotildees de trabalho na cidade envolvendo o setor de vestuaacuterio e a produccedilatildeo de alternativas por trabalhadores muitas vezes advindo do meio rural Propomos investigar as condiccedilotildees de vida dos trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam este mercado de trabalho bem como relacionar as memoacuterias e accedilotildees produzidas tanto para o trabalho como para a vida em Terra Roxa Para isso destacamos o trabalho com as fontes orais jornais fichas de cursos profissionalizantes e iacutendices estatiacutesticos como documentaccedilatildeo a ser privilegiada nessa pesquisa O interesse foi manter o diaacutelogo com as evidecircncias e quando necessaacuterio ampliar a anaacutelise de fontes ou mesmo revendo os caminhos da investigaccedilatildeo Esse encaminhamento considera que o conhecimento histoacuterico exige essa construccedilatildeo ao longo da pesquisa como tambeacutem o compromisso com as questotildees em foco

Palavras-chave Trabalhadores Relaccedilotildees de Trabalho Induacutestrias

8

Sumaacuterio INTRODUCcedilAtildeO 9

CAPIacuteTULO 1TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc 15

CAPIacuteTULO 2TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES 31

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 51

FONTES 53

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS 55

9

INTRODUCcedilAtildeO

A escolha dos sujeitos e do tema deste estudo (os trabalhadores atualmente

vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa- PR) eacute resultado de minha

trajetoacuteria de vida trabalho e acadecircmica

Primeiro de vida e trabalho porque o trabalho na induacutestria de moda bebecirc jaacute fez

parte de minha atividade profissional por algum tempo Deste modo pude conviver com

outros trabalhadores observar e ouvir suas avaliaccedilotildees sobre suas condiccedilotildees de vida

motivaccedilotildees interesses e conflitos que perpassam esse ambiente de trabalho o que me

instigou a pesquisar o tema De forma que muitas das interpretaccedilotildees e avaliaccedilotildees que os

trabalhadores indicam em suas narrativas atraveacutes das entrevistas feitas jaacute ouvi dos

meus familiares como da minha proacutepria matildee Pois grande parte deles reside em Terra

Roxa e trabalha na induacutestria de moda bebecirc

Segundo como acadecircmica e pesquisadora porque este trabalho de conclusatildeo de

curso eacute continuidade de uma iniciaccedilatildeo cientifica voluntaacuteria (PIC-V) e as questotildees que

estatildeo aqui sendo levantadas eacute uma continuidade das indagaccedilotildees que surgiram a partir de

um diaacutelogo inicial com as fontes feitas nesta pesquisa anterior1

O objetivo central da pesquisa foi investigar as condiccedilotildees de vida de

trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de vestuaacuterio moda bebecirc no municiacutepio de

Terra Roxa-PR problematizando suas relaccedilotildees de trabalho e como se inserem e

interpretam este mercado de trabalho dando visibilidade a estes sujeitos e suas accedilotildees na

cidade

O municiacutepio possui atualmente entre macro e micro cerca de 113 empresas que

produzem em torno de 9 milhotildees de peccedilas envolvendo aproximadamente 2500

trabalhadores empregados diretamente o que segundo a noccedilatildeo do poder publico

municipal ldquodinamiza a geraccedilatildeo de emprego e renda do municiacutepiordquo2 Como podemos

1 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 2 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013

10

perceber em uma reportagem do jornal online Gazeta do Povo intitulada ldquoEm Terra

Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojasrdquo

A cadeia da confecccedilatildeo infantil mudou os rumos da cidade de 17 mil habitantes e a vida de muitos paranaenses Maria do Carmo 42 anos eacute um exemplo Ateacute os 38 anos ela trabalhava nos Campos Gerais onde plantava eucalipto Hoje o cenaacuterio eacute o mesmo um siacutetio mas agora ela natildeo lida diretamente com a terra Maria atua no setor de corte de roupas e tambeacutem dirige o ocircnibus que transporta funcionaacuterios da empresa Baby Doces Momentos confecccedilatildeo localizada em um siacutetio de cinco alqueires que produz cerca de 20 mil peccedilas ao mecircs ldquoAgora me sinto melhor Antes trabalhava no sol com uma bomba de 20 litros nas costas para pulverizar e plantarrdquo conta3

A partir do trecho acima percebemos que ao avaliar a dinacircmica industrial no

municiacutepio a reportagem aponta a relaccedilatildeo com a produccedilatildeo e experiecircncia dos trabalhos

no meio rural evidentemente para positivar a expansatildeo desse ramo de induacutestria de

vestuaacuterio como salvaccedilatildeo da cidade jaacute que estas empresas ldquodinamiza a geraccedilatildeo de

emprego e renda do municiacutepiordquo

Eacute importante entender a dimensatildeo dessa estrutura empresarial industrial em

Terra Roxa pois esta historicidade vai abrir caminhos a serem problematizados ao

longo deste trabalho

Para desenvolver esta pesquisa pautamo-nos na dinacircmica que integra a reflexatildeo

da problemaacutetica e o processo de levantamento e anaacutelise de fontes Esse

encaminhamento inspira-se na indicaccedilatildeo de Thompson sobre o diaacutelogo necessaacuterio e

constante entre teoria e evidecircncias histoacutericas4

Segundo Thompson

O interrogador eacute a loacutegica histoacuterica o conteuacutedo da interrogaccedilatildeo eacute uma hipoacutetese o interrogado eacute a evidecircncia com suas propriedades determinadas O objeto do conhecimento histoacuterico eacute a histoacuteria lsquorealrsquo cujas evidecircncias devem ser necessariamente incompletas e imperfeitas5

3 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no-paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 4 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma criacutetica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar Editores 1981 5 IBIDEM p 49

11

Isso quer dizer que os historiadores podem selecionar essa ou aquela evidecircncia

propor novas perguntas mas isso natildeo significa que os proacuteprios acontecimentos passados

se modifiquem nem tampouco que seja um agregado de histoacuterias separadas Embora

essa interpretaccedilatildeo do processo histoacuterico surja em resposta agrave pergunta formulada nossa

produccedilatildeo natildeo inventa o processo e natildeo pode modificar o ldquostatus ontoloacutegicordquo do

passado

Eacute nesta perspectiva de anaacutelise que conduziremos este pesquisa Cabe contudo

salientar a contribuiccedilatildeo que esta nos proporciona para a compreensatildeo que proponho

sobre as relaccedilotildees de trabalho experiecircncias e interpretaccedilotildees dos trabalhadores nas

induacutestrias de confecccedilatildeo de moda bebecirc em Terra Roxa Para tanto pensaremos a histoacuteria

em um duplo sentido como experiecircncia humana e como a proacutepria narraccedilatildeo dessas

experiecircncias as interpretaccedilotildees e projeccedilotildees das quais o investigador vai utilizar6

A investigaccedilatildeo neste sentido estaacute relacionada com as problemaacuteticas que o

pesquisador se coloca no presente que envolvem sua experiecircncia de vida e as

concepccedilotildees da qual parte

Pretendo entender a partir das experiecircncias narradas por esses trabalhadores

como eles se inserem e interpretam este mercado de trabalho e fazem prospecccedilotildees

Segundo Thompson

Se determos a histoacuteria num determinado ponto natildeo haacute classe mas simplesmente uma multidatildeo de indiviacuteduos com amontoado de experiecircncias Mas se examinarmos esses homens durante um periacuteodo adequado de mudanccedilas sociais observaremos padrotildees em suas relaccedilotildees sua ideias e instituiccedilotildees A classe eacute definida pelos homens enquanto vivem sua proacutepria histoacuteria e ao final esta eacute sua definiccedilatildeo7

Neste sentido para entendermos os trabalhadores eacute necessaacuteria uma serie de

observaccedilotildees e anaacutelises que se expressam em suas praacuteticas cotidianas como eles

vivenciam e se portam perante sua dinacircmica de trabalho o que possibilita sua formaccedilatildeo

cultural e social

Para esse processo interpretativo utilizamos cinco entrevistas que realizei com

trabalhadores no intuito de potencializar as elaboraccedilotildees construiacutedas por esses sujeitos

sobre as motivaccedilotildees interesses e conflitos ou seja memoacuterias produzidas sobre

6 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987 7 THOMPSON E P ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12

12

trajetoacuterias e experiecircncia social compartilhada nas relaccedilotildees dentro e fora das induacutestrias

de vestuaacuterio na cidade

Como um dos meacutetodos de pesquisa foi trabalhar com fontes orais considero

importante apontar algumas dificuldades que encontrei ao realizar algumas entrevistas

Mesmo o municiacutepio empregando mais de 2500 trabalhadores na induacutestria de confecccedilatildeo

minha principal dificuldade foi encontrar trabalhadores que se dispusessem a realizar as

entrevistas

Aqueles que aceitavam soacute concordavam em produzir a entrevista quando

algueacutem muito proacuteximo deles me apresentava O fato de alguns trabalhadores aceitarem

natildeo excluiu a desconfianccedila e inseguranccedila que estes possuiacuteam em relaccedilatildeo agraves entrevistas

Desta forma a inseguranccedila dos trabalhadores sobre se poderiam falar ou natildeo a

respeito de suas relaccedilotildees de trabalho juntamente com a minha falta de experiecircncia em

saber lidar com essas inseguranccedilas prejudicaram o desenvolvimento das entrevistas

As respostas ficaram limitadas ao roteiro muitas vezes limitadas ao ldquosimrdquo ou ao ldquonatildeordquo

Pois aleacutem da timidez ao saberem que estatildeo sendo gravados ainda tive que lidar com o

receio dos entrevistados ao exporem sua trajetoacuteria e condiccedilotildees de vida

As entrevistas orais natildeo foram produto de teacutecnica mas das relaccedilotildees que

consegui desenvolver com esses trabalhadores Portanto o meacutetodo de utilizar fontes

orais consiste em trabalhar com a subjetividade dos indiviacuteduos lidando com as questotildees

postas pelos entrevistados a partir de minhas proacuteprias questotildees

Neste sentido o diaacutelogo com Alessandro Portelli e com outros autores ajudou a

compreender que essa relaccedilatildeo entre entrevistado e entrevistador natildeo eacute um objetivo

muito faacutecil de ser alcanccedilado pois as pessoas reinterpretam e datildeo novos significados aos

acontecimentos passados em funccedilatildeo do que vive no presente ou espera viver Ou ainda

encobrem sentimentos e interpretaccedilotildees por censura repressatildeo temores ou pela pouca

disposiccedilatildeo em falar8

Ao utilizar a fonte oral foi importante dialogar com a produccedilatildeo de Alessandro

Portelli o qual contribuiu para a construccedilatildeo de um procedimento de anaacutelise para a

produccedilatildeo das fontes orais e do olhar lanccedilado sobre esse material O uso de tal fonte na

pesquisa permitiu o enfrentamento da dinacircmica contraditoacuteria de valores e praacuteticas que

compotildeem escolhas pressotildees e expectativas desses sujeitos sociais

8 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 p33

13

Nesse sentido permite maior visibilidade poliacutetica da classe trabalhadora com

suas divisotildees e processos de identificaccedilatildeo na condiccedilatildeo de classe compartilhada

produzindo assim uma interpretaccedilatildeo histoacuterica comprometida com o potencial de luta e

intervenccedilatildeo social desses trabalhadores Essa investigaccedilatildeo tambeacutem traz como

enfrentamento lidar com os limites dessa fonte como as dificuldades de conseguir a

aceitaccedilatildeo da gravaccedilatildeo da entrevista e contatar trabalhadores9

O intuito de usarmos a fonte oral nesta pesquisa inspira-se nesta perspectiva de

Portelli Buscamos o trabalho com as entrevista natildeo como confirmaccedilatildeo de uma ldquoteserdquo

inicial mas sim com a intenccedilatildeo de dar visibilidade agraves interpretaccedilotildees construiacutedas pelos

trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa

Para tal associamos essa documentaccedilatildeo com mateacuterias jornaliacutesticas e fichas de

inscriccedilatildeo em cursos (de corte costura e bordado) na Escola do trabalho na cidade Aleacutem

da interpretaccedilatildeo de iacutendices estatiacutesticos sobre empregabilidade atividades econocircmicas

etc

O presente trabalho estaacute estruturado em dois capiacutetulos No primeiro capiacutetulo

busquei analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agrave

induacutestria de moda bebecirc a fim de compreender os motivos que levam esses sujeitos a

perceber a expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de

melhoria e mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas e na permanecircncia em Terra Roxa

No segundo capiacutetulo busco discutir a partir das experiecircncias cotidianas e das

relaccedilotildees de trabalho desses sujeitos as possibilidades e limites das expectativas que

estes trabalhadores estabelecem em relaccedilatildeo ao trabalho na induacutestria de moda bebecirc tal

qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre o

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa10

Essa intenccedilatildeo tenta se distanciar de determinados campos analiacuteticos que

sustentam essa expansatildeo industrial como sinocircnimo de desenvolvimento arraigados

na promoccedilatildeo de certos projetos empresariais e na historicidade progressista de alguns

processos de expansatildeo urbana Ao fazer esse distanciamento o interesse eacute ampliar o

9 PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 10 As induacutestrias de Terra Roxa estatildeo inseridas no Arranjo Produtivo Local (APL) criado em 2004 para oferecer subsiacutedios e aperfeiccediloamento aos empresaacuterios O APL da moda bebecirc visa entre outros aspectos maior eficiecircncia de inserccedilatildeo dos produtos da induacutestria de vestuaacuterio no mercado maior poder de negociaccedilatildeo de preccedilo da mateacuteria-prima atraccedilatildeo de novos prestadores de serviccedilos ao municiacutepio e otimizaccedilatildeo de custos com a qualificaccedilatildeo da matildeo de obra Esse assessoramento procura oferecer ao empresariado condiccedilotildees de mercado e apoio para fixaccedilatildeo em determinadas regiotildees

14

campo de anaacutelise apresentando contradiccedilotildees e tensotildees nesse percurso dirigindo atenccedilatildeo

aos trabalhadores mais do que agrave faacutebrica e ao sistema produtivo por ele mesmo11

Ao realizar esta pesquisa minha preocupaccedilatildeo se pauta em mostrar que estes

sujeitos satildeo seres conscientes de sua posiccedilatildeo enquanto sujeitos sociais e procuro

ressaltar que estes trabalhadores fazem parte deste processo histoacuterico enquanto

indiviacuteduos ativos mesmo que indiretamente intervenham nos rumos e ritmo dessa

expansatildeo industrial

Assim busquei com este trabalho explorar a partir das narrativas dos

trabalhadores e de suas experiecircncias entender natildeo somente estes sujeitos mas as

expectativas que estes constroem e as relaccedilotildees que estabelecem com o trabalho para a

promoccedilatildeo de seus interesses

11 O trabalho de Godoy procura fazer um percurso acadecircmico das nuances e alteraccedilotildees na abordagem do universo fabril Assim como Paoli Sader e Telles recolocam alguns enfrentamentos - na percepccedilatildeo de suas atuaccedilotildees e construccedilatildeo de sentidos - para aqueles que procuram perceber os trabalhadores neste cenaacuterio operaacuterio brasileiro Ver -GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 -PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198

15

CAPIacuteTULO 1

TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc

[] Com o tempo depois que essas empresas dede crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram mais faacuteceis neacute []12

Neste capiacutetulo vamos analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente

estatildeo ou que em algum momento de suas vidas estiveram vinculados agraves induacutestrias de

confecccedilatildeo de moda bebecirc do municiacutepio de Terra Roxa- PR mas que trazem em sua

trajetoacuteria uma relaccedilatildeo com o trabalho moradia e valores advindo do campo O objetivo

eacute problematizar suas avaliaccedilotildees frente agrave ldquoexpansatildeordquo industrial do municiacutepio e como essa

dialoga com seus interesses e necessidades

Ao analisarmos algumas entrevistas de trabalhadores vinculados a estas

induacutestrias foi comum encontrar assim como na narrativa citada na epiacutegrafe deste

capiacutetulo narrativas nesta perspectiva na qual os empregos gerados pela industrializaccedilatildeo

satildeo interpretados como possibilidade de melhoria na condiccedilatildeo de vida dos

trabalhadores Percebemos assim que o municiacutepio estaacute constantemente sendo indicado

como um grande polo de empregos mas essa indicaccedilatildeo natildeo resume as ponderaccedilotildees que

fazem sobre a presenccedila industrial em Terra Roxa - porque tambeacutem apontam elementos

que contradizem essa presenccedila

Buscaremos entatildeo dialogar com as fontes orais produzidas com trabalhadores

que se relacionaram com induacutestria de confecccedilatildeo procurando discutir tambeacutem alguns

trabalhos acadecircmicos que analisam praacuteticas dos trabalhadores em Terra Roxa A fim de

compreender a trajetoacuteria destes sujeitos e os motivos que os levam a perceber a

expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de melhoria e

mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas

Para compreendermos melhor estas interpretaccedilotildees fez-se necessaacuterio analisar o

percurso de relaccedilotildees e experiecircncias que construiacuteram Para isso foi importante

12 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

16

dimensionar a cidade na deacutecada de 1970 Momento em que se intensificou a mudanccedila

destes trabalhadores do campo para a cidade (ou ainda para outras regiotildees) ou seja este

foi um periacuteodo de mudanccedilas marcantes nas relaccedilotildees de trabalho onde morar e como

viver natildeo soacute no municiacutepio mas possiacutevel de identificar em outras cidades brasileiras

No trabalho de Ana Ameacutelia Camarano e Ricardo Abramovay haacute o interesse em

apresentar os movimentos migratoacuterios que respondem pelo processo de esvaziamento

da populaccedilatildeo rural no Brasil Os autores observam que ateacute 1980 houve um crescimento

absoluto do saldo populacional que deixou as aacutereas rurais brasileiras Aproximadamente

40 da populaccedilatildeo que vivia nas aacutereas rurais no comeccedilo dos anos 70 migraram nessa

deacutecada O fluxo que deixou o campo nos anos 80 tambeacutem foi expressivo 13 de todos

os que viviam no meio rural em 1980 saiacuteram durante esse periacuteodo o que representou

aproximadamente 13 milhotildees de pessoas13

Em termos nacionais a intensidade do movimento de desruralizaccedilatildeo segundo

os autores parece natildeo ter diminuiacutedo muito nos uacuteltimos 50 anos Entre 1950 e 1980 as

aacutereas rurais das regiotildees Sudeste e Sul forneceram um volume expressivo de novos

moradores para as aacutereas urbanas14 Para os autores como realizavam a pesquisa em fins

da deacutecada de 1990 suas impressotildees indicavam uma continuidade desse processo

Desde 1950 a cada 10 anos um em cada trecircs brasileiros vivendo no meio rural opta pela emigraccedilatildeo Os anos 90 natildeo arrefeceram em muito esta tendecircncia se as taxas de evasatildeo do meio rural observadas entre 1990 e 1995 persistirem pelo restante da deacutecada quase 30 dos brasileiros que entatildeo viviam no campo em 1990 teratildeo mudado seu local de residecircncia na virada do milecircnio15

Ainda que os autores analisem no campo da geografia demograacutefica apoiando-se

na noccedilatildeo de ecircxodo rural estes trazem ldquoo modo de vida no campordquo como incocircmodo para

a realizaccedilatildeo da pesquisa traduzido nas movimentaccedilotildees desses brasileiros entre o campo

e a cidade alteraccedilotildees natildeo soacute espaciais mas no modo como vivem e enfrentam

determinadas relaccedilotildees de poder

Estes se movimentam de acordo com as expectativas e interesses que produzem

como necessidades reorganizando as relaccedilotildees de trabalho e modos de vida diante de

pressotildees de reestruturaccedilatildeo da produccedilatildeo e da ocupaccedilatildeo das aacutereas rurais brasileiras da

13 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 14 IBIDEM 15 IBIDEM p 6

17

segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual

natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na

promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo

De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970

aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do

municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as

principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos

Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio

exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX

Graacutefico 1

Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)

Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e

principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a

distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando

Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de

1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea

urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave

expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de

vestuaacuterio moda bebecirc

16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013

18

Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no

municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo

urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e

insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo

na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e

incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola

em moldes capitalistas na cidade 17

A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas

unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha

o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade

em muitos casos diretamente com o consumidor

Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que

discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em

Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo

provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que

Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18

No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da

populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente

ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da

maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio

alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo

aponta um processo tranquilo

17

GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18

FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9

19

As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos

oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute

mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise

- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o

cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que

A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19

A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o

trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe

quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar

com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de

banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe

pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo

Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um

grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir

ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados

da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia

por um nuacutemero reduzido de vagas

Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo

saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por

um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria

condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses

19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33

20

trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de

induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade

Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu

entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria

seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas

vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece

Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20

A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves

induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos

perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas

de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para

Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida

Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como

citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este

processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de

Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande

decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio

Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do

IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que

formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho

atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores

mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que

permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram

como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras

atividades tambeacutem inconstantes

A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em

2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que

residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo

por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos

20

JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

21

sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)

estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos

produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no

transporte e venda de mercadorias21

O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os

trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira

produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no

contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria

e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas

Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua

forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de

escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma

grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de

mercadorias criminalizado como contrabando

O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online

Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o

narcotraacuteficordquo aponta que

Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122

A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida

com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que

almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores

apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os

21

CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013

22

oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando

permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute

associada a comprar roupas e tecircnis de marca

O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a

intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda

de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre

alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para

frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc

No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses

trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego

Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso

Frederico afirma que

Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23

A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da

agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em

segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees

No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este

processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas

nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica

quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo

Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24

23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

23

Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo

para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O

trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do

patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo

lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos

trabalhadores pela induacutestria ele me diz que

Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25

Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural

da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas

relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar

com essa nova dinacircmica

Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo

visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas

vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se

aproxima da percepccedilatildeo de Carlos

Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26

Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para

ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes

se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio

trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as

ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que

pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha

25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11

24

trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem

trabalho

Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe

complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho

pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida

que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram

Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no

campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e

trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte

das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave

trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a

perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura

Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27

Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de

alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute

registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses

trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas

A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade

de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As

oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um

maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa

condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos

desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor

a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado

O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos

Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo

Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa

27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10

25

Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28

Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas

anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do

empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da

cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram

nesse processo

O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho

financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para

empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a

demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de

trabalhadores agrave disposiccedilatildeo

Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no

municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do

empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor

produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que

A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29

Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos

gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por

ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e

possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio

A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees

municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno

28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM

26

desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos

proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e

do APL do vestuaacuterio na cidade 31

No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi

substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e

mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e

vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa

aacutereardquo

Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do

Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos

profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes

tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o

interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo

de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores

tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo

foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal

finalidade

De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho

rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da

folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo

A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como

Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes

Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o

municiacutepio de Terra Roxa

30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

27

Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34

O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de

trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda

continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila

tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de

garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno

dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o

campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre

os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal

As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma

alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida

ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores

possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -

com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou

outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por

perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista

dentre outros natildeo os oferece

Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes

trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de

classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de

melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no

ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a

trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em

outra cidade ela me disse que

Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35

34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

28

Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave

mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem

organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de

novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar

com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as

expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita

vantagem assimrdquo

Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para

Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se

demo na faacutebricardquo36

Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram

trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar

mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia

com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando

pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que

Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37

Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter

voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no

campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em

Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que

natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar

36 IDEM 37 IDEM

29

As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila

pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com

a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma

mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila

natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na

narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do

casal

Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas

construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril

Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho

na faacutebrica ela me disse que

Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38

Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que

gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as

dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores

preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica

ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na

avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em

conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho

O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como

Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos

indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em

casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria

Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista

Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim

38 IDEM

30

de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por

menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes

oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc

como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado

na Escola do Trabalho

Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o

tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram

mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias

permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas

relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais

Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns

trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de

compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas

tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa

39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

31

CAPIacuteTULO 2

TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40

Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa

natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O

municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande

polo de empregos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de

investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade

de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um

grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41

Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo

como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem

indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e

aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de

desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente

O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de

julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do

Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para

bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda

afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um

terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio

A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral

retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o

40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013

32

processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no

ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir

Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa

fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda

bebecirc pra terra roxa

Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43

A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande

destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da

cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra

Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o

municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo

queacuterdquo

No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves

transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que

este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo

sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em

resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores

Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa

industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo

enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa

Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20

principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a

43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

33

janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos

registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores

vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e

desligamento nesses setores

Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa

Meses Jan de 2003 a Jan de 2011

CBO ndash Frequumlecircncia

Admissotildees Desligamentos

Saldo

1ordm Emp

Reemp

Reint

C Prz Det

Transf

Total

Disp sem J Causa

Disp com J Causa

A Pedido

Term Contr

Aposent

Morte

Term C Prz Deter

Transf

Total

Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da

confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390

Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443

Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie

271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109

Costureira de peccedilas sob encomenda

171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em

geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio

varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina

60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio

em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina

bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas

34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27

Trabalhador agropecuaacuterio em geral

19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador

de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5

Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39

Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie

6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras

10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente

administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio

32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa

24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27

Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013

34

Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

35

Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

36

mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

37

curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

38

Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

42

Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

3

4

5

Aos meus pais Agnaldo e Marley

Que abdicam de seus sonhos para realizar os meus

6

AGRADECIMENTOS

Com especial carinho aos meus Pais Agnaldo e Marley trabalhadores que

apesar da difiacutecil situaccedilatildeo fizeram o possiacutevel e o impossiacutevel para que eu pudesse chegar

ateacute este momento Eacute imensuraacutevel a gratidatildeo e orgulho que nutro por vocecircs pois sei de

toda luta e determinaccedilatildeo para verem a filha formada Obrigada por todo o incentivo

ldquopuxotildees de orelhardquo apoio dedicaccedilatildeo e amor

Agradeccedilo aos amigos velhos e novos que iratildeo fazer parte das minhas melhores

lembranccedilas do ldquotempo de faculdaderdquo Em especial Simone Tineneu Dan Tonho Popi

Vassoura Elaine Julius Keka Emer Nayara Luana Paulo e Tati Alegraram as

minhas noites com momentos de descontraccedilatildeo no bar e rodas de violatildeo Por muitas

vezes foram estes momentos que recarregaram as baterias e deram forccedilas para

continuar

Aacute Vania Marilia e Marcos (Xequereu) companheiros do movimento estudantil

que me ensinaram muito durante toda essa caminhada foram nossas discussotildees que

potencializaram minhas inquietaccedilotildees e a vontade de lutar

Aacute Cintia amiga e companheira durante toda a graduaccedilatildeo por todas as risadas

todo apoio as conversas sobre tantas coisas as comilanccedilas as reclamaccedilotildees e claro por

todos os momentos de procrastinaccedilatildeo

Aacute minhas queridas amigas de infacircncia Aline Luciana Suzani Simone e Fran

que mesmo longe sempre estiveram presentes compartilhando anguacutestias e vitoacuterias

Aacute minha tia Elza que contribuiu de inuacutemeras formas para minha moradia em

Marechal Cacircndido Rondon

Aacute minha orientadora Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas por todo aprendizado

dedicaccedilatildeo e compreensatildeo

Aos trabalhadores que gentilmente me receberam em suas casas compartilhando

suas experiecircncias para a realizaccedilatildeo desse trabalho

Ao meu companheiro Marcos antes de qualquer coisa melhor amigo por toda

cobranccedila ajuda paciecircncia e amor

7

RESUMO

Este Trabalho de Conclusatildeo de Curso tem a intenccedilatildeo de problematizar analisar e investigar as relaccedilotildees de trabalho que marcam a trajetoacuteria de trabalhadores que compuseram praacuteticas no processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa-PR discutindo o modo como se relacionaram nem sempre amistosamente com as accedilotildees do poder puacuteblico municipal e com a participaccedilatildeo empresarial do ramo ldquomoda bebecircrdquo na cidade A pesquisa abordaraacute as trecircs uacuteltimas deacutecadas pelo fato de esse ser um momento histoacuterico importante pela intensificaccedilatildeo da exploraccedilatildeo industrial em Terra Roxa Essa temporalidade eacute significativa no processo de mudanccedila e produccedilatildeo de relaccedilotildees de trabalho na cidade envolvendo o setor de vestuaacuterio e a produccedilatildeo de alternativas por trabalhadores muitas vezes advindo do meio rural Propomos investigar as condiccedilotildees de vida dos trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam este mercado de trabalho bem como relacionar as memoacuterias e accedilotildees produzidas tanto para o trabalho como para a vida em Terra Roxa Para isso destacamos o trabalho com as fontes orais jornais fichas de cursos profissionalizantes e iacutendices estatiacutesticos como documentaccedilatildeo a ser privilegiada nessa pesquisa O interesse foi manter o diaacutelogo com as evidecircncias e quando necessaacuterio ampliar a anaacutelise de fontes ou mesmo revendo os caminhos da investigaccedilatildeo Esse encaminhamento considera que o conhecimento histoacuterico exige essa construccedilatildeo ao longo da pesquisa como tambeacutem o compromisso com as questotildees em foco

Palavras-chave Trabalhadores Relaccedilotildees de Trabalho Induacutestrias

8

Sumaacuterio INTRODUCcedilAtildeO 9

CAPIacuteTULO 1TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc 15

CAPIacuteTULO 2TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES 31

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 51

FONTES 53

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS 55

9

INTRODUCcedilAtildeO

A escolha dos sujeitos e do tema deste estudo (os trabalhadores atualmente

vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa- PR) eacute resultado de minha

trajetoacuteria de vida trabalho e acadecircmica

Primeiro de vida e trabalho porque o trabalho na induacutestria de moda bebecirc jaacute fez

parte de minha atividade profissional por algum tempo Deste modo pude conviver com

outros trabalhadores observar e ouvir suas avaliaccedilotildees sobre suas condiccedilotildees de vida

motivaccedilotildees interesses e conflitos que perpassam esse ambiente de trabalho o que me

instigou a pesquisar o tema De forma que muitas das interpretaccedilotildees e avaliaccedilotildees que os

trabalhadores indicam em suas narrativas atraveacutes das entrevistas feitas jaacute ouvi dos

meus familiares como da minha proacutepria matildee Pois grande parte deles reside em Terra

Roxa e trabalha na induacutestria de moda bebecirc

Segundo como acadecircmica e pesquisadora porque este trabalho de conclusatildeo de

curso eacute continuidade de uma iniciaccedilatildeo cientifica voluntaacuteria (PIC-V) e as questotildees que

estatildeo aqui sendo levantadas eacute uma continuidade das indagaccedilotildees que surgiram a partir de

um diaacutelogo inicial com as fontes feitas nesta pesquisa anterior1

O objetivo central da pesquisa foi investigar as condiccedilotildees de vida de

trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de vestuaacuterio moda bebecirc no municiacutepio de

Terra Roxa-PR problematizando suas relaccedilotildees de trabalho e como se inserem e

interpretam este mercado de trabalho dando visibilidade a estes sujeitos e suas accedilotildees na

cidade

O municiacutepio possui atualmente entre macro e micro cerca de 113 empresas que

produzem em torno de 9 milhotildees de peccedilas envolvendo aproximadamente 2500

trabalhadores empregados diretamente o que segundo a noccedilatildeo do poder publico

municipal ldquodinamiza a geraccedilatildeo de emprego e renda do municiacutepiordquo2 Como podemos

1 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 2 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013

10

perceber em uma reportagem do jornal online Gazeta do Povo intitulada ldquoEm Terra

Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojasrdquo

A cadeia da confecccedilatildeo infantil mudou os rumos da cidade de 17 mil habitantes e a vida de muitos paranaenses Maria do Carmo 42 anos eacute um exemplo Ateacute os 38 anos ela trabalhava nos Campos Gerais onde plantava eucalipto Hoje o cenaacuterio eacute o mesmo um siacutetio mas agora ela natildeo lida diretamente com a terra Maria atua no setor de corte de roupas e tambeacutem dirige o ocircnibus que transporta funcionaacuterios da empresa Baby Doces Momentos confecccedilatildeo localizada em um siacutetio de cinco alqueires que produz cerca de 20 mil peccedilas ao mecircs ldquoAgora me sinto melhor Antes trabalhava no sol com uma bomba de 20 litros nas costas para pulverizar e plantarrdquo conta3

A partir do trecho acima percebemos que ao avaliar a dinacircmica industrial no

municiacutepio a reportagem aponta a relaccedilatildeo com a produccedilatildeo e experiecircncia dos trabalhos

no meio rural evidentemente para positivar a expansatildeo desse ramo de induacutestria de

vestuaacuterio como salvaccedilatildeo da cidade jaacute que estas empresas ldquodinamiza a geraccedilatildeo de

emprego e renda do municiacutepiordquo

Eacute importante entender a dimensatildeo dessa estrutura empresarial industrial em

Terra Roxa pois esta historicidade vai abrir caminhos a serem problematizados ao

longo deste trabalho

Para desenvolver esta pesquisa pautamo-nos na dinacircmica que integra a reflexatildeo

da problemaacutetica e o processo de levantamento e anaacutelise de fontes Esse

encaminhamento inspira-se na indicaccedilatildeo de Thompson sobre o diaacutelogo necessaacuterio e

constante entre teoria e evidecircncias histoacutericas4

Segundo Thompson

O interrogador eacute a loacutegica histoacuterica o conteuacutedo da interrogaccedilatildeo eacute uma hipoacutetese o interrogado eacute a evidecircncia com suas propriedades determinadas O objeto do conhecimento histoacuterico eacute a histoacuteria lsquorealrsquo cujas evidecircncias devem ser necessariamente incompletas e imperfeitas5

3 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no-paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 4 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma criacutetica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar Editores 1981 5 IBIDEM p 49

11

Isso quer dizer que os historiadores podem selecionar essa ou aquela evidecircncia

propor novas perguntas mas isso natildeo significa que os proacuteprios acontecimentos passados

se modifiquem nem tampouco que seja um agregado de histoacuterias separadas Embora

essa interpretaccedilatildeo do processo histoacuterico surja em resposta agrave pergunta formulada nossa

produccedilatildeo natildeo inventa o processo e natildeo pode modificar o ldquostatus ontoloacutegicordquo do

passado

Eacute nesta perspectiva de anaacutelise que conduziremos este pesquisa Cabe contudo

salientar a contribuiccedilatildeo que esta nos proporciona para a compreensatildeo que proponho

sobre as relaccedilotildees de trabalho experiecircncias e interpretaccedilotildees dos trabalhadores nas

induacutestrias de confecccedilatildeo de moda bebecirc em Terra Roxa Para tanto pensaremos a histoacuteria

em um duplo sentido como experiecircncia humana e como a proacutepria narraccedilatildeo dessas

experiecircncias as interpretaccedilotildees e projeccedilotildees das quais o investigador vai utilizar6

A investigaccedilatildeo neste sentido estaacute relacionada com as problemaacuteticas que o

pesquisador se coloca no presente que envolvem sua experiecircncia de vida e as

concepccedilotildees da qual parte

Pretendo entender a partir das experiecircncias narradas por esses trabalhadores

como eles se inserem e interpretam este mercado de trabalho e fazem prospecccedilotildees

Segundo Thompson

Se determos a histoacuteria num determinado ponto natildeo haacute classe mas simplesmente uma multidatildeo de indiviacuteduos com amontoado de experiecircncias Mas se examinarmos esses homens durante um periacuteodo adequado de mudanccedilas sociais observaremos padrotildees em suas relaccedilotildees sua ideias e instituiccedilotildees A classe eacute definida pelos homens enquanto vivem sua proacutepria histoacuteria e ao final esta eacute sua definiccedilatildeo7

Neste sentido para entendermos os trabalhadores eacute necessaacuteria uma serie de

observaccedilotildees e anaacutelises que se expressam em suas praacuteticas cotidianas como eles

vivenciam e se portam perante sua dinacircmica de trabalho o que possibilita sua formaccedilatildeo

cultural e social

Para esse processo interpretativo utilizamos cinco entrevistas que realizei com

trabalhadores no intuito de potencializar as elaboraccedilotildees construiacutedas por esses sujeitos

sobre as motivaccedilotildees interesses e conflitos ou seja memoacuterias produzidas sobre

6 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987 7 THOMPSON E P ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12

12

trajetoacuterias e experiecircncia social compartilhada nas relaccedilotildees dentro e fora das induacutestrias

de vestuaacuterio na cidade

Como um dos meacutetodos de pesquisa foi trabalhar com fontes orais considero

importante apontar algumas dificuldades que encontrei ao realizar algumas entrevistas

Mesmo o municiacutepio empregando mais de 2500 trabalhadores na induacutestria de confecccedilatildeo

minha principal dificuldade foi encontrar trabalhadores que se dispusessem a realizar as

entrevistas

Aqueles que aceitavam soacute concordavam em produzir a entrevista quando

algueacutem muito proacuteximo deles me apresentava O fato de alguns trabalhadores aceitarem

natildeo excluiu a desconfianccedila e inseguranccedila que estes possuiacuteam em relaccedilatildeo agraves entrevistas

Desta forma a inseguranccedila dos trabalhadores sobre se poderiam falar ou natildeo a

respeito de suas relaccedilotildees de trabalho juntamente com a minha falta de experiecircncia em

saber lidar com essas inseguranccedilas prejudicaram o desenvolvimento das entrevistas

As respostas ficaram limitadas ao roteiro muitas vezes limitadas ao ldquosimrdquo ou ao ldquonatildeordquo

Pois aleacutem da timidez ao saberem que estatildeo sendo gravados ainda tive que lidar com o

receio dos entrevistados ao exporem sua trajetoacuteria e condiccedilotildees de vida

As entrevistas orais natildeo foram produto de teacutecnica mas das relaccedilotildees que

consegui desenvolver com esses trabalhadores Portanto o meacutetodo de utilizar fontes

orais consiste em trabalhar com a subjetividade dos indiviacuteduos lidando com as questotildees

postas pelos entrevistados a partir de minhas proacuteprias questotildees

Neste sentido o diaacutelogo com Alessandro Portelli e com outros autores ajudou a

compreender que essa relaccedilatildeo entre entrevistado e entrevistador natildeo eacute um objetivo

muito faacutecil de ser alcanccedilado pois as pessoas reinterpretam e datildeo novos significados aos

acontecimentos passados em funccedilatildeo do que vive no presente ou espera viver Ou ainda

encobrem sentimentos e interpretaccedilotildees por censura repressatildeo temores ou pela pouca

disposiccedilatildeo em falar8

Ao utilizar a fonte oral foi importante dialogar com a produccedilatildeo de Alessandro

Portelli o qual contribuiu para a construccedilatildeo de um procedimento de anaacutelise para a

produccedilatildeo das fontes orais e do olhar lanccedilado sobre esse material O uso de tal fonte na

pesquisa permitiu o enfrentamento da dinacircmica contraditoacuteria de valores e praacuteticas que

compotildeem escolhas pressotildees e expectativas desses sujeitos sociais

8 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 p33

13

Nesse sentido permite maior visibilidade poliacutetica da classe trabalhadora com

suas divisotildees e processos de identificaccedilatildeo na condiccedilatildeo de classe compartilhada

produzindo assim uma interpretaccedilatildeo histoacuterica comprometida com o potencial de luta e

intervenccedilatildeo social desses trabalhadores Essa investigaccedilatildeo tambeacutem traz como

enfrentamento lidar com os limites dessa fonte como as dificuldades de conseguir a

aceitaccedilatildeo da gravaccedilatildeo da entrevista e contatar trabalhadores9

O intuito de usarmos a fonte oral nesta pesquisa inspira-se nesta perspectiva de

Portelli Buscamos o trabalho com as entrevista natildeo como confirmaccedilatildeo de uma ldquoteserdquo

inicial mas sim com a intenccedilatildeo de dar visibilidade agraves interpretaccedilotildees construiacutedas pelos

trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa

Para tal associamos essa documentaccedilatildeo com mateacuterias jornaliacutesticas e fichas de

inscriccedilatildeo em cursos (de corte costura e bordado) na Escola do trabalho na cidade Aleacutem

da interpretaccedilatildeo de iacutendices estatiacutesticos sobre empregabilidade atividades econocircmicas

etc

O presente trabalho estaacute estruturado em dois capiacutetulos No primeiro capiacutetulo

busquei analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agrave

induacutestria de moda bebecirc a fim de compreender os motivos que levam esses sujeitos a

perceber a expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de

melhoria e mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas e na permanecircncia em Terra Roxa

No segundo capiacutetulo busco discutir a partir das experiecircncias cotidianas e das

relaccedilotildees de trabalho desses sujeitos as possibilidades e limites das expectativas que

estes trabalhadores estabelecem em relaccedilatildeo ao trabalho na induacutestria de moda bebecirc tal

qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre o

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa10

Essa intenccedilatildeo tenta se distanciar de determinados campos analiacuteticos que

sustentam essa expansatildeo industrial como sinocircnimo de desenvolvimento arraigados

na promoccedilatildeo de certos projetos empresariais e na historicidade progressista de alguns

processos de expansatildeo urbana Ao fazer esse distanciamento o interesse eacute ampliar o

9 PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 10 As induacutestrias de Terra Roxa estatildeo inseridas no Arranjo Produtivo Local (APL) criado em 2004 para oferecer subsiacutedios e aperfeiccediloamento aos empresaacuterios O APL da moda bebecirc visa entre outros aspectos maior eficiecircncia de inserccedilatildeo dos produtos da induacutestria de vestuaacuterio no mercado maior poder de negociaccedilatildeo de preccedilo da mateacuteria-prima atraccedilatildeo de novos prestadores de serviccedilos ao municiacutepio e otimizaccedilatildeo de custos com a qualificaccedilatildeo da matildeo de obra Esse assessoramento procura oferecer ao empresariado condiccedilotildees de mercado e apoio para fixaccedilatildeo em determinadas regiotildees

14

campo de anaacutelise apresentando contradiccedilotildees e tensotildees nesse percurso dirigindo atenccedilatildeo

aos trabalhadores mais do que agrave faacutebrica e ao sistema produtivo por ele mesmo11

Ao realizar esta pesquisa minha preocupaccedilatildeo se pauta em mostrar que estes

sujeitos satildeo seres conscientes de sua posiccedilatildeo enquanto sujeitos sociais e procuro

ressaltar que estes trabalhadores fazem parte deste processo histoacuterico enquanto

indiviacuteduos ativos mesmo que indiretamente intervenham nos rumos e ritmo dessa

expansatildeo industrial

Assim busquei com este trabalho explorar a partir das narrativas dos

trabalhadores e de suas experiecircncias entender natildeo somente estes sujeitos mas as

expectativas que estes constroem e as relaccedilotildees que estabelecem com o trabalho para a

promoccedilatildeo de seus interesses

11 O trabalho de Godoy procura fazer um percurso acadecircmico das nuances e alteraccedilotildees na abordagem do universo fabril Assim como Paoli Sader e Telles recolocam alguns enfrentamentos - na percepccedilatildeo de suas atuaccedilotildees e construccedilatildeo de sentidos - para aqueles que procuram perceber os trabalhadores neste cenaacuterio operaacuterio brasileiro Ver -GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 -PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198

15

CAPIacuteTULO 1

TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc

[] Com o tempo depois que essas empresas dede crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram mais faacuteceis neacute []12

Neste capiacutetulo vamos analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente

estatildeo ou que em algum momento de suas vidas estiveram vinculados agraves induacutestrias de

confecccedilatildeo de moda bebecirc do municiacutepio de Terra Roxa- PR mas que trazem em sua

trajetoacuteria uma relaccedilatildeo com o trabalho moradia e valores advindo do campo O objetivo

eacute problematizar suas avaliaccedilotildees frente agrave ldquoexpansatildeordquo industrial do municiacutepio e como essa

dialoga com seus interesses e necessidades

Ao analisarmos algumas entrevistas de trabalhadores vinculados a estas

induacutestrias foi comum encontrar assim como na narrativa citada na epiacutegrafe deste

capiacutetulo narrativas nesta perspectiva na qual os empregos gerados pela industrializaccedilatildeo

satildeo interpretados como possibilidade de melhoria na condiccedilatildeo de vida dos

trabalhadores Percebemos assim que o municiacutepio estaacute constantemente sendo indicado

como um grande polo de empregos mas essa indicaccedilatildeo natildeo resume as ponderaccedilotildees que

fazem sobre a presenccedila industrial em Terra Roxa - porque tambeacutem apontam elementos

que contradizem essa presenccedila

Buscaremos entatildeo dialogar com as fontes orais produzidas com trabalhadores

que se relacionaram com induacutestria de confecccedilatildeo procurando discutir tambeacutem alguns

trabalhos acadecircmicos que analisam praacuteticas dos trabalhadores em Terra Roxa A fim de

compreender a trajetoacuteria destes sujeitos e os motivos que os levam a perceber a

expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de melhoria e

mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas

Para compreendermos melhor estas interpretaccedilotildees fez-se necessaacuterio analisar o

percurso de relaccedilotildees e experiecircncias que construiacuteram Para isso foi importante

12 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

16

dimensionar a cidade na deacutecada de 1970 Momento em que se intensificou a mudanccedila

destes trabalhadores do campo para a cidade (ou ainda para outras regiotildees) ou seja este

foi um periacuteodo de mudanccedilas marcantes nas relaccedilotildees de trabalho onde morar e como

viver natildeo soacute no municiacutepio mas possiacutevel de identificar em outras cidades brasileiras

No trabalho de Ana Ameacutelia Camarano e Ricardo Abramovay haacute o interesse em

apresentar os movimentos migratoacuterios que respondem pelo processo de esvaziamento

da populaccedilatildeo rural no Brasil Os autores observam que ateacute 1980 houve um crescimento

absoluto do saldo populacional que deixou as aacutereas rurais brasileiras Aproximadamente

40 da populaccedilatildeo que vivia nas aacutereas rurais no comeccedilo dos anos 70 migraram nessa

deacutecada O fluxo que deixou o campo nos anos 80 tambeacutem foi expressivo 13 de todos

os que viviam no meio rural em 1980 saiacuteram durante esse periacuteodo o que representou

aproximadamente 13 milhotildees de pessoas13

Em termos nacionais a intensidade do movimento de desruralizaccedilatildeo segundo

os autores parece natildeo ter diminuiacutedo muito nos uacuteltimos 50 anos Entre 1950 e 1980 as

aacutereas rurais das regiotildees Sudeste e Sul forneceram um volume expressivo de novos

moradores para as aacutereas urbanas14 Para os autores como realizavam a pesquisa em fins

da deacutecada de 1990 suas impressotildees indicavam uma continuidade desse processo

Desde 1950 a cada 10 anos um em cada trecircs brasileiros vivendo no meio rural opta pela emigraccedilatildeo Os anos 90 natildeo arrefeceram em muito esta tendecircncia se as taxas de evasatildeo do meio rural observadas entre 1990 e 1995 persistirem pelo restante da deacutecada quase 30 dos brasileiros que entatildeo viviam no campo em 1990 teratildeo mudado seu local de residecircncia na virada do milecircnio15

