1 universidade estadual do oeste do paranÁ...
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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANAacute CAMPUS DE MARECHAL CAcircNDIDO RONDON
CENTRO DE CIEcircNCIAS HUMANAS EDUCACcedilAtildeO E LETRAS ndash CCHEL COLEGIADO DO CURSO DE HISTOacuteRIA
CAREM ALINE DE OLIVEIRA
SOBRE EXPLORACcedilAtildeO E ALTERNATIVAS NA TRAJETOacuteRIA DE TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA-BEBEcirc
(TERRA ROXA-PR 1990-2013)
Marechal Cacircndido Rondon
2013
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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANAacute CAMPUS DE MARECHAL CAcircNDIDO RONDON
CENTRO DE CIEcircNCIAS HUMANAS EDUCACcedilAtildeO E LETRAS ndash CCHEL COLEGIADO DO CURSO DE HISTOacuteRIA
CAREM ALINE DE OLIVEIRA
SOBRE EXPLORACcedilAtildeO E ALTERNATIVAS NA TRAJETOacuteRIA DE
TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA-BEBEcirc (TERRA ROXA-PR 1990-2013)
Trabalho de Conclusatildeo de Curso ndash TCC sob a orientaccedilatildeo da Drordf Sheille Soares de Freitas apresentado agrave Banca Examinadora como requisito baacutesico para obtenccedilatildeo do tiacutetulo de Licenciatura Plena em Histoacuteria pela Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Campus De Marechal Cacircndido Rondon
Marechal Cacircndido Rondon 2013
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Aos meus pais Agnaldo e Marley
Que abdicam de seus sonhos para realizar os meus
6
AGRADECIMENTOS
Com especial carinho aos meus Pais Agnaldo e Marley trabalhadores que
apesar da difiacutecil situaccedilatildeo fizeram o possiacutevel e o impossiacutevel para que eu pudesse chegar
ateacute este momento Eacute imensuraacutevel a gratidatildeo e orgulho que nutro por vocecircs pois sei de
toda luta e determinaccedilatildeo para verem a filha formada Obrigada por todo o incentivo
ldquopuxotildees de orelhardquo apoio dedicaccedilatildeo e amor
Agradeccedilo aos amigos velhos e novos que iratildeo fazer parte das minhas melhores
lembranccedilas do ldquotempo de faculdaderdquo Em especial Simone Tineneu Dan Tonho Popi
Vassoura Elaine Julius Keka Emer Nayara Luana Paulo e Tati Alegraram as
minhas noites com momentos de descontraccedilatildeo no bar e rodas de violatildeo Por muitas
vezes foram estes momentos que recarregaram as baterias e deram forccedilas para
continuar
Aacute Vania Marilia e Marcos (Xequereu) companheiros do movimento estudantil
que me ensinaram muito durante toda essa caminhada foram nossas discussotildees que
potencializaram minhas inquietaccedilotildees e a vontade de lutar
Aacute Cintia amiga e companheira durante toda a graduaccedilatildeo por todas as risadas
todo apoio as conversas sobre tantas coisas as comilanccedilas as reclamaccedilotildees e claro por
todos os momentos de procrastinaccedilatildeo
Aacute minhas queridas amigas de infacircncia Aline Luciana Suzani Simone e Fran
que mesmo longe sempre estiveram presentes compartilhando anguacutestias e vitoacuterias
Aacute minha tia Elza que contribuiu de inuacutemeras formas para minha moradia em
Marechal Cacircndido Rondon
Aacute minha orientadora Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas por todo aprendizado
dedicaccedilatildeo e compreensatildeo
Aos trabalhadores que gentilmente me receberam em suas casas compartilhando
suas experiecircncias para a realizaccedilatildeo desse trabalho
Ao meu companheiro Marcos antes de qualquer coisa melhor amigo por toda
cobranccedila ajuda paciecircncia e amor
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RESUMO
Este Trabalho de Conclusatildeo de Curso tem a intenccedilatildeo de problematizar analisar e investigar as relaccedilotildees de trabalho que marcam a trajetoacuteria de trabalhadores que compuseram praacuteticas no processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa-PR discutindo o modo como se relacionaram nem sempre amistosamente com as accedilotildees do poder puacuteblico municipal e com a participaccedilatildeo empresarial do ramo ldquomoda bebecircrdquo na cidade A pesquisa abordaraacute as trecircs uacuteltimas deacutecadas pelo fato de esse ser um momento histoacuterico importante pela intensificaccedilatildeo da exploraccedilatildeo industrial em Terra Roxa Essa temporalidade eacute significativa no processo de mudanccedila e produccedilatildeo de relaccedilotildees de trabalho na cidade envolvendo o setor de vestuaacuterio e a produccedilatildeo de alternativas por trabalhadores muitas vezes advindo do meio rural Propomos investigar as condiccedilotildees de vida dos trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam este mercado de trabalho bem como relacionar as memoacuterias e accedilotildees produzidas tanto para o trabalho como para a vida em Terra Roxa Para isso destacamos o trabalho com as fontes orais jornais fichas de cursos profissionalizantes e iacutendices estatiacutesticos como documentaccedilatildeo a ser privilegiada nessa pesquisa O interesse foi manter o diaacutelogo com as evidecircncias e quando necessaacuterio ampliar a anaacutelise de fontes ou mesmo revendo os caminhos da investigaccedilatildeo Esse encaminhamento considera que o conhecimento histoacuterico exige essa construccedilatildeo ao longo da pesquisa como tambeacutem o compromisso com as questotildees em foco
Palavras-chave Trabalhadores Relaccedilotildees de Trabalho Induacutestrias
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Sumaacuterio INTRODUCcedilAtildeO 9
CAPIacuteTULO 1TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc 15
CAPIacuteTULO 2TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES 31
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 51
FONTES 53
REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS 55
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INTRODUCcedilAtildeO
A escolha dos sujeitos e do tema deste estudo (os trabalhadores atualmente
vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa- PR) eacute resultado de minha
trajetoacuteria de vida trabalho e acadecircmica
Primeiro de vida e trabalho porque o trabalho na induacutestria de moda bebecirc jaacute fez
parte de minha atividade profissional por algum tempo Deste modo pude conviver com
outros trabalhadores observar e ouvir suas avaliaccedilotildees sobre suas condiccedilotildees de vida
motivaccedilotildees interesses e conflitos que perpassam esse ambiente de trabalho o que me
instigou a pesquisar o tema De forma que muitas das interpretaccedilotildees e avaliaccedilotildees que os
trabalhadores indicam em suas narrativas atraveacutes das entrevistas feitas jaacute ouvi dos
meus familiares como da minha proacutepria matildee Pois grande parte deles reside em Terra
Roxa e trabalha na induacutestria de moda bebecirc
Segundo como acadecircmica e pesquisadora porque este trabalho de conclusatildeo de
curso eacute continuidade de uma iniciaccedilatildeo cientifica voluntaacuteria (PIC-V) e as questotildees que
estatildeo aqui sendo levantadas eacute uma continuidade das indagaccedilotildees que surgiram a partir de
um diaacutelogo inicial com as fontes feitas nesta pesquisa anterior1
O objetivo central da pesquisa foi investigar as condiccedilotildees de vida de
trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de vestuaacuterio moda bebecirc no municiacutepio de
Terra Roxa-PR problematizando suas relaccedilotildees de trabalho e como se inserem e
interpretam este mercado de trabalho dando visibilidade a estes sujeitos e suas accedilotildees na
cidade
O municiacutepio possui atualmente entre macro e micro cerca de 113 empresas que
produzem em torno de 9 milhotildees de peccedilas envolvendo aproximadamente 2500
trabalhadores empregados diretamente o que segundo a noccedilatildeo do poder publico
municipal ldquodinamiza a geraccedilatildeo de emprego e renda do municiacutepiordquo2 Como podemos
1 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 2 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013
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perceber em uma reportagem do jornal online Gazeta do Povo intitulada ldquoEm Terra
Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojasrdquo
A cadeia da confecccedilatildeo infantil mudou os rumos da cidade de 17 mil habitantes e a vida de muitos paranaenses Maria do Carmo 42 anos eacute um exemplo Ateacute os 38 anos ela trabalhava nos Campos Gerais onde plantava eucalipto Hoje o cenaacuterio eacute o mesmo um siacutetio mas agora ela natildeo lida diretamente com a terra Maria atua no setor de corte de roupas e tambeacutem dirige o ocircnibus que transporta funcionaacuterios da empresa Baby Doces Momentos confecccedilatildeo localizada em um siacutetio de cinco alqueires que produz cerca de 20 mil peccedilas ao mecircs ldquoAgora me sinto melhor Antes trabalhava no sol com uma bomba de 20 litros nas costas para pulverizar e plantarrdquo conta3
A partir do trecho acima percebemos que ao avaliar a dinacircmica industrial no
municiacutepio a reportagem aponta a relaccedilatildeo com a produccedilatildeo e experiecircncia dos trabalhos
no meio rural evidentemente para positivar a expansatildeo desse ramo de induacutestria de
vestuaacuterio como salvaccedilatildeo da cidade jaacute que estas empresas ldquodinamiza a geraccedilatildeo de
emprego e renda do municiacutepiordquo
Eacute importante entender a dimensatildeo dessa estrutura empresarial industrial em
Terra Roxa pois esta historicidade vai abrir caminhos a serem problematizados ao
longo deste trabalho
Para desenvolver esta pesquisa pautamo-nos na dinacircmica que integra a reflexatildeo
da problemaacutetica e o processo de levantamento e anaacutelise de fontes Esse
encaminhamento inspira-se na indicaccedilatildeo de Thompson sobre o diaacutelogo necessaacuterio e
constante entre teoria e evidecircncias histoacutericas4
Segundo Thompson
O interrogador eacute a loacutegica histoacuterica o conteuacutedo da interrogaccedilatildeo eacute uma hipoacutetese o interrogado eacute a evidecircncia com suas propriedades determinadas O objeto do conhecimento histoacuterico eacute a histoacuteria lsquorealrsquo cujas evidecircncias devem ser necessariamente incompletas e imperfeitas5
3 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no-paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 4 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma criacutetica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar Editores 1981 5 IBIDEM p 49
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Isso quer dizer que os historiadores podem selecionar essa ou aquela evidecircncia
propor novas perguntas mas isso natildeo significa que os proacuteprios acontecimentos passados
se modifiquem nem tampouco que seja um agregado de histoacuterias separadas Embora
essa interpretaccedilatildeo do processo histoacuterico surja em resposta agrave pergunta formulada nossa
produccedilatildeo natildeo inventa o processo e natildeo pode modificar o ldquostatus ontoloacutegicordquo do
passado
Eacute nesta perspectiva de anaacutelise que conduziremos este pesquisa Cabe contudo
salientar a contribuiccedilatildeo que esta nos proporciona para a compreensatildeo que proponho
sobre as relaccedilotildees de trabalho experiecircncias e interpretaccedilotildees dos trabalhadores nas
induacutestrias de confecccedilatildeo de moda bebecirc em Terra Roxa Para tanto pensaremos a histoacuteria
em um duplo sentido como experiecircncia humana e como a proacutepria narraccedilatildeo dessas
experiecircncias as interpretaccedilotildees e projeccedilotildees das quais o investigador vai utilizar6
A investigaccedilatildeo neste sentido estaacute relacionada com as problemaacuteticas que o
pesquisador se coloca no presente que envolvem sua experiecircncia de vida e as
concepccedilotildees da qual parte
Pretendo entender a partir das experiecircncias narradas por esses trabalhadores
como eles se inserem e interpretam este mercado de trabalho e fazem prospecccedilotildees
Segundo Thompson
Se determos a histoacuteria num determinado ponto natildeo haacute classe mas simplesmente uma multidatildeo de indiviacuteduos com amontoado de experiecircncias Mas se examinarmos esses homens durante um periacuteodo adequado de mudanccedilas sociais observaremos padrotildees em suas relaccedilotildees sua ideias e instituiccedilotildees A classe eacute definida pelos homens enquanto vivem sua proacutepria histoacuteria e ao final esta eacute sua definiccedilatildeo7
Neste sentido para entendermos os trabalhadores eacute necessaacuteria uma serie de
observaccedilotildees e anaacutelises que se expressam em suas praacuteticas cotidianas como eles
vivenciam e se portam perante sua dinacircmica de trabalho o que possibilita sua formaccedilatildeo
cultural e social
Para esse processo interpretativo utilizamos cinco entrevistas que realizei com
trabalhadores no intuito de potencializar as elaboraccedilotildees construiacutedas por esses sujeitos
sobre as motivaccedilotildees interesses e conflitos ou seja memoacuterias produzidas sobre
6 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987 7 THOMPSON E P ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12
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trajetoacuterias e experiecircncia social compartilhada nas relaccedilotildees dentro e fora das induacutestrias
de vestuaacuterio na cidade
Como um dos meacutetodos de pesquisa foi trabalhar com fontes orais considero
importante apontar algumas dificuldades que encontrei ao realizar algumas entrevistas
Mesmo o municiacutepio empregando mais de 2500 trabalhadores na induacutestria de confecccedilatildeo
minha principal dificuldade foi encontrar trabalhadores que se dispusessem a realizar as
entrevistas
Aqueles que aceitavam soacute concordavam em produzir a entrevista quando
algueacutem muito proacuteximo deles me apresentava O fato de alguns trabalhadores aceitarem
natildeo excluiu a desconfianccedila e inseguranccedila que estes possuiacuteam em relaccedilatildeo agraves entrevistas
Desta forma a inseguranccedila dos trabalhadores sobre se poderiam falar ou natildeo a
respeito de suas relaccedilotildees de trabalho juntamente com a minha falta de experiecircncia em
saber lidar com essas inseguranccedilas prejudicaram o desenvolvimento das entrevistas
As respostas ficaram limitadas ao roteiro muitas vezes limitadas ao ldquosimrdquo ou ao ldquonatildeordquo
Pois aleacutem da timidez ao saberem que estatildeo sendo gravados ainda tive que lidar com o
receio dos entrevistados ao exporem sua trajetoacuteria e condiccedilotildees de vida
As entrevistas orais natildeo foram produto de teacutecnica mas das relaccedilotildees que
consegui desenvolver com esses trabalhadores Portanto o meacutetodo de utilizar fontes
orais consiste em trabalhar com a subjetividade dos indiviacuteduos lidando com as questotildees
postas pelos entrevistados a partir de minhas proacuteprias questotildees
Neste sentido o diaacutelogo com Alessandro Portelli e com outros autores ajudou a
compreender que essa relaccedilatildeo entre entrevistado e entrevistador natildeo eacute um objetivo
muito faacutecil de ser alcanccedilado pois as pessoas reinterpretam e datildeo novos significados aos
acontecimentos passados em funccedilatildeo do que vive no presente ou espera viver Ou ainda
encobrem sentimentos e interpretaccedilotildees por censura repressatildeo temores ou pela pouca
disposiccedilatildeo em falar8
Ao utilizar a fonte oral foi importante dialogar com a produccedilatildeo de Alessandro
Portelli o qual contribuiu para a construccedilatildeo de um procedimento de anaacutelise para a
produccedilatildeo das fontes orais e do olhar lanccedilado sobre esse material O uso de tal fonte na
pesquisa permitiu o enfrentamento da dinacircmica contraditoacuteria de valores e praacuteticas que
compotildeem escolhas pressotildees e expectativas desses sujeitos sociais
8 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 p33
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Nesse sentido permite maior visibilidade poliacutetica da classe trabalhadora com
suas divisotildees e processos de identificaccedilatildeo na condiccedilatildeo de classe compartilhada
produzindo assim uma interpretaccedilatildeo histoacuterica comprometida com o potencial de luta e
intervenccedilatildeo social desses trabalhadores Essa investigaccedilatildeo tambeacutem traz como
enfrentamento lidar com os limites dessa fonte como as dificuldades de conseguir a
aceitaccedilatildeo da gravaccedilatildeo da entrevista e contatar trabalhadores9
O intuito de usarmos a fonte oral nesta pesquisa inspira-se nesta perspectiva de
Portelli Buscamos o trabalho com as entrevista natildeo como confirmaccedilatildeo de uma ldquoteserdquo
inicial mas sim com a intenccedilatildeo de dar visibilidade agraves interpretaccedilotildees construiacutedas pelos
trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa
Para tal associamos essa documentaccedilatildeo com mateacuterias jornaliacutesticas e fichas de
inscriccedilatildeo em cursos (de corte costura e bordado) na Escola do trabalho na cidade Aleacutem
da interpretaccedilatildeo de iacutendices estatiacutesticos sobre empregabilidade atividades econocircmicas
etc
O presente trabalho estaacute estruturado em dois capiacutetulos No primeiro capiacutetulo
busquei analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agrave
induacutestria de moda bebecirc a fim de compreender os motivos que levam esses sujeitos a
perceber a expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de
melhoria e mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas e na permanecircncia em Terra Roxa
No segundo capiacutetulo busco discutir a partir das experiecircncias cotidianas e das
relaccedilotildees de trabalho desses sujeitos as possibilidades e limites das expectativas que
estes trabalhadores estabelecem em relaccedilatildeo ao trabalho na induacutestria de moda bebecirc tal
qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre o
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa10
Essa intenccedilatildeo tenta se distanciar de determinados campos analiacuteticos que
sustentam essa expansatildeo industrial como sinocircnimo de desenvolvimento arraigados
na promoccedilatildeo de certos projetos empresariais e na historicidade progressista de alguns
processos de expansatildeo urbana Ao fazer esse distanciamento o interesse eacute ampliar o
9 PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 10 As induacutestrias de Terra Roxa estatildeo inseridas no Arranjo Produtivo Local (APL) criado em 2004 para oferecer subsiacutedios e aperfeiccediloamento aos empresaacuterios O APL da moda bebecirc visa entre outros aspectos maior eficiecircncia de inserccedilatildeo dos produtos da induacutestria de vestuaacuterio no mercado maior poder de negociaccedilatildeo de preccedilo da mateacuteria-prima atraccedilatildeo de novos prestadores de serviccedilos ao municiacutepio e otimizaccedilatildeo de custos com a qualificaccedilatildeo da matildeo de obra Esse assessoramento procura oferecer ao empresariado condiccedilotildees de mercado e apoio para fixaccedilatildeo em determinadas regiotildees
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campo de anaacutelise apresentando contradiccedilotildees e tensotildees nesse percurso dirigindo atenccedilatildeo
aos trabalhadores mais do que agrave faacutebrica e ao sistema produtivo por ele mesmo11
Ao realizar esta pesquisa minha preocupaccedilatildeo se pauta em mostrar que estes
sujeitos satildeo seres conscientes de sua posiccedilatildeo enquanto sujeitos sociais e procuro
ressaltar que estes trabalhadores fazem parte deste processo histoacuterico enquanto
indiviacuteduos ativos mesmo que indiretamente intervenham nos rumos e ritmo dessa
expansatildeo industrial
Assim busquei com este trabalho explorar a partir das narrativas dos
trabalhadores e de suas experiecircncias entender natildeo somente estes sujeitos mas as
expectativas que estes constroem e as relaccedilotildees que estabelecem com o trabalho para a
promoccedilatildeo de seus interesses
11 O trabalho de Godoy procura fazer um percurso acadecircmico das nuances e alteraccedilotildees na abordagem do universo fabril Assim como Paoli Sader e Telles recolocam alguns enfrentamentos - na percepccedilatildeo de suas atuaccedilotildees e construccedilatildeo de sentidos - para aqueles que procuram perceber os trabalhadores neste cenaacuterio operaacuterio brasileiro Ver -GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 -PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198
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CAPIacuteTULO 1
TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc
[] Com o tempo depois que essas empresas dede crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram mais faacuteceis neacute []12
Neste capiacutetulo vamos analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente
estatildeo ou que em algum momento de suas vidas estiveram vinculados agraves induacutestrias de
confecccedilatildeo de moda bebecirc do municiacutepio de Terra Roxa- PR mas que trazem em sua
trajetoacuteria uma relaccedilatildeo com o trabalho moradia e valores advindo do campo O objetivo
eacute problematizar suas avaliaccedilotildees frente agrave ldquoexpansatildeordquo industrial do municiacutepio e como essa
dialoga com seus interesses e necessidades
Ao analisarmos algumas entrevistas de trabalhadores vinculados a estas
induacutestrias foi comum encontrar assim como na narrativa citada na epiacutegrafe deste
capiacutetulo narrativas nesta perspectiva na qual os empregos gerados pela industrializaccedilatildeo
satildeo interpretados como possibilidade de melhoria na condiccedilatildeo de vida dos
trabalhadores Percebemos assim que o municiacutepio estaacute constantemente sendo indicado
como um grande polo de empregos mas essa indicaccedilatildeo natildeo resume as ponderaccedilotildees que
fazem sobre a presenccedila industrial em Terra Roxa - porque tambeacutem apontam elementos
que contradizem essa presenccedila
Buscaremos entatildeo dialogar com as fontes orais produzidas com trabalhadores
que se relacionaram com induacutestria de confecccedilatildeo procurando discutir tambeacutem alguns
trabalhos acadecircmicos que analisam praacuteticas dos trabalhadores em Terra Roxa A fim de
compreender a trajetoacuteria destes sujeitos e os motivos que os levam a perceber a
expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de melhoria e
mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas
Para compreendermos melhor estas interpretaccedilotildees fez-se necessaacuterio analisar o
percurso de relaccedilotildees e experiecircncias que construiacuteram Para isso foi importante
12 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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dimensionar a cidade na deacutecada de 1970 Momento em que se intensificou a mudanccedila
destes trabalhadores do campo para a cidade (ou ainda para outras regiotildees) ou seja este
foi um periacuteodo de mudanccedilas marcantes nas relaccedilotildees de trabalho onde morar e como
viver natildeo soacute no municiacutepio mas possiacutevel de identificar em outras cidades brasileiras
No trabalho de Ana Ameacutelia Camarano e Ricardo Abramovay haacute o interesse em
apresentar os movimentos migratoacuterios que respondem pelo processo de esvaziamento
da populaccedilatildeo rural no Brasil Os autores observam que ateacute 1980 houve um crescimento
absoluto do saldo populacional que deixou as aacutereas rurais brasileiras Aproximadamente
40 da populaccedilatildeo que vivia nas aacutereas rurais no comeccedilo dos anos 70 migraram nessa
deacutecada O fluxo que deixou o campo nos anos 80 tambeacutem foi expressivo 13 de todos
os que viviam no meio rural em 1980 saiacuteram durante esse periacuteodo o que representou
aproximadamente 13 milhotildees de pessoas13
Em termos nacionais a intensidade do movimento de desruralizaccedilatildeo segundo
os autores parece natildeo ter diminuiacutedo muito nos uacuteltimos 50 anos Entre 1950 e 1980 as
aacutereas rurais das regiotildees Sudeste e Sul forneceram um volume expressivo de novos
moradores para as aacutereas urbanas14 Para os autores como realizavam a pesquisa em fins
da deacutecada de 1990 suas impressotildees indicavam uma continuidade desse processo
Desde 1950 a cada 10 anos um em cada trecircs brasileiros vivendo no meio rural opta pela emigraccedilatildeo Os anos 90 natildeo arrefeceram em muito esta tendecircncia se as taxas de evasatildeo do meio rural observadas entre 1990 e 1995 persistirem pelo restante da deacutecada quase 30 dos brasileiros que entatildeo viviam no campo em 1990 teratildeo mudado seu local de residecircncia na virada do milecircnio15
Ainda que os autores analisem no campo da geografia demograacutefica apoiando-se
na noccedilatildeo de ecircxodo rural estes trazem ldquoo modo de vida no campordquo como incocircmodo para
a realizaccedilatildeo da pesquisa traduzido nas movimentaccedilotildees desses brasileiros entre o campo
e a cidade alteraccedilotildees natildeo soacute espaciais mas no modo como vivem e enfrentam
determinadas relaccedilotildees de poder
Estes se movimentam de acordo com as expectativas e interesses que produzem
como necessidades reorganizando as relaccedilotildees de trabalho e modos de vida diante de
pressotildees de reestruturaccedilatildeo da produccedilatildeo e da ocupaccedilatildeo das aacutereas rurais brasileiras da
13 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 14 IBIDEM 15 IBIDEM p 6
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segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual
natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na
promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo
De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970
aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do
municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as
principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos
Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio
exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX
Graacutefico 1
Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)
Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e
principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a
distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando
Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de
1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea
urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave
expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de
vestuaacuterio moda bebecirc
16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013
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Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no
municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo
urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e
insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo
na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e
incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola
em moldes capitalistas na cidade 17
A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas
unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha
o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade
em muitos casos diretamente com o consumidor
Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que
discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em
Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo
provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que
Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18
No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da
populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente
ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da
maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio
alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo
aponta um processo tranquilo
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GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18
FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9
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As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos
oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute
mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise
- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o
cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que
A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19
A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o
trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe
quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar
com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de
banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe
pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo
Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um
grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir
ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados
da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia
por um nuacutemero reduzido de vagas
Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo
saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por
um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria
condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses
19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33
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trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de
induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade
Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu
entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria
seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas
vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece
Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20
A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves
induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos
perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas
de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para
Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida
Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como
citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este
processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de
Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande
decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio
Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do
IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que
formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho
atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores
mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que
permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram
como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras
atividades tambeacutem inconstantes
A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em
2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que
residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo
por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos
20
JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)
estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos
produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no
transporte e venda de mercadorias21
O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os
trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira
produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no
contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria
e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas
Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua
forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de
escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma
grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de
mercadorias criminalizado como contrabando
O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online
Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o
narcotraacuteficordquo aponta que
Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122
A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida
com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que
almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores
apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os
21
CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013
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oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando
permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute
associada a comprar roupas e tecircnis de marca
O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a
intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda
de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre
alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para
frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc
No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses
trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego
Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso
Frederico afirma que
Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23
A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da
agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em
segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees
No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este
processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas
nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica
quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo
Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24
23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
23
Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo
para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O
trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do
patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo
lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos
trabalhadores pela induacutestria ele me diz que
Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25
Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural
da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas
relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar
com essa nova dinacircmica
Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo
visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas
vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se
aproxima da percepccedilatildeo de Carlos
Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26
Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para
ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes
se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio
trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as
ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que
pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha
25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11
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trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem
trabalho
Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe
complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho
pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida
que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram
Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no
campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e
trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte
das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave
trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a
perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura
Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27
Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de
alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute
registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses
trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas
A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade
de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As
oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um
maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa
condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos
desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor
a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado
O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos
Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo
Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa
27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10
25
Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28
Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas
anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do
empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da
cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram
nesse processo
O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho
financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para
empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a
demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de
trabalhadores agrave disposiccedilatildeo
Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no
municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do
empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor
produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que
A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29
Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos
gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por
ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e
possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio
A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees
municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno
28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM
26
desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos
proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e
do APL do vestuaacuterio na cidade 31
No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi
substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e
mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e
vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa
aacutereardquo
Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do
Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos
profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes
tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o
interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo
de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores
tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo
foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal
finalidade
De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho
rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da
folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo
A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como
Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes
Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o
municiacutepio de Terra Roxa
30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
27
Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34
O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de
trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda
continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila
tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de
garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno
dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o
campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre
os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal
As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma
alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida
ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores
possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -
com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou
outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por
perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista
dentre outros natildeo os oferece
Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes
trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de
classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de
melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no
ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a
trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em
outra cidade ela me disse que
Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35
34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave
mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem
organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de
novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar
com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as
expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita
vantagem assimrdquo
Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para
Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se
demo na faacutebricardquo36
Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram
trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar
mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia
com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando
pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que
Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37
Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter
voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no
campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em
Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que
natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar
36 IDEM 37 IDEM
29
As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila
pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com
a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma
mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila
natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na
narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do
casal
Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas
construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril
Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho
na faacutebrica ela me disse que
Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38
Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que
gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as
dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores
preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica
ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na
avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em
conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho
O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como
Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos
indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em
casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria
Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista
Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim
38 IDEM
30
de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por
menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes
oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc
como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado
na Escola do Trabalho
Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o
tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram
mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias
permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas
relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais
Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns
trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de
compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas
tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa
39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
31
CAPIacuteTULO 2
TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40
Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa
natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O
municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande
polo de empregos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de
investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade
de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um
grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41
Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo
como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem
indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e
aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de
desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente
O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de
julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do
Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para
bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda
afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um
terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio
A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral
retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o
40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013
32
processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no
ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir
Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa
fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda
bebecirc pra terra roxa
Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43
A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande
destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da
cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra
Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o
municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo
queacuterdquo
No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves
transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que
este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo
sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em
resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores
Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa
industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo
enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa
Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20
principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a
43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
33
janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos
registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores
vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e
desligamento nesses setores
Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa
Meses Jan de 2003 a Jan de 2011
CBO ndash Frequumlecircncia
Admissotildees Desligamentos
Saldo
1ordm Emp
Reemp
Reint
C Prz Det
Transf
Total
Disp sem J Causa
Disp com J Causa
A Pedido
Term Contr
Aposent
Morte
Term C Prz Deter
Transf
Total
Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da
confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390
Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443
Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie
271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109
Costureira de peccedilas sob encomenda
171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em
geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio
varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina
60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio
em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina
bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas
34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27
Trabalhador agropecuaacuterio em geral
19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador
de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5
Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39
Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie
6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras
10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente
administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio
32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa
24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27
Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013
34
Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
35
Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
36
mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
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curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
38
Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
40
faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
42
Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
45
Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
46
Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
47
Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
48
era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
2
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANAacute CAMPUS DE MARECHAL CAcircNDIDO RONDON
CENTRO DE CIEcircNCIAS HUMANAS EDUCACcedilAtildeO E LETRAS ndash CCHEL COLEGIADO DO CURSO DE HISTOacuteRIA
CAREM ALINE DE OLIVEIRA
SOBRE EXPLORACcedilAtildeO E ALTERNATIVAS NA TRAJETOacuteRIA DE
TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA-BEBEcirc (TERRA ROXA-PR 1990-2013)
Trabalho de Conclusatildeo de Curso ndash TCC sob a orientaccedilatildeo da Drordf Sheille Soares de Freitas apresentado agrave Banca Examinadora como requisito baacutesico para obtenccedilatildeo do tiacutetulo de Licenciatura Plena em Histoacuteria pela Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Campus De Marechal Cacircndido Rondon
Marechal Cacircndido Rondon 2013
3
4
5
Aos meus pais Agnaldo e Marley
Que abdicam de seus sonhos para realizar os meus
6
AGRADECIMENTOS
Com especial carinho aos meus Pais Agnaldo e Marley trabalhadores que
apesar da difiacutecil situaccedilatildeo fizeram o possiacutevel e o impossiacutevel para que eu pudesse chegar
ateacute este momento Eacute imensuraacutevel a gratidatildeo e orgulho que nutro por vocecircs pois sei de
toda luta e determinaccedilatildeo para verem a filha formada Obrigada por todo o incentivo
ldquopuxotildees de orelhardquo apoio dedicaccedilatildeo e amor
Agradeccedilo aos amigos velhos e novos que iratildeo fazer parte das minhas melhores
lembranccedilas do ldquotempo de faculdaderdquo Em especial Simone Tineneu Dan Tonho Popi
Vassoura Elaine Julius Keka Emer Nayara Luana Paulo e Tati Alegraram as
minhas noites com momentos de descontraccedilatildeo no bar e rodas de violatildeo Por muitas
vezes foram estes momentos que recarregaram as baterias e deram forccedilas para
continuar
Aacute Vania Marilia e Marcos (Xequereu) companheiros do movimento estudantil
que me ensinaram muito durante toda essa caminhada foram nossas discussotildees que
potencializaram minhas inquietaccedilotildees e a vontade de lutar
Aacute Cintia amiga e companheira durante toda a graduaccedilatildeo por todas as risadas
todo apoio as conversas sobre tantas coisas as comilanccedilas as reclamaccedilotildees e claro por
todos os momentos de procrastinaccedilatildeo
Aacute minhas queridas amigas de infacircncia Aline Luciana Suzani Simone e Fran
que mesmo longe sempre estiveram presentes compartilhando anguacutestias e vitoacuterias
Aacute minha tia Elza que contribuiu de inuacutemeras formas para minha moradia em
Marechal Cacircndido Rondon
Aacute minha orientadora Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas por todo aprendizado
dedicaccedilatildeo e compreensatildeo
Aos trabalhadores que gentilmente me receberam em suas casas compartilhando
suas experiecircncias para a realizaccedilatildeo desse trabalho
Ao meu companheiro Marcos antes de qualquer coisa melhor amigo por toda
cobranccedila ajuda paciecircncia e amor
7
RESUMO
Este Trabalho de Conclusatildeo de Curso tem a intenccedilatildeo de problematizar analisar e investigar as relaccedilotildees de trabalho que marcam a trajetoacuteria de trabalhadores que compuseram praacuteticas no processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa-PR discutindo o modo como se relacionaram nem sempre amistosamente com as accedilotildees do poder puacuteblico municipal e com a participaccedilatildeo empresarial do ramo ldquomoda bebecircrdquo na cidade A pesquisa abordaraacute as trecircs uacuteltimas deacutecadas pelo fato de esse ser um momento histoacuterico importante pela intensificaccedilatildeo da exploraccedilatildeo industrial em Terra Roxa Essa temporalidade eacute significativa no processo de mudanccedila e produccedilatildeo de relaccedilotildees de trabalho na cidade envolvendo o setor de vestuaacuterio e a produccedilatildeo de alternativas por trabalhadores muitas vezes advindo do meio rural Propomos investigar as condiccedilotildees de vida dos trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam este mercado de trabalho bem como relacionar as memoacuterias e accedilotildees produzidas tanto para o trabalho como para a vida em Terra Roxa Para isso destacamos o trabalho com as fontes orais jornais fichas de cursos profissionalizantes e iacutendices estatiacutesticos como documentaccedilatildeo a ser privilegiada nessa pesquisa O interesse foi manter o diaacutelogo com as evidecircncias e quando necessaacuterio ampliar a anaacutelise de fontes ou mesmo revendo os caminhos da investigaccedilatildeo Esse encaminhamento considera que o conhecimento histoacuterico exige essa construccedilatildeo ao longo da pesquisa como tambeacutem o compromisso com as questotildees em foco
Palavras-chave Trabalhadores Relaccedilotildees de Trabalho Induacutestrias
8
Sumaacuterio INTRODUCcedilAtildeO 9
CAPIacuteTULO 1TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc 15
CAPIacuteTULO 2TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES 31
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 51
FONTES 53
REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS 55
9
INTRODUCcedilAtildeO
A escolha dos sujeitos e do tema deste estudo (os trabalhadores atualmente
vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa- PR) eacute resultado de minha
trajetoacuteria de vida trabalho e acadecircmica
Primeiro de vida e trabalho porque o trabalho na induacutestria de moda bebecirc jaacute fez
parte de minha atividade profissional por algum tempo Deste modo pude conviver com
outros trabalhadores observar e ouvir suas avaliaccedilotildees sobre suas condiccedilotildees de vida
motivaccedilotildees interesses e conflitos que perpassam esse ambiente de trabalho o que me
instigou a pesquisar o tema De forma que muitas das interpretaccedilotildees e avaliaccedilotildees que os
trabalhadores indicam em suas narrativas atraveacutes das entrevistas feitas jaacute ouvi dos
meus familiares como da minha proacutepria matildee Pois grande parte deles reside em Terra
Roxa e trabalha na induacutestria de moda bebecirc
Segundo como acadecircmica e pesquisadora porque este trabalho de conclusatildeo de
curso eacute continuidade de uma iniciaccedilatildeo cientifica voluntaacuteria (PIC-V) e as questotildees que
estatildeo aqui sendo levantadas eacute uma continuidade das indagaccedilotildees que surgiram a partir de
um diaacutelogo inicial com as fontes feitas nesta pesquisa anterior1
O objetivo central da pesquisa foi investigar as condiccedilotildees de vida de
trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de vestuaacuterio moda bebecirc no municiacutepio de
Terra Roxa-PR problematizando suas relaccedilotildees de trabalho e como se inserem e
interpretam este mercado de trabalho dando visibilidade a estes sujeitos e suas accedilotildees na
cidade
O municiacutepio possui atualmente entre macro e micro cerca de 113 empresas que
produzem em torno de 9 milhotildees de peccedilas envolvendo aproximadamente 2500
trabalhadores empregados diretamente o que segundo a noccedilatildeo do poder publico
municipal ldquodinamiza a geraccedilatildeo de emprego e renda do municiacutepiordquo2 Como podemos
1 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 2 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013
10
perceber em uma reportagem do jornal online Gazeta do Povo intitulada ldquoEm Terra
Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojasrdquo
A cadeia da confecccedilatildeo infantil mudou os rumos da cidade de 17 mil habitantes e a vida de muitos paranaenses Maria do Carmo 42 anos eacute um exemplo Ateacute os 38 anos ela trabalhava nos Campos Gerais onde plantava eucalipto Hoje o cenaacuterio eacute o mesmo um siacutetio mas agora ela natildeo lida diretamente com a terra Maria atua no setor de corte de roupas e tambeacutem dirige o ocircnibus que transporta funcionaacuterios da empresa Baby Doces Momentos confecccedilatildeo localizada em um siacutetio de cinco alqueires que produz cerca de 20 mil peccedilas ao mecircs ldquoAgora me sinto melhor Antes trabalhava no sol com uma bomba de 20 litros nas costas para pulverizar e plantarrdquo conta3
A partir do trecho acima percebemos que ao avaliar a dinacircmica industrial no
municiacutepio a reportagem aponta a relaccedilatildeo com a produccedilatildeo e experiecircncia dos trabalhos
no meio rural evidentemente para positivar a expansatildeo desse ramo de induacutestria de
vestuaacuterio como salvaccedilatildeo da cidade jaacute que estas empresas ldquodinamiza a geraccedilatildeo de
emprego e renda do municiacutepiordquo
Eacute importante entender a dimensatildeo dessa estrutura empresarial industrial em
Terra Roxa pois esta historicidade vai abrir caminhos a serem problematizados ao
longo deste trabalho
Para desenvolver esta pesquisa pautamo-nos na dinacircmica que integra a reflexatildeo
da problemaacutetica e o processo de levantamento e anaacutelise de fontes Esse
encaminhamento inspira-se na indicaccedilatildeo de Thompson sobre o diaacutelogo necessaacuterio e
constante entre teoria e evidecircncias histoacutericas4
Segundo Thompson
O interrogador eacute a loacutegica histoacuterica o conteuacutedo da interrogaccedilatildeo eacute uma hipoacutetese o interrogado eacute a evidecircncia com suas propriedades determinadas O objeto do conhecimento histoacuterico eacute a histoacuteria lsquorealrsquo cujas evidecircncias devem ser necessariamente incompletas e imperfeitas5
3 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no-paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 4 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma criacutetica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar Editores 1981 5 IBIDEM p 49
11
Isso quer dizer que os historiadores podem selecionar essa ou aquela evidecircncia
propor novas perguntas mas isso natildeo significa que os proacuteprios acontecimentos passados
se modifiquem nem tampouco que seja um agregado de histoacuterias separadas Embora
essa interpretaccedilatildeo do processo histoacuterico surja em resposta agrave pergunta formulada nossa
produccedilatildeo natildeo inventa o processo e natildeo pode modificar o ldquostatus ontoloacutegicordquo do
passado
Eacute nesta perspectiva de anaacutelise que conduziremos este pesquisa Cabe contudo
salientar a contribuiccedilatildeo que esta nos proporciona para a compreensatildeo que proponho
sobre as relaccedilotildees de trabalho experiecircncias e interpretaccedilotildees dos trabalhadores nas
induacutestrias de confecccedilatildeo de moda bebecirc em Terra Roxa Para tanto pensaremos a histoacuteria
em um duplo sentido como experiecircncia humana e como a proacutepria narraccedilatildeo dessas
experiecircncias as interpretaccedilotildees e projeccedilotildees das quais o investigador vai utilizar6
A investigaccedilatildeo neste sentido estaacute relacionada com as problemaacuteticas que o
pesquisador se coloca no presente que envolvem sua experiecircncia de vida e as
concepccedilotildees da qual parte
Pretendo entender a partir das experiecircncias narradas por esses trabalhadores
como eles se inserem e interpretam este mercado de trabalho e fazem prospecccedilotildees
Segundo Thompson
Se determos a histoacuteria num determinado ponto natildeo haacute classe mas simplesmente uma multidatildeo de indiviacuteduos com amontoado de experiecircncias Mas se examinarmos esses homens durante um periacuteodo adequado de mudanccedilas sociais observaremos padrotildees em suas relaccedilotildees sua ideias e instituiccedilotildees A classe eacute definida pelos homens enquanto vivem sua proacutepria histoacuteria e ao final esta eacute sua definiccedilatildeo7
Neste sentido para entendermos os trabalhadores eacute necessaacuteria uma serie de
observaccedilotildees e anaacutelises que se expressam em suas praacuteticas cotidianas como eles
vivenciam e se portam perante sua dinacircmica de trabalho o que possibilita sua formaccedilatildeo
cultural e social
Para esse processo interpretativo utilizamos cinco entrevistas que realizei com
trabalhadores no intuito de potencializar as elaboraccedilotildees construiacutedas por esses sujeitos
sobre as motivaccedilotildees interesses e conflitos ou seja memoacuterias produzidas sobre
6 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987 7 THOMPSON E P ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12
12
trajetoacuterias e experiecircncia social compartilhada nas relaccedilotildees dentro e fora das induacutestrias
de vestuaacuterio na cidade
Como um dos meacutetodos de pesquisa foi trabalhar com fontes orais considero
importante apontar algumas dificuldades que encontrei ao realizar algumas entrevistas
Mesmo o municiacutepio empregando mais de 2500 trabalhadores na induacutestria de confecccedilatildeo
minha principal dificuldade foi encontrar trabalhadores que se dispusessem a realizar as
entrevistas
Aqueles que aceitavam soacute concordavam em produzir a entrevista quando
algueacutem muito proacuteximo deles me apresentava O fato de alguns trabalhadores aceitarem
natildeo excluiu a desconfianccedila e inseguranccedila que estes possuiacuteam em relaccedilatildeo agraves entrevistas
Desta forma a inseguranccedila dos trabalhadores sobre se poderiam falar ou natildeo a
respeito de suas relaccedilotildees de trabalho juntamente com a minha falta de experiecircncia em
saber lidar com essas inseguranccedilas prejudicaram o desenvolvimento das entrevistas
As respostas ficaram limitadas ao roteiro muitas vezes limitadas ao ldquosimrdquo ou ao ldquonatildeordquo
Pois aleacutem da timidez ao saberem que estatildeo sendo gravados ainda tive que lidar com o
receio dos entrevistados ao exporem sua trajetoacuteria e condiccedilotildees de vida
As entrevistas orais natildeo foram produto de teacutecnica mas das relaccedilotildees que
consegui desenvolver com esses trabalhadores Portanto o meacutetodo de utilizar fontes
orais consiste em trabalhar com a subjetividade dos indiviacuteduos lidando com as questotildees
postas pelos entrevistados a partir de minhas proacuteprias questotildees
Neste sentido o diaacutelogo com Alessandro Portelli e com outros autores ajudou a
compreender que essa relaccedilatildeo entre entrevistado e entrevistador natildeo eacute um objetivo
muito faacutecil de ser alcanccedilado pois as pessoas reinterpretam e datildeo novos significados aos
acontecimentos passados em funccedilatildeo do que vive no presente ou espera viver Ou ainda
encobrem sentimentos e interpretaccedilotildees por censura repressatildeo temores ou pela pouca
disposiccedilatildeo em falar8
Ao utilizar a fonte oral foi importante dialogar com a produccedilatildeo de Alessandro
Portelli o qual contribuiu para a construccedilatildeo de um procedimento de anaacutelise para a
produccedilatildeo das fontes orais e do olhar lanccedilado sobre esse material O uso de tal fonte na
pesquisa permitiu o enfrentamento da dinacircmica contraditoacuteria de valores e praacuteticas que
compotildeem escolhas pressotildees e expectativas desses sujeitos sociais
8 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 p33
13
Nesse sentido permite maior visibilidade poliacutetica da classe trabalhadora com
suas divisotildees e processos de identificaccedilatildeo na condiccedilatildeo de classe compartilhada
produzindo assim uma interpretaccedilatildeo histoacuterica comprometida com o potencial de luta e
intervenccedilatildeo social desses trabalhadores Essa investigaccedilatildeo tambeacutem traz como
enfrentamento lidar com os limites dessa fonte como as dificuldades de conseguir a
aceitaccedilatildeo da gravaccedilatildeo da entrevista e contatar trabalhadores9
O intuito de usarmos a fonte oral nesta pesquisa inspira-se nesta perspectiva de
Portelli Buscamos o trabalho com as entrevista natildeo como confirmaccedilatildeo de uma ldquoteserdquo
inicial mas sim com a intenccedilatildeo de dar visibilidade agraves interpretaccedilotildees construiacutedas pelos
trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa
Para tal associamos essa documentaccedilatildeo com mateacuterias jornaliacutesticas e fichas de
inscriccedilatildeo em cursos (de corte costura e bordado) na Escola do trabalho na cidade Aleacutem
da interpretaccedilatildeo de iacutendices estatiacutesticos sobre empregabilidade atividades econocircmicas
etc
O presente trabalho estaacute estruturado em dois capiacutetulos No primeiro capiacutetulo
busquei analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agrave
induacutestria de moda bebecirc a fim de compreender os motivos que levam esses sujeitos a
perceber a expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de
melhoria e mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas e na permanecircncia em Terra Roxa
No segundo capiacutetulo busco discutir a partir das experiecircncias cotidianas e das
relaccedilotildees de trabalho desses sujeitos as possibilidades e limites das expectativas que
estes trabalhadores estabelecem em relaccedilatildeo ao trabalho na induacutestria de moda bebecirc tal
qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre o
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa10
Essa intenccedilatildeo tenta se distanciar de determinados campos analiacuteticos que
sustentam essa expansatildeo industrial como sinocircnimo de desenvolvimento arraigados
na promoccedilatildeo de certos projetos empresariais e na historicidade progressista de alguns
processos de expansatildeo urbana Ao fazer esse distanciamento o interesse eacute ampliar o
9 PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 10 As induacutestrias de Terra Roxa estatildeo inseridas no Arranjo Produtivo Local (APL) criado em 2004 para oferecer subsiacutedios e aperfeiccediloamento aos empresaacuterios O APL da moda bebecirc visa entre outros aspectos maior eficiecircncia de inserccedilatildeo dos produtos da induacutestria de vestuaacuterio no mercado maior poder de negociaccedilatildeo de preccedilo da mateacuteria-prima atraccedilatildeo de novos prestadores de serviccedilos ao municiacutepio e otimizaccedilatildeo de custos com a qualificaccedilatildeo da matildeo de obra Esse assessoramento procura oferecer ao empresariado condiccedilotildees de mercado e apoio para fixaccedilatildeo em determinadas regiotildees
14
campo de anaacutelise apresentando contradiccedilotildees e tensotildees nesse percurso dirigindo atenccedilatildeo
aos trabalhadores mais do que agrave faacutebrica e ao sistema produtivo por ele mesmo11
Ao realizar esta pesquisa minha preocupaccedilatildeo se pauta em mostrar que estes
sujeitos satildeo seres conscientes de sua posiccedilatildeo enquanto sujeitos sociais e procuro
ressaltar que estes trabalhadores fazem parte deste processo histoacuterico enquanto
indiviacuteduos ativos mesmo que indiretamente intervenham nos rumos e ritmo dessa
expansatildeo industrial
Assim busquei com este trabalho explorar a partir das narrativas dos
trabalhadores e de suas experiecircncias entender natildeo somente estes sujeitos mas as
expectativas que estes constroem e as relaccedilotildees que estabelecem com o trabalho para a
promoccedilatildeo de seus interesses
11 O trabalho de Godoy procura fazer um percurso acadecircmico das nuances e alteraccedilotildees na abordagem do universo fabril Assim como Paoli Sader e Telles recolocam alguns enfrentamentos - na percepccedilatildeo de suas atuaccedilotildees e construccedilatildeo de sentidos - para aqueles que procuram perceber os trabalhadores neste cenaacuterio operaacuterio brasileiro Ver -GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 -PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198
15
CAPIacuteTULO 1
TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc
[] Com o tempo depois que essas empresas dede crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram mais faacuteceis neacute []12
Neste capiacutetulo vamos analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente
estatildeo ou que em algum momento de suas vidas estiveram vinculados agraves induacutestrias de
confecccedilatildeo de moda bebecirc do municiacutepio de Terra Roxa- PR mas que trazem em sua
trajetoacuteria uma relaccedilatildeo com o trabalho moradia e valores advindo do campo O objetivo
eacute problematizar suas avaliaccedilotildees frente agrave ldquoexpansatildeordquo industrial do municiacutepio e como essa
dialoga com seus interesses e necessidades
Ao analisarmos algumas entrevistas de trabalhadores vinculados a estas
induacutestrias foi comum encontrar assim como na narrativa citada na epiacutegrafe deste
capiacutetulo narrativas nesta perspectiva na qual os empregos gerados pela industrializaccedilatildeo
satildeo interpretados como possibilidade de melhoria na condiccedilatildeo de vida dos
trabalhadores Percebemos assim que o municiacutepio estaacute constantemente sendo indicado
como um grande polo de empregos mas essa indicaccedilatildeo natildeo resume as ponderaccedilotildees que
fazem sobre a presenccedila industrial em Terra Roxa - porque tambeacutem apontam elementos
que contradizem essa presenccedila
Buscaremos entatildeo dialogar com as fontes orais produzidas com trabalhadores
que se relacionaram com induacutestria de confecccedilatildeo procurando discutir tambeacutem alguns
trabalhos acadecircmicos que analisam praacuteticas dos trabalhadores em Terra Roxa A fim de
compreender a trajetoacuteria destes sujeitos e os motivos que os levam a perceber a
expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de melhoria e
mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas
Para compreendermos melhor estas interpretaccedilotildees fez-se necessaacuterio analisar o
percurso de relaccedilotildees e experiecircncias que construiacuteram Para isso foi importante
12 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
16
dimensionar a cidade na deacutecada de 1970 Momento em que se intensificou a mudanccedila
destes trabalhadores do campo para a cidade (ou ainda para outras regiotildees) ou seja este
foi um periacuteodo de mudanccedilas marcantes nas relaccedilotildees de trabalho onde morar e como
viver natildeo soacute no municiacutepio mas possiacutevel de identificar em outras cidades brasileiras
No trabalho de Ana Ameacutelia Camarano e Ricardo Abramovay haacute o interesse em
apresentar os movimentos migratoacuterios que respondem pelo processo de esvaziamento
da populaccedilatildeo rural no Brasil Os autores observam que ateacute 1980 houve um crescimento
absoluto do saldo populacional que deixou as aacutereas rurais brasileiras Aproximadamente
40 da populaccedilatildeo que vivia nas aacutereas rurais no comeccedilo dos anos 70 migraram nessa
deacutecada O fluxo que deixou o campo nos anos 80 tambeacutem foi expressivo 13 de todos
os que viviam no meio rural em 1980 saiacuteram durante esse periacuteodo o que representou
aproximadamente 13 milhotildees de pessoas13
Em termos nacionais a intensidade do movimento de desruralizaccedilatildeo segundo
os autores parece natildeo ter diminuiacutedo muito nos uacuteltimos 50 anos Entre 1950 e 1980 as
aacutereas rurais das regiotildees Sudeste e Sul forneceram um volume expressivo de novos
moradores para as aacutereas urbanas14 Para os autores como realizavam a pesquisa em fins
da deacutecada de 1990 suas impressotildees indicavam uma continuidade desse processo
Desde 1950 a cada 10 anos um em cada trecircs brasileiros vivendo no meio rural opta pela emigraccedilatildeo Os anos 90 natildeo arrefeceram em muito esta tendecircncia se as taxas de evasatildeo do meio rural observadas entre 1990 e 1995 persistirem pelo restante da deacutecada quase 30 dos brasileiros que entatildeo viviam no campo em 1990 teratildeo mudado seu local de residecircncia na virada do milecircnio15
Ainda que os autores analisem no campo da geografia demograacutefica apoiando-se
na noccedilatildeo de ecircxodo rural estes trazem ldquoo modo de vida no campordquo como incocircmodo para
a realizaccedilatildeo da pesquisa traduzido nas movimentaccedilotildees desses brasileiros entre o campo
e a cidade alteraccedilotildees natildeo soacute espaciais mas no modo como vivem e enfrentam
determinadas relaccedilotildees de poder
Estes se movimentam de acordo com as expectativas e interesses que produzem
como necessidades reorganizando as relaccedilotildees de trabalho e modos de vida diante de
pressotildees de reestruturaccedilatildeo da produccedilatildeo e da ocupaccedilatildeo das aacutereas rurais brasileiras da
13 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 14 IBIDEM 15 IBIDEM p 6
17
segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual
natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na
promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo
De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970
aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do
municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as
principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos
Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio
exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX
Graacutefico 1
Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)
Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e
principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a
distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando
Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de
1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea
urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave
expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de
vestuaacuterio moda bebecirc
16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013
18
Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no
municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo
urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e
insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo
na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e
incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola
em moldes capitalistas na cidade 17
A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas
unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha
o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade
em muitos casos diretamente com o consumidor
Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que
discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em
Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo
provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que
Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18
No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da
populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente
ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da
maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio
alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo
aponta um processo tranquilo
17
GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18
FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9
19
As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos
oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute
mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise
- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o
cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que
A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19
A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o
trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe
quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar
com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de
banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe
pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo
Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um
grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir
ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados
da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia
por um nuacutemero reduzido de vagas
Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo
saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por
um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria
condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses
19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33
20
trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de
induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade
Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu
entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria
seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas
vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece
Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20
A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves
induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos
perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas
de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para
Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida
Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como
citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este
processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de
Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande
decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio
Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do
IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que
formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho
atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores
mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que
permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram
como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras
atividades tambeacutem inconstantes
A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em
2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que
residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo
por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos
20
JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
21
sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)
estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos
produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no
transporte e venda de mercadorias21
O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os
trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira
produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no
contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria
e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas
Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua
forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de
escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma
grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de
mercadorias criminalizado como contrabando
O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online
Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o
narcotraacuteficordquo aponta que
Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122
A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida
com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que
almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores
apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os
21
CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013
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oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando
permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute
associada a comprar roupas e tecircnis de marca
O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a
intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda
de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre
alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para
frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc
No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses
trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego
Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso
Frederico afirma que
Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23
A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da
agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em
segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees
No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este
processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas
nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica
quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo
Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24
23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
23
Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo
para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O
trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do
patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo
lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos
trabalhadores pela induacutestria ele me diz que
Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25
Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural
da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas
relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar
com essa nova dinacircmica
Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo
visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas
vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se
aproxima da percepccedilatildeo de Carlos
Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26
Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para
ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes
se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio
trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as
ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que
pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha
25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11
24
trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem
trabalho
Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe
complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho
pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida
que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram
Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no
campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e
trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte
das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave
trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a
perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura
Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27
Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de
alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute
registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses
trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas
A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade
de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As
oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um
maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa
condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos
desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor
a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado
O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos
Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo
Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa
27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10
25
Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28
Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas
anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do
empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da
cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram
nesse processo
O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho
financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para
empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a
demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de
trabalhadores agrave disposiccedilatildeo
Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no
municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do
empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor
produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que
A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29
Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos
gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por
ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e
possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio
A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees
municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno
28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM
26
desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos
proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e
do APL do vestuaacuterio na cidade 31
No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi
substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e
mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e
vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa
aacutereardquo
Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do
Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos
profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes
tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o
interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo
de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores
tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo
foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal
finalidade
De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho
rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da
folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo
A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como
Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes
Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o
municiacutepio de Terra Roxa
30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
27
Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34
O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de
trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda
continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila
tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de
garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno
dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o
campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre
os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal
As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma
alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida
ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores
possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -
com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou
outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por
perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista
dentre outros natildeo os oferece
Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes
trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de
classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de
melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no
ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a
trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em
outra cidade ela me disse que
Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35
34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
28
Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave
mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem
organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de
novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar
com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as
expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita
vantagem assimrdquo
Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para
Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se
demo na faacutebricardquo36
Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram
trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar
mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia
com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando
pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que
Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37
Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter
voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no
campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em
Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que
natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar
36 IDEM 37 IDEM
29
As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila
pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com
a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma
mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila
natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na
narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do
casal
Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas
construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril
Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho
na faacutebrica ela me disse que
Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38
Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que
gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as
dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores
preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica
ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na
avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em
conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho
O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como
Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos
indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em
casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria
Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista
Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim
38 IDEM
30
de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por
menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes
oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc
como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado
na Escola do Trabalho
Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o
tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram
mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias
permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas
relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais
Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns
trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de
compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas
tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa
39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
31
CAPIacuteTULO 2
TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40
Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa
natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O
municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande
polo de empregos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de
investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade
de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um
grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41
Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo
como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem
indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e
aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de
desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente
O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de
julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do
Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para
bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda
afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um
terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio
A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral
retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o
40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013
32
processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no
ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir
Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa
fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda
bebecirc pra terra roxa
Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43
A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande
destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da
cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra
Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o
municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo
queacuterdquo
No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves
transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que
este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo
sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em
resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores
Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa
industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo
enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa
Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20
principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a
43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
33
janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos
registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores
vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e
desligamento nesses setores
Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa
Meses Jan de 2003 a Jan de 2011
CBO ndash Frequumlecircncia
Admissotildees Desligamentos
Saldo
1ordm Emp
Reemp
Reint
C Prz Det
Transf
Total
Disp sem J Causa
Disp com J Causa
A Pedido
Term Contr
Aposent
Morte
Term C Prz Deter
Transf
Total
Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da
confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390
Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443
Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie
271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109
Costureira de peccedilas sob encomenda
171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em
geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio
varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina
60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio
em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina
bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas
34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27
Trabalhador agropecuaacuterio em geral
19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador
de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5
Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39
Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie
6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras
10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente
administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio
32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa
24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27
Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013
34
Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
35
Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
36
mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
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curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
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era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
3
4
5
Aos meus pais Agnaldo e Marley
Que abdicam de seus sonhos para realizar os meus
6
AGRADECIMENTOS
Com especial carinho aos meus Pais Agnaldo e Marley trabalhadores que
apesar da difiacutecil situaccedilatildeo fizeram o possiacutevel e o impossiacutevel para que eu pudesse chegar
ateacute este momento Eacute imensuraacutevel a gratidatildeo e orgulho que nutro por vocecircs pois sei de
toda luta e determinaccedilatildeo para verem a filha formada Obrigada por todo o incentivo
ldquopuxotildees de orelhardquo apoio dedicaccedilatildeo e amor
Agradeccedilo aos amigos velhos e novos que iratildeo fazer parte das minhas melhores
lembranccedilas do ldquotempo de faculdaderdquo Em especial Simone Tineneu Dan Tonho Popi
Vassoura Elaine Julius Keka Emer Nayara Luana Paulo e Tati Alegraram as
minhas noites com momentos de descontraccedilatildeo no bar e rodas de violatildeo Por muitas
vezes foram estes momentos que recarregaram as baterias e deram forccedilas para
continuar
Aacute Vania Marilia e Marcos (Xequereu) companheiros do movimento estudantil
que me ensinaram muito durante toda essa caminhada foram nossas discussotildees que
potencializaram minhas inquietaccedilotildees e a vontade de lutar
Aacute Cintia amiga e companheira durante toda a graduaccedilatildeo por todas as risadas
todo apoio as conversas sobre tantas coisas as comilanccedilas as reclamaccedilotildees e claro por
todos os momentos de procrastinaccedilatildeo
Aacute minhas queridas amigas de infacircncia Aline Luciana Suzani Simone e Fran
que mesmo longe sempre estiveram presentes compartilhando anguacutestias e vitoacuterias
Aacute minha tia Elza que contribuiu de inuacutemeras formas para minha moradia em
Marechal Cacircndido Rondon
Aacute minha orientadora Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas por todo aprendizado
dedicaccedilatildeo e compreensatildeo
Aos trabalhadores que gentilmente me receberam em suas casas compartilhando
suas experiecircncias para a realizaccedilatildeo desse trabalho
Ao meu companheiro Marcos antes de qualquer coisa melhor amigo por toda
cobranccedila ajuda paciecircncia e amor
7
RESUMO
Este Trabalho de Conclusatildeo de Curso tem a intenccedilatildeo de problematizar analisar e investigar as relaccedilotildees de trabalho que marcam a trajetoacuteria de trabalhadores que compuseram praacuteticas no processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa-PR discutindo o modo como se relacionaram nem sempre amistosamente com as accedilotildees do poder puacuteblico municipal e com a participaccedilatildeo empresarial do ramo ldquomoda bebecircrdquo na cidade A pesquisa abordaraacute as trecircs uacuteltimas deacutecadas pelo fato de esse ser um momento histoacuterico importante pela intensificaccedilatildeo da exploraccedilatildeo industrial em Terra Roxa Essa temporalidade eacute significativa no processo de mudanccedila e produccedilatildeo de relaccedilotildees de trabalho na cidade envolvendo o setor de vestuaacuterio e a produccedilatildeo de alternativas por trabalhadores muitas vezes advindo do meio rural Propomos investigar as condiccedilotildees de vida dos trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam este mercado de trabalho bem como relacionar as memoacuterias e accedilotildees produzidas tanto para o trabalho como para a vida em Terra Roxa Para isso destacamos o trabalho com as fontes orais jornais fichas de cursos profissionalizantes e iacutendices estatiacutesticos como documentaccedilatildeo a ser privilegiada nessa pesquisa O interesse foi manter o diaacutelogo com as evidecircncias e quando necessaacuterio ampliar a anaacutelise de fontes ou mesmo revendo os caminhos da investigaccedilatildeo Esse encaminhamento considera que o conhecimento histoacuterico exige essa construccedilatildeo ao longo da pesquisa como tambeacutem o compromisso com as questotildees em foco
Palavras-chave Trabalhadores Relaccedilotildees de Trabalho Induacutestrias
8
Sumaacuterio INTRODUCcedilAtildeO 9
CAPIacuteTULO 1TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc 15
CAPIacuteTULO 2TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES 31
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 51
FONTES 53
REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS 55
9
INTRODUCcedilAtildeO
A escolha dos sujeitos e do tema deste estudo (os trabalhadores atualmente
vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa- PR) eacute resultado de minha
trajetoacuteria de vida trabalho e acadecircmica
Primeiro de vida e trabalho porque o trabalho na induacutestria de moda bebecirc jaacute fez
parte de minha atividade profissional por algum tempo Deste modo pude conviver com
outros trabalhadores observar e ouvir suas avaliaccedilotildees sobre suas condiccedilotildees de vida
motivaccedilotildees interesses e conflitos que perpassam esse ambiente de trabalho o que me
instigou a pesquisar o tema De forma que muitas das interpretaccedilotildees e avaliaccedilotildees que os
trabalhadores indicam em suas narrativas atraveacutes das entrevistas feitas jaacute ouvi dos
meus familiares como da minha proacutepria matildee Pois grande parte deles reside em Terra
Roxa e trabalha na induacutestria de moda bebecirc
Segundo como acadecircmica e pesquisadora porque este trabalho de conclusatildeo de
curso eacute continuidade de uma iniciaccedilatildeo cientifica voluntaacuteria (PIC-V) e as questotildees que
estatildeo aqui sendo levantadas eacute uma continuidade das indagaccedilotildees que surgiram a partir de
um diaacutelogo inicial com as fontes feitas nesta pesquisa anterior1
O objetivo central da pesquisa foi investigar as condiccedilotildees de vida de
trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de vestuaacuterio moda bebecirc no municiacutepio de
Terra Roxa-PR problematizando suas relaccedilotildees de trabalho e como se inserem e
interpretam este mercado de trabalho dando visibilidade a estes sujeitos e suas accedilotildees na
cidade
O municiacutepio possui atualmente entre macro e micro cerca de 113 empresas que
produzem em torno de 9 milhotildees de peccedilas envolvendo aproximadamente 2500
trabalhadores empregados diretamente o que segundo a noccedilatildeo do poder publico
municipal ldquodinamiza a geraccedilatildeo de emprego e renda do municiacutepiordquo2 Como podemos
1 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 2 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013
10
perceber em uma reportagem do jornal online Gazeta do Povo intitulada ldquoEm Terra
Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojasrdquo
A cadeia da confecccedilatildeo infantil mudou os rumos da cidade de 17 mil habitantes e a vida de muitos paranaenses Maria do Carmo 42 anos eacute um exemplo Ateacute os 38 anos ela trabalhava nos Campos Gerais onde plantava eucalipto Hoje o cenaacuterio eacute o mesmo um siacutetio mas agora ela natildeo lida diretamente com a terra Maria atua no setor de corte de roupas e tambeacutem dirige o ocircnibus que transporta funcionaacuterios da empresa Baby Doces Momentos confecccedilatildeo localizada em um siacutetio de cinco alqueires que produz cerca de 20 mil peccedilas ao mecircs ldquoAgora me sinto melhor Antes trabalhava no sol com uma bomba de 20 litros nas costas para pulverizar e plantarrdquo conta3
A partir do trecho acima percebemos que ao avaliar a dinacircmica industrial no
municiacutepio a reportagem aponta a relaccedilatildeo com a produccedilatildeo e experiecircncia dos trabalhos
no meio rural evidentemente para positivar a expansatildeo desse ramo de induacutestria de
vestuaacuterio como salvaccedilatildeo da cidade jaacute que estas empresas ldquodinamiza a geraccedilatildeo de
emprego e renda do municiacutepiordquo
Eacute importante entender a dimensatildeo dessa estrutura empresarial industrial em
Terra Roxa pois esta historicidade vai abrir caminhos a serem problematizados ao
longo deste trabalho
Para desenvolver esta pesquisa pautamo-nos na dinacircmica que integra a reflexatildeo
da problemaacutetica e o processo de levantamento e anaacutelise de fontes Esse
encaminhamento inspira-se na indicaccedilatildeo de Thompson sobre o diaacutelogo necessaacuterio e
constante entre teoria e evidecircncias histoacutericas4
Segundo Thompson
O interrogador eacute a loacutegica histoacuterica o conteuacutedo da interrogaccedilatildeo eacute uma hipoacutetese o interrogado eacute a evidecircncia com suas propriedades determinadas O objeto do conhecimento histoacuterico eacute a histoacuteria lsquorealrsquo cujas evidecircncias devem ser necessariamente incompletas e imperfeitas5
3 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no-paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 4 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma criacutetica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar Editores 1981 5 IBIDEM p 49
11
Isso quer dizer que os historiadores podem selecionar essa ou aquela evidecircncia
propor novas perguntas mas isso natildeo significa que os proacuteprios acontecimentos passados
se modifiquem nem tampouco que seja um agregado de histoacuterias separadas Embora
essa interpretaccedilatildeo do processo histoacuterico surja em resposta agrave pergunta formulada nossa
produccedilatildeo natildeo inventa o processo e natildeo pode modificar o ldquostatus ontoloacutegicordquo do
passado
Eacute nesta perspectiva de anaacutelise que conduziremos este pesquisa Cabe contudo
salientar a contribuiccedilatildeo que esta nos proporciona para a compreensatildeo que proponho
sobre as relaccedilotildees de trabalho experiecircncias e interpretaccedilotildees dos trabalhadores nas
induacutestrias de confecccedilatildeo de moda bebecirc em Terra Roxa Para tanto pensaremos a histoacuteria
em um duplo sentido como experiecircncia humana e como a proacutepria narraccedilatildeo dessas
experiecircncias as interpretaccedilotildees e projeccedilotildees das quais o investigador vai utilizar6
A investigaccedilatildeo neste sentido estaacute relacionada com as problemaacuteticas que o
pesquisador se coloca no presente que envolvem sua experiecircncia de vida e as
concepccedilotildees da qual parte
Pretendo entender a partir das experiecircncias narradas por esses trabalhadores
como eles se inserem e interpretam este mercado de trabalho e fazem prospecccedilotildees
Segundo Thompson
Se determos a histoacuteria num determinado ponto natildeo haacute classe mas simplesmente uma multidatildeo de indiviacuteduos com amontoado de experiecircncias Mas se examinarmos esses homens durante um periacuteodo adequado de mudanccedilas sociais observaremos padrotildees em suas relaccedilotildees sua ideias e instituiccedilotildees A classe eacute definida pelos homens enquanto vivem sua proacutepria histoacuteria e ao final esta eacute sua definiccedilatildeo7
Neste sentido para entendermos os trabalhadores eacute necessaacuteria uma serie de
observaccedilotildees e anaacutelises que se expressam em suas praacuteticas cotidianas como eles
vivenciam e se portam perante sua dinacircmica de trabalho o que possibilita sua formaccedilatildeo
cultural e social
Para esse processo interpretativo utilizamos cinco entrevistas que realizei com
trabalhadores no intuito de potencializar as elaboraccedilotildees construiacutedas por esses sujeitos
sobre as motivaccedilotildees interesses e conflitos ou seja memoacuterias produzidas sobre
6 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987 7 THOMPSON E P ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12
12
trajetoacuterias e experiecircncia social compartilhada nas relaccedilotildees dentro e fora das induacutestrias
de vestuaacuterio na cidade
Como um dos meacutetodos de pesquisa foi trabalhar com fontes orais considero
importante apontar algumas dificuldades que encontrei ao realizar algumas entrevistas
Mesmo o municiacutepio empregando mais de 2500 trabalhadores na induacutestria de confecccedilatildeo
minha principal dificuldade foi encontrar trabalhadores que se dispusessem a realizar as
entrevistas
Aqueles que aceitavam soacute concordavam em produzir a entrevista quando
algueacutem muito proacuteximo deles me apresentava O fato de alguns trabalhadores aceitarem
natildeo excluiu a desconfianccedila e inseguranccedila que estes possuiacuteam em relaccedilatildeo agraves entrevistas
Desta forma a inseguranccedila dos trabalhadores sobre se poderiam falar ou natildeo a
respeito de suas relaccedilotildees de trabalho juntamente com a minha falta de experiecircncia em
saber lidar com essas inseguranccedilas prejudicaram o desenvolvimento das entrevistas
As respostas ficaram limitadas ao roteiro muitas vezes limitadas ao ldquosimrdquo ou ao ldquonatildeordquo
Pois aleacutem da timidez ao saberem que estatildeo sendo gravados ainda tive que lidar com o
receio dos entrevistados ao exporem sua trajetoacuteria e condiccedilotildees de vida
As entrevistas orais natildeo foram produto de teacutecnica mas das relaccedilotildees que
consegui desenvolver com esses trabalhadores Portanto o meacutetodo de utilizar fontes
orais consiste em trabalhar com a subjetividade dos indiviacuteduos lidando com as questotildees
postas pelos entrevistados a partir de minhas proacuteprias questotildees
Neste sentido o diaacutelogo com Alessandro Portelli e com outros autores ajudou a
compreender que essa relaccedilatildeo entre entrevistado e entrevistador natildeo eacute um objetivo
muito faacutecil de ser alcanccedilado pois as pessoas reinterpretam e datildeo novos significados aos
acontecimentos passados em funccedilatildeo do que vive no presente ou espera viver Ou ainda
encobrem sentimentos e interpretaccedilotildees por censura repressatildeo temores ou pela pouca
disposiccedilatildeo em falar8
Ao utilizar a fonte oral foi importante dialogar com a produccedilatildeo de Alessandro
Portelli o qual contribuiu para a construccedilatildeo de um procedimento de anaacutelise para a
produccedilatildeo das fontes orais e do olhar lanccedilado sobre esse material O uso de tal fonte na
pesquisa permitiu o enfrentamento da dinacircmica contraditoacuteria de valores e praacuteticas que
compotildeem escolhas pressotildees e expectativas desses sujeitos sociais
8 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 p33
13
Nesse sentido permite maior visibilidade poliacutetica da classe trabalhadora com
suas divisotildees e processos de identificaccedilatildeo na condiccedilatildeo de classe compartilhada
produzindo assim uma interpretaccedilatildeo histoacuterica comprometida com o potencial de luta e
intervenccedilatildeo social desses trabalhadores Essa investigaccedilatildeo tambeacutem traz como
enfrentamento lidar com os limites dessa fonte como as dificuldades de conseguir a
aceitaccedilatildeo da gravaccedilatildeo da entrevista e contatar trabalhadores9
O intuito de usarmos a fonte oral nesta pesquisa inspira-se nesta perspectiva de
Portelli Buscamos o trabalho com as entrevista natildeo como confirmaccedilatildeo de uma ldquoteserdquo
inicial mas sim com a intenccedilatildeo de dar visibilidade agraves interpretaccedilotildees construiacutedas pelos
trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa
Para tal associamos essa documentaccedilatildeo com mateacuterias jornaliacutesticas e fichas de
inscriccedilatildeo em cursos (de corte costura e bordado) na Escola do trabalho na cidade Aleacutem
da interpretaccedilatildeo de iacutendices estatiacutesticos sobre empregabilidade atividades econocircmicas
etc
O presente trabalho estaacute estruturado em dois capiacutetulos No primeiro capiacutetulo
busquei analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agrave
induacutestria de moda bebecirc a fim de compreender os motivos que levam esses sujeitos a
perceber a expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de
melhoria e mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas e na permanecircncia em Terra Roxa
No segundo capiacutetulo busco discutir a partir das experiecircncias cotidianas e das
relaccedilotildees de trabalho desses sujeitos as possibilidades e limites das expectativas que
estes trabalhadores estabelecem em relaccedilatildeo ao trabalho na induacutestria de moda bebecirc tal
qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre o
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa10
Essa intenccedilatildeo tenta se distanciar de determinados campos analiacuteticos que
sustentam essa expansatildeo industrial como sinocircnimo de desenvolvimento arraigados
na promoccedilatildeo de certos projetos empresariais e na historicidade progressista de alguns
processos de expansatildeo urbana Ao fazer esse distanciamento o interesse eacute ampliar o
9 PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 10 As induacutestrias de Terra Roxa estatildeo inseridas no Arranjo Produtivo Local (APL) criado em 2004 para oferecer subsiacutedios e aperfeiccediloamento aos empresaacuterios O APL da moda bebecirc visa entre outros aspectos maior eficiecircncia de inserccedilatildeo dos produtos da induacutestria de vestuaacuterio no mercado maior poder de negociaccedilatildeo de preccedilo da mateacuteria-prima atraccedilatildeo de novos prestadores de serviccedilos ao municiacutepio e otimizaccedilatildeo de custos com a qualificaccedilatildeo da matildeo de obra Esse assessoramento procura oferecer ao empresariado condiccedilotildees de mercado e apoio para fixaccedilatildeo em determinadas regiotildees
14
campo de anaacutelise apresentando contradiccedilotildees e tensotildees nesse percurso dirigindo atenccedilatildeo
aos trabalhadores mais do que agrave faacutebrica e ao sistema produtivo por ele mesmo11
Ao realizar esta pesquisa minha preocupaccedilatildeo se pauta em mostrar que estes
sujeitos satildeo seres conscientes de sua posiccedilatildeo enquanto sujeitos sociais e procuro
ressaltar que estes trabalhadores fazem parte deste processo histoacuterico enquanto
indiviacuteduos ativos mesmo que indiretamente intervenham nos rumos e ritmo dessa
expansatildeo industrial
Assim busquei com este trabalho explorar a partir das narrativas dos
trabalhadores e de suas experiecircncias entender natildeo somente estes sujeitos mas as
expectativas que estes constroem e as relaccedilotildees que estabelecem com o trabalho para a
promoccedilatildeo de seus interesses
11 O trabalho de Godoy procura fazer um percurso acadecircmico das nuances e alteraccedilotildees na abordagem do universo fabril Assim como Paoli Sader e Telles recolocam alguns enfrentamentos - na percepccedilatildeo de suas atuaccedilotildees e construccedilatildeo de sentidos - para aqueles que procuram perceber os trabalhadores neste cenaacuterio operaacuterio brasileiro Ver -GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 -PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198
15
CAPIacuteTULO 1
TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc
[] Com o tempo depois que essas empresas dede crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram mais faacuteceis neacute []12
Neste capiacutetulo vamos analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente
estatildeo ou que em algum momento de suas vidas estiveram vinculados agraves induacutestrias de
confecccedilatildeo de moda bebecirc do municiacutepio de Terra Roxa- PR mas que trazem em sua
trajetoacuteria uma relaccedilatildeo com o trabalho moradia e valores advindo do campo O objetivo
eacute problematizar suas avaliaccedilotildees frente agrave ldquoexpansatildeordquo industrial do municiacutepio e como essa
dialoga com seus interesses e necessidades
Ao analisarmos algumas entrevistas de trabalhadores vinculados a estas
induacutestrias foi comum encontrar assim como na narrativa citada na epiacutegrafe deste
capiacutetulo narrativas nesta perspectiva na qual os empregos gerados pela industrializaccedilatildeo
satildeo interpretados como possibilidade de melhoria na condiccedilatildeo de vida dos
trabalhadores Percebemos assim que o municiacutepio estaacute constantemente sendo indicado
como um grande polo de empregos mas essa indicaccedilatildeo natildeo resume as ponderaccedilotildees que
fazem sobre a presenccedila industrial em Terra Roxa - porque tambeacutem apontam elementos
que contradizem essa presenccedila
Buscaremos entatildeo dialogar com as fontes orais produzidas com trabalhadores
que se relacionaram com induacutestria de confecccedilatildeo procurando discutir tambeacutem alguns
trabalhos acadecircmicos que analisam praacuteticas dos trabalhadores em Terra Roxa A fim de
compreender a trajetoacuteria destes sujeitos e os motivos que os levam a perceber a
expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de melhoria e
mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas
Para compreendermos melhor estas interpretaccedilotildees fez-se necessaacuterio analisar o
percurso de relaccedilotildees e experiecircncias que construiacuteram Para isso foi importante
12 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
16
dimensionar a cidade na deacutecada de 1970 Momento em que se intensificou a mudanccedila
destes trabalhadores do campo para a cidade (ou ainda para outras regiotildees) ou seja este
foi um periacuteodo de mudanccedilas marcantes nas relaccedilotildees de trabalho onde morar e como
viver natildeo soacute no municiacutepio mas possiacutevel de identificar em outras cidades brasileiras
No trabalho de Ana Ameacutelia Camarano e Ricardo Abramovay haacute o interesse em
apresentar os movimentos migratoacuterios que respondem pelo processo de esvaziamento
da populaccedilatildeo rural no Brasil Os autores observam que ateacute 1980 houve um crescimento
absoluto do saldo populacional que deixou as aacutereas rurais brasileiras Aproximadamente
40 da populaccedilatildeo que vivia nas aacutereas rurais no comeccedilo dos anos 70 migraram nessa
deacutecada O fluxo que deixou o campo nos anos 80 tambeacutem foi expressivo 13 de todos
os que viviam no meio rural em 1980 saiacuteram durante esse periacuteodo o que representou
aproximadamente 13 milhotildees de pessoas13
Em termos nacionais a intensidade do movimento de desruralizaccedilatildeo segundo
os autores parece natildeo ter diminuiacutedo muito nos uacuteltimos 50 anos Entre 1950 e 1980 as
aacutereas rurais das regiotildees Sudeste e Sul forneceram um volume expressivo de novos
moradores para as aacutereas urbanas14 Para os autores como realizavam a pesquisa em fins
da deacutecada de 1990 suas impressotildees indicavam uma continuidade desse processo
Desde 1950 a cada 10 anos um em cada trecircs brasileiros vivendo no meio rural opta pela emigraccedilatildeo Os anos 90 natildeo arrefeceram em muito esta tendecircncia se as taxas de evasatildeo do meio rural observadas entre 1990 e 1995 persistirem pelo restante da deacutecada quase 30 dos brasileiros que entatildeo viviam no campo em 1990 teratildeo mudado seu local de residecircncia na virada do milecircnio15
Ainda que os autores analisem no campo da geografia demograacutefica apoiando-se
na noccedilatildeo de ecircxodo rural estes trazem ldquoo modo de vida no campordquo como incocircmodo para
a realizaccedilatildeo da pesquisa traduzido nas movimentaccedilotildees desses brasileiros entre o campo
e a cidade alteraccedilotildees natildeo soacute espaciais mas no modo como vivem e enfrentam
determinadas relaccedilotildees de poder
Estes se movimentam de acordo com as expectativas e interesses que produzem
como necessidades reorganizando as relaccedilotildees de trabalho e modos de vida diante de
pressotildees de reestruturaccedilatildeo da produccedilatildeo e da ocupaccedilatildeo das aacutereas rurais brasileiras da
13 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 14 IBIDEM 15 IBIDEM p 6
17
segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual
natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na
promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo
De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970
aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do
municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as
principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos
Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio
exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX
Graacutefico 1
Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)
Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e
principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a
distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando
Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de
1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea
urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave
expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de
vestuaacuterio moda bebecirc
16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013
18
Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no
municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo
urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e
insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo
na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e
incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola
em moldes capitalistas na cidade 17
A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas
unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha
o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade
em muitos casos diretamente com o consumidor
Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que
discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em
Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo
provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que
Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18
No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da
populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente
ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da
maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio
alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo
aponta um processo tranquilo
17
GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18
FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9
19
As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos
oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute
mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise
- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o
cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que
A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19
A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o
trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe
quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar
com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de
banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe
pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo
Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um
grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir
ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados
da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia
por um nuacutemero reduzido de vagas
Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo
saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por
um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria
condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses
19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33
20
trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de
induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade
Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu
entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria
seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas
vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece
Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20
A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves
induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos
perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas
de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para
Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida
Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como
citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este
processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de
Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande
decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio
Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do
IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que
formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho
atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores
mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que
permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram
como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras
atividades tambeacutem inconstantes
A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em
2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que
residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo
por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos
20
JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
21
sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)
estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos
produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no
transporte e venda de mercadorias21
O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os
trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira
produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no
contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria
e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas
Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua
forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de
escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma
grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de
mercadorias criminalizado como contrabando
O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online
Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o
narcotraacuteficordquo aponta que
Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122
A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida
com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que
almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores
apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os
21
CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013
22
oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando
permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute
associada a comprar roupas e tecircnis de marca
O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a
intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda
de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre
alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para
frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc
No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses
trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego
Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso
Frederico afirma que
Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23
A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da
agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em
segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees
No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este
processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas
nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica
quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo
Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24
23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
23
Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo
para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O
trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do
patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo
lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos
trabalhadores pela induacutestria ele me diz que
Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25
Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural
da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas
relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar
com essa nova dinacircmica
Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo
visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas
vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se
aproxima da percepccedilatildeo de Carlos
Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26
Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para
ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes
se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio
trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as
ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que
pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha
25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11
24
trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem
trabalho
Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe
complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho
pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida
que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram
Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no
campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e
trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte
das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave
trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a
perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura
Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27
Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de
alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute
registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses
trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas
A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade
de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As
oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um
maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa
condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos
desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor
a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado
O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos
Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo
Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa
27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10
25
Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28
Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas
anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do
empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da
cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram
nesse processo
O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho
financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para
empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a
demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de
trabalhadores agrave disposiccedilatildeo
Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no
municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do
empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor
produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que
A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29
Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos
gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por
ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e
possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio
A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees
municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno
28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM
26
desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos
proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e
do APL do vestuaacuterio na cidade 31
No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi
substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e
mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e
vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa
aacutereardquo
Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do
Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos
profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes
tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o
interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo
de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores
tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo
foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal
finalidade
De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho
rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da
folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo
A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como
Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes
Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o
municiacutepio de Terra Roxa
30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
27
Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34
O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de
trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda
continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila
tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de
garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno
dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o
campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre
os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal
As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma
alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida
ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores
possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -
com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou
outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por
perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista
dentre outros natildeo os oferece
Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes
trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de
classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de
melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no
ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a
trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em
outra cidade ela me disse que
Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35
34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
28
Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave
mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem
organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de
novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar
com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as
expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita
vantagem assimrdquo
Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para
Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se
demo na faacutebricardquo36
Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram
trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar
mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia
com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando
pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que
Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37
Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter
voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no
campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em
Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que
natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar
36 IDEM 37 IDEM
29
As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila
pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com
a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma
mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila
natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na
narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do
casal
Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas
construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril
Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho
na faacutebrica ela me disse que
Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38
Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que
gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as
dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores
preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica
ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na
avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em
conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho
O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como
Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos
indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em
casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria
Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista
Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim
38 IDEM
30
de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por
menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes
oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc
como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado
na Escola do Trabalho
Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o
tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram
mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias
permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas
relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais
Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns
trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de
compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas
tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa
39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
31
CAPIacuteTULO 2
TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40
Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa
natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O
municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande
polo de empregos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de
investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade
de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um
grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41
Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo
como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem
indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e
aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de
desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente
O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de
julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do
Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para
bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda
afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um
terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio
A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral
retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o
40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013
32
processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no
ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir
Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa
fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda
bebecirc pra terra roxa
Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43
A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande
destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da
cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra
Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o
municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo
queacuterdquo
No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves
transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que
este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo
sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em
resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores
Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa
industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo
enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa
Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20
principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a
43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
33
janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos
registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores
vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e
desligamento nesses setores
Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa
Meses Jan de 2003 a Jan de 2011
CBO ndash Frequumlecircncia
Admissotildees Desligamentos
Saldo
1ordm Emp
Reemp
Reint
C Prz Det
Transf
Total
Disp sem J Causa
Disp com J Causa
A Pedido
Term Contr
Aposent
Morte
Term C Prz Deter
Transf
Total
Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da
confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390
Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443
Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie
271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109
Costureira de peccedilas sob encomenda
171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em
geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio
varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina
60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio
em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina
bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas
34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27
Trabalhador agropecuaacuterio em geral
19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador
de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5
Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39
Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie
6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras
10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente
administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio
32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa
24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27
Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013
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Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
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Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
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mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
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curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
40
faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
43
Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
44
industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
45
Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
46
Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
47
Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
48
era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
4
5
Aos meus pais Agnaldo e Marley
Que abdicam de seus sonhos para realizar os meus
6
AGRADECIMENTOS
Com especial carinho aos meus Pais Agnaldo e Marley trabalhadores que
apesar da difiacutecil situaccedilatildeo fizeram o possiacutevel e o impossiacutevel para que eu pudesse chegar
ateacute este momento Eacute imensuraacutevel a gratidatildeo e orgulho que nutro por vocecircs pois sei de
toda luta e determinaccedilatildeo para verem a filha formada Obrigada por todo o incentivo
ldquopuxotildees de orelhardquo apoio dedicaccedilatildeo e amor
Agradeccedilo aos amigos velhos e novos que iratildeo fazer parte das minhas melhores
lembranccedilas do ldquotempo de faculdaderdquo Em especial Simone Tineneu Dan Tonho Popi
Vassoura Elaine Julius Keka Emer Nayara Luana Paulo e Tati Alegraram as
minhas noites com momentos de descontraccedilatildeo no bar e rodas de violatildeo Por muitas
vezes foram estes momentos que recarregaram as baterias e deram forccedilas para
continuar
Aacute Vania Marilia e Marcos (Xequereu) companheiros do movimento estudantil
que me ensinaram muito durante toda essa caminhada foram nossas discussotildees que
potencializaram minhas inquietaccedilotildees e a vontade de lutar
Aacute Cintia amiga e companheira durante toda a graduaccedilatildeo por todas as risadas
todo apoio as conversas sobre tantas coisas as comilanccedilas as reclamaccedilotildees e claro por
todos os momentos de procrastinaccedilatildeo
Aacute minhas queridas amigas de infacircncia Aline Luciana Suzani Simone e Fran
que mesmo longe sempre estiveram presentes compartilhando anguacutestias e vitoacuterias
Aacute minha tia Elza que contribuiu de inuacutemeras formas para minha moradia em
Marechal Cacircndido Rondon
Aacute minha orientadora Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas por todo aprendizado
dedicaccedilatildeo e compreensatildeo
Aos trabalhadores que gentilmente me receberam em suas casas compartilhando
suas experiecircncias para a realizaccedilatildeo desse trabalho
Ao meu companheiro Marcos antes de qualquer coisa melhor amigo por toda
cobranccedila ajuda paciecircncia e amor
7
RESUMO
Este Trabalho de Conclusatildeo de Curso tem a intenccedilatildeo de problematizar analisar e investigar as relaccedilotildees de trabalho que marcam a trajetoacuteria de trabalhadores que compuseram praacuteticas no processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa-PR discutindo o modo como se relacionaram nem sempre amistosamente com as accedilotildees do poder puacuteblico municipal e com a participaccedilatildeo empresarial do ramo ldquomoda bebecircrdquo na cidade A pesquisa abordaraacute as trecircs uacuteltimas deacutecadas pelo fato de esse ser um momento histoacuterico importante pela intensificaccedilatildeo da exploraccedilatildeo industrial em Terra Roxa Essa temporalidade eacute significativa no processo de mudanccedila e produccedilatildeo de relaccedilotildees de trabalho na cidade envolvendo o setor de vestuaacuterio e a produccedilatildeo de alternativas por trabalhadores muitas vezes advindo do meio rural Propomos investigar as condiccedilotildees de vida dos trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam este mercado de trabalho bem como relacionar as memoacuterias e accedilotildees produzidas tanto para o trabalho como para a vida em Terra Roxa Para isso destacamos o trabalho com as fontes orais jornais fichas de cursos profissionalizantes e iacutendices estatiacutesticos como documentaccedilatildeo a ser privilegiada nessa pesquisa O interesse foi manter o diaacutelogo com as evidecircncias e quando necessaacuterio ampliar a anaacutelise de fontes ou mesmo revendo os caminhos da investigaccedilatildeo Esse encaminhamento considera que o conhecimento histoacuterico exige essa construccedilatildeo ao longo da pesquisa como tambeacutem o compromisso com as questotildees em foco
Palavras-chave Trabalhadores Relaccedilotildees de Trabalho Induacutestrias
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Sumaacuterio INTRODUCcedilAtildeO 9
CAPIacuteTULO 1TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc 15
CAPIacuteTULO 2TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES 31
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 51
FONTES 53
REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS 55
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INTRODUCcedilAtildeO
A escolha dos sujeitos e do tema deste estudo (os trabalhadores atualmente
vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa- PR) eacute resultado de minha
trajetoacuteria de vida trabalho e acadecircmica
Primeiro de vida e trabalho porque o trabalho na induacutestria de moda bebecirc jaacute fez
parte de minha atividade profissional por algum tempo Deste modo pude conviver com
outros trabalhadores observar e ouvir suas avaliaccedilotildees sobre suas condiccedilotildees de vida
motivaccedilotildees interesses e conflitos que perpassam esse ambiente de trabalho o que me
instigou a pesquisar o tema De forma que muitas das interpretaccedilotildees e avaliaccedilotildees que os
trabalhadores indicam em suas narrativas atraveacutes das entrevistas feitas jaacute ouvi dos
meus familiares como da minha proacutepria matildee Pois grande parte deles reside em Terra
Roxa e trabalha na induacutestria de moda bebecirc
Segundo como acadecircmica e pesquisadora porque este trabalho de conclusatildeo de
curso eacute continuidade de uma iniciaccedilatildeo cientifica voluntaacuteria (PIC-V) e as questotildees que
estatildeo aqui sendo levantadas eacute uma continuidade das indagaccedilotildees que surgiram a partir de
um diaacutelogo inicial com as fontes feitas nesta pesquisa anterior1
O objetivo central da pesquisa foi investigar as condiccedilotildees de vida de
trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de vestuaacuterio moda bebecirc no municiacutepio de
Terra Roxa-PR problematizando suas relaccedilotildees de trabalho e como se inserem e
interpretam este mercado de trabalho dando visibilidade a estes sujeitos e suas accedilotildees na
cidade
O municiacutepio possui atualmente entre macro e micro cerca de 113 empresas que
produzem em torno de 9 milhotildees de peccedilas envolvendo aproximadamente 2500
trabalhadores empregados diretamente o que segundo a noccedilatildeo do poder publico
municipal ldquodinamiza a geraccedilatildeo de emprego e renda do municiacutepiordquo2 Como podemos
1 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 2 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013
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perceber em uma reportagem do jornal online Gazeta do Povo intitulada ldquoEm Terra
Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojasrdquo
A cadeia da confecccedilatildeo infantil mudou os rumos da cidade de 17 mil habitantes e a vida de muitos paranaenses Maria do Carmo 42 anos eacute um exemplo Ateacute os 38 anos ela trabalhava nos Campos Gerais onde plantava eucalipto Hoje o cenaacuterio eacute o mesmo um siacutetio mas agora ela natildeo lida diretamente com a terra Maria atua no setor de corte de roupas e tambeacutem dirige o ocircnibus que transporta funcionaacuterios da empresa Baby Doces Momentos confecccedilatildeo localizada em um siacutetio de cinco alqueires que produz cerca de 20 mil peccedilas ao mecircs ldquoAgora me sinto melhor Antes trabalhava no sol com uma bomba de 20 litros nas costas para pulverizar e plantarrdquo conta3
A partir do trecho acima percebemos que ao avaliar a dinacircmica industrial no
municiacutepio a reportagem aponta a relaccedilatildeo com a produccedilatildeo e experiecircncia dos trabalhos
no meio rural evidentemente para positivar a expansatildeo desse ramo de induacutestria de
vestuaacuterio como salvaccedilatildeo da cidade jaacute que estas empresas ldquodinamiza a geraccedilatildeo de
emprego e renda do municiacutepiordquo
Eacute importante entender a dimensatildeo dessa estrutura empresarial industrial em
Terra Roxa pois esta historicidade vai abrir caminhos a serem problematizados ao
longo deste trabalho
Para desenvolver esta pesquisa pautamo-nos na dinacircmica que integra a reflexatildeo
da problemaacutetica e o processo de levantamento e anaacutelise de fontes Esse
encaminhamento inspira-se na indicaccedilatildeo de Thompson sobre o diaacutelogo necessaacuterio e
constante entre teoria e evidecircncias histoacutericas4
Segundo Thompson
O interrogador eacute a loacutegica histoacuterica o conteuacutedo da interrogaccedilatildeo eacute uma hipoacutetese o interrogado eacute a evidecircncia com suas propriedades determinadas O objeto do conhecimento histoacuterico eacute a histoacuteria lsquorealrsquo cujas evidecircncias devem ser necessariamente incompletas e imperfeitas5
3 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no-paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 4 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma criacutetica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar Editores 1981 5 IBIDEM p 49
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Isso quer dizer que os historiadores podem selecionar essa ou aquela evidecircncia
propor novas perguntas mas isso natildeo significa que os proacuteprios acontecimentos passados
se modifiquem nem tampouco que seja um agregado de histoacuterias separadas Embora
essa interpretaccedilatildeo do processo histoacuterico surja em resposta agrave pergunta formulada nossa
produccedilatildeo natildeo inventa o processo e natildeo pode modificar o ldquostatus ontoloacutegicordquo do
passado
Eacute nesta perspectiva de anaacutelise que conduziremos este pesquisa Cabe contudo
salientar a contribuiccedilatildeo que esta nos proporciona para a compreensatildeo que proponho
sobre as relaccedilotildees de trabalho experiecircncias e interpretaccedilotildees dos trabalhadores nas
induacutestrias de confecccedilatildeo de moda bebecirc em Terra Roxa Para tanto pensaremos a histoacuteria
em um duplo sentido como experiecircncia humana e como a proacutepria narraccedilatildeo dessas
experiecircncias as interpretaccedilotildees e projeccedilotildees das quais o investigador vai utilizar6
A investigaccedilatildeo neste sentido estaacute relacionada com as problemaacuteticas que o
pesquisador se coloca no presente que envolvem sua experiecircncia de vida e as
concepccedilotildees da qual parte
Pretendo entender a partir das experiecircncias narradas por esses trabalhadores
como eles se inserem e interpretam este mercado de trabalho e fazem prospecccedilotildees
Segundo Thompson
Se determos a histoacuteria num determinado ponto natildeo haacute classe mas simplesmente uma multidatildeo de indiviacuteduos com amontoado de experiecircncias Mas se examinarmos esses homens durante um periacuteodo adequado de mudanccedilas sociais observaremos padrotildees em suas relaccedilotildees sua ideias e instituiccedilotildees A classe eacute definida pelos homens enquanto vivem sua proacutepria histoacuteria e ao final esta eacute sua definiccedilatildeo7
Neste sentido para entendermos os trabalhadores eacute necessaacuteria uma serie de
observaccedilotildees e anaacutelises que se expressam em suas praacuteticas cotidianas como eles
vivenciam e se portam perante sua dinacircmica de trabalho o que possibilita sua formaccedilatildeo
cultural e social
Para esse processo interpretativo utilizamos cinco entrevistas que realizei com
trabalhadores no intuito de potencializar as elaboraccedilotildees construiacutedas por esses sujeitos
sobre as motivaccedilotildees interesses e conflitos ou seja memoacuterias produzidas sobre
6 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987 7 THOMPSON E P ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12
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trajetoacuterias e experiecircncia social compartilhada nas relaccedilotildees dentro e fora das induacutestrias
de vestuaacuterio na cidade
Como um dos meacutetodos de pesquisa foi trabalhar com fontes orais considero
importante apontar algumas dificuldades que encontrei ao realizar algumas entrevistas
Mesmo o municiacutepio empregando mais de 2500 trabalhadores na induacutestria de confecccedilatildeo
minha principal dificuldade foi encontrar trabalhadores que se dispusessem a realizar as
entrevistas
Aqueles que aceitavam soacute concordavam em produzir a entrevista quando
algueacutem muito proacuteximo deles me apresentava O fato de alguns trabalhadores aceitarem
natildeo excluiu a desconfianccedila e inseguranccedila que estes possuiacuteam em relaccedilatildeo agraves entrevistas
Desta forma a inseguranccedila dos trabalhadores sobre se poderiam falar ou natildeo a
respeito de suas relaccedilotildees de trabalho juntamente com a minha falta de experiecircncia em
saber lidar com essas inseguranccedilas prejudicaram o desenvolvimento das entrevistas
As respostas ficaram limitadas ao roteiro muitas vezes limitadas ao ldquosimrdquo ou ao ldquonatildeordquo
Pois aleacutem da timidez ao saberem que estatildeo sendo gravados ainda tive que lidar com o
receio dos entrevistados ao exporem sua trajetoacuteria e condiccedilotildees de vida
As entrevistas orais natildeo foram produto de teacutecnica mas das relaccedilotildees que
consegui desenvolver com esses trabalhadores Portanto o meacutetodo de utilizar fontes
orais consiste em trabalhar com a subjetividade dos indiviacuteduos lidando com as questotildees
postas pelos entrevistados a partir de minhas proacuteprias questotildees
Neste sentido o diaacutelogo com Alessandro Portelli e com outros autores ajudou a
compreender que essa relaccedilatildeo entre entrevistado e entrevistador natildeo eacute um objetivo
muito faacutecil de ser alcanccedilado pois as pessoas reinterpretam e datildeo novos significados aos
acontecimentos passados em funccedilatildeo do que vive no presente ou espera viver Ou ainda
encobrem sentimentos e interpretaccedilotildees por censura repressatildeo temores ou pela pouca
disposiccedilatildeo em falar8
Ao utilizar a fonte oral foi importante dialogar com a produccedilatildeo de Alessandro
Portelli o qual contribuiu para a construccedilatildeo de um procedimento de anaacutelise para a
produccedilatildeo das fontes orais e do olhar lanccedilado sobre esse material O uso de tal fonte na
pesquisa permitiu o enfrentamento da dinacircmica contraditoacuteria de valores e praacuteticas que
compotildeem escolhas pressotildees e expectativas desses sujeitos sociais
8 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 p33
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Nesse sentido permite maior visibilidade poliacutetica da classe trabalhadora com
suas divisotildees e processos de identificaccedilatildeo na condiccedilatildeo de classe compartilhada
produzindo assim uma interpretaccedilatildeo histoacuterica comprometida com o potencial de luta e
intervenccedilatildeo social desses trabalhadores Essa investigaccedilatildeo tambeacutem traz como
enfrentamento lidar com os limites dessa fonte como as dificuldades de conseguir a
aceitaccedilatildeo da gravaccedilatildeo da entrevista e contatar trabalhadores9
O intuito de usarmos a fonte oral nesta pesquisa inspira-se nesta perspectiva de
Portelli Buscamos o trabalho com as entrevista natildeo como confirmaccedilatildeo de uma ldquoteserdquo
inicial mas sim com a intenccedilatildeo de dar visibilidade agraves interpretaccedilotildees construiacutedas pelos
trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa
Para tal associamos essa documentaccedilatildeo com mateacuterias jornaliacutesticas e fichas de
inscriccedilatildeo em cursos (de corte costura e bordado) na Escola do trabalho na cidade Aleacutem
da interpretaccedilatildeo de iacutendices estatiacutesticos sobre empregabilidade atividades econocircmicas
etc
O presente trabalho estaacute estruturado em dois capiacutetulos No primeiro capiacutetulo
busquei analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agrave
induacutestria de moda bebecirc a fim de compreender os motivos que levam esses sujeitos a
perceber a expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de
melhoria e mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas e na permanecircncia em Terra Roxa
No segundo capiacutetulo busco discutir a partir das experiecircncias cotidianas e das
relaccedilotildees de trabalho desses sujeitos as possibilidades e limites das expectativas que
estes trabalhadores estabelecem em relaccedilatildeo ao trabalho na induacutestria de moda bebecirc tal
qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre o
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa10
Essa intenccedilatildeo tenta se distanciar de determinados campos analiacuteticos que
sustentam essa expansatildeo industrial como sinocircnimo de desenvolvimento arraigados
na promoccedilatildeo de certos projetos empresariais e na historicidade progressista de alguns
processos de expansatildeo urbana Ao fazer esse distanciamento o interesse eacute ampliar o
9 PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 10 As induacutestrias de Terra Roxa estatildeo inseridas no Arranjo Produtivo Local (APL) criado em 2004 para oferecer subsiacutedios e aperfeiccediloamento aos empresaacuterios O APL da moda bebecirc visa entre outros aspectos maior eficiecircncia de inserccedilatildeo dos produtos da induacutestria de vestuaacuterio no mercado maior poder de negociaccedilatildeo de preccedilo da mateacuteria-prima atraccedilatildeo de novos prestadores de serviccedilos ao municiacutepio e otimizaccedilatildeo de custos com a qualificaccedilatildeo da matildeo de obra Esse assessoramento procura oferecer ao empresariado condiccedilotildees de mercado e apoio para fixaccedilatildeo em determinadas regiotildees
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campo de anaacutelise apresentando contradiccedilotildees e tensotildees nesse percurso dirigindo atenccedilatildeo
aos trabalhadores mais do que agrave faacutebrica e ao sistema produtivo por ele mesmo11
Ao realizar esta pesquisa minha preocupaccedilatildeo se pauta em mostrar que estes
sujeitos satildeo seres conscientes de sua posiccedilatildeo enquanto sujeitos sociais e procuro
ressaltar que estes trabalhadores fazem parte deste processo histoacuterico enquanto
indiviacuteduos ativos mesmo que indiretamente intervenham nos rumos e ritmo dessa
expansatildeo industrial
Assim busquei com este trabalho explorar a partir das narrativas dos
trabalhadores e de suas experiecircncias entender natildeo somente estes sujeitos mas as
expectativas que estes constroem e as relaccedilotildees que estabelecem com o trabalho para a
promoccedilatildeo de seus interesses
11 O trabalho de Godoy procura fazer um percurso acadecircmico das nuances e alteraccedilotildees na abordagem do universo fabril Assim como Paoli Sader e Telles recolocam alguns enfrentamentos - na percepccedilatildeo de suas atuaccedilotildees e construccedilatildeo de sentidos - para aqueles que procuram perceber os trabalhadores neste cenaacuterio operaacuterio brasileiro Ver -GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 -PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198
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CAPIacuteTULO 1
TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc
[] Com o tempo depois que essas empresas dede crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram mais faacuteceis neacute []12
Neste capiacutetulo vamos analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente
estatildeo ou que em algum momento de suas vidas estiveram vinculados agraves induacutestrias de
confecccedilatildeo de moda bebecirc do municiacutepio de Terra Roxa- PR mas que trazem em sua
trajetoacuteria uma relaccedilatildeo com o trabalho moradia e valores advindo do campo O objetivo
eacute problematizar suas avaliaccedilotildees frente agrave ldquoexpansatildeordquo industrial do municiacutepio e como essa
dialoga com seus interesses e necessidades
Ao analisarmos algumas entrevistas de trabalhadores vinculados a estas
induacutestrias foi comum encontrar assim como na narrativa citada na epiacutegrafe deste
capiacutetulo narrativas nesta perspectiva na qual os empregos gerados pela industrializaccedilatildeo
satildeo interpretados como possibilidade de melhoria na condiccedilatildeo de vida dos
trabalhadores Percebemos assim que o municiacutepio estaacute constantemente sendo indicado
como um grande polo de empregos mas essa indicaccedilatildeo natildeo resume as ponderaccedilotildees que
fazem sobre a presenccedila industrial em Terra Roxa - porque tambeacutem apontam elementos
que contradizem essa presenccedila
Buscaremos entatildeo dialogar com as fontes orais produzidas com trabalhadores
que se relacionaram com induacutestria de confecccedilatildeo procurando discutir tambeacutem alguns
trabalhos acadecircmicos que analisam praacuteticas dos trabalhadores em Terra Roxa A fim de
compreender a trajetoacuteria destes sujeitos e os motivos que os levam a perceber a
expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de melhoria e
mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas
Para compreendermos melhor estas interpretaccedilotildees fez-se necessaacuterio analisar o
percurso de relaccedilotildees e experiecircncias que construiacuteram Para isso foi importante
12 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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dimensionar a cidade na deacutecada de 1970 Momento em que se intensificou a mudanccedila
destes trabalhadores do campo para a cidade (ou ainda para outras regiotildees) ou seja este
foi um periacuteodo de mudanccedilas marcantes nas relaccedilotildees de trabalho onde morar e como
viver natildeo soacute no municiacutepio mas possiacutevel de identificar em outras cidades brasileiras
No trabalho de Ana Ameacutelia Camarano e Ricardo Abramovay haacute o interesse em
apresentar os movimentos migratoacuterios que respondem pelo processo de esvaziamento
da populaccedilatildeo rural no Brasil Os autores observam que ateacute 1980 houve um crescimento
absoluto do saldo populacional que deixou as aacutereas rurais brasileiras Aproximadamente
40 da populaccedilatildeo que vivia nas aacutereas rurais no comeccedilo dos anos 70 migraram nessa
deacutecada O fluxo que deixou o campo nos anos 80 tambeacutem foi expressivo 13 de todos
os que viviam no meio rural em 1980 saiacuteram durante esse periacuteodo o que representou
aproximadamente 13 milhotildees de pessoas13
Em termos nacionais a intensidade do movimento de desruralizaccedilatildeo segundo
os autores parece natildeo ter diminuiacutedo muito nos uacuteltimos 50 anos Entre 1950 e 1980 as
aacutereas rurais das regiotildees Sudeste e Sul forneceram um volume expressivo de novos
moradores para as aacutereas urbanas14 Para os autores como realizavam a pesquisa em fins
da deacutecada de 1990 suas impressotildees indicavam uma continuidade desse processo
Desde 1950 a cada 10 anos um em cada trecircs brasileiros vivendo no meio rural opta pela emigraccedilatildeo Os anos 90 natildeo arrefeceram em muito esta tendecircncia se as taxas de evasatildeo do meio rural observadas entre 1990 e 1995 persistirem pelo restante da deacutecada quase 30 dos brasileiros que entatildeo viviam no campo em 1990 teratildeo mudado seu local de residecircncia na virada do milecircnio15
Ainda que os autores analisem no campo da geografia demograacutefica apoiando-se
na noccedilatildeo de ecircxodo rural estes trazem ldquoo modo de vida no campordquo como incocircmodo para
a realizaccedilatildeo da pesquisa traduzido nas movimentaccedilotildees desses brasileiros entre o campo
e a cidade alteraccedilotildees natildeo soacute espaciais mas no modo como vivem e enfrentam
determinadas relaccedilotildees de poder
Estes se movimentam de acordo com as expectativas e interesses que produzem
como necessidades reorganizando as relaccedilotildees de trabalho e modos de vida diante de
pressotildees de reestruturaccedilatildeo da produccedilatildeo e da ocupaccedilatildeo das aacutereas rurais brasileiras da
13 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 14 IBIDEM 15 IBIDEM p 6
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segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual
natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na
promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo
De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970
aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do
municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as
principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos
Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio
exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX
Graacutefico 1
Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)
Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e
principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a
distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando
Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de
1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea
urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave
expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de
vestuaacuterio moda bebecirc
16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013
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Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no
municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo
urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e
insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo
na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e
incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola
em moldes capitalistas na cidade 17
A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas
unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha
o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade
em muitos casos diretamente com o consumidor
Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que
discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em
Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo
provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que
Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18
No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da
populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente
ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da
maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio
alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo
aponta um processo tranquilo
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GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18
FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9
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As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos
oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute
mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise
- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o
cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que
A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19
A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o
trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe
quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar
com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de
banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe
pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo
Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um
grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir
ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados
da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia
por um nuacutemero reduzido de vagas
Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo
saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por
um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria
condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses
19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33
20
trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de
induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade
Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu
entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria
seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas
vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece
Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20
A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves
induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos
perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas
de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para
Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida
Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como
citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este
processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de
Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande
decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio
Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do
IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que
formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho
atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores
mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que
permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram
como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras
atividades tambeacutem inconstantes
A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em
2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que
residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo
por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos
20
JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
21
sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)
estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos
produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no
transporte e venda de mercadorias21
O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os
trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira
produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no
contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria
e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas
Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua
forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de
escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma
grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de
mercadorias criminalizado como contrabando
O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online
Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o
narcotraacuteficordquo aponta que
Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122
A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida
com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que
almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores
apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os
21
CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013
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oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando
permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute
associada a comprar roupas e tecircnis de marca
O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a
intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda
de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre
alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para
frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc
No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses
trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego
Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso
Frederico afirma que
Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23
A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da
agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em
segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees
No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este
processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas
nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica
quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo
Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24
23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
23
Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo
para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O
trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do
patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo
lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos
trabalhadores pela induacutestria ele me diz que
Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25
Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural
da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas
relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar
com essa nova dinacircmica
Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo
visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas
vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se
aproxima da percepccedilatildeo de Carlos
Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26
Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para
ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes
se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio
trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as
ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que
pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha
25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11
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trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem
trabalho
Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe
complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho
pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida
que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram
Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no
campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e
trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte
das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave
trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a
perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura
Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27
Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de
alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute
registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses
trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas
A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade
de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As
oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um
maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa
condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos
desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor
a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado
O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos
Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo
Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa
27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10
25
Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28
Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas
anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do
empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da
cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram
nesse processo
O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho
financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para
empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a
demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de
trabalhadores agrave disposiccedilatildeo
Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no
municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do
empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor
produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que
A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29
Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos
gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por
ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e
possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio
A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees
municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno
28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM
26
desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos
proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e
do APL do vestuaacuterio na cidade 31
No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi
substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e
mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e
vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa
aacutereardquo
Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do
Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos
profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes
tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o
interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo
de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores
tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo
foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal
finalidade
De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho
rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da
folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo
A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como
Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes
Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o
municiacutepio de Terra Roxa
30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
27
Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34
O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de
trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda
continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila
tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de
garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno
dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o
campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre
os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal
As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma
alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida
ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores
possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -
com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou
outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por
perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista
dentre outros natildeo os oferece
Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes
trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de
classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de
melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no
ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a
trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em
outra cidade ela me disse que
Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35
34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
28
Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave
mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem
organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de
novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar
com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as
expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita
vantagem assimrdquo
Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para
Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se
demo na faacutebricardquo36
Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram
trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar
mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia
com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando
pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que
Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37
Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter
voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no
campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em
Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que
natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar
36 IDEM 37 IDEM
29
As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila
pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com
a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma
mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila
natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na
narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do
casal
Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas
construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril
Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho
na faacutebrica ela me disse que
Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38
Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que
gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as
dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores
preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica
ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na
avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em
conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho
O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como
Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos
indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em
casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria
Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista
Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim
38 IDEM
30
de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por
menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes
oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc
como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado
na Escola do Trabalho
Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o
tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram
mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias
permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas
relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais
Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns
trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de
compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas
tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa
39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
31
CAPIacuteTULO 2
TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40
Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa
natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O
municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande
polo de empregos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de
investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade
de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um
grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41
Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo
como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem
indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e
aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de
desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente
O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de
julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do
Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para
bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda
afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um
terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio
A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral
retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o
40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013
32
processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no
ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir
Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa
fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda
bebecirc pra terra roxa
Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43
A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande
destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da
cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra
Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o
municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo
queacuterdquo
No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves
transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que
este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo
sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em
resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores
Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa
industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo
enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa
Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20
principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a
43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
33
janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos
registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores
vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e
desligamento nesses setores
Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa
Meses Jan de 2003 a Jan de 2011
CBO ndash Frequumlecircncia
Admissotildees Desligamentos
Saldo
1ordm Emp
Reemp
Reint
C Prz Det
Transf
Total
Disp sem J Causa
Disp com J Causa
A Pedido
Term Contr
Aposent
Morte
Term C Prz Deter
Transf
Total
Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da
confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390
Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443
Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie
271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109
Costureira de peccedilas sob encomenda
171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em
geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio
varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina
60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio
em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina
bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas
34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27
Trabalhador agropecuaacuterio em geral
19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador
de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5
Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39
Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie
6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras
10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente
administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio
32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa
24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27
Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013
34
Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
35
Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
36
mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
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curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
40
faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
41
que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
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era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
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FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
5
Aos meus pais Agnaldo e Marley
Que abdicam de seus sonhos para realizar os meus
6
AGRADECIMENTOS
Com especial carinho aos meus Pais Agnaldo e Marley trabalhadores que
apesar da difiacutecil situaccedilatildeo fizeram o possiacutevel e o impossiacutevel para que eu pudesse chegar
ateacute este momento Eacute imensuraacutevel a gratidatildeo e orgulho que nutro por vocecircs pois sei de
toda luta e determinaccedilatildeo para verem a filha formada Obrigada por todo o incentivo
ldquopuxotildees de orelhardquo apoio dedicaccedilatildeo e amor
Agradeccedilo aos amigos velhos e novos que iratildeo fazer parte das minhas melhores
lembranccedilas do ldquotempo de faculdaderdquo Em especial Simone Tineneu Dan Tonho Popi
Vassoura Elaine Julius Keka Emer Nayara Luana Paulo e Tati Alegraram as
minhas noites com momentos de descontraccedilatildeo no bar e rodas de violatildeo Por muitas
vezes foram estes momentos que recarregaram as baterias e deram forccedilas para
continuar
Aacute Vania Marilia e Marcos (Xequereu) companheiros do movimento estudantil
que me ensinaram muito durante toda essa caminhada foram nossas discussotildees que
potencializaram minhas inquietaccedilotildees e a vontade de lutar
Aacute Cintia amiga e companheira durante toda a graduaccedilatildeo por todas as risadas
todo apoio as conversas sobre tantas coisas as comilanccedilas as reclamaccedilotildees e claro por
todos os momentos de procrastinaccedilatildeo
Aacute minhas queridas amigas de infacircncia Aline Luciana Suzani Simone e Fran
que mesmo longe sempre estiveram presentes compartilhando anguacutestias e vitoacuterias
Aacute minha tia Elza que contribuiu de inuacutemeras formas para minha moradia em
Marechal Cacircndido Rondon
Aacute minha orientadora Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas por todo aprendizado
dedicaccedilatildeo e compreensatildeo
Aos trabalhadores que gentilmente me receberam em suas casas compartilhando
suas experiecircncias para a realizaccedilatildeo desse trabalho
Ao meu companheiro Marcos antes de qualquer coisa melhor amigo por toda
cobranccedila ajuda paciecircncia e amor
7
RESUMO
Este Trabalho de Conclusatildeo de Curso tem a intenccedilatildeo de problematizar analisar e investigar as relaccedilotildees de trabalho que marcam a trajetoacuteria de trabalhadores que compuseram praacuteticas no processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa-PR discutindo o modo como se relacionaram nem sempre amistosamente com as accedilotildees do poder puacuteblico municipal e com a participaccedilatildeo empresarial do ramo ldquomoda bebecircrdquo na cidade A pesquisa abordaraacute as trecircs uacuteltimas deacutecadas pelo fato de esse ser um momento histoacuterico importante pela intensificaccedilatildeo da exploraccedilatildeo industrial em Terra Roxa Essa temporalidade eacute significativa no processo de mudanccedila e produccedilatildeo de relaccedilotildees de trabalho na cidade envolvendo o setor de vestuaacuterio e a produccedilatildeo de alternativas por trabalhadores muitas vezes advindo do meio rural Propomos investigar as condiccedilotildees de vida dos trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam este mercado de trabalho bem como relacionar as memoacuterias e accedilotildees produzidas tanto para o trabalho como para a vida em Terra Roxa Para isso destacamos o trabalho com as fontes orais jornais fichas de cursos profissionalizantes e iacutendices estatiacutesticos como documentaccedilatildeo a ser privilegiada nessa pesquisa O interesse foi manter o diaacutelogo com as evidecircncias e quando necessaacuterio ampliar a anaacutelise de fontes ou mesmo revendo os caminhos da investigaccedilatildeo Esse encaminhamento considera que o conhecimento histoacuterico exige essa construccedilatildeo ao longo da pesquisa como tambeacutem o compromisso com as questotildees em foco
Palavras-chave Trabalhadores Relaccedilotildees de Trabalho Induacutestrias
8
Sumaacuterio INTRODUCcedilAtildeO 9
CAPIacuteTULO 1TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc 15
CAPIacuteTULO 2TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES 31
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 51
FONTES 53
REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS 55
9
INTRODUCcedilAtildeO
A escolha dos sujeitos e do tema deste estudo (os trabalhadores atualmente
vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa- PR) eacute resultado de minha
trajetoacuteria de vida trabalho e acadecircmica
Primeiro de vida e trabalho porque o trabalho na induacutestria de moda bebecirc jaacute fez
parte de minha atividade profissional por algum tempo Deste modo pude conviver com
outros trabalhadores observar e ouvir suas avaliaccedilotildees sobre suas condiccedilotildees de vida