Ainda que os autores analisem no campo da geografia demograacutefica apoiando-se

na noccedilatildeo de ecircxodo rural estes trazem ldquoo modo de vida no campordquo como incocircmodo para

a realizaccedilatildeo da pesquisa traduzido nas movimentaccedilotildees desses brasileiros entre o campo

e a cidade alteraccedilotildees natildeo soacute espaciais mas no modo como vivem e enfrentam

determinadas relaccedilotildees de poder

Estes se movimentam de acordo com as expectativas e interesses que produzem

como necessidades reorganizando as relaccedilotildees de trabalho e modos de vida diante de

pressotildees de reestruturaccedilatildeo da produccedilatildeo e da ocupaccedilatildeo das aacutereas rurais brasileiras da

13 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 14 IBIDEM 15 IBIDEM p 6

17

segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual

natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na

promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo

De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970

aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do

municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as

principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos

Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio

exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX

Graacutefico 1

Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)

Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e

principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a

distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando

Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de

1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea

urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave

expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de

vestuaacuterio moda bebecirc

16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013

18

Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no

municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo

urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e

insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo

na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e

incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola

em moldes capitalistas na cidade 17

A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas

unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha

o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade

em muitos casos diretamente com o consumidor

Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que

discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em

Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo

provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que

Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18

No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da

populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente

ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da

maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio

alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo

aponta um processo tranquilo

17

GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18

FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9

19

As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos

oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute

mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise

- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o

cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que

A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19

A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o

trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe

quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar

com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de

banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe

pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo

Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um

grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir

ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados

da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia

por um nuacutemero reduzido de vagas

Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo

saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por

um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria

condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses

19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33

20

trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de

induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade

Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu

entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria

seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas

vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece

Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20

A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves

induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos

perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas

de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para

Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida

Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como

citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este

processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de

Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande

decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio

Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do

IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que

formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho

atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores

mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que

permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram

como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras

atividades tambeacutem inconstantes

A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em

2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que

residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo

por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos

20

JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

21

sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)

estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos

produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no

transporte e venda de mercadorias21

O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os

trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira

produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no

contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria

e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas

Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua

forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de

escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma

grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de

mercadorias criminalizado como contrabando

O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online

Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o

narcotraacuteficordquo aponta que

Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122

A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida

com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que

almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores

apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os

21

CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013

22

oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando

permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute

associada a comprar roupas e tecircnis de marca

O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a

intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda

de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre

alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para

frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc

No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses

trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego

Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso

Frederico afirma que

Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23

A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da

agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em

segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees

No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este

processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas

nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica

quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo

Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24

23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

23

Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo

para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O

trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do

patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo

lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos

trabalhadores pela induacutestria ele me diz que

Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25

Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural

da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas

relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar

com essa nova dinacircmica

Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo

visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas

vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se

aproxima da percepccedilatildeo de Carlos

Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26

Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para

ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes

se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio

trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as

ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que

pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha

25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11

24

trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem

trabalho

Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe

complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho

pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida

que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram

Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no

campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e

trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte

das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave

trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a

perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura

Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27

Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de

alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute

registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses

trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas

A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade

de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As

oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um

maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa

condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos

desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor

a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado

O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos

Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo

Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa

27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10

25

Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28

Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas

anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do

empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da

cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram

nesse processo

O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho

financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para

empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a

demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de

trabalhadores agrave disposiccedilatildeo

Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no

municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do

empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor

produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que

A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29

Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos

gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por

ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e

possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio

A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees

municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno

28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM

26

desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos

proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e

do APL do vestuaacuterio na cidade 31

No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi

substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e

mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e

vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa

aacutereardquo

Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do

Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos

profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes

tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o

interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo

de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores

tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo

foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal

finalidade

De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho

rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da

folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo

A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como

Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes

Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o

municiacutepio de Terra Roxa

30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

27

Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34

O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de

trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda

continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila

tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de

garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno

dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o

campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre

os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal

As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma

alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida

ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores

possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -

com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou

outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por

perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista

dentre outros natildeo os oferece

Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes

trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de

classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de

melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no

ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a

trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em

outra cidade ela me disse que

Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35

34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

28

Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave

mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem

organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de

novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar

com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as

expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita

vantagem assimrdquo

Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para

Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se

demo na faacutebricardquo36

Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram

trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar

mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia

com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando

pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que

Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37

Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter

voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no

campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em

Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que

natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar

36 IDEM 37 IDEM

29

As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila

pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com

a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma

mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila

natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na

narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do

casal

Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas

construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril

Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho

na faacutebrica ela me disse que

Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38

Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que

gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as

dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores

preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica

ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na

avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em

conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho

O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como

Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos

indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em

casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria

Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista

Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim

38 IDEM

30

de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por

menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes

oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc

como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado

na Escola do Trabalho

Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o

tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram

mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias

permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas

relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais

Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns

trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de

compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas

tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa

39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

31

CAPIacuteTULO 2

TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40

Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa

natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O

municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande

polo de empregos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de

investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade

de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um

grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41

Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo

como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem

indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e

aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de

desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente

O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de

julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do

Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para

bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda

afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um

terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio

A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral

retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o

40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013

32

processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no

ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir

Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa

fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda

bebecirc pra terra roxa

Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43

A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande

destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da

cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra

Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o

municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo

queacuterdquo

No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves

transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que

este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo

sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em

resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores

Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa

industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo

enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa

Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20

principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a

43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

33

janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos

registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores

vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e

desligamento nesses setores

Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa

Meses Jan de 2003 a Jan de 2011

CBO ndash Frequumlecircncia

Admissotildees Desligamentos

Saldo

1ordm Emp

Reemp

Reint

C Prz Det

Transf

Total

Disp sem J Causa

Disp com J Causa

A Pedido

Term Contr

Aposent

Morte

Term C Prz Deter

Transf

Total

Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da

confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390

Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443

Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie

271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109

Costureira de peccedilas sob encomenda

171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em

geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio

varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina

60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio

em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina

bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas

34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27

Trabalhador agropecuaacuterio em geral

19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador

de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5

Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39

Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie

6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras

10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente

administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio

32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa

24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27

Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013

34

Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

35

Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

36

mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

37

curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

38

Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

41

que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

42

Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

44

industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

45

Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

46

Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

4

5

Aos meus pais Agnaldo e Marley

Que abdicam de seus sonhos para realizar os meus

6

AGRADECIMENTOS

Com especial carinho aos meus Pais Agnaldo e Marley trabalhadores que

apesar da difiacutecil situaccedilatildeo fizeram o possiacutevel e o impossiacutevel para que eu pudesse chegar

ateacute este momento Eacute imensuraacutevel a gratidatildeo e orgulho que nutro por vocecircs pois sei de

toda luta e determinaccedilatildeo para verem a filha formada Obrigada por todo o incentivo

ldquopuxotildees de orelhardquo apoio dedicaccedilatildeo e amor

Agradeccedilo aos amigos velhos e novos que iratildeo fazer parte das minhas melhores

lembranccedilas do ldquotempo de faculdaderdquo Em especial Simone Tineneu Dan Tonho Popi

Vassoura Elaine Julius Keka Emer Nayara Luana Paulo e Tati Alegraram as

minhas noites com momentos de descontraccedilatildeo no bar e rodas de violatildeo Por muitas

vezes foram estes momentos que recarregaram as baterias e deram forccedilas para

continuar

Aacute Vania Marilia e Marcos (Xequereu) companheiros do movimento estudantil

que me ensinaram muito durante toda essa caminhada foram nossas discussotildees que

potencializaram minhas inquietaccedilotildees e a vontade de lutar

Aacute Cintia amiga e companheira durante toda a graduaccedilatildeo por todas as risadas

todo apoio as conversas sobre tantas coisas as comilanccedilas as reclamaccedilotildees e claro por

todos os momentos de procrastinaccedilatildeo

Aacute minhas queridas amigas de infacircncia Aline Luciana Suzani Simone e Fran

que mesmo longe sempre estiveram presentes compartilhando anguacutestias e vitoacuterias

Aacute minha tia Elza que contribuiu de inuacutemeras formas para minha moradia em

Marechal Cacircndido Rondon

Aacute minha orientadora Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas por todo aprendizado

dedicaccedilatildeo e compreensatildeo

Aos trabalhadores que gentilmente me receberam em suas casas compartilhando

suas experiecircncias para a realizaccedilatildeo desse trabalho

Ao meu companheiro Marcos antes de qualquer coisa melhor amigo por toda

cobranccedila ajuda paciecircncia e amor

7

RESUMO

Este Trabalho de Conclusatildeo de Curso tem a intenccedilatildeo de problematizar analisar e investigar as relaccedilotildees de trabalho que marcam a trajetoacuteria de trabalhadores que compuseram praacuteticas no processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa-PR discutindo o modo como se relacionaram nem sempre amistosamente com as accedilotildees do poder puacuteblico municipal e com a participaccedilatildeo empresarial do ramo ldquomoda bebecircrdquo na cidade A pesquisa abordaraacute as trecircs uacuteltimas deacutecadas pelo fato de esse ser um momento histoacuterico importante pela intensificaccedilatildeo da exploraccedilatildeo industrial em Terra Roxa Essa temporalidade eacute significativa no processo de mudanccedila e produccedilatildeo de relaccedilotildees de trabalho na cidade envolvendo o setor de vestuaacuterio e a produccedilatildeo de alternativas por trabalhadores muitas vezes advindo do meio rural Propomos investigar as condiccedilotildees de vida dos trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam este mercado de trabalho bem como relacionar as memoacuterias e accedilotildees produzidas tanto para o trabalho como para a vida em Terra Roxa Para isso destacamos o trabalho com as fontes orais jornais fichas de cursos profissionalizantes e iacutendices estatiacutesticos como documentaccedilatildeo a ser privilegiada nessa pesquisa O interesse foi manter o diaacutelogo com as evidecircncias e quando necessaacuterio ampliar a anaacutelise de fontes ou mesmo revendo os caminhos da investigaccedilatildeo Esse encaminhamento considera que o conhecimento histoacuterico exige essa construccedilatildeo ao longo da pesquisa como tambeacutem o compromisso com as questotildees em foco

Palavras-chave Trabalhadores Relaccedilotildees de Trabalho Induacutestrias

8

Sumaacuterio INTRODUCcedilAtildeO 9

CAPIacuteTULO 1TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc 15

CAPIacuteTULO 2TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES 31

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 51

FONTES 53

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS 55

9

INTRODUCcedilAtildeO

A escolha dos sujeitos e do tema deste estudo (os trabalhadores atualmente

vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa- PR) eacute resultado de minha

trajetoacuteria de vida trabalho e acadecircmica

Primeiro de vida e trabalho porque o trabalho na induacutestria de moda bebecirc jaacute fez

parte de minha atividade profissional por algum tempo Deste modo pude conviver com

outros trabalhadores observar e ouvir suas avaliaccedilotildees sobre suas condiccedilotildees de vida

motivaccedilotildees interesses e conflitos que perpassam esse ambiente de trabalho o que me

instigou a pesquisar o tema De forma que muitas das interpretaccedilotildees e avaliaccedilotildees que os

trabalhadores indicam em suas narrativas atraveacutes das entrevistas feitas jaacute ouvi dos

meus familiares como da minha proacutepria matildee Pois grande parte deles reside em Terra

Roxa e trabalha na induacutestria de moda bebecirc

Segundo como acadecircmica e pesquisadora porque este trabalho de conclusatildeo de

curso eacute continuidade de uma iniciaccedilatildeo cientifica voluntaacuteria (PIC-V) e as questotildees que

estatildeo aqui sendo levantadas eacute uma continuidade das indagaccedilotildees que surgiram a partir de

um diaacutelogo inicial com as fontes feitas nesta pesquisa anterior1

O objetivo central da pesquisa foi investigar as condiccedilotildees de vida de

trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de vestuaacuterio moda bebecirc no municiacutepio de

Terra Roxa-PR problematizando suas relaccedilotildees de trabalho e como se inserem e

interpretam este mercado de trabalho dando visibilidade a estes sujeitos e suas accedilotildees na

cidade

O municiacutepio possui atualmente entre macro e micro cerca de 113 empresas que

produzem em torno de 9 milhotildees de peccedilas envolvendo aproximadamente 2500

trabalhadores empregados diretamente o que segundo a noccedilatildeo do poder publico

municipal ldquodinamiza a geraccedilatildeo de emprego e renda do municiacutepiordquo2 Como podemos

1 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 2 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013

10

perceber em uma reportagem do jornal online Gazeta do Povo intitulada ldquoEm Terra

Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojasrdquo

A cadeia da confecccedilatildeo infantil mudou os rumos da cidade de 17 mil habitantes e a vida de muitos paranaenses Maria do Carmo 42 anos eacute um exemplo Ateacute os 38 anos ela trabalhava nos Campos Gerais onde plantava eucalipto Hoje o cenaacuterio eacute o mesmo um siacutetio mas agora ela natildeo lida diretamente com a terra Maria atua no setor de corte de roupas e tambeacutem dirige o ocircnibus que transporta funcionaacuterios da empresa Baby Doces Momentos confecccedilatildeo localizada em um siacutetio de cinco alqueires que produz cerca de 20 mil peccedilas ao mecircs ldquoAgora me sinto melhor Antes trabalhava no sol com uma bomba de 20 litros nas costas para pulverizar e plantarrdquo conta3

A partir do trecho acima percebemos que ao avaliar a dinacircmica industrial no

municiacutepio a reportagem aponta a relaccedilatildeo com a produccedilatildeo e experiecircncia dos trabalhos

no meio rural evidentemente para positivar a expansatildeo desse ramo de induacutestria de

vestuaacuterio como salvaccedilatildeo da cidade jaacute que estas empresas ldquodinamiza a geraccedilatildeo de

emprego e renda do municiacutepiordquo

Eacute importante entender a dimensatildeo dessa estrutura empresarial industrial em

Terra Roxa pois esta historicidade vai abrir caminhos a serem problematizados ao

longo deste trabalho

Para desenvolver esta pesquisa pautamo-nos na dinacircmica que integra a reflexatildeo

da problemaacutetica e o processo de levantamento e anaacutelise de fontes Esse

encaminhamento inspira-se na indicaccedilatildeo de Thompson sobre o diaacutelogo necessaacuterio e

constante entre teoria e evidecircncias histoacutericas4

Segundo Thompson

O interrogador eacute a loacutegica histoacuterica o conteuacutedo da interrogaccedilatildeo eacute uma hipoacutetese o interrogado eacute a evidecircncia com suas propriedades determinadas O objeto do conhecimento histoacuterico eacute a histoacuteria lsquorealrsquo cujas evidecircncias devem ser necessariamente incompletas e imperfeitas5

3 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no-paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 4 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma criacutetica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar Editores 1981 5 IBIDEM p 49

11

Isso quer dizer que os historiadores podem selecionar essa ou aquela evidecircncia

propor novas perguntas mas isso natildeo significa que os proacuteprios acontecimentos passados

se modifiquem nem tampouco que seja um agregado de histoacuterias separadas Embora

essa interpretaccedilatildeo do processo histoacuterico surja em resposta agrave pergunta formulada nossa

produccedilatildeo natildeo inventa o processo e natildeo pode modificar o ldquostatus ontoloacutegicordquo do

passado

Eacute nesta perspectiva de anaacutelise que conduziremos este pesquisa Cabe contudo

salientar a contribuiccedilatildeo que esta nos proporciona para a compreensatildeo que proponho

sobre as relaccedilotildees de trabalho experiecircncias e interpretaccedilotildees dos trabalhadores nas

induacutestrias de confecccedilatildeo de moda bebecirc em Terra Roxa Para tanto pensaremos a histoacuteria

em um duplo sentido como experiecircncia humana e como a proacutepria narraccedilatildeo dessas

experiecircncias as interpretaccedilotildees e projeccedilotildees das quais o investigador vai utilizar6

A investigaccedilatildeo neste sentido estaacute relacionada com as problemaacuteticas que o

pesquisador se coloca no presente que envolvem sua experiecircncia de vida e as

concepccedilotildees da qual parte

Pretendo entender a partir das experiecircncias narradas por esses trabalhadores

como eles se inserem e interpretam este mercado de trabalho e fazem prospecccedilotildees

Segundo Thompson

Se determos a histoacuteria num determinado ponto natildeo haacute classe mas simplesmente uma multidatildeo de indiviacuteduos com amontoado de experiecircncias Mas se examinarmos esses homens durante um periacuteodo adequado de mudanccedilas sociais observaremos padrotildees em suas relaccedilotildees sua ideias e instituiccedilotildees A classe eacute definida pelos homens enquanto vivem sua proacutepria histoacuteria e ao final esta eacute sua definiccedilatildeo7

Neste sentido para entendermos os trabalhadores eacute necessaacuteria uma serie de

observaccedilotildees e anaacutelises que se expressam em suas praacuteticas cotidianas como eles

vivenciam e se portam perante sua dinacircmica de trabalho o que possibilita sua formaccedilatildeo

cultural e social

Para esse processo interpretativo utilizamos cinco entrevistas que realizei com

trabalhadores no intuito de potencializar as elaboraccedilotildees construiacutedas por esses sujeitos

sobre as motivaccedilotildees interesses e conflitos ou seja memoacuterias produzidas sobre

6 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987 7 THOMPSON E P ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12

12

trajetoacuterias e experiecircncia social compartilhada nas relaccedilotildees dentro e fora das induacutestrias

de vestuaacuterio na cidade

Como um dos meacutetodos de pesquisa foi trabalhar com fontes orais considero

importante apontar algumas dificuldades que encontrei ao realizar algumas entrevistas

Mesmo o municiacutepio empregando mais de 2500 trabalhadores na induacutestria de confecccedilatildeo

minha principal dificuldade foi encontrar trabalhadores que se dispusessem a realizar as

entrevistas

Aqueles que aceitavam soacute concordavam em produzir a entrevista quando

algueacutem muito proacuteximo deles me apresentava O fato de alguns trabalhadores aceitarem

natildeo excluiu a desconfianccedila e inseguranccedila que estes possuiacuteam em relaccedilatildeo agraves entrevistas

Desta forma a inseguranccedila dos trabalhadores sobre se poderiam falar ou natildeo a

respeito de suas relaccedilotildees de trabalho juntamente com a minha falta de experiecircncia em

saber lidar com essas inseguranccedilas prejudicaram o desenvolvimento das entrevistas

As respostas ficaram limitadas ao roteiro muitas vezes limitadas ao ldquosimrdquo ou ao ldquonatildeordquo

Pois aleacutem da timidez ao saberem que estatildeo sendo gravados ainda tive que lidar com o

receio dos entrevistados ao exporem sua trajetoacuteria e condiccedilotildees de vida

As entrevistas orais natildeo foram produto de teacutecnica mas das relaccedilotildees que

consegui desenvolver com esses trabalhadores Portanto o meacutetodo de utilizar fontes

orais consiste em trabalhar com a subjetividade dos indiviacuteduos lidando com as questotildees

postas pelos entrevistados a partir de minhas proacuteprias questotildees

Neste sentido o diaacutelogo com Alessandro Portelli e com outros autores ajudou a

compreender que essa relaccedilatildeo entre entrevistado e entrevistador natildeo eacute um objetivo

muito faacutecil de ser alcanccedilado pois as pessoas reinterpretam e datildeo novos significados aos

acontecimentos passados em funccedilatildeo do que vive no presente ou espera viver Ou ainda

encobrem sentimentos e interpretaccedilotildees por censura repressatildeo temores ou pela pouca

disposiccedilatildeo em falar8

Ao utilizar a fonte oral foi importante dialogar com a produccedilatildeo de Alessandro

Portelli o qual contribuiu para a construccedilatildeo de um procedimento de anaacutelise para a

produccedilatildeo das fontes orais e do olhar lanccedilado sobre esse material O uso de tal fonte na

pesquisa permitiu o enfrentamento da dinacircmica contraditoacuteria de valores e praacuteticas que

compotildeem escolhas pressotildees e expectativas desses sujeitos sociais

8 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 p33

13

Nesse sentido permite maior visibilidade poliacutetica da classe trabalhadora com

suas divisotildees e processos de identificaccedilatildeo na condiccedilatildeo de classe compartilhada

produzindo assim uma interpretaccedilatildeo histoacuterica comprometida com o potencial de luta e

intervenccedilatildeo social desses trabalhadores Essa investigaccedilatildeo tambeacutem traz como

enfrentamento lidar com os limites dessa fonte como as dificuldades de conseguir a

aceitaccedilatildeo da gravaccedilatildeo da entrevista e contatar trabalhadores9

O intuito de usarmos a fonte oral nesta pesquisa inspira-se nesta perspectiva de

Portelli Buscamos o trabalho com as entrevista natildeo como confirmaccedilatildeo de uma ldquoteserdquo

inicial mas sim com a intenccedilatildeo de dar visibilidade agraves interpretaccedilotildees construiacutedas pelos

trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa

Para tal associamos essa documentaccedilatildeo com mateacuterias jornaliacutesticas e fichas de

inscriccedilatildeo em cursos (de corte costura e bordado) na Escola do trabalho na cidade Aleacutem

da interpretaccedilatildeo de iacutendices estatiacutesticos sobre empregabilidade atividades econocircmicas

etc

O presente trabalho estaacute estruturado em dois capiacutetulos No primeiro capiacutetulo

busquei analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agrave

induacutestria de moda bebecirc a fim de compreender os motivos que levam esses sujeitos a

perceber a expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de

melhoria e mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas e na permanecircncia em Terra Roxa

No segundo capiacutetulo busco discutir a partir das experiecircncias cotidianas e das

relaccedilotildees de trabalho desses sujeitos as possibilidades e limites das expectativas que

estes trabalhadores estabelecem em relaccedilatildeo ao trabalho na induacutestria de moda bebecirc tal

qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre o

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa10

Essa intenccedilatildeo tenta se distanciar de determinados campos analiacuteticos que

sustentam essa expansatildeo industrial como sinocircnimo de desenvolvimento arraigados

na promoccedilatildeo de certos projetos empresariais e na historicidade progressista de alguns

processos de expansatildeo urbana Ao fazer esse distanciamento o interesse eacute ampliar o

9 PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 10 As induacutestrias de Terra Roxa estatildeo inseridas no Arranjo Produtivo Local (APL) criado em 2004 para oferecer subsiacutedios e aperfeiccediloamento aos empresaacuterios O APL da moda bebecirc visa entre outros aspectos maior eficiecircncia de inserccedilatildeo dos produtos da induacutestria de vestuaacuterio no mercado maior poder de negociaccedilatildeo de preccedilo da mateacuteria-prima atraccedilatildeo de novos prestadores de serviccedilos ao municiacutepio e otimizaccedilatildeo de custos com a qualificaccedilatildeo da matildeo de obra Esse assessoramento procura oferecer ao empresariado condiccedilotildees de mercado e apoio para fixaccedilatildeo em determinadas regiotildees

14

campo de anaacutelise apresentando contradiccedilotildees e tensotildees nesse percurso dirigindo atenccedilatildeo

aos trabalhadores mais do que agrave faacutebrica e ao sistema produtivo por ele mesmo11

Ao realizar esta pesquisa minha preocupaccedilatildeo se pauta em mostrar que estes

sujeitos satildeo seres conscientes de sua posiccedilatildeo enquanto sujeitos sociais e procuro

ressaltar que estes trabalhadores fazem parte deste processo histoacuterico enquanto

indiviacuteduos ativos mesmo que indiretamente intervenham nos rumos e ritmo dessa

expansatildeo industrial

Assim busquei com este trabalho explorar a partir das narrativas dos

trabalhadores e de suas experiecircncias entender natildeo somente estes sujeitos mas as

expectativas que estes constroem e as relaccedilotildees que estabelecem com o trabalho para a

promoccedilatildeo de seus interesses

11 O trabalho de Godoy procura fazer um percurso acadecircmico das nuances e alteraccedilotildees na abordagem do universo fabril Assim como Paoli Sader e Telles recolocam alguns enfrentamentos - na percepccedilatildeo de suas atuaccedilotildees e construccedilatildeo de sentidos - para aqueles que procuram perceber os trabalhadores neste cenaacuterio operaacuterio brasileiro Ver -GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 -PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198

15

CAPIacuteTULO 1

TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc

[] Com o tempo depois que essas empresas dede crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram mais faacuteceis neacute []12

Neste capiacutetulo vamos analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente

estatildeo ou que em algum momento de suas vidas estiveram vinculados agraves induacutestrias de

confecccedilatildeo de moda bebecirc do municiacutepio de Terra Roxa- PR mas que trazem em sua

trajetoacuteria uma relaccedilatildeo com o trabalho moradia e valores advindo do campo O objetivo

eacute problematizar suas avaliaccedilotildees frente agrave ldquoexpansatildeordquo industrial do municiacutepio e como essa

dialoga com seus interesses e necessidades

Ao analisarmos algumas entrevistas de trabalhadores vinculados a estas

induacutestrias foi comum encontrar assim como na narrativa citada na epiacutegrafe deste

capiacutetulo narrativas nesta perspectiva na qual os empregos gerados pela industrializaccedilatildeo

satildeo interpretados como possibilidade de melhoria na condiccedilatildeo de vida dos

trabalhadores Percebemos assim que o municiacutepio estaacute constantemente sendo indicado

como um grande polo de empregos mas essa indicaccedilatildeo natildeo resume as ponderaccedilotildees que

fazem sobre a presenccedila industrial em Terra Roxa - porque tambeacutem apontam elementos

que contradizem essa presenccedila

Buscaremos entatildeo dialogar com as fontes orais produzidas com trabalhadores

que se relacionaram com induacutestria de confecccedilatildeo procurando discutir tambeacutem alguns

trabalhos acadecircmicos que analisam praacuteticas dos trabalhadores em Terra Roxa A fim de

compreender a trajetoacuteria destes sujeitos e os motivos que os levam a perceber a

expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de melhoria e

mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas

Para compreendermos melhor estas interpretaccedilotildees fez-se necessaacuterio analisar o

percurso de relaccedilotildees e experiecircncias que construiacuteram Para isso foi importante

12 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

16

dimensionar a cidade na deacutecada de 1970 Momento em que se intensificou a mudanccedila

destes trabalhadores do campo para a cidade (ou ainda para outras regiotildees) ou seja este

foi um periacuteodo de mudanccedilas marcantes nas relaccedilotildees de trabalho onde morar e como

viver natildeo soacute no municiacutepio mas possiacutevel de identificar em outras cidades brasileiras

No trabalho de Ana Ameacutelia Camarano e Ricardo Abramovay haacute o interesse em

apresentar os movimentos migratoacuterios que respondem pelo processo de esvaziamento

da populaccedilatildeo rural no Brasil Os autores observam que ateacute 1980 houve um crescimento

absoluto do saldo populacional que deixou as aacutereas rurais brasileiras Aproximadamente

40 da populaccedilatildeo que vivia nas aacutereas rurais no comeccedilo dos anos 70 migraram nessa

deacutecada O fluxo que deixou o campo nos anos 80 tambeacutem foi expressivo 13 de todos

os que viviam no meio rural em 1980 saiacuteram durante esse periacuteodo o que representou

aproximadamente 13 milhotildees de pessoas13

Em termos nacionais a intensidade do movimento de desruralizaccedilatildeo segundo

os autores parece natildeo ter diminuiacutedo muito nos uacuteltimos 50 anos Entre 1950 e 1980 as

aacutereas rurais das regiotildees Sudeste e Sul forneceram um volume expressivo de novos

moradores para as aacutereas urbanas14 Para os autores como realizavam a pesquisa em fins

da deacutecada de 1990 suas impressotildees indicavam uma continuidade desse processo

Desde 1950 a cada 10 anos um em cada trecircs brasileiros vivendo no meio rural opta pela emigraccedilatildeo Os anos 90 natildeo arrefeceram em muito esta tendecircncia se as taxas de evasatildeo do meio rural observadas entre 1990 e 1995 persistirem pelo restante da deacutecada quase 30 dos brasileiros que entatildeo viviam no campo em 1990 teratildeo mudado seu local de residecircncia na virada do milecircnio15

Ainda que os autores analisem no campo da geografia demograacutefica apoiando-se

na noccedilatildeo de ecircxodo rural estes trazem ldquoo modo de vida no campordquo como incocircmodo para

a realizaccedilatildeo da pesquisa traduzido nas movimentaccedilotildees desses brasileiros entre o campo

e a cidade alteraccedilotildees natildeo soacute espaciais mas no modo como vivem e enfrentam

determinadas relaccedilotildees de poder

Estes se movimentam de acordo com as expectativas e interesses que produzem

como necessidades reorganizando as relaccedilotildees de trabalho e modos de vida diante de

pressotildees de reestruturaccedilatildeo da produccedilatildeo e da ocupaccedilatildeo das aacutereas rurais brasileiras da

13 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 14 IBIDEM 15 IBIDEM p 6

17

segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual

natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na

promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo

De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970

aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do

municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as

principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos

Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio

exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX

Graacutefico 1

Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)

Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e

principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a

distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando

Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de

1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea

urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave

expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de

vestuaacuterio moda bebecirc

16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013

18

Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no

municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo

urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e

insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo

na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e

incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola

em moldes capitalistas na cidade 17

A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas

unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha

o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade

em muitos casos diretamente com o consumidor

Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que

discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em

Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo

provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que

Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18

No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da

populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente

ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da

maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio

alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo

aponta um processo tranquilo

17

GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18

FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9

19

As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos

oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute

mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise

- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o

cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que

A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19

A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o

trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe

quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar

com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de

banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe

pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo

Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um

grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir

ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados

da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia

por um nuacutemero reduzido de vagas

Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo

saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por

um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria

condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses

19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33

20

trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de

induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade

Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu

entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria

seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas

vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece

Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20

A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves

induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos

perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas

de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para

Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida

Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como

citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este

processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de

Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande

decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio

Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do

IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que

formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho

atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores

mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que

permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram

como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras

atividades tambeacutem inconstantes

A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em

2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que

residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo

por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos

20

JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

21

sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)

estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos

produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no

transporte e venda de mercadorias21

O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os

trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira

produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no

contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria

e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas

Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua

forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de

escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma

grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de

mercadorias criminalizado como contrabando

O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online

Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o

narcotraacuteficordquo aponta que

Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122

A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida

com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que

almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores

apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os

21

CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013

22

oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando

permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute

associada a comprar roupas e tecircnis de marca

O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a

intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda

de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre

alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para

frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc

No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses

trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego

Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso

Frederico afirma que

Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23

A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da

agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em

segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees

No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este

processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas

nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica

quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo

Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24

23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

23

Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo

para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O

trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do

patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo

lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos

trabalhadores pela induacutestria ele me diz que

Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25

Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural

da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas

relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar

com essa nova dinacircmica

Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo

visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas

vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se

aproxima da percepccedilatildeo de Carlos

Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26

Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para

ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes

se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio

trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as

ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que

pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha

25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11

24

trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem

trabalho

Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe

complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho

pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida

que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram

Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no

campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e

trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte

das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave

trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a

perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura

Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27

Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de

alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute

registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses

trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas

A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade

de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As

oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um

maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa

condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos

desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor

a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado

O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos

Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo

Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa

27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10

25

Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28

Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas

anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do

empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da

cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram

nesse processo

O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho

financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para

empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a

demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de

trabalhadores agrave disposiccedilatildeo

Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no

municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do

empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor

produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que

A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29

Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos

gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por

ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e

possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio

A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees

municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno

28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM

26

desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos

proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e

do APL do vestuaacuterio na cidade 31

No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi

substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e

mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e

vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa

aacutereardquo

Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do

Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos

profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes

tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o

interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo

de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores

tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo

foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal

finalidade

De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho

rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da

folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo

A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como

Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes

Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o

municiacutepio de Terra Roxa

30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

27

Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34

O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de

trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda

continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila

tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de

garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno

dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o

campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre

os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal

As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma

alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida

ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores

possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -

com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou

outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por

perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista

dentre outros natildeo os oferece

Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes

trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de

classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de

melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no

ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a

trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em

outra cidade ela me disse que

Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35

34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

28

Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave

mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem

organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de

novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar

com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as

expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita

vantagem assimrdquo

Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para

Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se

demo na faacutebricardquo36

Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram

trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar

mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia

com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando

pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que

Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37

Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter

voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no

campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em

Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que

natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar

36 IDEM 37 IDEM

29

As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila

pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com

a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma

mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila

natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na

narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do

casal

Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas

construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril

Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho

na faacutebrica ela me disse que

Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38

Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que

gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as

dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores

preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica

ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na

avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em

conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho

O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como

Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos

indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em

casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria

Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista

Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim

38 IDEM

30

de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por

menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes

oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc

como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado

na Escola do Trabalho

Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o

tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram

mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias

permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas

relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais

Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns

trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de

compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas

tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa

39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

31

CAPIacuteTULO 2

TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40

Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa

natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O

municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande

polo de empregos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de

investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade

de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um

grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41

Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo

como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem

indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e

aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de

desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente

O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de

julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do

Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para

bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda

afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um

terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio

A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral

retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o

40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013

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processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no

ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir

Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa

fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda

bebecirc pra terra roxa

Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43

A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande

destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da

cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra

Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o

municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo

queacuterdquo

No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves

transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que

este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo

sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em

resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores

Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa

industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo

enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa

Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20

principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a

43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

33

janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos

registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores

vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e

desligamento nesses setores

Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa

Meses Jan de 2003 a Jan de 2011

CBO ndash Frequumlecircncia

Admissotildees Desligamentos

Saldo

1ordm Emp

Reemp

Reint

C Prz Det

Transf

Total

Disp sem J Causa

Disp com J Causa

A Pedido

Term Contr

Aposent

Morte

Term C Prz Deter

Transf

Total

Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da

confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390

Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443

Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie

271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109

Costureira de peccedilas sob encomenda

171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em

geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio

varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina

60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio

em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina

bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas

34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27

Trabalhador agropecuaacuterio em geral

19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador

de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5

Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39

Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie

6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras

10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente

administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio

32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa

24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27

Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013

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Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

35

Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

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mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

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curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

41

que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

45

Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

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Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

5

Aos meus pais Agnaldo e Marley

Que abdicam de seus sonhos para realizar os meus

6

AGRADECIMENTOS

Com especial carinho aos meus Pais Agnaldo e Marley trabalhadores que

apesar da difiacutecil situaccedilatildeo fizeram o possiacutevel e o impossiacutevel para que eu pudesse chegar

ateacute este momento Eacute imensuraacutevel a gratidatildeo e orgulho que nutro por vocecircs pois sei de

toda luta e determinaccedilatildeo para verem a filha formada Obrigada por todo o incentivo

ldquopuxotildees de orelhardquo apoio dedicaccedilatildeo e amor

Agradeccedilo aos amigos velhos e novos que iratildeo fazer parte das minhas melhores

lembranccedilas do ldquotempo de faculdaderdquo Em especial Simone Tineneu Dan Tonho Popi

Vassoura Elaine Julius Keka Emer Nayara Luana Paulo e Tati Alegraram as

minhas noites com momentos de descontraccedilatildeo no bar e rodas de violatildeo Por muitas

vezes foram estes momentos que recarregaram as baterias e deram forccedilas para

continuar

Aacute Vania Marilia e Marcos (Xequereu) companheiros do movimento estudantil

que me ensinaram muito durante toda essa caminhada foram nossas discussotildees que

potencializaram minhas inquietaccedilotildees e a vontade de lutar

Aacute Cintia amiga e companheira durante toda a graduaccedilatildeo por todas as risadas

todo apoio as conversas sobre tantas coisas as comilanccedilas as reclamaccedilotildees e claro por

todos os momentos de procrastinaccedilatildeo

Aacute minhas queridas amigas de infacircncia Aline Luciana Suzani Simone e Fran

que mesmo longe sempre estiveram presentes compartilhando anguacutestias e vitoacuterias

Aacute minha tia Elza que contribuiu de inuacutemeras formas para minha moradia em

Marechal Cacircndido Rondon

Aacute minha orientadora Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas por todo aprendizado

dedicaccedilatildeo e compreensatildeo

Aos trabalhadores que gentilmente me receberam em suas casas compartilhando

suas experiecircncias para a realizaccedilatildeo desse trabalho

Ao meu companheiro Marcos antes de qualquer coisa melhor amigo por toda

cobranccedila ajuda paciecircncia e amor

7

RESUMO

Este Trabalho de Conclusatildeo de Curso tem a intenccedilatildeo de problematizar analisar e investigar as relaccedilotildees de trabalho que marcam a trajetoacuteria de trabalhadores que compuseram praacuteticas no processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa-PR discutindo o modo como se relacionaram nem sempre amistosamente com as accedilotildees do poder puacuteblico municipal e com a participaccedilatildeo empresarial do ramo ldquomoda bebecircrdquo na cidade A pesquisa abordaraacute as trecircs uacuteltimas deacutecadas pelo fato de esse ser um momento histoacuterico importante pela intensificaccedilatildeo da exploraccedilatildeo industrial em Terra Roxa Essa temporalidade eacute significativa no processo de mudanccedila e produccedilatildeo de relaccedilotildees de trabalho na cidade envolvendo o setor de vestuaacuterio e a produccedilatildeo de alternativas por trabalhadores muitas vezes advindo do meio rural Propomos investigar as condiccedilotildees de vida dos trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam este mercado de trabalho bem como relacionar as memoacuterias e accedilotildees produzidas tanto para o trabalho como para a vida em Terra Roxa Para isso destacamos o trabalho com as fontes orais jornais fichas de cursos profissionalizantes e iacutendices estatiacutesticos como documentaccedilatildeo a ser privilegiada nessa pesquisa O interesse foi manter o diaacutelogo com as evidecircncias e quando necessaacuterio ampliar a anaacutelise de fontes ou mesmo revendo os caminhos da investigaccedilatildeo Esse encaminhamento considera que o conhecimento histoacuterico exige essa construccedilatildeo ao longo da pesquisa como tambeacutem o compromisso com as questotildees em foco

Palavras-chave Trabalhadores Relaccedilotildees de Trabalho Induacutestrias

8

Sumaacuterio INTRODUCcedilAtildeO 9

CAPIacuteTULO 1TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc 15

CAPIacuteTULO 2TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES 31

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 51

FONTES 53

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS 55

9

INTRODUCcedilAtildeO

A escolha dos sujeitos e do tema deste estudo (os trabalhadores atualmente

vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa- PR) eacute resultado de minha

trajetoacuteria de vida trabalho e acadecircmica

Primeiro de vida e trabalho porque o trabalho na induacutestria de moda bebecirc jaacute fez

parte de minha atividade profissional por algum tempo Deste modo pude conviver com

outros trabalhadores observar e ouvir suas avaliaccedilotildees sobre suas condiccedilotildees de vida

motivaccedilotildees interesses e conflitos que perpassam esse ambiente de trabalho o que me

instigou a pesquisar o tema De forma que muitas das interpretaccedilotildees e avaliaccedilotildees que os

trabalhadores indicam em suas narrativas atraveacutes das entrevistas feitas jaacute ouvi dos

meus familiares como da minha proacutepria matildee Pois grande parte deles reside em Terra

Roxa e trabalha na induacutestria de moda bebecirc

Segundo como acadecircmica e pesquisadora porque este trabalho de conclusatildeo de

curso eacute continuidade de uma iniciaccedilatildeo cientifica voluntaacuteria (PIC-V) e as questotildees que

estatildeo aqui sendo levantadas eacute uma continuidade das indagaccedilotildees que surgiram a partir de

um diaacutelogo inicial com as fontes feitas nesta pesquisa anterior1

O objetivo central da pesquisa foi investigar as condiccedilotildees de vida de

trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de vestuaacuterio moda bebecirc no municiacutepio de

Terra Roxa-PR problematizando suas relaccedilotildees de trabalho e como se inserem e

interpretam este mercado de trabalho dando visibilidade a estes sujeitos e suas accedilotildees na

cidade

O municiacutepio possui atualmente entre macro e micro cerca de 113 empresas que

produzem em torno de 9 milhotildees de peccedilas envolvendo aproximadamente 2500

trabalhadores empregados diretamente o que segundo a noccedilatildeo do poder publico

municipal ldquodinamiza a geraccedilatildeo de emprego e renda do municiacutepiordquo2 Como podemos

1 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 2 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013

10

perceber em uma reportagem do jornal online Gazeta do Povo intitulada ldquoEm Terra

Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojasrdquo

A cadeia da confecccedilatildeo infantil mudou os rumos da cidade de 17 mil habitantes e a vida de muitos paranaenses Maria do Carmo 42 anos eacute um exemplo Ateacute os 38 anos ela trabalhava nos Campos Gerais onde plantava eucalipto Hoje o cenaacuterio eacute o mesmo um siacutetio mas agora ela natildeo lida diretamente com a terra Maria atua no setor de corte de roupas e tambeacutem dirige o ocircnibus que transporta funcionaacuterios da empresa Baby Doces Momentos confecccedilatildeo localizada em um siacutetio de cinco alqueires que produz cerca de 20 mil peccedilas ao mecircs ldquoAgora me sinto melhor Antes trabalhava no sol com uma bomba de 20 litros nas costas para pulverizar e plantarrdquo conta3

A partir do trecho acima percebemos que ao avaliar a dinacircmica industrial no

municiacutepio a reportagem aponta a relaccedilatildeo com a produccedilatildeo e experiecircncia dos trabalhos

no meio rural evidentemente para positivar a expansatildeo desse ramo de induacutestria de

vestuaacuterio como salvaccedilatildeo da cidade jaacute que estas empresas ldquodinamiza a geraccedilatildeo de

emprego e renda do municiacutepiordquo

Eacute importante entender a dimensatildeo dessa estrutura empresarial industrial em

Terra Roxa pois esta historicidade vai abrir caminhos a serem problematizados ao

longo deste trabalho

Para desenvolver esta pesquisa pautamo-nos na dinacircmica que integra a reflexatildeo

da problemaacutetica e o processo de levantamento e anaacutelise de fontes Esse

encaminhamento inspira-se na indicaccedilatildeo de Thompson sobre o diaacutelogo necessaacuterio e

constante entre teoria e evidecircncias histoacutericas4

Segundo Thompson

O interrogador eacute a loacutegica histoacuterica o conteuacutedo da interrogaccedilatildeo eacute uma hipoacutetese o interrogado eacute a evidecircncia com suas propriedades determinadas O objeto do conhecimento histoacuterico eacute a histoacuteria lsquorealrsquo cujas evidecircncias devem ser necessariamente incompletas e imperfeitas5

3 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no-paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 4 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma criacutetica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar Editores 1981 5 IBIDEM p 49

11

Isso quer dizer que os historiadores podem selecionar essa ou aquela evidecircncia

propor novas perguntas mas isso natildeo significa que os proacuteprios acontecimentos passados

se modifiquem nem tampouco que seja um agregado de histoacuterias separadas Embora

essa interpretaccedilatildeo do processo histoacuterico surja em resposta agrave pergunta formulada nossa

produccedilatildeo natildeo inventa o processo e natildeo pode modificar o ldquostatus ontoloacutegicordquo do

passado

Eacute nesta perspectiva de anaacutelise que conduziremos este pesquisa Cabe contudo

salientar a contribuiccedilatildeo que esta nos proporciona para a compreensatildeo que proponho

sobre as relaccedilotildees de trabalho experiecircncias e interpretaccedilotildees dos trabalhadores nas

induacutestrias de confecccedilatildeo de moda bebecirc em Terra Roxa Para tanto pensaremos a histoacuteria

em um duplo sentido como experiecircncia humana e como a proacutepria narraccedilatildeo dessas

experiecircncias as interpretaccedilotildees e projeccedilotildees das quais o investigador vai utilizar6

A investigaccedilatildeo neste sentido estaacute relacionada com as problemaacuteticas que o

pesquisador se coloca no presente que envolvem sua experiecircncia de vida e as

concepccedilotildees da qual parte

Pretendo entender a partir das experiecircncias narradas por esses trabalhadores

como eles se inserem e interpretam este mercado de trabalho e fazem prospecccedilotildees

Segundo Thompson

Se determos a histoacuteria num determinado ponto natildeo haacute classe mas simplesmente uma multidatildeo de indiviacuteduos com amontoado de experiecircncias Mas se examinarmos esses homens durante um periacuteodo adequado de mudanccedilas sociais observaremos padrotildees em suas relaccedilotildees sua ideias e instituiccedilotildees A classe eacute definida pelos homens enquanto vivem sua proacutepria histoacuteria e ao final esta eacute sua definiccedilatildeo7

Neste sentido para entendermos os trabalhadores eacute necessaacuteria uma serie de

observaccedilotildees e anaacutelises que se expressam em suas praacuteticas cotidianas como eles

vivenciam e se portam perante sua dinacircmica de trabalho o que possibilita sua formaccedilatildeo

cultural e social

Para esse processo interpretativo utilizamos cinco entrevistas que realizei com

trabalhadores no intuito de potencializar as elaboraccedilotildees construiacutedas por esses sujeitos

sobre as motivaccedilotildees interesses e conflitos ou seja memoacuterias produzidas sobre

6 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987 7 THOMPSON E P ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12

12

trajetoacuterias e experiecircncia social compartilhada nas relaccedilotildees dentro e fora das induacutestrias

de vestuaacuterio na cidade

Como um dos meacutetodos de pesquisa foi trabalhar com fontes orais considero

importante apontar algumas dificuldades que encontrei ao realizar algumas entrevistas

Mesmo o municiacutepio empregando mais de 2500 trabalhadores na induacutestria de confecccedilatildeo

minha principal dificuldade foi encontrar trabalhadores que se dispusessem a realizar as

entrevistas

Aqueles que aceitavam soacute concordavam em produzir a entrevista quando

algueacutem muito proacuteximo deles me apresentava O fato de alguns trabalhadores aceitarem

natildeo excluiu a desconfianccedila e inseguranccedila que estes possuiacuteam em relaccedilatildeo agraves entrevistas

Desta forma a inseguranccedila dos trabalhadores sobre se poderiam falar ou natildeo a

respeito de suas relaccedilotildees de trabalho juntamente com a minha falta de experiecircncia em

saber lidar com essas inseguranccedilas prejudicaram o desenvolvimento das entrevistas

As respostas ficaram limitadas ao roteiro muitas vezes limitadas ao ldquosimrdquo ou ao ldquonatildeordquo

Pois aleacutem da timidez ao saberem que estatildeo sendo gravados ainda tive que lidar com o

receio dos entrevistados ao exporem sua trajetoacuteria e condiccedilotildees de vida

As entrevistas orais natildeo foram produto de teacutecnica mas das relaccedilotildees que

consegui desenvolver com esses trabalhadores Portanto o meacutetodo de utilizar fontes

orais consiste em trabalhar com a subjetividade dos indiviacuteduos lidando com as questotildees

postas pelos entrevistados a partir de minhas proacuteprias questotildees

Neste sentido o diaacutelogo com Alessandro Portelli e com outros autores ajudou a

compreender que essa relaccedilatildeo entre entrevistado e entrevistador natildeo eacute um objetivo

muito faacutecil de ser alcanccedilado pois as pessoas reinterpretam e datildeo novos significados aos

acontecimentos passados em funccedilatildeo do que vive no presente ou espera viver Ou ainda

encobrem sentimentos e interpretaccedilotildees por censura repressatildeo temores ou pela pouca

disposiccedilatildeo em falar8

Ao utilizar a fonte oral foi importante dialogar com a produccedilatildeo de Alessandro

Portelli o qual contribuiu para a construccedilatildeo de um procedimento de anaacutelise para a

produccedilatildeo das fontes orais e do olhar lanccedilado sobre esse material O uso de tal fonte na

pesquisa permitiu o enfrentamento da dinacircmica contraditoacuteria de valores e praacuteticas que

compotildeem escolhas pressotildees e expectativas desses sujeitos sociais

8 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 p33

13

Nesse sentido permite maior visibilidade poliacutetica da classe trabalhadora com

suas divisotildees e processos de identificaccedilatildeo na condiccedilatildeo de classe compartilhada

produzindo assim uma interpretaccedilatildeo histoacuterica comprometida com o potencial de luta e

intervenccedilatildeo social desses trabalhadores Essa investigaccedilatildeo tambeacutem traz como

enfrentamento lidar com os limites dessa fonte como as dificuldades de conseguir a

aceitaccedilatildeo da gravaccedilatildeo da entrevista e contatar trabalhadores9

O intuito de usarmos a fonte oral nesta pesquisa inspira-se nesta perspectiva de

Portelli Buscamos o trabalho com as entrevista natildeo como confirmaccedilatildeo de uma ldquoteserdquo

inicial mas sim com a intenccedilatildeo de dar visibilidade agraves interpretaccedilotildees construiacutedas pelos

trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa

Para tal associamos essa documentaccedilatildeo com mateacuterias jornaliacutesticas e fichas de

inscriccedilatildeo em cursos (de corte costura e bordado) na Escola do trabalho na cidade Aleacutem

da interpretaccedilatildeo de iacutendices estatiacutesticos sobre empregabilidade atividades econocircmicas

etc

O presente trabalho estaacute estruturado em dois capiacutetulos No primeiro capiacutetulo

busquei analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agrave

induacutestria de moda bebecirc a fim de compreender os motivos que levam esses sujeitos a

perceber a expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de

melhoria e mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas e na permanecircncia em Terra Roxa

No segundo capiacutetulo busco discutir a partir das experiecircncias cotidianas e das

relaccedilotildees de trabalho desses sujeitos as possibilidades e limites das expectativas que

estes trabalhadores estabelecem em relaccedilatildeo ao trabalho na induacutestria de moda bebecirc tal

qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre o

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa10

Essa intenccedilatildeo tenta se distanciar de determinados campos analiacuteticos que

sustentam essa expansatildeo industrial como sinocircnimo de desenvolvimento arraigados

na promoccedilatildeo de certos projetos empresariais e na historicidade progressista de alguns

processos de expansatildeo urbana Ao fazer esse distanciamento o interesse eacute ampliar o

9 PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 10 As induacutestrias de Terra Roxa estatildeo inseridas no Arranjo Produtivo Local (APL) criado em 2004 para oferecer subsiacutedios e aperfeiccediloamento aos empresaacuterios O APL da moda bebecirc visa entre outros aspectos maior eficiecircncia de inserccedilatildeo dos produtos da induacutestria de vestuaacuterio no mercado maior poder de negociaccedilatildeo de preccedilo da mateacuteria-prima atraccedilatildeo de novos prestadores de serviccedilos ao municiacutepio e otimizaccedilatildeo de custos com a qualificaccedilatildeo da matildeo de obra Esse assessoramento procura oferecer ao empresariado condiccedilotildees de mercado e apoio para fixaccedilatildeo em determinadas regiotildees

14

campo de anaacutelise apresentando contradiccedilotildees e tensotildees nesse percurso dirigindo atenccedilatildeo

aos trabalhadores mais do que agrave faacutebrica e ao sistema produtivo por ele mesmo11

Ao realizar esta pesquisa minha preocupaccedilatildeo se pauta em mostrar que estes

sujeitos satildeo seres conscientes de sua posiccedilatildeo enquanto sujeitos sociais e procuro

ressaltar que estes trabalhadores fazem parte deste processo histoacuterico enquanto

indiviacuteduos ativos mesmo que indiretamente intervenham nos rumos e ritmo dessa

expansatildeo industrial

Assim busquei com este trabalho explorar a partir das narrativas dos

trabalhadores e de suas experiecircncias entender natildeo somente estes sujeitos mas as

expectativas que estes constroem e as relaccedilotildees que estabelecem com o trabalho para a

promoccedilatildeo de seus interesses

11 O trabalho de Godoy procura fazer um percurso acadecircmico das nuances e alteraccedilotildees na abordagem do universo fabril Assim como Paoli Sader e Telles recolocam alguns enfrentamentos - na percepccedilatildeo de suas atuaccedilotildees e construccedilatildeo de sentidos - para aqueles que procuram perceber os trabalhadores neste cenaacuterio operaacuterio brasileiro Ver -GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 -PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198

15

CAPIacuteTULO 1

TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc

[] Com o tempo depois que essas empresas dede crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram mais faacuteceis neacute []12

Neste capiacutetulo vamos analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente

estatildeo ou que em algum momento de suas vidas estiveram vinculados agraves induacutestrias de

confecccedilatildeo de moda bebecirc do municiacutepio de Terra Roxa- PR mas que trazem em sua

trajetoacuteria uma relaccedilatildeo com o trabalho moradia e valores advindo do campo O objetivo

eacute problematizar suas avaliaccedilotildees frente agrave ldquoexpansatildeordquo industrial do municiacutepio e como essa

dialoga com seus interesses e necessidades

Ao analisarmos algumas entrevistas de trabalhadores vinculados a estas

induacutestrias foi comum encontrar assim como na narrativa citada na epiacutegrafe deste

capiacutetulo narrativas nesta perspectiva na qual os empregos gerados pela industrializaccedilatildeo

satildeo interpretados como possibilidade de melhoria na condiccedilatildeo de vida dos

trabalhadores Percebemos assim que o municiacutepio estaacute constantemente sendo indicado

como um grande polo de empregos mas essa indicaccedilatildeo natildeo resume as ponderaccedilotildees que

fazem sobre a presenccedila industrial em Terra Roxa - porque tambeacutem apontam elementos

que contradizem essa presenccedila

Buscaremos entatildeo dialogar com as fontes orais produzidas com trabalhadores

que se relacionaram com induacutestria de confecccedilatildeo procurando discutir tambeacutem alguns

trabalhos acadecircmicos que analisam praacuteticas dos trabalhadores em Terra Roxa A fim de

compreender a trajetoacuteria destes sujeitos e os motivos que os levam a perceber a

expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de melhoria e

mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas

Para compreendermos melhor estas interpretaccedilotildees fez-se necessaacuterio analisar o

percurso de relaccedilotildees e experiecircncias que construiacuteram Para isso foi importante

12 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

16

dimensionar a cidade na deacutecada de 1970 Momento em que se intensificou a mudanccedila

destes trabalhadores do campo para a cidade (ou ainda para outras regiotildees) ou seja este

foi um periacuteodo de mudanccedilas marcantes nas relaccedilotildees de trabalho onde morar e como

viver natildeo soacute no municiacutepio mas possiacutevel de identificar em outras cidades brasileiras

No trabalho de Ana Ameacutelia Camarano e Ricardo Abramovay haacute o interesse em

apresentar os movimentos migratoacuterios que respondem pelo processo de esvaziamento

da populaccedilatildeo rural no Brasil Os autores observam que ateacute 1980 houve um crescimento

absoluto do saldo populacional que deixou as aacutereas rurais brasileiras Aproximadamente

40 da populaccedilatildeo que vivia nas aacutereas rurais no comeccedilo dos anos 70 migraram nessa

deacutecada O fluxo que deixou o campo nos anos 80 tambeacutem foi expressivo 13 de todos

os que viviam no meio rural em 1980 saiacuteram durante esse periacuteodo o que representou

aproximadamente 13 milhotildees de pessoas13

Em termos nacionais a intensidade do movimento de desruralizaccedilatildeo segundo

os autores parece natildeo ter diminuiacutedo muito nos uacuteltimos 50 anos Entre 1950 e 1980 as

aacutereas rurais das regiotildees Sudeste e Sul forneceram um volume expressivo de novos

moradores para as aacutereas urbanas14 Para os autores como realizavam a pesquisa em fins

da deacutecada de 1990 suas impressotildees indicavam uma continuidade desse processo

Desde 1950 a cada 10 anos um em cada trecircs brasileiros vivendo no meio rural opta pela emigraccedilatildeo Os anos 90 natildeo arrefeceram em muito esta tendecircncia se as taxas de evasatildeo do meio rural observadas entre 1990 e 1995 persistirem pelo restante da deacutecada quase 30 dos brasileiros que entatildeo viviam no campo em 1990 teratildeo mudado seu local de residecircncia na virada do milecircnio15

Ainda que os autores analisem no campo da geografia demograacutefica apoiando-se

na noccedilatildeo de ecircxodo rural estes trazem ldquoo modo de vida no campordquo como incocircmodo para

a realizaccedilatildeo da pesquisa traduzido nas movimentaccedilotildees desses brasileiros entre o campo

e a cidade alteraccedilotildees natildeo soacute espaciais mas no modo como vivem e enfrentam

determinadas relaccedilotildees de poder

Estes se movimentam de acordo com as expectativas e interesses que produzem

como necessidades reorganizando as relaccedilotildees de trabalho e modos de vida diante de

pressotildees de reestruturaccedilatildeo da produccedilatildeo e da ocupaccedilatildeo das aacutereas rurais brasileiras da

13 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 14 IBIDEM 15 IBIDEM p 6

17

segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual

natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na

promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo

De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970

aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do

municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as

principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos

Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio

exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX

Graacutefico 1

Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)

Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e

principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a

distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando

Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de

1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea

urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave

expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de

vestuaacuterio moda bebecirc

16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013

18

Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no

municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo

urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e

insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo

na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e

incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola

em moldes capitalistas na cidade 17

A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas

unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha

o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade

em muitos casos diretamente com o consumidor

Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que

discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em

Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo

provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que

Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18

No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da

populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente

ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da

maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio

alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo

aponta um processo tranquilo

17

GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18

FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9

19

As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos

oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute

mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise

- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o

cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que

A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19

A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o

trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe

quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar

com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de

banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe

pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo

Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um

grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir

ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados

da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia

por um nuacutemero reduzido de vagas

Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo

saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por

um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria

condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses

19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33

20

trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de

induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade

Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu

entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria

seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas

vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece

Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20

A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves

induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos

perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas

de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para

Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida

Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como

citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este

processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de

Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande

decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio

Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do

IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que

formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho

atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores

mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que

permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram

como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras

atividades tambeacutem inconstantes

A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em

2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que

residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo

por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos

20

JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

21

sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)

estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos

produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no

transporte e venda de mercadorias21

O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os

trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira

produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no

contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria

e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas

Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua

forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de

escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma

grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de

mercadorias criminalizado como contrabando

O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online

Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o

narcotraacuteficordquo aponta que

Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122

A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida

com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que

almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores

apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os

21

CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013

22

oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando

permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute

associada a comprar roupas e tecircnis de marca

O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a

intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda

de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre

alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para

frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc

No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses

trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego

Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso

Frederico afirma que

Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23

A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da

agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em

segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees

No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este

processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas

nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica

quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo

Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24

23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

23

Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo

para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O

trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do

patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo

lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos

trabalhadores pela induacutestria ele me diz que

Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25

Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural

da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas

relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar

com essa nova dinacircmica

Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo

visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas

vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se

aproxima da percepccedilatildeo de Carlos

Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26

Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para

ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes

se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio

trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as

ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que

pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha

25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11

24

trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem

trabalho

Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe

complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho

pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida

que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram

Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no

campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e

trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte

das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave

trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a

perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura

Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27

Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de

alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute

registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses

trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas

A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade

de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As

oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um

maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa

condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos

desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor

a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado

O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos

Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo

Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa

27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10

25

Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28

Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas

anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do

empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da

cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram

nesse processo

O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho

financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para

empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a

demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de

trabalhadores agrave disposiccedilatildeo

Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no

municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do

empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor

produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que

A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29

Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos

gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por

ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e

possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio

A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees

municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno

28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM

26

desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos

proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e

do APL do vestuaacuterio na cidade 31

No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi

substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e

mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e

vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa

aacutereardquo

Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do

Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos

profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes

tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o

interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo

de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores

tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo

foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal

finalidade

De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho

rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da

folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo

A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como

Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes

Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o

municiacutepio de Terra Roxa

30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

27

Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34

O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de

trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda

continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila

tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de

garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno

dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o

campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre

os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal

As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma

alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida

ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores

possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -

com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou

outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por

perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista

dentre outros natildeo os oferece

Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes

trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de

classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de

melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no

ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a

trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em

outra cidade ela me disse que

Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35

34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

28

Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave

mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem

organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de

novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar

com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as

expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita

vantagem assimrdquo

Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para

Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se

demo na faacutebricardquo36

Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram

trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar

mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia

com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando

pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que

Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37

Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter

voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no

campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em

Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que

natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar

36 IDEM 37 IDEM

29

As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila

pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com

a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma

mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila

natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na

narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do

casal

Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas

construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril

Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho

na faacutebrica ela me disse que

Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38

Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que

gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as

dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores

preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica

ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na

avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em

conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho

O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como

Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos

indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em

casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria

Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista

Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim

38 IDEM

30

de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por

menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes

oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc

como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado

na Escola do Trabalho

Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o

tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram

mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias

permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas

relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais

Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns

trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de

compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas

tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa

39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

31

CAPIacuteTULO 2

TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40

Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa

natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O

municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande

polo de empregos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de

investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade

de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um

grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41

Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo

como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem

indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e

aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de

desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente

O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de

julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do

Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para

bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda

afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um

terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio

A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral

retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o

40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013

32

processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no

ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir

Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa

fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda

bebecirc pra terra roxa

Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43

A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande

destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da

cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra

Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o

municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo

queacuterdquo

No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves

transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que

este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo

sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em

resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores

Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa

industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo

enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa

Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20

principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a

43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

33

janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos

registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores

vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e

desligamento nesses setores

Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa

Meses Jan de 2003 a Jan de 2011

CBO ndash Frequumlecircncia

Admissotildees Desligamentos

Saldo

1ordm Emp

Reemp

Reint

C Prz Det

Transf

Total

Disp sem J Causa

Disp com J Causa

A Pedido

Term Contr

Aposent

Morte

Term C Prz Deter

Transf

Total

Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da

confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390

Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443

Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie

271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109

Costureira de peccedilas sob encomenda

171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em

geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio

varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina

60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio

em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina

bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas

34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27

Trabalhador agropecuaacuterio em geral

19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador

de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5

Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39

Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie

6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras

10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente

administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio

32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa

24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27

Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013

34

Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

35

Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

36

mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

37

curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

38

Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

41

que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

6

AGRADECIMENTOS

Com especial carinho aos meus Pais Agnaldo e Marley trabalhadores que

apesar da difiacutecil situaccedilatildeo fizeram o possiacutevel e o impossiacutevel para que eu pudesse chegar

ateacute este momento Eacute imensuraacutevel a gratidatildeo e orgulho que nutro por vocecircs pois sei de

toda luta e determinaccedilatildeo para verem a filha formada Obrigada por todo o incentivo

ldquopuxotildees de orelhardquo apoio dedicaccedilatildeo e amor

Agradeccedilo aos amigos velhos e novos que iratildeo fazer parte das minhas melhores

lembranccedilas do ldquotempo de faculdaderdquo Em especial Simone Tineneu Dan Tonho Popi

Vassoura Elaine Julius Keka Emer Nayara Luana Paulo e Tati Alegraram as

minhas noites com momentos de descontraccedilatildeo no bar e rodas de violatildeo Por muitas

vezes foram estes momentos que recarregaram as baterias e deram forccedilas para

continuar

Aacute Vania Marilia e Marcos (Xequereu) companheiros do movimento estudantil

que me ensinaram muito durante toda essa caminhada foram nossas discussotildees que

potencializaram minhas inquietaccedilotildees e a vontade de lutar

Aacute Cintia amiga e companheira durante toda a graduaccedilatildeo por todas as risadas

todo apoio as conversas sobre tantas coisas as comilanccedilas as reclamaccedilotildees e claro por

todos os momentos de procrastinaccedilatildeo

Aacute minhas queridas amigas de infacircncia Aline Luciana Suzani Simone e Fran

que mesmo longe sempre estiveram presentes compartilhando anguacutestias e vitoacuterias

Aacute minha tia Elza que contribuiu de inuacutemeras formas para minha moradia em

Marechal Cacircndido Rondon

Aacute minha orientadora Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas por todo aprendizado

dedicaccedilatildeo e compreensatildeo

Aos trabalhadores que gentilmente me receberam em suas casas compartilhando

suas experiecircncias para a realizaccedilatildeo desse trabalho

Ao meu companheiro Marcos antes de qualquer coisa melhor amigo por toda

cobranccedila ajuda paciecircncia e amor

7

RESUMO

Este Trabalho de Conclusatildeo de Curso tem a intenccedilatildeo de problematizar analisar e investigar as relaccedilotildees de trabalho que marcam a trajetoacuteria de trabalhadores que compuseram praacuteticas no processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa-PR discutindo o modo como se relacionaram nem sempre amistosamente com as accedilotildees do poder puacuteblico municipal e com a participaccedilatildeo empresarial do ramo ldquomoda bebecircrdquo na cidade A pesquisa abordaraacute as trecircs uacuteltimas deacutecadas pelo fato de esse ser um momento histoacuterico importante pela intensificaccedilatildeo da exploraccedilatildeo industrial em Terra Roxa Essa temporalidade eacute significativa no processo de mudanccedila e produccedilatildeo de relaccedilotildees de trabalho na cidade envolvendo o setor de vestuaacuterio e a produccedilatildeo de alternativas por trabalhadores muitas vezes advindo do meio rural Propomos investigar as condiccedilotildees de vida dos trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam este mercado de trabalho bem como relacionar as memoacuterias e accedilotildees produzidas tanto para o trabalho como para a vida em Terra Roxa Para isso destacamos o trabalho com as fontes orais jornais fichas de cursos profissionalizantes e iacutendices estatiacutesticos como documentaccedilatildeo a ser privilegiada nessa pesquisa O interesse foi manter o diaacutelogo com as evidecircncias e quando necessaacuterio ampliar a anaacutelise de fontes ou mesmo revendo os caminhos da investigaccedilatildeo Esse encaminhamento considera que o conhecimento histoacuterico exige essa construccedilatildeo ao longo da pesquisa como tambeacutem o compromisso com as questotildees em foco

Palavras-chave Trabalhadores Relaccedilotildees de Trabalho Induacutestrias

8

Sumaacuterio INTRODUCcedilAtildeO 9

CAPIacuteTULO 1TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc 15

CAPIacuteTULO 2TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES 31

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 51

FONTES 53

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS 55

9

INTRODUCcedilAtildeO

A escolha dos sujeitos e do tema deste estudo (os trabalhadores atualmente

vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa- PR) eacute resultado de minha

trajetoacuteria de vida trabalho e acadecircmica

Primeiro de vida e trabalho porque o trabalho na induacutestria de moda bebecirc jaacute fez

parte de minha atividade profissional por algum tempo Deste modo pude conviver com

outros trabalhadores observar e ouvir suas avaliaccedilotildees sobre suas condiccedilotildees de vida

motivaccedilotildees interesses e conflitos que perpassam esse ambiente de trabalho o que me

instigou a pesquisar o tema De forma que muitas das interpretaccedilotildees e avaliaccedilotildees que os

trabalhadores indicam em suas narrativas atraveacutes das entrevistas feitas jaacute ouvi dos

meus familiares como da minha proacutepria matildee Pois grande parte deles reside em Terra

Roxa e trabalha na induacutestria de moda bebecirc

Segundo como acadecircmica e pesquisadora porque este trabalho de conclusatildeo de

curso eacute continuidade de uma iniciaccedilatildeo cientifica voluntaacuteria (PIC-V) e as questotildees que

estatildeo aqui sendo levantadas eacute uma continuidade das indagaccedilotildees que surgiram a partir de

um diaacutelogo inicial com as fontes feitas nesta pesquisa anterior1

O objetivo central da pesquisa foi investigar as condiccedilotildees de vida de

trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de vestuaacuterio moda bebecirc no municiacutepio de

Terra Roxa-PR problematizando suas relaccedilotildees de trabalho e como se inserem e

interpretam este mercado de trabalho dando visibilidade a estes sujeitos e suas accedilotildees na

cidade

O municiacutepio possui atualmente entre macro e micro cerca de 113 empresas que

produzem em torno de 9 milhotildees de peccedilas envolvendo aproximadamente 2500

trabalhadores empregados diretamente o que segundo a noccedilatildeo do poder publico

municipal ldquodinamiza a geraccedilatildeo de emprego e renda do municiacutepiordquo2 Como podemos

1 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 2 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013

10

perceber em uma reportagem do jornal online Gazeta do Povo intitulada ldquoEm Terra

Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojasrdquo

A cadeia da confecccedilatildeo infantil mudou os rumos da cidade de 17 mil habitantes e a vida de muitos paranaenses Maria do Carmo 42 anos eacute um exemplo Ateacute os 38 anos ela trabalhava nos Campos Gerais onde plantava eucalipto Hoje o cenaacuterio eacute o mesmo um siacutetio mas agora ela natildeo lida diretamente com a terra Maria atua no setor de corte de roupas e tambeacutem dirige o ocircnibus que transporta funcionaacuterios da empresa Baby Doces Momentos confecccedilatildeo localizada em um siacutetio de cinco alqueires que produz cerca de 20 mil peccedilas ao mecircs ldquoAgora me sinto melhor Antes trabalhava no sol com uma bomba de 20 litros nas costas para pulverizar e plantarrdquo conta3

A partir do trecho acima percebemos que ao avaliar a dinacircmica industrial no

municiacutepio a reportagem aponta a relaccedilatildeo com a produccedilatildeo e experiecircncia dos trabalhos

no meio rural evidentemente para positivar a expansatildeo desse ramo de induacutestria de

vestuaacuterio como salvaccedilatildeo da cidade jaacute que estas empresas ldquodinamiza a geraccedilatildeo de

emprego e renda do municiacutepiordquo

Eacute importante entender a dimensatildeo dessa estrutura empresarial industrial em

Terra Roxa pois esta historicidade vai abrir caminhos a serem problematizados ao

longo deste trabalho

Para desenvolver esta pesquisa pautamo-nos na dinacircmica que integra a reflexatildeo

da problemaacutetica e o processo de levantamento e anaacutelise de fontes Esse

encaminhamento inspira-se na indicaccedilatildeo de Thompson sobre o diaacutelogo necessaacuterio e

constante entre teoria e evidecircncias histoacutericas4

Segundo Thompson

O interrogador eacute a loacutegica histoacuterica o conteuacutedo da interrogaccedilatildeo eacute uma hipoacutetese o interrogado eacute a evidecircncia com suas propriedades determinadas O objeto do conhecimento histoacuterico eacute a histoacuteria lsquorealrsquo cujas evidecircncias devem ser necessariamente incompletas e imperfeitas5

3 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no-paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 4 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma criacutetica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar Editores 1981 5 IBIDEM p 49

11

Isso quer dizer que os historiadores podem selecionar essa ou aquela evidecircncia

propor novas perguntas mas isso natildeo significa que os proacuteprios acontecimentos passados

se modifiquem nem tampouco que seja um agregado de histoacuterias separadas Embora

essa interpretaccedilatildeo do processo histoacuterico surja em resposta agrave pergunta formulada nossa

produccedilatildeo natildeo inventa o processo e natildeo pode modificar o ldquostatus ontoloacutegicordquo do

passado

Eacute nesta perspectiva de anaacutelise que conduziremos este pesquisa Cabe contudo

salientar a contribuiccedilatildeo que esta nos proporciona para a compreensatildeo que proponho

sobre as relaccedilotildees de trabalho experiecircncias e interpretaccedilotildees dos trabalhadores nas

induacutestrias de confecccedilatildeo de moda bebecirc em Terra Roxa Para tanto pensaremos a histoacuteria

em um duplo sentido como experiecircncia humana e como a proacutepria narraccedilatildeo dessas

experiecircncias as interpretaccedilotildees e projeccedilotildees das quais o investigador vai utilizar6

A investigaccedilatildeo neste sentido estaacute relacionada com as problemaacuteticas que o

pesquisador se coloca no presente que envolvem sua experiecircncia de vida e as

concepccedilotildees da qual parte

Pretendo entender a partir das experiecircncias narradas por esses trabalhadores

como eles se inserem e interpretam este mercado de trabalho e fazem prospecccedilotildees

Segundo Thompson

Se determos a histoacuteria num determinado ponto natildeo haacute classe mas simplesmente uma multidatildeo de indiviacuteduos com amontoado de experiecircncias Mas se examinarmos esses homens durante um periacuteodo adequado de mudanccedilas sociais observaremos padrotildees em suas relaccedilotildees sua ideias e instituiccedilotildees A classe eacute definida pelos homens enquanto vivem sua proacutepria histoacuteria e ao final esta eacute sua definiccedilatildeo7

Neste sentido para entendermos os trabalhadores eacute necessaacuteria uma serie de

observaccedilotildees e anaacutelises que se expressam em suas praacuteticas cotidianas como eles

vivenciam e se portam perante sua dinacircmica de trabalho o que possibilita sua formaccedilatildeo

cultural e social

Para esse processo interpretativo utilizamos cinco entrevistas que realizei com

trabalhadores no intuito de potencializar as elaboraccedilotildees construiacutedas por esses sujeitos

sobre as motivaccedilotildees interesses e conflitos ou seja memoacuterias produzidas sobre

6 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987 7 THOMPSON E P ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12

12

trajetoacuterias e experiecircncia social compartilhada nas relaccedilotildees dentro e fora das induacutestrias

de vestuaacuterio na cidade

Como um dos meacutetodos de pesquisa foi trabalhar com fontes orais considero

importante apontar algumas dificuldades que encontrei ao realizar algumas entrevistas

Mesmo o municiacutepio empregando mais de 2500 trabalhadores na induacutestria de confecccedilatildeo

minha principal dificuldade foi encontrar trabalhadores que se dispusessem a realizar as

entrevistas

Aqueles que aceitavam soacute concordavam em produzir a entrevista quando

algueacutem muito proacuteximo deles me apresentava O fato de alguns trabalhadores aceitarem

natildeo excluiu a desconfianccedila e inseguranccedila que estes possuiacuteam em relaccedilatildeo agraves entrevistas

Desta forma a inseguranccedila dos trabalhadores sobre se poderiam falar ou natildeo a

respeito de suas relaccedilotildees de trabalho juntamente com a minha falta de experiecircncia em

saber lidar com essas inseguranccedilas prejudicaram o desenvolvimento das entrevistas

As respostas ficaram limitadas ao roteiro muitas vezes limitadas ao ldquosimrdquo ou ao ldquonatildeordquo

Pois aleacutem da timidez ao saberem que estatildeo sendo gravados ainda tive que lidar com o

receio dos entrevistados ao exporem sua trajetoacuteria e condiccedilotildees de vida

As entrevistas orais natildeo foram produto de teacutecnica mas das relaccedilotildees que

consegui desenvolver com esses trabalhadores Portanto o meacutetodo de utilizar fontes

orais consiste em trabalhar com a subjetividade dos indiviacuteduos lidando com as questotildees

postas pelos entrevistados a partir de minhas proacuteprias questotildees

Neste sentido o diaacutelogo com Alessandro Portelli e com outros autores ajudou a

compreender que essa relaccedilatildeo entre entrevistado e entrevistador natildeo eacute um objetivo

muito faacutecil de ser alcanccedilado pois as pessoas reinterpretam e datildeo novos significados aos

acontecimentos passados em funccedilatildeo do que vive no presente ou espera viver Ou ainda

encobrem sentimentos e interpretaccedilotildees por censura repressatildeo temores ou pela pouca

disposiccedilatildeo em falar8

Ao utilizar a fonte oral foi importante dialogar com a produccedilatildeo de Alessandro

Portelli o qual contribuiu para a construccedilatildeo de um procedimento de anaacutelise para a

produccedilatildeo das fontes orais e do olhar lanccedilado sobre esse material O uso de tal fonte na

pesquisa permitiu o enfrentamento da dinacircmica contraditoacuteria de valores e praacuteticas que

compotildeem escolhas pressotildees e expectativas desses sujeitos sociais

8 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 p33

13

Nesse sentido permite maior visibilidade poliacutetica da classe trabalhadora com

suas divisotildees e processos de identificaccedilatildeo na condiccedilatildeo de classe compartilhada

produzindo assim uma interpretaccedilatildeo histoacuterica comprometida com o potencial de luta e

intervenccedilatildeo social desses trabalhadores Essa investigaccedilatildeo tambeacutem traz como

enfrentamento lidar com os limites dessa fonte como as dificuldades de conseguir a

aceitaccedilatildeo da gravaccedilatildeo da entrevista e contatar trabalhadores9

O intuito de usarmos a fonte oral nesta pesquisa inspira-se nesta perspectiva de

Portelli Buscamos o trabalho com as entrevista natildeo como confirmaccedilatildeo de uma ldquoteserdquo

inicial mas sim com a intenccedilatildeo de dar visibilidade agraves interpretaccedilotildees construiacutedas pelos

trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa

Para tal associamos essa documentaccedilatildeo com mateacuterias jornaliacutesticas e fichas de

inscriccedilatildeo em cursos (de corte costura e bordado) na Escola do trabalho na cidade Aleacutem

da interpretaccedilatildeo de iacutendices estatiacutesticos sobre empregabilidade atividades econocircmicas

etc

O presente trabalho estaacute estruturado em dois capiacutetulos No primeiro capiacutetulo

busquei analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agrave

induacutestria de moda bebecirc a fim de compreender os motivos que levam esses sujeitos a

perceber a expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de

melhoria e mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas e na permanecircncia em Terra Roxa

No segundo capiacutetulo busco discutir a partir das experiecircncias cotidianas e das

relaccedilotildees de trabalho desses sujeitos as possibilidades e limites das expectativas que

estes trabalhadores estabelecem em relaccedilatildeo ao trabalho na induacutestria de moda bebecirc tal

qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre o

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa10

Essa intenccedilatildeo tenta se distanciar de determinados campos analiacuteticos que

sustentam essa expansatildeo industrial como sinocircnimo de desenvolvimento arraigados

na promoccedilatildeo de certos projetos empresariais e na historicidade progressista de alguns

processos de expansatildeo urbana Ao fazer esse distanciamento o interesse eacute ampliar o

9 PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 10 As induacutestrias de Terra Roxa estatildeo inseridas no Arranjo Produtivo Local (APL) criado em 2004 para oferecer subsiacutedios e aperfeiccediloamento aos empresaacuterios O APL da moda bebecirc visa entre outros aspectos maior eficiecircncia de inserccedilatildeo dos produtos da induacutestria de vestuaacuterio no mercado maior poder de negociaccedilatildeo de preccedilo da mateacuteria-prima atraccedilatildeo de novos prestadores de serviccedilos ao municiacutepio e otimizaccedilatildeo de custos com a qualificaccedilatildeo da matildeo de obra Esse assessoramento procura oferecer ao empresariado condiccedilotildees de mercado e apoio para fixaccedilatildeo em determinadas regiotildees

14

campo de anaacutelise apresentando contradiccedilotildees e tensotildees nesse percurso dirigindo atenccedilatildeo

aos trabalhadores mais do que agrave faacutebrica e ao sistema produtivo por ele mesmo11

Ao realizar esta pesquisa minha preocupaccedilatildeo se pauta em mostrar que estes

sujeitos satildeo seres conscientes de sua posiccedilatildeo enquanto sujeitos sociais e procuro

ressaltar que estes trabalhadores fazem parte deste processo histoacuterico enquanto

indiviacuteduos ativos mesmo que indiretamente intervenham nos rumos e ritmo dessa

expansatildeo industrial

Assim busquei com este trabalho explorar a partir das narrativas dos

trabalhadores e de suas experiecircncias entender natildeo somente estes sujeitos mas as

expectativas que estes constroem e as relaccedilotildees que estabelecem com o trabalho para a

promoccedilatildeo de seus interesses

11 O trabalho de Godoy procura fazer um percurso acadecircmico das nuances e alteraccedilotildees na abordagem do universo fabril Assim como Paoli Sader e Telles recolocam alguns enfrentamentos - na percepccedilatildeo de suas atuaccedilotildees e construccedilatildeo de sentidos - para aqueles que procuram perceber os trabalhadores neste cenaacuterio operaacuterio brasileiro Ver -GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 -PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198

15

CAPIacuteTULO 1

TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc

[] Com o tempo depois que essas empresas dede crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram mais faacuteceis neacute []12

Neste capiacutetulo vamos analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente

estatildeo ou que em algum momento de suas vidas estiveram vinculados agraves induacutestrias de

confecccedilatildeo de moda bebecirc do municiacutepio de Terra Roxa- PR mas que trazem em sua

trajetoacuteria uma relaccedilatildeo com o trabalho moradia e valores advindo do campo O objetivo

eacute problematizar suas avaliaccedilotildees frente agrave ldquoexpansatildeordquo industrial do municiacutepio e como essa

dialoga com seus interesses e necessidades

Ao analisarmos algumas entrevistas de trabalhadores vinculados a estas

induacutestrias foi comum encontrar assim como na narrativa citada na epiacutegrafe deste

capiacutetulo narrativas nesta perspectiva na qual os empregos gerados pela industrializaccedilatildeo

satildeo interpretados como possibilidade de melhoria na condiccedilatildeo de vida dos

trabalhadores Percebemos assim que o municiacutepio estaacute constantemente sendo indicado

como um grande polo de empregos mas essa indicaccedilatildeo natildeo resume as ponderaccedilotildees que

fazem sobre a presenccedila industrial em Terra Roxa - porque tambeacutem apontam elementos

que contradizem essa presenccedila

Buscaremos entatildeo dialogar com as fontes orais produzidas com trabalhadores

que se relacionaram com induacutestria de confecccedilatildeo procurando discutir tambeacutem alguns

trabalhos acadecircmicos que analisam praacuteticas dos trabalhadores em Terra Roxa A fim de

compreender a trajetoacuteria destes sujeitos e os motivos que os levam a perceber a

expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de melhoria e

mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas

Para compreendermos melhor estas interpretaccedilotildees fez-se necessaacuterio analisar o

percurso de relaccedilotildees e experiecircncias que construiacuteram Para isso foi importante

12 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

16

dimensionar a cidade na deacutecada de 1970 Momento em que se intensificou a mudanccedila

destes trabalhadores do campo para a cidade (ou ainda para outras regiotildees) ou seja este

foi um periacuteodo de mudanccedilas marcantes nas relaccedilotildees de trabalho onde morar e como

viver natildeo soacute no municiacutepio mas possiacutevel de identificar em outras cidades brasileiras

No trabalho de Ana Ameacutelia Camarano e Ricardo Abramovay haacute o interesse em

apresentar os movimentos migratoacuterios que respondem pelo processo de esvaziamento

da populaccedilatildeo rural no Brasil Os autores observam que ateacute 1980 houve um crescimento

absoluto do saldo populacional que deixou as aacutereas rurais brasileiras Aproximadamente

40 da populaccedilatildeo que vivia nas aacutereas rurais no comeccedilo dos anos 70 migraram nessa

deacutecada O fluxo que deixou o campo nos anos 80 tambeacutem foi expressivo 13 de todos

os que viviam no meio rural em 1980 saiacuteram durante esse periacuteodo o que representou

aproximadamente 13 milhotildees de pessoas13

Em termos nacionais a intensidade do movimento de desruralizaccedilatildeo segundo

os autores parece natildeo ter diminuiacutedo muito nos uacuteltimos 50 anos Entre 1950 e 1980 as

aacutereas rurais das regiotildees Sudeste e Sul forneceram um volume expressivo de novos

moradores para as aacutereas urbanas14 Para os autores como realizavam a pesquisa em fins

da deacutecada de 1990 suas impressotildees indicavam uma continuidade desse processo

Desde 1950 a cada 10 anos um em cada trecircs brasileiros vivendo no meio rural opta pela emigraccedilatildeo Os anos 90 natildeo arrefeceram em muito esta tendecircncia se as taxas de evasatildeo do meio rural observadas entre 1990 e 1995 persistirem pelo restante da deacutecada quase 30 dos brasileiros que entatildeo viviam no campo em 1990 teratildeo mudado seu local de residecircncia na virada do milecircnio15

Ainda que os autores analisem no campo da geografia demograacutefica apoiando-se

na noccedilatildeo de ecircxodo rural estes trazem ldquoo modo de vida no campordquo como incocircmodo para

a realizaccedilatildeo da pesquisa traduzido nas movimentaccedilotildees desses brasileiros entre o campo

e a cidade alteraccedilotildees natildeo soacute espaciais mas no modo como vivem e enfrentam

determinadas relaccedilotildees de poder

Estes se movimentam de acordo com as expectativas e interesses que produzem

como necessidades reorganizando as relaccedilotildees de trabalho e modos de vida diante de

pressotildees de reestruturaccedilatildeo da produccedilatildeo e da ocupaccedilatildeo das aacutereas rurais brasileiras da

13 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 14 IBIDEM 15 IBIDEM p 6

17

segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual

natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na

promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo

De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970

aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do

municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as

principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos

Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio

exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX

Graacutefico 1

Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)

Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e

principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a

distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando

Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de

1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea

urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave

expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de

vestuaacuterio moda bebecirc

16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013

18

Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no

municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo

urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e

insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo

na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e

incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola

em moldes capitalistas na cidade 17

A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas

unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha

o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade

em muitos casos diretamente com o consumidor

Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que

discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em

Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo

provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que

Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18

No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da

populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente

ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da

maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio

alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo

aponta um processo tranquilo

17

GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18

FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9

19

As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos

oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute

mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise

- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o

cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que

A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19

A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o

trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe

quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar

com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de

banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe

pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo

Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um

grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir

ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados

da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia

por um nuacutemero reduzido de vagas

Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo

saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por

um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria

condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses

19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33

20

trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de

induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade

Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu

entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria

seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas

vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece

Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20

A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves

induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos

perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas

de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para

Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida

Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como

citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este

processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de

Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande

decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio

Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do

IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que

formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho

atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores

mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que

permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram

como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras

atividades tambeacutem inconstantes

A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em

2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que

residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo

por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos

20

JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

21

sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)

estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos

produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no

transporte e venda de mercadorias21

O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os

trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira

produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no

contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria

e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas

Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua

forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de

escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma

grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de

mercadorias criminalizado como contrabando

O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online

Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o

narcotraacuteficordquo aponta que

Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122

A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida

com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que

almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores

apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os

21

CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013

22

oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando

permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute

associada a comprar roupas e tecircnis de marca

O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a

intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda

de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre

alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para

frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc

No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses

trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego

Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso

Frederico afirma que

Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23

A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da

agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em

segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees

No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este

processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas

nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica

quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo

Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24

23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

23

Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo

para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O

trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do

patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo

lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos

trabalhadores pela induacutestria ele me diz que

Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25

Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural

da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas

relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar

com essa nova dinacircmica

Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo

visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas

vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se

aproxima da percepccedilatildeo de Carlos

Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26

Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para

ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes

se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio

trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as

ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que

pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha

25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11

24

trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem

trabalho

Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe

complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho

pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida

que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram

Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no

campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e

trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte

das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave

trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a

perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura

Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27

Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de

alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute

registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses

trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas

A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade

de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As

oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um

maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa

condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos

desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor

a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado

O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos

Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo

Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa

27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10

25

Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28

Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas

anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do

empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da

cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram

nesse processo

O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho

financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para

empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a

demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de

trabalhadores agrave disposiccedilatildeo

Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no

municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do

empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor

produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que

A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29

Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos

gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por

ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e

possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio

A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees

municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno

28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM

26

desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos

proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e

do APL do vestuaacuterio na cidade 31

No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi

substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e

mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e

vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa

aacutereardquo

Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do

Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos

profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes

tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o

interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo

de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores

tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo

foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal

finalidade

De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho

rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da

folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo

A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como

Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes

Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o

municiacutepio de Terra Roxa

30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

27

Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34

O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de

trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda

continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila

tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de

garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno

dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o

campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre

os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal

As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma

alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida

ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores

possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -

com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou

outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por

perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista

dentre outros natildeo os oferece

Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes

trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de

classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de

melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no

ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a

trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em

outra cidade ela me disse que

Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35

34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

28

Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave

mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem

organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de

novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar

com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as

expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita

vantagem assimrdquo

Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para

Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se

demo na faacutebricardquo36

Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram

trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar

mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia

com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando

pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que

Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37

Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter

voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no

campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em

Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que

natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar

36 IDEM 37 IDEM

29

As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila

pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com

a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma

mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila

natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na

narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do

casal

Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas

construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril

Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho

na faacutebrica ela me disse que

Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38

Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que

gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as

dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores

preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica

ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na

avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em

conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho

O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como

Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos

indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em

casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria

Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista

Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim

38 IDEM

30

de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por

menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes

oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc

como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado

na Escola do Trabalho

Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o

tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram

mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias

permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas

relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais

Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns

trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de

compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas

tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa

39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

31

CAPIacuteTULO 2

TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40

Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa

natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O

municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande

polo de empregos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de

investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade

de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um

grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41

Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo

como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem

indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e

aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de

desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente

O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de

julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do

Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para

bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda

afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um

terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio

A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral

retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o

40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013

32

processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no

ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir

Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa

fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda

bebecirc pra terra roxa

Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43

A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande

destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da

cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra

Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o

municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo

queacuterdquo

No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves

transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que

este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo

sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em

resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores

Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa

industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo

enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa

Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20

principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a

43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

33

janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos

registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores

vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e

desligamento nesses setores

Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa

Meses Jan de 2003 a Jan de 2011

CBO ndash Frequumlecircncia

Admissotildees Desligamentos

Saldo

1ordm Emp

Reemp

Reint

C Prz Det

Transf

Total

Disp sem J Causa

Disp com J Causa

A Pedido

Term Contr

Aposent

Morte

Term C Prz Deter

Transf

Total

Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da

confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390

Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443

Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie

271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109

Costureira de peccedilas sob encomenda

171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em

geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio

varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina

60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio

em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina

bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas

34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27

Trabalhador agropecuaacuterio em geral

19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador

de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5

Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39

Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie

6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras

10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente

administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio

32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa

24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27

Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013

34

Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

35

Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

36

mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

37

curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

38

Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

41

que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

42

Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

44

industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

45

Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

46

Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

7

RESUMO

Este Trabalho de Conclusatildeo de Curso tem a intenccedilatildeo de problematizar analisar e investigar as relaccedilotildees de trabalho que marcam a trajetoacuteria de trabalhadores que compuseram praacuteticas no processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa-PR discutindo o modo como se relacionaram nem sempre amistosamente com as accedilotildees do poder puacuteblico municipal e com a participaccedilatildeo empresarial do ramo ldquomoda bebecircrdquo na cidade A pesquisa abordaraacute as trecircs uacuteltimas deacutecadas pelo fato de esse ser um momento histoacuterico importante pela intensificaccedilatildeo da exploraccedilatildeo industrial em Terra Roxa Essa temporalidade eacute significativa no processo de mudanccedila e produccedilatildeo de relaccedilotildees de trabalho na cidade envolvendo o setor de vestuaacuterio e a produccedilatildeo de alternativas por trabalhadores muitas vezes advindo do meio rural Propomos investigar as condiccedilotildees de vida dos trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam este mercado de trabalho bem como relacionar as memoacuterias e accedilotildees produzidas tanto para o trabalho como para a vida em Terra Roxa Para isso destacamos o trabalho com as fontes orais jornais fichas de cursos profissionalizantes e iacutendices estatiacutesticos como documentaccedilatildeo a ser privilegiada nessa pesquisa O interesse foi manter o diaacutelogo com as evidecircncias e quando necessaacuterio ampliar a anaacutelise de fontes ou mesmo revendo os caminhos da investigaccedilatildeo Esse encaminhamento considera que o conhecimento histoacuterico exige essa construccedilatildeo ao longo da pesquisa como tambeacutem o compromisso com as questotildees em foco

Palavras-chave Trabalhadores Relaccedilotildees de Trabalho Induacutestrias

8

Sumaacuterio INTRODUCcedilAtildeO 9

CAPIacuteTULO 1TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc 15

CAPIacuteTULO 2TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES 31

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 51

FONTES 53

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS 55

9

INTRODUCcedilAtildeO

A escolha dos sujeitos e do tema deste estudo (os trabalhadores atualmente

vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa- PR) eacute resultado de minha

trajetoacuteria de vida trabalho e acadecircmica

Primeiro de vida e trabalho porque o trabalho na induacutestria de moda bebecirc jaacute fez

parte de minha atividade profissional por algum tempo Deste modo pude conviver com

outros trabalhadores observar e ouvir suas avaliaccedilotildees sobre suas condiccedilotildees de vida

motivaccedilotildees interesses e conflitos que perpassam esse ambiente de trabalho o que me

instigou a pesquisar o tema De forma que muitas das interpretaccedilotildees e avaliaccedilotildees que os

trabalhadores indicam em suas narrativas atraveacutes das entrevistas feitas jaacute ouvi dos

meus familiares como da minha proacutepria matildee Pois grande parte deles reside em Terra