motivaccedilotildees interesses e conflitos que perpassam esse ambiente de trabalho o que me
instigou a pesquisar o tema De forma que muitas das interpretaccedilotildees e avaliaccedilotildees que os
trabalhadores indicam em suas narrativas atraveacutes das entrevistas feitas jaacute ouvi dos
meus familiares como da minha proacutepria matildee Pois grande parte deles reside em Terra
Roxa e trabalha na induacutestria de moda bebecirc
Segundo como acadecircmica e pesquisadora porque este trabalho de conclusatildeo de
curso eacute continuidade de uma iniciaccedilatildeo cientifica voluntaacuteria (PIC-V) e as questotildees que
estatildeo aqui sendo levantadas eacute uma continuidade das indagaccedilotildees que surgiram a partir de
um diaacutelogo inicial com as fontes feitas nesta pesquisa anterior1
O objetivo central da pesquisa foi investigar as condiccedilotildees de vida de
trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de vestuaacuterio moda bebecirc no municiacutepio de
Terra Roxa-PR problematizando suas relaccedilotildees de trabalho e como se inserem e
interpretam este mercado de trabalho dando visibilidade a estes sujeitos e suas accedilotildees na
cidade
O municiacutepio possui atualmente entre macro e micro cerca de 113 empresas que
produzem em torno de 9 milhotildees de peccedilas envolvendo aproximadamente 2500
trabalhadores empregados diretamente o que segundo a noccedilatildeo do poder publico
municipal ldquodinamiza a geraccedilatildeo de emprego e renda do municiacutepiordquo2 Como podemos
1 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 2 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013
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perceber em uma reportagem do jornal online Gazeta do Povo intitulada ldquoEm Terra
Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojasrdquo
A cadeia da confecccedilatildeo infantil mudou os rumos da cidade de 17 mil habitantes e a vida de muitos paranaenses Maria do Carmo 42 anos eacute um exemplo Ateacute os 38 anos ela trabalhava nos Campos Gerais onde plantava eucalipto Hoje o cenaacuterio eacute o mesmo um siacutetio mas agora ela natildeo lida diretamente com a terra Maria atua no setor de corte de roupas e tambeacutem dirige o ocircnibus que transporta funcionaacuterios da empresa Baby Doces Momentos confecccedilatildeo localizada em um siacutetio de cinco alqueires que produz cerca de 20 mil peccedilas ao mecircs ldquoAgora me sinto melhor Antes trabalhava no sol com uma bomba de 20 litros nas costas para pulverizar e plantarrdquo conta3
A partir do trecho acima percebemos que ao avaliar a dinacircmica industrial no
municiacutepio a reportagem aponta a relaccedilatildeo com a produccedilatildeo e experiecircncia dos trabalhos
no meio rural evidentemente para positivar a expansatildeo desse ramo de induacutestria de
vestuaacuterio como salvaccedilatildeo da cidade jaacute que estas empresas ldquodinamiza a geraccedilatildeo de
emprego e renda do municiacutepiordquo
Eacute importante entender a dimensatildeo dessa estrutura empresarial industrial em
Terra Roxa pois esta historicidade vai abrir caminhos a serem problematizados ao
longo deste trabalho
Para desenvolver esta pesquisa pautamo-nos na dinacircmica que integra a reflexatildeo
da problemaacutetica e o processo de levantamento e anaacutelise de fontes Esse
encaminhamento inspira-se na indicaccedilatildeo de Thompson sobre o diaacutelogo necessaacuterio e
constante entre teoria e evidecircncias histoacutericas4
Segundo Thompson
O interrogador eacute a loacutegica histoacuterica o conteuacutedo da interrogaccedilatildeo eacute uma hipoacutetese o interrogado eacute a evidecircncia com suas propriedades determinadas O objeto do conhecimento histoacuterico eacute a histoacuteria lsquorealrsquo cujas evidecircncias devem ser necessariamente incompletas e imperfeitas5
3 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no-paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 4 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma criacutetica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar Editores 1981 5 IBIDEM p 49
11
Isso quer dizer que os historiadores podem selecionar essa ou aquela evidecircncia
propor novas perguntas mas isso natildeo significa que os proacuteprios acontecimentos passados
se modifiquem nem tampouco que seja um agregado de histoacuterias separadas Embora
essa interpretaccedilatildeo do processo histoacuterico surja em resposta agrave pergunta formulada nossa
produccedilatildeo natildeo inventa o processo e natildeo pode modificar o ldquostatus ontoloacutegicordquo do
passado
Eacute nesta perspectiva de anaacutelise que conduziremos este pesquisa Cabe contudo
salientar a contribuiccedilatildeo que esta nos proporciona para a compreensatildeo que proponho
sobre as relaccedilotildees de trabalho experiecircncias e interpretaccedilotildees dos trabalhadores nas
induacutestrias de confecccedilatildeo de moda bebecirc em Terra Roxa Para tanto pensaremos a histoacuteria
em um duplo sentido como experiecircncia humana e como a proacutepria narraccedilatildeo dessas
experiecircncias as interpretaccedilotildees e projeccedilotildees das quais o investigador vai utilizar6
A investigaccedilatildeo neste sentido estaacute relacionada com as problemaacuteticas que o
pesquisador se coloca no presente que envolvem sua experiecircncia de vida e as
concepccedilotildees da qual parte
Pretendo entender a partir das experiecircncias narradas por esses trabalhadores
como eles se inserem e interpretam este mercado de trabalho e fazem prospecccedilotildees
Segundo Thompson
Se determos a histoacuteria num determinado ponto natildeo haacute classe mas simplesmente uma multidatildeo de indiviacuteduos com amontoado de experiecircncias Mas se examinarmos esses homens durante um periacuteodo adequado de mudanccedilas sociais observaremos padrotildees em suas relaccedilotildees sua ideias e instituiccedilotildees A classe eacute definida pelos homens enquanto vivem sua proacutepria histoacuteria e ao final esta eacute sua definiccedilatildeo7
Neste sentido para entendermos os trabalhadores eacute necessaacuteria uma serie de
observaccedilotildees e anaacutelises que se expressam em suas praacuteticas cotidianas como eles
vivenciam e se portam perante sua dinacircmica de trabalho o que possibilita sua formaccedilatildeo
cultural e social
Para esse processo interpretativo utilizamos cinco entrevistas que realizei com
trabalhadores no intuito de potencializar as elaboraccedilotildees construiacutedas por esses sujeitos
sobre as motivaccedilotildees interesses e conflitos ou seja memoacuterias produzidas sobre
6 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987 7 THOMPSON E P ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12
12
trajetoacuterias e experiecircncia social compartilhada nas relaccedilotildees dentro e fora das induacutestrias
de vestuaacuterio na cidade
Como um dos meacutetodos de pesquisa foi trabalhar com fontes orais considero
importante apontar algumas dificuldades que encontrei ao realizar algumas entrevistas
Mesmo o municiacutepio empregando mais de 2500 trabalhadores na induacutestria de confecccedilatildeo
minha principal dificuldade foi encontrar trabalhadores que se dispusessem a realizar as
entrevistas
Aqueles que aceitavam soacute concordavam em produzir a entrevista quando
algueacutem muito proacuteximo deles me apresentava O fato de alguns trabalhadores aceitarem
natildeo excluiu a desconfianccedila e inseguranccedila que estes possuiacuteam em relaccedilatildeo agraves entrevistas
Desta forma a inseguranccedila dos trabalhadores sobre se poderiam falar ou natildeo a
respeito de suas relaccedilotildees de trabalho juntamente com a minha falta de experiecircncia em
saber lidar com essas inseguranccedilas prejudicaram o desenvolvimento das entrevistas
As respostas ficaram limitadas ao roteiro muitas vezes limitadas ao ldquosimrdquo ou ao ldquonatildeordquo
Pois aleacutem da timidez ao saberem que estatildeo sendo gravados ainda tive que lidar com o
receio dos entrevistados ao exporem sua trajetoacuteria e condiccedilotildees de vida
As entrevistas orais natildeo foram produto de teacutecnica mas das relaccedilotildees que
consegui desenvolver com esses trabalhadores Portanto o meacutetodo de utilizar fontes
orais consiste em trabalhar com a subjetividade dos indiviacuteduos lidando com as questotildees
postas pelos entrevistados a partir de minhas proacuteprias questotildees
Neste sentido o diaacutelogo com Alessandro Portelli e com outros autores ajudou a
compreender que essa relaccedilatildeo entre entrevistado e entrevistador natildeo eacute um objetivo
muito faacutecil de ser alcanccedilado pois as pessoas reinterpretam e datildeo novos significados aos
acontecimentos passados em funccedilatildeo do que vive no presente ou espera viver Ou ainda
encobrem sentimentos e interpretaccedilotildees por censura repressatildeo temores ou pela pouca
disposiccedilatildeo em falar8
Ao utilizar a fonte oral foi importante dialogar com a produccedilatildeo de Alessandro
Portelli o qual contribuiu para a construccedilatildeo de um procedimento de anaacutelise para a
produccedilatildeo das fontes orais e do olhar lanccedilado sobre esse material O uso de tal fonte na
pesquisa permitiu o enfrentamento da dinacircmica contraditoacuteria de valores e praacuteticas que
compotildeem escolhas pressotildees e expectativas desses sujeitos sociais
8 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 p33
13
Nesse sentido permite maior visibilidade poliacutetica da classe trabalhadora com
suas divisotildees e processos de identificaccedilatildeo na condiccedilatildeo de classe compartilhada
produzindo assim uma interpretaccedilatildeo histoacuterica comprometida com o potencial de luta e
intervenccedilatildeo social desses trabalhadores Essa investigaccedilatildeo tambeacutem traz como
enfrentamento lidar com os limites dessa fonte como as dificuldades de conseguir a
aceitaccedilatildeo da gravaccedilatildeo da entrevista e contatar trabalhadores9
O intuito de usarmos a fonte oral nesta pesquisa inspira-se nesta perspectiva de
Portelli Buscamos o trabalho com as entrevista natildeo como confirmaccedilatildeo de uma ldquoteserdquo
inicial mas sim com a intenccedilatildeo de dar visibilidade agraves interpretaccedilotildees construiacutedas pelos
trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa
Para tal associamos essa documentaccedilatildeo com mateacuterias jornaliacutesticas e fichas de
inscriccedilatildeo em cursos (de corte costura e bordado) na Escola do trabalho na cidade Aleacutem
da interpretaccedilatildeo de iacutendices estatiacutesticos sobre empregabilidade atividades econocircmicas
etc
O presente trabalho estaacute estruturado em dois capiacutetulos No primeiro capiacutetulo
busquei analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agrave
induacutestria de moda bebecirc a fim de compreender os motivos que levam esses sujeitos a
perceber a expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de
melhoria e mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas e na permanecircncia em Terra Roxa
No segundo capiacutetulo busco discutir a partir das experiecircncias cotidianas e das
relaccedilotildees de trabalho desses sujeitos as possibilidades e limites das expectativas que
estes trabalhadores estabelecem em relaccedilatildeo ao trabalho na induacutestria de moda bebecirc tal
qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre o
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa10
Essa intenccedilatildeo tenta se distanciar de determinados campos analiacuteticos que
sustentam essa expansatildeo industrial como sinocircnimo de desenvolvimento arraigados
na promoccedilatildeo de certos projetos empresariais e na historicidade progressista de alguns
processos de expansatildeo urbana Ao fazer esse distanciamento o interesse eacute ampliar o
9 PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 10 As induacutestrias de Terra Roxa estatildeo inseridas no Arranjo Produtivo Local (APL) criado em 2004 para oferecer subsiacutedios e aperfeiccediloamento aos empresaacuterios O APL da moda bebecirc visa entre outros aspectos maior eficiecircncia de inserccedilatildeo dos produtos da induacutestria de vestuaacuterio no mercado maior poder de negociaccedilatildeo de preccedilo da mateacuteria-prima atraccedilatildeo de novos prestadores de serviccedilos ao municiacutepio e otimizaccedilatildeo de custos com a qualificaccedilatildeo da matildeo de obra Esse assessoramento procura oferecer ao empresariado condiccedilotildees de mercado e apoio para fixaccedilatildeo em determinadas regiotildees
14
campo de anaacutelise apresentando contradiccedilotildees e tensotildees nesse percurso dirigindo atenccedilatildeo
aos trabalhadores mais do que agrave faacutebrica e ao sistema produtivo por ele mesmo11
Ao realizar esta pesquisa minha preocupaccedilatildeo se pauta em mostrar que estes
sujeitos satildeo seres conscientes de sua posiccedilatildeo enquanto sujeitos sociais e procuro
ressaltar que estes trabalhadores fazem parte deste processo histoacuterico enquanto
indiviacuteduos ativos mesmo que indiretamente intervenham nos rumos e ritmo dessa
expansatildeo industrial
Assim busquei com este trabalho explorar a partir das narrativas dos
trabalhadores e de suas experiecircncias entender natildeo somente estes sujeitos mas as
expectativas que estes constroem e as relaccedilotildees que estabelecem com o trabalho para a
promoccedilatildeo de seus interesses
11 O trabalho de Godoy procura fazer um percurso acadecircmico das nuances e alteraccedilotildees na abordagem do universo fabril Assim como Paoli Sader e Telles recolocam alguns enfrentamentos - na percepccedilatildeo de suas atuaccedilotildees e construccedilatildeo de sentidos - para aqueles que procuram perceber os trabalhadores neste cenaacuterio operaacuterio brasileiro Ver -GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 -PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198
15
CAPIacuteTULO 1
TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc
[] Com o tempo depois que essas empresas dede crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram mais faacuteceis neacute []12
Neste capiacutetulo vamos analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente
estatildeo ou que em algum momento de suas vidas estiveram vinculados agraves induacutestrias de
confecccedilatildeo de moda bebecirc do municiacutepio de Terra Roxa- PR mas que trazem em sua
trajetoacuteria uma relaccedilatildeo com o trabalho moradia e valores advindo do campo O objetivo
eacute problematizar suas avaliaccedilotildees frente agrave ldquoexpansatildeordquo industrial do municiacutepio e como essa
dialoga com seus interesses e necessidades
Ao analisarmos algumas entrevistas de trabalhadores vinculados a estas
induacutestrias foi comum encontrar assim como na narrativa citada na epiacutegrafe deste
capiacutetulo narrativas nesta perspectiva na qual os empregos gerados pela industrializaccedilatildeo
satildeo interpretados como possibilidade de melhoria na condiccedilatildeo de vida dos
trabalhadores Percebemos assim que o municiacutepio estaacute constantemente sendo indicado
como um grande polo de empregos mas essa indicaccedilatildeo natildeo resume as ponderaccedilotildees que
fazem sobre a presenccedila industrial em Terra Roxa - porque tambeacutem apontam elementos
que contradizem essa presenccedila
Buscaremos entatildeo dialogar com as fontes orais produzidas com trabalhadores
que se relacionaram com induacutestria de confecccedilatildeo procurando discutir tambeacutem alguns
trabalhos acadecircmicos que analisam praacuteticas dos trabalhadores em Terra Roxa A fim de
compreender a trajetoacuteria destes sujeitos e os motivos que os levam a perceber a
expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de melhoria e
mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas
Para compreendermos melhor estas interpretaccedilotildees fez-se necessaacuterio analisar o
percurso de relaccedilotildees e experiecircncias que construiacuteram Para isso foi importante
12 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
16
dimensionar a cidade na deacutecada de 1970 Momento em que se intensificou a mudanccedila
destes trabalhadores do campo para a cidade (ou ainda para outras regiotildees) ou seja este
foi um periacuteodo de mudanccedilas marcantes nas relaccedilotildees de trabalho onde morar e como
viver natildeo soacute no municiacutepio mas possiacutevel de identificar em outras cidades brasileiras
No trabalho de Ana Ameacutelia Camarano e Ricardo Abramovay haacute o interesse em
apresentar os movimentos migratoacuterios que respondem pelo processo de esvaziamento
da populaccedilatildeo rural no Brasil Os autores observam que ateacute 1980 houve um crescimento
absoluto do saldo populacional que deixou as aacutereas rurais brasileiras Aproximadamente
40 da populaccedilatildeo que vivia nas aacutereas rurais no comeccedilo dos anos 70 migraram nessa
deacutecada O fluxo que deixou o campo nos anos 80 tambeacutem foi expressivo 13 de todos
os que viviam no meio rural em 1980 saiacuteram durante esse periacuteodo o que representou
aproximadamente 13 milhotildees de pessoas13
Em termos nacionais a intensidade do movimento de desruralizaccedilatildeo segundo
os autores parece natildeo ter diminuiacutedo muito nos uacuteltimos 50 anos Entre 1950 e 1980 as
aacutereas rurais das regiotildees Sudeste e Sul forneceram um volume expressivo de novos
moradores para as aacutereas urbanas14 Para os autores como realizavam a pesquisa em fins
da deacutecada de 1990 suas impressotildees indicavam uma continuidade desse processo
Desde 1950 a cada 10 anos um em cada trecircs brasileiros vivendo no meio rural opta pela emigraccedilatildeo Os anos 90 natildeo arrefeceram em muito esta tendecircncia se as taxas de evasatildeo do meio rural observadas entre 1990 e 1995 persistirem pelo restante da deacutecada quase 30 dos brasileiros que entatildeo viviam no campo em 1990 teratildeo mudado seu local de residecircncia na virada do milecircnio15
Ainda que os autores analisem no campo da geografia demograacutefica apoiando-se
na noccedilatildeo de ecircxodo rural estes trazem ldquoo modo de vida no campordquo como incocircmodo para
a realizaccedilatildeo da pesquisa traduzido nas movimentaccedilotildees desses brasileiros entre o campo
e a cidade alteraccedilotildees natildeo soacute espaciais mas no modo como vivem e enfrentam
determinadas relaccedilotildees de poder
Estes se movimentam de acordo com as expectativas e interesses que produzem
como necessidades reorganizando as relaccedilotildees de trabalho e modos de vida diante de
pressotildees de reestruturaccedilatildeo da produccedilatildeo e da ocupaccedilatildeo das aacutereas rurais brasileiras da
13 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 14 IBIDEM 15 IBIDEM p 6
17
segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual
natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na
promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo
De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970
aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do
municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as
principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos
Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio
exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX
Graacutefico 1
Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)
Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e
principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a
distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando
Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de
1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea
urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave
expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de
vestuaacuterio moda bebecirc
16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013
18
Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no
municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo
urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e
insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo
na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e
incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola
em moldes capitalistas na cidade 17
A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas
unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha
o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade
em muitos casos diretamente com o consumidor
Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que
discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em
Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo
provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que
Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18
No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da
populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente
ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da
maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio
alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo
aponta um processo tranquilo
17
GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18
FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9
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As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos
oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute
mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise
- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o
cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que
A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19
A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o
trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe
quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar
com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de
banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe
pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo
Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um
grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir
ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados
da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia
por um nuacutemero reduzido de vagas
Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo
saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por
um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria
condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses
19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33
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trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de
induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade
Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu
entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria
seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas
vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece
Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20
A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves
induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos
perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas
de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para
Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida
Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como
citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este
processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de
Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande
decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio
Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do
IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que
formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho
atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores
mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que
permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram
como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras
atividades tambeacutem inconstantes
A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em
2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que
residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo
por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos
20
JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
21
sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)
estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos
produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no
transporte e venda de mercadorias21
O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os
trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira
produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no
contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria
e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas
Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua
forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de
escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma
grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de
mercadorias criminalizado como contrabando
O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online
Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o
narcotraacuteficordquo aponta que
Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122
A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida
com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que
almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores
apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os
21
CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013
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oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando
permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute
associada a comprar roupas e tecircnis de marca
O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a
intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda
de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre
alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para
frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc
No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses
trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego
Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso
Frederico afirma que
Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23
A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da
agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em
segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees
No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este
processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas
nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica
quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo
Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24
23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
23
Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo
para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O
trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do
patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo
lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos
trabalhadores pela induacutestria ele me diz que
Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25
Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural
da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas
relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar
com essa nova dinacircmica
Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo
visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas
vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se
aproxima da percepccedilatildeo de Carlos
Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26
Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para
ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes
se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio
trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as
ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que
pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha
25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11
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trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem
trabalho
Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe
complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho
pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida
que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram
Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no
campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e
trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte
das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave
trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a
perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura
Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27
Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de
alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute
registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses
trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas
A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade
de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As
oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um
maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa
condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos
desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor
a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado
O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos
Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo
Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa
27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10
25
Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28
Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas
anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do
empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da
cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram
nesse processo
O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho
financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para
empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a
demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de
trabalhadores agrave disposiccedilatildeo
Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no
municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do
empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor
produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que
A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29
Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos
gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por
ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e
possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio
A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees
municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno
28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM
26
desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos
proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e
do APL do vestuaacuterio na cidade 31
No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi
substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e
mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e
vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa
aacutereardquo
Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do
Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos
profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes
tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o
interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo
de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores
tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo
foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal
finalidade
De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho
rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da
folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo
A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como
Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes
Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o
municiacutepio de Terra Roxa
30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
27
Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34
O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de
trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda
continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila
tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de
garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno
dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o
campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre
os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal
As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma
alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida
ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores
possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -
com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou
outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por
perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista
dentre outros natildeo os oferece
Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes
trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de
classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de
melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no
ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a
trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em
outra cidade ela me disse que
Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35
34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
28
Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave
mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem
organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de
novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar
com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as
expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita
vantagem assimrdquo
Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para
Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se
demo na faacutebricardquo36
Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram
trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar
mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia
com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando
pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que
Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37
Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter
voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no
campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em
Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que
natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar
36 IDEM 37 IDEM
29
As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila
pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com
a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma
mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila
natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na
narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do
casal
Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas
construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril
Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho
na faacutebrica ela me disse que
Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38
Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que
gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as
dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores
preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica
ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na
avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em
conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho
O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como
Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos
indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em
casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria
Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista
Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim
38 IDEM
30
de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por
menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes
oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc
como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado
na Escola do Trabalho
Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o
tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram
mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias
permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas
relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais
Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns
trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de
compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas
tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa
39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
31
CAPIacuteTULO 2
TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40
Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa
natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O
municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande
polo de empregos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de
investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade
de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um
grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41
Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo
como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem
indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e
aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de
desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente
O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de
julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do
Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para
bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda
afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um
terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio
A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral
retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o
40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013
32
processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no
ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir
Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa
fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda
bebecirc pra terra roxa
Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43
A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande
destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da
cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra
Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o
municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo
queacuterdquo
No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves
transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que
este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo
sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em
resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores
Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa
industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo
enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa
Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20
principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a
43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
33
janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos
registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores
vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e
desligamento nesses setores
Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa
Meses Jan de 2003 a Jan de 2011
CBO ndash Frequumlecircncia
Admissotildees Desligamentos
Saldo
1ordm Emp
Reemp
Reint
C Prz Det
Transf
Total
Disp sem J Causa
Disp com J Causa
A Pedido
Term Contr
Aposent
Morte
Term C Prz Deter
Transf
Total
Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da
confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390
Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443
Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie
271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109
Costureira de peccedilas sob encomenda
171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em
geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio
varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina
60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio
em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina
bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas
34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27
Trabalhador agropecuaacuterio em geral
19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador
de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5
Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39
Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie
6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras
10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente
administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio
32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa
24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27
Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013
34
Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
35
Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
36
mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
37
curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
38
Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
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era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
6
AGRADECIMENTOS
Com especial carinho aos meus Pais Agnaldo e Marley trabalhadores que
apesar da difiacutecil situaccedilatildeo fizeram o possiacutevel e o impossiacutevel para que eu pudesse chegar
ateacute este momento Eacute imensuraacutevel a gratidatildeo e orgulho que nutro por vocecircs pois sei de
toda luta e determinaccedilatildeo para verem a filha formada Obrigada por todo o incentivo
ldquopuxotildees de orelhardquo apoio dedicaccedilatildeo e amor
Agradeccedilo aos amigos velhos e novos que iratildeo fazer parte das minhas melhores
lembranccedilas do ldquotempo de faculdaderdquo Em especial Simone Tineneu Dan Tonho Popi
Vassoura Elaine Julius Keka Emer Nayara Luana Paulo e Tati Alegraram as
minhas noites com momentos de descontraccedilatildeo no bar e rodas de violatildeo Por muitas
vezes foram estes momentos que recarregaram as baterias e deram forccedilas para
continuar
Aacute Vania Marilia e Marcos (Xequereu) companheiros do movimento estudantil
que me ensinaram muito durante toda essa caminhada foram nossas discussotildees que
potencializaram minhas inquietaccedilotildees e a vontade de lutar
Aacute Cintia amiga e companheira durante toda a graduaccedilatildeo por todas as risadas
todo apoio as conversas sobre tantas coisas as comilanccedilas as reclamaccedilotildees e claro por
todos os momentos de procrastinaccedilatildeo
Aacute minhas queridas amigas de infacircncia Aline Luciana Suzani Simone e Fran
que mesmo longe sempre estiveram presentes compartilhando anguacutestias e vitoacuterias
Aacute minha tia Elza que contribuiu de inuacutemeras formas para minha moradia em
Marechal Cacircndido Rondon
Aacute minha orientadora Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas por todo aprendizado
dedicaccedilatildeo e compreensatildeo
Aos trabalhadores que gentilmente me receberam em suas casas compartilhando
suas experiecircncias para a realizaccedilatildeo desse trabalho
Ao meu companheiro Marcos antes de qualquer coisa melhor amigo por toda
cobranccedila ajuda paciecircncia e amor
7
RESUMO
Este Trabalho de Conclusatildeo de Curso tem a intenccedilatildeo de problematizar analisar e investigar as relaccedilotildees de trabalho que marcam a trajetoacuteria de trabalhadores que compuseram praacuteticas no processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa-PR discutindo o modo como se relacionaram nem sempre amistosamente com as accedilotildees do poder puacuteblico municipal e com a participaccedilatildeo empresarial do ramo ldquomoda bebecircrdquo na cidade A pesquisa abordaraacute as trecircs uacuteltimas deacutecadas pelo fato de esse ser um momento histoacuterico importante pela intensificaccedilatildeo da exploraccedilatildeo industrial em Terra Roxa Essa temporalidade eacute significativa no processo de mudanccedila e produccedilatildeo de relaccedilotildees de trabalho na cidade envolvendo o setor de vestuaacuterio e a produccedilatildeo de alternativas por trabalhadores muitas vezes advindo do meio rural Propomos investigar as condiccedilotildees de vida dos trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam este mercado de trabalho bem como relacionar as memoacuterias e accedilotildees produzidas tanto para o trabalho como para a vida em Terra Roxa Para isso destacamos o trabalho com as fontes orais jornais fichas de cursos profissionalizantes e iacutendices estatiacutesticos como documentaccedilatildeo a ser privilegiada nessa pesquisa O interesse foi manter o diaacutelogo com as evidecircncias e quando necessaacuterio ampliar a anaacutelise de fontes ou mesmo revendo os caminhos da investigaccedilatildeo Esse encaminhamento considera que o conhecimento histoacuterico exige essa construccedilatildeo ao longo da pesquisa como tambeacutem o compromisso com as questotildees em foco
Palavras-chave Trabalhadores Relaccedilotildees de Trabalho Induacutestrias
8
Sumaacuterio INTRODUCcedilAtildeO 9
CAPIacuteTULO 1TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc 15
CAPIacuteTULO 2TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES 31
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 51
FONTES 53
REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS 55
9
INTRODUCcedilAtildeO
A escolha dos sujeitos e do tema deste estudo (os trabalhadores atualmente
vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa- PR) eacute resultado de minha
trajetoacuteria de vida trabalho e acadecircmica
Primeiro de vida e trabalho porque o trabalho na induacutestria de moda bebecirc jaacute fez
parte de minha atividade profissional por algum tempo Deste modo pude conviver com
outros trabalhadores observar e ouvir suas avaliaccedilotildees sobre suas condiccedilotildees de vida
motivaccedilotildees interesses e conflitos que perpassam esse ambiente de trabalho o que me
instigou a pesquisar o tema De forma que muitas das interpretaccedilotildees e avaliaccedilotildees que os
trabalhadores indicam em suas narrativas atraveacutes das entrevistas feitas jaacute ouvi dos
meus familiares como da minha proacutepria matildee Pois grande parte deles reside em Terra
Roxa e trabalha na induacutestria de moda bebecirc
Segundo como acadecircmica e pesquisadora porque este trabalho de conclusatildeo de
curso eacute continuidade de uma iniciaccedilatildeo cientifica voluntaacuteria (PIC-V) e as questotildees que
estatildeo aqui sendo levantadas eacute uma continuidade das indagaccedilotildees que surgiram a partir de
um diaacutelogo inicial com as fontes feitas nesta pesquisa anterior1
O objetivo central da pesquisa foi investigar as condiccedilotildees de vida de
trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de vestuaacuterio moda bebecirc no municiacutepio de
Terra Roxa-PR problematizando suas relaccedilotildees de trabalho e como se inserem e
interpretam este mercado de trabalho dando visibilidade a estes sujeitos e suas accedilotildees na
cidade
O municiacutepio possui atualmente entre macro e micro cerca de 113 empresas que
produzem em torno de 9 milhotildees de peccedilas envolvendo aproximadamente 2500
trabalhadores empregados diretamente o que segundo a noccedilatildeo do poder publico
municipal ldquodinamiza a geraccedilatildeo de emprego e renda do municiacutepiordquo2 Como podemos
1 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 2 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013
10
perceber em uma reportagem do jornal online Gazeta do Povo intitulada ldquoEm Terra
Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojasrdquo
A cadeia da confecccedilatildeo infantil mudou os rumos da cidade de 17 mil habitantes e a vida de muitos paranaenses Maria do Carmo 42 anos eacute um exemplo Ateacute os 38 anos ela trabalhava nos Campos Gerais onde plantava eucalipto Hoje o cenaacuterio eacute o mesmo um siacutetio mas agora ela natildeo lida diretamente com a terra Maria atua no setor de corte de roupas e tambeacutem dirige o ocircnibus que transporta funcionaacuterios da empresa Baby Doces Momentos confecccedilatildeo localizada em um siacutetio de cinco alqueires que produz cerca de 20 mil peccedilas ao mecircs ldquoAgora me sinto melhor Antes trabalhava no sol com uma bomba de 20 litros nas costas para pulverizar e plantarrdquo conta3
A partir do trecho acima percebemos que ao avaliar a dinacircmica industrial no
municiacutepio a reportagem aponta a relaccedilatildeo com a produccedilatildeo e experiecircncia dos trabalhos
no meio rural evidentemente para positivar a expansatildeo desse ramo de induacutestria de
vestuaacuterio como salvaccedilatildeo da cidade jaacute que estas empresas ldquodinamiza a geraccedilatildeo de
emprego e renda do municiacutepiordquo
Eacute importante entender a dimensatildeo dessa estrutura empresarial industrial em
Terra Roxa pois esta historicidade vai abrir caminhos a serem problematizados ao
longo deste trabalho
Para desenvolver esta pesquisa pautamo-nos na dinacircmica que integra a reflexatildeo
da problemaacutetica e o processo de levantamento e anaacutelise de fontes Esse
encaminhamento inspira-se na indicaccedilatildeo de Thompson sobre o diaacutelogo necessaacuterio e
constante entre teoria e evidecircncias histoacutericas4
Segundo Thompson
O interrogador eacute a loacutegica histoacuterica o conteuacutedo da interrogaccedilatildeo eacute uma hipoacutetese o interrogado eacute a evidecircncia com suas propriedades determinadas O objeto do conhecimento histoacuterico eacute a histoacuteria lsquorealrsquo cujas evidecircncias devem ser necessariamente incompletas e imperfeitas5
3 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no-paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 4 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma criacutetica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar Editores 1981 5 IBIDEM p 49
11
Isso quer dizer que os historiadores podem selecionar essa ou aquela evidecircncia
propor novas perguntas mas isso natildeo significa que os proacuteprios acontecimentos passados
se modifiquem nem tampouco que seja um agregado de histoacuterias separadas Embora
essa interpretaccedilatildeo do processo histoacuterico surja em resposta agrave pergunta formulada nossa
produccedilatildeo natildeo inventa o processo e natildeo pode modificar o ldquostatus ontoloacutegicordquo do
passado
Eacute nesta perspectiva de anaacutelise que conduziremos este pesquisa Cabe contudo
salientar a contribuiccedilatildeo que esta nos proporciona para a compreensatildeo que proponho
sobre as relaccedilotildees de trabalho experiecircncias e interpretaccedilotildees dos trabalhadores nas
induacutestrias de confecccedilatildeo de moda bebecirc em Terra Roxa Para tanto pensaremos a histoacuteria
em um duplo sentido como experiecircncia humana e como a proacutepria narraccedilatildeo dessas
experiecircncias as interpretaccedilotildees e projeccedilotildees das quais o investigador vai utilizar6
A investigaccedilatildeo neste sentido estaacute relacionada com as problemaacuteticas que o
pesquisador se coloca no presente que envolvem sua experiecircncia de vida e as
concepccedilotildees da qual parte
Pretendo entender a partir das experiecircncias narradas por esses trabalhadores
como eles se inserem e interpretam este mercado de trabalho e fazem prospecccedilotildees
Segundo Thompson
Se determos a histoacuteria num determinado ponto natildeo haacute classe mas simplesmente uma multidatildeo de indiviacuteduos com amontoado de experiecircncias Mas se examinarmos esses homens durante um periacuteodo adequado de mudanccedilas sociais observaremos padrotildees em suas relaccedilotildees sua ideias e instituiccedilotildees A classe eacute definida pelos homens enquanto vivem sua proacutepria histoacuteria e ao final esta eacute sua definiccedilatildeo7
Neste sentido para entendermos os trabalhadores eacute necessaacuteria uma serie de
observaccedilotildees e anaacutelises que se expressam em suas praacuteticas cotidianas como eles
vivenciam e se portam perante sua dinacircmica de trabalho o que possibilita sua formaccedilatildeo
cultural e social
Para esse processo interpretativo utilizamos cinco entrevistas que realizei com
trabalhadores no intuito de potencializar as elaboraccedilotildees construiacutedas por esses sujeitos
sobre as motivaccedilotildees interesses e conflitos ou seja memoacuterias produzidas sobre
6 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987 7 THOMPSON E P ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12
12
trajetoacuterias e experiecircncia social compartilhada nas relaccedilotildees dentro e fora das induacutestrias
de vestuaacuterio na cidade
Como um dos meacutetodos de pesquisa foi trabalhar com fontes orais considero
importante apontar algumas dificuldades que encontrei ao realizar algumas entrevistas
Mesmo o municiacutepio empregando mais de 2500 trabalhadores na induacutestria de confecccedilatildeo
minha principal dificuldade foi encontrar trabalhadores que se dispusessem a realizar as
entrevistas
Aqueles que aceitavam soacute concordavam em produzir a entrevista quando
algueacutem muito proacuteximo deles me apresentava O fato de alguns trabalhadores aceitarem
natildeo excluiu a desconfianccedila e inseguranccedila que estes possuiacuteam em relaccedilatildeo agraves entrevistas
Desta forma a inseguranccedila dos trabalhadores sobre se poderiam falar ou natildeo a
respeito de suas relaccedilotildees de trabalho juntamente com a minha falta de experiecircncia em
saber lidar com essas inseguranccedilas prejudicaram o desenvolvimento das entrevistas
As respostas ficaram limitadas ao roteiro muitas vezes limitadas ao ldquosimrdquo ou ao ldquonatildeordquo
Pois aleacutem da timidez ao saberem que estatildeo sendo gravados ainda tive que lidar com o
receio dos entrevistados ao exporem sua trajetoacuteria e condiccedilotildees de vida
As entrevistas orais natildeo foram produto de teacutecnica mas das relaccedilotildees que
consegui desenvolver com esses trabalhadores Portanto o meacutetodo de utilizar fontes
orais consiste em trabalhar com a subjetividade dos indiviacuteduos lidando com as questotildees
postas pelos entrevistados a partir de minhas proacuteprias questotildees
Neste sentido o diaacutelogo com Alessandro Portelli e com outros autores ajudou a
compreender que essa relaccedilatildeo entre entrevistado e entrevistador natildeo eacute um objetivo
muito faacutecil de ser alcanccedilado pois as pessoas reinterpretam e datildeo novos significados aos
acontecimentos passados em funccedilatildeo do que vive no presente ou espera viver Ou ainda
encobrem sentimentos e interpretaccedilotildees por censura repressatildeo temores ou pela pouca
disposiccedilatildeo em falar8
Ao utilizar a fonte oral foi importante dialogar com a produccedilatildeo de Alessandro
Portelli o qual contribuiu para a construccedilatildeo de um procedimento de anaacutelise para a
produccedilatildeo das fontes orais e do olhar lanccedilado sobre esse material O uso de tal fonte na
pesquisa permitiu o enfrentamento da dinacircmica contraditoacuteria de valores e praacuteticas que
compotildeem escolhas pressotildees e expectativas desses sujeitos sociais
8 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 p33
13
Nesse sentido permite maior visibilidade poliacutetica da classe trabalhadora com
suas divisotildees e processos de identificaccedilatildeo na condiccedilatildeo de classe compartilhada
produzindo assim uma interpretaccedilatildeo histoacuterica comprometida com o potencial de luta e
intervenccedilatildeo social desses trabalhadores Essa investigaccedilatildeo tambeacutem traz como
enfrentamento lidar com os limites dessa fonte como as dificuldades de conseguir a
aceitaccedilatildeo da gravaccedilatildeo da entrevista e contatar trabalhadores9
O intuito de usarmos a fonte oral nesta pesquisa inspira-se nesta perspectiva de
Portelli Buscamos o trabalho com as entrevista natildeo como confirmaccedilatildeo de uma ldquoteserdquo
inicial mas sim com a intenccedilatildeo de dar visibilidade agraves interpretaccedilotildees construiacutedas pelos
trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa
Para tal associamos essa documentaccedilatildeo com mateacuterias jornaliacutesticas e fichas de
inscriccedilatildeo em cursos (de corte costura e bordado) na Escola do trabalho na cidade Aleacutem
da interpretaccedilatildeo de iacutendices estatiacutesticos sobre empregabilidade atividades econocircmicas
etc
O presente trabalho estaacute estruturado em dois capiacutetulos No primeiro capiacutetulo
busquei analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agrave
induacutestria de moda bebecirc a fim de compreender os motivos que levam esses sujeitos a
perceber a expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de
melhoria e mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas e na permanecircncia em Terra Roxa
No segundo capiacutetulo busco discutir a partir das experiecircncias cotidianas e das
relaccedilotildees de trabalho desses sujeitos as possibilidades e limites das expectativas que
estes trabalhadores estabelecem em relaccedilatildeo ao trabalho na induacutestria de moda bebecirc tal
qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre o
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa10
Essa intenccedilatildeo tenta se distanciar de determinados campos analiacuteticos que
sustentam essa expansatildeo industrial como sinocircnimo de desenvolvimento arraigados
na promoccedilatildeo de certos projetos empresariais e na historicidade progressista de alguns
processos de expansatildeo urbana Ao fazer esse distanciamento o interesse eacute ampliar o
9 PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 10 As induacutestrias de Terra Roxa estatildeo inseridas no Arranjo Produtivo Local (APL) criado em 2004 para oferecer subsiacutedios e aperfeiccediloamento aos empresaacuterios O APL da moda bebecirc visa entre outros aspectos maior eficiecircncia de inserccedilatildeo dos produtos da induacutestria de vestuaacuterio no mercado maior poder de negociaccedilatildeo de preccedilo da mateacuteria-prima atraccedilatildeo de novos prestadores de serviccedilos ao municiacutepio e otimizaccedilatildeo de custos com a qualificaccedilatildeo da matildeo de obra Esse assessoramento procura oferecer ao empresariado condiccedilotildees de mercado e apoio para fixaccedilatildeo em determinadas regiotildees
14
campo de anaacutelise apresentando contradiccedilotildees e tensotildees nesse percurso dirigindo atenccedilatildeo
aos trabalhadores mais do que agrave faacutebrica e ao sistema produtivo por ele mesmo11
Ao realizar esta pesquisa minha preocupaccedilatildeo se pauta em mostrar que estes
sujeitos satildeo seres conscientes de sua posiccedilatildeo enquanto sujeitos sociais e procuro
ressaltar que estes trabalhadores fazem parte deste processo histoacuterico enquanto
indiviacuteduos ativos mesmo que indiretamente intervenham nos rumos e ritmo dessa
expansatildeo industrial
Assim busquei com este trabalho explorar a partir das narrativas dos
trabalhadores e de suas experiecircncias entender natildeo somente estes sujeitos mas as
expectativas que estes constroem e as relaccedilotildees que estabelecem com o trabalho para a
promoccedilatildeo de seus interesses
11 O trabalho de Godoy procura fazer um percurso acadecircmico das nuances e alteraccedilotildees na abordagem do universo fabril Assim como Paoli Sader e Telles recolocam alguns enfrentamentos - na percepccedilatildeo de suas atuaccedilotildees e construccedilatildeo de sentidos - para aqueles que procuram perceber os trabalhadores neste cenaacuterio operaacuterio brasileiro Ver -GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 -PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198
15
CAPIacuteTULO 1
TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc
[] Com o tempo depois que essas empresas dede crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram mais faacuteceis neacute []12
Neste capiacutetulo vamos analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente
estatildeo ou que em algum momento de suas vidas estiveram vinculados agraves induacutestrias de
confecccedilatildeo de moda bebecirc do municiacutepio de Terra Roxa- PR mas que trazem em sua
trajetoacuteria uma relaccedilatildeo com o trabalho moradia e valores advindo do campo O objetivo
eacute problematizar suas avaliaccedilotildees frente agrave ldquoexpansatildeordquo industrial do municiacutepio e como essa
dialoga com seus interesses e necessidades
Ao analisarmos algumas entrevistas de trabalhadores vinculados a estas
induacutestrias foi comum encontrar assim como na narrativa citada na epiacutegrafe deste
capiacutetulo narrativas nesta perspectiva na qual os empregos gerados pela industrializaccedilatildeo
satildeo interpretados como possibilidade de melhoria na condiccedilatildeo de vida dos
trabalhadores Percebemos assim que o municiacutepio estaacute constantemente sendo indicado
como um grande polo de empregos mas essa indicaccedilatildeo natildeo resume as ponderaccedilotildees que
fazem sobre a presenccedila industrial em Terra Roxa - porque tambeacutem apontam elementos
que contradizem essa presenccedila
Buscaremos entatildeo dialogar com as fontes orais produzidas com trabalhadores
que se relacionaram com induacutestria de confecccedilatildeo procurando discutir tambeacutem alguns
trabalhos acadecircmicos que analisam praacuteticas dos trabalhadores em Terra Roxa A fim de
compreender a trajetoacuteria destes sujeitos e os motivos que os levam a perceber a
expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de melhoria e
mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas
Para compreendermos melhor estas interpretaccedilotildees fez-se necessaacuterio analisar o
percurso de relaccedilotildees e experiecircncias que construiacuteram Para isso foi importante
12 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
16
dimensionar a cidade na deacutecada de 1970 Momento em que se intensificou a mudanccedila
destes trabalhadores do campo para a cidade (ou ainda para outras regiotildees) ou seja este
foi um periacuteodo de mudanccedilas marcantes nas relaccedilotildees de trabalho onde morar e como
viver natildeo soacute no municiacutepio mas possiacutevel de identificar em outras cidades brasileiras
No trabalho de Ana Ameacutelia Camarano e Ricardo Abramovay haacute o interesse em
apresentar os movimentos migratoacuterios que respondem pelo processo de esvaziamento
da populaccedilatildeo rural no Brasil Os autores observam que ateacute 1980 houve um crescimento
absoluto do saldo populacional que deixou as aacutereas rurais brasileiras Aproximadamente
40 da populaccedilatildeo que vivia nas aacutereas rurais no comeccedilo dos anos 70 migraram nessa
deacutecada O fluxo que deixou o campo nos anos 80 tambeacutem foi expressivo 13 de todos
os que viviam no meio rural em 1980 saiacuteram durante esse periacuteodo o que representou
aproximadamente 13 milhotildees de pessoas13
Em termos nacionais a intensidade do movimento de desruralizaccedilatildeo segundo
os autores parece natildeo ter diminuiacutedo muito nos uacuteltimos 50 anos Entre 1950 e 1980 as
aacutereas rurais das regiotildees Sudeste e Sul forneceram um volume expressivo de novos
moradores para as aacutereas urbanas14 Para os autores como realizavam a pesquisa em fins
da deacutecada de 1990 suas impressotildees indicavam uma continuidade desse processo
Desde 1950 a cada 10 anos um em cada trecircs brasileiros vivendo no meio rural opta pela emigraccedilatildeo Os anos 90 natildeo arrefeceram em muito esta tendecircncia se as taxas de evasatildeo do meio rural observadas entre 1990 e 1995 persistirem pelo restante da deacutecada quase 30 dos brasileiros que entatildeo viviam no campo em 1990 teratildeo mudado seu local de residecircncia na virada do milecircnio15
Ainda que os autores analisem no campo da geografia demograacutefica apoiando-se
na noccedilatildeo de ecircxodo rural estes trazem ldquoo modo de vida no campordquo como incocircmodo para
a realizaccedilatildeo da pesquisa traduzido nas movimentaccedilotildees desses brasileiros entre o campo
e a cidade alteraccedilotildees natildeo soacute espaciais mas no modo como vivem e enfrentam
determinadas relaccedilotildees de poder
Estes se movimentam de acordo com as expectativas e interesses que produzem
como necessidades reorganizando as relaccedilotildees de trabalho e modos de vida diante de
pressotildees de reestruturaccedilatildeo da produccedilatildeo e da ocupaccedilatildeo das aacutereas rurais brasileiras da
13 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 14 IBIDEM 15 IBIDEM p 6
17
segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual
natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na
promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo
De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970
aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do
municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as
principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos
Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio
exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX
Graacutefico 1
Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)
Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e
principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a
distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando
Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de
1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea
urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave
expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de
vestuaacuterio moda bebecirc
16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013
18
Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no
municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo
urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e
insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo
na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e
incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola
em moldes capitalistas na cidade 17
A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas
unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha
o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade
em muitos casos diretamente com o consumidor
Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que
discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em
Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo
provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que
Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18
No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da
populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente
ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da
maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio
alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo
aponta um processo tranquilo
17
GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18
FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9
19
As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos
oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute
mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise
- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o
cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que
A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19
A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o
trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe
quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar
com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de
banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe
pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo
Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um
grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir
ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados
da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia
por um nuacutemero reduzido de vagas
Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo
saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por
um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria
condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses
19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33
20
trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de
induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade
Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu
entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria
seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas
vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece
Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20
A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves
induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos
perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas
de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para
Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida
Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como
citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este
processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de
Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande
decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio
Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do
IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que
formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho
atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores
mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que
permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram
como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras
atividades tambeacutem inconstantes
A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em
2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que
residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo
por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos
20
JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
21
sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)
estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos
produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no
transporte e venda de mercadorias21
O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os
trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira
produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no
contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria
e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas
Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua
forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de
escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma
grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de
mercadorias criminalizado como contrabando
O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online
Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o
narcotraacuteficordquo aponta que
Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122
A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida
com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que
almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores
apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os
21
CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013
22
oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando
permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute
associada a comprar roupas e tecircnis de marca
O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a
intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda
de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre
alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para
frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc
No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses
trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego
Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso
Frederico afirma que
Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23
A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da
agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em
segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees
No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este
processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas
nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica
quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo
Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24
23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
23
Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo
para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O
trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do
patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo
lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos
trabalhadores pela induacutestria ele me diz que
Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25
Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural
da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas
relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar
com essa nova dinacircmica
Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo
visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas
vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se
aproxima da percepccedilatildeo de Carlos
Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26
Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para
ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes
se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio
trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as
ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que
pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha
25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11
24
trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem
trabalho
Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe
complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho
pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida
que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram
Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no
campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e
trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte
das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave
trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a
perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura
Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27
Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de
alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute
registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses
trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas
A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade
de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As
oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um
maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa
condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos
desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor
a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado
O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos
Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo
Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa
27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10
25
Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28
Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas
anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do
empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da
cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram
nesse processo
O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho
financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para
empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a
demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de
trabalhadores agrave disposiccedilatildeo
Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no
municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do
empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor
produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que
A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29
Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos
gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por
ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e
possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio
A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees
municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno
28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM
26
desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos
proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e
do APL do vestuaacuterio na cidade 31
No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi
substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e
mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e
vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa
aacutereardquo
Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do
Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos
profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes
tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o
interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo
de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores
tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo
foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal
finalidade
De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho
rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da
folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo
A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como
Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes
Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o
municiacutepio de Terra Roxa
30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
27
Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34
O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de
trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda
continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila
tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de
garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno
dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o
campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre
os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal
As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma
alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida
ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores
possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -
com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou
outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por
perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista
dentre outros natildeo os oferece
Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes
trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de
classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de
melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no
ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a
trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em
outra cidade ela me disse que
Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35
34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
28
Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave
mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem
organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de
novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar
com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as
expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita
vantagem assimrdquo
Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para
Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se
demo na faacutebricardquo36
Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram
trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar
mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia
com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando
pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que
Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37
Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter
voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no
campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em
Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que
natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar
36 IDEM 37 IDEM
29
As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila
pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com
a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma
mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila
natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na
narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do
casal
Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas
construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril
Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho
na faacutebrica ela me disse que
Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38
Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que
gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as
dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores
preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica
ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na
avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em
conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho
O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como
Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos
indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em
casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria
Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista
Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim
38 IDEM
30
de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por
menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes
oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc
como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado
na Escola do Trabalho
Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o
tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram
mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias
permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas
relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais
Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns
trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de
compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas
tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa
39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
31
CAPIacuteTULO 2
TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40
Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa
natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O
municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande
polo de empregos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de
investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade
de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um
grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41
Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo
como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem
indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e
aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de
desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente
O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de
julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do
Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para
bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda
afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um
terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio
A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral
retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o
40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013
32
processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no
ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir
Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa
fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda
bebecirc pra terra roxa
Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43
A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande
destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da
cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra
Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o
municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo
queacuterdquo
No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves
transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que
este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo
sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em
resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores
Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa
industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo
enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa
Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20
principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a
43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
33
janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos
registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores
vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e
desligamento nesses setores
Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa
Meses Jan de 2003 a Jan de 2011
CBO ndash Frequumlecircncia
Admissotildees Desligamentos
Saldo
1ordm Emp
Reemp
Reint
C Prz Det
Transf
Total
Disp sem J Causa
Disp com J Causa
A Pedido
Term Contr
Aposent
Morte
Term C Prz Deter
Transf
Total
Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da
confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390
Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443
Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie
271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109
Costureira de peccedilas sob encomenda
171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em
geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio
varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina
60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio
em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina
bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas
34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27
Trabalhador agropecuaacuterio em geral
19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador
de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5
Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39
Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie
6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras
10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente
administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio
32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa
24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27
Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013
34
Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
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Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
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mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
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curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
46
Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
47
Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
48
era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
7
RESUMO
Este Trabalho de Conclusatildeo de Curso tem a intenccedilatildeo de problematizar analisar e investigar as relaccedilotildees de trabalho que marcam a trajetoacuteria de trabalhadores que compuseram praacuteticas no processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa-PR discutindo o modo como se relacionaram nem sempre amistosamente com as accedilotildees do poder puacuteblico municipal e com a participaccedilatildeo empresarial do ramo ldquomoda bebecircrdquo na cidade A pesquisa abordaraacute as trecircs uacuteltimas deacutecadas pelo fato de esse ser um momento histoacuterico importante pela intensificaccedilatildeo da exploraccedilatildeo industrial em Terra Roxa Essa temporalidade eacute significativa no processo de mudanccedila e produccedilatildeo de relaccedilotildees de trabalho na cidade envolvendo o setor de vestuaacuterio e a produccedilatildeo de alternativas por trabalhadores muitas vezes advindo do meio rural Propomos investigar as condiccedilotildees de vida dos trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam este mercado de trabalho bem como relacionar as memoacuterias e accedilotildees produzidas tanto para o trabalho como para a vida em Terra Roxa Para isso destacamos o trabalho com as fontes orais jornais fichas de cursos profissionalizantes e iacutendices estatiacutesticos como documentaccedilatildeo a ser privilegiada nessa pesquisa O interesse foi manter o diaacutelogo com as evidecircncias e quando necessaacuterio ampliar a anaacutelise de fontes ou mesmo revendo os caminhos da investigaccedilatildeo Esse encaminhamento considera que o conhecimento histoacuterico exige essa construccedilatildeo ao longo da pesquisa como tambeacutem o compromisso com as questotildees em foco
Palavras-chave Trabalhadores Relaccedilotildees de Trabalho Induacutestrias
8
Sumaacuterio INTRODUCcedilAtildeO 9
CAPIacuteTULO 1TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc 15
CAPIacuteTULO 2TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES 31
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 51
FONTES 53
REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS 55
9
INTRODUCcedilAtildeO
A escolha dos sujeitos e do tema deste estudo (os trabalhadores atualmente
vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa- PR) eacute resultado de minha
trajetoacuteria de vida trabalho e acadecircmica
Primeiro de vida e trabalho porque o trabalho na induacutestria de moda bebecirc jaacute fez
parte de minha atividade profissional por algum tempo Deste modo pude conviver com
outros trabalhadores observar e ouvir suas avaliaccedilotildees sobre suas condiccedilotildees de vida
motivaccedilotildees interesses e conflitos que perpassam esse ambiente de trabalho o que me
instigou a pesquisar o tema De forma que muitas das interpretaccedilotildees e avaliaccedilotildees que os
trabalhadores indicam em suas narrativas atraveacutes das entrevistas feitas jaacute ouvi dos
meus familiares como da minha proacutepria matildee Pois grande parte deles reside em Terra
Roxa e trabalha na induacutestria de moda bebecirc
Segundo como acadecircmica e pesquisadora porque este trabalho de conclusatildeo de
curso eacute continuidade de uma iniciaccedilatildeo cientifica voluntaacuteria (PIC-V) e as questotildees que
estatildeo aqui sendo levantadas eacute uma continuidade das indagaccedilotildees que surgiram a partir de
um diaacutelogo inicial com as fontes feitas nesta pesquisa anterior1
O objetivo central da pesquisa foi investigar as condiccedilotildees de vida de
trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de vestuaacuterio moda bebecirc no municiacutepio de
Terra Roxa-PR problematizando suas relaccedilotildees de trabalho e como se inserem e
interpretam este mercado de trabalho dando visibilidade a estes sujeitos e suas accedilotildees na
cidade
O municiacutepio possui atualmente entre macro e micro cerca de 113 empresas que
produzem em torno de 9 milhotildees de peccedilas envolvendo aproximadamente 2500
trabalhadores empregados diretamente o que segundo a noccedilatildeo do poder publico
municipal ldquodinamiza a geraccedilatildeo de emprego e renda do municiacutepiordquo2 Como podemos
1 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 2 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013
10
perceber em uma reportagem do jornal online Gazeta do Povo intitulada ldquoEm Terra
Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojasrdquo
A cadeia da confecccedilatildeo infantil mudou os rumos da cidade de 17 mil habitantes e a vida de muitos paranaenses Maria do Carmo 42 anos eacute um exemplo Ateacute os 38 anos ela trabalhava nos Campos Gerais onde plantava eucalipto Hoje o cenaacuterio eacute o mesmo um siacutetio mas agora ela natildeo lida diretamente com a terra Maria atua no setor de corte de roupas e tambeacutem dirige o ocircnibus que transporta funcionaacuterios da empresa Baby Doces Momentos confecccedilatildeo localizada em um siacutetio de cinco alqueires que produz cerca de 20 mil peccedilas ao mecircs ldquoAgora me sinto melhor Antes trabalhava no sol com uma bomba de 20 litros nas costas para pulverizar e plantarrdquo conta3
A partir do trecho acima percebemos que ao avaliar a dinacircmica industrial no
municiacutepio a reportagem aponta a relaccedilatildeo com a produccedilatildeo e experiecircncia dos trabalhos
no meio rural evidentemente para positivar a expansatildeo desse ramo de induacutestria de
vestuaacuterio como salvaccedilatildeo da cidade jaacute que estas empresas ldquodinamiza a geraccedilatildeo de
emprego e renda do municiacutepiordquo
Eacute importante entender a dimensatildeo dessa estrutura empresarial industrial em
Terra Roxa pois esta historicidade vai abrir caminhos a serem problematizados ao
longo deste trabalho
Para desenvolver esta pesquisa pautamo-nos na dinacircmica que integra a reflexatildeo
da problemaacutetica e o processo de levantamento e anaacutelise de fontes Esse
encaminhamento inspira-se na indicaccedilatildeo de Thompson sobre o diaacutelogo necessaacuterio e
constante entre teoria e evidecircncias histoacutericas4
Segundo Thompson
O interrogador eacute a loacutegica histoacuterica o conteuacutedo da interrogaccedilatildeo eacute uma hipoacutetese o interrogado eacute a evidecircncia com suas propriedades determinadas O objeto do conhecimento histoacuterico eacute a histoacuteria lsquorealrsquo cujas evidecircncias devem ser necessariamente incompletas e imperfeitas5
3 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no-paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 4 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma criacutetica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar Editores 1981 5 IBIDEM p 49
11
Isso quer dizer que os historiadores podem selecionar essa ou aquela evidecircncia
propor novas perguntas mas isso natildeo significa que os proacuteprios acontecimentos passados
se modifiquem nem tampouco que seja um agregado de histoacuterias separadas Embora
essa interpretaccedilatildeo do processo histoacuterico surja em resposta agrave pergunta formulada nossa
produccedilatildeo natildeo inventa o processo e natildeo pode modificar o ldquostatus ontoloacutegicordquo do
passado
Eacute nesta perspectiva de anaacutelise que conduziremos este pesquisa Cabe contudo
salientar a contribuiccedilatildeo que esta nos proporciona para a compreensatildeo que proponho
sobre as relaccedilotildees de trabalho experiecircncias e interpretaccedilotildees dos trabalhadores nas
induacutestrias de confecccedilatildeo de moda bebecirc em Terra Roxa Para tanto pensaremos a histoacuteria
em um duplo sentido como experiecircncia humana e como a proacutepria narraccedilatildeo dessas
experiecircncias as interpretaccedilotildees e projeccedilotildees das quais o investigador vai utilizar6
A investigaccedilatildeo neste sentido estaacute relacionada com as problemaacuteticas que o
pesquisador se coloca no presente que envolvem sua experiecircncia de vida e as
concepccedilotildees da qual parte
Pretendo entender a partir das experiecircncias narradas por esses trabalhadores
como eles se inserem e interpretam este mercado de trabalho e fazem prospecccedilotildees
Segundo Thompson
Se determos a histoacuteria num determinado ponto natildeo haacute classe mas simplesmente uma multidatildeo de indiviacuteduos com amontoado de experiecircncias Mas se examinarmos esses homens durante um periacuteodo adequado de mudanccedilas sociais observaremos padrotildees em suas relaccedilotildees sua ideias e instituiccedilotildees A classe eacute definida pelos homens enquanto vivem sua proacutepria histoacuteria e ao final esta eacute sua definiccedilatildeo7
Neste sentido para entendermos os trabalhadores eacute necessaacuteria uma serie de
observaccedilotildees e anaacutelises que se expressam em suas praacuteticas cotidianas como eles
vivenciam e se portam perante sua dinacircmica de trabalho o que possibilita sua formaccedilatildeo
cultural e social
Para esse processo interpretativo utilizamos cinco entrevistas que realizei com
trabalhadores no intuito de potencializar as elaboraccedilotildees construiacutedas por esses sujeitos