Roxa e trabalha na induacutestria de moda bebecirc

Segundo como acadecircmica e pesquisadora porque este trabalho de conclusatildeo de

curso eacute continuidade de uma iniciaccedilatildeo cientifica voluntaacuteria (PIC-V) e as questotildees que

estatildeo aqui sendo levantadas eacute uma continuidade das indagaccedilotildees que surgiram a partir de

um diaacutelogo inicial com as fontes feitas nesta pesquisa anterior1

O objetivo central da pesquisa foi investigar as condiccedilotildees de vida de

trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de vestuaacuterio moda bebecirc no municiacutepio de

Terra Roxa-PR problematizando suas relaccedilotildees de trabalho e como se inserem e

interpretam este mercado de trabalho dando visibilidade a estes sujeitos e suas accedilotildees na

cidade

O municiacutepio possui atualmente entre macro e micro cerca de 113 empresas que

produzem em torno de 9 milhotildees de peccedilas envolvendo aproximadamente 2500

trabalhadores empregados diretamente o que segundo a noccedilatildeo do poder publico

municipal ldquodinamiza a geraccedilatildeo de emprego e renda do municiacutepiordquo2 Como podemos

1 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 2 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013

10

perceber em uma reportagem do jornal online Gazeta do Povo intitulada ldquoEm Terra

Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojasrdquo

A cadeia da confecccedilatildeo infantil mudou os rumos da cidade de 17 mil habitantes e a vida de muitos paranaenses Maria do Carmo 42 anos eacute um exemplo Ateacute os 38 anos ela trabalhava nos Campos Gerais onde plantava eucalipto Hoje o cenaacuterio eacute o mesmo um siacutetio mas agora ela natildeo lida diretamente com a terra Maria atua no setor de corte de roupas e tambeacutem dirige o ocircnibus que transporta funcionaacuterios da empresa Baby Doces Momentos confecccedilatildeo localizada em um siacutetio de cinco alqueires que produz cerca de 20 mil peccedilas ao mecircs ldquoAgora me sinto melhor Antes trabalhava no sol com uma bomba de 20 litros nas costas para pulverizar e plantarrdquo conta3

A partir do trecho acima percebemos que ao avaliar a dinacircmica industrial no

municiacutepio a reportagem aponta a relaccedilatildeo com a produccedilatildeo e experiecircncia dos trabalhos

no meio rural evidentemente para positivar a expansatildeo desse ramo de induacutestria de

vestuaacuterio como salvaccedilatildeo da cidade jaacute que estas empresas ldquodinamiza a geraccedilatildeo de

emprego e renda do municiacutepiordquo

Eacute importante entender a dimensatildeo dessa estrutura empresarial industrial em

Terra Roxa pois esta historicidade vai abrir caminhos a serem problematizados ao

longo deste trabalho

Para desenvolver esta pesquisa pautamo-nos na dinacircmica que integra a reflexatildeo

da problemaacutetica e o processo de levantamento e anaacutelise de fontes Esse

encaminhamento inspira-se na indicaccedilatildeo de Thompson sobre o diaacutelogo necessaacuterio e

constante entre teoria e evidecircncias histoacutericas4

Segundo Thompson

O interrogador eacute a loacutegica histoacuterica o conteuacutedo da interrogaccedilatildeo eacute uma hipoacutetese o interrogado eacute a evidecircncia com suas propriedades determinadas O objeto do conhecimento histoacuterico eacute a histoacuteria lsquorealrsquo cujas evidecircncias devem ser necessariamente incompletas e imperfeitas5

3 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no-paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 4 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma criacutetica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar Editores 1981 5 IBIDEM p 49

11

Isso quer dizer que os historiadores podem selecionar essa ou aquela evidecircncia

propor novas perguntas mas isso natildeo significa que os proacuteprios acontecimentos passados

se modifiquem nem tampouco que seja um agregado de histoacuterias separadas Embora

essa interpretaccedilatildeo do processo histoacuterico surja em resposta agrave pergunta formulada nossa

produccedilatildeo natildeo inventa o processo e natildeo pode modificar o ldquostatus ontoloacutegicordquo do

passado

Eacute nesta perspectiva de anaacutelise que conduziremos este pesquisa Cabe contudo

salientar a contribuiccedilatildeo que esta nos proporciona para a compreensatildeo que proponho

sobre as relaccedilotildees de trabalho experiecircncias e interpretaccedilotildees dos trabalhadores nas

induacutestrias de confecccedilatildeo de moda bebecirc em Terra Roxa Para tanto pensaremos a histoacuteria

em um duplo sentido como experiecircncia humana e como a proacutepria narraccedilatildeo dessas

experiecircncias as interpretaccedilotildees e projeccedilotildees das quais o investigador vai utilizar6

A investigaccedilatildeo neste sentido estaacute relacionada com as problemaacuteticas que o

pesquisador se coloca no presente que envolvem sua experiecircncia de vida e as

concepccedilotildees da qual parte

Pretendo entender a partir das experiecircncias narradas por esses trabalhadores

como eles se inserem e interpretam este mercado de trabalho e fazem prospecccedilotildees

Segundo Thompson

Se determos a histoacuteria num determinado ponto natildeo haacute classe mas simplesmente uma multidatildeo de indiviacuteduos com amontoado de experiecircncias Mas se examinarmos esses homens durante um periacuteodo adequado de mudanccedilas sociais observaremos padrotildees em suas relaccedilotildees sua ideias e instituiccedilotildees A classe eacute definida pelos homens enquanto vivem sua proacutepria histoacuteria e ao final esta eacute sua definiccedilatildeo7

Neste sentido para entendermos os trabalhadores eacute necessaacuteria uma serie de

observaccedilotildees e anaacutelises que se expressam em suas praacuteticas cotidianas como eles

vivenciam e se portam perante sua dinacircmica de trabalho o que possibilita sua formaccedilatildeo

cultural e social

Para esse processo interpretativo utilizamos cinco entrevistas que realizei com

trabalhadores no intuito de potencializar as elaboraccedilotildees construiacutedas por esses sujeitos

sobre as motivaccedilotildees interesses e conflitos ou seja memoacuterias produzidas sobre

6 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987 7 THOMPSON E P ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12

12

trajetoacuterias e experiecircncia social compartilhada nas relaccedilotildees dentro e fora das induacutestrias

de vestuaacuterio na cidade

Como um dos meacutetodos de pesquisa foi trabalhar com fontes orais considero

importante apontar algumas dificuldades que encontrei ao realizar algumas entrevistas

Mesmo o municiacutepio empregando mais de 2500 trabalhadores na induacutestria de confecccedilatildeo

minha principal dificuldade foi encontrar trabalhadores que se dispusessem a realizar as

entrevistas

Aqueles que aceitavam soacute concordavam em produzir a entrevista quando

algueacutem muito proacuteximo deles me apresentava O fato de alguns trabalhadores aceitarem

natildeo excluiu a desconfianccedila e inseguranccedila que estes possuiacuteam em relaccedilatildeo agraves entrevistas

Desta forma a inseguranccedila dos trabalhadores sobre se poderiam falar ou natildeo a

respeito de suas relaccedilotildees de trabalho juntamente com a minha falta de experiecircncia em

saber lidar com essas inseguranccedilas prejudicaram o desenvolvimento das entrevistas

As respostas ficaram limitadas ao roteiro muitas vezes limitadas ao ldquosimrdquo ou ao ldquonatildeordquo

Pois aleacutem da timidez ao saberem que estatildeo sendo gravados ainda tive que lidar com o

receio dos entrevistados ao exporem sua trajetoacuteria e condiccedilotildees de vida

As entrevistas orais natildeo foram produto de teacutecnica mas das relaccedilotildees que

consegui desenvolver com esses trabalhadores Portanto o meacutetodo de utilizar fontes

orais consiste em trabalhar com a subjetividade dos indiviacuteduos lidando com as questotildees

postas pelos entrevistados a partir de minhas proacuteprias questotildees

Neste sentido o diaacutelogo com Alessandro Portelli e com outros autores ajudou a

compreender que essa relaccedilatildeo entre entrevistado e entrevistador natildeo eacute um objetivo

muito faacutecil de ser alcanccedilado pois as pessoas reinterpretam e datildeo novos significados aos

acontecimentos passados em funccedilatildeo do que vive no presente ou espera viver Ou ainda

encobrem sentimentos e interpretaccedilotildees por censura repressatildeo temores ou pela pouca

disposiccedilatildeo em falar8

Ao utilizar a fonte oral foi importante dialogar com a produccedilatildeo de Alessandro

Portelli o qual contribuiu para a construccedilatildeo de um procedimento de anaacutelise para a

produccedilatildeo das fontes orais e do olhar lanccedilado sobre esse material O uso de tal fonte na

pesquisa permitiu o enfrentamento da dinacircmica contraditoacuteria de valores e praacuteticas que

compotildeem escolhas pressotildees e expectativas desses sujeitos sociais

8 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 p33

13

Nesse sentido permite maior visibilidade poliacutetica da classe trabalhadora com

suas divisotildees e processos de identificaccedilatildeo na condiccedilatildeo de classe compartilhada

produzindo assim uma interpretaccedilatildeo histoacuterica comprometida com o potencial de luta e

intervenccedilatildeo social desses trabalhadores Essa investigaccedilatildeo tambeacutem traz como

enfrentamento lidar com os limites dessa fonte como as dificuldades de conseguir a

aceitaccedilatildeo da gravaccedilatildeo da entrevista e contatar trabalhadores9

O intuito de usarmos a fonte oral nesta pesquisa inspira-se nesta perspectiva de

Portelli Buscamos o trabalho com as entrevista natildeo como confirmaccedilatildeo de uma ldquoteserdquo

inicial mas sim com a intenccedilatildeo de dar visibilidade agraves interpretaccedilotildees construiacutedas pelos

trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa

Para tal associamos essa documentaccedilatildeo com mateacuterias jornaliacutesticas e fichas de

inscriccedilatildeo em cursos (de corte costura e bordado) na Escola do trabalho na cidade Aleacutem

da interpretaccedilatildeo de iacutendices estatiacutesticos sobre empregabilidade atividades econocircmicas

etc

O presente trabalho estaacute estruturado em dois capiacutetulos No primeiro capiacutetulo

busquei analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agrave

induacutestria de moda bebecirc a fim de compreender os motivos que levam esses sujeitos a

perceber a expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de

melhoria e mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas e na permanecircncia em Terra Roxa

No segundo capiacutetulo busco discutir a partir das experiecircncias cotidianas e das

relaccedilotildees de trabalho desses sujeitos as possibilidades e limites das expectativas que

estes trabalhadores estabelecem em relaccedilatildeo ao trabalho na induacutestria de moda bebecirc tal

qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre o

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa10

Essa intenccedilatildeo tenta se distanciar de determinados campos analiacuteticos que

sustentam essa expansatildeo industrial como sinocircnimo de desenvolvimento arraigados

na promoccedilatildeo de certos projetos empresariais e na historicidade progressista de alguns

processos de expansatildeo urbana Ao fazer esse distanciamento o interesse eacute ampliar o

9 PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 10 As induacutestrias de Terra Roxa estatildeo inseridas no Arranjo Produtivo Local (APL) criado em 2004 para oferecer subsiacutedios e aperfeiccediloamento aos empresaacuterios O APL da moda bebecirc visa entre outros aspectos maior eficiecircncia de inserccedilatildeo dos produtos da induacutestria de vestuaacuterio no mercado maior poder de negociaccedilatildeo de preccedilo da mateacuteria-prima atraccedilatildeo de novos prestadores de serviccedilos ao municiacutepio e otimizaccedilatildeo de custos com a qualificaccedilatildeo da matildeo de obra Esse assessoramento procura oferecer ao empresariado condiccedilotildees de mercado e apoio para fixaccedilatildeo em determinadas regiotildees

14

campo de anaacutelise apresentando contradiccedilotildees e tensotildees nesse percurso dirigindo atenccedilatildeo

aos trabalhadores mais do que agrave faacutebrica e ao sistema produtivo por ele mesmo11

Ao realizar esta pesquisa minha preocupaccedilatildeo se pauta em mostrar que estes

sujeitos satildeo seres conscientes de sua posiccedilatildeo enquanto sujeitos sociais e procuro

ressaltar que estes trabalhadores fazem parte deste processo histoacuterico enquanto

indiviacuteduos ativos mesmo que indiretamente intervenham nos rumos e ritmo dessa

expansatildeo industrial

Assim busquei com este trabalho explorar a partir das narrativas dos

trabalhadores e de suas experiecircncias entender natildeo somente estes sujeitos mas as

expectativas que estes constroem e as relaccedilotildees que estabelecem com o trabalho para a

promoccedilatildeo de seus interesses

11 O trabalho de Godoy procura fazer um percurso acadecircmico das nuances e alteraccedilotildees na abordagem do universo fabril Assim como Paoli Sader e Telles recolocam alguns enfrentamentos - na percepccedilatildeo de suas atuaccedilotildees e construccedilatildeo de sentidos - para aqueles que procuram perceber os trabalhadores neste cenaacuterio operaacuterio brasileiro Ver -GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 -PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198

15

CAPIacuteTULO 1

TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc

[] Com o tempo depois que essas empresas dede crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram mais faacuteceis neacute []12

Neste capiacutetulo vamos analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente

estatildeo ou que em algum momento de suas vidas estiveram vinculados agraves induacutestrias de

confecccedilatildeo de moda bebecirc do municiacutepio de Terra Roxa- PR mas que trazem em sua

trajetoacuteria uma relaccedilatildeo com o trabalho moradia e valores advindo do campo O objetivo

eacute problematizar suas avaliaccedilotildees frente agrave ldquoexpansatildeordquo industrial do municiacutepio e como essa

dialoga com seus interesses e necessidades

Ao analisarmos algumas entrevistas de trabalhadores vinculados a estas

induacutestrias foi comum encontrar assim como na narrativa citada na epiacutegrafe deste

capiacutetulo narrativas nesta perspectiva na qual os empregos gerados pela industrializaccedilatildeo

satildeo interpretados como possibilidade de melhoria na condiccedilatildeo de vida dos

trabalhadores Percebemos assim que o municiacutepio estaacute constantemente sendo indicado

como um grande polo de empregos mas essa indicaccedilatildeo natildeo resume as ponderaccedilotildees que

fazem sobre a presenccedila industrial em Terra Roxa - porque tambeacutem apontam elementos

que contradizem essa presenccedila

Buscaremos entatildeo dialogar com as fontes orais produzidas com trabalhadores

que se relacionaram com induacutestria de confecccedilatildeo procurando discutir tambeacutem alguns

trabalhos acadecircmicos que analisam praacuteticas dos trabalhadores em Terra Roxa A fim de

compreender a trajetoacuteria destes sujeitos e os motivos que os levam a perceber a

expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de melhoria e

mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas

Para compreendermos melhor estas interpretaccedilotildees fez-se necessaacuterio analisar o

percurso de relaccedilotildees e experiecircncias que construiacuteram Para isso foi importante

12 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

16

dimensionar a cidade na deacutecada de 1970 Momento em que se intensificou a mudanccedila

destes trabalhadores do campo para a cidade (ou ainda para outras regiotildees) ou seja este

foi um periacuteodo de mudanccedilas marcantes nas relaccedilotildees de trabalho onde morar e como

viver natildeo soacute no municiacutepio mas possiacutevel de identificar em outras cidades brasileiras

No trabalho de Ana Ameacutelia Camarano e Ricardo Abramovay haacute o interesse em

apresentar os movimentos migratoacuterios que respondem pelo processo de esvaziamento

da populaccedilatildeo rural no Brasil Os autores observam que ateacute 1980 houve um crescimento

absoluto do saldo populacional que deixou as aacutereas rurais brasileiras Aproximadamente

40 da populaccedilatildeo que vivia nas aacutereas rurais no comeccedilo dos anos 70 migraram nessa

deacutecada O fluxo que deixou o campo nos anos 80 tambeacutem foi expressivo 13 de todos

os que viviam no meio rural em 1980 saiacuteram durante esse periacuteodo o que representou

aproximadamente 13 milhotildees de pessoas13

Em termos nacionais a intensidade do movimento de desruralizaccedilatildeo segundo

os autores parece natildeo ter diminuiacutedo muito nos uacuteltimos 50 anos Entre 1950 e 1980 as

aacutereas rurais das regiotildees Sudeste e Sul forneceram um volume expressivo de novos

moradores para as aacutereas urbanas14 Para os autores como realizavam a pesquisa em fins

da deacutecada de 1990 suas impressotildees indicavam uma continuidade desse processo

Desde 1950 a cada 10 anos um em cada trecircs brasileiros vivendo no meio rural opta pela emigraccedilatildeo Os anos 90 natildeo arrefeceram em muito esta tendecircncia se as taxas de evasatildeo do meio rural observadas entre 1990 e 1995 persistirem pelo restante da deacutecada quase 30 dos brasileiros que entatildeo viviam no campo em 1990 teratildeo mudado seu local de residecircncia na virada do milecircnio15

Ainda que os autores analisem no campo da geografia demograacutefica apoiando-se

na noccedilatildeo de ecircxodo rural estes trazem ldquoo modo de vida no campordquo como incocircmodo para

a realizaccedilatildeo da pesquisa traduzido nas movimentaccedilotildees desses brasileiros entre o campo

e a cidade alteraccedilotildees natildeo soacute espaciais mas no modo como vivem e enfrentam

determinadas relaccedilotildees de poder

Estes se movimentam de acordo com as expectativas e interesses que produzem

como necessidades reorganizando as relaccedilotildees de trabalho e modos de vida diante de

pressotildees de reestruturaccedilatildeo da produccedilatildeo e da ocupaccedilatildeo das aacutereas rurais brasileiras da

13 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 14 IBIDEM 15 IBIDEM p 6

17

segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual

natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na

promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo

De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970

aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do

municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as

principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos

Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio

exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX

Graacutefico 1

Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)

Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e

principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a

distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando

Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de

1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea

urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave

expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de

vestuaacuterio moda bebecirc

16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013

18

Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no

municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo

urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e

insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo

na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e

incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola

em moldes capitalistas na cidade 17

A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas

unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha

o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade

em muitos casos diretamente com o consumidor

Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que

discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em

Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo

provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que

Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18

No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da

populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente

ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da

maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio

alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo

aponta um processo tranquilo

17

GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18

FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9

19

As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos

oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute

mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise

- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o

cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que

A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19

A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o

trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe

quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar

com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de

banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe

pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo

Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um

grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir

ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados

da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia

por um nuacutemero reduzido de vagas

Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo

saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por

um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria

condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses

19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33

20

trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de

induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade

Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu

entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria

seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas

vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece

Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20

A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves

induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos

perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas

de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para

Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida

Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como

citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este

processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de

Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande

decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio

Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do

IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que

formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho

atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores

mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que

permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram

como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras

atividades tambeacutem inconstantes

A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em

2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que

residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo

por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos

20

JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

21

sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)

estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos

produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no

transporte e venda de mercadorias21

O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os

trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira

produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no

contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria

e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas

Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua

forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de

escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma

grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de

mercadorias criminalizado como contrabando

O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online

Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o

narcotraacuteficordquo aponta que

Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122

A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida

com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que

almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores

apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os

21

CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013

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oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando

permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute

associada a comprar roupas e tecircnis de marca

O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a

intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda

de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre

alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para

frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc

No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses

trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego

Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso

Frederico afirma que

Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23

A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da

agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em

segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees

No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este

processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas

nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica

quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo

Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24

23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

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Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo

para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O

trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do

patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo

lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos

trabalhadores pela induacutestria ele me diz que

Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25

Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural

da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas

relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar

com essa nova dinacircmica

Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo

visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas

vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se

aproxima da percepccedilatildeo de Carlos

Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26

Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para

ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes

se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio

trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as

ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que

pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha

25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11

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trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem

trabalho

Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe

complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho

pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida

que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram

Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no

campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e

trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte

das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave

trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a

perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura

Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27

Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de

alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute

registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses

trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas

A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade

de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As

oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um

maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa

condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos

desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor

a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado

O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos

Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo

Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa

27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10

25

Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28

Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas

anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do

empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da

cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram

nesse processo

O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho

financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para

empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a

demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de

trabalhadores agrave disposiccedilatildeo

Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no

municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do

empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor

produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que

A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29

Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos

gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por

ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e

possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio

A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees

municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno

28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM

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desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos

proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e

do APL do vestuaacuterio na cidade 31

No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi

substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e

mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e

vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa

aacutereardquo

Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do

Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos

profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes

tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o

interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo

de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores

tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo

foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal

finalidade

De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho

rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da

folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo

A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como

Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes

Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o

municiacutepio de Terra Roxa

30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

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Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34

O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de

trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda

continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila

tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de

garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno

dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o

campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre

os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal

As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma

alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida

ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores

possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -

com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou

outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por

perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista

dentre outros natildeo os oferece

Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes

trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de

classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de

melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no

ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a

trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em

outra cidade ela me disse que

Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35

34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

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Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave

mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem

organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de

novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar

com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as

expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita

vantagem assimrdquo

Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para

Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se

demo na faacutebricardquo36

Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram

trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar

mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia

com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando

pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que

Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37

Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter

voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no

campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em

Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que

natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar

36 IDEM 37 IDEM

29

As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila

pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com

a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma

mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila

natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na

narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do

casal

Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas

construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril

Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho

na faacutebrica ela me disse que

Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38

Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que

gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as

dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores

preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica

ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na

avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em

conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho

O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como

Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos

indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em

casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria

Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista

Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim

38 IDEM

30

de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por

menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes

oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc

como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado

na Escola do Trabalho

Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o

tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram

mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias

permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas

relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais

Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns

trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de

compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas

tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa

39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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CAPIacuteTULO 2

TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40

Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa

natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O

municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande

polo de empregos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de

investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade

de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um

grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41

Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo

como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem

indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e

aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de

desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente

O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de

julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do

Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para

bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda

afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um

terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio

A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral

retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o

40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013

32

processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no

ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir

Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa

fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda

bebecirc pra terra roxa

Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43

A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande

destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da

cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra

Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o

municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo

queacuterdquo

No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves

transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que

este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo

sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em

resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores

Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa

industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo

enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa

Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20

principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a

43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

33

janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos

registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores

vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e

desligamento nesses setores

Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa

Meses Jan de 2003 a Jan de 2011

CBO ndash Frequumlecircncia

Admissotildees Desligamentos

Saldo

1ordm Emp

Reemp

Reint

C Prz Det

Transf

Total

Disp sem J Causa

Disp com J Causa

A Pedido

Term Contr

Aposent

Morte

Term C Prz Deter

Transf

Total

Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da

confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390

Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443

Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie

271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109

Costureira de peccedilas sob encomenda

171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em

geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio

varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina

60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio

em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina

bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas

34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27

Trabalhador agropecuaacuterio em geral

19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador

de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5

Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39

Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie

6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras

10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente

administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio

32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa

24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27

Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013

34

Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

35

Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

36

mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

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curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

38

Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

41

que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

42

Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

44

industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

45

Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

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Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

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FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

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lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

8

Sumaacuterio INTRODUCcedilAtildeO 9

CAPIacuteTULO 1TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc 15

CAPIacuteTULO 2TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES 31

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 51

FONTES 53

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS 55

9

INTRODUCcedilAtildeO

A escolha dos sujeitos e do tema deste estudo (os trabalhadores atualmente

vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa- PR) eacute resultado de minha

trajetoacuteria de vida trabalho e acadecircmica

Primeiro de vida e trabalho porque o trabalho na induacutestria de moda bebecirc jaacute fez

parte de minha atividade profissional por algum tempo Deste modo pude conviver com

outros trabalhadores observar e ouvir suas avaliaccedilotildees sobre suas condiccedilotildees de vida

motivaccedilotildees interesses e conflitos que perpassam esse ambiente de trabalho o que me

instigou a pesquisar o tema De forma que muitas das interpretaccedilotildees e avaliaccedilotildees que os

trabalhadores indicam em suas narrativas atraveacutes das entrevistas feitas jaacute ouvi dos

meus familiares como da minha proacutepria matildee Pois grande parte deles reside em Terra

Roxa e trabalha na induacutestria de moda bebecirc

Segundo como acadecircmica e pesquisadora porque este trabalho de conclusatildeo de

curso eacute continuidade de uma iniciaccedilatildeo cientifica voluntaacuteria (PIC-V) e as questotildees que

estatildeo aqui sendo levantadas eacute uma continuidade das indagaccedilotildees que surgiram a partir de

um diaacutelogo inicial com as fontes feitas nesta pesquisa anterior1

O objetivo central da pesquisa foi investigar as condiccedilotildees de vida de

trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de vestuaacuterio moda bebecirc no municiacutepio de

Terra Roxa-PR problematizando suas relaccedilotildees de trabalho e como se inserem e

interpretam este mercado de trabalho dando visibilidade a estes sujeitos e suas accedilotildees na

cidade

O municiacutepio possui atualmente entre macro e micro cerca de 113 empresas que

produzem em torno de 9 milhotildees de peccedilas envolvendo aproximadamente 2500

trabalhadores empregados diretamente o que segundo a noccedilatildeo do poder publico

municipal ldquodinamiza a geraccedilatildeo de emprego e renda do municiacutepiordquo2 Como podemos

1 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 2 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013

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perceber em uma reportagem do jornal online Gazeta do Povo intitulada ldquoEm Terra

Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojasrdquo

A cadeia da confecccedilatildeo infantil mudou os rumos da cidade de 17 mil habitantes e a vida de muitos paranaenses Maria do Carmo 42 anos eacute um exemplo Ateacute os 38 anos ela trabalhava nos Campos Gerais onde plantava eucalipto Hoje o cenaacuterio eacute o mesmo um siacutetio mas agora ela natildeo lida diretamente com a terra Maria atua no setor de corte de roupas e tambeacutem dirige o ocircnibus que transporta funcionaacuterios da empresa Baby Doces Momentos confecccedilatildeo localizada em um siacutetio de cinco alqueires que produz cerca de 20 mil peccedilas ao mecircs ldquoAgora me sinto melhor Antes trabalhava no sol com uma bomba de 20 litros nas costas para pulverizar e plantarrdquo conta3

A partir do trecho acima percebemos que ao avaliar a dinacircmica industrial no

municiacutepio a reportagem aponta a relaccedilatildeo com a produccedilatildeo e experiecircncia dos trabalhos

no meio rural evidentemente para positivar a expansatildeo desse ramo de induacutestria de

vestuaacuterio como salvaccedilatildeo da cidade jaacute que estas empresas ldquodinamiza a geraccedilatildeo de

emprego e renda do municiacutepiordquo

Eacute importante entender a dimensatildeo dessa estrutura empresarial industrial em

Terra Roxa pois esta historicidade vai abrir caminhos a serem problematizados ao

longo deste trabalho

Para desenvolver esta pesquisa pautamo-nos na dinacircmica que integra a reflexatildeo

da problemaacutetica e o processo de levantamento e anaacutelise de fontes Esse

encaminhamento inspira-se na indicaccedilatildeo de Thompson sobre o diaacutelogo necessaacuterio e

constante entre teoria e evidecircncias histoacutericas4

Segundo Thompson

O interrogador eacute a loacutegica histoacuterica o conteuacutedo da interrogaccedilatildeo eacute uma hipoacutetese o interrogado eacute a evidecircncia com suas propriedades determinadas O objeto do conhecimento histoacuterico eacute a histoacuteria lsquorealrsquo cujas evidecircncias devem ser necessariamente incompletas e imperfeitas5

3 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no-paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 4 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma criacutetica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar Editores 1981 5 IBIDEM p 49

11

Isso quer dizer que os historiadores podem selecionar essa ou aquela evidecircncia

propor novas perguntas mas isso natildeo significa que os proacuteprios acontecimentos passados

se modifiquem nem tampouco que seja um agregado de histoacuterias separadas Embora

essa interpretaccedilatildeo do processo histoacuterico surja em resposta agrave pergunta formulada nossa

produccedilatildeo natildeo inventa o processo e natildeo pode modificar o ldquostatus ontoloacutegicordquo do

passado

Eacute nesta perspectiva de anaacutelise que conduziremos este pesquisa Cabe contudo

salientar a contribuiccedilatildeo que esta nos proporciona para a compreensatildeo que proponho

sobre as relaccedilotildees de trabalho experiecircncias e interpretaccedilotildees dos trabalhadores nas

induacutestrias de confecccedilatildeo de moda bebecirc em Terra Roxa Para tanto pensaremos a histoacuteria

em um duplo sentido como experiecircncia humana e como a proacutepria narraccedilatildeo dessas

experiecircncias as interpretaccedilotildees e projeccedilotildees das quais o investigador vai utilizar6

A investigaccedilatildeo neste sentido estaacute relacionada com as problemaacuteticas que o

pesquisador se coloca no presente que envolvem sua experiecircncia de vida e as

concepccedilotildees da qual parte

Pretendo entender a partir das experiecircncias narradas por esses trabalhadores

como eles se inserem e interpretam este mercado de trabalho e fazem prospecccedilotildees

Segundo Thompson

Se determos a histoacuteria num determinado ponto natildeo haacute classe mas simplesmente uma multidatildeo de indiviacuteduos com amontoado de experiecircncias Mas se examinarmos esses homens durante um periacuteodo adequado de mudanccedilas sociais observaremos padrotildees em suas relaccedilotildees sua ideias e instituiccedilotildees A classe eacute definida pelos homens enquanto vivem sua proacutepria histoacuteria e ao final esta eacute sua definiccedilatildeo7

Neste sentido para entendermos os trabalhadores eacute necessaacuteria uma serie de

observaccedilotildees e anaacutelises que se expressam em suas praacuteticas cotidianas como eles

vivenciam e se portam perante sua dinacircmica de trabalho o que possibilita sua formaccedilatildeo

cultural e social

Para esse processo interpretativo utilizamos cinco entrevistas que realizei com

trabalhadores no intuito de potencializar as elaboraccedilotildees construiacutedas por esses sujeitos

sobre as motivaccedilotildees interesses e conflitos ou seja memoacuterias produzidas sobre

6 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987 7 THOMPSON E P ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12

12

trajetoacuterias e experiecircncia social compartilhada nas relaccedilotildees dentro e fora das induacutestrias

de vestuaacuterio na cidade

Como um dos meacutetodos de pesquisa foi trabalhar com fontes orais considero

importante apontar algumas dificuldades que encontrei ao realizar algumas entrevistas

Mesmo o municiacutepio empregando mais de 2500 trabalhadores na induacutestria de confecccedilatildeo

minha principal dificuldade foi encontrar trabalhadores que se dispusessem a realizar as

entrevistas

Aqueles que aceitavam soacute concordavam em produzir a entrevista quando

algueacutem muito proacuteximo deles me apresentava O fato de alguns trabalhadores aceitarem

natildeo excluiu a desconfianccedila e inseguranccedila que estes possuiacuteam em relaccedilatildeo agraves entrevistas

Desta forma a inseguranccedila dos trabalhadores sobre se poderiam falar ou natildeo a

respeito de suas relaccedilotildees de trabalho juntamente com a minha falta de experiecircncia em

saber lidar com essas inseguranccedilas prejudicaram o desenvolvimento das entrevistas

As respostas ficaram limitadas ao roteiro muitas vezes limitadas ao ldquosimrdquo ou ao ldquonatildeordquo

Pois aleacutem da timidez ao saberem que estatildeo sendo gravados ainda tive que lidar com o

receio dos entrevistados ao exporem sua trajetoacuteria e condiccedilotildees de vida

As entrevistas orais natildeo foram produto de teacutecnica mas das relaccedilotildees que

consegui desenvolver com esses trabalhadores Portanto o meacutetodo de utilizar fontes

orais consiste em trabalhar com a subjetividade dos indiviacuteduos lidando com as questotildees

postas pelos entrevistados a partir de minhas proacuteprias questotildees

Neste sentido o diaacutelogo com Alessandro Portelli e com outros autores ajudou a

compreender que essa relaccedilatildeo entre entrevistado e entrevistador natildeo eacute um objetivo

muito faacutecil de ser alcanccedilado pois as pessoas reinterpretam e datildeo novos significados aos

acontecimentos passados em funccedilatildeo do que vive no presente ou espera viver Ou ainda

encobrem sentimentos e interpretaccedilotildees por censura repressatildeo temores ou pela pouca

disposiccedilatildeo em falar8

Ao utilizar a fonte oral foi importante dialogar com a produccedilatildeo de Alessandro

Portelli o qual contribuiu para a construccedilatildeo de um procedimento de anaacutelise para a

produccedilatildeo das fontes orais e do olhar lanccedilado sobre esse material O uso de tal fonte na

pesquisa permitiu o enfrentamento da dinacircmica contraditoacuteria de valores e praacuteticas que

compotildeem escolhas pressotildees e expectativas desses sujeitos sociais

8 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 p33

13

Nesse sentido permite maior visibilidade poliacutetica da classe trabalhadora com

suas divisotildees e processos de identificaccedilatildeo na condiccedilatildeo de classe compartilhada

produzindo assim uma interpretaccedilatildeo histoacuterica comprometida com o potencial de luta e

intervenccedilatildeo social desses trabalhadores Essa investigaccedilatildeo tambeacutem traz como

enfrentamento lidar com os limites dessa fonte como as dificuldades de conseguir a

aceitaccedilatildeo da gravaccedilatildeo da entrevista e contatar trabalhadores9

O intuito de usarmos a fonte oral nesta pesquisa inspira-se nesta perspectiva de

Portelli Buscamos o trabalho com as entrevista natildeo como confirmaccedilatildeo de uma ldquoteserdquo

inicial mas sim com a intenccedilatildeo de dar visibilidade agraves interpretaccedilotildees construiacutedas pelos

trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa

Para tal associamos essa documentaccedilatildeo com mateacuterias jornaliacutesticas e fichas de

inscriccedilatildeo em cursos (de corte costura e bordado) na Escola do trabalho na cidade Aleacutem

da interpretaccedilatildeo de iacutendices estatiacutesticos sobre empregabilidade atividades econocircmicas

etc

O presente trabalho estaacute estruturado em dois capiacutetulos No primeiro capiacutetulo

busquei analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agrave

induacutestria de moda bebecirc a fim de compreender os motivos que levam esses sujeitos a

perceber a expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de

melhoria e mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas e na permanecircncia em Terra Roxa

No segundo capiacutetulo busco discutir a partir das experiecircncias cotidianas e das

relaccedilotildees de trabalho desses sujeitos as possibilidades e limites das expectativas que

estes trabalhadores estabelecem em relaccedilatildeo ao trabalho na induacutestria de moda bebecirc tal

qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre o

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa10

Essa intenccedilatildeo tenta se distanciar de determinados campos analiacuteticos que

sustentam essa expansatildeo industrial como sinocircnimo de desenvolvimento arraigados

na promoccedilatildeo de certos projetos empresariais e na historicidade progressista de alguns

processos de expansatildeo urbana Ao fazer esse distanciamento o interesse eacute ampliar o

9 PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 10 As induacutestrias de Terra Roxa estatildeo inseridas no Arranjo Produtivo Local (APL) criado em 2004 para oferecer subsiacutedios e aperfeiccediloamento aos empresaacuterios O APL da moda bebecirc visa entre outros aspectos maior eficiecircncia de inserccedilatildeo dos produtos da induacutestria de vestuaacuterio no mercado maior poder de negociaccedilatildeo de preccedilo da mateacuteria-prima atraccedilatildeo de novos prestadores de serviccedilos ao municiacutepio e otimizaccedilatildeo de custos com a qualificaccedilatildeo da matildeo de obra Esse assessoramento procura oferecer ao empresariado condiccedilotildees de mercado e apoio para fixaccedilatildeo em determinadas regiotildees

14

campo de anaacutelise apresentando contradiccedilotildees e tensotildees nesse percurso dirigindo atenccedilatildeo

aos trabalhadores mais do que agrave faacutebrica e ao sistema produtivo por ele mesmo11

Ao realizar esta pesquisa minha preocupaccedilatildeo se pauta em mostrar que estes

sujeitos satildeo seres conscientes de sua posiccedilatildeo enquanto sujeitos sociais e procuro

ressaltar que estes trabalhadores fazem parte deste processo histoacuterico enquanto

indiviacuteduos ativos mesmo que indiretamente intervenham nos rumos e ritmo dessa

expansatildeo industrial

Assim busquei com este trabalho explorar a partir das narrativas dos

trabalhadores e de suas experiecircncias entender natildeo somente estes sujeitos mas as

expectativas que estes constroem e as relaccedilotildees que estabelecem com o trabalho para a

promoccedilatildeo de seus interesses

11 O trabalho de Godoy procura fazer um percurso acadecircmico das nuances e alteraccedilotildees na abordagem do universo fabril Assim como Paoli Sader e Telles recolocam alguns enfrentamentos - na percepccedilatildeo de suas atuaccedilotildees e construccedilatildeo de sentidos - para aqueles que procuram perceber os trabalhadores neste cenaacuterio operaacuterio brasileiro Ver -GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 -PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198

15

CAPIacuteTULO 1

TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc

[] Com o tempo depois que essas empresas dede crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram mais faacuteceis neacute []12

Neste capiacutetulo vamos analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente

estatildeo ou que em algum momento de suas vidas estiveram vinculados agraves induacutestrias de

confecccedilatildeo de moda bebecirc do municiacutepio de Terra Roxa- PR mas que trazem em sua

trajetoacuteria uma relaccedilatildeo com o trabalho moradia e valores advindo do campo O objetivo

eacute problematizar suas avaliaccedilotildees frente agrave ldquoexpansatildeordquo industrial do municiacutepio e como essa

dialoga com seus interesses e necessidades

Ao analisarmos algumas entrevistas de trabalhadores vinculados a estas

induacutestrias foi comum encontrar assim como na narrativa citada na epiacutegrafe deste

capiacutetulo narrativas nesta perspectiva na qual os empregos gerados pela industrializaccedilatildeo

satildeo interpretados como possibilidade de melhoria na condiccedilatildeo de vida dos

trabalhadores Percebemos assim que o municiacutepio estaacute constantemente sendo indicado

como um grande polo de empregos mas essa indicaccedilatildeo natildeo resume as ponderaccedilotildees que

fazem sobre a presenccedila industrial em Terra Roxa - porque tambeacutem apontam elementos

que contradizem essa presenccedila

Buscaremos entatildeo dialogar com as fontes orais produzidas com trabalhadores

que se relacionaram com induacutestria de confecccedilatildeo procurando discutir tambeacutem alguns

trabalhos acadecircmicos que analisam praacuteticas dos trabalhadores em Terra Roxa A fim de

compreender a trajetoacuteria destes sujeitos e os motivos que os levam a perceber a

expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de melhoria e

mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas

Para compreendermos melhor estas interpretaccedilotildees fez-se necessaacuterio analisar o

percurso de relaccedilotildees e experiecircncias que construiacuteram Para isso foi importante

12 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

16

dimensionar a cidade na deacutecada de 1970 Momento em que se intensificou a mudanccedila

destes trabalhadores do campo para a cidade (ou ainda para outras regiotildees) ou seja este

foi um periacuteodo de mudanccedilas marcantes nas relaccedilotildees de trabalho onde morar e como

viver natildeo soacute no municiacutepio mas possiacutevel de identificar em outras cidades brasileiras

No trabalho de Ana Ameacutelia Camarano e Ricardo Abramovay haacute o interesse em

apresentar os movimentos migratoacuterios que respondem pelo processo de esvaziamento

da populaccedilatildeo rural no Brasil Os autores observam que ateacute 1980 houve um crescimento

absoluto do saldo populacional que deixou as aacutereas rurais brasileiras Aproximadamente

40 da populaccedilatildeo que vivia nas aacutereas rurais no comeccedilo dos anos 70 migraram nessa

deacutecada O fluxo que deixou o campo nos anos 80 tambeacutem foi expressivo 13 de todos

os que viviam no meio rural em 1980 saiacuteram durante esse periacuteodo o que representou

aproximadamente 13 milhotildees de pessoas13

Em termos nacionais a intensidade do movimento de desruralizaccedilatildeo segundo

os autores parece natildeo ter diminuiacutedo muito nos uacuteltimos 50 anos Entre 1950 e 1980 as

aacutereas rurais das regiotildees Sudeste e Sul forneceram um volume expressivo de novos

moradores para as aacutereas urbanas14 Para os autores como realizavam a pesquisa em fins

da deacutecada de 1990 suas impressotildees indicavam uma continuidade desse processo

Desde 1950 a cada 10 anos um em cada trecircs brasileiros vivendo no meio rural opta pela emigraccedilatildeo Os anos 90 natildeo arrefeceram em muito esta tendecircncia se as taxas de evasatildeo do meio rural observadas entre 1990 e 1995 persistirem pelo restante da deacutecada quase 30 dos brasileiros que entatildeo viviam no campo em 1990 teratildeo mudado seu local de residecircncia na virada do milecircnio15

Ainda que os autores analisem no campo da geografia demograacutefica apoiando-se

na noccedilatildeo de ecircxodo rural estes trazem ldquoo modo de vida no campordquo como incocircmodo para

a realizaccedilatildeo da pesquisa traduzido nas movimentaccedilotildees desses brasileiros entre o campo

e a cidade alteraccedilotildees natildeo soacute espaciais mas no modo como vivem e enfrentam

determinadas relaccedilotildees de poder

Estes se movimentam de acordo com as expectativas e interesses que produzem

como necessidades reorganizando as relaccedilotildees de trabalho e modos de vida diante de

pressotildees de reestruturaccedilatildeo da produccedilatildeo e da ocupaccedilatildeo das aacutereas rurais brasileiras da

13 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 14 IBIDEM 15 IBIDEM p 6

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segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual

natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na

promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo

De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970

aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do

municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as

principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos

Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio

exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX

Graacutefico 1

Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)

Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e

principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a

distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando

Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de

1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea

urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave

expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de

vestuaacuterio moda bebecirc

16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013

18

Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no

municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo

urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e

insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo

na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e

incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola

em moldes capitalistas na cidade 17

A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas

unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha

o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade

em muitos casos diretamente com o consumidor

Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que

discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em

Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo

provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que

Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18

No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da

populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente

ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da

maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio

alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo

aponta um processo tranquilo

17

GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18

FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9

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As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos

oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute

mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise

- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o

cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que

A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19

A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o

trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe

quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar

com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de

banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe

pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo

Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um

grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir

ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados

da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia

por um nuacutemero reduzido de vagas

Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo

saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por

um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria

condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses

19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33

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trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de

induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade

Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu

entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria

seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas

vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece

Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20

A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves

induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos

perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas

de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para

Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida

Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como

citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este

processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de

Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande

decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio

Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do

IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que

formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho

atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores

mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que

permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram

como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras

atividades tambeacutem inconstantes

A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em

2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que

residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo

por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos

20

JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

21

sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)

estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos

produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no

transporte e venda de mercadorias21

O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os

trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira

produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no

contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria

e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas

Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua

forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de

escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma

grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de

mercadorias criminalizado como contrabando

O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online

Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o

narcotraacuteficordquo aponta que

Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122

A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida

com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que

almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores

apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os

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CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013

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oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando

permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute

associada a comprar roupas e tecircnis de marca

O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a

intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda

de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre

alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para

frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc

No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses

trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego

Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso

Frederico afirma que

Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23

A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da

agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em

segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees

No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este

processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas

nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica

quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo

Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24

23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

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Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo

para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O

trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do

patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo

lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos

trabalhadores pela induacutestria ele me diz que

Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25

Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural

da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas

relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar

com essa nova dinacircmica

Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo

visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas

vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se

aproxima da percepccedilatildeo de Carlos

Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26

Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para

ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes

se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio

trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as

ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que

pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha

25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11

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trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem

trabalho

Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe

complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho

pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida

que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram

Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no

campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e

trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte

das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave

trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a

perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura

Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27

Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de

alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute

registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses

trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas

A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade

de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As

oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um

maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa

condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos

desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor

a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado

O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos

Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo

Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa

27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10

25

Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28

Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas

anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do

empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da

cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram

nesse processo

O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho

financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para

empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a

demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de

trabalhadores agrave disposiccedilatildeo

Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no

municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do

empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor

produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que

A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29

Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos

gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por

ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e

possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio

A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees

municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno

28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM

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desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos

proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e

do APL do vestuaacuterio na cidade 31

No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi

substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e

mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e

vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa

aacutereardquo

Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do

Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos

profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes

tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o

interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo

de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores

tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo

foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal

finalidade

De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho

rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da

folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo

A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como

Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes

Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o

municiacutepio de Terra Roxa

30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

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Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34

O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de

trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda

continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila

tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de

garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno

dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o

campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre

os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal

As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma

alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida

ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores

possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -

com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou

outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por

perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista

dentre outros natildeo os oferece

Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes

trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de

classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de

melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no

ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a

trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em

outra cidade ela me disse que

Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35

34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

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Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave

mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem

organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de

novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar

com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as

expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita

vantagem assimrdquo

Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para

Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se

demo na faacutebricardquo36

Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram

trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar

mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia

com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando

pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que

Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37

Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter

voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no

campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em

Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que

natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar

36 IDEM 37 IDEM

29

As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila

pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com

a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma

mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila

natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na

narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do

casal

Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas

construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril

Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho

na faacutebrica ela me disse que

Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38

Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que

gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as

dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores

preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica

ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na

avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em

conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho

O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como

Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos

indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em

casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria

Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista

Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim

38 IDEM

30

de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por

menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes

oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc

como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado

na Escola do Trabalho

Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o

tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram

mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias

permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas

relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais

Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns

trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de

compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas

tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa

39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

31

CAPIacuteTULO 2

TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40

Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa

natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O

municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande

polo de empregos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de

investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade

de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um

grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41

Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo

como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem

indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e

aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de

desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente

O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de

julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do

Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para

bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda

afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um

terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio

A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral

retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o

40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013

32

processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no

ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir

Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa

fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda

bebecirc pra terra roxa

Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43

A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande

destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da

cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra

Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o

municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo

queacuterdquo

No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves

transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que

este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo

sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em

resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores

Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa

industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo

enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa

Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20

principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a

43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

33

janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos

registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores

vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e

desligamento nesses setores

Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa

Meses Jan de 2003 a Jan de 2011

CBO ndash Frequumlecircncia

Admissotildees Desligamentos

Saldo

1ordm Emp

Reemp

Reint

C Prz Det

Transf

Total

Disp sem J Causa

Disp com J Causa

A Pedido

Term Contr

Aposent

Morte

Term C Prz Deter

Transf

Total

Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da

confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390

Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443

Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie

271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109

Costureira de peccedilas sob encomenda

171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em

geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio

varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina

60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio

em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina

bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas

34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27

Trabalhador agropecuaacuterio em geral

19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador

de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5

Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39

Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie

6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras

10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente

administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio

32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa

24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27

Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013

34

Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

35

Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

36

mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

37

curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

38

Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

41

que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

42

Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

45

Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

46

Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

9

INTRODUCcedilAtildeO

A escolha dos sujeitos e do tema deste estudo (os trabalhadores atualmente

vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa- PR) eacute resultado de minha

trajetoacuteria de vida trabalho e acadecircmica

Primeiro de vida e trabalho porque o trabalho na induacutestria de moda bebecirc jaacute fez

parte de minha atividade profissional por algum tempo Deste modo pude conviver com

outros trabalhadores observar e ouvir suas avaliaccedilotildees sobre suas condiccedilotildees de vida

motivaccedilotildees interesses e conflitos que perpassam esse ambiente de trabalho o que me

instigou a pesquisar o tema De forma que muitas das interpretaccedilotildees e avaliaccedilotildees que os

trabalhadores indicam em suas narrativas atraveacutes das entrevistas feitas jaacute ouvi dos

meus familiares como da minha proacutepria matildee Pois grande parte deles reside em Terra

Roxa e trabalha na induacutestria de moda bebecirc

Segundo como acadecircmica e pesquisadora porque este trabalho de conclusatildeo de

curso eacute continuidade de uma iniciaccedilatildeo cientifica voluntaacuteria (PIC-V) e as questotildees que

estatildeo aqui sendo levantadas eacute uma continuidade das indagaccedilotildees que surgiram a partir de

um diaacutelogo inicial com as fontes feitas nesta pesquisa anterior1

O objetivo central da pesquisa foi investigar as condiccedilotildees de vida de

trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de vestuaacuterio moda bebecirc no municiacutepio de

Terra Roxa-PR problematizando suas relaccedilotildees de trabalho e como se inserem e

interpretam este mercado de trabalho dando visibilidade a estes sujeitos e suas accedilotildees na

cidade

O municiacutepio possui atualmente entre macro e micro cerca de 113 empresas que

produzem em torno de 9 milhotildees de peccedilas envolvendo aproximadamente 2500

trabalhadores empregados diretamente o que segundo a noccedilatildeo do poder publico

municipal ldquodinamiza a geraccedilatildeo de emprego e renda do municiacutepiordquo2 Como podemos

1 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 2 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013

10

perceber em uma reportagem do jornal online Gazeta do Povo intitulada ldquoEm Terra

Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojasrdquo

A cadeia da confecccedilatildeo infantil mudou os rumos da cidade de 17 mil habitantes e a vida de muitos paranaenses Maria do Carmo 42 anos eacute um exemplo Ateacute os 38 anos ela trabalhava nos Campos Gerais onde plantava eucalipto Hoje o cenaacuterio eacute o mesmo um siacutetio mas agora ela natildeo lida diretamente com a terra Maria atua no setor de corte de roupas e tambeacutem dirige o ocircnibus que transporta funcionaacuterios da empresa Baby Doces Momentos confecccedilatildeo localizada em um siacutetio de cinco alqueires que produz cerca de 20 mil peccedilas ao mecircs ldquoAgora me sinto melhor Antes trabalhava no sol com uma bomba de 20 litros nas costas para pulverizar e plantarrdquo conta3

A partir do trecho acima percebemos que ao avaliar a dinacircmica industrial no

municiacutepio a reportagem aponta a relaccedilatildeo com a produccedilatildeo e experiecircncia dos trabalhos

no meio rural evidentemente para positivar a expansatildeo desse ramo de induacutestria de

vestuaacuterio como salvaccedilatildeo da cidade jaacute que estas empresas ldquodinamiza a geraccedilatildeo de

emprego e renda do municiacutepiordquo

Eacute importante entender a dimensatildeo dessa estrutura empresarial industrial em

Terra Roxa pois esta historicidade vai abrir caminhos a serem problematizados ao

longo deste trabalho

Para desenvolver esta pesquisa pautamo-nos na dinacircmica que integra a reflexatildeo

da problemaacutetica e o processo de levantamento e anaacutelise de fontes Esse

encaminhamento inspira-se na indicaccedilatildeo de Thompson sobre o diaacutelogo necessaacuterio e

constante entre teoria e evidecircncias histoacutericas4

Segundo Thompson

O interrogador eacute a loacutegica histoacuterica o conteuacutedo da interrogaccedilatildeo eacute uma hipoacutetese o interrogado eacute a evidecircncia com suas propriedades determinadas O objeto do conhecimento histoacuterico eacute a histoacuteria lsquorealrsquo cujas evidecircncias devem ser necessariamente incompletas e imperfeitas5

3 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no-paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 4 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma criacutetica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar Editores 1981 5 IBIDEM p 49

11

Isso quer dizer que os historiadores podem selecionar essa ou aquela evidecircncia

propor novas perguntas mas isso natildeo significa que os proacuteprios acontecimentos passados

se modifiquem nem tampouco que seja um agregado de histoacuterias separadas Embora

essa interpretaccedilatildeo do processo histoacuterico surja em resposta agrave pergunta formulada nossa

produccedilatildeo natildeo inventa o processo e natildeo pode modificar o ldquostatus ontoloacutegicordquo do

passado

Eacute nesta perspectiva de anaacutelise que conduziremos este pesquisa Cabe contudo

salientar a contribuiccedilatildeo que esta nos proporciona para a compreensatildeo que proponho

sobre as relaccedilotildees de trabalho experiecircncias e interpretaccedilotildees dos trabalhadores nas

induacutestrias de confecccedilatildeo de moda bebecirc em Terra Roxa Para tanto pensaremos a histoacuteria

em um duplo sentido como experiecircncia humana e como a proacutepria narraccedilatildeo dessas

experiecircncias as interpretaccedilotildees e projeccedilotildees das quais o investigador vai utilizar6

A investigaccedilatildeo neste sentido estaacute relacionada com as problemaacuteticas que o

pesquisador se coloca no presente que envolvem sua experiecircncia de vida e as

concepccedilotildees da qual parte

Pretendo entender a partir das experiecircncias narradas por esses trabalhadores

como eles se inserem e interpretam este mercado de trabalho e fazem prospecccedilotildees

Segundo Thompson

Se determos a histoacuteria num determinado ponto natildeo haacute classe mas simplesmente uma multidatildeo de indiviacuteduos com amontoado de experiecircncias Mas se examinarmos esses homens durante um periacuteodo adequado de mudanccedilas sociais observaremos padrotildees em suas relaccedilotildees sua ideias e instituiccedilotildees A classe eacute definida pelos homens enquanto vivem sua proacutepria histoacuteria e ao final esta eacute sua definiccedilatildeo7

Neste sentido para entendermos os trabalhadores eacute necessaacuteria uma serie de

observaccedilotildees e anaacutelises que se expressam em suas praacuteticas cotidianas como eles

vivenciam e se portam perante sua dinacircmica de trabalho o que possibilita sua formaccedilatildeo

cultural e social

Para esse processo interpretativo utilizamos cinco entrevistas que realizei com

trabalhadores no intuito de potencializar as elaboraccedilotildees construiacutedas por esses sujeitos

sobre as motivaccedilotildees interesses e conflitos ou seja memoacuterias produzidas sobre

6 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987 7 THOMPSON E P ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12

12

trajetoacuterias e experiecircncia social compartilhada nas relaccedilotildees dentro e fora das induacutestrias

de vestuaacuterio na cidade

Como um dos meacutetodos de pesquisa foi trabalhar com fontes orais considero

importante apontar algumas dificuldades que encontrei ao realizar algumas entrevistas

Mesmo o municiacutepio empregando mais de 2500 trabalhadores na induacutestria de confecccedilatildeo

minha principal dificuldade foi encontrar trabalhadores que se dispusessem a realizar as

entrevistas

Aqueles que aceitavam soacute concordavam em produzir a entrevista quando

algueacutem muito proacuteximo deles me apresentava O fato de alguns trabalhadores aceitarem

natildeo excluiu a desconfianccedila e inseguranccedila que estes possuiacuteam em relaccedilatildeo agraves entrevistas

Desta forma a inseguranccedila dos trabalhadores sobre se poderiam falar ou natildeo a

respeito de suas relaccedilotildees de trabalho juntamente com a minha falta de experiecircncia em

saber lidar com essas inseguranccedilas prejudicaram o desenvolvimento das entrevistas

As respostas ficaram limitadas ao roteiro muitas vezes limitadas ao ldquosimrdquo ou ao ldquonatildeordquo

Pois aleacutem da timidez ao saberem que estatildeo sendo gravados ainda tive que lidar com o

receio dos entrevistados ao exporem sua trajetoacuteria e condiccedilotildees de vida

As entrevistas orais natildeo foram produto de teacutecnica mas das relaccedilotildees que

consegui desenvolver com esses trabalhadores Portanto o meacutetodo de utilizar fontes

orais consiste em trabalhar com a subjetividade dos indiviacuteduos lidando com as questotildees

postas pelos entrevistados a partir de minhas proacuteprias questotildees

Neste sentido o diaacutelogo com Alessandro Portelli e com outros autores ajudou a

compreender que essa relaccedilatildeo entre entrevistado e entrevistador natildeo eacute um objetivo

muito faacutecil de ser alcanccedilado pois as pessoas reinterpretam e datildeo novos significados aos

acontecimentos passados em funccedilatildeo do que vive no presente ou espera viver Ou ainda

encobrem sentimentos e interpretaccedilotildees por censura repressatildeo temores ou pela pouca

disposiccedilatildeo em falar8

Ao utilizar a fonte oral foi importante dialogar com a produccedilatildeo de Alessandro

Portelli o qual contribuiu para a construccedilatildeo de um procedimento de anaacutelise para a

produccedilatildeo das fontes orais e do olhar lanccedilado sobre esse material O uso de tal fonte na

pesquisa permitiu o enfrentamento da dinacircmica contraditoacuteria de valores e praacuteticas que

compotildeem escolhas pressotildees e expectativas desses sujeitos sociais

8 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 p33

13

Nesse sentido permite maior visibilidade poliacutetica da classe trabalhadora com

suas divisotildees e processos de identificaccedilatildeo na condiccedilatildeo de classe compartilhada

produzindo assim uma interpretaccedilatildeo histoacuterica comprometida com o potencial de luta e

intervenccedilatildeo social desses trabalhadores Essa investigaccedilatildeo tambeacutem traz como

enfrentamento lidar com os limites dessa fonte como as dificuldades de conseguir a

aceitaccedilatildeo da gravaccedilatildeo da entrevista e contatar trabalhadores9

O intuito de usarmos a fonte oral nesta pesquisa inspira-se nesta perspectiva de

Portelli Buscamos o trabalho com as entrevista natildeo como confirmaccedilatildeo de uma ldquoteserdquo

inicial mas sim com a intenccedilatildeo de dar visibilidade agraves interpretaccedilotildees construiacutedas pelos

trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa

Para tal associamos essa documentaccedilatildeo com mateacuterias jornaliacutesticas e fichas de

inscriccedilatildeo em cursos (de corte costura e bordado) na Escola do trabalho na cidade Aleacutem

da interpretaccedilatildeo de iacutendices estatiacutesticos sobre empregabilidade atividades econocircmicas

etc

O presente trabalho estaacute estruturado em dois capiacutetulos No primeiro capiacutetulo

busquei analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agrave

induacutestria de moda bebecirc a fim de compreender os motivos que levam esses sujeitos a

perceber a expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de

melhoria e mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas e na permanecircncia em Terra Roxa

No segundo capiacutetulo busco discutir a partir das experiecircncias cotidianas e das

relaccedilotildees de trabalho desses sujeitos as possibilidades e limites das expectativas que

estes trabalhadores estabelecem em relaccedilatildeo ao trabalho na induacutestria de moda bebecirc tal

qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre o

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa10

Essa intenccedilatildeo tenta se distanciar de determinados campos analiacuteticos que

sustentam essa expansatildeo industrial como sinocircnimo de desenvolvimento arraigados

na promoccedilatildeo de certos projetos empresariais e na historicidade progressista de alguns

processos de expansatildeo urbana Ao fazer esse distanciamento o interesse eacute ampliar o

9 PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 10 As induacutestrias de Terra Roxa estatildeo inseridas no Arranjo Produtivo Local (APL) criado em 2004 para oferecer subsiacutedios e aperfeiccediloamento aos empresaacuterios O APL da moda bebecirc visa entre outros aspectos maior eficiecircncia de inserccedilatildeo dos produtos da induacutestria de vestuaacuterio no mercado maior poder de negociaccedilatildeo de preccedilo da mateacuteria-prima atraccedilatildeo de novos prestadores de serviccedilos ao municiacutepio e otimizaccedilatildeo de custos com a qualificaccedilatildeo da matildeo de obra Esse assessoramento procura oferecer ao empresariado condiccedilotildees de mercado e apoio para fixaccedilatildeo em determinadas regiotildees

14

campo de anaacutelise apresentando contradiccedilotildees e tensotildees nesse percurso dirigindo atenccedilatildeo

aos trabalhadores mais do que agrave faacutebrica e ao sistema produtivo por ele mesmo11

Ao realizar esta pesquisa minha preocupaccedilatildeo se pauta em mostrar que estes

sujeitos satildeo seres conscientes de sua posiccedilatildeo enquanto sujeitos sociais e procuro

ressaltar que estes trabalhadores fazem parte deste processo histoacuterico enquanto

indiviacuteduos ativos mesmo que indiretamente intervenham nos rumos e ritmo dessa

expansatildeo industrial

Assim busquei com este trabalho explorar a partir das narrativas dos

trabalhadores e de suas experiecircncias entender natildeo somente estes sujeitos mas as

expectativas que estes constroem e as relaccedilotildees que estabelecem com o trabalho para a

promoccedilatildeo de seus interesses

11 O trabalho de Godoy procura fazer um percurso acadecircmico das nuances e alteraccedilotildees na abordagem do universo fabril Assim como Paoli Sader e Telles recolocam alguns enfrentamentos - na percepccedilatildeo de suas atuaccedilotildees e construccedilatildeo de sentidos - para aqueles que procuram perceber os trabalhadores neste cenaacuterio operaacuterio brasileiro Ver -GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 -PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198

15

CAPIacuteTULO 1

TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc

[] Com o tempo depois que essas empresas dede crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram mais faacuteceis neacute []12

Neste capiacutetulo vamos analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente

estatildeo ou que em algum momento de suas vidas estiveram vinculados agraves induacutestrias de

confecccedilatildeo de moda bebecirc do municiacutepio de Terra Roxa- PR mas que trazem em sua

trajetoacuteria uma relaccedilatildeo com o trabalho moradia e valores advindo do campo O objetivo

eacute problematizar suas avaliaccedilotildees frente agrave ldquoexpansatildeordquo industrial do municiacutepio e como essa

dialoga com seus interesses e necessidades

Ao analisarmos algumas entrevistas de trabalhadores vinculados a estas

induacutestrias foi comum encontrar assim como na narrativa citada na epiacutegrafe deste

capiacutetulo narrativas nesta perspectiva na qual os empregos gerados pela industrializaccedilatildeo

satildeo interpretados como possibilidade de melhoria na condiccedilatildeo de vida dos

trabalhadores Percebemos assim que o municiacutepio estaacute constantemente sendo indicado

como um grande polo de empregos mas essa indicaccedilatildeo natildeo resume as ponderaccedilotildees que

fazem sobre a presenccedila industrial em Terra Roxa - porque tambeacutem apontam elementos

que contradizem essa presenccedila

Buscaremos entatildeo dialogar com as fontes orais produzidas com trabalhadores

que se relacionaram com induacutestria de confecccedilatildeo procurando discutir tambeacutem alguns

trabalhos acadecircmicos que analisam praacuteticas dos trabalhadores em Terra Roxa A fim de

compreender a trajetoacuteria destes sujeitos e os motivos que os levam a perceber a

expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de melhoria e

mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas

Para compreendermos melhor estas interpretaccedilotildees fez-se necessaacuterio analisar o

percurso de relaccedilotildees e experiecircncias que construiacuteram Para isso foi importante

12 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

16

dimensionar a cidade na deacutecada de 1970 Momento em que se intensificou a mudanccedila

destes trabalhadores do campo para a cidade (ou ainda para outras regiotildees) ou seja este

foi um periacuteodo de mudanccedilas marcantes nas relaccedilotildees de trabalho onde morar e como

viver natildeo soacute no municiacutepio mas possiacutevel de identificar em outras cidades brasileiras

No trabalho de Ana Ameacutelia Camarano e Ricardo Abramovay haacute o interesse em

apresentar os movimentos migratoacuterios que respondem pelo processo de esvaziamento

da populaccedilatildeo rural no Brasil Os autores observam que ateacute 1980 houve um crescimento

absoluto do saldo populacional que deixou as aacutereas rurais brasileiras Aproximadamente

40 da populaccedilatildeo que vivia nas aacutereas rurais no comeccedilo dos anos 70 migraram nessa

deacutecada O fluxo que deixou o campo nos anos 80 tambeacutem foi expressivo 13 de todos

os que viviam no meio rural em 1980 saiacuteram durante esse periacuteodo o que representou

aproximadamente 13 milhotildees de pessoas13

Em termos nacionais a intensidade do movimento de desruralizaccedilatildeo segundo

os autores parece natildeo ter diminuiacutedo muito nos uacuteltimos 50 anos Entre 1950 e 1980 as

aacutereas rurais das regiotildees Sudeste e Sul forneceram um volume expressivo de novos

moradores para as aacutereas urbanas14 Para os autores como realizavam a pesquisa em fins

da deacutecada de 1990 suas impressotildees indicavam uma continuidade desse processo

Desde 1950 a cada 10 anos um em cada trecircs brasileiros vivendo no meio rural opta pela emigraccedilatildeo Os anos 90 natildeo arrefeceram em muito esta tendecircncia se as taxas de evasatildeo do meio rural observadas entre 1990 e 1995 persistirem pelo restante da deacutecada quase 30 dos brasileiros que entatildeo viviam no campo em 1990 teratildeo mudado seu local de residecircncia na virada do milecircnio15

Ainda que os autores analisem no campo da geografia demograacutefica apoiando-se

na noccedilatildeo de ecircxodo rural estes trazem ldquoo modo de vida no campordquo como incocircmodo para

a realizaccedilatildeo da pesquisa traduzido nas movimentaccedilotildees desses brasileiros entre o campo

e a cidade alteraccedilotildees natildeo soacute espaciais mas no modo como vivem e enfrentam

determinadas relaccedilotildees de poder

Estes se movimentam de acordo com as expectativas e interesses que produzem

como necessidades reorganizando as relaccedilotildees de trabalho e modos de vida diante de

pressotildees de reestruturaccedilatildeo da produccedilatildeo e da ocupaccedilatildeo das aacutereas rurais brasileiras da

13 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 14 IBIDEM 15 IBIDEM p 6

17

segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual

natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na

promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo

De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970

aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do

municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as

principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos

Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio

exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX

Graacutefico 1

Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)

Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e

principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a

distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando

Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de

1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea

urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave

expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de

vestuaacuterio moda bebecirc

16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013

18

Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no

municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo

urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e

insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo

na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e

incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola

em moldes capitalistas na cidade 17

A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas

unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha

o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade

em muitos casos diretamente com o consumidor

Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que

discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em

Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo

provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que

Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18

No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da

populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente

ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da

maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio

alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo

aponta um processo tranquilo

17

GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18

FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9

19

As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos

oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute

mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise

- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o

cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que

A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19

A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o

trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe

quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar

com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de

banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe

pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo

Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um

grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir

ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados

da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia

por um nuacutemero reduzido de vagas

Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo

saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por

um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria

condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses

19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33

20

trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de

induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade

Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu

entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria

seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas

vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece

Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20

A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves

induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos

perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas

de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para

Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida

Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como

citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este

processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de

Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande

decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio

Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do

IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que

formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho

atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores

mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que

permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram

como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras

atividades tambeacutem inconstantes

A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em

2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que

residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo

por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos

20

JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

21

sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)

estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos

produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no

transporte e venda de mercadorias21

O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os

trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira

produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no

contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria

e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas

Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua

forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de

escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma

grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de

mercadorias criminalizado como contrabando

O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online

Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o

narcotraacuteficordquo aponta que

Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122

A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida

com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que

almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores

apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os

21

CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013

22

oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando

permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute

associada a comprar roupas e tecircnis de marca

O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a

intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda

de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre

alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para

frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc

No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses

trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego

Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso

Frederico afirma que

Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23

A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da

agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em

segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees

No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este

processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas

nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica

quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo

Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24

23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

23

Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo

para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O

trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do

patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo

lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos

trabalhadores pela induacutestria ele me diz que

Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25

Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural

da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas

relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar

com essa nova dinacircmica

Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo

visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas

vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se

aproxima da percepccedilatildeo de Carlos

Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26

Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para

ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes

se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio

trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as

ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que

pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha

25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11

24

trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem

trabalho

Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe

complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho

pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida

que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram

Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no

campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e

trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte

das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave

trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a

perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura

Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27

Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de

alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute

registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses

trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas

A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade

de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As

oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um

maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa

condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos

desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor

a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado

O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos

Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo

Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa

27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10

25

Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28

Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas

anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do

empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da

cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram

nesse processo

O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho

financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para

empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a

demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de

trabalhadores agrave disposiccedilatildeo

Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no

municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do

empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor

produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que

A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29

Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos

gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por

ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e

possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio

A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees

municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno

28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM

26

desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos

proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e

do APL do vestuaacuterio na cidade 31

No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi

substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e

mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e

vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa

aacutereardquo

Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do

Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos

profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes

tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o

interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo

de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores

tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo

foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal

finalidade

De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho

rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da

folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo

A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como

Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes

Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o

municiacutepio de Terra Roxa

30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

27

Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34

O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de

trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda

continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila

tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de

garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno

dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o

campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre

os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal

As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma

alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida

ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores

possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -

com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou

outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por

perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista

dentre outros natildeo os oferece

Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes

trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de

classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de

melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no

ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a

trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em

outra cidade ela me disse que

Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35

34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

28

Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave

mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem

organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de

novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar

com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as

expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita

vantagem assimrdquo

Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para

Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se

demo na faacutebricardquo36

Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram

trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar

mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia

com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando

pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que

Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37

Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter

voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no

campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em

Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que

natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar

36 IDEM 37 IDEM

29

As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila

pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com

a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma

mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila

natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na

narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do

casal

Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas

construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril

Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho

na faacutebrica ela me disse que

Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38

Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que

gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as

dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores

preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica

ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na

avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em

conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho

O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como

Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos

indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em

casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria

Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista

Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim

38 IDEM

30

de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por

menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes

oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc

como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado

na Escola do Trabalho

Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o

tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram

mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias

permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas

relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais

Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns

trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de

compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas

tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa

39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

31

CAPIacuteTULO 2

TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40

Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa

natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O

municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande

polo de empregos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de

investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade

de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um

grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41

Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo

como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem

indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e

aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de

desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente

O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de

julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do

Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para

bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda

afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um

terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio

A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral

retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o

40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013

32

processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no

ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir

Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa

fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda

bebecirc pra terra roxa

Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43

A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande

destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da

cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra

Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o

municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo

queacuterdquo

No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves

transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que

este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo

sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em

resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores

Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa

industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo

enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa

Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20

principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a

43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

33

janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos

registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores

vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e

desligamento nesses setores

Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa

Meses Jan de 2003 a Jan de 2011

CBO ndash Frequumlecircncia

Admissotildees Desligamentos

Saldo

1ordm Emp

Reemp

Reint

C Prz Det

Transf

Total

Disp sem J Causa

Disp com J Causa

A Pedido

Term Contr

Aposent

Morte

Term C Prz Deter

Transf

Total

Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da

confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390

Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443

Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie

271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109

Costureira de peccedilas sob encomenda

171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em

geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio

varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina

60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio

em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina

bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas

34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27

Trabalhador agropecuaacuterio em geral

19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador

de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5

Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39

Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie

6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras

10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente

administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio

32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa

24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27

Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013

34

Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

35

Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

36

mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

37

curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

38

Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

41

que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

10

perceber em uma reportagem do jornal online Gazeta do Povo intitulada ldquoEm Terra

Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojasrdquo

A cadeia da confecccedilatildeo infantil mudou os rumos da cidade de 17 mil habitantes e a vida de muitos paranaenses Maria do Carmo 42 anos eacute um exemplo Ateacute os 38 anos ela trabalhava nos Campos Gerais onde plantava eucalipto Hoje o cenaacuterio eacute o mesmo um siacutetio mas agora ela natildeo lida diretamente com a terra Maria atua no setor de corte de roupas e tambeacutem dirige o ocircnibus que transporta funcionaacuterios da empresa Baby Doces Momentos confecccedilatildeo localizada em um siacutetio de cinco alqueires que produz cerca de 20 mil peccedilas ao mecircs ldquoAgora me sinto melhor Antes trabalhava no sol com uma bomba de 20 litros nas costas para pulverizar e plantarrdquo conta3

A partir do trecho acima percebemos que ao avaliar a dinacircmica industrial no

municiacutepio a reportagem aponta a relaccedilatildeo com a produccedilatildeo e experiecircncia dos trabalhos

no meio rural evidentemente para positivar a expansatildeo desse ramo de induacutestria de

vestuaacuterio como salvaccedilatildeo da cidade jaacute que estas empresas ldquodinamiza a geraccedilatildeo de

emprego e renda do municiacutepiordquo

Eacute importante entender a dimensatildeo dessa estrutura empresarial industrial em

Terra Roxa pois esta historicidade vai abrir caminhos a serem problematizados ao

longo deste trabalho

Para desenvolver esta pesquisa pautamo-nos na dinacircmica que integra a reflexatildeo

da problemaacutetica e o processo de levantamento e anaacutelise de fontes Esse

encaminhamento inspira-se na indicaccedilatildeo de Thompson sobre o diaacutelogo necessaacuterio e

constante entre teoria e evidecircncias histoacutericas4

Segundo Thompson

O interrogador eacute a loacutegica histoacuterica o conteuacutedo da interrogaccedilatildeo eacute uma hipoacutetese o interrogado eacute a evidecircncia com suas propriedades determinadas O objeto do conhecimento histoacuterico eacute a histoacuteria lsquorealrsquo cujas evidecircncias devem ser necessariamente incompletas e imperfeitas5

3 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no-paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 4 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma criacutetica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar Editores 1981 5 IBIDEM p 49

11

Isso quer dizer que os historiadores podem selecionar essa ou aquela evidecircncia

propor novas perguntas mas isso natildeo significa que os proacuteprios acontecimentos passados

se modifiquem nem tampouco que seja um agregado de histoacuterias separadas Embora

essa interpretaccedilatildeo do processo histoacuterico surja em resposta agrave pergunta formulada nossa

produccedilatildeo natildeo inventa o processo e natildeo pode modificar o ldquostatus ontoloacutegicordquo do

passado

Eacute nesta perspectiva de anaacutelise que conduziremos este pesquisa Cabe contudo

salientar a contribuiccedilatildeo que esta nos proporciona para a compreensatildeo que proponho

sobre as relaccedilotildees de trabalho experiecircncias e interpretaccedilotildees dos trabalhadores nas

induacutestrias de confecccedilatildeo de moda bebecirc em Terra Roxa Para tanto pensaremos a histoacuteria

em um duplo sentido como experiecircncia humana e como a proacutepria narraccedilatildeo dessas

experiecircncias as interpretaccedilotildees e projeccedilotildees das quais o investigador vai utilizar6

A investigaccedilatildeo neste sentido estaacute relacionada com as problemaacuteticas que o

pesquisador se coloca no presente que envolvem sua experiecircncia de vida e as

concepccedilotildees da qual parte

Pretendo entender a partir das experiecircncias narradas por esses trabalhadores

como eles se inserem e interpretam este mercado de trabalho e fazem prospecccedilotildees

Segundo Thompson

Se determos a histoacuteria num determinado ponto natildeo haacute classe mas simplesmente uma multidatildeo de indiviacuteduos com amontoado de experiecircncias Mas se examinarmos esses homens durante um periacuteodo adequado de mudanccedilas sociais observaremos padrotildees em suas relaccedilotildees sua ideias e instituiccedilotildees A classe eacute definida pelos homens enquanto vivem sua proacutepria histoacuteria e ao final esta eacute sua definiccedilatildeo7

Neste sentido para entendermos os trabalhadores eacute necessaacuteria uma serie de

observaccedilotildees e anaacutelises que se expressam em suas praacuteticas cotidianas como eles

vivenciam e se portam perante sua dinacircmica de trabalho o que possibilita sua formaccedilatildeo

cultural e social

Para esse processo interpretativo utilizamos cinco entrevistas que realizei com

trabalhadores no intuito de potencializar as elaboraccedilotildees construiacutedas por esses sujeitos

sobre as motivaccedilotildees interesses e conflitos ou seja memoacuterias produzidas sobre

6 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987 7 THOMPSON E P ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12

12

trajetoacuterias e experiecircncia social compartilhada nas relaccedilotildees dentro e fora das induacutestrias

de vestuaacuterio na cidade

Como um dos meacutetodos de pesquisa foi trabalhar com fontes orais considero

importante apontar algumas dificuldades que encontrei ao realizar algumas entrevistas

Mesmo o municiacutepio empregando mais de 2500 trabalhadores na induacutestria de confecccedilatildeo

minha principal dificuldade foi encontrar trabalhadores que se dispusessem a realizar as

entrevistas

Aqueles que aceitavam soacute concordavam em produzir a entrevista quando

algueacutem muito proacuteximo deles me apresentava O fato de alguns trabalhadores aceitarem

natildeo excluiu a desconfianccedila e inseguranccedila que estes possuiacuteam em relaccedilatildeo agraves entrevistas

Desta forma a inseguranccedila dos trabalhadores sobre se poderiam falar ou natildeo a

respeito de suas relaccedilotildees de trabalho juntamente com a minha falta de experiecircncia em

saber lidar com essas inseguranccedilas prejudicaram o desenvolvimento das entrevistas

As respostas ficaram limitadas ao roteiro muitas vezes limitadas ao ldquosimrdquo ou ao ldquonatildeordquo

Pois aleacutem da timidez ao saberem que estatildeo sendo gravados ainda tive que lidar com o

receio dos entrevistados ao exporem sua trajetoacuteria e condiccedilotildees de vida

As entrevistas orais natildeo foram produto de teacutecnica mas das relaccedilotildees que

consegui desenvolver com esses trabalhadores Portanto o meacutetodo de utilizar fontes

orais consiste em trabalhar com a subjetividade dos indiviacuteduos lidando com as questotildees

postas pelos entrevistados a partir de minhas proacuteprias questotildees

Neste sentido o diaacutelogo com Alessandro Portelli e com outros autores ajudou a

compreender que essa relaccedilatildeo entre entrevistado e entrevistador natildeo eacute um objetivo

muito faacutecil de ser alcanccedilado pois as pessoas reinterpretam e datildeo novos significados aos

acontecimentos passados em funccedilatildeo do que vive no presente ou espera viver Ou ainda

encobrem sentimentos e interpretaccedilotildees por censura repressatildeo temores ou pela pouca

disposiccedilatildeo em falar8

Ao utilizar a fonte oral foi importante dialogar com a produccedilatildeo de Alessandro

Portelli o qual contribuiu para a construccedilatildeo de um procedimento de anaacutelise para a

produccedilatildeo das fontes orais e do olhar lanccedilado sobre esse material O uso de tal fonte na

pesquisa permitiu o enfrentamento da dinacircmica contraditoacuteria de valores e praacuteticas que

compotildeem escolhas pressotildees e expectativas desses sujeitos sociais

8 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 p33

13

Nesse sentido permite maior visibilidade poliacutetica da classe trabalhadora com

suas divisotildees e processos de identificaccedilatildeo na condiccedilatildeo de classe compartilhada

produzindo assim uma interpretaccedilatildeo histoacuterica comprometida com o potencial de luta e

intervenccedilatildeo social desses trabalhadores Essa investigaccedilatildeo tambeacutem traz como

enfrentamento lidar com os limites dessa fonte como as dificuldades de conseguir a

aceitaccedilatildeo da gravaccedilatildeo da entrevista e contatar trabalhadores9

O intuito de usarmos a fonte oral nesta pesquisa inspira-se nesta perspectiva de

Portelli Buscamos o trabalho com as entrevista natildeo como confirmaccedilatildeo de uma ldquoteserdquo

inicial mas sim com a intenccedilatildeo de dar visibilidade agraves interpretaccedilotildees construiacutedas pelos

trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa

Para tal associamos essa documentaccedilatildeo com mateacuterias jornaliacutesticas e fichas de

inscriccedilatildeo em cursos (de corte costura e bordado) na Escola do trabalho na cidade Aleacutem

da interpretaccedilatildeo de iacutendices estatiacutesticos sobre empregabilidade atividades econocircmicas

etc

O presente trabalho estaacute estruturado em dois capiacutetulos No primeiro capiacutetulo

busquei analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agrave

induacutestria de moda bebecirc a fim de compreender os motivos que levam esses sujeitos a

perceber a expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de

melhoria e mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas e na permanecircncia em Terra Roxa

No segundo capiacutetulo busco discutir a partir das experiecircncias cotidianas e das

relaccedilotildees de trabalho desses sujeitos as possibilidades e limites das expectativas que

estes trabalhadores estabelecem em relaccedilatildeo ao trabalho na induacutestria de moda bebecirc tal

qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre o

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa10

Essa intenccedilatildeo tenta se distanciar de determinados campos analiacuteticos que

sustentam essa expansatildeo industrial como sinocircnimo de desenvolvimento arraigados

na promoccedilatildeo de certos projetos empresariais e na historicidade progressista de alguns

processos de expansatildeo urbana Ao fazer esse distanciamento o interesse eacute ampliar o

9 PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 10 As induacutestrias de Terra Roxa estatildeo inseridas no Arranjo Produtivo Local (APL) criado em 2004 para oferecer subsiacutedios e aperfeiccediloamento aos empresaacuterios O APL da moda bebecirc visa entre outros aspectos maior eficiecircncia de inserccedilatildeo dos produtos da induacutestria de vestuaacuterio no mercado maior poder de negociaccedilatildeo de preccedilo da mateacuteria-prima atraccedilatildeo de novos prestadores de serviccedilos ao municiacutepio e otimizaccedilatildeo de custos com a qualificaccedilatildeo da matildeo de obra Esse assessoramento procura oferecer ao empresariado condiccedilotildees de mercado e apoio para fixaccedilatildeo em determinadas regiotildees

14

campo de anaacutelise apresentando contradiccedilotildees e tensotildees nesse percurso dirigindo atenccedilatildeo

aos trabalhadores mais do que agrave faacutebrica e ao sistema produtivo por ele mesmo11

Ao realizar esta pesquisa minha preocupaccedilatildeo se pauta em mostrar que estes

sujeitos satildeo seres conscientes de sua posiccedilatildeo enquanto sujeitos sociais e procuro

ressaltar que estes trabalhadores fazem parte deste processo histoacuterico enquanto

indiviacuteduos ativos mesmo que indiretamente intervenham nos rumos e ritmo dessa

expansatildeo industrial

Assim busquei com este trabalho explorar a partir das narrativas dos

trabalhadores e de suas experiecircncias entender natildeo somente estes sujeitos mas as

expectativas que estes constroem e as relaccedilotildees que estabelecem com o trabalho para a

promoccedilatildeo de seus interesses

11 O trabalho de Godoy procura fazer um percurso acadecircmico das nuances e alteraccedilotildees na abordagem do universo fabril Assim como Paoli Sader e Telles recolocam alguns enfrentamentos - na percepccedilatildeo de suas atuaccedilotildees e construccedilatildeo de sentidos - para aqueles que procuram perceber os trabalhadores neste cenaacuterio operaacuterio brasileiro Ver -GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 -PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198

15

CAPIacuteTULO 1

TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc

[] Com o tempo depois que essas empresas dede crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram mais faacuteceis neacute []12

Neste capiacutetulo vamos analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente

estatildeo ou que em algum momento de suas vidas estiveram vinculados agraves induacutestrias de

confecccedilatildeo de moda bebecirc do municiacutepio de Terra Roxa- PR mas que trazem em sua

trajetoacuteria uma relaccedilatildeo com o trabalho moradia e valores advindo do campo O objetivo

eacute problematizar suas avaliaccedilotildees frente agrave ldquoexpansatildeordquo industrial do municiacutepio e como essa

dialoga com seus interesses e necessidades

Ao analisarmos algumas entrevistas de trabalhadores vinculados a estas

induacutestrias foi comum encontrar assim como na narrativa citada na epiacutegrafe deste

capiacutetulo narrativas nesta perspectiva na qual os empregos gerados pela industrializaccedilatildeo

satildeo interpretados como possibilidade de melhoria na condiccedilatildeo de vida dos

trabalhadores Percebemos assim que o municiacutepio estaacute constantemente sendo indicado

como um grande polo de empregos mas essa indicaccedilatildeo natildeo resume as ponderaccedilotildees que

fazem sobre a presenccedila industrial em Terra Roxa - porque tambeacutem apontam elementos

que contradizem essa presenccedila

Buscaremos entatildeo dialogar com as fontes orais produzidas com trabalhadores

que se relacionaram com induacutestria de confecccedilatildeo procurando discutir tambeacutem alguns

trabalhos acadecircmicos que analisam praacuteticas dos trabalhadores em Terra Roxa A fim de

compreender a trajetoacuteria destes sujeitos e os motivos que os levam a perceber a

expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de melhoria e

mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas

Para compreendermos melhor estas interpretaccedilotildees fez-se necessaacuterio analisar o

percurso de relaccedilotildees e experiecircncias que construiacuteram Para isso foi importante

12 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

16

dimensionar a cidade na deacutecada de 1970 Momento em que se intensificou a mudanccedila

destes trabalhadores do campo para a cidade (ou ainda para outras regiotildees) ou seja este

foi um periacuteodo de mudanccedilas marcantes nas relaccedilotildees de trabalho onde morar e como

viver natildeo soacute no municiacutepio mas possiacutevel de identificar em outras cidades brasileiras

No trabalho de Ana Ameacutelia Camarano e Ricardo Abramovay haacute o interesse em

apresentar os movimentos migratoacuterios que respondem pelo processo de esvaziamento

da populaccedilatildeo rural no Brasil Os autores observam que ateacute 1980 houve um crescimento

absoluto do saldo populacional que deixou as aacutereas rurais brasileiras Aproximadamente

40 da populaccedilatildeo que vivia nas aacutereas rurais no comeccedilo dos anos 70 migraram nessa

deacutecada O fluxo que deixou o campo nos anos 80 tambeacutem foi expressivo 13 de todos

os que viviam no meio rural em 1980 saiacuteram durante esse periacuteodo o que representou

aproximadamente 13 milhotildees de pessoas13

Em termos nacionais a intensidade do movimento de desruralizaccedilatildeo segundo

os autores parece natildeo ter diminuiacutedo muito nos uacuteltimos 50 anos Entre 1950 e 1980 as

aacutereas rurais das regiotildees Sudeste e Sul forneceram um volume expressivo de novos

moradores para as aacutereas urbanas14 Para os autores como realizavam a pesquisa em fins

da deacutecada de 1990 suas impressotildees indicavam uma continuidade desse processo

Desde 1950 a cada 10 anos um em cada trecircs brasileiros vivendo no meio rural opta pela emigraccedilatildeo Os anos 90 natildeo arrefeceram em muito esta tendecircncia se as taxas de evasatildeo do meio rural observadas entre 1990 e 1995 persistirem pelo restante da deacutecada quase 30 dos brasileiros que entatildeo viviam no campo em 1990 teratildeo mudado seu local de residecircncia na virada do milecircnio15

Ainda que os autores analisem no campo da geografia demograacutefica apoiando-se

na noccedilatildeo de ecircxodo rural estes trazem ldquoo modo de vida no campordquo como incocircmodo para

a realizaccedilatildeo da pesquisa traduzido nas movimentaccedilotildees desses brasileiros entre o campo

e a cidade alteraccedilotildees natildeo soacute espaciais mas no modo como vivem e enfrentam

determinadas relaccedilotildees de poder

Estes se movimentam de acordo com as expectativas e interesses que produzem

como necessidades reorganizando as relaccedilotildees de trabalho e modos de vida diante de

pressotildees de reestruturaccedilatildeo da produccedilatildeo e da ocupaccedilatildeo das aacutereas rurais brasileiras da

13 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 14 IBIDEM 15 IBIDEM p 6

17

segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual

natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na

promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo

De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970

aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do

municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as

principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos

Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio

exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX

Graacutefico 1

Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)

Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e

principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a

distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando

Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de

1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea

urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave

expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de

vestuaacuterio moda bebecirc

16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013

18

Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no

municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo

urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e

insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo

na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e

incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola

em moldes capitalistas na cidade 17

A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas

unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha

o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade

em muitos casos diretamente com o consumidor

Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que

discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em

Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo

provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que

Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18

No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da

populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente

ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da

maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio

alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo

aponta um processo tranquilo

17

GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18

FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9

19

As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos

oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute

mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise

- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o

cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que

A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19

A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o

trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe

quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar

com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de

banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe

pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo

Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um

grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir

ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados

da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia

por um nuacutemero reduzido de vagas

Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo

saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por

um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria

condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses

19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33

20

trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de

induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade

Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu

entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria

seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas

vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece

Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20

A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves

induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos

perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas

de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para

Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida

Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como

citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este

processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de

Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande

decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio

Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do

IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que

formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho

atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores

mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que

permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram

como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras

atividades tambeacutem inconstantes

A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em

2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que

residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo

por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos

20

JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

21

sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)

estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos

produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no

transporte e venda de mercadorias21

O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os

trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira

produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no

contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria

e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas

Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua

forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de

escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma

grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de

mercadorias criminalizado como contrabando

O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online

Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o

narcotraacuteficordquo aponta que

Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122

A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida

com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que

almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores

apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os

21

CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013

22

oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando

permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute

associada a comprar roupas e tecircnis de marca

O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a

intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda

de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre

alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para

frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc

No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses

trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego

Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso

Frederico afirma que

Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23

A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da

agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em

segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees

No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este

processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas

nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica

quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo

Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24

23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

23

Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo

para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O

trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do

patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo

lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos

trabalhadores pela induacutestria ele me diz que

Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25

Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural

da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas

relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar

com essa nova dinacircmica

Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo

visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas

vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se

aproxima da percepccedilatildeo de Carlos

Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26

Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para

ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes

se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio

trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as

ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que

pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha

25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11

24

trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem

trabalho

Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe

complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho

pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida

que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram

Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no

campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e

trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte

das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave

trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a

perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura

Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27

Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de

alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute

registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses

trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas

A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade

de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As

oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um

maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa

condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos

desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor

a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado

O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos

Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo

Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa

27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10

25

Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28

Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas

anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do

empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da

cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram

nesse processo

O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho

financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para

empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a

demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de

trabalhadores agrave disposiccedilatildeo

Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no

municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do

empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor

produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que

A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29

Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos

gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por

ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e

possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio

A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees

municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno

28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM

26

desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos

proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e

do APL do vestuaacuterio na cidade 31

No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi

substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e

mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e

vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa

aacutereardquo

Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do

Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos

profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes

tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o

interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo

de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores

tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo

foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal

finalidade

De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho

rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da

folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo

A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como

Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes

Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o

municiacutepio de Terra Roxa

30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

27

Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34

O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de

trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda

continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila

tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de

garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno

dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o

campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre

os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal

As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma

alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida

ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores

possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -

com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou

outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por

perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista

dentre outros natildeo os oferece

Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes

trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de

classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de

melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no

ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a

trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em

outra cidade ela me disse que

Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35

34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

28

Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave

mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem

organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de

novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar

com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as

expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita

vantagem assimrdquo

Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para

Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se

demo na faacutebricardquo36

Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram

trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar

mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia

com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando

pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que

Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37

Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter

voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no

campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em

Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que

natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar

36 IDEM 37 IDEM

29

As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila

pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com

a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma

mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila

natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na

narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do

casal

Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas

construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril

Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho

na faacutebrica ela me disse que

Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38

Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que

gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as

dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores

preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica

ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na

avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em

conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho

O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como

Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos

indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em

casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria

Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista

Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim

38 IDEM

30

de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por

menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes

oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc

como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado

na Escola do Trabalho

Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o

tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram

mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias

permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas

relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais

Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns

trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de

compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas

tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa

39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

31

CAPIacuteTULO 2

TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40

Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa

natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O

municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande

polo de empregos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de

investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade

de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um

grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41

Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo

como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem

indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e

aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de

desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente

O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de

julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do

Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para

bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda

afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um

terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio

A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral

retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o

40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013

32

processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no

ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir

Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa

fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda

bebecirc pra terra roxa

Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43

A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande

destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da

cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra

Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o

municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo

queacuterdquo

No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves

transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que

este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo

sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em

resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores

Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa

industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo

enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa

Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20

principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a

43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

33

janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos

registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores

vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e

desligamento nesses setores

Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa

Meses Jan de 2003 a Jan de 2011

CBO ndash Frequumlecircncia

Admissotildees Desligamentos

Saldo

1ordm Emp

Reemp

Reint

C Prz Det

Transf

Total

Disp sem J Causa

Disp com J Causa

A Pedido

Term Contr

Aposent

Morte

Term C Prz Deter

Transf

Total

Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da

confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390

Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443

Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie

271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109

Costureira de peccedilas sob encomenda

171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em

geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio

varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina

60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio

em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina

bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas

34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27

Trabalhador agropecuaacuterio em geral

19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador

de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5

Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39

Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie

6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras

10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente

administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio

32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa

24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27

Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013

34

Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

35

Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

36

mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

37

curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

38

Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

41

que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

42

Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

45

Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

11

Isso quer dizer que os historiadores podem selecionar essa ou aquela evidecircncia

propor novas perguntas mas isso natildeo significa que os proacuteprios acontecimentos passados

se modifiquem nem tampouco que seja um agregado de histoacuterias separadas Embora

essa interpretaccedilatildeo do processo histoacuterico surja em resposta agrave pergunta formulada nossa

produccedilatildeo natildeo inventa o processo e natildeo pode modificar o ldquostatus ontoloacutegicordquo do

passado

Eacute nesta perspectiva de anaacutelise que conduziremos este pesquisa Cabe contudo

salientar a contribuiccedilatildeo que esta nos proporciona para a compreensatildeo que proponho

sobre as relaccedilotildees de trabalho experiecircncias e interpretaccedilotildees dos trabalhadores nas

induacutestrias de confecccedilatildeo de moda bebecirc em Terra Roxa Para tanto pensaremos a histoacuteria

em um duplo sentido como experiecircncia humana e como a proacutepria narraccedilatildeo dessas

experiecircncias as interpretaccedilotildees e projeccedilotildees das quais o investigador vai utilizar6