sobre as motivaccedilotildees interesses e conflitos ou seja memoacuterias produzidas sobre
6 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987 7 THOMPSON E P ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12
12
trajetoacuterias e experiecircncia social compartilhada nas relaccedilotildees dentro e fora das induacutestrias
de vestuaacuterio na cidade
Como um dos meacutetodos de pesquisa foi trabalhar com fontes orais considero
importante apontar algumas dificuldades que encontrei ao realizar algumas entrevistas
Mesmo o municiacutepio empregando mais de 2500 trabalhadores na induacutestria de confecccedilatildeo
minha principal dificuldade foi encontrar trabalhadores que se dispusessem a realizar as
entrevistas
Aqueles que aceitavam soacute concordavam em produzir a entrevista quando
algueacutem muito proacuteximo deles me apresentava O fato de alguns trabalhadores aceitarem
natildeo excluiu a desconfianccedila e inseguranccedila que estes possuiacuteam em relaccedilatildeo agraves entrevistas
Desta forma a inseguranccedila dos trabalhadores sobre se poderiam falar ou natildeo a
respeito de suas relaccedilotildees de trabalho juntamente com a minha falta de experiecircncia em
saber lidar com essas inseguranccedilas prejudicaram o desenvolvimento das entrevistas
As respostas ficaram limitadas ao roteiro muitas vezes limitadas ao ldquosimrdquo ou ao ldquonatildeordquo
Pois aleacutem da timidez ao saberem que estatildeo sendo gravados ainda tive que lidar com o
receio dos entrevistados ao exporem sua trajetoacuteria e condiccedilotildees de vida
As entrevistas orais natildeo foram produto de teacutecnica mas das relaccedilotildees que
consegui desenvolver com esses trabalhadores Portanto o meacutetodo de utilizar fontes
orais consiste em trabalhar com a subjetividade dos indiviacuteduos lidando com as questotildees
postas pelos entrevistados a partir de minhas proacuteprias questotildees
Neste sentido o diaacutelogo com Alessandro Portelli e com outros autores ajudou a
compreender que essa relaccedilatildeo entre entrevistado e entrevistador natildeo eacute um objetivo
muito faacutecil de ser alcanccedilado pois as pessoas reinterpretam e datildeo novos significados aos
acontecimentos passados em funccedilatildeo do que vive no presente ou espera viver Ou ainda
encobrem sentimentos e interpretaccedilotildees por censura repressatildeo temores ou pela pouca
disposiccedilatildeo em falar8
Ao utilizar a fonte oral foi importante dialogar com a produccedilatildeo de Alessandro
Portelli o qual contribuiu para a construccedilatildeo de um procedimento de anaacutelise para a
produccedilatildeo das fontes orais e do olhar lanccedilado sobre esse material O uso de tal fonte na
pesquisa permitiu o enfrentamento da dinacircmica contraditoacuteria de valores e praacuteticas que
compotildeem escolhas pressotildees e expectativas desses sujeitos sociais
8 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 p33
13
Nesse sentido permite maior visibilidade poliacutetica da classe trabalhadora com
suas divisotildees e processos de identificaccedilatildeo na condiccedilatildeo de classe compartilhada
produzindo assim uma interpretaccedilatildeo histoacuterica comprometida com o potencial de luta e
intervenccedilatildeo social desses trabalhadores Essa investigaccedilatildeo tambeacutem traz como
enfrentamento lidar com os limites dessa fonte como as dificuldades de conseguir a
aceitaccedilatildeo da gravaccedilatildeo da entrevista e contatar trabalhadores9
O intuito de usarmos a fonte oral nesta pesquisa inspira-se nesta perspectiva de
Portelli Buscamos o trabalho com as entrevista natildeo como confirmaccedilatildeo de uma ldquoteserdquo
inicial mas sim com a intenccedilatildeo de dar visibilidade agraves interpretaccedilotildees construiacutedas pelos
trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa
Para tal associamos essa documentaccedilatildeo com mateacuterias jornaliacutesticas e fichas de
inscriccedilatildeo em cursos (de corte costura e bordado) na Escola do trabalho na cidade Aleacutem
da interpretaccedilatildeo de iacutendices estatiacutesticos sobre empregabilidade atividades econocircmicas
etc
O presente trabalho estaacute estruturado em dois capiacutetulos No primeiro capiacutetulo
busquei analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agrave
induacutestria de moda bebecirc a fim de compreender os motivos que levam esses sujeitos a
perceber a expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de
melhoria e mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas e na permanecircncia em Terra Roxa
No segundo capiacutetulo busco discutir a partir das experiecircncias cotidianas e das
relaccedilotildees de trabalho desses sujeitos as possibilidades e limites das expectativas que
estes trabalhadores estabelecem em relaccedilatildeo ao trabalho na induacutestria de moda bebecirc tal
qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre o
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa10
Essa intenccedilatildeo tenta se distanciar de determinados campos analiacuteticos que
sustentam essa expansatildeo industrial como sinocircnimo de desenvolvimento arraigados
na promoccedilatildeo de certos projetos empresariais e na historicidade progressista de alguns
processos de expansatildeo urbana Ao fazer esse distanciamento o interesse eacute ampliar o
9 PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 10 As induacutestrias de Terra Roxa estatildeo inseridas no Arranjo Produtivo Local (APL) criado em 2004 para oferecer subsiacutedios e aperfeiccediloamento aos empresaacuterios O APL da moda bebecirc visa entre outros aspectos maior eficiecircncia de inserccedilatildeo dos produtos da induacutestria de vestuaacuterio no mercado maior poder de negociaccedilatildeo de preccedilo da mateacuteria-prima atraccedilatildeo de novos prestadores de serviccedilos ao municiacutepio e otimizaccedilatildeo de custos com a qualificaccedilatildeo da matildeo de obra Esse assessoramento procura oferecer ao empresariado condiccedilotildees de mercado e apoio para fixaccedilatildeo em determinadas regiotildees
14
campo de anaacutelise apresentando contradiccedilotildees e tensotildees nesse percurso dirigindo atenccedilatildeo
aos trabalhadores mais do que agrave faacutebrica e ao sistema produtivo por ele mesmo11
Ao realizar esta pesquisa minha preocupaccedilatildeo se pauta em mostrar que estes
sujeitos satildeo seres conscientes de sua posiccedilatildeo enquanto sujeitos sociais e procuro
ressaltar que estes trabalhadores fazem parte deste processo histoacuterico enquanto
indiviacuteduos ativos mesmo que indiretamente intervenham nos rumos e ritmo dessa
expansatildeo industrial
Assim busquei com este trabalho explorar a partir das narrativas dos
trabalhadores e de suas experiecircncias entender natildeo somente estes sujeitos mas as
expectativas que estes constroem e as relaccedilotildees que estabelecem com o trabalho para a
promoccedilatildeo de seus interesses
11 O trabalho de Godoy procura fazer um percurso acadecircmico das nuances e alteraccedilotildees na abordagem do universo fabril Assim como Paoli Sader e Telles recolocam alguns enfrentamentos - na percepccedilatildeo de suas atuaccedilotildees e construccedilatildeo de sentidos - para aqueles que procuram perceber os trabalhadores neste cenaacuterio operaacuterio brasileiro Ver -GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 -PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198
15
CAPIacuteTULO 1
TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc
[] Com o tempo depois que essas empresas dede crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram mais faacuteceis neacute []12
Neste capiacutetulo vamos analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente
estatildeo ou que em algum momento de suas vidas estiveram vinculados agraves induacutestrias de
confecccedilatildeo de moda bebecirc do municiacutepio de Terra Roxa- PR mas que trazem em sua
trajetoacuteria uma relaccedilatildeo com o trabalho moradia e valores advindo do campo O objetivo
eacute problematizar suas avaliaccedilotildees frente agrave ldquoexpansatildeordquo industrial do municiacutepio e como essa
dialoga com seus interesses e necessidades
Ao analisarmos algumas entrevistas de trabalhadores vinculados a estas
induacutestrias foi comum encontrar assim como na narrativa citada na epiacutegrafe deste
capiacutetulo narrativas nesta perspectiva na qual os empregos gerados pela industrializaccedilatildeo
satildeo interpretados como possibilidade de melhoria na condiccedilatildeo de vida dos
trabalhadores Percebemos assim que o municiacutepio estaacute constantemente sendo indicado
como um grande polo de empregos mas essa indicaccedilatildeo natildeo resume as ponderaccedilotildees que
fazem sobre a presenccedila industrial em Terra Roxa - porque tambeacutem apontam elementos
que contradizem essa presenccedila
Buscaremos entatildeo dialogar com as fontes orais produzidas com trabalhadores
que se relacionaram com induacutestria de confecccedilatildeo procurando discutir tambeacutem alguns
trabalhos acadecircmicos que analisam praacuteticas dos trabalhadores em Terra Roxa A fim de
compreender a trajetoacuteria destes sujeitos e os motivos que os levam a perceber a
expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de melhoria e
mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas
Para compreendermos melhor estas interpretaccedilotildees fez-se necessaacuterio analisar o
percurso de relaccedilotildees e experiecircncias que construiacuteram Para isso foi importante
12 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
16
dimensionar a cidade na deacutecada de 1970 Momento em que se intensificou a mudanccedila
destes trabalhadores do campo para a cidade (ou ainda para outras regiotildees) ou seja este
foi um periacuteodo de mudanccedilas marcantes nas relaccedilotildees de trabalho onde morar e como
viver natildeo soacute no municiacutepio mas possiacutevel de identificar em outras cidades brasileiras
No trabalho de Ana Ameacutelia Camarano e Ricardo Abramovay haacute o interesse em
apresentar os movimentos migratoacuterios que respondem pelo processo de esvaziamento
da populaccedilatildeo rural no Brasil Os autores observam que ateacute 1980 houve um crescimento
absoluto do saldo populacional que deixou as aacutereas rurais brasileiras Aproximadamente
40 da populaccedilatildeo que vivia nas aacutereas rurais no comeccedilo dos anos 70 migraram nessa
deacutecada O fluxo que deixou o campo nos anos 80 tambeacutem foi expressivo 13 de todos
os que viviam no meio rural em 1980 saiacuteram durante esse periacuteodo o que representou
aproximadamente 13 milhotildees de pessoas13
Em termos nacionais a intensidade do movimento de desruralizaccedilatildeo segundo
os autores parece natildeo ter diminuiacutedo muito nos uacuteltimos 50 anos Entre 1950 e 1980 as
aacutereas rurais das regiotildees Sudeste e Sul forneceram um volume expressivo de novos
moradores para as aacutereas urbanas14 Para os autores como realizavam a pesquisa em fins
da deacutecada de 1990 suas impressotildees indicavam uma continuidade desse processo
Desde 1950 a cada 10 anos um em cada trecircs brasileiros vivendo no meio rural opta pela emigraccedilatildeo Os anos 90 natildeo arrefeceram em muito esta tendecircncia se as taxas de evasatildeo do meio rural observadas entre 1990 e 1995 persistirem pelo restante da deacutecada quase 30 dos brasileiros que entatildeo viviam no campo em 1990 teratildeo mudado seu local de residecircncia na virada do milecircnio15
Ainda que os autores analisem no campo da geografia demograacutefica apoiando-se
na noccedilatildeo de ecircxodo rural estes trazem ldquoo modo de vida no campordquo como incocircmodo para
a realizaccedilatildeo da pesquisa traduzido nas movimentaccedilotildees desses brasileiros entre o campo
e a cidade alteraccedilotildees natildeo soacute espaciais mas no modo como vivem e enfrentam
determinadas relaccedilotildees de poder
Estes se movimentam de acordo com as expectativas e interesses que produzem
como necessidades reorganizando as relaccedilotildees de trabalho e modos de vida diante de
pressotildees de reestruturaccedilatildeo da produccedilatildeo e da ocupaccedilatildeo das aacutereas rurais brasileiras da
13 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 14 IBIDEM 15 IBIDEM p 6
17
segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual
natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na
promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo
De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970
aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do
municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as
principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos
Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio
exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX
Graacutefico 1
Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)
Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e
principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a
distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando
Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de
1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea
urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave
expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de
vestuaacuterio moda bebecirc
16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013
18
Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no
municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo
urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e
insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo
na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e
incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola
em moldes capitalistas na cidade 17
A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas
unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha
o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade
em muitos casos diretamente com o consumidor
Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que
discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em
Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo
provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que
Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18
No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da
populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente
ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da
maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio
alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo
aponta um processo tranquilo
17
GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18
FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9
19
As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos
oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute
mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise
- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o
cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que
A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19
A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o
trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe
quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar
com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de
banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe
pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo
Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um
grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir
ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados
da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia
por um nuacutemero reduzido de vagas
Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo
saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por
um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria
condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses
19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33
20
trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de
induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade
Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu
entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria
seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas
vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece
Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20
A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves
induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos
perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas
de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para
Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida
Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como
citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este
processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de
Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande
decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio
Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do
IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que
formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho
atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores
mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que
permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram
como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras
atividades tambeacutem inconstantes
A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em
2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que
residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo
por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos
20
JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
21
sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)
estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos
produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no
transporte e venda de mercadorias21
O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os
trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira
produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no
contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria
e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas
Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua
forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de
escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma
grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de
mercadorias criminalizado como contrabando
O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online
Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o
narcotraacuteficordquo aponta que
Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122
A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida
com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que
almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores
apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os
21
CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013
22
oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando
permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute
associada a comprar roupas e tecircnis de marca
O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a
intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda
de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre
alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para
frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc
No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses
trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego
Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso
Frederico afirma que
Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23
A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da
agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em
segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees
No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este
processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas
nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica
quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo
Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24
23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
23
Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo
para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O
trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do
patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo
lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos
trabalhadores pela induacutestria ele me diz que
Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25
Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural
da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas
relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar
com essa nova dinacircmica
Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo
visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas
vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se
aproxima da percepccedilatildeo de Carlos
Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26
Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para
ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes
se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio
trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as
ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que
pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha
25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11
24
trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem
trabalho
Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe
complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho
pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida
que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram
Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no
campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e
trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte
das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave
trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a
perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura
Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27
Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de
alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute
registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses
trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas
A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade
de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As
oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um
maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa
condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos
desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor
a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado
O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos
Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo
Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa
27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10
25
Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28
Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas
anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do
empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da
cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram
nesse processo
O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho
financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para
empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a
demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de
trabalhadores agrave disposiccedilatildeo
Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no
municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do
empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor
produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que
A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29
Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos
gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por
ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e
possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio
A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees
municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno
28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM
26
desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos
proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e
do APL do vestuaacuterio na cidade 31
No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi
substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e
mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e
vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa
aacutereardquo
Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do
Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos
profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes
tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o
interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo
de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores
tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo
foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal
finalidade
De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho
rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da
folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo
A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como
Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes
Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o
municiacutepio de Terra Roxa
30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
27
Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34
O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de
trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda
continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila
tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de
garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno
dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o
campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre
os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal
As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma
alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida
ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores
possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -
com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou
outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por
perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista
dentre outros natildeo os oferece
Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes
trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de
classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de
melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no
ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a
trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em
outra cidade ela me disse que
Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35
34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
28
Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave
mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem
organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de
novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar
com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as
expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita
vantagem assimrdquo
Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para
Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se
demo na faacutebricardquo36
Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram
trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar
mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia
com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando
pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que
Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37
Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter
voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no
campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em
Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que
natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar
36 IDEM 37 IDEM
29
As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila
pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com
a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma
mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila
natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na
narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do
casal
Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas
construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril
Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho
na faacutebrica ela me disse que
Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38
Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que
gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as
dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores
preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica
ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na
avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em
conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho
O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como
Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos
indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em
casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria
Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista
Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim
38 IDEM
30
de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por
menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes
oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc
como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado
na Escola do Trabalho
Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o
tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram
mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias
permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas
relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais
Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns
trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de
compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas
tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa
39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
31
CAPIacuteTULO 2
TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40
Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa
natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O
municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande
polo de empregos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de
investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade
de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um
grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41
Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo
como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem
indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e
aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de
desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente
O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de
julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do
Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para
bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda
afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um
terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio
A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral
retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o
40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013
32
processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no
ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir
Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa
fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda
bebecirc pra terra roxa
Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43
A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande
destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da
cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra
Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o
municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo
queacuterdquo
No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves
transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que
este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo
sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em
resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores
Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa
industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo
enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa
Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20
principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a
43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
33
janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos
registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores
vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e
desligamento nesses setores
Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa
Meses Jan de 2003 a Jan de 2011
CBO ndash Frequumlecircncia
Admissotildees Desligamentos
Saldo
1ordm Emp
Reemp
Reint
C Prz Det
Transf
Total
Disp sem J Causa
Disp com J Causa
A Pedido
Term Contr
Aposent
Morte
Term C Prz Deter
Transf
Total
Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da
confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390
Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443
Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie
271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109
Costureira de peccedilas sob encomenda
171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em
geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio
varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina
60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio
em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina
bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas
34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27
Trabalhador agropecuaacuterio em geral
19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador
de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5
Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39
Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie
6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras
10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente
administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio
32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa
24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27
Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013
34
Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
35
Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
36
mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
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curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
40
faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
41
que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
43
Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
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era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
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A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
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No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
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FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
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Sumaacuterio INTRODUCcedilAtildeO 9
CAPIacuteTULO 1TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc 15
CAPIacuteTULO 2TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES 31
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 51
FONTES 53
REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS 55
9
INTRODUCcedilAtildeO
A escolha dos sujeitos e do tema deste estudo (os trabalhadores atualmente
vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa- PR) eacute resultado de minha
trajetoacuteria de vida trabalho e acadecircmica
Primeiro de vida e trabalho porque o trabalho na induacutestria de moda bebecirc jaacute fez
parte de minha atividade profissional por algum tempo Deste modo pude conviver com
outros trabalhadores observar e ouvir suas avaliaccedilotildees sobre suas condiccedilotildees de vida
motivaccedilotildees interesses e conflitos que perpassam esse ambiente de trabalho o que me
instigou a pesquisar o tema De forma que muitas das interpretaccedilotildees e avaliaccedilotildees que os
trabalhadores indicam em suas narrativas atraveacutes das entrevistas feitas jaacute ouvi dos
meus familiares como da minha proacutepria matildee Pois grande parte deles reside em Terra
Roxa e trabalha na induacutestria de moda bebecirc
Segundo como acadecircmica e pesquisadora porque este trabalho de conclusatildeo de
curso eacute continuidade de uma iniciaccedilatildeo cientifica voluntaacuteria (PIC-V) e as questotildees que
estatildeo aqui sendo levantadas eacute uma continuidade das indagaccedilotildees que surgiram a partir de
um diaacutelogo inicial com as fontes feitas nesta pesquisa anterior1
O objetivo central da pesquisa foi investigar as condiccedilotildees de vida de
trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de vestuaacuterio moda bebecirc no municiacutepio de
Terra Roxa-PR problematizando suas relaccedilotildees de trabalho e como se inserem e
interpretam este mercado de trabalho dando visibilidade a estes sujeitos e suas accedilotildees na
cidade
O municiacutepio possui atualmente entre macro e micro cerca de 113 empresas que
produzem em torno de 9 milhotildees de peccedilas envolvendo aproximadamente 2500
trabalhadores empregados diretamente o que segundo a noccedilatildeo do poder publico
municipal ldquodinamiza a geraccedilatildeo de emprego e renda do municiacutepiordquo2 Como podemos
1 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 2 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013
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perceber em uma reportagem do jornal online Gazeta do Povo intitulada ldquoEm Terra
Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojasrdquo
A cadeia da confecccedilatildeo infantil mudou os rumos da cidade de 17 mil habitantes e a vida de muitos paranaenses Maria do Carmo 42 anos eacute um exemplo Ateacute os 38 anos ela trabalhava nos Campos Gerais onde plantava eucalipto Hoje o cenaacuterio eacute o mesmo um siacutetio mas agora ela natildeo lida diretamente com a terra Maria atua no setor de corte de roupas e tambeacutem dirige o ocircnibus que transporta funcionaacuterios da empresa Baby Doces Momentos confecccedilatildeo localizada em um siacutetio de cinco alqueires que produz cerca de 20 mil peccedilas ao mecircs ldquoAgora me sinto melhor Antes trabalhava no sol com uma bomba de 20 litros nas costas para pulverizar e plantarrdquo conta3
A partir do trecho acima percebemos que ao avaliar a dinacircmica industrial no
municiacutepio a reportagem aponta a relaccedilatildeo com a produccedilatildeo e experiecircncia dos trabalhos
no meio rural evidentemente para positivar a expansatildeo desse ramo de induacutestria de
vestuaacuterio como salvaccedilatildeo da cidade jaacute que estas empresas ldquodinamiza a geraccedilatildeo de
emprego e renda do municiacutepiordquo
Eacute importante entender a dimensatildeo dessa estrutura empresarial industrial em
Terra Roxa pois esta historicidade vai abrir caminhos a serem problematizados ao
longo deste trabalho
Para desenvolver esta pesquisa pautamo-nos na dinacircmica que integra a reflexatildeo
da problemaacutetica e o processo de levantamento e anaacutelise de fontes Esse
encaminhamento inspira-se na indicaccedilatildeo de Thompson sobre o diaacutelogo necessaacuterio e
constante entre teoria e evidecircncias histoacutericas4
Segundo Thompson
O interrogador eacute a loacutegica histoacuterica o conteuacutedo da interrogaccedilatildeo eacute uma hipoacutetese o interrogado eacute a evidecircncia com suas propriedades determinadas O objeto do conhecimento histoacuterico eacute a histoacuteria lsquorealrsquo cujas evidecircncias devem ser necessariamente incompletas e imperfeitas5
3 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no-paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 4 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma criacutetica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar Editores 1981 5 IBIDEM p 49
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Isso quer dizer que os historiadores podem selecionar essa ou aquela evidecircncia
propor novas perguntas mas isso natildeo significa que os proacuteprios acontecimentos passados
se modifiquem nem tampouco que seja um agregado de histoacuterias separadas Embora
essa interpretaccedilatildeo do processo histoacuterico surja em resposta agrave pergunta formulada nossa
produccedilatildeo natildeo inventa o processo e natildeo pode modificar o ldquostatus ontoloacutegicordquo do
passado
Eacute nesta perspectiva de anaacutelise que conduziremos este pesquisa Cabe contudo
salientar a contribuiccedilatildeo que esta nos proporciona para a compreensatildeo que proponho
sobre as relaccedilotildees de trabalho experiecircncias e interpretaccedilotildees dos trabalhadores nas
induacutestrias de confecccedilatildeo de moda bebecirc em Terra Roxa Para tanto pensaremos a histoacuteria
em um duplo sentido como experiecircncia humana e como a proacutepria narraccedilatildeo dessas
experiecircncias as interpretaccedilotildees e projeccedilotildees das quais o investigador vai utilizar6
A investigaccedilatildeo neste sentido estaacute relacionada com as problemaacuteticas que o
pesquisador se coloca no presente que envolvem sua experiecircncia de vida e as
concepccedilotildees da qual parte
Pretendo entender a partir das experiecircncias narradas por esses trabalhadores
como eles se inserem e interpretam este mercado de trabalho e fazem prospecccedilotildees
Segundo Thompson
Se determos a histoacuteria num determinado ponto natildeo haacute classe mas simplesmente uma multidatildeo de indiviacuteduos com amontoado de experiecircncias Mas se examinarmos esses homens durante um periacuteodo adequado de mudanccedilas sociais observaremos padrotildees em suas relaccedilotildees sua ideias e instituiccedilotildees A classe eacute definida pelos homens enquanto vivem sua proacutepria histoacuteria e ao final esta eacute sua definiccedilatildeo7
Neste sentido para entendermos os trabalhadores eacute necessaacuteria uma serie de
observaccedilotildees e anaacutelises que se expressam em suas praacuteticas cotidianas como eles
vivenciam e se portam perante sua dinacircmica de trabalho o que possibilita sua formaccedilatildeo
cultural e social
Para esse processo interpretativo utilizamos cinco entrevistas que realizei com
trabalhadores no intuito de potencializar as elaboraccedilotildees construiacutedas por esses sujeitos
sobre as motivaccedilotildees interesses e conflitos ou seja memoacuterias produzidas sobre
6 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987 7 THOMPSON E P ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12
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trajetoacuterias e experiecircncia social compartilhada nas relaccedilotildees dentro e fora das induacutestrias
de vestuaacuterio na cidade
Como um dos meacutetodos de pesquisa foi trabalhar com fontes orais considero
importante apontar algumas dificuldades que encontrei ao realizar algumas entrevistas
Mesmo o municiacutepio empregando mais de 2500 trabalhadores na induacutestria de confecccedilatildeo
minha principal dificuldade foi encontrar trabalhadores que se dispusessem a realizar as
entrevistas
Aqueles que aceitavam soacute concordavam em produzir a entrevista quando
algueacutem muito proacuteximo deles me apresentava O fato de alguns trabalhadores aceitarem
natildeo excluiu a desconfianccedila e inseguranccedila que estes possuiacuteam em relaccedilatildeo agraves entrevistas
Desta forma a inseguranccedila dos trabalhadores sobre se poderiam falar ou natildeo a
respeito de suas relaccedilotildees de trabalho juntamente com a minha falta de experiecircncia em
saber lidar com essas inseguranccedilas prejudicaram o desenvolvimento das entrevistas
As respostas ficaram limitadas ao roteiro muitas vezes limitadas ao ldquosimrdquo ou ao ldquonatildeordquo
Pois aleacutem da timidez ao saberem que estatildeo sendo gravados ainda tive que lidar com o
receio dos entrevistados ao exporem sua trajetoacuteria e condiccedilotildees de vida
As entrevistas orais natildeo foram produto de teacutecnica mas das relaccedilotildees que
consegui desenvolver com esses trabalhadores Portanto o meacutetodo de utilizar fontes
orais consiste em trabalhar com a subjetividade dos indiviacuteduos lidando com as questotildees
postas pelos entrevistados a partir de minhas proacuteprias questotildees
Neste sentido o diaacutelogo com Alessandro Portelli e com outros autores ajudou a
compreender que essa relaccedilatildeo entre entrevistado e entrevistador natildeo eacute um objetivo
muito faacutecil de ser alcanccedilado pois as pessoas reinterpretam e datildeo novos significados aos
acontecimentos passados em funccedilatildeo do que vive no presente ou espera viver Ou ainda
encobrem sentimentos e interpretaccedilotildees por censura repressatildeo temores ou pela pouca
disposiccedilatildeo em falar8
Ao utilizar a fonte oral foi importante dialogar com a produccedilatildeo de Alessandro
Portelli o qual contribuiu para a construccedilatildeo de um procedimento de anaacutelise para a
produccedilatildeo das fontes orais e do olhar lanccedilado sobre esse material O uso de tal fonte na
pesquisa permitiu o enfrentamento da dinacircmica contraditoacuteria de valores e praacuteticas que
compotildeem escolhas pressotildees e expectativas desses sujeitos sociais
8 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 p33
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Nesse sentido permite maior visibilidade poliacutetica da classe trabalhadora com
suas divisotildees e processos de identificaccedilatildeo na condiccedilatildeo de classe compartilhada
produzindo assim uma interpretaccedilatildeo histoacuterica comprometida com o potencial de luta e
intervenccedilatildeo social desses trabalhadores Essa investigaccedilatildeo tambeacutem traz como
enfrentamento lidar com os limites dessa fonte como as dificuldades de conseguir a
aceitaccedilatildeo da gravaccedilatildeo da entrevista e contatar trabalhadores9
O intuito de usarmos a fonte oral nesta pesquisa inspira-se nesta perspectiva de
Portelli Buscamos o trabalho com as entrevista natildeo como confirmaccedilatildeo de uma ldquoteserdquo
inicial mas sim com a intenccedilatildeo de dar visibilidade agraves interpretaccedilotildees construiacutedas pelos
trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa
Para tal associamos essa documentaccedilatildeo com mateacuterias jornaliacutesticas e fichas de
inscriccedilatildeo em cursos (de corte costura e bordado) na Escola do trabalho na cidade Aleacutem
da interpretaccedilatildeo de iacutendices estatiacutesticos sobre empregabilidade atividades econocircmicas
etc
O presente trabalho estaacute estruturado em dois capiacutetulos No primeiro capiacutetulo
busquei analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agrave
induacutestria de moda bebecirc a fim de compreender os motivos que levam esses sujeitos a
perceber a expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de
melhoria e mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas e na permanecircncia em Terra Roxa
No segundo capiacutetulo busco discutir a partir das experiecircncias cotidianas e das
relaccedilotildees de trabalho desses sujeitos as possibilidades e limites das expectativas que
estes trabalhadores estabelecem em relaccedilatildeo ao trabalho na induacutestria de moda bebecirc tal
qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre o
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa10
Essa intenccedilatildeo tenta se distanciar de determinados campos analiacuteticos que
sustentam essa expansatildeo industrial como sinocircnimo de desenvolvimento arraigados
na promoccedilatildeo de certos projetos empresariais e na historicidade progressista de alguns
processos de expansatildeo urbana Ao fazer esse distanciamento o interesse eacute ampliar o
9 PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 10 As induacutestrias de Terra Roxa estatildeo inseridas no Arranjo Produtivo Local (APL) criado em 2004 para oferecer subsiacutedios e aperfeiccediloamento aos empresaacuterios O APL da moda bebecirc visa entre outros aspectos maior eficiecircncia de inserccedilatildeo dos produtos da induacutestria de vestuaacuterio no mercado maior poder de negociaccedilatildeo de preccedilo da mateacuteria-prima atraccedilatildeo de novos prestadores de serviccedilos ao municiacutepio e otimizaccedilatildeo de custos com a qualificaccedilatildeo da matildeo de obra Esse assessoramento procura oferecer ao empresariado condiccedilotildees de mercado e apoio para fixaccedilatildeo em determinadas regiotildees
14
campo de anaacutelise apresentando contradiccedilotildees e tensotildees nesse percurso dirigindo atenccedilatildeo
aos trabalhadores mais do que agrave faacutebrica e ao sistema produtivo por ele mesmo11
Ao realizar esta pesquisa minha preocupaccedilatildeo se pauta em mostrar que estes
sujeitos satildeo seres conscientes de sua posiccedilatildeo enquanto sujeitos sociais e procuro
ressaltar que estes trabalhadores fazem parte deste processo histoacuterico enquanto
indiviacuteduos ativos mesmo que indiretamente intervenham nos rumos e ritmo dessa
expansatildeo industrial
Assim busquei com este trabalho explorar a partir das narrativas dos
trabalhadores e de suas experiecircncias entender natildeo somente estes sujeitos mas as
expectativas que estes constroem e as relaccedilotildees que estabelecem com o trabalho para a
promoccedilatildeo de seus interesses
11 O trabalho de Godoy procura fazer um percurso acadecircmico das nuances e alteraccedilotildees na abordagem do universo fabril Assim como Paoli Sader e Telles recolocam alguns enfrentamentos - na percepccedilatildeo de suas atuaccedilotildees e construccedilatildeo de sentidos - para aqueles que procuram perceber os trabalhadores neste cenaacuterio operaacuterio brasileiro Ver -GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 -PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198
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CAPIacuteTULO 1
TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc
[] Com o tempo depois que essas empresas dede crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram mais faacuteceis neacute []12
Neste capiacutetulo vamos analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente
estatildeo ou que em algum momento de suas vidas estiveram vinculados agraves induacutestrias de
confecccedilatildeo de moda bebecirc do municiacutepio de Terra Roxa- PR mas que trazem em sua
trajetoacuteria uma relaccedilatildeo com o trabalho moradia e valores advindo do campo O objetivo
eacute problematizar suas avaliaccedilotildees frente agrave ldquoexpansatildeordquo industrial do municiacutepio e como essa
dialoga com seus interesses e necessidades
Ao analisarmos algumas entrevistas de trabalhadores vinculados a estas
induacutestrias foi comum encontrar assim como na narrativa citada na epiacutegrafe deste
capiacutetulo narrativas nesta perspectiva na qual os empregos gerados pela industrializaccedilatildeo
satildeo interpretados como possibilidade de melhoria na condiccedilatildeo de vida dos
trabalhadores Percebemos assim que o municiacutepio estaacute constantemente sendo indicado
como um grande polo de empregos mas essa indicaccedilatildeo natildeo resume as ponderaccedilotildees que
fazem sobre a presenccedila industrial em Terra Roxa - porque tambeacutem apontam elementos
que contradizem essa presenccedila
Buscaremos entatildeo dialogar com as fontes orais produzidas com trabalhadores
que se relacionaram com induacutestria de confecccedilatildeo procurando discutir tambeacutem alguns
trabalhos acadecircmicos que analisam praacuteticas dos trabalhadores em Terra Roxa A fim de
compreender a trajetoacuteria destes sujeitos e os motivos que os levam a perceber a
expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de melhoria e
mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas
Para compreendermos melhor estas interpretaccedilotildees fez-se necessaacuterio analisar o
percurso de relaccedilotildees e experiecircncias que construiacuteram Para isso foi importante
12 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
16
dimensionar a cidade na deacutecada de 1970 Momento em que se intensificou a mudanccedila
destes trabalhadores do campo para a cidade (ou ainda para outras regiotildees) ou seja este
foi um periacuteodo de mudanccedilas marcantes nas relaccedilotildees de trabalho onde morar e como
viver natildeo soacute no municiacutepio mas possiacutevel de identificar em outras cidades brasileiras
No trabalho de Ana Ameacutelia Camarano e Ricardo Abramovay haacute o interesse em
apresentar os movimentos migratoacuterios que respondem pelo processo de esvaziamento
da populaccedilatildeo rural no Brasil Os autores observam que ateacute 1980 houve um crescimento
absoluto do saldo populacional que deixou as aacutereas rurais brasileiras Aproximadamente
40 da populaccedilatildeo que vivia nas aacutereas rurais no comeccedilo dos anos 70 migraram nessa
deacutecada O fluxo que deixou o campo nos anos 80 tambeacutem foi expressivo 13 de todos
os que viviam no meio rural em 1980 saiacuteram durante esse periacuteodo o que representou
aproximadamente 13 milhotildees de pessoas13
Em termos nacionais a intensidade do movimento de desruralizaccedilatildeo segundo
os autores parece natildeo ter diminuiacutedo muito nos uacuteltimos 50 anos Entre 1950 e 1980 as
aacutereas rurais das regiotildees Sudeste e Sul forneceram um volume expressivo de novos
moradores para as aacutereas urbanas14 Para os autores como realizavam a pesquisa em fins
da deacutecada de 1990 suas impressotildees indicavam uma continuidade desse processo
Desde 1950 a cada 10 anos um em cada trecircs brasileiros vivendo no meio rural opta pela emigraccedilatildeo Os anos 90 natildeo arrefeceram em muito esta tendecircncia se as taxas de evasatildeo do meio rural observadas entre 1990 e 1995 persistirem pelo restante da deacutecada quase 30 dos brasileiros que entatildeo viviam no campo em 1990 teratildeo mudado seu local de residecircncia na virada do milecircnio15
Ainda que os autores analisem no campo da geografia demograacutefica apoiando-se
na noccedilatildeo de ecircxodo rural estes trazem ldquoo modo de vida no campordquo como incocircmodo para
a realizaccedilatildeo da pesquisa traduzido nas movimentaccedilotildees desses brasileiros entre o campo
e a cidade alteraccedilotildees natildeo soacute espaciais mas no modo como vivem e enfrentam
determinadas relaccedilotildees de poder
Estes se movimentam de acordo com as expectativas e interesses que produzem
como necessidades reorganizando as relaccedilotildees de trabalho e modos de vida diante de
pressotildees de reestruturaccedilatildeo da produccedilatildeo e da ocupaccedilatildeo das aacutereas rurais brasileiras da
13 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 14 IBIDEM 15 IBIDEM p 6
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segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual
natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na
promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo
De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970
aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do
municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as
principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos
Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio
exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX
Graacutefico 1
Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)
Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e
principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a
distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando
Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de
1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea
urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave
expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de
vestuaacuterio moda bebecirc
16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013
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Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no
municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo
urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e
insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo
na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e
incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola
em moldes capitalistas na cidade 17
A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas
unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha
o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade
em muitos casos diretamente com o consumidor
Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que
discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em
Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo
provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que
Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18
No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da
populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente
ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da
maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio
alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo
aponta um processo tranquilo
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GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18
FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9
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As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos
oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute
mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise
- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o
cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que
A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19
A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o
trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe
quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar
com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de
banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe
pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo
Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um
grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir
ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados
da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia
por um nuacutemero reduzido de vagas
Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo
saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por
um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria
condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses
19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33
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trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de
induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade
Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu
entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria
seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas
vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece
Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20
A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves
induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos
perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas
de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para
Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida
Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como
citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este
processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de
Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande
decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio
Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do
IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que
formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho
atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores
mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que
permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram
como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras
atividades tambeacutem inconstantes
A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em
2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que
residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo
por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos
20
JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)
estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos
produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no
transporte e venda de mercadorias21
O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os
trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira
produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no
contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria
e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas
Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua
forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de
escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma
grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de
mercadorias criminalizado como contrabando
O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online
Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o
narcotraacuteficordquo aponta que
Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122
A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida
com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que
almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores
apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os
21
CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013
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oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando
permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute
associada a comprar roupas e tecircnis de marca
O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a
intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda
de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre
alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para
frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc
No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses
trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego
Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso
Frederico afirma que
Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23
A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da
agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em
segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees
No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este
processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas
nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica
quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo
Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24
23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo
para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O
trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do
patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo
lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos
trabalhadores pela induacutestria ele me diz que
Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25
Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural
da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas
relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar
com essa nova dinacircmica
Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo
visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas
vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se
aproxima da percepccedilatildeo de Carlos
Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26
Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para
ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes
se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio
trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as
ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que
pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha
25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11
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trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem
trabalho
Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe
complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho
pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida
que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram
Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no
campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e
trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte
das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave
trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a
perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura
Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27
Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de
alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute
registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses
trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas
A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade
de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As
oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um
maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa
condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos
desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor
a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado
O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos
Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo
Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa
27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10
25
Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28
Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas
anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do
empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da
cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram
nesse processo
O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho
financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para
empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a
demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de
trabalhadores agrave disposiccedilatildeo
Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no
municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do
empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor
produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que
A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29
Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos
gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por
ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e
possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio
A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees
municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno
28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM
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desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos
proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e
do APL do vestuaacuterio na cidade 31
No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi
substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e
mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e
vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa
aacutereardquo
Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do
Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos
profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes
tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o
interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo
de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores
tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo
foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal
finalidade
De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho
rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da
folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo
A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como
Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes
Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o
municiacutepio de Terra Roxa
30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
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Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34
O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de
trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda
continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila
tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de
garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno
dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o
campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre
os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal
As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma
alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida
ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores
possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -
com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou
outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por
perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista
dentre outros natildeo os oferece
Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes
trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de
classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de
melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no
ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a
trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em
outra cidade ela me disse que
Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35
34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave
mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem
organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de
novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar
com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as
expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita
vantagem assimrdquo
Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para
Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se
demo na faacutebricardquo36
Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram
trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar
mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia
com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando
pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que
Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37
Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter
voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no
campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em
Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que
natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar
36 IDEM 37 IDEM
29
As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila
pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com
a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma
mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila
natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na
narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do
casal
Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas
construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril
Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho
na faacutebrica ela me disse que
Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38
Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que
gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as
dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores
preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica
ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na
avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em
conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho
O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como
Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos
indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em
casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria
Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista
Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim
38 IDEM
30
de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por
menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes
oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc
como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado
na Escola do Trabalho
Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o
tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram
mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias
permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas
relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais
Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns
trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de
compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas
tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa
39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
31
CAPIacuteTULO 2
TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40
Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa
natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O
municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande
polo de empregos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de
investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade
de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um
grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41
Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo
como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem
indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e
aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de
desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente
O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de
julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do
Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para
bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda
afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um
terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio
A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral
retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o
40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013
32
processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no
ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir
Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa
fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda
bebecirc pra terra roxa
Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43
A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande
destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da
cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra
Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o
municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo
queacuterdquo
No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves
transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que
este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo
sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em
resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores
Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa
industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo
enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa
Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20
principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a
43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
33
janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos
registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores
vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e
desligamento nesses setores
Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa
Meses Jan de 2003 a Jan de 2011
CBO ndash Frequumlecircncia
Admissotildees Desligamentos
Saldo
1ordm Emp
Reemp
Reint
C Prz Det
Transf
Total
Disp sem J Causa
Disp com J Causa
A Pedido
Term Contr
Aposent
Morte
Term C Prz Deter
Transf
Total
Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da
confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390
Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443
Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie
271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109
Costureira de peccedilas sob encomenda
171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em
geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio
varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina
60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio
em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina
bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas
34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27
Trabalhador agropecuaacuterio em geral
19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador
de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5
Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39
Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie
6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras
10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente
administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio
32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa
24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27
Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013
34
Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
35
Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
36
mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
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curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
38
Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
40
faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
45
Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
46
Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
47
Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
48
era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
9
INTRODUCcedilAtildeO
A escolha dos sujeitos e do tema deste estudo (os trabalhadores atualmente
vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa- PR) eacute resultado de minha
trajetoacuteria de vida trabalho e acadecircmica
Primeiro de vida e trabalho porque o trabalho na induacutestria de moda bebecirc jaacute fez
parte de minha atividade profissional por algum tempo Deste modo pude conviver com
outros trabalhadores observar e ouvir suas avaliaccedilotildees sobre suas condiccedilotildees de vida
motivaccedilotildees interesses e conflitos que perpassam esse ambiente de trabalho o que me
instigou a pesquisar o tema De forma que muitas das interpretaccedilotildees e avaliaccedilotildees que os
trabalhadores indicam em suas narrativas atraveacutes das entrevistas feitas jaacute ouvi dos
meus familiares como da minha proacutepria matildee Pois grande parte deles reside em Terra
Roxa e trabalha na induacutestria de moda bebecirc
Segundo como acadecircmica e pesquisadora porque este trabalho de conclusatildeo de
curso eacute continuidade de uma iniciaccedilatildeo cientifica voluntaacuteria (PIC-V) e as questotildees que
estatildeo aqui sendo levantadas eacute uma continuidade das indagaccedilotildees que surgiram a partir de
um diaacutelogo inicial com as fontes feitas nesta pesquisa anterior1
O objetivo central da pesquisa foi investigar as condiccedilotildees de vida de
trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de vestuaacuterio moda bebecirc no municiacutepio de
Terra Roxa-PR problematizando suas relaccedilotildees de trabalho e como se inserem e
interpretam este mercado de trabalho dando visibilidade a estes sujeitos e suas accedilotildees na
cidade
O municiacutepio possui atualmente entre macro e micro cerca de 113 empresas que
produzem em torno de 9 milhotildees de peccedilas envolvendo aproximadamente 2500
trabalhadores empregados diretamente o que segundo a noccedilatildeo do poder publico
municipal ldquodinamiza a geraccedilatildeo de emprego e renda do municiacutepiordquo2 Como podemos
1 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 2 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013
10
perceber em uma reportagem do jornal online Gazeta do Povo intitulada ldquoEm Terra
Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojasrdquo
A cadeia da confecccedilatildeo infantil mudou os rumos da cidade de 17 mil habitantes e a vida de muitos paranaenses Maria do Carmo 42 anos eacute um exemplo Ateacute os 38 anos ela trabalhava nos Campos Gerais onde plantava eucalipto Hoje o cenaacuterio eacute o mesmo um siacutetio mas agora ela natildeo lida diretamente com a terra Maria atua no setor de corte de roupas e tambeacutem dirige o ocircnibus que transporta funcionaacuterios da empresa Baby Doces Momentos confecccedilatildeo localizada em um siacutetio de cinco alqueires que produz cerca de 20 mil peccedilas ao mecircs ldquoAgora me sinto melhor Antes trabalhava no sol com uma bomba de 20 litros nas costas para pulverizar e plantarrdquo conta3
A partir do trecho acima percebemos que ao avaliar a dinacircmica industrial no
municiacutepio a reportagem aponta a relaccedilatildeo com a produccedilatildeo e experiecircncia dos trabalhos
no meio rural evidentemente para positivar a expansatildeo desse ramo de induacutestria de
vestuaacuterio como salvaccedilatildeo da cidade jaacute que estas empresas ldquodinamiza a geraccedilatildeo de
emprego e renda do municiacutepiordquo
Eacute importante entender a dimensatildeo dessa estrutura empresarial industrial em
Terra Roxa pois esta historicidade vai abrir caminhos a serem problematizados ao
longo deste trabalho
Para desenvolver esta pesquisa pautamo-nos na dinacircmica que integra a reflexatildeo
da problemaacutetica e o processo de levantamento e anaacutelise de fontes Esse
encaminhamento inspira-se na indicaccedilatildeo de Thompson sobre o diaacutelogo necessaacuterio e
constante entre teoria e evidecircncias histoacutericas4
Segundo Thompson
O interrogador eacute a loacutegica histoacuterica o conteuacutedo da interrogaccedilatildeo eacute uma hipoacutetese o interrogado eacute a evidecircncia com suas propriedades determinadas O objeto do conhecimento histoacuterico eacute a histoacuteria lsquorealrsquo cujas evidecircncias devem ser necessariamente incompletas e imperfeitas5
3 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no-paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 4 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma criacutetica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar Editores 1981 5 IBIDEM p 49
11
Isso quer dizer que os historiadores podem selecionar essa ou aquela evidecircncia
propor novas perguntas mas isso natildeo significa que os proacuteprios acontecimentos passados
se modifiquem nem tampouco que seja um agregado de histoacuterias separadas Embora
essa interpretaccedilatildeo do processo histoacuterico surja em resposta agrave pergunta formulada nossa
produccedilatildeo natildeo inventa o processo e natildeo pode modificar o ldquostatus ontoloacutegicordquo do
passado
Eacute nesta perspectiva de anaacutelise que conduziremos este pesquisa Cabe contudo
salientar a contribuiccedilatildeo que esta nos proporciona para a compreensatildeo que proponho
sobre as relaccedilotildees de trabalho experiecircncias e interpretaccedilotildees dos trabalhadores nas
induacutestrias de confecccedilatildeo de moda bebecirc em Terra Roxa Para tanto pensaremos a histoacuteria
em um duplo sentido como experiecircncia humana e como a proacutepria narraccedilatildeo dessas
experiecircncias as interpretaccedilotildees e projeccedilotildees das quais o investigador vai utilizar6
A investigaccedilatildeo neste sentido estaacute relacionada com as problemaacuteticas que o
pesquisador se coloca no presente que envolvem sua experiecircncia de vida e as
concepccedilotildees da qual parte
Pretendo entender a partir das experiecircncias narradas por esses trabalhadores
como eles se inserem e interpretam este mercado de trabalho e fazem prospecccedilotildees
Segundo Thompson
Se determos a histoacuteria num determinado ponto natildeo haacute classe mas simplesmente uma multidatildeo de indiviacuteduos com amontoado de experiecircncias Mas se examinarmos esses homens durante um periacuteodo adequado de mudanccedilas sociais observaremos padrotildees em suas relaccedilotildees sua ideias e instituiccedilotildees A classe eacute definida pelos homens enquanto vivem sua proacutepria histoacuteria e ao final esta eacute sua definiccedilatildeo7
Neste sentido para entendermos os trabalhadores eacute necessaacuteria uma serie de
observaccedilotildees e anaacutelises que se expressam em suas praacuteticas cotidianas como eles
vivenciam e se portam perante sua dinacircmica de trabalho o que possibilita sua formaccedilatildeo
cultural e social
Para esse processo interpretativo utilizamos cinco entrevistas que realizei com
trabalhadores no intuito de potencializar as elaboraccedilotildees construiacutedas por esses sujeitos
sobre as motivaccedilotildees interesses e conflitos ou seja memoacuterias produzidas sobre
6 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987 7 THOMPSON E P ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12
12
trajetoacuterias e experiecircncia social compartilhada nas relaccedilotildees dentro e fora das induacutestrias
de vestuaacuterio na cidade
Como um dos meacutetodos de pesquisa foi trabalhar com fontes orais considero
importante apontar algumas dificuldades que encontrei ao realizar algumas entrevistas
Mesmo o municiacutepio empregando mais de 2500 trabalhadores na induacutestria de confecccedilatildeo
minha principal dificuldade foi encontrar trabalhadores que se dispusessem a realizar as
entrevistas
Aqueles que aceitavam soacute concordavam em produzir a entrevista quando
algueacutem muito proacuteximo deles me apresentava O fato de alguns trabalhadores aceitarem
natildeo excluiu a desconfianccedila e inseguranccedila que estes possuiacuteam em relaccedilatildeo agraves entrevistas
Desta forma a inseguranccedila dos trabalhadores sobre se poderiam falar ou natildeo a
respeito de suas relaccedilotildees de trabalho juntamente com a minha falta de experiecircncia em
saber lidar com essas inseguranccedilas prejudicaram o desenvolvimento das entrevistas
As respostas ficaram limitadas ao roteiro muitas vezes limitadas ao ldquosimrdquo ou ao ldquonatildeordquo
Pois aleacutem da timidez ao saberem que estatildeo sendo gravados ainda tive que lidar com o
receio dos entrevistados ao exporem sua trajetoacuteria e condiccedilotildees de vida
As entrevistas orais natildeo foram produto de teacutecnica mas das relaccedilotildees que
consegui desenvolver com esses trabalhadores Portanto o meacutetodo de utilizar fontes
orais consiste em trabalhar com a subjetividade dos indiviacuteduos lidando com as questotildees
postas pelos entrevistados a partir de minhas proacuteprias questotildees
Neste sentido o diaacutelogo com Alessandro Portelli e com outros autores ajudou a
compreender que essa relaccedilatildeo entre entrevistado e entrevistador natildeo eacute um objetivo
muito faacutecil de ser alcanccedilado pois as pessoas reinterpretam e datildeo novos significados aos
acontecimentos passados em funccedilatildeo do que vive no presente ou espera viver Ou ainda
encobrem sentimentos e interpretaccedilotildees por censura repressatildeo temores ou pela pouca
disposiccedilatildeo em falar8
Ao utilizar a fonte oral foi importante dialogar com a produccedilatildeo de Alessandro
Portelli o qual contribuiu para a construccedilatildeo de um procedimento de anaacutelise para a
produccedilatildeo das fontes orais e do olhar lanccedilado sobre esse material O uso de tal fonte na
pesquisa permitiu o enfrentamento da dinacircmica contraditoacuteria de valores e praacuteticas que
compotildeem escolhas pressotildees e expectativas desses sujeitos sociais
8 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 p33
13
Nesse sentido permite maior visibilidade poliacutetica da classe trabalhadora com
suas divisotildees e processos de identificaccedilatildeo na condiccedilatildeo de classe compartilhada
produzindo assim uma interpretaccedilatildeo histoacuterica comprometida com o potencial de luta e
intervenccedilatildeo social desses trabalhadores Essa investigaccedilatildeo tambeacutem traz como
enfrentamento lidar com os limites dessa fonte como as dificuldades de conseguir a
aceitaccedilatildeo da gravaccedilatildeo da entrevista e contatar trabalhadores9
O intuito de usarmos a fonte oral nesta pesquisa inspira-se nesta perspectiva de
Portelli Buscamos o trabalho com as entrevista natildeo como confirmaccedilatildeo de uma ldquoteserdquo
inicial mas sim com a intenccedilatildeo de dar visibilidade agraves interpretaccedilotildees construiacutedas pelos
trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa
Para tal associamos essa documentaccedilatildeo com mateacuterias jornaliacutesticas e fichas de
inscriccedilatildeo em cursos (de corte costura e bordado) na Escola do trabalho na cidade Aleacutem
da interpretaccedilatildeo de iacutendices estatiacutesticos sobre empregabilidade atividades econocircmicas
etc
O presente trabalho estaacute estruturado em dois capiacutetulos No primeiro capiacutetulo
busquei analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agrave
induacutestria de moda bebecirc a fim de compreender os motivos que levam esses sujeitos a
perceber a expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de
melhoria e mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas e na permanecircncia em Terra Roxa
No segundo capiacutetulo busco discutir a partir das experiecircncias cotidianas e das
relaccedilotildees de trabalho desses sujeitos as possibilidades e limites das expectativas que
estes trabalhadores estabelecem em relaccedilatildeo ao trabalho na induacutestria de moda bebecirc tal
qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre o
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa10
Essa intenccedilatildeo tenta se distanciar de determinados campos analiacuteticos que
sustentam essa expansatildeo industrial como sinocircnimo de desenvolvimento arraigados
na promoccedilatildeo de certos projetos empresariais e na historicidade progressista de alguns
processos de expansatildeo urbana Ao fazer esse distanciamento o interesse eacute ampliar o
9 PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 10 As induacutestrias de Terra Roxa estatildeo inseridas no Arranjo Produtivo Local (APL) criado em 2004 para oferecer subsiacutedios e aperfeiccediloamento aos empresaacuterios O APL da moda bebecirc visa entre outros aspectos maior eficiecircncia de inserccedilatildeo dos produtos da induacutestria de vestuaacuterio no mercado maior poder de negociaccedilatildeo de preccedilo da mateacuteria-prima atraccedilatildeo de novos prestadores de serviccedilos ao municiacutepio e otimizaccedilatildeo de custos com a qualificaccedilatildeo da matildeo de obra Esse assessoramento procura oferecer ao empresariado condiccedilotildees de mercado e apoio para fixaccedilatildeo em determinadas regiotildees
14
campo de anaacutelise apresentando contradiccedilotildees e tensotildees nesse percurso dirigindo atenccedilatildeo
aos trabalhadores mais do que agrave faacutebrica e ao sistema produtivo por ele mesmo11
Ao realizar esta pesquisa minha preocupaccedilatildeo se pauta em mostrar que estes
sujeitos satildeo seres conscientes de sua posiccedilatildeo enquanto sujeitos sociais e procuro
ressaltar que estes trabalhadores fazem parte deste processo histoacuterico enquanto
indiviacuteduos ativos mesmo que indiretamente intervenham nos rumos e ritmo dessa
expansatildeo industrial
Assim busquei com este trabalho explorar a partir das narrativas dos
trabalhadores e de suas experiecircncias entender natildeo somente estes sujeitos mas as
expectativas que estes constroem e as relaccedilotildees que estabelecem com o trabalho para a
promoccedilatildeo de seus interesses
11 O trabalho de Godoy procura fazer um percurso acadecircmico das nuances e alteraccedilotildees na abordagem do universo fabril Assim como Paoli Sader e Telles recolocam alguns enfrentamentos - na percepccedilatildeo de suas atuaccedilotildees e construccedilatildeo de sentidos - para aqueles que procuram perceber os trabalhadores neste cenaacuterio operaacuterio brasileiro Ver -GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 -PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198
15
CAPIacuteTULO 1
TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc
[] Com o tempo depois que essas empresas dede crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram mais faacuteceis neacute []12
Neste capiacutetulo vamos analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente
estatildeo ou que em algum momento de suas vidas estiveram vinculados agraves induacutestrias de
confecccedilatildeo de moda bebecirc do municiacutepio de Terra Roxa- PR mas que trazem em sua
trajetoacuteria uma relaccedilatildeo com o trabalho moradia e valores advindo do campo O objetivo
eacute problematizar suas avaliaccedilotildees frente agrave ldquoexpansatildeordquo industrial do municiacutepio e como essa
dialoga com seus interesses e necessidades
Ao analisarmos algumas entrevistas de trabalhadores vinculados a estas
induacutestrias foi comum encontrar assim como na narrativa citada na epiacutegrafe deste
capiacutetulo narrativas nesta perspectiva na qual os empregos gerados pela industrializaccedilatildeo
satildeo interpretados como possibilidade de melhoria na condiccedilatildeo de vida dos
trabalhadores Percebemos assim que o municiacutepio estaacute constantemente sendo indicado
como um grande polo de empregos mas essa indicaccedilatildeo natildeo resume as ponderaccedilotildees que
fazem sobre a presenccedila industrial em Terra Roxa - porque tambeacutem apontam elementos
que contradizem essa presenccedila
Buscaremos entatildeo dialogar com as fontes orais produzidas com trabalhadores
que se relacionaram com induacutestria de confecccedilatildeo procurando discutir tambeacutem alguns
trabalhos acadecircmicos que analisam praacuteticas dos trabalhadores em Terra Roxa A fim de
compreender a trajetoacuteria destes sujeitos e os motivos que os levam a perceber a
expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de melhoria e
mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas
Para compreendermos melhor estas interpretaccedilotildees fez-se necessaacuterio analisar o
percurso de relaccedilotildees e experiecircncias que construiacuteram Para isso foi importante
12 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
16
dimensionar a cidade na deacutecada de 1970 Momento em que se intensificou a mudanccedila
destes trabalhadores do campo para a cidade (ou ainda para outras regiotildees) ou seja este
foi um periacuteodo de mudanccedilas marcantes nas relaccedilotildees de trabalho onde morar e como
viver natildeo soacute no municiacutepio mas possiacutevel de identificar em outras cidades brasileiras
No trabalho de Ana Ameacutelia Camarano e Ricardo Abramovay haacute o interesse em
apresentar os movimentos migratoacuterios que respondem pelo processo de esvaziamento
da populaccedilatildeo rural no Brasil Os autores observam que ateacute 1980 houve um crescimento
absoluto do saldo populacional que deixou as aacutereas rurais brasileiras Aproximadamente
40 da populaccedilatildeo que vivia nas aacutereas rurais no comeccedilo dos anos 70 migraram nessa
deacutecada O fluxo que deixou o campo nos anos 80 tambeacutem foi expressivo 13 de todos
os que viviam no meio rural em 1980 saiacuteram durante esse periacuteodo o que representou
aproximadamente 13 milhotildees de pessoas13
Em termos nacionais a intensidade do movimento de desruralizaccedilatildeo segundo
os autores parece natildeo ter diminuiacutedo muito nos uacuteltimos 50 anos Entre 1950 e 1980 as
aacutereas rurais das regiotildees Sudeste e Sul forneceram um volume expressivo de novos
moradores para as aacutereas urbanas14 Para os autores como realizavam a pesquisa em fins
da deacutecada de 1990 suas impressotildees indicavam uma continuidade desse processo
Desde 1950 a cada 10 anos um em cada trecircs brasileiros vivendo no meio rural opta pela emigraccedilatildeo Os anos 90 natildeo arrefeceram em muito esta tendecircncia se as taxas de evasatildeo do meio rural observadas entre 1990 e 1995 persistirem pelo restante da deacutecada quase 30 dos brasileiros que entatildeo viviam no campo em 1990 teratildeo mudado seu local de residecircncia na virada do milecircnio15