A investigaccedilatildeo neste sentido estaacute relacionada com as problemaacuteticas que o

pesquisador se coloca no presente que envolvem sua experiecircncia de vida e as

concepccedilotildees da qual parte

Pretendo entender a partir das experiecircncias narradas por esses trabalhadores

como eles se inserem e interpretam este mercado de trabalho e fazem prospecccedilotildees

Segundo Thompson

Se determos a histoacuteria num determinado ponto natildeo haacute classe mas simplesmente uma multidatildeo de indiviacuteduos com amontoado de experiecircncias Mas se examinarmos esses homens durante um periacuteodo adequado de mudanccedilas sociais observaremos padrotildees em suas relaccedilotildees sua ideias e instituiccedilotildees A classe eacute definida pelos homens enquanto vivem sua proacutepria histoacuteria e ao final esta eacute sua definiccedilatildeo7

Neste sentido para entendermos os trabalhadores eacute necessaacuteria uma serie de

observaccedilotildees e anaacutelises que se expressam em suas praacuteticas cotidianas como eles

vivenciam e se portam perante sua dinacircmica de trabalho o que possibilita sua formaccedilatildeo

cultural e social

Para esse processo interpretativo utilizamos cinco entrevistas que realizei com

trabalhadores no intuito de potencializar as elaboraccedilotildees construiacutedas por esses sujeitos

sobre as motivaccedilotildees interesses e conflitos ou seja memoacuterias produzidas sobre

6 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987 7 THOMPSON E P ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12

12

trajetoacuterias e experiecircncia social compartilhada nas relaccedilotildees dentro e fora das induacutestrias

de vestuaacuterio na cidade

Como um dos meacutetodos de pesquisa foi trabalhar com fontes orais considero

importante apontar algumas dificuldades que encontrei ao realizar algumas entrevistas

Mesmo o municiacutepio empregando mais de 2500 trabalhadores na induacutestria de confecccedilatildeo

minha principal dificuldade foi encontrar trabalhadores que se dispusessem a realizar as

entrevistas

Aqueles que aceitavam soacute concordavam em produzir a entrevista quando

algueacutem muito proacuteximo deles me apresentava O fato de alguns trabalhadores aceitarem

natildeo excluiu a desconfianccedila e inseguranccedila que estes possuiacuteam em relaccedilatildeo agraves entrevistas

Desta forma a inseguranccedila dos trabalhadores sobre se poderiam falar ou natildeo a

respeito de suas relaccedilotildees de trabalho juntamente com a minha falta de experiecircncia em

saber lidar com essas inseguranccedilas prejudicaram o desenvolvimento das entrevistas

As respostas ficaram limitadas ao roteiro muitas vezes limitadas ao ldquosimrdquo ou ao ldquonatildeordquo

Pois aleacutem da timidez ao saberem que estatildeo sendo gravados ainda tive que lidar com o

receio dos entrevistados ao exporem sua trajetoacuteria e condiccedilotildees de vida

As entrevistas orais natildeo foram produto de teacutecnica mas das relaccedilotildees que

consegui desenvolver com esses trabalhadores Portanto o meacutetodo de utilizar fontes

orais consiste em trabalhar com a subjetividade dos indiviacuteduos lidando com as questotildees

postas pelos entrevistados a partir de minhas proacuteprias questotildees

Neste sentido o diaacutelogo com Alessandro Portelli e com outros autores ajudou a

compreender que essa relaccedilatildeo entre entrevistado e entrevistador natildeo eacute um objetivo

muito faacutecil de ser alcanccedilado pois as pessoas reinterpretam e datildeo novos significados aos

acontecimentos passados em funccedilatildeo do que vive no presente ou espera viver Ou ainda

encobrem sentimentos e interpretaccedilotildees por censura repressatildeo temores ou pela pouca

disposiccedilatildeo em falar8

Ao utilizar a fonte oral foi importante dialogar com a produccedilatildeo de Alessandro

Portelli o qual contribuiu para a construccedilatildeo de um procedimento de anaacutelise para a

produccedilatildeo das fontes orais e do olhar lanccedilado sobre esse material O uso de tal fonte na

pesquisa permitiu o enfrentamento da dinacircmica contraditoacuteria de valores e praacuteticas que

compotildeem escolhas pressotildees e expectativas desses sujeitos sociais

8 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 p33

13

Nesse sentido permite maior visibilidade poliacutetica da classe trabalhadora com

suas divisotildees e processos de identificaccedilatildeo na condiccedilatildeo de classe compartilhada

produzindo assim uma interpretaccedilatildeo histoacuterica comprometida com o potencial de luta e

intervenccedilatildeo social desses trabalhadores Essa investigaccedilatildeo tambeacutem traz como

enfrentamento lidar com os limites dessa fonte como as dificuldades de conseguir a

aceitaccedilatildeo da gravaccedilatildeo da entrevista e contatar trabalhadores9

O intuito de usarmos a fonte oral nesta pesquisa inspira-se nesta perspectiva de

Portelli Buscamos o trabalho com as entrevista natildeo como confirmaccedilatildeo de uma ldquoteserdquo

inicial mas sim com a intenccedilatildeo de dar visibilidade agraves interpretaccedilotildees construiacutedas pelos

trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa

Para tal associamos essa documentaccedilatildeo com mateacuterias jornaliacutesticas e fichas de

inscriccedilatildeo em cursos (de corte costura e bordado) na Escola do trabalho na cidade Aleacutem

da interpretaccedilatildeo de iacutendices estatiacutesticos sobre empregabilidade atividades econocircmicas

etc

O presente trabalho estaacute estruturado em dois capiacutetulos No primeiro capiacutetulo

busquei analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agrave

induacutestria de moda bebecirc a fim de compreender os motivos que levam esses sujeitos a

perceber a expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de

melhoria e mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas e na permanecircncia em Terra Roxa

No segundo capiacutetulo busco discutir a partir das experiecircncias cotidianas e das

relaccedilotildees de trabalho desses sujeitos as possibilidades e limites das expectativas que

estes trabalhadores estabelecem em relaccedilatildeo ao trabalho na induacutestria de moda bebecirc tal

qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre o

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa10

Essa intenccedilatildeo tenta se distanciar de determinados campos analiacuteticos que

sustentam essa expansatildeo industrial como sinocircnimo de desenvolvimento arraigados

na promoccedilatildeo de certos projetos empresariais e na historicidade progressista de alguns

processos de expansatildeo urbana Ao fazer esse distanciamento o interesse eacute ampliar o

9 PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 10 As induacutestrias de Terra Roxa estatildeo inseridas no Arranjo Produtivo Local (APL) criado em 2004 para oferecer subsiacutedios e aperfeiccediloamento aos empresaacuterios O APL da moda bebecirc visa entre outros aspectos maior eficiecircncia de inserccedilatildeo dos produtos da induacutestria de vestuaacuterio no mercado maior poder de negociaccedilatildeo de preccedilo da mateacuteria-prima atraccedilatildeo de novos prestadores de serviccedilos ao municiacutepio e otimizaccedilatildeo de custos com a qualificaccedilatildeo da matildeo de obra Esse assessoramento procura oferecer ao empresariado condiccedilotildees de mercado e apoio para fixaccedilatildeo em determinadas regiotildees

14

campo de anaacutelise apresentando contradiccedilotildees e tensotildees nesse percurso dirigindo atenccedilatildeo

aos trabalhadores mais do que agrave faacutebrica e ao sistema produtivo por ele mesmo11

Ao realizar esta pesquisa minha preocupaccedilatildeo se pauta em mostrar que estes

sujeitos satildeo seres conscientes de sua posiccedilatildeo enquanto sujeitos sociais e procuro

ressaltar que estes trabalhadores fazem parte deste processo histoacuterico enquanto

indiviacuteduos ativos mesmo que indiretamente intervenham nos rumos e ritmo dessa

expansatildeo industrial

Assim busquei com este trabalho explorar a partir das narrativas dos

trabalhadores e de suas experiecircncias entender natildeo somente estes sujeitos mas as

expectativas que estes constroem e as relaccedilotildees que estabelecem com o trabalho para a

promoccedilatildeo de seus interesses

11 O trabalho de Godoy procura fazer um percurso acadecircmico das nuances e alteraccedilotildees na abordagem do universo fabril Assim como Paoli Sader e Telles recolocam alguns enfrentamentos - na percepccedilatildeo de suas atuaccedilotildees e construccedilatildeo de sentidos - para aqueles que procuram perceber os trabalhadores neste cenaacuterio operaacuterio brasileiro Ver -GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 -PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198

15

CAPIacuteTULO 1

TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc

[] Com o tempo depois que essas empresas dede crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram mais faacuteceis neacute []12

Neste capiacutetulo vamos analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente

estatildeo ou que em algum momento de suas vidas estiveram vinculados agraves induacutestrias de

confecccedilatildeo de moda bebecirc do municiacutepio de Terra Roxa- PR mas que trazem em sua

trajetoacuteria uma relaccedilatildeo com o trabalho moradia e valores advindo do campo O objetivo

eacute problematizar suas avaliaccedilotildees frente agrave ldquoexpansatildeordquo industrial do municiacutepio e como essa

dialoga com seus interesses e necessidades

Ao analisarmos algumas entrevistas de trabalhadores vinculados a estas

induacutestrias foi comum encontrar assim como na narrativa citada na epiacutegrafe deste

capiacutetulo narrativas nesta perspectiva na qual os empregos gerados pela industrializaccedilatildeo

satildeo interpretados como possibilidade de melhoria na condiccedilatildeo de vida dos

trabalhadores Percebemos assim que o municiacutepio estaacute constantemente sendo indicado

como um grande polo de empregos mas essa indicaccedilatildeo natildeo resume as ponderaccedilotildees que

fazem sobre a presenccedila industrial em Terra Roxa - porque tambeacutem apontam elementos

que contradizem essa presenccedila

Buscaremos entatildeo dialogar com as fontes orais produzidas com trabalhadores

que se relacionaram com induacutestria de confecccedilatildeo procurando discutir tambeacutem alguns

trabalhos acadecircmicos que analisam praacuteticas dos trabalhadores em Terra Roxa A fim de

compreender a trajetoacuteria destes sujeitos e os motivos que os levam a perceber a

expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de melhoria e

mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas

Para compreendermos melhor estas interpretaccedilotildees fez-se necessaacuterio analisar o

percurso de relaccedilotildees e experiecircncias que construiacuteram Para isso foi importante

12 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

16

dimensionar a cidade na deacutecada de 1970 Momento em que se intensificou a mudanccedila

destes trabalhadores do campo para a cidade (ou ainda para outras regiotildees) ou seja este

foi um periacuteodo de mudanccedilas marcantes nas relaccedilotildees de trabalho onde morar e como

viver natildeo soacute no municiacutepio mas possiacutevel de identificar em outras cidades brasileiras

No trabalho de Ana Ameacutelia Camarano e Ricardo Abramovay haacute o interesse em

apresentar os movimentos migratoacuterios que respondem pelo processo de esvaziamento

da populaccedilatildeo rural no Brasil Os autores observam que ateacute 1980 houve um crescimento

absoluto do saldo populacional que deixou as aacutereas rurais brasileiras Aproximadamente

40 da populaccedilatildeo que vivia nas aacutereas rurais no comeccedilo dos anos 70 migraram nessa

deacutecada O fluxo que deixou o campo nos anos 80 tambeacutem foi expressivo 13 de todos

os que viviam no meio rural em 1980 saiacuteram durante esse periacuteodo o que representou

aproximadamente 13 milhotildees de pessoas13

Em termos nacionais a intensidade do movimento de desruralizaccedilatildeo segundo

os autores parece natildeo ter diminuiacutedo muito nos uacuteltimos 50 anos Entre 1950 e 1980 as

aacutereas rurais das regiotildees Sudeste e Sul forneceram um volume expressivo de novos

moradores para as aacutereas urbanas14 Para os autores como realizavam a pesquisa em fins

da deacutecada de 1990 suas impressotildees indicavam uma continuidade desse processo

Desde 1950 a cada 10 anos um em cada trecircs brasileiros vivendo no meio rural opta pela emigraccedilatildeo Os anos 90 natildeo arrefeceram em muito esta tendecircncia se as taxas de evasatildeo do meio rural observadas entre 1990 e 1995 persistirem pelo restante da deacutecada quase 30 dos brasileiros que entatildeo viviam no campo em 1990 teratildeo mudado seu local de residecircncia na virada do milecircnio15

Ainda que os autores analisem no campo da geografia demograacutefica apoiando-se

na noccedilatildeo de ecircxodo rural estes trazem ldquoo modo de vida no campordquo como incocircmodo para

a realizaccedilatildeo da pesquisa traduzido nas movimentaccedilotildees desses brasileiros entre o campo

e a cidade alteraccedilotildees natildeo soacute espaciais mas no modo como vivem e enfrentam

determinadas relaccedilotildees de poder

Estes se movimentam de acordo com as expectativas e interesses que produzem

como necessidades reorganizando as relaccedilotildees de trabalho e modos de vida diante de

pressotildees de reestruturaccedilatildeo da produccedilatildeo e da ocupaccedilatildeo das aacutereas rurais brasileiras da

13 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 14 IBIDEM 15 IBIDEM p 6

17

segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual

natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na

promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo

De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970

aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do

municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as

principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos

Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio

exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX

Graacutefico 1

Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)

Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e

principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a

distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando

Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de

1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea

urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave

expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de

vestuaacuterio moda bebecirc

16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013

18

Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no

municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo

urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e

insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo

na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e

incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola

em moldes capitalistas na cidade 17

A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas

unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha

o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade

em muitos casos diretamente com o consumidor

Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que

discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em

Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo

provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que

Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18

No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da

populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente

ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da

maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio

alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo

aponta um processo tranquilo

17

GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18

FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9

19

As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos

oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute

mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise

- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o

cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que

A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19

A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o

trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe

quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar

com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de

banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe

pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo

Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um

grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir

ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados

da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia

por um nuacutemero reduzido de vagas

Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo

saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por

um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria

condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses

19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33

20

trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de

induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade

Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu

entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria

seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas

vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece

Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20

A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves

induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos

perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas

de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para

Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida

Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como

citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este

processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de

Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande

decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio

Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do

IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que

formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho

atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores

mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que

permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram

como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras

atividades tambeacutem inconstantes

A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em

2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que

residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo

por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos

20

JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

21

sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)

estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos

produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no

transporte e venda de mercadorias21

O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os

trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira

produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no

contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria

e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas

Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua

forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de

escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma

grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de

mercadorias criminalizado como contrabando

O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online

Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o

narcotraacuteficordquo aponta que

Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122

A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida

com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que

almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores

apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os

21

CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013

22

oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando

permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute

associada a comprar roupas e tecircnis de marca

O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a

intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda

de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre

alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para

frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc

No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses

trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego

Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso

Frederico afirma que

Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23

A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da

agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em

segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees

No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este

processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas

nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica

quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo

Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24

23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

23

Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo

para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O

trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do

patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo

lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos

trabalhadores pela induacutestria ele me diz que

Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25

Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural

da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas

relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar

com essa nova dinacircmica

Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo

visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas

vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se

aproxima da percepccedilatildeo de Carlos

Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26

Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para

ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes

se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio

trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as

ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que

pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha

25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11

24

trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem

trabalho

Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe

complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho

pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida

que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram

Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no

campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e

trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte

das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave

trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a

perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura

Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27

Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de

alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute

registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses

trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas

A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade

de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As

oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um

maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa

condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos

desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor

a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado

O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos

Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo

Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa

27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10

25

Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28

Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas

anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do

empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da

cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram

nesse processo

O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho

financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para

empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a

demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de

trabalhadores agrave disposiccedilatildeo

Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no

municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do

empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor

produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que

A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29

Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos

gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por

ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e

possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio

A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees

municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno

28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM

26

desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos

proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e

do APL do vestuaacuterio na cidade 31

No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi

substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e

mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e

vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa

aacutereardquo

Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do

Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos

profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes

tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o

interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo

de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores

tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo

foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal

finalidade

De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho

rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da

folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo

A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como

Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes

Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o

municiacutepio de Terra Roxa

30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

27

Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34

O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de

trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda

continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila

tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de

garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno

dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o

campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre

os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal

As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma

alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida

ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores

possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -

com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou

outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por

perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista

dentre outros natildeo os oferece

Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes

trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de

classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de

melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no

ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a

trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em

outra cidade ela me disse que

Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35

34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

28

Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave

mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem

organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de

novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar

com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as

expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita

vantagem assimrdquo

Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para

Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se

demo na faacutebricardquo36

Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram

trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar

mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia

com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando

pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que

Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37

Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter

voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no

campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em

Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que

natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar

36 IDEM 37 IDEM

29

As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila

pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com

a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma

mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila

natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na

narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do

casal

Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas

construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril

Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho

na faacutebrica ela me disse que

Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38

Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que

gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as

dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores

preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica

ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na

avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em

conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho

O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como

Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos

indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em

casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria

Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista

Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim

38 IDEM

30

de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por

menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes

oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc

como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado

na Escola do Trabalho

Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o

tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram

mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias

permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas

relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais

Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns

trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de

compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas

tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa

39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

31

CAPIacuteTULO 2

TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40

Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa

natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O

municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande

polo de empregos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de

investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade

de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um

grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41

Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo

como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem

indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e

aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de

desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente

O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de

julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do

Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para

bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda

afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um

terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio

A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral

retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o

40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013

32

processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no

ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir

Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa

fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda

bebecirc pra terra roxa

Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43

A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande

destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da

cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra

Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o

municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo

queacuterdquo

No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves

transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que

este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo

sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em

resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores

Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa

industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo

enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa

Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20

principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a

43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

33

janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos

registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores

vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e

desligamento nesses setores

Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa

Meses Jan de 2003 a Jan de 2011

CBO ndash Frequumlecircncia

Admissotildees Desligamentos

Saldo

1ordm Emp

Reemp

Reint

C Prz Det

Transf

Total

Disp sem J Causa

Disp com J Causa

A Pedido

Term Contr

Aposent

Morte

Term C Prz Deter

Transf

Total

Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da

confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390

Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443

Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie

271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109

Costureira de peccedilas sob encomenda

171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em

geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio

varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina

60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio

em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina

bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas

34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27

Trabalhador agropecuaacuterio em geral

19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador

de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5

Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39

Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie

6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras

10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente

administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio

32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa

24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27

Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013

34

Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

35

Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

36

mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

37

curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

38

Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

41

que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

42

Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

12

trajetoacuterias e experiecircncia social compartilhada nas relaccedilotildees dentro e fora das induacutestrias

de vestuaacuterio na cidade

Como um dos meacutetodos de pesquisa foi trabalhar com fontes orais considero

importante apontar algumas dificuldades que encontrei ao realizar algumas entrevistas

Mesmo o municiacutepio empregando mais de 2500 trabalhadores na induacutestria de confecccedilatildeo

minha principal dificuldade foi encontrar trabalhadores que se dispusessem a realizar as

entrevistas

Aqueles que aceitavam soacute concordavam em produzir a entrevista quando

algueacutem muito proacuteximo deles me apresentava O fato de alguns trabalhadores aceitarem

natildeo excluiu a desconfianccedila e inseguranccedila que estes possuiacuteam em relaccedilatildeo agraves entrevistas

Desta forma a inseguranccedila dos trabalhadores sobre se poderiam falar ou natildeo a

respeito de suas relaccedilotildees de trabalho juntamente com a minha falta de experiecircncia em

saber lidar com essas inseguranccedilas prejudicaram o desenvolvimento das entrevistas

As respostas ficaram limitadas ao roteiro muitas vezes limitadas ao ldquosimrdquo ou ao ldquonatildeordquo

Pois aleacutem da timidez ao saberem que estatildeo sendo gravados ainda tive que lidar com o

receio dos entrevistados ao exporem sua trajetoacuteria e condiccedilotildees de vida

As entrevistas orais natildeo foram produto de teacutecnica mas das relaccedilotildees que

consegui desenvolver com esses trabalhadores Portanto o meacutetodo de utilizar fontes

orais consiste em trabalhar com a subjetividade dos indiviacuteduos lidando com as questotildees

postas pelos entrevistados a partir de minhas proacuteprias questotildees

Neste sentido o diaacutelogo com Alessandro Portelli e com outros autores ajudou a

compreender que essa relaccedilatildeo entre entrevistado e entrevistador natildeo eacute um objetivo

muito faacutecil de ser alcanccedilado pois as pessoas reinterpretam e datildeo novos significados aos

acontecimentos passados em funccedilatildeo do que vive no presente ou espera viver Ou ainda

encobrem sentimentos e interpretaccedilotildees por censura repressatildeo temores ou pela pouca

disposiccedilatildeo em falar8

Ao utilizar a fonte oral foi importante dialogar com a produccedilatildeo de Alessandro

Portelli o qual contribuiu para a construccedilatildeo de um procedimento de anaacutelise para a

produccedilatildeo das fontes orais e do olhar lanccedilado sobre esse material O uso de tal fonte na

pesquisa permitiu o enfrentamento da dinacircmica contraditoacuteria de valores e praacuteticas que

compotildeem escolhas pressotildees e expectativas desses sujeitos sociais

8 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 p33

13

Nesse sentido permite maior visibilidade poliacutetica da classe trabalhadora com

suas divisotildees e processos de identificaccedilatildeo na condiccedilatildeo de classe compartilhada

produzindo assim uma interpretaccedilatildeo histoacuterica comprometida com o potencial de luta e

intervenccedilatildeo social desses trabalhadores Essa investigaccedilatildeo tambeacutem traz como

enfrentamento lidar com os limites dessa fonte como as dificuldades de conseguir a

aceitaccedilatildeo da gravaccedilatildeo da entrevista e contatar trabalhadores9

O intuito de usarmos a fonte oral nesta pesquisa inspira-se nesta perspectiva de

Portelli Buscamos o trabalho com as entrevista natildeo como confirmaccedilatildeo de uma ldquoteserdquo

inicial mas sim com a intenccedilatildeo de dar visibilidade agraves interpretaccedilotildees construiacutedas pelos

trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa

Para tal associamos essa documentaccedilatildeo com mateacuterias jornaliacutesticas e fichas de

inscriccedilatildeo em cursos (de corte costura e bordado) na Escola do trabalho na cidade Aleacutem

da interpretaccedilatildeo de iacutendices estatiacutesticos sobre empregabilidade atividades econocircmicas

etc

O presente trabalho estaacute estruturado em dois capiacutetulos No primeiro capiacutetulo

busquei analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agrave

induacutestria de moda bebecirc a fim de compreender os motivos que levam esses sujeitos a

perceber a expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de

melhoria e mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas e na permanecircncia em Terra Roxa

No segundo capiacutetulo busco discutir a partir das experiecircncias cotidianas e das

relaccedilotildees de trabalho desses sujeitos as possibilidades e limites das expectativas que

estes trabalhadores estabelecem em relaccedilatildeo ao trabalho na induacutestria de moda bebecirc tal

qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre o

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa10

Essa intenccedilatildeo tenta se distanciar de determinados campos analiacuteticos que

sustentam essa expansatildeo industrial como sinocircnimo de desenvolvimento arraigados

na promoccedilatildeo de certos projetos empresariais e na historicidade progressista de alguns

processos de expansatildeo urbana Ao fazer esse distanciamento o interesse eacute ampliar o

9 PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 10 As induacutestrias de Terra Roxa estatildeo inseridas no Arranjo Produtivo Local (APL) criado em 2004 para oferecer subsiacutedios e aperfeiccediloamento aos empresaacuterios O APL da moda bebecirc visa entre outros aspectos maior eficiecircncia de inserccedilatildeo dos produtos da induacutestria de vestuaacuterio no mercado maior poder de negociaccedilatildeo de preccedilo da mateacuteria-prima atraccedilatildeo de novos prestadores de serviccedilos ao municiacutepio e otimizaccedilatildeo de custos com a qualificaccedilatildeo da matildeo de obra Esse assessoramento procura oferecer ao empresariado condiccedilotildees de mercado e apoio para fixaccedilatildeo em determinadas regiotildees

14

campo de anaacutelise apresentando contradiccedilotildees e tensotildees nesse percurso dirigindo atenccedilatildeo

aos trabalhadores mais do que agrave faacutebrica e ao sistema produtivo por ele mesmo11

Ao realizar esta pesquisa minha preocupaccedilatildeo se pauta em mostrar que estes

sujeitos satildeo seres conscientes de sua posiccedilatildeo enquanto sujeitos sociais e procuro

ressaltar que estes trabalhadores fazem parte deste processo histoacuterico enquanto

indiviacuteduos ativos mesmo que indiretamente intervenham nos rumos e ritmo dessa

expansatildeo industrial

Assim busquei com este trabalho explorar a partir das narrativas dos

trabalhadores e de suas experiecircncias entender natildeo somente estes sujeitos mas as

expectativas que estes constroem e as relaccedilotildees que estabelecem com o trabalho para a

promoccedilatildeo de seus interesses

11 O trabalho de Godoy procura fazer um percurso acadecircmico das nuances e alteraccedilotildees na abordagem do universo fabril Assim como Paoli Sader e Telles recolocam alguns enfrentamentos - na percepccedilatildeo de suas atuaccedilotildees e construccedilatildeo de sentidos - para aqueles que procuram perceber os trabalhadores neste cenaacuterio operaacuterio brasileiro Ver -GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 -PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198

15

CAPIacuteTULO 1

TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc

[] Com o tempo depois que essas empresas dede crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram mais faacuteceis neacute []12

Neste capiacutetulo vamos analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente

estatildeo ou que em algum momento de suas vidas estiveram vinculados agraves induacutestrias de

confecccedilatildeo de moda bebecirc do municiacutepio de Terra Roxa- PR mas que trazem em sua

trajetoacuteria uma relaccedilatildeo com o trabalho moradia e valores advindo do campo O objetivo

eacute problematizar suas avaliaccedilotildees frente agrave ldquoexpansatildeordquo industrial do municiacutepio e como essa

dialoga com seus interesses e necessidades

Ao analisarmos algumas entrevistas de trabalhadores vinculados a estas

induacutestrias foi comum encontrar assim como na narrativa citada na epiacutegrafe deste

capiacutetulo narrativas nesta perspectiva na qual os empregos gerados pela industrializaccedilatildeo

satildeo interpretados como possibilidade de melhoria na condiccedilatildeo de vida dos

trabalhadores Percebemos assim que o municiacutepio estaacute constantemente sendo indicado

como um grande polo de empregos mas essa indicaccedilatildeo natildeo resume as ponderaccedilotildees que

fazem sobre a presenccedila industrial em Terra Roxa - porque tambeacutem apontam elementos

que contradizem essa presenccedila

Buscaremos entatildeo dialogar com as fontes orais produzidas com trabalhadores

que se relacionaram com induacutestria de confecccedilatildeo procurando discutir tambeacutem alguns

trabalhos acadecircmicos que analisam praacuteticas dos trabalhadores em Terra Roxa A fim de

compreender a trajetoacuteria destes sujeitos e os motivos que os levam a perceber a

expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de melhoria e

mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas

Para compreendermos melhor estas interpretaccedilotildees fez-se necessaacuterio analisar o

percurso de relaccedilotildees e experiecircncias que construiacuteram Para isso foi importante

12 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

16

dimensionar a cidade na deacutecada de 1970 Momento em que se intensificou a mudanccedila

destes trabalhadores do campo para a cidade (ou ainda para outras regiotildees) ou seja este

foi um periacuteodo de mudanccedilas marcantes nas relaccedilotildees de trabalho onde morar e como

viver natildeo soacute no municiacutepio mas possiacutevel de identificar em outras cidades brasileiras

No trabalho de Ana Ameacutelia Camarano e Ricardo Abramovay haacute o interesse em

apresentar os movimentos migratoacuterios que respondem pelo processo de esvaziamento

da populaccedilatildeo rural no Brasil Os autores observam que ateacute 1980 houve um crescimento

absoluto do saldo populacional que deixou as aacutereas rurais brasileiras Aproximadamente

40 da populaccedilatildeo que vivia nas aacutereas rurais no comeccedilo dos anos 70 migraram nessa

deacutecada O fluxo que deixou o campo nos anos 80 tambeacutem foi expressivo 13 de todos

os que viviam no meio rural em 1980 saiacuteram durante esse periacuteodo o que representou

aproximadamente 13 milhotildees de pessoas13

Em termos nacionais a intensidade do movimento de desruralizaccedilatildeo segundo

os autores parece natildeo ter diminuiacutedo muito nos uacuteltimos 50 anos Entre 1950 e 1980 as

aacutereas rurais das regiotildees Sudeste e Sul forneceram um volume expressivo de novos

moradores para as aacutereas urbanas14 Para os autores como realizavam a pesquisa em fins

da deacutecada de 1990 suas impressotildees indicavam uma continuidade desse processo

Desde 1950 a cada 10 anos um em cada trecircs brasileiros vivendo no meio rural opta pela emigraccedilatildeo Os anos 90 natildeo arrefeceram em muito esta tendecircncia se as taxas de evasatildeo do meio rural observadas entre 1990 e 1995 persistirem pelo restante da deacutecada quase 30 dos brasileiros que entatildeo viviam no campo em 1990 teratildeo mudado seu local de residecircncia na virada do milecircnio15

Ainda que os autores analisem no campo da geografia demograacutefica apoiando-se

na noccedilatildeo de ecircxodo rural estes trazem ldquoo modo de vida no campordquo como incocircmodo para

a realizaccedilatildeo da pesquisa traduzido nas movimentaccedilotildees desses brasileiros entre o campo

e a cidade alteraccedilotildees natildeo soacute espaciais mas no modo como vivem e enfrentam

determinadas relaccedilotildees de poder

Estes se movimentam de acordo com as expectativas e interesses que produzem

como necessidades reorganizando as relaccedilotildees de trabalho e modos de vida diante de

pressotildees de reestruturaccedilatildeo da produccedilatildeo e da ocupaccedilatildeo das aacutereas rurais brasileiras da

13 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 14 IBIDEM 15 IBIDEM p 6

17

segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual

natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na

promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo

De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970

aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do

municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as

principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos

Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio

exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX

Graacutefico 1

Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)

Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e

principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a

distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando

Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de

1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea

urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave

expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de

vestuaacuterio moda bebecirc

16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013

18

Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no

municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo

urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e

insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo

na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e

incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola

em moldes capitalistas na cidade 17

A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas

unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha

o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade

em muitos casos diretamente com o consumidor

Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que

discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em

Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo

provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que

Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18

No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da

populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente

ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da

maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio

alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo

aponta um processo tranquilo

17

GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18

FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9

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As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos

oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute

mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise

- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o

cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que

A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19

A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o

trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe

quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar

com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de

banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe

pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo

Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um

grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir

ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados

da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia

por um nuacutemero reduzido de vagas

Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo

saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por

um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria

condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses

19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33

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trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de

induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade

Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu

entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria

seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas

vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece

Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20

A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves

induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos

perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas

de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para

Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida

Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como

citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este

processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de

Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande

decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio

Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do

IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que

formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho

atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores

mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que

permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram

como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras

atividades tambeacutem inconstantes

A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em

2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que

residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo

por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos

20

JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

21

sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)

estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos

produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no

transporte e venda de mercadorias21

O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os

trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira

produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no

contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria

e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas

Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua

forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de

escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma

grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de

mercadorias criminalizado como contrabando

O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online

Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o

narcotraacuteficordquo aponta que

Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122

A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida

com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que

almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores

apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os

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CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013

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oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando

permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute

associada a comprar roupas e tecircnis de marca

O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a

intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda

de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre

alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para

frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc

No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses

trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego

Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso

Frederico afirma que

Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23

A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da

agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em

segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees

No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este

processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas

nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica

quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo

Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24

23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

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Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo

para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O

trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do

patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo

lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos

trabalhadores pela induacutestria ele me diz que

Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25

Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural

da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas

relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar

com essa nova dinacircmica

Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo

visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas

vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se

aproxima da percepccedilatildeo de Carlos

Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26

Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para

ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes

se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio

trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as

ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que

pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha

25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11

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trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem

trabalho

Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe

complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho

pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida

que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram

Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no

campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e

trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte

das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave

trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a

perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura

Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27

Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de

alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute

registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses

trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas

A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade

de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As

oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um

maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa

condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos

desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor

a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado

O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos

Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo

Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa

27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10

25

Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28

Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas

anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do

empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da

cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram

nesse processo

O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho

financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para

empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a

demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de

trabalhadores agrave disposiccedilatildeo

Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no

municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do

empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor

produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que

A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29

Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos

gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por

ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e

possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio

A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees

municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno

28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM

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desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos

proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e

do APL do vestuaacuterio na cidade 31

No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi

substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e

mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e

vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa

aacutereardquo

Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do

Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos

profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes

tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o

interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo

de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores

tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo

foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal

finalidade

De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho

rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da

folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo

A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como

Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes

Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o

municiacutepio de Terra Roxa

30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

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Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34

O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de

trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda

continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila

tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de

garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno

dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o

campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre

os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal

As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma

alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida

ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores

possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -

com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou

outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por

perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista

dentre outros natildeo os oferece

Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes

trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de

classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de

melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no

ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a

trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em

outra cidade ela me disse que

Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35

34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

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Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave

mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem

organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de

novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar

com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as

expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita

vantagem assimrdquo

Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para

Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se

demo na faacutebricardquo36

Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram

trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar

mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia

com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando

pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que

Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37

Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter

voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no

campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em

Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que

natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar

36 IDEM 37 IDEM

29

As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila

pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com

a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma

mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila

natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na

narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do

casal

Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas

construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril

Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho

na faacutebrica ela me disse que

Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38

Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que

gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as

dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores

preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica

ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na

avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em

conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho

O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como

Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos

indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em

casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria

Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista

Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim

38 IDEM

30

de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por

menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes

oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc

como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado

na Escola do Trabalho

Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o

tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram

mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias

permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas

relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais

Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns

trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de

compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas

tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa

39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

31

CAPIacuteTULO 2

TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40

Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa

natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O

municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande

polo de empregos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de

investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade

de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um

grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41

Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo

como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem

indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e

aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de

desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente

O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de

julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do

Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para

bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda

afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um

terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio

A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral

retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o

40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013

32

processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no

ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir

Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa

fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda

bebecirc pra terra roxa

Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43

A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande

destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da

cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra

Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o

municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo

queacuterdquo

No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves

transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que

este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo

sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em

resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores

Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa

industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo

enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa

Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20

principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a

43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

33

janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos

registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores

vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e

desligamento nesses setores

Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa

Meses Jan de 2003 a Jan de 2011

CBO ndash Frequumlecircncia

Admissotildees Desligamentos

Saldo

1ordm Emp

Reemp

Reint

C Prz Det

Transf

Total

Disp sem J Causa

Disp com J Causa

A Pedido

Term Contr

Aposent

Morte

Term C Prz Deter

Transf

Total

Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da

confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390

Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443

Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie

271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109

Costureira de peccedilas sob encomenda

171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em

geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio

varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina

60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio

em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina

bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas

34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27

Trabalhador agropecuaacuterio em geral

19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador

de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5

Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39

Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie

6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras

10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente

administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio

32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa

24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27

Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013

34

Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

35

Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

36

mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

37

curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

38

Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

41

que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

42

Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

45

Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

46

Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

13

Nesse sentido permite maior visibilidade poliacutetica da classe trabalhadora com

suas divisotildees e processos de identificaccedilatildeo na condiccedilatildeo de classe compartilhada

produzindo assim uma interpretaccedilatildeo histoacuterica comprometida com o potencial de luta e

intervenccedilatildeo social desses trabalhadores Essa investigaccedilatildeo tambeacutem traz como

enfrentamento lidar com os limites dessa fonte como as dificuldades de conseguir a

aceitaccedilatildeo da gravaccedilatildeo da entrevista e contatar trabalhadores9

O intuito de usarmos a fonte oral nesta pesquisa inspira-se nesta perspectiva de

Portelli Buscamos o trabalho com as entrevista natildeo como confirmaccedilatildeo de uma ldquoteserdquo

inicial mas sim com a intenccedilatildeo de dar visibilidade agraves interpretaccedilotildees construiacutedas pelos

trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa

Para tal associamos essa documentaccedilatildeo com mateacuterias jornaliacutesticas e fichas de

inscriccedilatildeo em cursos (de corte costura e bordado) na Escola do trabalho na cidade Aleacutem

da interpretaccedilatildeo de iacutendices estatiacutesticos sobre empregabilidade atividades econocircmicas

etc

O presente trabalho estaacute estruturado em dois capiacutetulos No primeiro capiacutetulo

busquei analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agrave

induacutestria de moda bebecirc a fim de compreender os motivos que levam esses sujeitos a

perceber a expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de

melhoria e mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas e na permanecircncia em Terra Roxa

No segundo capiacutetulo busco discutir a partir das experiecircncias cotidianas e das

relaccedilotildees de trabalho desses sujeitos as possibilidades e limites das expectativas que

estes trabalhadores estabelecem em relaccedilatildeo ao trabalho na induacutestria de moda bebecirc tal

qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre o

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa10

Essa intenccedilatildeo tenta se distanciar de determinados campos analiacuteticos que

sustentam essa expansatildeo industrial como sinocircnimo de desenvolvimento arraigados

na promoccedilatildeo de certos projetos empresariais e na historicidade progressista de alguns

processos de expansatildeo urbana Ao fazer esse distanciamento o interesse eacute ampliar o

9 PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 10 As induacutestrias de Terra Roxa estatildeo inseridas no Arranjo Produtivo Local (APL) criado em 2004 para oferecer subsiacutedios e aperfeiccediloamento aos empresaacuterios O APL da moda bebecirc visa entre outros aspectos maior eficiecircncia de inserccedilatildeo dos produtos da induacutestria de vestuaacuterio no mercado maior poder de negociaccedilatildeo de preccedilo da mateacuteria-prima atraccedilatildeo de novos prestadores de serviccedilos ao municiacutepio e otimizaccedilatildeo de custos com a qualificaccedilatildeo da matildeo de obra Esse assessoramento procura oferecer ao empresariado condiccedilotildees de mercado e apoio para fixaccedilatildeo em determinadas regiotildees

14

campo de anaacutelise apresentando contradiccedilotildees e tensotildees nesse percurso dirigindo atenccedilatildeo

aos trabalhadores mais do que agrave faacutebrica e ao sistema produtivo por ele mesmo11

Ao realizar esta pesquisa minha preocupaccedilatildeo se pauta em mostrar que estes

sujeitos satildeo seres conscientes de sua posiccedilatildeo enquanto sujeitos sociais e procuro

ressaltar que estes trabalhadores fazem parte deste processo histoacuterico enquanto

indiviacuteduos ativos mesmo que indiretamente intervenham nos rumos e ritmo dessa

expansatildeo industrial

Assim busquei com este trabalho explorar a partir das narrativas dos

trabalhadores e de suas experiecircncias entender natildeo somente estes sujeitos mas as

expectativas que estes constroem e as relaccedilotildees que estabelecem com o trabalho para a

promoccedilatildeo de seus interesses

11 O trabalho de Godoy procura fazer um percurso acadecircmico das nuances e alteraccedilotildees na abordagem do universo fabril Assim como Paoli Sader e Telles recolocam alguns enfrentamentos - na percepccedilatildeo de suas atuaccedilotildees e construccedilatildeo de sentidos - para aqueles que procuram perceber os trabalhadores neste cenaacuterio operaacuterio brasileiro Ver -GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 -PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198

15

CAPIacuteTULO 1

TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc

[] Com o tempo depois que essas empresas dede crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram mais faacuteceis neacute []12

Neste capiacutetulo vamos analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente

estatildeo ou que em algum momento de suas vidas estiveram vinculados agraves induacutestrias de

confecccedilatildeo de moda bebecirc do municiacutepio de Terra Roxa- PR mas que trazem em sua

trajetoacuteria uma relaccedilatildeo com o trabalho moradia e valores advindo do campo O objetivo

eacute problematizar suas avaliaccedilotildees frente agrave ldquoexpansatildeordquo industrial do municiacutepio e como essa

dialoga com seus interesses e necessidades

Ao analisarmos algumas entrevistas de trabalhadores vinculados a estas

induacutestrias foi comum encontrar assim como na narrativa citada na epiacutegrafe deste

capiacutetulo narrativas nesta perspectiva na qual os empregos gerados pela industrializaccedilatildeo

satildeo interpretados como possibilidade de melhoria na condiccedilatildeo de vida dos

trabalhadores Percebemos assim que o municiacutepio estaacute constantemente sendo indicado

como um grande polo de empregos mas essa indicaccedilatildeo natildeo resume as ponderaccedilotildees que

fazem sobre a presenccedila industrial em Terra Roxa - porque tambeacutem apontam elementos

que contradizem essa presenccedila

Buscaremos entatildeo dialogar com as fontes orais produzidas com trabalhadores

que se relacionaram com induacutestria de confecccedilatildeo procurando discutir tambeacutem alguns

trabalhos acadecircmicos que analisam praacuteticas dos trabalhadores em Terra Roxa A fim de

compreender a trajetoacuteria destes sujeitos e os motivos que os levam a perceber a

expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de melhoria e

mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas

Para compreendermos melhor estas interpretaccedilotildees fez-se necessaacuterio analisar o

percurso de relaccedilotildees e experiecircncias que construiacuteram Para isso foi importante

12 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

16

dimensionar a cidade na deacutecada de 1970 Momento em que se intensificou a mudanccedila

destes trabalhadores do campo para a cidade (ou ainda para outras regiotildees) ou seja este

foi um periacuteodo de mudanccedilas marcantes nas relaccedilotildees de trabalho onde morar e como

viver natildeo soacute no municiacutepio mas possiacutevel de identificar em outras cidades brasileiras

No trabalho de Ana Ameacutelia Camarano e Ricardo Abramovay haacute o interesse em

apresentar os movimentos migratoacuterios que respondem pelo processo de esvaziamento

da populaccedilatildeo rural no Brasil Os autores observam que ateacute 1980 houve um crescimento

absoluto do saldo populacional que deixou as aacutereas rurais brasileiras Aproximadamente

40 da populaccedilatildeo que vivia nas aacutereas rurais no comeccedilo dos anos 70 migraram nessa

deacutecada O fluxo que deixou o campo nos anos 80 tambeacutem foi expressivo 13 de todos

os que viviam no meio rural em 1980 saiacuteram durante esse periacuteodo o que representou

aproximadamente 13 milhotildees de pessoas13

Em termos nacionais a intensidade do movimento de desruralizaccedilatildeo segundo

os autores parece natildeo ter diminuiacutedo muito nos uacuteltimos 50 anos Entre 1950 e 1980 as

aacutereas rurais das regiotildees Sudeste e Sul forneceram um volume expressivo de novos

moradores para as aacutereas urbanas14 Para os autores como realizavam a pesquisa em fins

da deacutecada de 1990 suas impressotildees indicavam uma continuidade desse processo

Desde 1950 a cada 10 anos um em cada trecircs brasileiros vivendo no meio rural opta pela emigraccedilatildeo Os anos 90 natildeo arrefeceram em muito esta tendecircncia se as taxas de evasatildeo do meio rural observadas entre 1990 e 1995 persistirem pelo restante da deacutecada quase 30 dos brasileiros que entatildeo viviam no campo em 1990 teratildeo mudado seu local de residecircncia na virada do milecircnio15

Ainda que os autores analisem no campo da geografia demograacutefica apoiando-se

na noccedilatildeo de ecircxodo rural estes trazem ldquoo modo de vida no campordquo como incocircmodo para

a realizaccedilatildeo da pesquisa traduzido nas movimentaccedilotildees desses brasileiros entre o campo

e a cidade alteraccedilotildees natildeo soacute espaciais mas no modo como vivem e enfrentam

determinadas relaccedilotildees de poder

Estes se movimentam de acordo com as expectativas e interesses que produzem

como necessidades reorganizando as relaccedilotildees de trabalho e modos de vida diante de

pressotildees de reestruturaccedilatildeo da produccedilatildeo e da ocupaccedilatildeo das aacutereas rurais brasileiras da

13 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 14 IBIDEM 15 IBIDEM p 6

17

segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual

natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na

promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo

De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970

aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do

municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as

principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos

Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio

exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX

Graacutefico 1

Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)

Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e

principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a

distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando

Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de

1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea

urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave

expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de

vestuaacuterio moda bebecirc

16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013

18

Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no

municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo

urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e

insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo

na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e

incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola

em moldes capitalistas na cidade 17

A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas

unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha

o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade

em muitos casos diretamente com o consumidor

Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que

discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em

Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo

provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que

Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18

No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da

populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente

ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da

maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio

alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo

aponta um processo tranquilo

17

GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18

FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9

19

As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos

oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute

mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise

- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o

cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que

A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19

A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o

trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe

quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar

com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de

banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe

pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo

Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um

grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir

ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados

da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia

por um nuacutemero reduzido de vagas

Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo

saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por

um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria

condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses

19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33

20

trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de

induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade

Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu

entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria

seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas

vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece

Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20

A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves

induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos

perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas

de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para

Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida

Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como

citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este

processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de

Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande

decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio

Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do

IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que

formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho

atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores

mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que

permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram

como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras

atividades tambeacutem inconstantes

A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em

2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que

residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo

por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos

20

JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

21

sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)

estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos

produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no

transporte e venda de mercadorias21

O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os

trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira

produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no

contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria

e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas

Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua

forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de

escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma

grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de

mercadorias criminalizado como contrabando

O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online

Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o

narcotraacuteficordquo aponta que

Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122

A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida

com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que

almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores

apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os

21

CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013

22

oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando

permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute

associada a comprar roupas e tecircnis de marca

O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a

intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda

de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre

alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para

frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc

No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses

trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego

Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso

Frederico afirma que

Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23

A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da

agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em

segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees

No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este

processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas

nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica

quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo

Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24

23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

23

Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo

para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O

trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do

patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo

lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos

trabalhadores pela induacutestria ele me diz que

Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25

Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural

da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas

relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar

com essa nova dinacircmica

Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo

visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas

vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se

aproxima da percepccedilatildeo de Carlos

Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26

Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para

ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes

se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio

trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as

ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que

pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha

25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11

24

trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem

trabalho

Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe

complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho

pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida

que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram

Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no

campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e

trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte

das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave

trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a

perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura

Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27

Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de

alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute

registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses

trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas

A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade

de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As

oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um

maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa

condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos

desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor

a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado

O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos

Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo

Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa

27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10

25

Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28

Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas

anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do

empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da

cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram

nesse processo

O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho

financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para

empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a

demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de

trabalhadores agrave disposiccedilatildeo

Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no

municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do

empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor

produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que

A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29

Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos

gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por

ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e

possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio

A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees

municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno

28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM

26

desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos

proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e

do APL do vestuaacuterio na cidade 31

No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi

substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e

mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e

vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa

aacutereardquo

Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do

Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos

profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes

tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o

interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo

de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores

tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo

foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal

finalidade

De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho

rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da

folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo

A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como

Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes

Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o

municiacutepio de Terra Roxa

30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

27

Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34

O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de

trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda

continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila

tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de

garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno

dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o

campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre

os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal

As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma

alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida

ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores

possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -

com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou

outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por

perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista

dentre outros natildeo os oferece

Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes

trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de

classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de

melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no

ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a

trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em

outra cidade ela me disse que

Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35

34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

28

Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave

mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem

organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de

novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar

com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as

expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita

vantagem assimrdquo

Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para

Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se

demo na faacutebricardquo36

Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram

trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar

mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia

com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando

pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que

Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37

Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter

voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no

campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em

Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que

natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar

36 IDEM 37 IDEM

29

As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila

pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com

a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma

mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila

natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na

narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do

casal

Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas

construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril

Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho

na faacutebrica ela me disse que

Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38

Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que

gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as

dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores

preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica

ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na

avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em

conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho

O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como

Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos

indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em

casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria

Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista

Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim

38 IDEM

30

de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por

menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes

oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc

como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado

na Escola do Trabalho

Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o

tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram

mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias

permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas

relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais

Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns

trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de

compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas

tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa

39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

31

CAPIacuteTULO 2

TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40

Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa

natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O

municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande

polo de empregos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de

investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade

de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um

grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41

Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo

como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem

indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e

aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de

desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente

O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de

julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do

Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para

bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda

afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um

terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio

A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral

retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o

40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013

32

processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no

ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir

Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa

fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda

bebecirc pra terra roxa

Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43

A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande

destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da

cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra

Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o

municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo

queacuterdquo

No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves

transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que

este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo

sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em

resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores

Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa

industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo

enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa

Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20

principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a

43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

33

janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos

registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores

vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e

desligamento nesses setores

Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa

Meses Jan de 2003 a Jan de 2011

CBO ndash Frequumlecircncia

Admissotildees Desligamentos

Saldo

1ordm Emp

Reemp

Reint

C Prz Det

Transf

Total

Disp sem J Causa

Disp com J Causa

A Pedido

Term Contr

Aposent

Morte

Term C Prz Deter

Transf

Total

Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da

confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390

Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443

Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie

271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109

Costureira de peccedilas sob encomenda

171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em

geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio

varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina

60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio

em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina

bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas

34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27

Trabalhador agropecuaacuterio em geral

19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador

de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5

Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39

Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie

6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras

10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente

administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio

32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa

24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27

Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013

34

Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

35

Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

36

mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

37

curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

38

Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

41

que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

42

Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

44

industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

45

Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

46

Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

14

campo de anaacutelise apresentando contradiccedilotildees e tensotildees nesse percurso dirigindo atenccedilatildeo

aos trabalhadores mais do que agrave faacutebrica e ao sistema produtivo por ele mesmo11

Ao realizar esta pesquisa minha preocupaccedilatildeo se pauta em mostrar que estes

sujeitos satildeo seres conscientes de sua posiccedilatildeo enquanto sujeitos sociais e procuro

ressaltar que estes trabalhadores fazem parte deste processo histoacuterico enquanto

indiviacuteduos ativos mesmo que indiretamente intervenham nos rumos e ritmo dessa

expansatildeo industrial

Assim busquei com este trabalho explorar a partir das narrativas dos

trabalhadores e de suas experiecircncias entender natildeo somente estes sujeitos mas as

expectativas que estes constroem e as relaccedilotildees que estabelecem com o trabalho para a

promoccedilatildeo de seus interesses

11 O trabalho de Godoy procura fazer um percurso acadecircmico das nuances e alteraccedilotildees na abordagem do universo fabril Assim como Paoli Sader e Telles recolocam alguns enfrentamentos - na percepccedilatildeo de suas atuaccedilotildees e construccedilatildeo de sentidos - para aqueles que procuram perceber os trabalhadores neste cenaacuterio operaacuterio brasileiro Ver -GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 -PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198

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CAPIacuteTULO 1

TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc

[] Com o tempo depois que essas empresas dede crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram mais faacuteceis neacute []12

Neste capiacutetulo vamos analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente

estatildeo ou que em algum momento de suas vidas estiveram vinculados agraves induacutestrias de

confecccedilatildeo de moda bebecirc do municiacutepio de Terra Roxa- PR mas que trazem em sua

trajetoacuteria uma relaccedilatildeo com o trabalho moradia e valores advindo do campo O objetivo

eacute problematizar suas avaliaccedilotildees frente agrave ldquoexpansatildeordquo industrial do municiacutepio e como essa

dialoga com seus interesses e necessidades

Ao analisarmos algumas entrevistas de trabalhadores vinculados a estas

induacutestrias foi comum encontrar assim como na narrativa citada na epiacutegrafe deste

capiacutetulo narrativas nesta perspectiva na qual os empregos gerados pela industrializaccedilatildeo

satildeo interpretados como possibilidade de melhoria na condiccedilatildeo de vida dos

trabalhadores Percebemos assim que o municiacutepio estaacute constantemente sendo indicado

como um grande polo de empregos mas essa indicaccedilatildeo natildeo resume as ponderaccedilotildees que

fazem sobre a presenccedila industrial em Terra Roxa - porque tambeacutem apontam elementos

que contradizem essa presenccedila

Buscaremos entatildeo dialogar com as fontes orais produzidas com trabalhadores

que se relacionaram com induacutestria de confecccedilatildeo procurando discutir tambeacutem alguns

trabalhos acadecircmicos que analisam praacuteticas dos trabalhadores em Terra Roxa A fim de

compreender a trajetoacuteria destes sujeitos e os motivos que os levam a perceber a

expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de melhoria e

mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas

Para compreendermos melhor estas interpretaccedilotildees fez-se necessaacuterio analisar o

percurso de relaccedilotildees e experiecircncias que construiacuteram Para isso foi importante

12 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

16

dimensionar a cidade na deacutecada de 1970 Momento em que se intensificou a mudanccedila

destes trabalhadores do campo para a cidade (ou ainda para outras regiotildees) ou seja este

foi um periacuteodo de mudanccedilas marcantes nas relaccedilotildees de trabalho onde morar e como

viver natildeo soacute no municiacutepio mas possiacutevel de identificar em outras cidades brasileiras

No trabalho de Ana Ameacutelia Camarano e Ricardo Abramovay haacute o interesse em

apresentar os movimentos migratoacuterios que respondem pelo processo de esvaziamento

da populaccedilatildeo rural no Brasil Os autores observam que ateacute 1980 houve um crescimento

absoluto do saldo populacional que deixou as aacutereas rurais brasileiras Aproximadamente

40 da populaccedilatildeo que vivia nas aacutereas rurais no comeccedilo dos anos 70 migraram nessa

deacutecada O fluxo que deixou o campo nos anos 80 tambeacutem foi expressivo 13 de todos

os que viviam no meio rural em 1980 saiacuteram durante esse periacuteodo o que representou

aproximadamente 13 milhotildees de pessoas13

Em termos nacionais a intensidade do movimento de desruralizaccedilatildeo segundo

os autores parece natildeo ter diminuiacutedo muito nos uacuteltimos 50 anos Entre 1950 e 1980 as

aacutereas rurais das regiotildees Sudeste e Sul forneceram um volume expressivo de novos

moradores para as aacutereas urbanas14 Para os autores como realizavam a pesquisa em fins

da deacutecada de 1990 suas impressotildees indicavam uma continuidade desse processo

Desde 1950 a cada 10 anos um em cada trecircs brasileiros vivendo no meio rural opta pela emigraccedilatildeo Os anos 90 natildeo arrefeceram em muito esta tendecircncia se as taxas de evasatildeo do meio rural observadas entre 1990 e 1995 persistirem pelo restante da deacutecada quase 30 dos brasileiros que entatildeo viviam no campo em 1990 teratildeo mudado seu local de residecircncia na virada do milecircnio15

Ainda que os autores analisem no campo da geografia demograacutefica apoiando-se

na noccedilatildeo de ecircxodo rural estes trazem ldquoo modo de vida no campordquo como incocircmodo para

a realizaccedilatildeo da pesquisa traduzido nas movimentaccedilotildees desses brasileiros entre o campo

e a cidade alteraccedilotildees natildeo soacute espaciais mas no modo como vivem e enfrentam

determinadas relaccedilotildees de poder

Estes se movimentam de acordo com as expectativas e interesses que produzem

como necessidades reorganizando as relaccedilotildees de trabalho e modos de vida diante de

pressotildees de reestruturaccedilatildeo da produccedilatildeo e da ocupaccedilatildeo das aacutereas rurais brasileiras da

13 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 14 IBIDEM 15 IBIDEM p 6

17

segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual

natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na

promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo

De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970

aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do

municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as

principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos

Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio

exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX

Graacutefico 1

Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)

Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e

principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a

distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando

Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de

1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea

urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave

expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de

vestuaacuterio moda bebecirc

16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013

18

Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no

municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo

urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e

insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo

na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e

incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola

em moldes capitalistas na cidade 17

A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas

unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha

o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade

em muitos casos diretamente com o consumidor

Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que

discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em

Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo

provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que

Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18

No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da

populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente

ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da

maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio

alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo

aponta um processo tranquilo

17

GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18

FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9

19

As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos

oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute

mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise

- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o

cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que

A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19

A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o

trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe

quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar

com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de

banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe

pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo

Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um

grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir

ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados

da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia

por um nuacutemero reduzido de vagas

Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo

saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por

um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria

condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses

19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33

20

trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de

induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade

Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu

entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria

seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas

vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece

Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20

A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves

induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos

perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas

de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para

Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida

Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como

citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este

processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de

Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande

decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio

Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do

IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que

formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho

atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores

mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que

permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram

como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras

atividades tambeacutem inconstantes

A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em

2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que

residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo

por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos

20

JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

21

sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)

estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos

produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no

transporte e venda de mercadorias21

O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os

trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira

produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no

contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria

e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas

Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua

forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de

escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma

grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de

mercadorias criminalizado como contrabando

O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online

Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o

narcotraacuteficordquo aponta que

Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122

A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida

com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que

almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores

apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os

21

CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013

22

oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando

permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute

associada a comprar roupas e tecircnis de marca

O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a

intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda

de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre

alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para

frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc

No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses

trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego

Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso

Frederico afirma que

Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23

A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da

agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em

segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees

No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este

processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas

nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica

quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo

Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24

23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

23

Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo

para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O

trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do

patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo

lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos

trabalhadores pela induacutestria ele me diz que

Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25

Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural

da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas

relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar

com essa nova dinacircmica

Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo

visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas

vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se

aproxima da percepccedilatildeo de Carlos

Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26

Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para

ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes

se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio

trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as

ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que

pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha

25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11

24

trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem

trabalho

Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe

complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho

pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida

que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram

Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no

campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e

trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte

das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave

trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a

perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura

Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27

Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de

alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute

registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses

trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas

A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade

de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As

oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um

maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa

condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos

desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor

a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado

O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos

Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo

Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa

27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10

25

Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28

Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas

anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do

empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da

cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram

nesse processo

O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho

financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para

empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a

demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de

trabalhadores agrave disposiccedilatildeo

Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no

municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do

empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor

produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que

A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29

Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos

gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por

ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e

possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio

A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees

municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno

28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM

26

desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos

proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e

do APL do vestuaacuterio na cidade 31

No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi

substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e

mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e

vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa

aacutereardquo

Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do

Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos

profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes

tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o

interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo

de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores

tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo

foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal

finalidade

De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho

rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da

folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo

A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como

Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes

Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o

municiacutepio de Terra Roxa

30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

27

Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34

O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de

trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda

continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila

tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de

garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno

dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o

campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre

os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal

As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma

alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida

ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores

possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -

com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou

outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por

perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista

dentre outros natildeo os oferece

Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes

trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de

classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de

melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no

ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a

trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em

outra cidade ela me disse que

Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35

34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

28

Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave

mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem

organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de

novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar

com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as

expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita

vantagem assimrdquo

Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para

Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se

demo na faacutebricardquo36

Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram

trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar

mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia

com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando

pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que

Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37

Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter

voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no

campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em

Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que

natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar

36 IDEM 37 IDEM

29

As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila

pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com

a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma

mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila

natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na

narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do

casal

Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas

construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril

Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho

na faacutebrica ela me disse que

Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38

Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que

gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as

dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores

preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica

ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na

avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em

conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho

O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como

Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos

indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em

casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria

Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista

Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim

38 IDEM

30

de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por

menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes

oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc

como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado

na Escola do Trabalho

Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o

tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram

mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias

permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas

relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais

Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns

trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de

compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas

tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa

39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

31

CAPIacuteTULO 2

TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40

Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa

natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O

municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande

polo de empregos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de

investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade

de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um

grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41

Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo

como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem

indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e

aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de

desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente

O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de

julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do

Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para

bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda

afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um

terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio

A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral

retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o

40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013

32

processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no

ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir

Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa

fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda

bebecirc pra terra roxa

Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43

A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande

destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da

cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra

Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o

municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo

queacuterdquo

No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves

transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que

este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo

sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em

resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores

Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa

industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo

enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa

Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20

principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a

43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

33

janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos

registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores

vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e

desligamento nesses setores

Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa

Meses Jan de 2003 a Jan de 2011

CBO ndash Frequumlecircncia

Admissotildees Desligamentos

Saldo

1ordm Emp

Reemp

Reint

C Prz Det

Transf

Total

Disp sem J Causa

Disp com J Causa

A Pedido

Term Contr

Aposent

Morte

Term C Prz Deter

Transf

Total

Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da

confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390

Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443

Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie

271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109

Costureira de peccedilas sob encomenda

171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em

geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio

varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina

60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio

em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina

bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas

34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27

Trabalhador agropecuaacuterio em geral

19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador

de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5

Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39

Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie

6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras

10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente

administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio

32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa

24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27

Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013

34

Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

35

Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

36

mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

37

curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

38

Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

41

que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

42

Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

44

industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

45

Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

46

Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

15

CAPIacuteTULO 1

TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc

[] Com o tempo depois que essas empresas dede crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram mais faacuteceis neacute []12

Neste capiacutetulo vamos analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente

estatildeo ou que em algum momento de suas vidas estiveram vinculados agraves induacutestrias de

confecccedilatildeo de moda bebecirc do municiacutepio de Terra Roxa- PR mas que trazem em sua

trajetoacuteria uma relaccedilatildeo com o trabalho moradia e valores advindo do campo O objetivo

eacute problematizar suas avaliaccedilotildees frente agrave ldquoexpansatildeordquo industrial do municiacutepio e como essa

dialoga com seus interesses e necessidades

Ao analisarmos algumas entrevistas de trabalhadores vinculados a estas

induacutestrias foi comum encontrar assim como na narrativa citada na epiacutegrafe deste

capiacutetulo narrativas nesta perspectiva na qual os empregos gerados pela industrializaccedilatildeo

satildeo interpretados como possibilidade de melhoria na condiccedilatildeo de vida dos

trabalhadores Percebemos assim que o municiacutepio estaacute constantemente sendo indicado

como um grande polo de empregos mas essa indicaccedilatildeo natildeo resume as ponderaccedilotildees que

fazem sobre a presenccedila industrial em Terra Roxa - porque tambeacutem apontam elementos

que contradizem essa presenccedila

Buscaremos entatildeo dialogar com as fontes orais produzidas com trabalhadores

que se relacionaram com induacutestria de confecccedilatildeo procurando discutir tambeacutem alguns

trabalhos acadecircmicos que analisam praacuteticas dos trabalhadores em Terra Roxa A fim de

compreender a trajetoacuteria destes sujeitos e os motivos que os levam a perceber a

expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de melhoria e

mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas

Para compreendermos melhor estas interpretaccedilotildees fez-se necessaacuterio analisar o

percurso de relaccedilotildees e experiecircncias que construiacuteram Para isso foi importante

12 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

16

dimensionar a cidade na deacutecada de 1970 Momento em que se intensificou a mudanccedila

destes trabalhadores do campo para a cidade (ou ainda para outras regiotildees) ou seja este

foi um periacuteodo de mudanccedilas marcantes nas relaccedilotildees de trabalho onde morar e como

viver natildeo soacute no municiacutepio mas possiacutevel de identificar em outras cidades brasileiras

No trabalho de Ana Ameacutelia Camarano e Ricardo Abramovay haacute o interesse em

apresentar os movimentos migratoacuterios que respondem pelo processo de esvaziamento

da populaccedilatildeo rural no Brasil Os autores observam que ateacute 1980 houve um crescimento

absoluto do saldo populacional que deixou as aacutereas rurais brasileiras Aproximadamente

40 da populaccedilatildeo que vivia nas aacutereas rurais no comeccedilo dos anos 70 migraram nessa

deacutecada O fluxo que deixou o campo nos anos 80 tambeacutem foi expressivo 13 de todos

os que viviam no meio rural em 1980 saiacuteram durante esse periacuteodo o que representou

aproximadamente 13 milhotildees de pessoas13

Em termos nacionais a intensidade do movimento de desruralizaccedilatildeo segundo

os autores parece natildeo ter diminuiacutedo muito nos uacuteltimos 50 anos Entre 1950 e 1980 as

aacutereas rurais das regiotildees Sudeste e Sul forneceram um volume expressivo de novos

moradores para as aacutereas urbanas14 Para os autores como realizavam a pesquisa em fins

da deacutecada de 1990 suas impressotildees indicavam uma continuidade desse processo

Desde 1950 a cada 10 anos um em cada trecircs brasileiros vivendo no meio rural opta pela emigraccedilatildeo Os anos 90 natildeo arrefeceram em muito esta tendecircncia se as taxas de evasatildeo do meio rural observadas entre 1990 e 1995 persistirem pelo restante da deacutecada quase 30 dos brasileiros que entatildeo viviam no campo em 1990 teratildeo mudado seu local de residecircncia na virada do milecircnio15

Ainda que os autores analisem no campo da geografia demograacutefica apoiando-se

na noccedilatildeo de ecircxodo rural estes trazem ldquoo modo de vida no campordquo como incocircmodo para

a realizaccedilatildeo da pesquisa traduzido nas movimentaccedilotildees desses brasileiros entre o campo

e a cidade alteraccedilotildees natildeo soacute espaciais mas no modo como vivem e enfrentam

determinadas relaccedilotildees de poder

Estes se movimentam de acordo com as expectativas e interesses que produzem

como necessidades reorganizando as relaccedilotildees de trabalho e modos de vida diante de

pressotildees de reestruturaccedilatildeo da produccedilatildeo e da ocupaccedilatildeo das aacutereas rurais brasileiras da

13 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 14 IBIDEM 15 IBIDEM p 6

17

segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual

natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na

promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo

De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970

aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do

municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as

principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos

Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio

exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX

Graacutefico 1

Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)

Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e

principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a

distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando

Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de

1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea

urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave

expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de

vestuaacuterio moda bebecirc

16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013

18

Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no

municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo

urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e

insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo

na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e

incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola

em moldes capitalistas na cidade 17

A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas

unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha

o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade

em muitos casos diretamente com o consumidor

Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que

discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em

Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo

provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que

Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18

No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da

populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente

ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da

maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio

alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo

aponta um processo tranquilo

17

GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18

FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9

19

As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos

oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute

mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise

- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o

cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que

A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19

A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o

trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe

quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar

com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de

banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe

pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo

Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um

grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir

ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados

da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia

por um nuacutemero reduzido de vagas

Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo

saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por

um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria

condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses

19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33

20

trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de

induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade

Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu

entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria

seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas

vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece

Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20

A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves

induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos

perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas

de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para

Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida

Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como

citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este

processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de

Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande

decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio

Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do

IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que

formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho

atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores

mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que

permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram

como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras

atividades tambeacutem inconstantes

A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em

2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que

residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo

por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos

20

JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

21

sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)

estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos

produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no

transporte e venda de mercadorias21

O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os

trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira

produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no

contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria

e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas

Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua

forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de

escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma

grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de

mercadorias criminalizado como contrabando

O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online

Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o

narcotraacuteficordquo aponta que

Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122

A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida

com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que

almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores

apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os

21

CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013

22

oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando

permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute

associada a comprar roupas e tecircnis de marca

O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a

intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda

de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre

alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para

frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc

No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses

trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego

Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso

Frederico afirma que

Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23

A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da

agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em

segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees

No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este

processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas

nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica

quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo

Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24

23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

23

Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo

para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O

trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do

patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo

lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos

trabalhadores pela induacutestria ele me diz que

Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25

Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural

da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas

relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar

com essa nova dinacircmica

Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo

visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas

vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se

aproxima da percepccedilatildeo de Carlos

Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26

Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para

ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes

se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio

trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as

ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que

pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha

25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11

24

trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem

trabalho

Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe

complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho

pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida

que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram

Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no

campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e

trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte

das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave

trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a

perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura

Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27

Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de

alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute

registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses

trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas

A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade

de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As

oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um

maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa

condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos

desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor

a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado

O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos

Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo

Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa

27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10

25

Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28

Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas

anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do

empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da

cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram

nesse processo

O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho

financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para

empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a

demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de

trabalhadores agrave disposiccedilatildeo

Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no

municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do

empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor

produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que

A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29

Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos

gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por

ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e

possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio

A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees

municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno

28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM

26

desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos

proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e

do APL do vestuaacuterio na cidade 31

No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi

substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e

mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e

vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa

aacutereardquo

Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do

Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos

profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes

tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o

interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo

de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores

tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo

foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal

finalidade

De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho

rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da

folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo

A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como

Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes

Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o

municiacutepio de Terra Roxa

30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

27

Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34

O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de

trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda

continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila

tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de

garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno

dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o

campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre

os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal

As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma

alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida

ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores

possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -

com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou

outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por

perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista

dentre outros natildeo os oferece

Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes

trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de

classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de

melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no

ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a

trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em

outra cidade ela me disse que

Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35

34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

28

Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave

mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem

organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de

novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar

com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as

expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita

vantagem assimrdquo

Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para

Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se

demo na faacutebricardquo36

Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram

trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar

mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia

com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando

pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que

Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37

Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter

voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no

campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em

Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que

natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar

36 IDEM 37 IDEM

29

As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila

pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com

a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma

mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila

natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na

narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do

casal

Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas

construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril

Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho

na faacutebrica ela me disse que

Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38

Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que

gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as

dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores

preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica

ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na

avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em

conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho

O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como

Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos

indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em

casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria

Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista

Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim

38 IDEM

30

de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por

menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes

oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc

como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado

na Escola do Trabalho

Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o

tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram

mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias

permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas

relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais

Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns

trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de

compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas

tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa

39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

31

CAPIacuteTULO 2

TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40

Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa

natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O

municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande

polo de empregos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de

investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade

de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um

grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41

Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo

como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem

indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e

aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de

desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente

O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de

julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do

Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para

bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda

afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um

terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio

A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral

retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o

40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013

32

processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no

ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir

Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa

fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda

bebecirc pra terra roxa

Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43

A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande

destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da

cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra

Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o

municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo

queacuterdquo

No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves

transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que

este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo

sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em

resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores

Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa

industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo

enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa

Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20

principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a

43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

33

janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos

registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores

vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e

desligamento nesses setores

Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa

Meses Jan de 2003 a Jan de 2011

CBO ndash Frequumlecircncia

Admissotildees Desligamentos

Saldo

1ordm Emp

Reemp

Reint

C Prz Det

Transf

Total

Disp sem J Causa

Disp com J Causa

A Pedido

Term Contr

Aposent

Morte

Term C Prz Deter

Transf

Total

Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da

confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390

Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443

Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie

271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109

Costureira de peccedilas sob encomenda

171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em

geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio

varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina

60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio

em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina

bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas

34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27

Trabalhador agropecuaacuterio em geral

19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador

de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5

Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39

Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie

6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras

10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente

administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio

32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa

24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27

Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013

34

Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

35

Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

36

mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

37

curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

38

Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

41

que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

16

dimensionar a cidade na deacutecada de 1970 Momento em que se intensificou a mudanccedila

destes trabalhadores do campo para a cidade (ou ainda para outras regiotildees) ou seja este

foi um periacuteodo de mudanccedilas marcantes nas relaccedilotildees de trabalho onde morar e como

viver natildeo soacute no municiacutepio mas possiacutevel de identificar em outras cidades brasileiras

No trabalho de Ana Ameacutelia Camarano e Ricardo Abramovay haacute o interesse em

apresentar os movimentos migratoacuterios que respondem pelo processo de esvaziamento

da populaccedilatildeo rural no Brasil Os autores observam que ateacute 1980 houve um crescimento

absoluto do saldo populacional que deixou as aacutereas rurais brasileiras Aproximadamente

40 da populaccedilatildeo que vivia nas aacutereas rurais no comeccedilo dos anos 70 migraram nessa

deacutecada O fluxo que deixou o campo nos anos 80 tambeacutem foi expressivo 13 de todos

os que viviam no meio rural em 1980 saiacuteram durante esse periacuteodo o que representou

aproximadamente 13 milhotildees de pessoas13

Em termos nacionais a intensidade do movimento de desruralizaccedilatildeo segundo

os autores parece natildeo ter diminuiacutedo muito nos uacuteltimos 50 anos Entre 1950 e 1980 as

aacutereas rurais das regiotildees Sudeste e Sul forneceram um volume expressivo de novos

moradores para as aacutereas urbanas14 Para os autores como realizavam a pesquisa em fins

da deacutecada de 1990 suas impressotildees indicavam uma continuidade desse processo

Desde 1950 a cada 10 anos um em cada trecircs brasileiros vivendo no meio rural opta pela emigraccedilatildeo Os anos 90 natildeo arrefeceram em muito esta tendecircncia se as taxas de evasatildeo do meio rural observadas entre 1990 e 1995 persistirem pelo restante da deacutecada quase 30 dos brasileiros que entatildeo viviam no campo em 1990 teratildeo mudado seu local de residecircncia na virada do milecircnio15

Ainda que os autores analisem no campo da geografia demograacutefica apoiando-se

na noccedilatildeo de ecircxodo rural estes trazem ldquoo modo de vida no campordquo como incocircmodo para

a realizaccedilatildeo da pesquisa traduzido nas movimentaccedilotildees desses brasileiros entre o campo

e a cidade alteraccedilotildees natildeo soacute espaciais mas no modo como vivem e enfrentam

determinadas relaccedilotildees de poder

Estes se movimentam de acordo com as expectativas e interesses que produzem

como necessidades reorganizando as relaccedilotildees de trabalho e modos de vida diante de

pressotildees de reestruturaccedilatildeo da produccedilatildeo e da ocupaccedilatildeo das aacutereas rurais brasileiras da

13 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 14 IBIDEM 15 IBIDEM p 6

17

segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual

natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na

promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo

De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970

aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do

municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as

principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos

Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio

exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX

Graacutefico 1

Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)

Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e

principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a

distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando

Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de

1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea

urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave

expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de

vestuaacuterio moda bebecirc

16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013

18

Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no

municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo

urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e

insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo

na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e

incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola

em moldes capitalistas na cidade 17

A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas

unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha

o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade

em muitos casos diretamente com o consumidor

Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que

discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em

Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo

provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que

Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18

No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da

populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente

ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da

maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio

alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo

aponta um processo tranquilo

17

GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18

FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9

19

As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos

oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute

mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise

- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o

cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que

A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19

A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o

trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe

quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar

com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de

banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe

pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo

Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um

grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir

ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados

da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia

por um nuacutemero reduzido de vagas

Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo

saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por

um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria

condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses

19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33

20

trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de

induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade

Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu

entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria

seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas

vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece

Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20

A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves

induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos

perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas

de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para

Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida

Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como

citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este

processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de

Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande

decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio

Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do

IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que

formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho

atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores

mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que

permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram

como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras

atividades tambeacutem inconstantes

A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em

2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que

residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo

por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos

20

JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

21

sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)

estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos

produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no

transporte e venda de mercadorias21

O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os

trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira

produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no

contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria

e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas

Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua

forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de

escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma

grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de

mercadorias criminalizado como contrabando

O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online

Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o

narcotraacuteficordquo aponta que

Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122

A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida

com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que

almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores

apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os

21

CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013

22

oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando

permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute

associada a comprar roupas e tecircnis de marca

O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a

intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda

de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre

alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para

frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc

No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses

trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego

Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso

Frederico afirma que

Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23

A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da

agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em

segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees

No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este

processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas

nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica

quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo

Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24

23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

23

Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo

para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O

trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do

patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo

lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos

trabalhadores pela induacutestria ele me diz que

Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25

Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural

da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas

relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar

com essa nova dinacircmica

Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo

visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas

vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se

aproxima da percepccedilatildeo de Carlos

Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26

Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para

ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes

se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio

trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as

ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que

pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha

25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11

24

trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem

trabalho

Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe

complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho

pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida

que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram

Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no

campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e

trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte

das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave

trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a

perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura

Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27

Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de

alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute

registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses

trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas

A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade

de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As

oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um

maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa

condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos

desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor

a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado

O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos

Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo

Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa

27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10

25

Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28

Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas

anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do

empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da

cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram

nesse processo

O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho

financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para

empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a

demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de

trabalhadores agrave disposiccedilatildeo

Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no

municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do

empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor

produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que

A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29

Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos

gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por

ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e

possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio

A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees

municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno

28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM

26

desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos

proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e

do APL do vestuaacuterio na cidade 31

No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi

substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e

mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e

vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa

aacutereardquo

Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do

Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos

profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes

tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o

interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo

de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores

tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo

foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal

finalidade

De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho

rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da

folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo

A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como

Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes

Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o

municiacutepio de Terra Roxa

30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

27

Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34

O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de

trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda

continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila

tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de

garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno

dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o

campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre

os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal

As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma

alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida

ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores

possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -

com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou

outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por

perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista

dentre outros natildeo os oferece

Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes

trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de

classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de

melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no

ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a

trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em

outra cidade ela me disse que

Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35

34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

28

Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave

mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem

organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de

novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar

com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as

expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita

vantagem assimrdquo

Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para

Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se

demo na faacutebricardquo36

Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram

trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar

mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia

com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando

pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que

Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37

Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter

voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no

campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em

Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que

natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar

36 IDEM 37 IDEM

29

As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila

pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com

a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma

mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila

natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na

narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do

casal

Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas

construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril

Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho

na faacutebrica ela me disse que

Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38

Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que

gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as

dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores

preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica

ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na

avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em

conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho

O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como

Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos

indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em

casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria

Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista

Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim

38 IDEM

30

de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por

menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes

oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc

como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado

na Escola do Trabalho

Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o

tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram

mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias

permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas

relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais

Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns

trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de

compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas

tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa

39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

31

CAPIacuteTULO 2

TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40

Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa

natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O

municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande

polo de empregos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de

investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade

de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um

grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41

Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo

como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem

indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e

aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de

desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente

O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de

julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do

Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para

bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda

afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um

terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio

A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral

retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o

40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013

32

processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no

ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir

Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa

fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda

bebecirc pra terra roxa

Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43

A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande

destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da

cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra

Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o

municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo

queacuterdquo

No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves

transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que

este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo

sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em

resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores

Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa

industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo

enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa

Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20

principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a

43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

33

janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos

registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores

vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e

desligamento nesses setores

Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa

Meses Jan de 2003 a Jan de 2011

CBO ndash Frequumlecircncia

Admissotildees Desligamentos

Saldo

1ordm Emp

Reemp

Reint

C Prz Det

Transf

Total

Disp sem J Causa

Disp com J Causa

A Pedido

Term Contr

Aposent

Morte

Term C Prz Deter

Transf

Total

Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da

confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390

Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443

Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie

271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109

Costureira de peccedilas sob encomenda

171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em

geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio

varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina

60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio

em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina

bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas

34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27

Trabalhador agropecuaacuterio em geral

19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador

de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5

Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39

Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie

6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras

10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente

administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio

32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa

24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27

Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013

34

Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

35

Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

36

mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

37

curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

38

Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

41

que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

42

Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

44

industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

45

Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

46

Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

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segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual

natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na

promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo

De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970

aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do

municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as

principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos

Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio

exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX

Graacutefico 1

Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)

Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e

principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a

distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando

Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de

1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea

urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave

expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de

vestuaacuterio moda bebecirc

16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013

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Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no

municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo

urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e

insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo

na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e

incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola

em moldes capitalistas na cidade 17

A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas

unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha

o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade

em muitos casos diretamente com o consumidor

Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que

discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em

Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo

provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que

Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18

No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da

populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente

ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da

maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio

alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo

aponta um processo tranquilo

17

GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18

FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9

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As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos

oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute

mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise

- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o

cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que

A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19

A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o

trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe

quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar

com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de

banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe

pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo

Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um

grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir

ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados

da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia

por um nuacutemero reduzido de vagas

Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo

saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por

um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria

condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses

19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33

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trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de

induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade

Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu

entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria

seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas

vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece

Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20

A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves

induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos

perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas

de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para

Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida

Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como

citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este

processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de

Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande

decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio

Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do

IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que

formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho

atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores

mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que

permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram

como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras

atividades tambeacutem inconstantes

A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em

2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que

residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo

por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos

20

JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

21

sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)

estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos

produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no

transporte e venda de mercadorias21

O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os

trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira

produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no

contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria

e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas

Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua

forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de

escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma

grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de

mercadorias criminalizado como contrabando

O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online

Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o

narcotraacuteficordquo aponta que

Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122

A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida

com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que

almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores

apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os

21

CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013

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oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando

permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute

associada a comprar roupas e tecircnis de marca

O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a

intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda

de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre

alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para

frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc

No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses

trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego

Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso

Frederico afirma que

Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23

A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da

agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em

segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees

No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este

processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas

nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica

quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo

Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24

23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

23

Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo

para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O

trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do

patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo

lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos

trabalhadores pela induacutestria ele me diz que

Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25

Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural

da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas

relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar

com essa nova dinacircmica

Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo

visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas

vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se

aproxima da percepccedilatildeo de Carlos

Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26

Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para

ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes

se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio

trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as

ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que

pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha

25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11

24

trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem

trabalho

Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe

complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho

pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida

que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram

Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no

campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e

trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte

das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave

trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a

perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura

Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27

Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de

alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute

registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses

trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas

A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade

de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As

oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um

maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa

condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos

desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor

a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado

O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos

Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo

Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa

27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10

25

Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28

Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas

anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do

empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da

cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram

nesse processo

O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho

financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para

empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a

demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de

trabalhadores agrave disposiccedilatildeo

Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no

municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do

empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor

produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que

A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29

Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos

gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por

ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e

possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio

A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees

municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno

28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM

26

desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos

proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e

do APL do vestuaacuterio na cidade 31

No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi

substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e

mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e

vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa

aacutereardquo

Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do

Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos

profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes

tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o

interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo

de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores

tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo

foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal

finalidade

De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho

rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da

folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo

A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como

Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes

Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o

municiacutepio de Terra Roxa

30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

27

Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34

O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de

trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda

continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila

tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de

garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno

dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o

campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre

os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal

As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma

alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida

ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores

possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -

com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou

outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por

perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista

dentre outros natildeo os oferece

Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes

trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de

classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de

melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no

ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a

trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em

outra cidade ela me disse que

Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35

34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

28

Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave

mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem

organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de

novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar

com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as

expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita

vantagem assimrdquo

Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para

Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se

demo na faacutebricardquo36

Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram

trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar

mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia

com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando

pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que

Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37

Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter

voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no

campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em

Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que

natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar

36 IDEM 37 IDEM

29

As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila

pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com

a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma

mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila

natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na

narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do

casal

Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas

construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril

Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho

na faacutebrica ela me disse que

Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38

Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que

gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as

dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores

preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica

ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na

avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em

conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho

O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como

Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos

indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em

casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria

Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista

Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim

38 IDEM

30

de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por

menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes

oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc

como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado

na Escola do Trabalho

Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o

tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram

mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias

permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas

relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais

Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns

trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de

compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas

tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa

39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

31

CAPIacuteTULO 2

TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40

Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa

natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O

municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande

polo de empregos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de

investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade

de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um

grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41

Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo

como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem

indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e

aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de

desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente

O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de

julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do

Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para

bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda

afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um

terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio

A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral

retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o

40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013

32

processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no

ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir

Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa

fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda

bebecirc pra terra roxa

Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43

A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande

destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da

cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra

Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o

municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo

queacuterdquo

No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves

transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que

este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo

sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em

resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores

Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa

industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo

enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa

Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20

principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a

43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

33

janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos

registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores

vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e

desligamento nesses setores

Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa

Meses Jan de 2003 a Jan de 2011

CBO ndash Frequumlecircncia

Admissotildees Desligamentos

Saldo

1ordm Emp

Reemp

Reint

C Prz Det

Transf

Total

Disp sem J Causa

Disp com J Causa

A Pedido

Term Contr

Aposent

Morte

Term C Prz Deter

Transf

Total

Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da

confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390

Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443

Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie

271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109

Costureira de peccedilas sob encomenda

171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em

geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio

varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina

60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio

em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina

bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas

34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27

Trabalhador agropecuaacuterio em geral

19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador

de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5

Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39

Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie

6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras

10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente

administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio

32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa

24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27

Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013

34

Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

35

Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

36

mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

37

curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

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faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

18

Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no

municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo

urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e

insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo

na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e

incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola

em moldes capitalistas na cidade 17

A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas

unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha

o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade

em muitos casos diretamente com o consumidor

Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que

discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em

Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo

provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que

Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18

No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da

populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente

ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da

maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio

alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo

aponta um processo tranquilo

17

GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18

FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9

19

As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos

oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute

mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise

- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o

cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que

A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19

A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o

trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe

quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar

com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de

banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe

pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo

Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um

grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir

ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados

da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia

por um nuacutemero reduzido de vagas

Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo

saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por

um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria

condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses

19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33

20

trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de

induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade

Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu

entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria

seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas

vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece

Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20

A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves

induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos

perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas

de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para

Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida

Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como

citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este

processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de

Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande

decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio

Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do

IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que

formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho

atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores

mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que

permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram

como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras

atividades tambeacutem inconstantes

A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em

2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que

residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo

por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos

20

JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

21

sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)

estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos

produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no

transporte e venda de mercadorias21

O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os

trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira

produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no

contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria

e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas

Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua

forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de

escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma

grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de

mercadorias criminalizado como contrabando

O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online

Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o

narcotraacuteficordquo aponta que

Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122

A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida

com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que

almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores

apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os

21

CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013

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oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando

permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute

associada a comprar roupas e tecircnis de marca

O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a

intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda

de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre

alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para

frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc

No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses

trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego

Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso

Frederico afirma que

Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23

A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da

agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em

segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees

No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este

processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas

nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica

quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo

Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24

23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

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Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo

para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O

trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do

patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo

lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos

trabalhadores pela induacutestria ele me diz que

Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25

Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural

da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas

relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar

com essa nova dinacircmica

Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo

visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas

vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se

aproxima da percepccedilatildeo de Carlos

Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26

Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para

ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes

se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio

trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as

ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que

pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha

25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11

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trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem

trabalho

Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe

complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho

pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida

que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram

Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no

campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e

trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte

das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave

trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a

perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura

Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27

Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de

alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute

registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses

trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas

A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade

de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As

oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um

maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa

condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos

desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor

a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado

O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos

Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo

Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa

27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10

25

Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28

Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas

anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do

empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da

cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram

nesse processo

O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho

financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para

empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a

demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de

trabalhadores agrave disposiccedilatildeo

Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no

municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do

empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor

produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que

A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29

Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos

gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por

ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e

possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio

A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees

municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno

28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM

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desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos

proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e

do APL do vestuaacuterio na cidade 31

No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi

substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e

mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e

vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa

aacutereardquo

Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do

Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos

profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes

tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o

interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo

de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores

tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo

foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal

finalidade

De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho

rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da

folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo

A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como

Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes

Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o

municiacutepio de Terra Roxa

30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

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Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34

O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de

trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda

continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila

tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de

garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno

dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o

campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre

os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal

As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma

alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida

ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores

possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -

com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou

outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por

perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista

dentre outros natildeo os oferece

Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes

trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de

classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de

melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no

ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a

trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em

outra cidade ela me disse que

Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35

34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

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Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave

mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem

organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de

novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar

com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as

expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita

vantagem assimrdquo

Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para

Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se

demo na faacutebricardquo36

Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram

trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar

mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia

com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando

pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que

Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37

Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter

voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no

campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em

Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que

natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar

36 IDEM 37 IDEM

29

As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila

pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com

a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma

mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila

natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na

narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do

casal

Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas

construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril

Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho

na faacutebrica ela me disse que

Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38

Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que

gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as

dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores

preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica

ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na

avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em

conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho

O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como

Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos

indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em

casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria

Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista

Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim

38 IDEM

30

de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por

menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes

oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc

como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado

na Escola do Trabalho

Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o

tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram

mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias

permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas

relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais

Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns

trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de

compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas

tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa

39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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CAPIacuteTULO 2

TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40

Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa

natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O

municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande

polo de empregos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de

investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade

de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um

grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41

Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo

como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem

indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e

aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de

desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente

O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de

julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do

Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para

bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda

afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um

terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio

A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral

retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o

40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013

32

processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no

ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir

Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa

fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda

bebecirc pra terra roxa

Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43

A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande

destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da

cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra

Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o

municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo

queacuterdquo

No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves

transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que

este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo

sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em

resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores

Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa

industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo

enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa

Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20

principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a

43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

33

janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos

registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores

vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e

desligamento nesses setores

Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa

Meses Jan de 2003 a Jan de 2011

CBO ndash Frequumlecircncia

Admissotildees Desligamentos

Saldo

1ordm Emp

Reemp

Reint

C Prz Det

Transf

Total

Disp sem J Causa

Disp com J Causa

A Pedido

Term Contr

Aposent

Morte

Term C Prz Deter

Transf

Total

Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da

confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390

Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443

Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie

271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109

Costureira de peccedilas sob encomenda

171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em

geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio

varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina

60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio

em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina

bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas

34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27

Trabalhador agropecuaacuterio em geral

19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador

de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5

Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39

Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie

6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras

10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente

administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio

32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa

24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27

Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013

34

Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

35

Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

36

mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

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curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

38

Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

41

que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

42

Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

44

industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

45

Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

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Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

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FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

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lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

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As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos

oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute

mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise

- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o

cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que

A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19

A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o

trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe

quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar

com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de

banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe

pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo

Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um

grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir

ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados

da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia

por um nuacutemero reduzido de vagas

Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo

saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por

um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria

condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses

19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33

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trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de

induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade

Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu

entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria

seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas

vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece

Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20

A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves

induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos

perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas

de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para

Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida

Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como

citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este

processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de

Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande

decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio

Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do

IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que

formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho

atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores

mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que

permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram

como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras

atividades tambeacutem inconstantes

A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em

2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que

residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo

por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos

20

JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

21

sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)

estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos

produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no

transporte e venda de mercadorias21

O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os

trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira

produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no

contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria

e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas

Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua

forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de

escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma

grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de

mercadorias criminalizado como contrabando

O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online

Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o

narcotraacuteficordquo aponta que

Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122

A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida

com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que

almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores

apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os

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CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013

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oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando

permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute

associada a comprar roupas e tecircnis de marca

O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a

intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda

de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre

alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para

frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc

No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses

trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego

Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso

Frederico afirma que

Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23

A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da

agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em

segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees

No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este

processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas

nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica

quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo

Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24

23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

23

Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo

para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O

trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do

patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo

lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos

trabalhadores pela induacutestria ele me diz que

Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25

Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural

da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas

relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar

com essa nova dinacircmica

Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo

visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas

vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se

aproxima da percepccedilatildeo de Carlos

Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26

Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para

ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes

se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio

trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as

ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que

pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha

25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11

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trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem

trabalho

Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe

complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho

pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida

que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram

Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no

campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e

trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte

das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave

trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a

perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura

Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27

Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de

alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute

registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses

trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas

A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade

de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As

oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um

maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa

condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos

desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor

a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado

O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos

Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo

Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa

27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10

25

Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28

Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas

anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do

empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da

cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram

nesse processo

O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho

financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para

empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a

demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de

trabalhadores agrave disposiccedilatildeo

Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no

municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do

empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor

produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que

A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29

Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos

gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por

ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e

possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio

A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees

municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno

28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM

26

desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos

proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e

do APL do vestuaacuterio na cidade 31

No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi

substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e

mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e

vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa

aacutereardquo

Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do

Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos

profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes

tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o

interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo

de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores

tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo

foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal

finalidade

De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho

rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da

folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo

A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como

Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes

Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o

municiacutepio de Terra Roxa

30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

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Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34

O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de

trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda

continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila

tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de

garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno

dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o

campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre

os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal

As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma

alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida

ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores

possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -

com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou

outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por

perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista

dentre outros natildeo os oferece

Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes

trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de

classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de

melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no

ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a

trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em

outra cidade ela me disse que

Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35

34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

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Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave

mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem

organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de

novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar

com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as

expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita

vantagem assimrdquo

Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para

Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se

demo na faacutebricardquo36

Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram

trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar

mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia

com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando

pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que

Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37

Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter

voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no

campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em

Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que

natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar

36 IDEM 37 IDEM

29

As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila

pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com

a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma

mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila

natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na

narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do

casal

Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas

construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril

Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho

na faacutebrica ela me disse que

Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38

Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que

gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as

dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores

preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica

ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na

avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em

conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho

O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como

Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos

indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em

casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria

Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista

Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim

38 IDEM

30

de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por

menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes

oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc

como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado

na Escola do Trabalho

Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o

tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram

mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias

permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas

relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais

Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns

trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de

compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas

tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa

39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

31

CAPIacuteTULO 2

TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40

Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa

natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O

municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande

polo de empregos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de

investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade

de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um

grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41

Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo

como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem

indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e

aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de

desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente

O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de

julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do

Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para

bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda

afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um

terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio

A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral

retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o

40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013

32

processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no

ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir

Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa

fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda

bebecirc pra terra roxa

Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43

A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande

destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da

cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra

Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o

municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo

queacuterdquo

No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves

transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que

este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo

sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em

resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores

Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa

industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo

enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa

Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20

principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a

43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

33

janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos

registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores

vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e

desligamento nesses setores

Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa

Meses Jan de 2003 a Jan de 2011

CBO ndash Frequumlecircncia

Admissotildees Desligamentos

Saldo

1ordm Emp

Reemp

Reint

C Prz Det

Transf

Total

Disp sem J Causa

Disp com J Causa

A Pedido

Term Contr

Aposent

Morte

Term C Prz Deter

Transf

Total

Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da

confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390

Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443

Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie

271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109

Costureira de peccedilas sob encomenda

171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em

geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio

varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina

60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio

em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina

bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas

34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27

Trabalhador agropecuaacuterio em geral

19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador

de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5

Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39

Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie

6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras

10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente

administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio

32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa

24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27

Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013

34

Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

35

Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

36

mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

37

curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

38

Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

41

que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

20

trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de

induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade

Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu

entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria

seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas

vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece

Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20

A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves

induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos

perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas

de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para

Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida

Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como

citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este

processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de

Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande

decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio

Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do

IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que

formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho

atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores

mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que

permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram

como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras

atividades tambeacutem inconstantes

A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em

2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que

residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo

por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos

20

JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

21

sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)

estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos

produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no

transporte e venda de mercadorias21

O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os

trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira

produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no

contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria

e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas

Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua

forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de

escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma

grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de

mercadorias criminalizado como contrabando

O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online

Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o

narcotraacuteficordquo aponta que

Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122

A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida

com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que

almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores

apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os

21

CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013

22

oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando

permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute

associada a comprar roupas e tecircnis de marca

O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a

intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda

de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre

alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para

frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc

No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses

trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego

Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso

Frederico afirma que

Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23

A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da

agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em

segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees

No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este

processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas

nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica

quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo

Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24

23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

23

Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo

para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O

trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do

patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo

lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos

trabalhadores pela induacutestria ele me diz que

Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25

Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural

da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas

relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar

com essa nova dinacircmica

Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo

visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas

vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se

aproxima da percepccedilatildeo de Carlos

Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26

Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para

ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes

se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio

trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as

ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que

pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha

25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11

24

trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem

trabalho

Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe

complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho

pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida

que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram

Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no

campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e

trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte

das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave

trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a

perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura

Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27

Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de

alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute

registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses

trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas

A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade

de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As

oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um

maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa

condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos

desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor

a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado

O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos

Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo

Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa

27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10

25

Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28

Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas

anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do

empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da

cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram

nesse processo

O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho

financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para

empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a

demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de

trabalhadores agrave disposiccedilatildeo

Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no

municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do

empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor

produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que

A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29

Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos

gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por

ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e

possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio

A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees

municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno

28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM

26

desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos

proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e

do APL do vestuaacuterio na cidade 31

No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi

substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e

mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e

vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa

aacutereardquo

Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do

Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos

profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes

tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o

interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo

de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores

tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo

foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal

finalidade

De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho

rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da

folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo

A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como

Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes

Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o

municiacutepio de Terra Roxa

30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

27

Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34

O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de

trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda

continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila

tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de

garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno

dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o

campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre

os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal

As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma

alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida

ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores

possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -

com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou

outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por

perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista

dentre outros natildeo os oferece

Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes

trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de

classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de

melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no

ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a

trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em

outra cidade ela me disse que

Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35

34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

28

Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave

mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem

organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de

novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar

com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as

expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita

vantagem assimrdquo

Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para

Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se

demo na faacutebricardquo36

Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram

trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar

mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia

com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando

pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que

Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37

Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter

voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no

campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em

Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que

natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar

36 IDEM 37 IDEM

29

As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila

pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com

a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma

mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila

natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na

narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do

casal

Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas

construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril

Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho

na faacutebrica ela me disse que

Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38

Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que

gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as

dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores

preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica

ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na

avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em

conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho

O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como

Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos

indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em

casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria

Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista

Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim

38 IDEM

30

de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por

menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes

oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc

como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado

na Escola do Trabalho

Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o

tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram

mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias

permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas

relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais

Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns

trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de

compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas

tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa

39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

31

CAPIacuteTULO 2

TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40

Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa

natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O

municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande

polo de empregos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de

investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade

de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um

grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41

Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo

como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem

indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e

aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de

desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente

O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de

julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do

Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para

bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda

afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um

terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio

A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral

retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o

40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013

32

processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no

ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir

Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa

fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda

bebecirc pra terra roxa

Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43

A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande

destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da

cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra

Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o

municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo

queacuterdquo

No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves

transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que

este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo

sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em

resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores

Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa

industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo

enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa

Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20

principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a

43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

33

janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos

registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores

vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e

desligamento nesses setores

Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa

Meses Jan de 2003 a Jan de 2011

CBO ndash Frequumlecircncia

Admissotildees Desligamentos

Saldo

1ordm Emp

Reemp

Reint

C Prz Det

Transf

Total

Disp sem J Causa

Disp com J Causa

A Pedido

Term Contr

Aposent

Morte

Term C Prz Deter

Transf

Total

Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da

confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390

Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443

Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie

271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109

Costureira de peccedilas sob encomenda

171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em

geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio

varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina

60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio

em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina

bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas

34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27

Trabalhador agropecuaacuterio em geral

19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador

de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5

Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39

Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie

6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras

10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente

administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio

32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa

24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27

Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013

34

Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

35

Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

36

mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

37

curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

38

Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

21

sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)

estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos

produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no

transporte e venda de mercadorias21

O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os

trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira

produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no

contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria

e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas

Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua

forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de

escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma

grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de

mercadorias criminalizado como contrabando

O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online

Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o

narcotraacuteficordquo aponta que

Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122

A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida

com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que

almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores

apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os

21

CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013

22

oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando

permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute

associada a comprar roupas e tecircnis de marca

O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a

intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda

de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre

alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para

frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc

No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses

trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego

Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso

Frederico afirma que

Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23

A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da

agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em

segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees

No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este

processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas

nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica

quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo

Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24

23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

23

Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo

para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O

trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do

patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo

lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos

trabalhadores pela induacutestria ele me diz que

Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25

Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural

da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas

relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar

com essa nova dinacircmica

Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo

visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas

vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se

aproxima da percepccedilatildeo de Carlos

Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26

Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para

ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes

se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio

trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as

ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que

pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha

25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11

24

trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem

trabalho

Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe

complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho

pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida

que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram

Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no

campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e

trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte

das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave

trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a

perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura

Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27

Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de

alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute

registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses

trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas

A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade

de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As

oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um

maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa

condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos

desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor

a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado

O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos

Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo

Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa

27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10

25

Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28

Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas

anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do

empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da

cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram

nesse processo

O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho

financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para

empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a

demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de

trabalhadores agrave disposiccedilatildeo

Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no

municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do

empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor

produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que

A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29

Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos

gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por

ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e

possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio

A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees

municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno

28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM

26

desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos

proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e

do APL do vestuaacuterio na cidade 31

No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi

substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e

mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e

vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa

aacutereardquo

Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do

Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos

profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes

tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o

interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo

de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores

tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo

foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal

finalidade

De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho

rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da

folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo

A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como

Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes

Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o

municiacutepio de Terra Roxa

30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

27

Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34

O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de

trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda

continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila

tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de

garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno

dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o

campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre

os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal

As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma

alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida

ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores

possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -

com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou

outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por

perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista

dentre outros natildeo os oferece

Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes

trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de

classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de

melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no

ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a

trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em

outra cidade ela me disse que

Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35

34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

28

Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave

mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem

organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de

novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar

com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as

expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita

vantagem assimrdquo

Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para

Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se

demo na faacutebricardquo36

Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram

trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar

mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia

com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando

pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que

Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37

Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter

voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no

campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em

Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que

natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar

36 IDEM 37 IDEM

29

As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila

pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com

a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma

mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila

natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na

narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do

casal

Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas

construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril

Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho

na faacutebrica ela me disse que

Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38

Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que

gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as

dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores

preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica

ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na

avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em

conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho

O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como

Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos

indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em

casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria

Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista

Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim

38 IDEM

30

de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por

menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes

oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc

como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado

na Escola do Trabalho

Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o

tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram

mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias

permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas

relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais

Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns

trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de

compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas

tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa

39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

31

CAPIacuteTULO 2

TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40

Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa

natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O

municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande

polo de empregos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de

investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade

de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um

grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41

Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo

como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem

indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e

aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de

desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente

O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de

julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do

Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para

bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda

afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um

terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio

A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral

retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o

40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013

32

processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no

ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir

Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa

fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda

bebecirc pra terra roxa

Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43

A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande

destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da

cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra

Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o

municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo

queacuterdquo

No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves

transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que

este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo

sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em

resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores

Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa

industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo

enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa

Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20

principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a

43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

33

janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos

registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores

vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e

desligamento nesses setores

Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa

Meses Jan de 2003 a Jan de 2011

CBO ndash Frequumlecircncia

Admissotildees Desligamentos

Saldo

1ordm Emp

Reemp

Reint

C Prz Det

Transf

Total

Disp sem J Causa

Disp com J Causa

A Pedido

Term Contr

Aposent

Morte

Term C Prz Deter

Transf

Total

Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da

confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390

Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443

Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie

271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109

Costureira de peccedilas sob encomenda

171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em

geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio

varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina

60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio

em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina

bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas

34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27

Trabalhador agropecuaacuterio em geral

19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador

de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5

Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39

Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie

6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras

10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente

administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio

32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa

24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27

Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013

34

Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

35

Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

36

mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

37

curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

38

Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

41

que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

42

Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

45

Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

46

Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

22

oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando

permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute

associada a comprar roupas e tecircnis de marca

O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a

intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda

de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre

alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para

frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc

No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses

trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego

Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso

Frederico afirma que

Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23

A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da

agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em

segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees

No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este

processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas

nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica

quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo

Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24

23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

23

Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo

para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O

trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do

patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo

lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos

trabalhadores pela induacutestria ele me diz que

Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25

Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural

da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas

relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar

com essa nova dinacircmica

Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo

visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas

vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se

aproxima da percepccedilatildeo de Carlos

Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26

Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para

ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes

se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio

trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as

ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que

pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha

25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11

24

trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem

trabalho

Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe

complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho

pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida

que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram

Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no

campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e

trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte

das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave

trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a

perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura

Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27

Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de

alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute

registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses

trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas

A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade

de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As

oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um

maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa

condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos

desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor

a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado

O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos

Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo

Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa

27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10

25

Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28

Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas

anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do

empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da

cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram

nesse processo

O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho

financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para

empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a

demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de

trabalhadores agrave disposiccedilatildeo

Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no

municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do

empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor

produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que

A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29

Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos

gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por

ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e

possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio

A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees

municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno

28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM

26

desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos

proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e

do APL do vestuaacuterio na cidade 31

No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi

substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e

mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e

vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa

aacutereardquo

Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do

Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos

profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes

tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o

interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo

de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores

tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo

foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal

finalidade

De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho

rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da

folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo

A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como

Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes

Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o

municiacutepio de Terra Roxa

30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

27

Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34

O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de

trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda

continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila

tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de

garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno

dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o

campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre

os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal

As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma

alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida

ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores

possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -

com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou

outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por

perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista

dentre outros natildeo os oferece

Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes

trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de

classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de

melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no

ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a

trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em

outra cidade ela me disse que

Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35

34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

28

Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave

mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem

organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de

novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar

com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as

expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita

vantagem assimrdquo

Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para

Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se

demo na faacutebricardquo36

Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram

trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar

mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia

com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando

pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que

Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37

Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter

voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no

campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em

Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que

natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar

36 IDEM 37 IDEM

29

As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila

pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com

a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma

mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila

natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na

narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do

casal

Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas

construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril

Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho

na faacutebrica ela me disse que

Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38

Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que

gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as

dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores

preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica

ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na

avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em

conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho

O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como

Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos

indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em

casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria

Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista

Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim

38 IDEM

30

de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por

menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes

oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc

como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado

na Escola do Trabalho

Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o

tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram

mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias

permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas

relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais

Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns

trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de

compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas

tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa

39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

31

CAPIacuteTULO 2

TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40

Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa

natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O

municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande

polo de empregos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de

investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade

de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um

grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41

Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo

como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem

indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e

aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de

desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente

O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de

julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do

Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para

bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda

afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um

terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio

A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral

retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o

40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013

32

processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no

ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir

Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa

fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda

bebecirc pra terra roxa

Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43

A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande

destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da

cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra

Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o

municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo

queacuterdquo

No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves

transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que

este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo

sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em

resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores

Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa

industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo

enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa

Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20

principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a

43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

33

janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos

registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores

vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e

desligamento nesses setores

Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa

Meses Jan de 2003 a Jan de 2011

CBO ndash Frequumlecircncia

Admissotildees Desligamentos

Saldo

1ordm Emp

Reemp

Reint

C Prz Det

Transf

Total

Disp sem J Causa

Disp com J Causa

A Pedido

Term Contr

Aposent

Morte

Term C Prz Deter

Transf

Total

Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da

confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390

Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443

Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie

271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109

Costureira de peccedilas sob encomenda

171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em

geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio

varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina

60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio

em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina

bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas

34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27

Trabalhador agropecuaacuterio em geral

19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador

de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5

Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39

Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie

6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras

10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente

administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio

32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa

24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27

Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013

34

Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

35

Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

36

mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

37

curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

38

Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

41

que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

42

Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

45

Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

46

Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

23

Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo

para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O

trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do

patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo

lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos

trabalhadores pela induacutestria ele me diz que

Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25

Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural

da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas

relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar

com essa nova dinacircmica

Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo

visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas

vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se

aproxima da percepccedilatildeo de Carlos

Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26

Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para

ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes

se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio

trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as

ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que

pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha

25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11

24

trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem

trabalho

Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe

complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho

pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida

que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram

Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no

campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e

trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte

das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave

trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a

perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura

Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27

Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de

alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute

registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses

trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas

A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade

de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As

oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um

maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa

condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos

desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor

a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado

O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos

Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo

Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa

27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10

25

Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28

Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas

anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do

empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da

cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram

nesse processo

O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho

financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para

empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a

demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de

trabalhadores agrave disposiccedilatildeo

Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no

municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do

empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor

produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que

A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29

Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos

gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por

ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e

possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio

A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees

municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno

28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM

26

desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos

proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e

do APL do vestuaacuterio na cidade 31

No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi

substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e

mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e

vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa

aacutereardquo

Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do

Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos

profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes

tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o

interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo

de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores

tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo

foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal

finalidade

De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho

rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da

folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo

A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como

Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes

Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o

municiacutepio de Terra Roxa

30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

27

Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34

O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de

trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda

continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila

tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de

garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno

dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o

campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre

os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal

As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma

alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida

ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores

possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -

com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou

outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por

perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista

dentre outros natildeo os oferece

Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes

trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de

classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de

melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no

ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a

trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em

outra cidade ela me disse que

Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35

34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

28

Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave

mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem

organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de

novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar

com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as

expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita

vantagem assimrdquo

Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para

Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se

demo na faacutebricardquo36

Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram

trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar

mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia

com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando

pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que

Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37

Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter

voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no

campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em

Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que

natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar

36 IDEM 37 IDEM

29

As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila

pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com

a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma

mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila

natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na

narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do

casal

Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas

construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril

Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho

na faacutebrica ela me disse que

Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38

Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que

gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as

dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores

preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica

ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na

avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em

conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho

O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como

Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos

indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em

casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria

Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista

Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim

38 IDEM

30

de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por

menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes

oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc

como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado

na Escola do Trabalho

Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o

tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram

mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias

permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas

relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais

Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns

trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de

compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas

tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa

39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

31

CAPIacuteTULO 2

TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40

Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa

natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O

municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande

polo de empregos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de

investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade

de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um

grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41

Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo

como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem

indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e

aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de

desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente

O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de

julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do

Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para

bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda

afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um

terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio

A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral

retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o

40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013

32

processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no

ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir

Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa

fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda

bebecirc pra terra roxa

Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43

A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande

destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da

cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra

Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o

municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo

queacuterdquo

No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves

transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que

este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo

sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em

resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores

Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa

industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo

enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa

Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20

principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a

43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

33

janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos

registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores

vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e

desligamento nesses setores

Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa

Meses Jan de 2003 a Jan de 2011

CBO ndash Frequumlecircncia

Admissotildees Desligamentos

Saldo

1ordm Emp

Reemp

Reint

C Prz Det

Transf

Total

Disp sem J Causa

Disp com J Causa

A Pedido

Term Contr

Aposent

Morte

Term C Prz Deter

Transf

Total

Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da

confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390

Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443

Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie

271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109

Costureira de peccedilas sob encomenda

171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em

geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio

varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina

60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio

em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina

bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas

34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27

Trabalhador agropecuaacuterio em geral

19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador

de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5

Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39

Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie

6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras

10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente

administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio

32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa

24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27

Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013

34

Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

35

Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

36

mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

37

curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

38

Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

42

Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

24

trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem

trabalho

Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe

complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho

pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida

que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram

Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no

campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e

trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte

das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave

trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a

perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura

Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27

Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de

alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute

registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses

trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas

A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade

de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As

oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um

maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa

condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos

desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor

a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado

O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos

Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo

Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa

27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10

25

Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28

Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas

anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do

empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da

cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram

nesse processo

O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho

financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para

empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a

demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de

trabalhadores agrave disposiccedilatildeo

Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no

municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do

empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor

produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que

A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29

Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos

gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por

ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e

possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio

A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees

municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno

28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM

26

desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos

proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e

do APL do vestuaacuterio na cidade 31

No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi

substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e

mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e

vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa

aacutereardquo

Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do

Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos

profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes

tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o

interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo

de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores

tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo

foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal

finalidade

De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho

rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da

folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo

A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como

Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes

Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o

municiacutepio de Terra Roxa

30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

27

Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34

O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de

trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda

continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila

tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de

garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno

dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o

campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre

os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal

As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma

alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida

ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores

possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -

com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou

outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por

perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista

dentre outros natildeo os oferece

Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes

trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de

classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de

melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no

ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a

trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em

outra cidade ela me disse que

Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35

34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

28

Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave

mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem

organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de

novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar

com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as

expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita

vantagem assimrdquo

Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para

Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se

demo na faacutebricardquo36

Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram

trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar

mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia

com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando

pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que

Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37

Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter

voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no

campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em

Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que

natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar

36 IDEM 37 IDEM

29

As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila

pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com

a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma

mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila

natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na

narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do

casal

Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas

construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril

Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho

na faacutebrica ela me disse que

Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38

Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que

gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as

dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores

preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica

ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na

avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em

conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho

O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como

Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos

indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em

casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria

Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista

Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim

38 IDEM

30

de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por

menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes

oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc

como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado

na Escola do Trabalho

Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o

tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram

mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias

permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas

relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais

Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns

trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de

compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas

tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa

39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

31

CAPIacuteTULO 2

TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40

Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa

natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O

municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande

polo de empregos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de

investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade

de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um

grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41

Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo

como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem

indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e

aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de

desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente

O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de

julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do

Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para

bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda

afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um

terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio

A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral

retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o

40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013

32

processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no

ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir

Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa

fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda

bebecirc pra terra roxa

Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43

A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande

destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da

cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra

Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o

municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo

queacuterdquo

No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves

transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que

este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo

sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em

resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores

Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa

industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo

enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa

Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20

principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a

43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

33

janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos

registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores

vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e

desligamento nesses setores

Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa

Meses Jan de 2003 a Jan de 2011

CBO ndash Frequumlecircncia

Admissotildees Desligamentos

Saldo

1ordm Emp

Reemp

Reint

C Prz Det

Transf

Total

Disp sem J Causa

Disp com J Causa

A Pedido

Term Contr

Aposent

Morte

Term C Prz Deter

Transf

Total

Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da

confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390

Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443

Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie

271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109

Costureira de peccedilas sob encomenda

171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em

geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio

varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina

60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio

em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina

bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas

34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27

Trabalhador agropecuaacuterio em geral

19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador

de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5

Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39

Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie

6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras

10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente

administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio

32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa

24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27

Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013

34

Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

35

Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

36

mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

37

curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

38

Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

41

que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

42

Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

44

industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

45

Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

25

Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28

Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas

anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do

empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da

cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram

nesse processo

O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho

financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para

empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a

demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de

trabalhadores agrave disposiccedilatildeo

Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no

municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do

empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor

produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que

A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29

Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos

gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por

ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e

possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio

A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees

municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno

28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM

26

desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos

proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e

do APL do vestuaacuterio na cidade 31

No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi

substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e

mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e

vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa

aacutereardquo

Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do

Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos

profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes

tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o

interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo

de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores

tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo

foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal

finalidade

De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho

rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da

folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo

A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como

Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes

Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o

municiacutepio de Terra Roxa

30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

27

Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34

O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de

trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda

continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila

tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de

garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno

dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o

campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre

os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal

As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma

alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida

ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores

possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -

com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou

outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por

perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista

dentre outros natildeo os oferece

Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes

trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de

classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de

melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no

ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a

trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em

outra cidade ela me disse que

Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35

34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

28

Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave

mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem

organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de

novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar

com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as

expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita

vantagem assimrdquo

Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para

Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se

demo na faacutebricardquo36

Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram

trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar

mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia

com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando

pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que

Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37

Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter

voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no

campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em

Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que

natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar

36 IDEM 37 IDEM

29

As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila

pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com

a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma

mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila

natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na

narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do

casal

Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas

construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril

Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho

na faacutebrica ela me disse que

Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38

Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que

gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as

dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores

preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica

ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na

avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em

conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho

O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como

Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos

indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em

casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria

Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista

Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim

38 IDEM

30

de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por

menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes

oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc

como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado

na Escola do Trabalho

Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o

tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram

mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias

permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas

relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais

Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns

trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de

compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas

tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa

39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

31

CAPIacuteTULO 2

TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40

Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa

natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O

municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande

polo de empregos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de

investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade

de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um

grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41

Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo

como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem

indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e

aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de

desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente

O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de

julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do

Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para

bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda

afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um

terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio

A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral

retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o

40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013

32

processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no

ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir

Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa

fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda

bebecirc pra terra roxa

Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43

A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande

destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da

cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra

Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o

municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo

queacuterdquo

No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves

transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que

este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo

sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em

resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores

Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa

industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo

enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa

Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20

principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a

43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

33

janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos

registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores

vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e

desligamento nesses setores

Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa

Meses Jan de 2003 a Jan de 2011

CBO ndash Frequumlecircncia

Admissotildees Desligamentos

Saldo

1ordm Emp

Reemp

Reint

C Prz Det

Transf

Total

Disp sem J Causa

Disp com J Causa

A Pedido

Term Contr

Aposent

Morte

Term C Prz Deter

Transf

Total

Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da

confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390

Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443

Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie

271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109

Costureira de peccedilas sob encomenda

171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em

geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio

varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina

60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio

em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina

bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas

34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27

Trabalhador agropecuaacuterio em geral

19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador

de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5

Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39

Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie

6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras

10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente

administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio

32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa

24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27

Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013

34

Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

35

Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

36

mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

37

curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

38

Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

41

que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

42

Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

44

industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

45

Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

26

desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos

proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e

do APL do vestuaacuterio na cidade 31

No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi

substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e

mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e

vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa

aacutereardquo

Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do

Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos

profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes

tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o

interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo

de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores

tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo

foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal

finalidade

De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho

rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da

folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo

A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como

Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes

Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o

municiacutepio de Terra Roxa

30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

27

Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34

O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de

trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda

continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila

tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de

garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno

dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o

campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre

os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal

As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma

alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida

ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores

possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -

com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou

outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por

perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista

dentre outros natildeo os oferece

Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes

trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de

classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de

melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no

ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a

trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em

outra cidade ela me disse que

Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35

34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

28

Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave

mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem

organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de

novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar

com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as

expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita

vantagem assimrdquo

Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para

Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se

demo na faacutebricardquo36

Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram

trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar

mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia

com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando

pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que

Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37

Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter

voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no

campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em

Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que

natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar

36 IDEM 37 IDEM

29

As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila

pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com

a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma

mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila

natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na

narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do

casal

Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas

construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril

Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho

na faacutebrica ela me disse que

Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38

Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que

gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as

dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores

preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica

ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na

avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em

conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho

O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como

Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos

indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em

casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria

Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista

Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim

38 IDEM

30

de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por

menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes

oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc

como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado

na Escola do Trabalho

Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o

tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram

mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias

permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas

relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais

Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns

trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de

compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas

tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa

39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

31

CAPIacuteTULO 2

TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40

Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa

natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O

municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande

polo de empregos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de

investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade

de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um

grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41

Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo

como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem

indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e

aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de

desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente

O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de

julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do

Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para

bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda

afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um

terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio

A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral

retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o

40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013

32

processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no

ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir

Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa

fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda

bebecirc pra terra roxa

Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43

A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande

destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da

cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra

Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o

municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo

queacuterdquo

No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves

transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que

este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo

sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em

resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores

Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa

industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo

enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa

Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20

principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a

43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

33

janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos

registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores

vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e

desligamento nesses setores

Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa

Meses Jan de 2003 a Jan de 2011

CBO ndash Frequumlecircncia

Admissotildees Desligamentos

Saldo

1ordm Emp

Reemp

Reint

C Prz Det

Transf

Total

Disp sem J Causa

Disp com J Causa

A Pedido

Term Contr

Aposent

Morte

Term C Prz Deter

Transf

Total

Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da

confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390

Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443

Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie

271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109

Costureira de peccedilas sob encomenda

171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em

geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio

varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina

60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio

em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina

bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas

34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27

Trabalhador agropecuaacuterio em geral

19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador

de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5

Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39

Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie

6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras

10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente

administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio

32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa

24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27

Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013

34

Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

35

Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

36

mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

37

curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

38

Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

41

que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

42

Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

44

industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

45

Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

46

Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

27

Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34

O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de

trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda

continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila

tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de

garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno

dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o

campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre

os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal

As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma

alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida

ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores

possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -

com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou

outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por

perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista

dentre outros natildeo os oferece

Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes

trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de

classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de

melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no

ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a

trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em

outra cidade ela me disse que

Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35

34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

28

Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave

mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem

organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de

novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar

com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as

expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita

vantagem assimrdquo

Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para

Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se

demo na faacutebricardquo36

Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram

trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar

mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia

com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando

pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que

Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37

Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter

voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no

campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em

Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que

natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar

36 IDEM 37 IDEM

29

As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila

pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com

a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma

mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila

natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na

narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do

casal

Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas

construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril

Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho

na faacutebrica ela me disse que

Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38

Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que

gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as

dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores

preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica

ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na

avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em

conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho

O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como

Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos

indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em

casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria

Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista

Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim

38 IDEM

30

de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por

menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes

oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc

como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado

na Escola do Trabalho

Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o

tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram

mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias

permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas

relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais

Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns

trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de

compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas

tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa

39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

31

CAPIacuteTULO 2

TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40

Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa

natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O

municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande

polo de empregos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de

investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade

de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um

grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41

Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo

como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem

indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e

aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de

desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente

O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de

julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do

Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para

bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda

afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um

terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio

A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral

retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o

40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013

32

processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no

ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir

Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa

fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda

bebecirc pra terra roxa

Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43

A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande

destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da

cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra

Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o

municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo

queacuterdquo

No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves

transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que

este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo

sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em

resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores

Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa

industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo

enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa

Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20

principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a

43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

33

janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos

registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores

vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e

desligamento nesses setores

Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa

Meses Jan de 2003 a Jan de 2011

CBO ndash Frequumlecircncia

Admissotildees Desligamentos

Saldo

1ordm Emp

Reemp

Reint

C Prz Det

Transf

Total

Disp sem J Causa

Disp com J Causa

A Pedido

Term Contr

Aposent

Morte

Term C Prz Deter

Transf

Total

Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da

confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390

Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443

Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie

271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109

Costureira de peccedilas sob encomenda

171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em

geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio

varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina

60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio

em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina

bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas

34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27

Trabalhador agropecuaacuterio em geral

19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador

de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5

Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39

Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie

6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras

10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente

administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio

32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa

24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27

Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013

34

Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

35

Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

36

mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

37

curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

38

Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

41

que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

42

Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

28

Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave

mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem

organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de

novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar

com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as

expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita

vantagem assimrdquo

Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para

Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se

demo na faacutebricardquo36

Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram

trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar

mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia

com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando

pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que

Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37

Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter

voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no

campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em

Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que

natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar

36 IDEM 37 IDEM

29

As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila

pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com

a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma

mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila

natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na

narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do

casal

Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas

construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril

Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho

na faacutebrica ela me disse que

Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38

Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que

gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as

dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores

preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica

ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na

avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em

conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho

O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como

Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos

indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em

casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria

Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista

Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim

38 IDEM

30

de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por

menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes

oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc

como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado

na Escola do Trabalho

Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o

tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram

mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias

permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas

relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais

Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns

trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de

compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas

tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa

39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

31

CAPIacuteTULO 2

TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40

Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa

natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O

municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande

polo de empregos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de

investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade

de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um

grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41

Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo

como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem

indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e

aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de

desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente

O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de

julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do

Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para

bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda

afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um

terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio

A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral

retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o

40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013

32

processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no

ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir

Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa

fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda

bebecirc pra terra roxa

Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43

A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande

destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da

cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra

Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o

municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo

queacuterdquo

No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves

transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que

este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo

sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em

resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores

Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa

industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo

enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa

Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20

principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a

43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

33

janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos

registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores

vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e

desligamento nesses setores

Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa

Meses Jan de 2003 a Jan de 2011

CBO ndash Frequumlecircncia

Admissotildees Desligamentos

Saldo

1ordm Emp

Reemp

Reint

C Prz Det

Transf

Total

Disp sem J Causa

Disp com J Causa

A Pedido

Term Contr

Aposent

Morte

Term C Prz Deter

Transf

Total

Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da

confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390

Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443

Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie

271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109

Costureira de peccedilas sob encomenda

171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em

geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio

varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina

60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio

em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina

bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas

34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27

Trabalhador agropecuaacuterio em geral

19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador

de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5

Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39

Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie

6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras

10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente

administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio

32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa

24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27

Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013

34

Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

35

Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

36

mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

37

curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

38

Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

41

que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

42

Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

44

industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

45

Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

46

Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

29

As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila

pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com

a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma

mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila

natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na

narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do

casal

Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas

construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril

Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho

na faacutebrica ela me disse que

Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38

Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que

gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as

dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores

preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica

ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na

avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em

conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho

O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como

Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos

indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em

casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria

Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista

Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim

38 IDEM

30

de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por

menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes

oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc

como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado

na Escola do Trabalho

Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o

tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram

mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias

permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas

relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais

Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns

trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de

compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas

tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa

39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

31

CAPIacuteTULO 2

TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40

Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa

natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O

municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande

polo de empregos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de

investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade

de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um

grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41

Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo

como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem

indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e

aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de

desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente

O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de

julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do

Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para

bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda

afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um

terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio

A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral

retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o

40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013

32

processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no

ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir

Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa

fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda

bebecirc pra terra roxa

Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43

A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande

destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da

cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra

Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o

municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo

queacuterdquo

No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves

transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que

este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo

sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em

resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores

Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa

industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo

enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa

Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20

principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a

43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

33

janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos

registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores

vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e

desligamento nesses setores

Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa

Meses Jan de 2003 a Jan de 2011

CBO ndash Frequumlecircncia

Admissotildees Desligamentos

Saldo

1ordm Emp

Reemp

Reint

C Prz Det

Transf

Total

Disp sem J Causa

Disp com J Causa

A Pedido

Term Contr

Aposent

Morte

Term C Prz Deter

Transf

Total

Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da

confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390

Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443

Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie

271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109

Costureira de peccedilas sob encomenda

171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em

geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio

varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina

60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio

em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina

bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas

34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27

Trabalhador agropecuaacuterio em geral

19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador

de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5

Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39

Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie

6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras

10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente

administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio

32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa

24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27

Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013

34

Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

35

Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

36

mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

37

curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

38

Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

41

que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

42

Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

45

Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

46

Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

30

de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por

menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes

oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc

como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado

na Escola do Trabalho

Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o

tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram

mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias

permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas

relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais

Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns

trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de

compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas

tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do

processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa

39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

31

CAPIacuteTULO 2

TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40

Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa

natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O

municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande

polo de empregos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de

investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade

de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um

grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41

Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo

como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem

indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e

aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de

desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente

O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de

julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do

Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para

bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda

afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um

terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio

A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral

retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o

40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013

32

processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no

ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir

Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa

fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda

bebecirc pra terra roxa

Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43

A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande

destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da

cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra

Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o

municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo

queacuterdquo

No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves

transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que

este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo

sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em

resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores

Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa

industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo

enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa

Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20

principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a

43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

33

janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos

registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores

vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e

desligamento nesses setores

Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa

Meses Jan de 2003 a Jan de 2011

CBO ndash Frequumlecircncia

Admissotildees Desligamentos

Saldo

1ordm Emp

Reemp

Reint

C Prz Det

Transf

Total

Disp sem J Causa

Disp com J Causa

A Pedido

Term Contr

Aposent

Morte

Term C Prz Deter

Transf

Total

Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da

confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390

Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443

Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie

271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109

Costureira de peccedilas sob encomenda

171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em

geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio

varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina

60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio

em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina

bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas

34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27

Trabalhador agropecuaacuterio em geral

19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador

de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5

Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39

Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie

6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras

10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente

administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio

32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa

24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27

Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013

34

Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

35

Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

36

mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

37

curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

38

Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

31

CAPIacuteTULO 2

TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40

Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa

natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O

municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande

polo de empregos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de

investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade

de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um

grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41

Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo

como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem

indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e

aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de

desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente

O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de

julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do

Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para

bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda

afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um

terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio

A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral

retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o

40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013

32

processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no

ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir

Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa

fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda

bebecirc pra terra roxa

Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43

A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande

destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da

cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra

Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o

municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo

queacuterdquo

No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves

transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que

este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo

sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em

resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores

Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa

industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo

enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa

Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20

principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a

43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

33

janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos

registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores

vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e

desligamento nesses setores

Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa

Meses Jan de 2003 a Jan de 2011

CBO ndash Frequumlecircncia

Admissotildees Desligamentos

Saldo

1ordm Emp

Reemp

Reint

C Prz Det

Transf

Total

Disp sem J Causa

Disp com J Causa

A Pedido

Term Contr

Aposent

Morte

Term C Prz Deter

Transf

Total

Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da

confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390

Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443

Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie

271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109

Costureira de peccedilas sob encomenda

171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em

geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio

varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina

60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio

em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina

bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas

34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27

Trabalhador agropecuaacuterio em geral

19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador

de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5

Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39

Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie

6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras

10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente

administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio

32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa

24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27

Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013

34

Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

35

Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

36

mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

37

curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

38

Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

41

que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

42

Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

44

industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

45

Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

46

Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

32

processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no

ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir

Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa

fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda

bebecirc pra terra roxa

Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43

A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande

destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da

cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra

Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o

municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo

queacuterdquo

No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves

transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que

este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo

sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em

resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores

Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa

industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo

enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa

Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20

principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a

43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011

33

janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos

registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores

vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e

desligamento nesses setores

Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa

Meses Jan de 2003 a Jan de 2011

CBO ndash Frequumlecircncia

Admissotildees Desligamentos

Saldo

1ordm Emp

Reemp

Reint

C Prz Det

Transf

Total

Disp sem J Causa

Disp com J Causa

A Pedido

Term Contr

Aposent

Morte

Term C Prz Deter

Transf

Total

Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da

confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390

Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443

Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie

271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109

Costureira de peccedilas sob encomenda

171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em

geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio

varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina

60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio

em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina

bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas

34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27

Trabalhador agropecuaacuterio em geral

19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador

de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5

Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39

Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie

6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras

10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente

administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio

32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa

24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27

Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013

34

Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

35

Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

36

mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

37

curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

38

Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

41

que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

42

Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

44

industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

45

Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

46

Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

33

janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos

registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores

vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e

desligamento nesses setores

Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa

Meses Jan de 2003 a Jan de 2011

CBO ndash Frequumlecircncia

Admissotildees Desligamentos

Saldo

1ordm Emp

Reemp

Reint

C Prz Det

Transf

Total

Disp sem J Causa

Disp com J Causa

A Pedido

Term Contr

Aposent

Morte

Term C Prz Deter

Transf

Total

Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da

confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390

Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443

Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie

271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109

Costureira de peccedilas sob encomenda

171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em

geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio

varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina

60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio

em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina

bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas

34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27

Trabalhador agropecuaacuterio em geral

19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador

de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5

Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39

Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie

6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras

10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente

administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio

32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa

24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27

Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013

34

Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

35

Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

36

mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

37

curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

38

Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

41

que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

42

Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

44

industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

45

Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

46

Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

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FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

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Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave

induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual

entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o

maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo

tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos

Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar

temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar

temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e

soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos

desligamentos no setor industrial

Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram

um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa

com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os

distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram

entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias

concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT

O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos

dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo causa aos trabalhadores

No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45

As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais

no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande

desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47

entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem

influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores

industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em

periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees

44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM

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Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

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mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

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curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

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faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

44

industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

45

Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

46

Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

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FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

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Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo

relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes

trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu

espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo

Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de

conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das

faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir

da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra

Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas

bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de

vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e

motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores

Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da

trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em

uma faacutebrica de bordado

Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47

O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a

compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser

procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em

sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas

condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia

Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a

esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de

trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio

46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45

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mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

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curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

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faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

45

Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

46

Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

36

mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute

ldquochurrasco final do anordquo48

Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas

no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi

possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -

alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees

sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso

profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso

de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos

mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc

Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc

da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha

funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a

trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos

indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um

setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de

remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses

Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da

induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam

o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma

possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo

infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso

de peluacutecia almofadas etcrdquo50

O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser

relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda

se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou

mesmo no setor de vestuaacuterio

Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes

trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes

antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o

48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012

37

curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

38

Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

41

que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

42

Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

37

curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos

nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem

do curso jaacute empregados

As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um

nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma

maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao

curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego

Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo

significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees

que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se

ldquoespecializamrdquo

Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa

qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente

na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde

entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de

crescer dentro da empresa e ele disse que

Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51

Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua

qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos

tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar

prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e

necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho

e decisotildees na vida

A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos

atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho

oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e

de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre

como decidem os cursos que seratildeo ofertados

51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

40

faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

41

que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

42

Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

45

Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

46

Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

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Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

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Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52

Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e

maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum

destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham

uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute

que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu

proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular

Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de

qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles

uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi

Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53

Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo

precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de

acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No

entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos

de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio

Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54

Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o

perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores

52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM

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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

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faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

39

que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc

e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio

negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos

anteriormente

Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado

aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o

curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de

trabalho e adquirirem carteira assinada

No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos

profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e

expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos

anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a

trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica

Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55

A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do

ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que

natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a

deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso

por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para

ajudar na casa da matildee

Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a

matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre

55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

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faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

41

que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

45

Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

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Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

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faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua

condiccedilatildeo de vida e de seus familiares

Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela

havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora

somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que

apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra

Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57

Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais

produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava

(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua

empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda

A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica

territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta

analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da

informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se

tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla

jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se

com o trabalho domeacutestico58

No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores

que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do

trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como

aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em

casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam

mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo

A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras

trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda

56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166

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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

41

que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento

significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras

Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas

pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era

uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como

um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua

primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica

Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo

ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus

que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor

pro meu filho e pra minha matildee60rdquo

O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as

possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas

relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas

expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com

o trabalho que exerceu na casa da vizinha

Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que

trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que

pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o

salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o

salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante

desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das

conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem

Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo

de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou

mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos

que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da

faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que

estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios

60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011

42

Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

44

industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

45

Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

46

Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

42

Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de

trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da

Escola do trabalho diz

Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62

Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na

aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a

trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me

ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a

seguranccedila de saiacuterem empregados

Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas

induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os

trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como

Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a

qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi

rapidamente contratada

Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64

Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou

outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a

rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas

disponibilizam

Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de

confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando

62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

44

industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

45

Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

46

Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

43

Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa

de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em

periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande

nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e

consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores

Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor

da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a

confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se

movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por

conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a

seus interesses

Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de

vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai

nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em

dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam

natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e

aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores

As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de

obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os

trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como

podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo

A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66

Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado

para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em

expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de

65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013

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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

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Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

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era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

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Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

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No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

44

industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido

visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute

mesmo nos distritos

No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de

algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do

municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa

Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa

Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas

maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento

ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para

distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande

quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por

trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que

possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas

O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais

conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em

se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha

por esse trabalho ele afirma que

Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67

Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho

que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea

da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter

que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar

vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo

Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da

induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele

jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo

67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

45

Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

46

Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

45

Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e

trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do

trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a

transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel

cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo

contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores

nessa relaccedilatildeo Segundo o autor

Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69

Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo

radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz

uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo

trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um

trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida

industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute

uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica

enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo

com suas necessidades e interesses

No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma

positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas

decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na

induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que

Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70

68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

46

Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

47

Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

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Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

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FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

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lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito

recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma

infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida

dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua

narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na

empresa de moda bebecirc a 8 anos

Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos

que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a

receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao

trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que

seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute

isso que seu trabalho garantia

Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria

mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -

como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes

A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72

O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses

trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho

carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de

natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das

dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem

conta nos armazeacutens

Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como

sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita

Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do

trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda

instaacutevel

71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

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Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

48

era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

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Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

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No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

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FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

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lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

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Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73

A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o

marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre

evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de

trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que

esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que

somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda

Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores

expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos

atraacutes como ela relata

Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74

Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade

em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira

experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no

intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural

Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo

73 IDEM 74 IDEM

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era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

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Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

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No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

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FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

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lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

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era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75

A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na

fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o

trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia

Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a

renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para

mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses

trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas

Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76

Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma

trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a

outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora

diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais

rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da

trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades

que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares

Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem

no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como

a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e

comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia

75 IDEM 76 IDEM

49

A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

51

CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

53

FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

55

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

56

PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

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A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77

Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns

bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto

percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para

adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos

trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave

trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao

trabalho e agraves decisotildees que encaminham

Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho

muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada

pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina

sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele

Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos

trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a

possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar

os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de

confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas

vidas

A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o

hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor

condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios

os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a

transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos

narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita

Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78

77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013

50

Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

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No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

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FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

54

lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

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Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice

tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo

diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio

voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de

possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo

e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem

ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a

que destaco abaixo

Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79

Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os

empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos

ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm

consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste

processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o

sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de

situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e

identificam em comum

Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de

industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando

mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho

intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da

induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem

relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos

de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a

construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas

79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011

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CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

52

No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

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FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

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lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

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CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no

processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios

trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos

Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que

atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as

avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses

sujeitos

Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um

interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como

os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no

municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de

questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das

expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas

Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes

trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam

o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio

principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho

As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes

trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho

buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em

outras relaccedilotildees de trabalho como no campo

O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda

bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas

em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade

Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra

Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso

e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo

das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de

trabalho

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No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

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FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

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lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

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No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de

exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma

possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir

alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se

mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista

das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo

com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar

entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc

A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O

objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores

vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo

De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do

roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram

sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro

entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus

realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram

trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade

Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa

jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a

expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico

municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da

cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a

investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio

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FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

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lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

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FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em

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lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

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lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006

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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997

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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987

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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987