Ainda que os autores analisem no campo da geografia demograacutefica apoiando-se
na noccedilatildeo de ecircxodo rural estes trazem ldquoo modo de vida no campordquo como incocircmodo para
a realizaccedilatildeo da pesquisa traduzido nas movimentaccedilotildees desses brasileiros entre o campo
e a cidade alteraccedilotildees natildeo soacute espaciais mas no modo como vivem e enfrentam
determinadas relaccedilotildees de poder
Estes se movimentam de acordo com as expectativas e interesses que produzem
como necessidades reorganizando as relaccedilotildees de trabalho e modos de vida diante de
pressotildees de reestruturaccedilatildeo da produccedilatildeo e da ocupaccedilatildeo das aacutereas rurais brasileiras da
13 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 14 IBIDEM 15 IBIDEM p 6
17
segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual
natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na
promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo
De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970
aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do
municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as
principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos
Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio
exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX
Graacutefico 1
Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)
Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e
principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a
distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando
Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de
1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea
urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave
expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de
vestuaacuterio moda bebecirc
16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013
18
Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no
municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo
urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e
insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo
na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e
incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola
em moldes capitalistas na cidade 17
A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas
unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha
o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade
em muitos casos diretamente com o consumidor
Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que
discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em
Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo
provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que
Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18
No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da
populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente
ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da
maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio
alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo
aponta um processo tranquilo
17
GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18
FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9
19
As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos
oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute
mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise
- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o
cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que
A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19
A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o
trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe
quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar
com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de
banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe
pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo
Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um
grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir
ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados
da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia
por um nuacutemero reduzido de vagas
Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo
saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por
um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria
condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses
19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33
20
trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de
induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade
Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu
entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria
seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas
vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece
Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20
A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves
induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos
perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas
de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para
Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida
Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como
citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este
processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de
Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande
decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio
Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do
IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que
formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho
atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores
mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que
permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram
como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras
atividades tambeacutem inconstantes
A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em
2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que
residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo
por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos
20
JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
21
sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)
estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos
produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no
transporte e venda de mercadorias21
O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os
trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira
produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no
contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria
e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas
Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua
forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de
escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma
grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de
mercadorias criminalizado como contrabando
O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online
Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o
narcotraacuteficordquo aponta que
Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122
A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida
com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que
almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores
apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os
21
CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013
22
oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando
permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute
associada a comprar roupas e tecircnis de marca
O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a
intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda
de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre
alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para
frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc
No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses
trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego
Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso
Frederico afirma que
Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23
A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da
agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em
segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees
No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este
processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas
nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica
quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo
Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24
23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
23
Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo
para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O
trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do
patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo
lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos
trabalhadores pela induacutestria ele me diz que
Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25
Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural
da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas
relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar
com essa nova dinacircmica
Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo
visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas
vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se
aproxima da percepccedilatildeo de Carlos
Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26
Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para
ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes
se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio
trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as
ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que
pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha
25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11
24
trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem
trabalho
Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe
complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho
pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida
que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram
Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no
campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e
trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte
das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave
trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a
perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura
Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27
Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de
alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute
registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses
trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas
A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade
de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As
oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um
maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa
condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos
desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor
a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado
O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos
Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo
Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa
27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10
25
Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28
Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas
anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do
empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da
cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram
nesse processo
O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho
financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para
empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a
demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de
trabalhadores agrave disposiccedilatildeo
Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no
municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do
empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor
produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que
A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29
Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos
gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por
ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e
possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio
A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees
municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno
28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM
26
desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos
proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e
do APL do vestuaacuterio na cidade 31
No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi
substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e
mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e
vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa
aacutereardquo
Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do
Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos
profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes
tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o
interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo
de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores
tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo
foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal
finalidade
De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho
rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da
folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo
A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como
Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes
Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o
municiacutepio de Terra Roxa
30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
27
Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34
O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de
trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda
continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila
tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de
garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno
dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o
campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre
os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal
As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma
alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida
ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores
possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -
com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou
outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por
perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista
dentre outros natildeo os oferece
Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes
trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de
classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de
melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no
ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a
trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em
outra cidade ela me disse que
Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35
34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
28
Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave
mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem
organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de
novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar
com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as
expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita
vantagem assimrdquo
Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para
Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se
demo na faacutebricardquo36
Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram
trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar
mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia
com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando
pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que
Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37
Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter
voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no
campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em
Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que
natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar
36 IDEM 37 IDEM
29
As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila
pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com
a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma
mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila
natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na
narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do
casal
Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas
construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril
Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho
na faacutebrica ela me disse que
Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38
Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que
gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as
dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores
preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica
ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na
avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em
conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho
O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como
Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos
indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em
casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria
Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista
Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim
38 IDEM
30
de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por
menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes
oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc
como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado
na Escola do Trabalho
Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o
tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram
mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias
permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas
relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais
Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns
trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de
compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas
tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa
39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
31
CAPIacuteTULO 2
TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40
Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa
natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O
municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande
polo de empregos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de
investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade
de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um
grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41
Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo
como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem
indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e
aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de
desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente
O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de
julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do
Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para
bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda
afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um
terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio
A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral
retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o
40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013
32
processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no
ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir
Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa
fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda
bebecirc pra terra roxa
Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43
A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande
destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da
cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra
Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o
municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo
queacuterdquo
No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves
transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que
este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo
sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em
resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores
Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa
industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo
enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa
Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20
principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a
43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
33
janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos
registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores
vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e
desligamento nesses setores
Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa
Meses Jan de 2003 a Jan de 2011
CBO ndash Frequumlecircncia
Admissotildees Desligamentos
Saldo
1ordm Emp
Reemp
Reint
C Prz Det
Transf
Total
Disp sem J Causa
Disp com J Causa
A Pedido
Term Contr
Aposent
Morte
Term C Prz Deter
Transf
Total
Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da
confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390
Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443
Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie
271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109
Costureira de peccedilas sob encomenda
171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em
geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio
varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina
60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio
em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina
bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas
34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27
Trabalhador agropecuaacuterio em geral
19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador
de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5
Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39
Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie
6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras
10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente
administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio
32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa
24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27
Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013
34
Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
35
Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
36
mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
37
curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
38
Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
39
que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
40
faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
48
era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
10
perceber em uma reportagem do jornal online Gazeta do Povo intitulada ldquoEm Terra
Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojasrdquo
A cadeia da confecccedilatildeo infantil mudou os rumos da cidade de 17 mil habitantes e a vida de muitos paranaenses Maria do Carmo 42 anos eacute um exemplo Ateacute os 38 anos ela trabalhava nos Campos Gerais onde plantava eucalipto Hoje o cenaacuterio eacute o mesmo um siacutetio mas agora ela natildeo lida diretamente com a terra Maria atua no setor de corte de roupas e tambeacutem dirige o ocircnibus que transporta funcionaacuterios da empresa Baby Doces Momentos confecccedilatildeo localizada em um siacutetio de cinco alqueires que produz cerca de 20 mil peccedilas ao mecircs ldquoAgora me sinto melhor Antes trabalhava no sol com uma bomba de 20 litros nas costas para pulverizar e plantarrdquo conta3
A partir do trecho acima percebemos que ao avaliar a dinacircmica industrial no
municiacutepio a reportagem aponta a relaccedilatildeo com a produccedilatildeo e experiecircncia dos trabalhos
no meio rural evidentemente para positivar a expansatildeo desse ramo de induacutestria de
vestuaacuterio como salvaccedilatildeo da cidade jaacute que estas empresas ldquodinamiza a geraccedilatildeo de
emprego e renda do municiacutepiordquo
Eacute importante entender a dimensatildeo dessa estrutura empresarial industrial em
Terra Roxa pois esta historicidade vai abrir caminhos a serem problematizados ao
longo deste trabalho
Para desenvolver esta pesquisa pautamo-nos na dinacircmica que integra a reflexatildeo
da problemaacutetica e o processo de levantamento e anaacutelise de fontes Esse
encaminhamento inspira-se na indicaccedilatildeo de Thompson sobre o diaacutelogo necessaacuterio e
constante entre teoria e evidecircncias histoacutericas4
Segundo Thompson
O interrogador eacute a loacutegica histoacuterica o conteuacutedo da interrogaccedilatildeo eacute uma hipoacutetese o interrogado eacute a evidecircncia com suas propriedades determinadas O objeto do conhecimento histoacuterico eacute a histoacuteria lsquorealrsquo cujas evidecircncias devem ser necessariamente incompletas e imperfeitas5
3 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no-paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 4 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma criacutetica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar Editores 1981 5 IBIDEM p 49
11
Isso quer dizer que os historiadores podem selecionar essa ou aquela evidecircncia
propor novas perguntas mas isso natildeo significa que os proacuteprios acontecimentos passados
se modifiquem nem tampouco que seja um agregado de histoacuterias separadas Embora
essa interpretaccedilatildeo do processo histoacuterico surja em resposta agrave pergunta formulada nossa
produccedilatildeo natildeo inventa o processo e natildeo pode modificar o ldquostatus ontoloacutegicordquo do
passado
Eacute nesta perspectiva de anaacutelise que conduziremos este pesquisa Cabe contudo
salientar a contribuiccedilatildeo que esta nos proporciona para a compreensatildeo que proponho
sobre as relaccedilotildees de trabalho experiecircncias e interpretaccedilotildees dos trabalhadores nas
induacutestrias de confecccedilatildeo de moda bebecirc em Terra Roxa Para tanto pensaremos a histoacuteria
em um duplo sentido como experiecircncia humana e como a proacutepria narraccedilatildeo dessas
experiecircncias as interpretaccedilotildees e projeccedilotildees das quais o investigador vai utilizar6
A investigaccedilatildeo neste sentido estaacute relacionada com as problemaacuteticas que o
pesquisador se coloca no presente que envolvem sua experiecircncia de vida e as
concepccedilotildees da qual parte
Pretendo entender a partir das experiecircncias narradas por esses trabalhadores
como eles se inserem e interpretam este mercado de trabalho e fazem prospecccedilotildees
Segundo Thompson
Se determos a histoacuteria num determinado ponto natildeo haacute classe mas simplesmente uma multidatildeo de indiviacuteduos com amontoado de experiecircncias Mas se examinarmos esses homens durante um periacuteodo adequado de mudanccedilas sociais observaremos padrotildees em suas relaccedilotildees sua ideias e instituiccedilotildees A classe eacute definida pelos homens enquanto vivem sua proacutepria histoacuteria e ao final esta eacute sua definiccedilatildeo7
Neste sentido para entendermos os trabalhadores eacute necessaacuteria uma serie de
observaccedilotildees e anaacutelises que se expressam em suas praacuteticas cotidianas como eles
vivenciam e se portam perante sua dinacircmica de trabalho o que possibilita sua formaccedilatildeo
cultural e social
Para esse processo interpretativo utilizamos cinco entrevistas que realizei com
trabalhadores no intuito de potencializar as elaboraccedilotildees construiacutedas por esses sujeitos
sobre as motivaccedilotildees interesses e conflitos ou seja memoacuterias produzidas sobre
6 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987 7 THOMPSON E P ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12
12
trajetoacuterias e experiecircncia social compartilhada nas relaccedilotildees dentro e fora das induacutestrias
de vestuaacuterio na cidade
Como um dos meacutetodos de pesquisa foi trabalhar com fontes orais considero
importante apontar algumas dificuldades que encontrei ao realizar algumas entrevistas
Mesmo o municiacutepio empregando mais de 2500 trabalhadores na induacutestria de confecccedilatildeo
minha principal dificuldade foi encontrar trabalhadores que se dispusessem a realizar as
entrevistas
Aqueles que aceitavam soacute concordavam em produzir a entrevista quando
algueacutem muito proacuteximo deles me apresentava O fato de alguns trabalhadores aceitarem
natildeo excluiu a desconfianccedila e inseguranccedila que estes possuiacuteam em relaccedilatildeo agraves entrevistas
Desta forma a inseguranccedila dos trabalhadores sobre se poderiam falar ou natildeo a
respeito de suas relaccedilotildees de trabalho juntamente com a minha falta de experiecircncia em
saber lidar com essas inseguranccedilas prejudicaram o desenvolvimento das entrevistas
As respostas ficaram limitadas ao roteiro muitas vezes limitadas ao ldquosimrdquo ou ao ldquonatildeordquo
Pois aleacutem da timidez ao saberem que estatildeo sendo gravados ainda tive que lidar com o
receio dos entrevistados ao exporem sua trajetoacuteria e condiccedilotildees de vida
As entrevistas orais natildeo foram produto de teacutecnica mas das relaccedilotildees que
consegui desenvolver com esses trabalhadores Portanto o meacutetodo de utilizar fontes
orais consiste em trabalhar com a subjetividade dos indiviacuteduos lidando com as questotildees
postas pelos entrevistados a partir de minhas proacuteprias questotildees
Neste sentido o diaacutelogo com Alessandro Portelli e com outros autores ajudou a
compreender que essa relaccedilatildeo entre entrevistado e entrevistador natildeo eacute um objetivo
muito faacutecil de ser alcanccedilado pois as pessoas reinterpretam e datildeo novos significados aos
acontecimentos passados em funccedilatildeo do que vive no presente ou espera viver Ou ainda
encobrem sentimentos e interpretaccedilotildees por censura repressatildeo temores ou pela pouca
disposiccedilatildeo em falar8
Ao utilizar a fonte oral foi importante dialogar com a produccedilatildeo de Alessandro
Portelli o qual contribuiu para a construccedilatildeo de um procedimento de anaacutelise para a
produccedilatildeo das fontes orais e do olhar lanccedilado sobre esse material O uso de tal fonte na
pesquisa permitiu o enfrentamento da dinacircmica contraditoacuteria de valores e praacuteticas que
compotildeem escolhas pressotildees e expectativas desses sujeitos sociais
8 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 p33
13
Nesse sentido permite maior visibilidade poliacutetica da classe trabalhadora com
suas divisotildees e processos de identificaccedilatildeo na condiccedilatildeo de classe compartilhada
produzindo assim uma interpretaccedilatildeo histoacuterica comprometida com o potencial de luta e
intervenccedilatildeo social desses trabalhadores Essa investigaccedilatildeo tambeacutem traz como
enfrentamento lidar com os limites dessa fonte como as dificuldades de conseguir a
aceitaccedilatildeo da gravaccedilatildeo da entrevista e contatar trabalhadores9
O intuito de usarmos a fonte oral nesta pesquisa inspira-se nesta perspectiva de
Portelli Buscamos o trabalho com as entrevista natildeo como confirmaccedilatildeo de uma ldquoteserdquo
inicial mas sim com a intenccedilatildeo de dar visibilidade agraves interpretaccedilotildees construiacutedas pelos
trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa
Para tal associamos essa documentaccedilatildeo com mateacuterias jornaliacutesticas e fichas de
inscriccedilatildeo em cursos (de corte costura e bordado) na Escola do trabalho na cidade Aleacutem
da interpretaccedilatildeo de iacutendices estatiacutesticos sobre empregabilidade atividades econocircmicas
etc
O presente trabalho estaacute estruturado em dois capiacutetulos No primeiro capiacutetulo
busquei analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agrave
induacutestria de moda bebecirc a fim de compreender os motivos que levam esses sujeitos a
perceber a expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de
melhoria e mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas e na permanecircncia em Terra Roxa
No segundo capiacutetulo busco discutir a partir das experiecircncias cotidianas e das
relaccedilotildees de trabalho desses sujeitos as possibilidades e limites das expectativas que
estes trabalhadores estabelecem em relaccedilatildeo ao trabalho na induacutestria de moda bebecirc tal
qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre o
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa10
Essa intenccedilatildeo tenta se distanciar de determinados campos analiacuteticos que
sustentam essa expansatildeo industrial como sinocircnimo de desenvolvimento arraigados
na promoccedilatildeo de certos projetos empresariais e na historicidade progressista de alguns
processos de expansatildeo urbana Ao fazer esse distanciamento o interesse eacute ampliar o
9 PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 10 As induacutestrias de Terra Roxa estatildeo inseridas no Arranjo Produtivo Local (APL) criado em 2004 para oferecer subsiacutedios e aperfeiccediloamento aos empresaacuterios O APL da moda bebecirc visa entre outros aspectos maior eficiecircncia de inserccedilatildeo dos produtos da induacutestria de vestuaacuterio no mercado maior poder de negociaccedilatildeo de preccedilo da mateacuteria-prima atraccedilatildeo de novos prestadores de serviccedilos ao municiacutepio e otimizaccedilatildeo de custos com a qualificaccedilatildeo da matildeo de obra Esse assessoramento procura oferecer ao empresariado condiccedilotildees de mercado e apoio para fixaccedilatildeo em determinadas regiotildees
14
campo de anaacutelise apresentando contradiccedilotildees e tensotildees nesse percurso dirigindo atenccedilatildeo
aos trabalhadores mais do que agrave faacutebrica e ao sistema produtivo por ele mesmo11
Ao realizar esta pesquisa minha preocupaccedilatildeo se pauta em mostrar que estes
sujeitos satildeo seres conscientes de sua posiccedilatildeo enquanto sujeitos sociais e procuro
ressaltar que estes trabalhadores fazem parte deste processo histoacuterico enquanto
indiviacuteduos ativos mesmo que indiretamente intervenham nos rumos e ritmo dessa
expansatildeo industrial
Assim busquei com este trabalho explorar a partir das narrativas dos
trabalhadores e de suas experiecircncias entender natildeo somente estes sujeitos mas as
expectativas que estes constroem e as relaccedilotildees que estabelecem com o trabalho para a
promoccedilatildeo de seus interesses
11 O trabalho de Godoy procura fazer um percurso acadecircmico das nuances e alteraccedilotildees na abordagem do universo fabril Assim como Paoli Sader e Telles recolocam alguns enfrentamentos - na percepccedilatildeo de suas atuaccedilotildees e construccedilatildeo de sentidos - para aqueles que procuram perceber os trabalhadores neste cenaacuterio operaacuterio brasileiro Ver -GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 -PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198
15
CAPIacuteTULO 1
TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc
[] Com o tempo depois que essas empresas dede crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram mais faacuteceis neacute []12
Neste capiacutetulo vamos analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente
estatildeo ou que em algum momento de suas vidas estiveram vinculados agraves induacutestrias de
confecccedilatildeo de moda bebecirc do municiacutepio de Terra Roxa- PR mas que trazem em sua
trajetoacuteria uma relaccedilatildeo com o trabalho moradia e valores advindo do campo O objetivo
eacute problematizar suas avaliaccedilotildees frente agrave ldquoexpansatildeordquo industrial do municiacutepio e como essa
dialoga com seus interesses e necessidades
Ao analisarmos algumas entrevistas de trabalhadores vinculados a estas
induacutestrias foi comum encontrar assim como na narrativa citada na epiacutegrafe deste
capiacutetulo narrativas nesta perspectiva na qual os empregos gerados pela industrializaccedilatildeo
satildeo interpretados como possibilidade de melhoria na condiccedilatildeo de vida dos
trabalhadores Percebemos assim que o municiacutepio estaacute constantemente sendo indicado
como um grande polo de empregos mas essa indicaccedilatildeo natildeo resume as ponderaccedilotildees que
fazem sobre a presenccedila industrial em Terra Roxa - porque tambeacutem apontam elementos
que contradizem essa presenccedila
Buscaremos entatildeo dialogar com as fontes orais produzidas com trabalhadores
que se relacionaram com induacutestria de confecccedilatildeo procurando discutir tambeacutem alguns
trabalhos acadecircmicos que analisam praacuteticas dos trabalhadores em Terra Roxa A fim de
compreender a trajetoacuteria destes sujeitos e os motivos que os levam a perceber a
expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de melhoria e
mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas
Para compreendermos melhor estas interpretaccedilotildees fez-se necessaacuterio analisar o
percurso de relaccedilotildees e experiecircncias que construiacuteram Para isso foi importante
12 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
16
dimensionar a cidade na deacutecada de 1970 Momento em que se intensificou a mudanccedila
destes trabalhadores do campo para a cidade (ou ainda para outras regiotildees) ou seja este
foi um periacuteodo de mudanccedilas marcantes nas relaccedilotildees de trabalho onde morar e como
viver natildeo soacute no municiacutepio mas possiacutevel de identificar em outras cidades brasileiras
No trabalho de Ana Ameacutelia Camarano e Ricardo Abramovay haacute o interesse em
apresentar os movimentos migratoacuterios que respondem pelo processo de esvaziamento
da populaccedilatildeo rural no Brasil Os autores observam que ateacute 1980 houve um crescimento
absoluto do saldo populacional que deixou as aacutereas rurais brasileiras Aproximadamente
40 da populaccedilatildeo que vivia nas aacutereas rurais no comeccedilo dos anos 70 migraram nessa
deacutecada O fluxo que deixou o campo nos anos 80 tambeacutem foi expressivo 13 de todos
os que viviam no meio rural em 1980 saiacuteram durante esse periacuteodo o que representou
aproximadamente 13 milhotildees de pessoas13
Em termos nacionais a intensidade do movimento de desruralizaccedilatildeo segundo
os autores parece natildeo ter diminuiacutedo muito nos uacuteltimos 50 anos Entre 1950 e 1980 as
aacutereas rurais das regiotildees Sudeste e Sul forneceram um volume expressivo de novos
moradores para as aacutereas urbanas14 Para os autores como realizavam a pesquisa em fins
da deacutecada de 1990 suas impressotildees indicavam uma continuidade desse processo
Desde 1950 a cada 10 anos um em cada trecircs brasileiros vivendo no meio rural opta pela emigraccedilatildeo Os anos 90 natildeo arrefeceram em muito esta tendecircncia se as taxas de evasatildeo do meio rural observadas entre 1990 e 1995 persistirem pelo restante da deacutecada quase 30 dos brasileiros que entatildeo viviam no campo em 1990 teratildeo mudado seu local de residecircncia na virada do milecircnio15
Ainda que os autores analisem no campo da geografia demograacutefica apoiando-se
na noccedilatildeo de ecircxodo rural estes trazem ldquoo modo de vida no campordquo como incocircmodo para
a realizaccedilatildeo da pesquisa traduzido nas movimentaccedilotildees desses brasileiros entre o campo
e a cidade alteraccedilotildees natildeo soacute espaciais mas no modo como vivem e enfrentam
determinadas relaccedilotildees de poder
Estes se movimentam de acordo com as expectativas e interesses que produzem
como necessidades reorganizando as relaccedilotildees de trabalho e modos de vida diante de
pressotildees de reestruturaccedilatildeo da produccedilatildeo e da ocupaccedilatildeo das aacutereas rurais brasileiras da
13 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 14 IBIDEM 15 IBIDEM p 6
17
segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual
natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na
promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo
De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970
aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do
municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as
principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos
Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio
exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX
Graacutefico 1
Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)
Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e
principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a
distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando
Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de
1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea
urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave
expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de
vestuaacuterio moda bebecirc
16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013
18
Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no
municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo
urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e
insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo
na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e
incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola
em moldes capitalistas na cidade 17
A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas
unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha
o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade
em muitos casos diretamente com o consumidor
Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que
discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em
Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo
provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que
Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18
No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da
populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente
ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da
maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio
alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo
aponta um processo tranquilo
17
GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18
FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9
19
As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos
oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute
mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise
- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o
cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que
A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19
A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o
trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe
quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar
com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de
banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe
pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo
Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um
grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir
ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados
da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia
por um nuacutemero reduzido de vagas
Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo
saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por
um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria
condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses
19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33
20
trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de
induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade
Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu
entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria
seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas
vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece
Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20
A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves
induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos
perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas
de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para
Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida
Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como
citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este
processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de
Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande
decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio
Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do
IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que
formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho
atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores
mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que
permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram
como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras
atividades tambeacutem inconstantes
A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em
2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que
residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo
por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos
20
JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
21
sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)
estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos
produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no
transporte e venda de mercadorias21
O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os
trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira
produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no
contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria
e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas
Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua
forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de
escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma
grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de
mercadorias criminalizado como contrabando
O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online
Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o
narcotraacuteficordquo aponta que
Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122
A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida
com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que
almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores
apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os
21
CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013
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oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando
permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute
associada a comprar roupas e tecircnis de marca
O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a
intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda
de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre
alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para
frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc
No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses
trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego
Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso
Frederico afirma que
Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23
A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da
agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em
segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees
No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este
processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas
nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica
quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo
Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24
23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
23
Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo
para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O
trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do
patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo
lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos
trabalhadores pela induacutestria ele me diz que
Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25
Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural
da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas
relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar
com essa nova dinacircmica
Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo
visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas
vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se
aproxima da percepccedilatildeo de Carlos
Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26
Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para
ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes
se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio
trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as
ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que
pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha
25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11
24
trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem
trabalho
Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe
complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho
pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida
que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram
Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no
campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e
trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte
das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave
trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a
perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura
Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27
Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de
alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute
registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses
trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas
A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade
de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As
oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um
maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa
condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos
desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor
a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado
O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos
Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo
Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa
27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10
25
Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28
Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas
anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do
empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da
cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram
nesse processo
O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho
financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para
empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a
demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de
trabalhadores agrave disposiccedilatildeo
Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no
municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do
empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor
produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que
A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29
Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos
gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por
ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e
possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio
A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees
municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno
28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM
26
desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos
proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e
do APL do vestuaacuterio na cidade 31
No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi
substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e
mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e
vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa
aacutereardquo
Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do
Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos
profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes
tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o
interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo
de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores
tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo
foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal
finalidade
De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho
rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da
folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo
A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como
Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes
Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o
municiacutepio de Terra Roxa
30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
27
Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34
O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de
trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda
continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila
tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de
garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno
dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o
campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre
os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal
As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma
alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida
ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores
possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -
com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou
outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por
perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista
dentre outros natildeo os oferece
Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes
trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de
classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de
melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no
ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a
trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em
outra cidade ela me disse que
Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35
34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
28
Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave
mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem
organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de
novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar
com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as
expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita
vantagem assimrdquo
Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para
Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se
demo na faacutebricardquo36
Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram
trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar
mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia
com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando
pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que
Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37
Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter
voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no
campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em
Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que
natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar
36 IDEM 37 IDEM
29
As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila
pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com
a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma
mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila
natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na
narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do
casal
Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas
construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril
Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho
na faacutebrica ela me disse que
Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38
Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que
gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as
dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores
preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica
ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na
avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em
conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho
O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como
Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos
indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em
casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria
Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista
Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim
38 IDEM
30
de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por
menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes
oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc
como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado
na Escola do Trabalho
Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o
tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram
mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias
permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas
relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais
Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns
trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de
compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas
tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa
39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
31
CAPIacuteTULO 2
TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40
Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa
natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O
municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande
polo de empregos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de
investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade
de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um
grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41
Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo
como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem
indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e
aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de
desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente
O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de
julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do
Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para
bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda
afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um
terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio
A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral
retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o
40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013
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processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no
ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir
Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa
fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda
bebecirc pra terra roxa
Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43
A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande
destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da
cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra
Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o
municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo
queacuterdquo
No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves
transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que
este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo
sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em
resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores
Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa
industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo
enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa
Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20
principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a
43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
33
janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos
registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores
vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e
desligamento nesses setores
Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa
Meses Jan de 2003 a Jan de 2011
CBO ndash Frequumlecircncia
Admissotildees Desligamentos
Saldo
1ordm Emp
Reemp
Reint
C Prz Det
Transf
Total
Disp sem J Causa
Disp com J Causa
A Pedido
Term Contr
Aposent
Morte
Term C Prz Deter
Transf
Total
Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da
confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390
Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443
Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie
271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109
Costureira de peccedilas sob encomenda
171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em
geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio
varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina
60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio
em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina
bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas
34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27
Trabalhador agropecuaacuterio em geral
19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador
de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5
Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39
Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie
6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras
10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente
administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio
32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa
24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27
Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013
34
Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
35
Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
36
mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
37
curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
38
Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
39
que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
40
faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
45
Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
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era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
11
Isso quer dizer que os historiadores podem selecionar essa ou aquela evidecircncia
propor novas perguntas mas isso natildeo significa que os proacuteprios acontecimentos passados
se modifiquem nem tampouco que seja um agregado de histoacuterias separadas Embora
essa interpretaccedilatildeo do processo histoacuterico surja em resposta agrave pergunta formulada nossa
produccedilatildeo natildeo inventa o processo e natildeo pode modificar o ldquostatus ontoloacutegicordquo do
passado
Eacute nesta perspectiva de anaacutelise que conduziremos este pesquisa Cabe contudo
salientar a contribuiccedilatildeo que esta nos proporciona para a compreensatildeo que proponho
sobre as relaccedilotildees de trabalho experiecircncias e interpretaccedilotildees dos trabalhadores nas
induacutestrias de confecccedilatildeo de moda bebecirc em Terra Roxa Para tanto pensaremos a histoacuteria
em um duplo sentido como experiecircncia humana e como a proacutepria narraccedilatildeo dessas
experiecircncias as interpretaccedilotildees e projeccedilotildees das quais o investigador vai utilizar6
A investigaccedilatildeo neste sentido estaacute relacionada com as problemaacuteticas que o
pesquisador se coloca no presente que envolvem sua experiecircncia de vida e as
concepccedilotildees da qual parte
Pretendo entender a partir das experiecircncias narradas por esses trabalhadores
como eles se inserem e interpretam este mercado de trabalho e fazem prospecccedilotildees
Segundo Thompson
Se determos a histoacuteria num determinado ponto natildeo haacute classe mas simplesmente uma multidatildeo de indiviacuteduos com amontoado de experiecircncias Mas se examinarmos esses homens durante um periacuteodo adequado de mudanccedilas sociais observaremos padrotildees em suas relaccedilotildees sua ideias e instituiccedilotildees A classe eacute definida pelos homens enquanto vivem sua proacutepria histoacuteria e ao final esta eacute sua definiccedilatildeo7
Neste sentido para entendermos os trabalhadores eacute necessaacuteria uma serie de
observaccedilotildees e anaacutelises que se expressam em suas praacuteticas cotidianas como eles
vivenciam e se portam perante sua dinacircmica de trabalho o que possibilita sua formaccedilatildeo
cultural e social
Para esse processo interpretativo utilizamos cinco entrevistas que realizei com
trabalhadores no intuito de potencializar as elaboraccedilotildees construiacutedas por esses sujeitos
sobre as motivaccedilotildees interesses e conflitos ou seja memoacuterias produzidas sobre
6 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987 7 THOMPSON E P ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12
12
trajetoacuterias e experiecircncia social compartilhada nas relaccedilotildees dentro e fora das induacutestrias
de vestuaacuterio na cidade
Como um dos meacutetodos de pesquisa foi trabalhar com fontes orais considero
importante apontar algumas dificuldades que encontrei ao realizar algumas entrevistas
Mesmo o municiacutepio empregando mais de 2500 trabalhadores na induacutestria de confecccedilatildeo
minha principal dificuldade foi encontrar trabalhadores que se dispusessem a realizar as
entrevistas
Aqueles que aceitavam soacute concordavam em produzir a entrevista quando
algueacutem muito proacuteximo deles me apresentava O fato de alguns trabalhadores aceitarem
natildeo excluiu a desconfianccedila e inseguranccedila que estes possuiacuteam em relaccedilatildeo agraves entrevistas
Desta forma a inseguranccedila dos trabalhadores sobre se poderiam falar ou natildeo a
respeito de suas relaccedilotildees de trabalho juntamente com a minha falta de experiecircncia em
saber lidar com essas inseguranccedilas prejudicaram o desenvolvimento das entrevistas
As respostas ficaram limitadas ao roteiro muitas vezes limitadas ao ldquosimrdquo ou ao ldquonatildeordquo
Pois aleacutem da timidez ao saberem que estatildeo sendo gravados ainda tive que lidar com o
receio dos entrevistados ao exporem sua trajetoacuteria e condiccedilotildees de vida
As entrevistas orais natildeo foram produto de teacutecnica mas das relaccedilotildees que
consegui desenvolver com esses trabalhadores Portanto o meacutetodo de utilizar fontes
orais consiste em trabalhar com a subjetividade dos indiviacuteduos lidando com as questotildees
postas pelos entrevistados a partir de minhas proacuteprias questotildees
Neste sentido o diaacutelogo com Alessandro Portelli e com outros autores ajudou a
compreender que essa relaccedilatildeo entre entrevistado e entrevistador natildeo eacute um objetivo
muito faacutecil de ser alcanccedilado pois as pessoas reinterpretam e datildeo novos significados aos
acontecimentos passados em funccedilatildeo do que vive no presente ou espera viver Ou ainda
encobrem sentimentos e interpretaccedilotildees por censura repressatildeo temores ou pela pouca
disposiccedilatildeo em falar8
Ao utilizar a fonte oral foi importante dialogar com a produccedilatildeo de Alessandro
Portelli o qual contribuiu para a construccedilatildeo de um procedimento de anaacutelise para a
produccedilatildeo das fontes orais e do olhar lanccedilado sobre esse material O uso de tal fonte na
pesquisa permitiu o enfrentamento da dinacircmica contraditoacuteria de valores e praacuteticas que
compotildeem escolhas pressotildees e expectativas desses sujeitos sociais
8 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 p33
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Nesse sentido permite maior visibilidade poliacutetica da classe trabalhadora com
suas divisotildees e processos de identificaccedilatildeo na condiccedilatildeo de classe compartilhada
produzindo assim uma interpretaccedilatildeo histoacuterica comprometida com o potencial de luta e
intervenccedilatildeo social desses trabalhadores Essa investigaccedilatildeo tambeacutem traz como
enfrentamento lidar com os limites dessa fonte como as dificuldades de conseguir a
aceitaccedilatildeo da gravaccedilatildeo da entrevista e contatar trabalhadores9
O intuito de usarmos a fonte oral nesta pesquisa inspira-se nesta perspectiva de
Portelli Buscamos o trabalho com as entrevista natildeo como confirmaccedilatildeo de uma ldquoteserdquo
inicial mas sim com a intenccedilatildeo de dar visibilidade agraves interpretaccedilotildees construiacutedas pelos
trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa
Para tal associamos essa documentaccedilatildeo com mateacuterias jornaliacutesticas e fichas de
inscriccedilatildeo em cursos (de corte costura e bordado) na Escola do trabalho na cidade Aleacutem
da interpretaccedilatildeo de iacutendices estatiacutesticos sobre empregabilidade atividades econocircmicas
etc
O presente trabalho estaacute estruturado em dois capiacutetulos No primeiro capiacutetulo
busquei analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agrave
induacutestria de moda bebecirc a fim de compreender os motivos que levam esses sujeitos a
perceber a expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de
melhoria e mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas e na permanecircncia em Terra Roxa
No segundo capiacutetulo busco discutir a partir das experiecircncias cotidianas e das
relaccedilotildees de trabalho desses sujeitos as possibilidades e limites das expectativas que
estes trabalhadores estabelecem em relaccedilatildeo ao trabalho na induacutestria de moda bebecirc tal
qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre o
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa10
Essa intenccedilatildeo tenta se distanciar de determinados campos analiacuteticos que
sustentam essa expansatildeo industrial como sinocircnimo de desenvolvimento arraigados
na promoccedilatildeo de certos projetos empresariais e na historicidade progressista de alguns
processos de expansatildeo urbana Ao fazer esse distanciamento o interesse eacute ampliar o
9 PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 10 As induacutestrias de Terra Roxa estatildeo inseridas no Arranjo Produtivo Local (APL) criado em 2004 para oferecer subsiacutedios e aperfeiccediloamento aos empresaacuterios O APL da moda bebecirc visa entre outros aspectos maior eficiecircncia de inserccedilatildeo dos produtos da induacutestria de vestuaacuterio no mercado maior poder de negociaccedilatildeo de preccedilo da mateacuteria-prima atraccedilatildeo de novos prestadores de serviccedilos ao municiacutepio e otimizaccedilatildeo de custos com a qualificaccedilatildeo da matildeo de obra Esse assessoramento procura oferecer ao empresariado condiccedilotildees de mercado e apoio para fixaccedilatildeo em determinadas regiotildees
14
campo de anaacutelise apresentando contradiccedilotildees e tensotildees nesse percurso dirigindo atenccedilatildeo
aos trabalhadores mais do que agrave faacutebrica e ao sistema produtivo por ele mesmo11
Ao realizar esta pesquisa minha preocupaccedilatildeo se pauta em mostrar que estes
sujeitos satildeo seres conscientes de sua posiccedilatildeo enquanto sujeitos sociais e procuro
ressaltar que estes trabalhadores fazem parte deste processo histoacuterico enquanto
indiviacuteduos ativos mesmo que indiretamente intervenham nos rumos e ritmo dessa
expansatildeo industrial
Assim busquei com este trabalho explorar a partir das narrativas dos
trabalhadores e de suas experiecircncias entender natildeo somente estes sujeitos mas as
expectativas que estes constroem e as relaccedilotildees que estabelecem com o trabalho para a
promoccedilatildeo de seus interesses
11 O trabalho de Godoy procura fazer um percurso acadecircmico das nuances e alteraccedilotildees na abordagem do universo fabril Assim como Paoli Sader e Telles recolocam alguns enfrentamentos - na percepccedilatildeo de suas atuaccedilotildees e construccedilatildeo de sentidos - para aqueles que procuram perceber os trabalhadores neste cenaacuterio operaacuterio brasileiro Ver -GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 -PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198
15
CAPIacuteTULO 1
TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc
[] Com o tempo depois que essas empresas dede crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram mais faacuteceis neacute []12
Neste capiacutetulo vamos analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente
estatildeo ou que em algum momento de suas vidas estiveram vinculados agraves induacutestrias de
confecccedilatildeo de moda bebecirc do municiacutepio de Terra Roxa- PR mas que trazem em sua
trajetoacuteria uma relaccedilatildeo com o trabalho moradia e valores advindo do campo O objetivo
eacute problematizar suas avaliaccedilotildees frente agrave ldquoexpansatildeordquo industrial do municiacutepio e como essa
dialoga com seus interesses e necessidades
Ao analisarmos algumas entrevistas de trabalhadores vinculados a estas
induacutestrias foi comum encontrar assim como na narrativa citada na epiacutegrafe deste
capiacutetulo narrativas nesta perspectiva na qual os empregos gerados pela industrializaccedilatildeo
satildeo interpretados como possibilidade de melhoria na condiccedilatildeo de vida dos
trabalhadores Percebemos assim que o municiacutepio estaacute constantemente sendo indicado
como um grande polo de empregos mas essa indicaccedilatildeo natildeo resume as ponderaccedilotildees que
fazem sobre a presenccedila industrial em Terra Roxa - porque tambeacutem apontam elementos
que contradizem essa presenccedila
Buscaremos entatildeo dialogar com as fontes orais produzidas com trabalhadores
que se relacionaram com induacutestria de confecccedilatildeo procurando discutir tambeacutem alguns
trabalhos acadecircmicos que analisam praacuteticas dos trabalhadores em Terra Roxa A fim de
compreender a trajetoacuteria destes sujeitos e os motivos que os levam a perceber a
expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de melhoria e
mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas
Para compreendermos melhor estas interpretaccedilotildees fez-se necessaacuterio analisar o
percurso de relaccedilotildees e experiecircncias que construiacuteram Para isso foi importante
12 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
16
dimensionar a cidade na deacutecada de 1970 Momento em que se intensificou a mudanccedila
destes trabalhadores do campo para a cidade (ou ainda para outras regiotildees) ou seja este
foi um periacuteodo de mudanccedilas marcantes nas relaccedilotildees de trabalho onde morar e como
viver natildeo soacute no municiacutepio mas possiacutevel de identificar em outras cidades brasileiras
No trabalho de Ana Ameacutelia Camarano e Ricardo Abramovay haacute o interesse em
apresentar os movimentos migratoacuterios que respondem pelo processo de esvaziamento
da populaccedilatildeo rural no Brasil Os autores observam que ateacute 1980 houve um crescimento
absoluto do saldo populacional que deixou as aacutereas rurais brasileiras Aproximadamente
40 da populaccedilatildeo que vivia nas aacutereas rurais no comeccedilo dos anos 70 migraram nessa
deacutecada O fluxo que deixou o campo nos anos 80 tambeacutem foi expressivo 13 de todos
os que viviam no meio rural em 1980 saiacuteram durante esse periacuteodo o que representou
aproximadamente 13 milhotildees de pessoas13
Em termos nacionais a intensidade do movimento de desruralizaccedilatildeo segundo
os autores parece natildeo ter diminuiacutedo muito nos uacuteltimos 50 anos Entre 1950 e 1980 as
aacutereas rurais das regiotildees Sudeste e Sul forneceram um volume expressivo de novos
moradores para as aacutereas urbanas14 Para os autores como realizavam a pesquisa em fins
da deacutecada de 1990 suas impressotildees indicavam uma continuidade desse processo
Desde 1950 a cada 10 anos um em cada trecircs brasileiros vivendo no meio rural opta pela emigraccedilatildeo Os anos 90 natildeo arrefeceram em muito esta tendecircncia se as taxas de evasatildeo do meio rural observadas entre 1990 e 1995 persistirem pelo restante da deacutecada quase 30 dos brasileiros que entatildeo viviam no campo em 1990 teratildeo mudado seu local de residecircncia na virada do milecircnio15
Ainda que os autores analisem no campo da geografia demograacutefica apoiando-se
na noccedilatildeo de ecircxodo rural estes trazem ldquoo modo de vida no campordquo como incocircmodo para
a realizaccedilatildeo da pesquisa traduzido nas movimentaccedilotildees desses brasileiros entre o campo
e a cidade alteraccedilotildees natildeo soacute espaciais mas no modo como vivem e enfrentam
determinadas relaccedilotildees de poder
Estes se movimentam de acordo com as expectativas e interesses que produzem
como necessidades reorganizando as relaccedilotildees de trabalho e modos de vida diante de
pressotildees de reestruturaccedilatildeo da produccedilatildeo e da ocupaccedilatildeo das aacutereas rurais brasileiras da
13 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 14 IBIDEM 15 IBIDEM p 6
17
segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual
natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na
promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo
De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970
aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do
municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as
principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos
Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio
exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX
Graacutefico 1
Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)
Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e
principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a
distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando
Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de
1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea
urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave
expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de
vestuaacuterio moda bebecirc
16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013
18
Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no
municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo
urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e
insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo
na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e
incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola
em moldes capitalistas na cidade 17
A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas
unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha
o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade
em muitos casos diretamente com o consumidor
Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que
discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em
Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo
provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que
Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18
No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da
populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente
ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da
maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio
alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo
aponta um processo tranquilo
17
GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18
FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9
19
As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos
oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute
mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise
- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o
cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que
A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19
A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o
trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe
quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar
com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de
banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe
pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo
Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um
grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir
ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados
da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia
por um nuacutemero reduzido de vagas
Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo
saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por
um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria
condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses
19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33
20
trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de
induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade
Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu
entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria
seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas
vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece
Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20
A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves
induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos
perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas
de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para
Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida
Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como
citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este
processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de
Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande
decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio
Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do
IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que
formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho
atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores
mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que
permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram
como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras
atividades tambeacutem inconstantes
A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em
2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que
residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo
por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos
20
JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
21
sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)
estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos
produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no
transporte e venda de mercadorias21
O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os
trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira
produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no
contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria
e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas
Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua
forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de
escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma
grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de
mercadorias criminalizado como contrabando
O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online
Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o
narcotraacuteficordquo aponta que
Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122
A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida
com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que
almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores
apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os
21
CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013
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oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando
permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute
associada a comprar roupas e tecircnis de marca
O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a
intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda
de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre
alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para
frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc
No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses
trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego
Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso
Frederico afirma que
Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23
A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da
agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em
segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees
No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este
processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas
nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica
quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo
Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24
23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
23
Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo
para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O
trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do
patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo
lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos
trabalhadores pela induacutestria ele me diz que
Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25
Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural
da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas
relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar
com essa nova dinacircmica
Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo
visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas
vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se
aproxima da percepccedilatildeo de Carlos
Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26
Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para
ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes
se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio
trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as
ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que
pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha
25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11
24
trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem
trabalho
Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe
complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho
pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida
que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram
Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no
campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e
trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte
das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave
trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a
perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura
Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27
Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de
alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute
registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses
trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas
A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade
de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As
oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um
maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa
condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos
desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor
a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado
O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos
Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo
Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa
27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10
25
Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28
Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas
anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do
empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da
cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram
nesse processo
O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho
financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para
empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a
demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de
trabalhadores agrave disposiccedilatildeo
Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no
municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do
empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor
produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que
A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29
Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos
gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por
ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e
possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio
A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees
municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno
28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM
26
desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos
proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e
do APL do vestuaacuterio na cidade 31
No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi
substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e
mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e
vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa
aacutereardquo
Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do
Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos
profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes
tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o
interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo
de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores
tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo
foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal
finalidade
De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho
rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da
folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo
A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como
Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes
Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o
municiacutepio de Terra Roxa
30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
27
Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34
O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de
trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda
continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila
tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de
garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno
dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o
campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre
os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal
As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma
alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida
ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores
possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -
com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou
outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por
perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista
dentre outros natildeo os oferece
Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes
trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de
classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de
melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no
ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a
trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em
outra cidade ela me disse que
Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35
34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
28
Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave
mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem
organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de
novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar
com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as
expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita
vantagem assimrdquo
Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para
Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se
demo na faacutebricardquo36
Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram
trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar
mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia
com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando
pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que
Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37
Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter
voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no
campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em
Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que
natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar
36 IDEM 37 IDEM
29
As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila
pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com
a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma
mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila
natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na
narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do
casal
Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas
construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril
Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho
na faacutebrica ela me disse que
Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38
Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que
gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as
dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores
preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica
ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na
avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em
conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho
O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como
Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos
indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em
casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria
Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista
Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim
38 IDEM
30
de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por
menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes
oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc
como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado
na Escola do Trabalho
Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o
tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram
mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias
permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas
relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais
Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns
trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de
compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas
tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa
39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
31
CAPIacuteTULO 2
TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40
Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa
natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O
municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande
polo de empregos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de
investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade
de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um
grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41
Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo
como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem
indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e
aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de
desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente
O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de
julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do
Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para
bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda
afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um
terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio
A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral
retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o
40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013
32
processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no
ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir
Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa
fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda
bebecirc pra terra roxa
Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43
A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande
destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da
cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra
Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o
municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo
queacuterdquo
No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves
transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que
este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo
sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em
resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores
Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa
industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo
enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa
Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20
principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a
43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
33
janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos
registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores
vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e
desligamento nesses setores
Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa
Meses Jan de 2003 a Jan de 2011
CBO ndash Frequumlecircncia
Admissotildees Desligamentos
Saldo
1ordm Emp
Reemp
Reint
C Prz Det
Transf
Total
Disp sem J Causa
Disp com J Causa
A Pedido
Term Contr
Aposent
Morte
Term C Prz Deter
Transf
Total
Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da
confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390
Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443
Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie
271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109
Costureira de peccedilas sob encomenda
171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em
geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio
varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina
60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio
em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina
bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas
34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27
Trabalhador agropecuaacuterio em geral
19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador
de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5
Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39
Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie
6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras
10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente
administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio
32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa
24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27
Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013
34
Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
35
Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
36
mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
37
curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
38
Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
39
que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
40
faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
48
era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
12
trajetoacuterias e experiecircncia social compartilhada nas relaccedilotildees dentro e fora das induacutestrias
de vestuaacuterio na cidade
Como um dos meacutetodos de pesquisa foi trabalhar com fontes orais considero
importante apontar algumas dificuldades que encontrei ao realizar algumas entrevistas
Mesmo o municiacutepio empregando mais de 2500 trabalhadores na induacutestria de confecccedilatildeo
minha principal dificuldade foi encontrar trabalhadores que se dispusessem a realizar as
entrevistas
Aqueles que aceitavam soacute concordavam em produzir a entrevista quando
algueacutem muito proacuteximo deles me apresentava O fato de alguns trabalhadores aceitarem
natildeo excluiu a desconfianccedila e inseguranccedila que estes possuiacuteam em relaccedilatildeo agraves entrevistas
Desta forma a inseguranccedila dos trabalhadores sobre se poderiam falar ou natildeo a
respeito de suas relaccedilotildees de trabalho juntamente com a minha falta de experiecircncia em
saber lidar com essas inseguranccedilas prejudicaram o desenvolvimento das entrevistas
As respostas ficaram limitadas ao roteiro muitas vezes limitadas ao ldquosimrdquo ou ao ldquonatildeordquo
Pois aleacutem da timidez ao saberem que estatildeo sendo gravados ainda tive que lidar com o
receio dos entrevistados ao exporem sua trajetoacuteria e condiccedilotildees de vida
As entrevistas orais natildeo foram produto de teacutecnica mas das relaccedilotildees que
consegui desenvolver com esses trabalhadores Portanto o meacutetodo de utilizar fontes
orais consiste em trabalhar com a subjetividade dos indiviacuteduos lidando com as questotildees
postas pelos entrevistados a partir de minhas proacuteprias questotildees
Neste sentido o diaacutelogo com Alessandro Portelli e com outros autores ajudou a
compreender que essa relaccedilatildeo entre entrevistado e entrevistador natildeo eacute um objetivo
muito faacutecil de ser alcanccedilado pois as pessoas reinterpretam e datildeo novos significados aos
acontecimentos passados em funccedilatildeo do que vive no presente ou espera viver Ou ainda
encobrem sentimentos e interpretaccedilotildees por censura repressatildeo temores ou pela pouca
disposiccedilatildeo em falar8
Ao utilizar a fonte oral foi importante dialogar com a produccedilatildeo de Alessandro
Portelli o qual contribuiu para a construccedilatildeo de um procedimento de anaacutelise para a
produccedilatildeo das fontes orais e do olhar lanccedilado sobre esse material O uso de tal fonte na
pesquisa permitiu o enfrentamento da dinacircmica contraditoacuteria de valores e praacuteticas que
compotildeem escolhas pressotildees e expectativas desses sujeitos sociais
8 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 p33
13
Nesse sentido permite maior visibilidade poliacutetica da classe trabalhadora com
suas divisotildees e processos de identificaccedilatildeo na condiccedilatildeo de classe compartilhada
produzindo assim uma interpretaccedilatildeo histoacuterica comprometida com o potencial de luta e
intervenccedilatildeo social desses trabalhadores Essa investigaccedilatildeo tambeacutem traz como
enfrentamento lidar com os limites dessa fonte como as dificuldades de conseguir a
aceitaccedilatildeo da gravaccedilatildeo da entrevista e contatar trabalhadores9
O intuito de usarmos a fonte oral nesta pesquisa inspira-se nesta perspectiva de
Portelli Buscamos o trabalho com as entrevista natildeo como confirmaccedilatildeo de uma ldquoteserdquo
inicial mas sim com a intenccedilatildeo de dar visibilidade agraves interpretaccedilotildees construiacutedas pelos
trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa
Para tal associamos essa documentaccedilatildeo com mateacuterias jornaliacutesticas e fichas de
inscriccedilatildeo em cursos (de corte costura e bordado) na Escola do trabalho na cidade Aleacutem
da interpretaccedilatildeo de iacutendices estatiacutesticos sobre empregabilidade atividades econocircmicas
etc
O presente trabalho estaacute estruturado em dois capiacutetulos No primeiro capiacutetulo
busquei analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agrave
induacutestria de moda bebecirc a fim de compreender os motivos que levam esses sujeitos a
perceber a expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de
melhoria e mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas e na permanecircncia em Terra Roxa
No segundo capiacutetulo busco discutir a partir das experiecircncias cotidianas e das
relaccedilotildees de trabalho desses sujeitos as possibilidades e limites das expectativas que
estes trabalhadores estabelecem em relaccedilatildeo ao trabalho na induacutestria de moda bebecirc tal
qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre o
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa10
Essa intenccedilatildeo tenta se distanciar de determinados campos analiacuteticos que
sustentam essa expansatildeo industrial como sinocircnimo de desenvolvimento arraigados
na promoccedilatildeo de certos projetos empresariais e na historicidade progressista de alguns
processos de expansatildeo urbana Ao fazer esse distanciamento o interesse eacute ampliar o
9 PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 10 As induacutestrias de Terra Roxa estatildeo inseridas no Arranjo Produtivo Local (APL) criado em 2004 para oferecer subsiacutedios e aperfeiccediloamento aos empresaacuterios O APL da moda bebecirc visa entre outros aspectos maior eficiecircncia de inserccedilatildeo dos produtos da induacutestria de vestuaacuterio no mercado maior poder de negociaccedilatildeo de preccedilo da mateacuteria-prima atraccedilatildeo de novos prestadores de serviccedilos ao municiacutepio e otimizaccedilatildeo de custos com a qualificaccedilatildeo da matildeo de obra Esse assessoramento procura oferecer ao empresariado condiccedilotildees de mercado e apoio para fixaccedilatildeo em determinadas regiotildees
14
campo de anaacutelise apresentando contradiccedilotildees e tensotildees nesse percurso dirigindo atenccedilatildeo
aos trabalhadores mais do que agrave faacutebrica e ao sistema produtivo por ele mesmo11
Ao realizar esta pesquisa minha preocupaccedilatildeo se pauta em mostrar que estes
sujeitos satildeo seres conscientes de sua posiccedilatildeo enquanto sujeitos sociais e procuro
ressaltar que estes trabalhadores fazem parte deste processo histoacuterico enquanto
indiviacuteduos ativos mesmo que indiretamente intervenham nos rumos e ritmo dessa
expansatildeo industrial
Assim busquei com este trabalho explorar a partir das narrativas dos
trabalhadores e de suas experiecircncias entender natildeo somente estes sujeitos mas as
expectativas que estes constroem e as relaccedilotildees que estabelecem com o trabalho para a
promoccedilatildeo de seus interesses
11 O trabalho de Godoy procura fazer um percurso acadecircmico das nuances e alteraccedilotildees na abordagem do universo fabril Assim como Paoli Sader e Telles recolocam alguns enfrentamentos - na percepccedilatildeo de suas atuaccedilotildees e construccedilatildeo de sentidos - para aqueles que procuram perceber os trabalhadores neste cenaacuterio operaacuterio brasileiro Ver -GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 -PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198
15
CAPIacuteTULO 1
TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc
[] Com o tempo depois que essas empresas dede crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram mais faacuteceis neacute []12
Neste capiacutetulo vamos analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente
estatildeo ou que em algum momento de suas vidas estiveram vinculados agraves induacutestrias de
confecccedilatildeo de moda bebecirc do municiacutepio de Terra Roxa- PR mas que trazem em sua
trajetoacuteria uma relaccedilatildeo com o trabalho moradia e valores advindo do campo O objetivo
eacute problematizar suas avaliaccedilotildees frente agrave ldquoexpansatildeordquo industrial do municiacutepio e como essa
dialoga com seus interesses e necessidades
Ao analisarmos algumas entrevistas de trabalhadores vinculados a estas
induacutestrias foi comum encontrar assim como na narrativa citada na epiacutegrafe deste
capiacutetulo narrativas nesta perspectiva na qual os empregos gerados pela industrializaccedilatildeo
satildeo interpretados como possibilidade de melhoria na condiccedilatildeo de vida dos
trabalhadores Percebemos assim que o municiacutepio estaacute constantemente sendo indicado
como um grande polo de empregos mas essa indicaccedilatildeo natildeo resume as ponderaccedilotildees que
fazem sobre a presenccedila industrial em Terra Roxa - porque tambeacutem apontam elementos
que contradizem essa presenccedila
Buscaremos entatildeo dialogar com as fontes orais produzidas com trabalhadores
que se relacionaram com induacutestria de confecccedilatildeo procurando discutir tambeacutem alguns
trabalhos acadecircmicos que analisam praacuteticas dos trabalhadores em Terra Roxa A fim de
compreender a trajetoacuteria destes sujeitos e os motivos que os levam a perceber a
expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de melhoria e
mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas
Para compreendermos melhor estas interpretaccedilotildees fez-se necessaacuterio analisar o
percurso de relaccedilotildees e experiecircncias que construiacuteram Para isso foi importante
12 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
16
dimensionar a cidade na deacutecada de 1970 Momento em que se intensificou a mudanccedila
destes trabalhadores do campo para a cidade (ou ainda para outras regiotildees) ou seja este
foi um periacuteodo de mudanccedilas marcantes nas relaccedilotildees de trabalho onde morar e como
viver natildeo soacute no municiacutepio mas possiacutevel de identificar em outras cidades brasileiras
No trabalho de Ana Ameacutelia Camarano e Ricardo Abramovay haacute o interesse em
apresentar os movimentos migratoacuterios que respondem pelo processo de esvaziamento
da populaccedilatildeo rural no Brasil Os autores observam que ateacute 1980 houve um crescimento
absoluto do saldo populacional que deixou as aacutereas rurais brasileiras Aproximadamente
40 da populaccedilatildeo que vivia nas aacutereas rurais no comeccedilo dos anos 70 migraram nessa
deacutecada O fluxo que deixou o campo nos anos 80 tambeacutem foi expressivo 13 de todos
os que viviam no meio rural em 1980 saiacuteram durante esse periacuteodo o que representou
aproximadamente 13 milhotildees de pessoas13
Em termos nacionais a intensidade do movimento de desruralizaccedilatildeo segundo
os autores parece natildeo ter diminuiacutedo muito nos uacuteltimos 50 anos Entre 1950 e 1980 as
aacutereas rurais das regiotildees Sudeste e Sul forneceram um volume expressivo de novos
moradores para as aacutereas urbanas14 Para os autores como realizavam a pesquisa em fins
da deacutecada de 1990 suas impressotildees indicavam uma continuidade desse processo
Desde 1950 a cada 10 anos um em cada trecircs brasileiros vivendo no meio rural opta pela emigraccedilatildeo Os anos 90 natildeo arrefeceram em muito esta tendecircncia se as taxas de evasatildeo do meio rural observadas entre 1990 e 1995 persistirem pelo restante da deacutecada quase 30 dos brasileiros que entatildeo viviam no campo em 1990 teratildeo mudado seu local de residecircncia na virada do milecircnio15
Ainda que os autores analisem no campo da geografia demograacutefica apoiando-se
na noccedilatildeo de ecircxodo rural estes trazem ldquoo modo de vida no campordquo como incocircmodo para
a realizaccedilatildeo da pesquisa traduzido nas movimentaccedilotildees desses brasileiros entre o campo
e a cidade alteraccedilotildees natildeo soacute espaciais mas no modo como vivem e enfrentam
determinadas relaccedilotildees de poder
Estes se movimentam de acordo com as expectativas e interesses que produzem
como necessidades reorganizando as relaccedilotildees de trabalho e modos de vida diante de
pressotildees de reestruturaccedilatildeo da produccedilatildeo e da ocupaccedilatildeo das aacutereas rurais brasileiras da
13 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 14 IBIDEM 15 IBIDEM p 6
17
segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual
natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na
promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo
De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970
aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do
municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as
principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos
Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio
exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX
Graacutefico 1
Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)
Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e
principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a
distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando
Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de
1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea
urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave
expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de
vestuaacuterio moda bebecirc
16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013
18
Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no
municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo
urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e
insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo
na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e
incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola
em moldes capitalistas na cidade 17
A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas
unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha
o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade
em muitos casos diretamente com o consumidor
Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que
discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em
Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo
provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que
Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18
No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da
populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente
ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da
maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio
alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo
aponta um processo tranquilo
17
GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18
FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9
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As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos
oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute
mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise
- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o
cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que
A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19
A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o
trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe
quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar
com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de
banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe
pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo
Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um
grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir
ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados
da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia
por um nuacutemero reduzido de vagas
Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo
saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por
um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria
condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses
19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33
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trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de
induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade
Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu
entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria
seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas
vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece
Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20
A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves
induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos
perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas
de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para
Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida
Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como
citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este
processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de
Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande
decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio
Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do
IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que
formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho
atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores
mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que
permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram
como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras
atividades tambeacutem inconstantes
A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em
2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que
residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo
por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos
20
JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)
estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos
produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no
transporte e venda de mercadorias21
O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os
trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira
produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no
contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria
e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas
Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua
forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de
escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma
grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de
mercadorias criminalizado como contrabando
O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online
Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o
narcotraacuteficordquo aponta que
Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122
A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida
com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que
almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores
apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os
21
CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013
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oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando
permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute
associada a comprar roupas e tecircnis de marca
O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a
intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda
de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre
alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para
frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc
No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses
trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego
Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso
Frederico afirma que
Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23
A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da
agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em
segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees
No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este
processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas
nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica
quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo
Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24
23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo
para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O
trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do
patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo
lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos
trabalhadores pela induacutestria ele me diz que
Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25
Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural
da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas
relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar
com essa nova dinacircmica
Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo
visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas
vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se
aproxima da percepccedilatildeo de Carlos
Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26
Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para
ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes
se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio
trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as
ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que
pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha
25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11
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trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem
trabalho
Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe
complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho
pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida
que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram
Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no
campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e
trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte
das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave
trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a
perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura
Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27
Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de
alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute
registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses
trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas
A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade
de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As
oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um
maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa
condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos
desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor
a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado
O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos
Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo
Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa
27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10
25
Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28
Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas
anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do
empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da
cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram
nesse processo
O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho
financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para
empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a
demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de
trabalhadores agrave disposiccedilatildeo
Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no
municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do
empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor
produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que
A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29
Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos
gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por
ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e
possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio
A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees
municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno
28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM
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desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos
proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e
do APL do vestuaacuterio na cidade 31
No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi
substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e
mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e
vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa
aacutereardquo
Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do
Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos
profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes
tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o
interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo
de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores
tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo
foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal
finalidade
De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho
rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da
folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo
A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como
Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes
Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o
municiacutepio de Terra Roxa
30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
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Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34
O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de
trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda
continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila
tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de
garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno
dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o
campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre
os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal
As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma
alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida
ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores
possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -
com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou
outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por
perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista
dentre outros natildeo os oferece
Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes
trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de
classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de
melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no
ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a
trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em
outra cidade ela me disse que
Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35
34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave
mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem
organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de
novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar
com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as
expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita
vantagem assimrdquo
Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para
Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se
demo na faacutebricardquo36
Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram
trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar
mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia
com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando
pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que
Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37
Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter
voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no
campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em
Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que
natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar
36 IDEM 37 IDEM
29
As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila
pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com
a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma
mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila
natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na
narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do
casal
Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas
construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril
Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho
na faacutebrica ela me disse que
Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38
Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que
gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as
dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores
preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica
ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na
avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em
conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho
O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como
Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos
indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em
casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria
Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista
Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim
38 IDEM
30
de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por
menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes
oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc
como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado
na Escola do Trabalho
Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o
tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram
mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias
permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas
relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais
Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns
trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de
compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas
tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa
39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
31
CAPIacuteTULO 2
TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40
Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa
natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O
municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande
polo de empregos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de
investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade
de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um
grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41
Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo
como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem
indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e
aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de
desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente
O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de
julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do
Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para
bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda
afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um
terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio
A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral
retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o
40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013
32
processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no
ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir
Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa
fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda
bebecirc pra terra roxa
Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43
A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande
destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da
cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra
Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o
municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo
queacuterdquo
No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves
transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que
este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo
sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em
resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores
Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa
industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo
enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa
Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20
principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a
43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
33
janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos
registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores
vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e
desligamento nesses setores
Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa
Meses Jan de 2003 a Jan de 2011
CBO ndash Frequumlecircncia
Admissotildees Desligamentos
Saldo
1ordm Emp
Reemp
Reint
C Prz Det
Transf
Total
Disp sem J Causa
Disp com J Causa
A Pedido
Term Contr
Aposent
Morte
Term C Prz Deter
Transf
Total
Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da
confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390
Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443
Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie
271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109
Costureira de peccedilas sob encomenda
171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em
geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio
varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina
60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio
em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina
bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas
34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27
Trabalhador agropecuaacuterio em geral
19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador
de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5
Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39
Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie
6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras
10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente
administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio
32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa
24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27
Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013
34
Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
35
Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
36
mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
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curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
38
Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
40
faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
45
Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
46
Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
47
Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
48
era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
13
Nesse sentido permite maior visibilidade poliacutetica da classe trabalhadora com
suas divisotildees e processos de identificaccedilatildeo na condiccedilatildeo de classe compartilhada
produzindo assim uma interpretaccedilatildeo histoacuterica comprometida com o potencial de luta e
intervenccedilatildeo social desses trabalhadores Essa investigaccedilatildeo tambeacutem traz como
enfrentamento lidar com os limites dessa fonte como as dificuldades de conseguir a
aceitaccedilatildeo da gravaccedilatildeo da entrevista e contatar trabalhadores9
O intuito de usarmos a fonte oral nesta pesquisa inspira-se nesta perspectiva de
Portelli Buscamos o trabalho com as entrevista natildeo como confirmaccedilatildeo de uma ldquoteserdquo
inicial mas sim com a intenccedilatildeo de dar visibilidade agraves interpretaccedilotildees construiacutedas pelos
trabalhadores que se vincularam agraves induacutestrias de moda bebecirc em Terra Roxa
Para tal associamos essa documentaccedilatildeo com mateacuterias jornaliacutesticas e fichas de
inscriccedilatildeo em cursos (de corte costura e bordado) na Escola do trabalho na cidade Aleacutem
da interpretaccedilatildeo de iacutendices estatiacutesticos sobre empregabilidade atividades econocircmicas
etc
O presente trabalho estaacute estruturado em dois capiacutetulos No primeiro capiacutetulo
busquei analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agrave
induacutestria de moda bebecirc a fim de compreender os motivos que levam esses sujeitos a
perceber a expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de
melhoria e mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas e na permanecircncia em Terra Roxa
No segundo capiacutetulo busco discutir a partir das experiecircncias cotidianas e das
relaccedilotildees de trabalho desses sujeitos as possibilidades e limites das expectativas que
estes trabalhadores estabelecem em relaccedilatildeo ao trabalho na induacutestria de moda bebecirc tal
qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre o
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa10
Essa intenccedilatildeo tenta se distanciar de determinados campos analiacuteticos que
sustentam essa expansatildeo industrial como sinocircnimo de desenvolvimento arraigados
na promoccedilatildeo de certos projetos empresariais e na historicidade progressista de alguns
processos de expansatildeo urbana Ao fazer esse distanciamento o interesse eacute ampliar o
9 PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 10 As induacutestrias de Terra Roxa estatildeo inseridas no Arranjo Produtivo Local (APL) criado em 2004 para oferecer subsiacutedios e aperfeiccediloamento aos empresaacuterios O APL da moda bebecirc visa entre outros aspectos maior eficiecircncia de inserccedilatildeo dos produtos da induacutestria de vestuaacuterio no mercado maior poder de negociaccedilatildeo de preccedilo da mateacuteria-prima atraccedilatildeo de novos prestadores de serviccedilos ao municiacutepio e otimizaccedilatildeo de custos com a qualificaccedilatildeo da matildeo de obra Esse assessoramento procura oferecer ao empresariado condiccedilotildees de mercado e apoio para fixaccedilatildeo em determinadas regiotildees
14
campo de anaacutelise apresentando contradiccedilotildees e tensotildees nesse percurso dirigindo atenccedilatildeo
aos trabalhadores mais do que agrave faacutebrica e ao sistema produtivo por ele mesmo11
Ao realizar esta pesquisa minha preocupaccedilatildeo se pauta em mostrar que estes
sujeitos satildeo seres conscientes de sua posiccedilatildeo enquanto sujeitos sociais e procuro
ressaltar que estes trabalhadores fazem parte deste processo histoacuterico enquanto
indiviacuteduos ativos mesmo que indiretamente intervenham nos rumos e ritmo dessa
expansatildeo industrial
Assim busquei com este trabalho explorar a partir das narrativas dos
trabalhadores e de suas experiecircncias entender natildeo somente estes sujeitos mas as
expectativas que estes constroem e as relaccedilotildees que estabelecem com o trabalho para a
promoccedilatildeo de seus interesses
11 O trabalho de Godoy procura fazer um percurso acadecircmico das nuances e alteraccedilotildees na abordagem do universo fabril Assim como Paoli Sader e Telles recolocam alguns enfrentamentos - na percepccedilatildeo de suas atuaccedilotildees e construccedilatildeo de sentidos - para aqueles que procuram perceber os trabalhadores neste cenaacuterio operaacuterio brasileiro Ver -GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 -PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198
15
CAPIacuteTULO 1
TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc
[] Com o tempo depois que essas empresas dede crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram mais faacuteceis neacute []12
Neste capiacutetulo vamos analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente
estatildeo ou que em algum momento de suas vidas estiveram vinculados agraves induacutestrias de
confecccedilatildeo de moda bebecirc do municiacutepio de Terra Roxa- PR mas que trazem em sua
trajetoacuteria uma relaccedilatildeo com o trabalho moradia e valores advindo do campo O objetivo
eacute problematizar suas avaliaccedilotildees frente agrave ldquoexpansatildeordquo industrial do municiacutepio e como essa
dialoga com seus interesses e necessidades
Ao analisarmos algumas entrevistas de trabalhadores vinculados a estas
induacutestrias foi comum encontrar assim como na narrativa citada na epiacutegrafe deste
capiacutetulo narrativas nesta perspectiva na qual os empregos gerados pela industrializaccedilatildeo
satildeo interpretados como possibilidade de melhoria na condiccedilatildeo de vida dos
trabalhadores Percebemos assim que o municiacutepio estaacute constantemente sendo indicado
como um grande polo de empregos mas essa indicaccedilatildeo natildeo resume as ponderaccedilotildees que
fazem sobre a presenccedila industrial em Terra Roxa - porque tambeacutem apontam elementos
que contradizem essa presenccedila
Buscaremos entatildeo dialogar com as fontes orais produzidas com trabalhadores
que se relacionaram com induacutestria de confecccedilatildeo procurando discutir tambeacutem alguns
trabalhos acadecircmicos que analisam praacuteticas dos trabalhadores em Terra Roxa A fim de
compreender a trajetoacuteria destes sujeitos e os motivos que os levam a perceber a
expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de melhoria e
mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas
Para compreendermos melhor estas interpretaccedilotildees fez-se necessaacuterio analisar o
percurso de relaccedilotildees e experiecircncias que construiacuteram Para isso foi importante
12 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
16
dimensionar a cidade na deacutecada de 1970 Momento em que se intensificou a mudanccedila
destes trabalhadores do campo para a cidade (ou ainda para outras regiotildees) ou seja este
foi um periacuteodo de mudanccedilas marcantes nas relaccedilotildees de trabalho onde morar e como
viver natildeo soacute no municiacutepio mas possiacutevel de identificar em outras cidades brasileiras
No trabalho de Ana Ameacutelia Camarano e Ricardo Abramovay haacute o interesse em
apresentar os movimentos migratoacuterios que respondem pelo processo de esvaziamento
da populaccedilatildeo rural no Brasil Os autores observam que ateacute 1980 houve um crescimento
absoluto do saldo populacional que deixou as aacutereas rurais brasileiras Aproximadamente
40 da populaccedilatildeo que vivia nas aacutereas rurais no comeccedilo dos anos 70 migraram nessa
deacutecada O fluxo que deixou o campo nos anos 80 tambeacutem foi expressivo 13 de todos
os que viviam no meio rural em 1980 saiacuteram durante esse periacuteodo o que representou
aproximadamente 13 milhotildees de pessoas13
Em termos nacionais a intensidade do movimento de desruralizaccedilatildeo segundo
os autores parece natildeo ter diminuiacutedo muito nos uacuteltimos 50 anos Entre 1950 e 1980 as
aacutereas rurais das regiotildees Sudeste e Sul forneceram um volume expressivo de novos
moradores para as aacutereas urbanas14 Para os autores como realizavam a pesquisa em fins
da deacutecada de 1990 suas impressotildees indicavam uma continuidade desse processo
Desde 1950 a cada 10 anos um em cada trecircs brasileiros vivendo no meio rural opta pela emigraccedilatildeo Os anos 90 natildeo arrefeceram em muito esta tendecircncia se as taxas de evasatildeo do meio rural observadas entre 1990 e 1995 persistirem pelo restante da deacutecada quase 30 dos brasileiros que entatildeo viviam no campo em 1990 teratildeo mudado seu local de residecircncia na virada do milecircnio15
Ainda que os autores analisem no campo da geografia demograacutefica apoiando-se
na noccedilatildeo de ecircxodo rural estes trazem ldquoo modo de vida no campordquo como incocircmodo para
a realizaccedilatildeo da pesquisa traduzido nas movimentaccedilotildees desses brasileiros entre o campo
e a cidade alteraccedilotildees natildeo soacute espaciais mas no modo como vivem e enfrentam
determinadas relaccedilotildees de poder
Estes se movimentam de acordo com as expectativas e interesses que produzem
como necessidades reorganizando as relaccedilotildees de trabalho e modos de vida diante de
pressotildees de reestruturaccedilatildeo da produccedilatildeo e da ocupaccedilatildeo das aacutereas rurais brasileiras da
13 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 14 IBIDEM 15 IBIDEM p 6
17
segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual
natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na
promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo
De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970
aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do
municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as
principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos
Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio
exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX
Graacutefico 1
Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)
Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e
principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a
distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando
Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de
1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea
urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave
expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de
vestuaacuterio moda bebecirc
16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013
18
Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no
municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo
urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e
insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo
na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e
incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola
em moldes capitalistas na cidade 17
A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas
unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha
o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade
em muitos casos diretamente com o consumidor
Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que
discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em
Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo
provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que
Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18
No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da
populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente
ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da
maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio
alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo
aponta um processo tranquilo
17
GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18
FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9
19
As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos
oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute
mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise
- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o
cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que
A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19
A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o
trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe
quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar
com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de
banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe
pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo
Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um
grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir
ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados
da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia
por um nuacutemero reduzido de vagas
Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo
saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por
um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria
condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses
19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33
20
trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de
induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade
Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu
entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria
seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas
vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece
Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20
A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves
induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos
perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas
de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para
Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida
Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como
citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este
processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de
Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande
decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio
Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do
IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que
formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho
atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores
mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que
permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram
como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras
atividades tambeacutem inconstantes
A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em
2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que
residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo
por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos
20
JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
21
sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)
estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos
produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no
transporte e venda de mercadorias21
O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os
trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira
produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no
contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria
e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas
Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua
forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de
escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma
grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de
mercadorias criminalizado como contrabando
O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online
Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o
narcotraacuteficordquo aponta que
Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122
A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida
com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que
almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores
apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os
21
CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013
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oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando
permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute
associada a comprar roupas e tecircnis de marca
O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a
intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda
de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre
alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para
frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc
No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses
trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego
Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso
Frederico afirma que
Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23
A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da
agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em
segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees
No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este
processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas
nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica
quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo
Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24
23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
23
Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo
para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O
trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do
patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo
lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos
trabalhadores pela induacutestria ele me diz que
Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25
Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural
da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas
relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar
com essa nova dinacircmica
Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo
visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas
vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se
aproxima da percepccedilatildeo de Carlos
Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26
Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para
ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes
se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio
trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as
ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que
pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha
25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11
24
trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem
trabalho
Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe
complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho
pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida
que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram
Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no
campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e
trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte
das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave
trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a
perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura
Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27
Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de
alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute
registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses
trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas
A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade
de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As
oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um
maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa
condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos
desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor
a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado
O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos
Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo
Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa
27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10
25
Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28
Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas
anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do
empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da
cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram
nesse processo
O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho
financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para
empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a
demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de
trabalhadores agrave disposiccedilatildeo
Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no
municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do
empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor
produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que
A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29
Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos
gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por
ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e
possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio
A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees
municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno
28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM
26
desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos
proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e
do APL do vestuaacuterio na cidade 31
No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi
substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e
mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e
vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa
aacutereardquo
Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do
Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos
profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes
tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o
interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo
de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores
tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo
foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal
finalidade
De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho
rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da
folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo
A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como
Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes
Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o
municiacutepio de Terra Roxa
30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
27
Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34
O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de
trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda
continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila
tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de
garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno
dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o
campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre
os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal
As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma
alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida
ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores
possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -
com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou
outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por
perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista
dentre outros natildeo os oferece
Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes
trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de
classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de
melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no
ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a
trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em
outra cidade ela me disse que
Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35
34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
28
Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave
mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem
organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de
novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar
com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as
expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita
vantagem assimrdquo
Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para
Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se
demo na faacutebricardquo36
Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram
trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar
mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia
com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando
pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que
Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37
Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter
voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no
campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em
Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que
natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar
36 IDEM 37 IDEM
29
As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila
pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com
a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma
mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila
natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na
narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do
casal
Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas
construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril
Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho
na faacutebrica ela me disse que
Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38
Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que
gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as
dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores
preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica
ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na
avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em
conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho
O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como
Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos
indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em
casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria
Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista
Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim
38 IDEM
30
de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por
menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes
oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc
como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado
na Escola do Trabalho
Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o
tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram
mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias
permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas
relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais
Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns
trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de
compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas
tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa
39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
31
CAPIacuteTULO 2
TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40
Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa
natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O
municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande
polo de empregos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de
investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade
de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um
grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41
Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo
como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem
indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e
aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de
desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente
O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de
julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do
Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para
bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda
afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um
terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio
A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral
retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o
40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013
32
processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no
ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir
Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa
fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda
bebecirc pra terra roxa
Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43
A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande
destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da
cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra
Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o
municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo
queacuterdquo
No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves
transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que
este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo
sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em
resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores
Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa
industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo
enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa
Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20
principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a
43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
33
janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos
registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores
vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e
desligamento nesses setores
Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa
Meses Jan de 2003 a Jan de 2011
CBO ndash Frequumlecircncia
Admissotildees Desligamentos
Saldo
1ordm Emp
Reemp
Reint
C Prz Det
Transf
Total
Disp sem J Causa
Disp com J Causa
A Pedido
Term Contr
Aposent
Morte
Term C Prz Deter
Transf
Total
Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da
confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390
Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443
Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie
271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109
Costureira de peccedilas sob encomenda
171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em
geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio
varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina
60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio
em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina
bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas
34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27
Trabalhador agropecuaacuterio em geral
19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador
de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5
Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39
Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie
6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras
10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente
administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio
32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa
24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27
Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013
34
Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
35
Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
36
mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
37
curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
40
faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
41
que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
42
Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
43
Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
45
Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
46
Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
47
Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
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era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
14
campo de anaacutelise apresentando contradiccedilotildees e tensotildees nesse percurso dirigindo atenccedilatildeo
aos trabalhadores mais do que agrave faacutebrica e ao sistema produtivo por ele mesmo11
Ao realizar esta pesquisa minha preocupaccedilatildeo se pauta em mostrar que estes
sujeitos satildeo seres conscientes de sua posiccedilatildeo enquanto sujeitos sociais e procuro
ressaltar que estes trabalhadores fazem parte deste processo histoacuterico enquanto
indiviacuteduos ativos mesmo que indiretamente intervenham nos rumos e ritmo dessa
expansatildeo industrial
Assim busquei com este trabalho explorar a partir das narrativas dos
trabalhadores e de suas experiecircncias entender natildeo somente estes sujeitos mas as
expectativas que estes constroem e as relaccedilotildees que estabelecem com o trabalho para a
promoccedilatildeo de seus interesses
11 O trabalho de Godoy procura fazer um percurso acadecircmico das nuances e alteraccedilotildees na abordagem do universo fabril Assim como Paoli Sader e Telles recolocam alguns enfrentamentos - na percepccedilatildeo de suas atuaccedilotildees e construccedilatildeo de sentidos - para aqueles que procuram perceber os trabalhadores neste cenaacuterio operaacuterio brasileiro Ver -GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 -PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198
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CAPIacuteTULO 1
TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc
[] Com o tempo depois que essas empresas dede crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram mais faacuteceis neacute []12
Neste capiacutetulo vamos analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente
estatildeo ou que em algum momento de suas vidas estiveram vinculados agraves induacutestrias de
confecccedilatildeo de moda bebecirc do municiacutepio de Terra Roxa- PR mas que trazem em sua
trajetoacuteria uma relaccedilatildeo com o trabalho moradia e valores advindo do campo O objetivo
eacute problematizar suas avaliaccedilotildees frente agrave ldquoexpansatildeordquo industrial do municiacutepio e como essa
dialoga com seus interesses e necessidades
Ao analisarmos algumas entrevistas de trabalhadores vinculados a estas
induacutestrias foi comum encontrar assim como na narrativa citada na epiacutegrafe deste
capiacutetulo narrativas nesta perspectiva na qual os empregos gerados pela industrializaccedilatildeo
satildeo interpretados como possibilidade de melhoria na condiccedilatildeo de vida dos
trabalhadores Percebemos assim que o municiacutepio estaacute constantemente sendo indicado
como um grande polo de empregos mas essa indicaccedilatildeo natildeo resume as ponderaccedilotildees que
fazem sobre a presenccedila industrial em Terra Roxa - porque tambeacutem apontam elementos
que contradizem essa presenccedila
Buscaremos entatildeo dialogar com as fontes orais produzidas com trabalhadores
que se relacionaram com induacutestria de confecccedilatildeo procurando discutir tambeacutem alguns
trabalhos acadecircmicos que analisam praacuteticas dos trabalhadores em Terra Roxa A fim de
compreender a trajetoacuteria destes sujeitos e os motivos que os levam a perceber a
expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de melhoria e
mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas
Para compreendermos melhor estas interpretaccedilotildees fez-se necessaacuterio analisar o
percurso de relaccedilotildees e experiecircncias que construiacuteram Para isso foi importante
12 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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dimensionar a cidade na deacutecada de 1970 Momento em que se intensificou a mudanccedila
destes trabalhadores do campo para a cidade (ou ainda para outras regiotildees) ou seja este
foi um periacuteodo de mudanccedilas marcantes nas relaccedilotildees de trabalho onde morar e como
viver natildeo soacute no municiacutepio mas possiacutevel de identificar em outras cidades brasileiras
No trabalho de Ana Ameacutelia Camarano e Ricardo Abramovay haacute o interesse em
apresentar os movimentos migratoacuterios que respondem pelo processo de esvaziamento
da populaccedilatildeo rural no Brasil Os autores observam que ateacute 1980 houve um crescimento
absoluto do saldo populacional que deixou as aacutereas rurais brasileiras Aproximadamente
40 da populaccedilatildeo que vivia nas aacutereas rurais no comeccedilo dos anos 70 migraram nessa
deacutecada O fluxo que deixou o campo nos anos 80 tambeacutem foi expressivo 13 de todos
os que viviam no meio rural em 1980 saiacuteram durante esse periacuteodo o que representou
aproximadamente 13 milhotildees de pessoas13
Em termos nacionais a intensidade do movimento de desruralizaccedilatildeo segundo
os autores parece natildeo ter diminuiacutedo muito nos uacuteltimos 50 anos Entre 1950 e 1980 as
aacutereas rurais das regiotildees Sudeste e Sul forneceram um volume expressivo de novos
moradores para as aacutereas urbanas14 Para os autores como realizavam a pesquisa em fins
da deacutecada de 1990 suas impressotildees indicavam uma continuidade desse processo
Desde 1950 a cada 10 anos um em cada trecircs brasileiros vivendo no meio rural opta pela emigraccedilatildeo Os anos 90 natildeo arrefeceram em muito esta tendecircncia se as taxas de evasatildeo do meio rural observadas entre 1990 e 1995 persistirem pelo restante da deacutecada quase 30 dos brasileiros que entatildeo viviam no campo em 1990 teratildeo mudado seu local de residecircncia na virada do milecircnio15
Ainda que os autores analisem no campo da geografia demograacutefica apoiando-se
na noccedilatildeo de ecircxodo rural estes trazem ldquoo modo de vida no campordquo como incocircmodo para
a realizaccedilatildeo da pesquisa traduzido nas movimentaccedilotildees desses brasileiros entre o campo
e a cidade alteraccedilotildees natildeo soacute espaciais mas no modo como vivem e enfrentam
determinadas relaccedilotildees de poder
Estes se movimentam de acordo com as expectativas e interesses que produzem
como necessidades reorganizando as relaccedilotildees de trabalho e modos de vida diante de
pressotildees de reestruturaccedilatildeo da produccedilatildeo e da ocupaccedilatildeo das aacutereas rurais brasileiras da
13 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 14 IBIDEM 15 IBIDEM p 6
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segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual
natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na
promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo
De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970
aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do
municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as
principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos
Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio
exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX
Graacutefico 1
Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)
Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e
principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a
distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando
Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de
1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea
urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave
expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de
vestuaacuterio moda bebecirc
16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013
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Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no
municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo
urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e
insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo
na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e
incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola
em moldes capitalistas na cidade 17
A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas
unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha
o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade
em muitos casos diretamente com o consumidor
Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que
discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em
Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo
provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que
Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18
No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da
populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente
ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da
maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio
alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo
aponta um processo tranquilo
17
GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18
FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9
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As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos
oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute
mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise
- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o
cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que
A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19
A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o
trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe
quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar
com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de
banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe
pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo
Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um
grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir
ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados
da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia
por um nuacutemero reduzido de vagas
Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo
saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por
um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria
condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses
19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33
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trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de
induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade
Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu
entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria
seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas
vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece
Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20
A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves
induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos
perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas
de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para
Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida
Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como
citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este
processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de
Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande
decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio
Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do
IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que
formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho
atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores
mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que
permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram
como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras
atividades tambeacutem inconstantes
A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em
2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que
residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo
por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos
20
JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
21
sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)
estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos
produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no
transporte e venda de mercadorias21
O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os
trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira
produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no
contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria
e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas
Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua
forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de
escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma
grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de
mercadorias criminalizado como contrabando
O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online
Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o
narcotraacuteficordquo aponta que
Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122
A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida
com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que
almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores
apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os
21
CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013
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oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando
permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute
associada a comprar roupas e tecircnis de marca
O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a
intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda
de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre
alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para
frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc
No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses
trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego
Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso
Frederico afirma que
Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23
A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da
agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em
segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees
No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este
processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas
nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica
quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo
Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24
23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
23
Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo
para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O
trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do
patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo
lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos
trabalhadores pela induacutestria ele me diz que
Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25
Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural
da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas
relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar
com essa nova dinacircmica
Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo
visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas
vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se
aproxima da percepccedilatildeo de Carlos
Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26
Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para
ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes
se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio
trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as
ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que
pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha
25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11
24
trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem
trabalho
Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe
complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho
pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida
que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram
Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no
campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e
trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte
das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave
trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a
perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura
Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27
Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de
alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute
registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses
trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas
A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade
de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As
oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um
maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa
condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos
desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor
a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado
O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos
Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo
Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa
27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10
25
Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28
Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas
anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do
empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da
cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram
nesse processo
O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho
financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para
empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a
demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de
trabalhadores agrave disposiccedilatildeo
Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no
municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do
empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor
produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que
A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29
Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos
gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por
ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e
possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio
A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees
municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno
28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM
26
desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos
proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e
do APL do vestuaacuterio na cidade 31
No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi
substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e
mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e
vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa
aacutereardquo
Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do
Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos
profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes
tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o
interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo
de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores
tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo
foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal
finalidade
De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho
rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da
folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo
A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como
Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes
Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o
municiacutepio de Terra Roxa
30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
27
Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34
O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de
trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda
continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila
tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de
garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno
dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o
campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre
os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal
As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma
alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida
ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores
possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -
com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou
outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por
perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista
dentre outros natildeo os oferece
Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes
trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de
classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de
melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no
ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a
trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em
outra cidade ela me disse que
Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35
34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
28
Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave
mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem
organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de
novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar
com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as
expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita
vantagem assimrdquo
Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para
Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se
demo na faacutebricardquo36
Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram
trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar
mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia
com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando
pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que
Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37
Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter
voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no
campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em
Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que
natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar
36 IDEM 37 IDEM
29
As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila
pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com
a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma
mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila
natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na
narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do
casal
Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas
construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril
Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho
na faacutebrica ela me disse que
Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38
Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que
gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as
dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores
preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica
ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na
avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em
conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho
O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como
Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos
indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em
casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria
Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista
Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim
38 IDEM
30
de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por
menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes
oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc
como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado
na Escola do Trabalho
Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o
tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram
mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias
permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas
relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais
Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns
trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de
compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas
tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa
39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
31
CAPIacuteTULO 2
TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40
Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa
natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O
municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande
polo de empregos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de
investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade
de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um
grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41
Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo
como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem
indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e
aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de
desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente
O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de
julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do
Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para
bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda
afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um
terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio
A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral
retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o
40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013
32
processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no
ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir
Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa
fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda
bebecirc pra terra roxa
Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43
A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande
destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da
cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra
Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o
municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo
queacuterdquo
No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves
transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que
este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo
sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em
resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores
Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa
industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo
enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa
Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20
principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a
43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
33
janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos
registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores
vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e
desligamento nesses setores
Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa
Meses Jan de 2003 a Jan de 2011
CBO ndash Frequumlecircncia
Admissotildees Desligamentos
Saldo
1ordm Emp
Reemp
Reint
C Prz Det
Transf
Total
Disp sem J Causa
Disp com J Causa
A Pedido
Term Contr
Aposent
Morte
Term C Prz Deter
Transf
Total
Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da
confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390
Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443
Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie
271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109
Costureira de peccedilas sob encomenda
171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em
geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio
varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina
60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio
em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina
bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas
34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27
Trabalhador agropecuaacuterio em geral
19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador
de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5
Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39
Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie
6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras
10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente
administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio
32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa
24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27
Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013
34
Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
35
Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
36
mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
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curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
38
Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
40
faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
41
que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
42
Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
43
Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
44
industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
45
Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
46
Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
47
Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
48
era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
15
CAPIacuteTULO 1
TRABALHADORES ENTRE O CAMPO E A MODA BEBEcirc
[] Com o tempo depois que essas empresas dede crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram mais faacuteceis neacute []12
Neste capiacutetulo vamos analisar a trajetoacuteria dos trabalhadores que atualmente
estatildeo ou que em algum momento de suas vidas estiveram vinculados agraves induacutestrias de
confecccedilatildeo de moda bebecirc do municiacutepio de Terra Roxa- PR mas que trazem em sua
trajetoacuteria uma relaccedilatildeo com o trabalho moradia e valores advindo do campo O objetivo
eacute problematizar suas avaliaccedilotildees frente agrave ldquoexpansatildeordquo industrial do municiacutepio e como essa
dialoga com seus interesses e necessidades
Ao analisarmos algumas entrevistas de trabalhadores vinculados a estas
induacutestrias foi comum encontrar assim como na narrativa citada na epiacutegrafe deste
capiacutetulo narrativas nesta perspectiva na qual os empregos gerados pela industrializaccedilatildeo
satildeo interpretados como possibilidade de melhoria na condiccedilatildeo de vida dos
trabalhadores Percebemos assim que o municiacutepio estaacute constantemente sendo indicado
como um grande polo de empregos mas essa indicaccedilatildeo natildeo resume as ponderaccedilotildees que
fazem sobre a presenccedila industrial em Terra Roxa - porque tambeacutem apontam elementos
que contradizem essa presenccedila
Buscaremos entatildeo dialogar com as fontes orais produzidas com trabalhadores
que se relacionaram com induacutestria de confecccedilatildeo procurando discutir tambeacutem alguns
trabalhos acadecircmicos que analisam praacuteticas dos trabalhadores em Terra Roxa A fim de
compreender a trajetoacuteria destes sujeitos e os motivos que os levam a perceber a
expansatildeo industrial da confecccedilatildeo infantil como uma possibilidade de melhoria e
mudanccedila nas condiccedilotildees de suas vidas
Para compreendermos melhor estas interpretaccedilotildees fez-se necessaacuterio analisar o
percurso de relaccedilotildees e experiecircncias que construiacuteram Para isso foi importante
12 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
16
dimensionar a cidade na deacutecada de 1970 Momento em que se intensificou a mudanccedila
destes trabalhadores do campo para a cidade (ou ainda para outras regiotildees) ou seja este
foi um periacuteodo de mudanccedilas marcantes nas relaccedilotildees de trabalho onde morar e como
viver natildeo soacute no municiacutepio mas possiacutevel de identificar em outras cidades brasileiras
No trabalho de Ana Ameacutelia Camarano e Ricardo Abramovay haacute o interesse em
apresentar os movimentos migratoacuterios que respondem pelo processo de esvaziamento
da populaccedilatildeo rural no Brasil Os autores observam que ateacute 1980 houve um crescimento
absoluto do saldo populacional que deixou as aacutereas rurais brasileiras Aproximadamente
40 da populaccedilatildeo que vivia nas aacutereas rurais no comeccedilo dos anos 70 migraram nessa
deacutecada O fluxo que deixou o campo nos anos 80 tambeacutem foi expressivo 13 de todos
os que viviam no meio rural em 1980 saiacuteram durante esse periacuteodo o que representou
aproximadamente 13 milhotildees de pessoas13
Em termos nacionais a intensidade do movimento de desruralizaccedilatildeo segundo
os autores parece natildeo ter diminuiacutedo muito nos uacuteltimos 50 anos Entre 1950 e 1980 as
aacutereas rurais das regiotildees Sudeste e Sul forneceram um volume expressivo de novos
moradores para as aacutereas urbanas14 Para os autores como realizavam a pesquisa em fins
da deacutecada de 1990 suas impressotildees indicavam uma continuidade desse processo
Desde 1950 a cada 10 anos um em cada trecircs brasileiros vivendo no meio rural opta pela emigraccedilatildeo Os anos 90 natildeo arrefeceram em muito esta tendecircncia se as taxas de evasatildeo do meio rural observadas entre 1990 e 1995 persistirem pelo restante da deacutecada quase 30 dos brasileiros que entatildeo viviam no campo em 1990 teratildeo mudado seu local de residecircncia na virada do milecircnio15
Ainda que os autores analisem no campo da geografia demograacutefica apoiando-se
na noccedilatildeo de ecircxodo rural estes trazem ldquoo modo de vida no campordquo como incocircmodo para
a realizaccedilatildeo da pesquisa traduzido nas movimentaccedilotildees desses brasileiros entre o campo
e a cidade alteraccedilotildees natildeo soacute espaciais mas no modo como vivem e enfrentam
determinadas relaccedilotildees de poder
Estes se movimentam de acordo com as expectativas e interesses que produzem
como necessidades reorganizando as relaccedilotildees de trabalho e modos de vida diante de
pressotildees de reestruturaccedilatildeo da produccedilatildeo e da ocupaccedilatildeo das aacutereas rurais brasileiras da
13 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 14 IBIDEM 15 IBIDEM p 6
17
segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual
natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na
promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo
De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970
aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do
municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as
principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos
Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio
exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX
Graacutefico 1
Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)
Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e
principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a
distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando
Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de
1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea
urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave
expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de
vestuaacuterio moda bebecirc
16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013
18
Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no
municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo
urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e
insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo
na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e
incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola
em moldes capitalistas na cidade 17
A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas
unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha
o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade
em muitos casos diretamente com o consumidor
Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que
discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em
Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo
provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que
Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18
No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da
populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente
ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da
maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio
alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo
aponta um processo tranquilo
17
GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18
FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9
19
As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos
oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute
mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise
- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o
cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que
A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19
A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o
trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe
quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar
com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de
banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe
pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo
Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um
grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir
ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados
da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia
por um nuacutemero reduzido de vagas
Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo
saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por
um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria
condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses
19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33
20
trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de
induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade
Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu
entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria
seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas
vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece
Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20
A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves
induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos
perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas
de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para
Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida
Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como
citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este
processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de
Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande
decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio
Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do
IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que
formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho
atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores
mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que
permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram
como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras
atividades tambeacutem inconstantes
A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em
2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que
residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo
por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos
20
JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
21
sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)
estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos
produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no
transporte e venda de mercadorias21
O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os
trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira
produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no
contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria
e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas
Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua
forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de
escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma
grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de
mercadorias criminalizado como contrabando
O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online
Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o
narcotraacuteficordquo aponta que
Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122
A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida
com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que
almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores
apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os
21
CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013
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oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando
permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute
associada a comprar roupas e tecircnis de marca
O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a
intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda
de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre
alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para
frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc
No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses
trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego
Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso
Frederico afirma que
Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23
A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da
agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em
segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees
No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este
processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas
nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica
quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo
Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24
23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
23
Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo
para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O
trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do
patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo
lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos
trabalhadores pela induacutestria ele me diz que
Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25
Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural
da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas
relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar
com essa nova dinacircmica
Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo
visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas
vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se
aproxima da percepccedilatildeo de Carlos
Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26
Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para
ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes
se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio
trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as
ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que
pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha
25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11
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trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem
trabalho
Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe
complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho
pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida
que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram
Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no
campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e
trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte
das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave
trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a
perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura
Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27
Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de
alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute
registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses
trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas
A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade
de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As
oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um
maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa
condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos
desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor
a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado
O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos
Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo
Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa
27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10
25
Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28
Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas
anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do
empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da
cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram
nesse processo
O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho
financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para
empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a
demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de
trabalhadores agrave disposiccedilatildeo
Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no
municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do
empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor
produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que
A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29
Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos
gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por
ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e
possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio
A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees
municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno
28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM
26
desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos
proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e
do APL do vestuaacuterio na cidade 31
No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi
substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e
mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e
vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa
aacutereardquo
Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do
Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos
profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes
tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o
interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo
de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores
tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo
foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal
finalidade
De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho
rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da
folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo
A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como
Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes
Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o
municiacutepio de Terra Roxa
30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
27
Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34
O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de
trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda
continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila
tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de
garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno
dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o
campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre
os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal
As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma
alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida
ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores
possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -
com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou
outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por
perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista
dentre outros natildeo os oferece
Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes
trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de
classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de
melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no
ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a
trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em
outra cidade ela me disse que
Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35
34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
28
Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave
mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem
organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de
novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar
com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as
expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita
vantagem assimrdquo
Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para
Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se
demo na faacutebricardquo36
Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram
trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar
mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia
com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando
pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que
Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37
Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter
voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no
campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em
Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que
natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar
36 IDEM 37 IDEM
29
As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila
pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com
a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma
mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila
natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na
narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do
casal
Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas
construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril
Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho
na faacutebrica ela me disse que
Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38
Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que
gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as
dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores
preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica
ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na
avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em
conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho
O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como
Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos
indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em
casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria
Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista
Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim
38 IDEM
30
de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por
menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes
oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc
como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado
na Escola do Trabalho
Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o
tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram
mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias
permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas
relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais
Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns
trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de
compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas
tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa
39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
31
CAPIacuteTULO 2
TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40
Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa
natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O
municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande
polo de empregos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de
investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade
de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um
grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41
Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo
como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem
indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e
aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de
desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente
O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de
julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do
Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para
bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda
afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um
terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio
A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral
retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o
40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013
32
processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no
ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir
Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa
fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda
bebecirc pra terra roxa
Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43
A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande
destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da
cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra
Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o
municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo
queacuterdquo
No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves
transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que
este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo
sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em
resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores
Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa
industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo
enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa
Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20
principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a
43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
33
janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos
registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores
vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e
desligamento nesses setores
Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa
Meses Jan de 2003 a Jan de 2011
CBO ndash Frequumlecircncia
Admissotildees Desligamentos
Saldo
1ordm Emp
Reemp
Reint
C Prz Det
Transf
Total
Disp sem J Causa
Disp com J Causa
A Pedido
Term Contr
Aposent
Morte
Term C Prz Deter
Transf
Total
Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da
confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390
Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443
Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie
271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109
Costureira de peccedilas sob encomenda
171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em
geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio
varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina
60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio
em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina
bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas
34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27
Trabalhador agropecuaacuterio em geral
19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador
de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5
Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39
Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie
6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras
10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente
administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio
32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa
24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27
Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013
34
Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
35
Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
36
mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
37
curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
38
Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
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era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
16
dimensionar a cidade na deacutecada de 1970 Momento em que se intensificou a mudanccedila
destes trabalhadores do campo para a cidade (ou ainda para outras regiotildees) ou seja este
foi um periacuteodo de mudanccedilas marcantes nas relaccedilotildees de trabalho onde morar e como
viver natildeo soacute no municiacutepio mas possiacutevel de identificar em outras cidades brasileiras
No trabalho de Ana Ameacutelia Camarano e Ricardo Abramovay haacute o interesse em
apresentar os movimentos migratoacuterios que respondem pelo processo de esvaziamento
da populaccedilatildeo rural no Brasil Os autores observam que ateacute 1980 houve um crescimento
absoluto do saldo populacional que deixou as aacutereas rurais brasileiras Aproximadamente
40 da populaccedilatildeo que vivia nas aacutereas rurais no comeccedilo dos anos 70 migraram nessa
deacutecada O fluxo que deixou o campo nos anos 80 tambeacutem foi expressivo 13 de todos
os que viviam no meio rural em 1980 saiacuteram durante esse periacuteodo o que representou
aproximadamente 13 milhotildees de pessoas13
Em termos nacionais a intensidade do movimento de desruralizaccedilatildeo segundo
os autores parece natildeo ter diminuiacutedo muito nos uacuteltimos 50 anos Entre 1950 e 1980 as
aacutereas rurais das regiotildees Sudeste e Sul forneceram um volume expressivo de novos
moradores para as aacutereas urbanas14 Para os autores como realizavam a pesquisa em fins
da deacutecada de 1990 suas impressotildees indicavam uma continuidade desse processo
Desde 1950 a cada 10 anos um em cada trecircs brasileiros vivendo no meio rural opta pela emigraccedilatildeo Os anos 90 natildeo arrefeceram em muito esta tendecircncia se as taxas de evasatildeo do meio rural observadas entre 1990 e 1995 persistirem pelo restante da deacutecada quase 30 dos brasileiros que entatildeo viviam no campo em 1990 teratildeo mudado seu local de residecircncia na virada do milecircnio15
Ainda que os autores analisem no campo da geografia demograacutefica apoiando-se
na noccedilatildeo de ecircxodo rural estes trazem ldquoo modo de vida no campordquo como incocircmodo para
a realizaccedilatildeo da pesquisa traduzido nas movimentaccedilotildees desses brasileiros entre o campo
e a cidade alteraccedilotildees natildeo soacute espaciais mas no modo como vivem e enfrentam
determinadas relaccedilotildees de poder
Estes se movimentam de acordo com as expectativas e interesses que produzem
como necessidades reorganizando as relaccedilotildees de trabalho e modos de vida diante de
pressotildees de reestruturaccedilatildeo da produccedilatildeo e da ocupaccedilatildeo das aacutereas rurais brasileiras da
13 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de Pesquisa Econocircmica Aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 14 IBIDEM 15 IBIDEM p 6
17
segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual
natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na
promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo
De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970
aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do
municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as
principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos
Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio
exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX
Graacutefico 1
Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)
Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e
principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a
distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando
Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de
1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea
urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave
expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de
vestuaacuterio moda bebecirc
16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013
18
Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no
municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo
urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e
insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo
na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e
incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola
em moldes capitalistas na cidade 17
A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas
unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha
o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade
em muitos casos diretamente com o consumidor
Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que
discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em
Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo
provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que
Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18
No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da
populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente
ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da
maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio
alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo
aponta um processo tranquilo
17
GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18
FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9
19
As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos
oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute
mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise
- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o
cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que
A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19
A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o
trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe
quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar
com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de
banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe
pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo
Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um
grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir
ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados
da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia
por um nuacutemero reduzido de vagas
Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo
saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por
um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria
condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses
19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33
20
trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de
induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade
Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu
entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria
seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas
vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece
Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20
A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves
induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos
perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas
de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para
Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida
Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como
citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este
processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de
Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande
decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio
Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do
IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que
formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho
atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores
mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que
permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram
como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras
atividades tambeacutem inconstantes
A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em
2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que
residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo
por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos
20
JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
21
sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)
estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos
produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no
transporte e venda de mercadorias21
O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os
trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira
produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no
contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria
e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas
Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua
forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de
escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma
grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de
mercadorias criminalizado como contrabando
O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online
Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o
narcotraacuteficordquo aponta que
Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122
A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida
com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que
almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores
apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os
21
CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013
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oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando
permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute
associada a comprar roupas e tecircnis de marca
O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a
intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda
de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre
alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para
frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc
No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses
trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego
Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso
Frederico afirma que
Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23
A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da
agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em
segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees
No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este
processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas
nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica
quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo
Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24
23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
23
Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo
para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O
trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do
patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo
lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos
trabalhadores pela induacutestria ele me diz que
Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25
Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural
da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas
relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar
com essa nova dinacircmica
Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo
visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas
vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se
aproxima da percepccedilatildeo de Carlos
Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26
Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para
ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes
se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio
trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as
ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que
pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha
25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11
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trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem
trabalho
Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe
complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho
pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida
que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram
Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no
campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e
trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte
das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave
trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a
perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura
Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27
Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de
alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute
registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses
trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas
A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade
de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As
oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um
maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa
condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos
desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor
a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado
O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos
Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo
Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa
27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10
25
Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28
Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas
anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do
empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da
cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram
nesse processo
O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho
financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para
empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a
demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de
trabalhadores agrave disposiccedilatildeo
Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no
municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do
empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor
produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que
A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29
Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos
gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por
ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e
possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio
A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees
municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno
28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM
26
desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos
proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e
do APL do vestuaacuterio na cidade 31
No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi
substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e
mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e
vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa
aacutereardquo
Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do
Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos
profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes
tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o
interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo
de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores
tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo
foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal
finalidade
De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho
rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da
folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo
A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como
Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes
Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o
municiacutepio de Terra Roxa
30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
27
Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34
O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de
trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda
continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila
tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de
garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno
dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o
campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre
os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal
As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma
alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida
ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores
possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -
com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou
outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por
perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista
dentre outros natildeo os oferece
Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes
trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de
classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de
melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no
ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a
trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em
outra cidade ela me disse que
Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35
34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
28
Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave
mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem
organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de
novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar
com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as
expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita
vantagem assimrdquo
Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para
Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se
demo na faacutebricardquo36
Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram
trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar
mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia
com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando
pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que
Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37
Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter
voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no
campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em
Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que
natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar
36 IDEM 37 IDEM
29
As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila
pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com
a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma
mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila
natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na
narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do
casal
Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas
construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril
Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho
na faacutebrica ela me disse que
Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38
Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que
gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as
dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores
preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica
ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na
avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em
conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho
O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como
Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos
indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em
casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria
Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista
Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim
38 IDEM
30
de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por
menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes
oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc
como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado
na Escola do Trabalho
Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o
tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram
mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias
permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas
relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais
Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns
trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de
compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas
tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa
39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
31
CAPIacuteTULO 2
TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40
Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa
natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O
municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande
polo de empregos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de
investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade
de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um
grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41
Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo
como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem
indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e
aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de
desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente
O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de
julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do
Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para
bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda
afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um
terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio
A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral
retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o
40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013
32
processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no
ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir
Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa
fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda
bebecirc pra terra roxa
Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43
A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande
destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da
cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra
Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o
municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo
queacuterdquo
No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves
transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que
este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo
sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em
resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores
Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa
industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo
enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa
Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20
principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a
43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
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janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos
registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores
vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e
desligamento nesses setores
Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa
Meses Jan de 2003 a Jan de 2011
CBO ndash Frequumlecircncia
Admissotildees Desligamentos
Saldo
1ordm Emp
Reemp
Reint
C Prz Det
Transf
Total
Disp sem J Causa
Disp com J Causa
A Pedido
Term Contr
Aposent
Morte
Term C Prz Deter
Transf
Total
Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da
confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390
Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443
Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie
271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109
Costureira de peccedilas sob encomenda
171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em
geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio
varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina
60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio
em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina
bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas
34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27
Trabalhador agropecuaacuterio em geral
19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador
de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5
Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39
Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie
6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras
10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente
administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio
32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa
24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27
Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013
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Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
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Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
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mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
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curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
40
faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
41
que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
42
Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
43
Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
44
industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
45
Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
46
Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
47
Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
48
era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
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segunda metade do seacuteculo XX aos dias atuais Entretanto essa rearticulaccedilatildeo desigual
natildeo retira confrontos e praacuteticas residuais que permanecem nesse processo de disputa na
promoccedilatildeo da capitalizaccedilatildeo das atividades e permanecircncia no campo
De acordo com o censo demograacutefico do IBGE16 ateacute meados da deacutecada de 1970
aproximadamente 84 da populaccedilatildeo terraroxense concentrava-se na aacuterea rural do
municiacutepio Uma evidecircncia da importacircncia desse setor e onde estavam concentradas as
principais praacuteticas de trabalho moradia e sociabilidade desses sujeitos
Como podemos observar no Graacutefico 1 as alteraccedilotildees na populaccedilatildeo do municiacutepio
exibiu (e tambeacutem exigiu) fortes alteraccedilotildees nas uacuteltimos deacutecadas do Seacutec XX
Graacutefico 1
Fonte IBGE Censo Populacional (1970 1980 1991 1996 2000 2010)
Apoacutes a deacutecada de 1970 haacute um decreacutescimo significativo na populaccedilatildeo total e
principalmente na rural do municiacutepio Podemos perceber que ateacute a deacutecada 1980 a
distinccedilatildeo entre o rural e o urbano continua ainda assim acentuada mas se aproximando
Nas deacutecadas posteriores essa relaccedilatildeo comeccedila a ter uma inversatildeo A partir da deacutecada de
1990 a populaccedilatildeo que permaneceu em Terra Roxa passa a concentrar-se mais na aacuterea
urbana do municiacutepio algo que indica outras reorganizaccedilotildees Uma delas vinculada agrave
expansatildeo agroindustrial e ao processo de investimentos no setor de induacutestria de
vestuaacuterio moda bebecirc
16 Ver lthttpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxagt Acesso em 18102013
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Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no
municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo
urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e
insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo
na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e
incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola
em moldes capitalistas na cidade 17
A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas
unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha
o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade
em muitos casos diretamente com o consumidor
Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que
discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em
Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo
provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que
Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18
No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da
populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente
ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da
maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio
alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo
aponta um processo tranquilo
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GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18
FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9
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As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos
oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute
mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise
- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o
cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que
A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19
A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o
trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe
quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar
com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de
banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe
pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo
Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um
grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir
ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados
da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia
por um nuacutemero reduzido de vagas
Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo
saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por
um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria
condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses
19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33
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trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de
induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade
Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu
entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria
seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas
vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece
Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20
A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves
induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos
perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas
de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para
Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida
Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como
citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este
processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de
Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande
decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio
Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do
IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que
formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho
atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores
mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que
permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram
como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras
atividades tambeacutem inconstantes
A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em
2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que
residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo
por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos
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JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)
estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos
produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no
transporte e venda de mercadorias21
O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os
trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira
produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no
contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria
e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas
Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua
forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de
escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma
grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de
mercadorias criminalizado como contrabando
O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online
Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o
narcotraacuteficordquo aponta que
Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122
A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida
com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que
almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores
apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os
21
CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013
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oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando
permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute
associada a comprar roupas e tecircnis de marca
O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a
intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda
de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre
alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para
frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc
No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses
trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego
Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso
Frederico afirma que
Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23
A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da
agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em
segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees
No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este
processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas
nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica
quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo
Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24
23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo
para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O
trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do
patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo
lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos
trabalhadores pela induacutestria ele me diz que
Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25
Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural
da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas
relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar
com essa nova dinacircmica
Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo
visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas
vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se
aproxima da percepccedilatildeo de Carlos
Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26
Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para
ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes
se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio
trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as
ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que
pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha
25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11
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trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem
trabalho
Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe
complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho
pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida
que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram
Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no
campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e
trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte
das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave
trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a
perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura
Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27
Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de
alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute
registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses
trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas
A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade
de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As
oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um
maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa
condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos
desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor
a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado
O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos
Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo
Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa
27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10
25
Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28
Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas
anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do
empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da
cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram
nesse processo
O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho
financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para
empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a
demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de
trabalhadores agrave disposiccedilatildeo
Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no
municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do
empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor
produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que
A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29
Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos
gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por
ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e
possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio
A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees
municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno
28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM
26
desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos
proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e
do APL do vestuaacuterio na cidade 31
No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi
substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e
mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e
vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa
aacutereardquo
Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do
Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos
profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes
tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o
interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo
de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores
tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo
foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal
finalidade
De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho
rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da
folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo
A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como
Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes
Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o
municiacutepio de Terra Roxa
30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
27
Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34
O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de
trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda
continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila
tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de
garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno
dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o
campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre
os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal
As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma
alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida
ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores
possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -
com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou
outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por
perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista
dentre outros natildeo os oferece
Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes
trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de
classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de
melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no
ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a
trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em
outra cidade ela me disse que
Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35
34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
28
Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave
mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem
organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de
novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar
com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as
expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita
vantagem assimrdquo
Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para
Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se
demo na faacutebricardquo36
Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram
trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar
mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia
com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando
pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que
Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37
Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter
voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no
campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em
Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que
natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar
36 IDEM 37 IDEM
29
As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila
pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com
a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma
mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila
natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na
narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do
casal
Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas
construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril
Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho
na faacutebrica ela me disse que
Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38
Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que
gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as
dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores
preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica
ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na
avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em
conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho
O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como
Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos
indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em
casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria
Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista
Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim
38 IDEM
30
de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por
menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes
oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc
como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado
na Escola do Trabalho
Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o
tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram
mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias
permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas
relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais
Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns
trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de
compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas
tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa
39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
31
CAPIacuteTULO 2
TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40
Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa
natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O
municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande
polo de empregos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de
investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade
de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um
grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41
Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo
como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem
indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e
aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de
desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente
O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de
julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do
Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para
bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda
afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um
terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio
A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral
retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o
40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013
32
processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no
ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir
Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa
fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda
bebecirc pra terra roxa
Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43
A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande
destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da
cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra
Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o
municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo
queacuterdquo
No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves
transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que
este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo
sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em
resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores
Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa
industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo
enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa
Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20
principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a
43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
33
janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos
registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores
vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e
desligamento nesses setores
Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa
Meses Jan de 2003 a Jan de 2011
CBO ndash Frequumlecircncia
Admissotildees Desligamentos
Saldo
1ordm Emp
Reemp
Reint
C Prz Det
Transf
Total
Disp sem J Causa
Disp com J Causa
A Pedido
Term Contr
Aposent
Morte
Term C Prz Deter
Transf
Total
Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da
confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390
Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443
Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie
271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109
Costureira de peccedilas sob encomenda
171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em
geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio
varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina
60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio
em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina
bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas
34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27
Trabalhador agropecuaacuterio em geral
19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador
de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5
Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39
Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie
6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras
10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente
administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio
32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa
24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27
Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013
34
Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
35
Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
36
mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
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curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
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era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
18
Segundo Maria Luiza Guareschi em seu trabalho sobre o uso de agrotoacutexicos no
municiacutepio de Terra Roxa esse processo de alteraccedilatildeo populacional e de concentraccedilatildeo
urbana foi resultado da intensificaccedilatildeo da utilizaccedilatildeo de maacutequinas equipamentos e
insumos quiacutemicos que provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees sociais de produccedilatildeo
na agricultura Esse processo viabilizado com o auxiacutelio do Estado creacuteditos e
incentivos de acordo com a autora promoveu a expansatildeo da grande empresa agriacutecola
em moldes capitalistas na cidade 17
A seu ver essa expansatildeo provocou a destruiccedilatildeo de milhares de pequenas
unidades de produccedilatildeo baseadas no trabalho familiar atraveacutes do qual o produtor obtinha
o produto necessaacuterio ao sustento de sua famiacutelia e comercializava o excedente na cidade
em muitos casos diretamente com o consumidor
Nesta perspectiva segue tambeacutem a interpretaccedilatildeo de Liane Adiers Frederico que
discutiu as experiecircncias de mulheres boias-frias do distrito Santa Rita DacuteOeste em
Terra Roxa A autora parte dessa avaliaccedilatildeo em que a ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo
provocou sensiacutevel modificaccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho Concluindo que
Os grandes proprietaacuterios compravam as terras de quem natildeo conseguia acompanhar todo esse processo das novas relaccedilotildees agraacuterias Ora com recursos proacuteprios ou com recursos de terceiros (financiamentos em cooperativas e bancos) eles continuaram a produzir mantendo seu patrimocircnio Assim muitos dos pequenos proprietaacuterios rurais natildeo conseguiram acompanhar as inovaccedilotildees tecnoloacutegicas fazendo com que desistissem da atividade rural e se mudassem para a zona urbana de Terra Roxa18
No entanto natildeo podemos atribuir a evasatildeo populacional ou a inversatildeo da
populaccedilatildeo rural para a urbana ndash como nos eacute demonstrado no graacutefico 1 - especificamente
ao projeto estatal de modernizaccedilatildeo do campo Eacute claro que a intensificaccedilatildeo do uso da
maquinaria pressionou este processo mas natildeo o definiu exclusivamente foi necessaacuterio
alterar as formas de relacionar-se para o trabalho e morada no campo algo que natildeo
aponta um processo tranquilo
17
GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 18
FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 p 9
19
As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos
oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute
mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise
- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o
cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que
A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19
A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o
trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe
quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar
com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de
banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe
pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo
Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um
grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir
ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados
da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia
por um nuacutemero reduzido de vagas
Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo
saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por
um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria
condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses
19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33
20
trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de
induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade
Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu
entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria
seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas
vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece
Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20
A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves
induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos
perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas
de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para
Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida
Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como
citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este
processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de
Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande
decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio
Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do
IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que
formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho
atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores
mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que
permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram
como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras
atividades tambeacutem inconstantes
A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em
2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que
residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo
por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos
20
JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
21
sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)
estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos
produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no
transporte e venda de mercadorias21
O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os
trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira
produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no
contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria
e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas
Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua
forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de
escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma
grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de
mercadorias criminalizado como contrabando
O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online
Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o
narcotraacuteficordquo aponta que
Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122
A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida
com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que
almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores
apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os
21
CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013
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oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando
permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute
associada a comprar roupas e tecircnis de marca
O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a
intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda
de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre
alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para
frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc
No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses
trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego
Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso
Frederico afirma que
Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23
A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da
agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em
segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees
No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este
processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas
nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica
quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo
Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24
23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo
para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O
trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do
patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo
lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos
trabalhadores pela induacutestria ele me diz que
Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25
Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural
da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas
relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar
com essa nova dinacircmica
Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo
visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas
vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se
aproxima da percepccedilatildeo de Carlos
Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26
Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para
ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes
se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio
trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as
ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que
pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha
25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11
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trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem
trabalho
Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe
complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho
pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida
que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram
Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no
campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e
trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte
das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave
trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a
perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura
Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27
Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de
alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute
registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses
trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas
A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade
de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As
oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um
maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa
condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos
desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor
a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado
O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos
Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo
Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa
27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10
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Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28
Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas
anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do
empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da
cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram
nesse processo
O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho
financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para
empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a
demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de
trabalhadores agrave disposiccedilatildeo
Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no
municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do
empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor
produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que
A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29
Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos
gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por
ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e
possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio
A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees
municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno
28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM
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desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos
proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e
do APL do vestuaacuterio na cidade 31
No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi
substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e
mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e
vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa
aacutereardquo
Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do
Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos
profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes
tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o
interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo
de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores
tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo
foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal
finalidade
De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho
rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da
folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo
A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como
Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes
Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o
municiacutepio de Terra Roxa
30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
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Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34
O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de
trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda
continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila
tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de
garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno
dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o
campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre
os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal
As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma
alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida
ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores
possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -
com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou
outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por
perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista
dentre outros natildeo os oferece
Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes
trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de
classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de
melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no
ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a
trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em
outra cidade ela me disse que
Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35
34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave
mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem
organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de
novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar
com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as
expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita
vantagem assimrdquo
Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para
Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se
demo na faacutebricardquo36
Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram
trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar
mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia
com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando
pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que
Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37
Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter
voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no
campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em
Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que
natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar
36 IDEM 37 IDEM
29
As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila
pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com
a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma
mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila
natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na
narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do
casal
Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas
construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril
Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho
na faacutebrica ela me disse que
Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38
Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que
gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as
dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores
preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica
ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na
avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em
conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho
O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como
Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos
indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em
casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria
Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista
Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim
38 IDEM
30
de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por
menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes
oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc
como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado
na Escola do Trabalho
Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o
tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram
mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias
permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas
relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais
Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns
trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de
compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas
tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa
39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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CAPIacuteTULO 2
TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40
Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa
natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O
municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande
polo de empregos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de
investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade
de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um
grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41
Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo
como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem
indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e
aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de
desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente
O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de
julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do
Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para
bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda
afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um
terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio
A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral
retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o
40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013
32
processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no
ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir
Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa
fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda
bebecirc pra terra roxa
Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43
A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande
destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da
cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra
Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o
municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo
queacuterdquo
No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves
transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que
este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo
sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em
resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores
Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa
industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo
enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa
Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20
principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a
43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
33
janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos
registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores
vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e
desligamento nesses setores
Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa
Meses Jan de 2003 a Jan de 2011
CBO ndash Frequumlecircncia
Admissotildees Desligamentos
Saldo
1ordm Emp
Reemp
Reint
C Prz Det
Transf
Total
Disp sem J Causa
Disp com J Causa
A Pedido
Term Contr
Aposent
Morte
Term C Prz Deter
Transf
Total
Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da
confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390
Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443
Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie
271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109
Costureira de peccedilas sob encomenda
171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em
geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio
varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina
60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio
em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina
bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas
34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27
Trabalhador agropecuaacuterio em geral
19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador
de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5
Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39
Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie
6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras
10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente
administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio
32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa
24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27
Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013
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Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
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Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
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mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
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curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
40
faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
41
que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
43
Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
45
Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
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era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
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As dificuldades nas relaccedilotildees de trabalho no campo nas uacuteltimas deacutecadas nos
oferecem outros indiacutecios para esta alteraccedilatildeo do viver no campo ou na cidade Ateacute
mesmo na produccedilatildeo de Schenato - que possui o marco da modernizaccedilatildeo para sua anaacutelise
- ao dialogar com a trabalhadora diarista Anaide durante a entrevista a fala sobre o
cotidiano do trabalhador boia-fria destaca que
A vida de ldquoboacuteia-friardquo eacute muito dura A gente levanta aacutes 400 horas da manhatilde praacute fazer almoccedilo e alguns serviccedilos Vai para o ponto de ldquoboacuteia-friardquo que eacute Bar da Ermelinda e vai de caminhatildeo aonde as pessoas querem a gente vai trabalhar Satildeo vaacuterios tipos de serviccedilo Carpir quebrar milho colher algodatildeo mas o que tem mais eacute carpir Uma das dificuldades do trabalho eacute quando a gente vai trabalhar em um sitio que natildeo tem nenhuma aacutervore a gente passa o dia todo no sol quente e a gente que eacute mulher e trabalha junto com homens no mesmo lugar natildeo tem como fazer as necessidades jaacute aconteceu de um dia todo eu ficar sem urinar porque natildeo tinha lugar onde eu me esconder Tem dias que natildeo daacute praacute trabalhar porque chove e tem eacutepocas que natildeo tem serviccedilo jaacute cheguei a ficar de dois ateacute quatro meses sem serviccedilo ai agente passa muita dificuldade O que eu gostaria para melhorar a minha vida era ter emprego fixo que quando chovesse eu pudesse trabalhar igual e receber do mesmo jeito19
A partir da fala de Anaide percebemos as incertezas e instabilidades que o
trabalho como trabalhador rural diarista representa Pois o trabalhador nunca sabe
quando chove e quantos dias do mecircs pode trabalhar O trabalhador diarista tem que lidar
com as condiccedilotildees mais adversas de trabalho e de local de trabalho (como a falta de
banheiro) Ele tem que estar disposto a realizar qualquer tipo de trabalho que lhe
pedirem como Anaide afirma ldquoSatildeo vaacuterios tipos de serviccedilordquo
Estes serviccedilos sempre requerem trabalho de forccedila braccedilal o que ocasiona um
grande desgaste fiacutesico nos trabalhadores Para tanto estes estatildeo pressionados a cumprir
ldquodireitinhordquo todas as tarefas que lhes fora pedido a fim de garantirem serem chamados
da proacutexima vez - principalmente em um processo em que intensificava a concorrecircncia
por um nuacutemero reduzido de vagas
Poreacutem de todas as dificuldades narradas pela trabalhadora agrave incerteza de natildeo
saber o quanto iraacute receber ao fim do mecircs se torna sua maior preocupaccedilatildeo A procura por
um salaacuterio fixo para ldquomelhorar a sua vidardquo entre todos outros (como a precaacuteria
condiccedilatildeo de trabalho) talvez seja um dos maiores estiacutemulos para a mudanccedila desses
19 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33
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trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de
induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade
Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu
entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria
seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas
vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece
Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20
A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves
induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos
perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas
de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para
Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida
Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como
citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este
processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de
Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande
decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio
Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do
IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que
formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho
atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores
mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que
permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram
como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras
atividades tambeacutem inconstantes
A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em
2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que
residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo
por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos
20
JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)
estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos
produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no
transporte e venda de mercadorias21
O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os
trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira
produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no
contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria
e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas
Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua
forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de
escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma
grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de
mercadorias criminalizado como contrabando
O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online
Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o
narcotraacuteficordquo aponta que
Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122
A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida
com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que
almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores
apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os
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CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013
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oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando
permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute
associada a comprar roupas e tecircnis de marca
O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a
intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda
de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre
alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para
frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc
No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses
trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego
Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso
Frederico afirma que
Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23
A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da
agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em
segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees
No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este
processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas
nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica
quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo
Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24
23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo
para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O
trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do
patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo
lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos
trabalhadores pela induacutestria ele me diz que
Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25
Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural
da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas
relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar
com essa nova dinacircmica
Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo
visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas
vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se
aproxima da percepccedilatildeo de Carlos
Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26
Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para
ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes
se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio
trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as
ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que
pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha
25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11
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trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem
trabalho
Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe
complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho
pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida
que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram
Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no
campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e
trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte
das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave
trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a
perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura
Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27
Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de
alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute
registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses
trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas
A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade
de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As
oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um
maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa
condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos
desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor
a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado
O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos
Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo
Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa
27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10
25
Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28
Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas
anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do
empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da
cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram
nesse processo
O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho
financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para
empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a
demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de
trabalhadores agrave disposiccedilatildeo
Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no
municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do
empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor
produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que
A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29
Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos
gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por
ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e
possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio
A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees
municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno
28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM
26
desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos
proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e
do APL do vestuaacuterio na cidade 31
No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi
substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e
mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e
vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa
aacutereardquo
Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do
Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos
profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes
tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o
interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo
de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores
tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo
foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal
finalidade
De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho
rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da
folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo
A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como
Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes
Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o
municiacutepio de Terra Roxa
30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
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Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34
O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de
trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda
continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila
tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de
garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno
dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o
campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre
os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal
As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma
alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida
ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores
possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -
com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou
outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por
perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista
dentre outros natildeo os oferece
Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes
trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de
classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de
melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no
ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a
trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em
outra cidade ela me disse que
Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35
34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave
mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem
organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de
novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar
com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as
expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita
vantagem assimrdquo
Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para
Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se
demo na faacutebricardquo36
Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram
trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar
mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia
com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando
pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que
Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37
Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter
voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no
campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em
Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que
natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar
36 IDEM 37 IDEM
29
As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila
pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com
a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma
mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila
natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na
narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do
casal
Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas
construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril
Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho
na faacutebrica ela me disse que
Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38
Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que
gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as
dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores
preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica
ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na
avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em
conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho
O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como
Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos
indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em
casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria
Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista
Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim
38 IDEM
30
de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por
menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes
oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc
como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado
na Escola do Trabalho
Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o
tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram
mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias
permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas
relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais
Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns
trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de
compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas
tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa
39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
31
CAPIacuteTULO 2
TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40
Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa
natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O
municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande
polo de empregos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de
investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade
de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um
grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41
Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo
como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem
indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e
aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de
desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente
O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de
julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do
Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para
bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda
afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um
terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio
A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral
retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o
40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013
32
processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no
ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir
Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa
fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda
bebecirc pra terra roxa
Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43
A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande
destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da
cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra
Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o
municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo
queacuterdquo
No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves
transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que
este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo
sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em
resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores
Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa
industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo
enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa
Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20
principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a
43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
33
janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos
registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores
vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e
desligamento nesses setores
Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa
Meses Jan de 2003 a Jan de 2011
CBO ndash Frequumlecircncia
Admissotildees Desligamentos
Saldo
1ordm Emp
Reemp
Reint
C Prz Det
Transf
Total
Disp sem J Causa
Disp com J Causa
A Pedido
Term Contr
Aposent
Morte
Term C Prz Deter
Transf
Total
Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da
confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390
Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443
Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie
271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109
Costureira de peccedilas sob encomenda
171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em
geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio
varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina
60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio
em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina
bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas
34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27
Trabalhador agropecuaacuterio em geral
19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador
de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5
Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39
Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie
6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras
10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente
administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio
32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa
24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27
Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013
34
Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
35
Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
36
mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
37
curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
38
Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
39
que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
40
faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
47
Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
48
era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
20
trabalhadores do campo para a cidade ou ainda para o trabalho nos galpotildees de
induacutestrias de moda bebecirc instalados nos distritos da cidade
Encontramos ainda em associaccedilatildeo com essa indicaccedilatildeo a narrativa do meu
entrevistado Joseacute ao questionaacute-lo sobre sua consideraccedilatildeo de que o trabalho na induacutestria
seria melhor que no campo sua narrativa nos remete agraves mudanccedilas - indicadas muitas
vezes como comodidade - que a aacuterea urbana oferece
Ah porque no campo assim eacute muito afastado da cidade neacute Daiacute na cidade tem mais comodidade mais lazer Pra estudar fazer algum curso aqui eacute mais faacutecil porque eacute dentro da cidade e laacute era muito longe20
A partir desta fala do trabalhador Joseacute de 42 anos que hoje estaacute vinculado agraves
induacutestrias de moda bebecirc mas que jaacute trabalhou no campo em uma olaria podemos
perceber que essa facilidade da cidade tambeacutem se torna uma motivaccedilatildeo As alternativas
de se especializar estudar satildeo avaliadas como maiores na cidade Isso significa para
Joseacute possibilidades de melhoria de trabalho e consequentemente de vida
Contudo o projeto estatal e empresarial de modernizaccedilatildeo do campo como
citamos anteriormente natildeo deixa de ser uma das alavancas que intensificou este
processo de mudanccedila do campo para a cidade e tambeacutem de evasatildeo populacional de
Terra Roxa como observaacutevel no graacutefico1 que traz entre 1970 e 1980 um grande
decreacutescimo na populaccedilatildeo total do municiacutepio
Terra Roxa eacute considerada atualmente de pequeno porte Conforme os iacutendices do
IBGE 2010 possui cerca de 16 mil habitantes menos da metade da populaccedilatildeo que
formava o municiacutepio na deacutecada de 1970 Na verdade natildeo haacute postos de trabalho
atrativos suficientemente capazes de suportar toda a demanda dos trabalhadores
mesmo reduzindo a taxa populacional Pequenos proprietaacuterios parceiros e diaristas que
permaneceram na cidade apoacutes as mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo tiveram
como principal alternativa o trabalho de diarista rural arrendataacuterios associado a outras
atividades tambeacutem inconstantes
A palestra proferida por Eric Gustavo Cardin no GT Mundos do Trabalho em
2013 apresenta uma pesquisa que indica outras atividades para trabalhadores que
residem em Terra Roxa que ampliam a renda desses sujeitos e concorrem na avaliaccedilatildeo
por este ou aquele trabalho Para tanto Cardin buscou discutir a partir da trajetoacuteria dos
20
JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
21
sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)
estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos
produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no
transporte e venda de mercadorias21
O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os
trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira
produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no
contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria
e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas
Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua
forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de
escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma
grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de
mercadorias criminalizado como contrabando
O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online
Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o
narcotraacuteficordquo aponta que
Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122
A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida
com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que
almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores
apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os
21
CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013
22
oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando
permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute
associada a comprar roupas e tecircnis de marca
O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a
intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda
de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre
alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para
frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc
No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses
trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego
Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso
Frederico afirma que
Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23
A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da
agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em
segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees
No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este
processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas
nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica
quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo
Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24
23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
23
Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo
para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O
trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do
patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo
lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos
trabalhadores pela induacutestria ele me diz que
Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25
Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural
da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas
relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar
com essa nova dinacircmica
Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo
visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas
vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se
aproxima da percepccedilatildeo de Carlos
Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26
Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para
ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes
se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio
trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as
ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que
pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha
25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11
24
trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem
trabalho
Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe
complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho
pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida
que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram
Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no
campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e
trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte
das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave
trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a
perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura
Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27
Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de
alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute
registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses
trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas
A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade
de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As
oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um
maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa
condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos
desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor
a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado
O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos
Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo
Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa
27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10
25
Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28
Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas
anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do
empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da
cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram
nesse processo
O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho
financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para
empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a
demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de
trabalhadores agrave disposiccedilatildeo
Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no
municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do
empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor
produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que
A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29
Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos
gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por
ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e
possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio
A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees
municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno
28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM
26
desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos
proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e
do APL do vestuaacuterio na cidade 31
No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi
substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e
mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e
vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa
aacutereardquo
Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do
Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos
profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes
tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o
interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo
de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores
tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo
foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal
finalidade
De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho
rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da
folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo
A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como
Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes
Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o
municiacutepio de Terra Roxa
30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
27
Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34
O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de
trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda
continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila
tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de
garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno
dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o
campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre
os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal
As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma
alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida
ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores
possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -
com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou
outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por
perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista
dentre outros natildeo os oferece
Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes
trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de
classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de
melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no
ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a
trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em
outra cidade ela me disse que
Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35
34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
28
Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave
mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem
organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de
novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar
com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as
expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita
vantagem assimrdquo
Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para
Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se
demo na faacutebricardquo36
Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram
trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar
mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia
com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando
pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que
Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37
Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter
voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no
campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em
Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que
natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar
36 IDEM 37 IDEM
29
As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila
pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com
a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma
mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila
natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na
narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do
casal
Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas
construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril
Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho
na faacutebrica ela me disse que
Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38
Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que
gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as
dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores
preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica
ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na
avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em
conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho
O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como
Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos
indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em
casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria
Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista
Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim
38 IDEM
30
de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por
menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes
oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc
como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado
na Escola do Trabalho
Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o
tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram
mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias
permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas
relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais
Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns
trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de
compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas
tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa
39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
31
CAPIacuteTULO 2
TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40
Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa
natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O
municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande
polo de empregos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de
investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade
de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um
grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41
Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo
como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem
indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e
aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de
desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente
O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de
julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do
Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para
bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda
afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um
terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio
A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral
retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o
40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013
32
processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no
ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir
Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa
fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda
bebecirc pra terra roxa
Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43
A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande
destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da
cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra
Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o
municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo
queacuterdquo
No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves
transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que
este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo
sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em
resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores
Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa
industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo
enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa
Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20
principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a
43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
33
janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos
registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores
vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e
desligamento nesses setores
Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa
Meses Jan de 2003 a Jan de 2011
CBO ndash Frequumlecircncia
Admissotildees Desligamentos
Saldo
1ordm Emp
Reemp
Reint
C Prz Det
Transf
Total
Disp sem J Causa
Disp com J Causa
A Pedido
Term Contr
Aposent
Morte
Term C Prz Deter
Transf
Total
Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da
confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390
Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443
Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie
271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109
Costureira de peccedilas sob encomenda
171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em
geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio
varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina
60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio
em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina
bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas
34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27
Trabalhador agropecuaacuterio em geral
19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador
de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5
Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39
Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie
6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras
10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente
administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio
32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa
24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27
Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013
34
Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
35
Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
36
mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
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curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
48
era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
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55
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56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
21
sujeitos envolvidos em sua pesquisa sobre o trabalho na fronteira (Brasil-Paraguai)
estabelecendo sempre um diaacutelogo muito direto com os saberes que estes indiviacuteduos
produzem com as trajetoacuterias que traccedilam e com as experiecircncias que acumulam no
transporte e venda de mercadorias21
O que nos chama a atenccedilatildeo na fala de Cardin eacute que ele aponta como os
trabalhadores de Terra Roxa lidam com as expectativas que o trabalho na fronteira
produz Indicando-nos como alguns trabalhadores do municiacutepio se inseriram no
contrabando buscando alternativas para uma renda maior que possibilitasse a melhoria
e a mudanccedila da condiccedilatildeo de suas vidas
Cardin afirma que os trabalhadores entrevistados por ele estatildeo no aacutepice de sua
forccedila de trabalho satildeo trabalhadores muito jovens entre 15 e 30 anos com baixo niacutevel de
escolaridade muitas vezes nem completaram o ensino fundamental Pois haacute uma
grande evasatildeo escolar em funccedilatildeo do ganho com o trabalho no transporte de
mercadorias criminalizado como contrabando
O pesquisador em entrevista para a composiccedilatildeo da reportagem do jornal online
Gazeta do povo intitulada ldquoEscolas na fronteira perdem alunos para o contrabando e o
narcotraacuteficordquo aponta que
Escolas dos municiacutepios lindeiros ao Lago de Itaipu comeccedilam a perder alunos para o contrabando e o narcotraacutefico O fenocircmeno antes restrito a Foz do Iguaccedilu cidade epicentro da criminalidade na fronteira do Brasil com o Paraguai agora se espalha com forccedila por toda a Costa Oeste paranaense Em quatro municiacutepios da regiatildeo o abandono escolar no ensino meacutedio eacute mais alto do que o patamar brasileiro que eacute de 95 Em sete deles o iacutendice supera a meacutedia paranaense de 79 conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Aniacutesio Teixeira (Inep) de 201122
A evasatildeo escolar como discuti Cardin estaacute relacionada agrave maneira faacutecil e raacutepida
com que os sujeitos que se inserem nesta praacutetica encontram de conseguirem o que
almejam Nas entrevistas que Cardin realizou com alguns deles estes trabalhadores
apontam que natildeo vecirc expectativas no estudo ou em postos de trabalho como os
21
CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponiacutevel em lthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 22 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013
22
oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando
permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute
associada a comprar roupas e tecircnis de marca
O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a
intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda
de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre
alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para
frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc
No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses
trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego
Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso
Frederico afirma que
Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23
A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da
agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em
segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees
No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este
processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas
nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica
quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo
Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24
23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
23
Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo
para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O
trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do
patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo
lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos
trabalhadores pela induacutestria ele me diz que
Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25
Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural
da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas
relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar
com essa nova dinacircmica
Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo
visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas
vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se
aproxima da percepccedilatildeo de Carlos
Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26
Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para
ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes
se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio
trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as
ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que
pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha
25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11
24
trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem
trabalho
Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe
complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho
pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida
que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram
Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no
campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e
trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte
das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave
trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a
perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura
Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27
Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de
alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute
registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses
trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas
A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade
de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As
oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um
maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa
condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos
desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor
a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado
O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos
Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo
Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa
27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10
25
Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28
Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas
anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do
empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da
cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram
nesse processo
O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho
financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para
empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a
demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de
trabalhadores agrave disposiccedilatildeo
Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no
municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do
empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor
produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que
A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29
Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos
gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por
ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e
possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio
A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees
municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno
28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM
26
desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos
proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e
do APL do vestuaacuterio na cidade 31
No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi
substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e
mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e
vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa
aacutereardquo
Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do
Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos
profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes
tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o
interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo
de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores
tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo
foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal
finalidade
De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho
rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da
folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo
A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como
Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes
Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o
municiacutepio de Terra Roxa
30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
27
Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34
O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de
trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda
continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila
tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de
garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno
dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o
campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre
os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal
As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma
alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida
ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores
possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -
com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou
outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por
perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista
dentre outros natildeo os oferece
Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes
trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de
classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de
melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no
ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a
trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em
outra cidade ela me disse que
Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35
34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
28
Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave
mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem
organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de
novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar
com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as
expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita
vantagem assimrdquo
Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para
Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se
demo na faacutebricardquo36
Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram
trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar
mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia
com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando
pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que
Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37
Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter
voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no
campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em
Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que
natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar
36 IDEM 37 IDEM
29
As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila
pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com
a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma
mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila
natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na
narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do
casal
Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas
construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril
Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho
na faacutebrica ela me disse que
Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38
Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que
gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as
dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores
preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica
ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na
avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em
conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho
O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como
Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos
indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em
casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria
Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista
Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim
38 IDEM
30
de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por
menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes
oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc
como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado
na Escola do Trabalho
Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o
tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram
mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias
permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas
relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais
Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns
trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de
compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas
tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa
39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
31
CAPIacuteTULO 2
TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40
Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa
natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O
municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande
polo de empregos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de
investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade
de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um
grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41
Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo
como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem
indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e
aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de
desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente
O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de
julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do
Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para
bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda
afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um
terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio
A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral
retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o
40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013
32
processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no
ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir
Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa
fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda
bebecirc pra terra roxa
Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43
A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande
destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da
cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra
Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o
municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo
queacuterdquo
No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves
transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que
este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo
sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em
resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores
Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa
industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo
enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa
Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20
principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a
43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
33
janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos
registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores
vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e
desligamento nesses setores
Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa
Meses Jan de 2003 a Jan de 2011
CBO ndash Frequumlecircncia
Admissotildees Desligamentos
Saldo
1ordm Emp
Reemp
Reint
C Prz Det
Transf
Total
Disp sem J Causa
Disp com J Causa
A Pedido
Term Contr
Aposent
Morte
Term C Prz Deter
Transf
Total
Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da
confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390
Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443
Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie
271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109
Costureira de peccedilas sob encomenda
171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em
geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio
varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina
60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio
em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina
bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas
34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27
Trabalhador agropecuaacuterio em geral
19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador
de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5
Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39
Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie
6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras
10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente
administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio
32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa
24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27
Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013
34
Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
35
Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
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mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
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curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
43
Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
47
Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
48
era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
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55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
22
oferecidos nas induacutestrias e no trabalho de diaristas no campo Pois o contrabando
permite de forma muito mais raacutepida a ldquoascensatildeo socialrdquo que muitas vezes estaacute
associada a comprar roupas e tecircnis de marca
O que pretendemos ressaltar com a indicaccedilatildeo de Cardin eacute que apoacutes a
intensificaccedilatildeo das mudanccedilas nas relaccedilotildees de trabalho no campo e expansatildeo da demanda
de mercadorias advindas do Paraguai o contrabando tornou-se uma dentre
alternativas para os trabalhadores de Terra Roxa que tambeacutem se direcionam para
frigoriacuteficos em cidades vizinhas etc
No entanto com o processo de ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo o uso desses
trabalhadores deixou de ser utilizado em grande escala ocasionando desemprego
Muitos trabalhadores ficaram sujeitos a uma situaccedilatildeo de subempregados Sobre isso
Frederico afirma que
Os maquinaacuterios tambeacutem abalaram o trabalho volante pois o boacuteia-fria foi substituiacutedo pela maacutequina Onde antes se precisava de muita matildeo-de-obra para realizar determinada atividade rural com a ldquomodernizaccedilatildeo da agriculturardquo e com o uso de implementos agriacutecolas muito potentes foi se trocando a matildeo-de-obra pela maacutequina23
A explicaccedilatildeo de Frederico segue na perspectiva de que a mecanizaccedilatildeo da
agricultara foi o uacutenico elemento para a evasatildeo desses trabalhadores deixando em
segunda plano as relaccedilotildees contraditoacuterias e conflituosas que permearam tais alteraccedilotildees
No entanto como jaacute trouxemos anteriormente haacute outros indiacutecios que percorreram este
processo que dizem respeito agrave interpretaccedilatildeo dos trabalhadores frente a tais mudanccedilas
nas suas relaccedilotildees de trabalho Como a narrativa da trabalhadora Berenice nos indica
quando pergunto sobre a opccedilatildeo de alguns trabalhadores deixarem o trabalho no campo
Porque na roccedila tipo assim eacute um serviccedilo ali que se chuvecirc vocecirc natildeo trabaia e tipo assim vocecirc natildeo eacute registrado cecirc natildeo tem a garantia que aquilo laacute vai ter todo mecircs Porque tipo assim se vocecirc trabaia uma semana cecirc natildeo vai duas neacute Por causa do tempo depende muito do tempo e depende muito tameacutem de lugar porque tem muita gente que natildeo aguenta o sol eacute muito quente durante o dia Ai eacute onde a pessoa acaba optando de ir pra um serviccedilo mais melhor que eacute trabaia debaixo de uma sombra chega em casa limpo que nem a tia falocirc entendeu Natildeo chega que na roccedila eacute muito cansativo chega tudo queimada chega suja come a comida gelada eacute difiacutecil24
23 FREDERICO Liane Adiers Op cit p 10 24 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
23
Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo
para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O
trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do
patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo
lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos
trabalhadores pela induacutestria ele me diz que
Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25
Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural
da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas
relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar
com essa nova dinacircmica
Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo
visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas
vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se
aproxima da percepccedilatildeo de Carlos
Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26
Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para
ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes
se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio
trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as
ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que
pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha
25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11
24
trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem
trabalho
Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe
complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho
pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida
que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram
Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no
campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e
trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte
das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave
trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a
perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura
Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27
Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de
alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute
registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses
trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas
A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade
de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As
oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um
maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa
condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos
desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor
a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado
O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos
Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo
Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa
27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10
25
Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28
Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas
anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do
empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da
cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram
nesse processo
O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho
financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para
empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a
demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de
trabalhadores agrave disposiccedilatildeo
Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no
municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do
empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor
produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que
A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29
Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos
gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por
ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e
possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio
A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees
municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno
28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM
26
desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos
proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e
do APL do vestuaacuterio na cidade 31
No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi
substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e
mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e
vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa
aacutereardquo
Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do
Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos
profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes
tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o
interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo
de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores
tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo
foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal
finalidade
De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho
rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da
folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo
A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como
Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes
Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o
municiacutepio de Terra Roxa
30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
27
Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34
O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de
trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda
continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila
tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de
garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno
dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o
campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre
os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal
As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma
alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida
ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores
possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -
com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou
outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por
perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista
dentre outros natildeo os oferece
Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes
trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de
classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de
melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no
ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a
trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em
outra cidade ela me disse que
Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35
34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
28
Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave
mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem
organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de
novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar
com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as
expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita
vantagem assimrdquo
Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para
Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se
demo na faacutebricardquo36
Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram
trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar
mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia
com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando
pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que
Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37
Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter
voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no
campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em
Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que
natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar
36 IDEM 37 IDEM
29
As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila
pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com
a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma
mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila
natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na
narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do
casal
Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas
construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril
Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho
na faacutebrica ela me disse que
Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38
Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que
gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as
dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores
preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica
ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na
avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em
conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho
O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como
Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos
indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em
casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria
Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista
Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim
38 IDEM
30
de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por
menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes
oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc
como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado
na Escola do Trabalho
Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o
tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram
mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias
permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas
relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais
Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns
trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de
compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas
tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa
39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
31
CAPIacuteTULO 2
TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40
Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa
natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O
municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande
polo de empregos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de
investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade
de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um
grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41
Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo
como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem
indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e
aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de
desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente
O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de
julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do
Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para
bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda
afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um
terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio
A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral
retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o
40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013
32
processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no
ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir
Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa
fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda
bebecirc pra terra roxa
Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43
A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande
destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da
cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra
Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o
municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo
queacuterdquo
No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves
transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que
este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo
sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em
resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores
Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa
industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo
enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa
Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20
principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a
43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
33
janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos
registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores
vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e
desligamento nesses setores
Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa
Meses Jan de 2003 a Jan de 2011
CBO ndash Frequumlecircncia
Admissotildees Desligamentos
Saldo
1ordm Emp
Reemp
Reint
C Prz Det
Transf
Total
Disp sem J Causa
Disp com J Causa
A Pedido
Term Contr
Aposent
Morte
Term C Prz Deter
Transf
Total
Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da
confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390
Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443
Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie
271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109
Costureira de peccedilas sob encomenda
171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em
geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio
varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina
60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio
em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina
bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas
34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27
Trabalhador agropecuaacuterio em geral
19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador
de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5
Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39
Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie
6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras
10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente
administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio
32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa
24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27
Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013
34
Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
35
Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
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mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
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curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
43
Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
47
Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
48
era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
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55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
23
Na fala de Berenice podemos perceber que a mudanccedila do trabalhador do campo
para a cidade pode estar relacionada agrave busca por uma condiccedilatildeo melhor de trabalho O
trabalhador rural ao mudar para a cidade perdendo a possibilidade de viver na terra do
patratildeo busca tambeacutem um trabalho que lhe proporcione ldquobenefiacuteciosrdquo que o anterior natildeo
lhe oferecia Poreacutem quando indago o trabalhador Carlos sobre a ldquopreferecircnciardquo dos
trabalhadores pela induacutestria ele me diz que
Hoje sim neacute Porque hoje a roccedila eacute mais mecanizada neacute Entatildeo pra vocecirc carpir uma roccedila Tu natildeo vai carpir mais uma roccedila vocecirc vai passar veneno Hoje quem predomina mais eacute quem tem maquinaacuterio as coisas assim neacute A matildeo de obra mesmo assim humana eacute mais escassa neacute25
Observamos na fala do trabalhador uma noccedilatildeo distinta da explicaccedilatildeo estrutural
da modernizaccedilatildeo no campo ele fala desse processo de mecanizaccedilatildeo e mudanccedila nas
relaccedilotildees de trabalho mas indicando como os trabalhadores viram e atuaram ao lidar
com essa nova dinacircmica
Muitos desses trabalhadores observaram (e ainda observam) este processo
visando novas possibilidades para melhoria das condiccedilotildees de seu trabalho e de suas
vidas Na obra de Frederico ela traz a narrativa de uma trabalhadora diarista que se
aproxima da percepccedilatildeo de Carlos
Ah Agora a vantagem a terra eacute mais limpa jaacute natildeo tem mais aquele perigo de encontrar mais com cobra essas coisas assim bicho qualquer Entatildeo agora estaacute mais limpo porque o veneno tambeacutem ajuda bastante [] Aiacute eacute ser a vantagem eacute que agora estaacute mais limpo que antes que antes era muita coisa era demais Mas se gente natildeo fizesse bonito mesmo a gente ficava sem trabalho26
Na narrativa da trabalhadora fica clara a vantagem do uso de agrotoacutexicos para
ela Estes aleacutem de auxiliarem na diminuiccedilatildeo de animais peccedilonhentos que muitas vezes
se tornavam um perigo para os trabalhadores rurais diminuem tambeacutem o proacuteprio
trabalho que a diarista teria em capinar a terra Nota-se que ela apesar de todas as
ldquodesvantagensrdquo da ldquomodernizaccedilatildeo do campordquo vecirc neste processo a melhoria mesmo que
pequena nas condiccedilotildees de seu trabalho - pois avalia que o periacuteodo em que tinha
25 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011 26 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p11
24
trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem
trabalho
Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe
complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho
pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida
que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram
Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no
campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e
trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte
das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave
trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a
perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura
Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27
Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de
alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute
registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses
trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas
A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade
de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As
oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um
maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa
condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos
desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor
a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado
O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos
Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo
Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa
27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10
25
Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28
Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas
anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do
empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da
cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram
nesse processo
O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho
financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para
empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a
demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de
trabalhadores agrave disposiccedilatildeo
Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no
municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do
empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor
produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que
A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29
Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos
gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por
ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e
possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio
A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees
municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno
28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM
26
desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos
proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e
do APL do vestuaacuterio na cidade 31
No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi
substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e
mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e
vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa
aacutereardquo
Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do
Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos
profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes
tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o
interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo
de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores
tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo
foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal
finalidade
De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho
rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da
folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo
A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como
Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes
Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o
municiacutepio de Terra Roxa
30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
27
Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34
O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de
trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda
continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila
tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de
garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno
dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o
campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre
os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal
As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma
alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida
ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores
possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -
com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou
outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por
perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista
dentre outros natildeo os oferece
Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes
trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de
classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de
melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no
ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a
trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em
outra cidade ela me disse que
Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35
34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
28
Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave
mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem
organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de
novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar
com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as
expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita
vantagem assimrdquo
Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para
Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se
demo na faacutebricardquo36
Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram
trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar
mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia
com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando
pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que
Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37
Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter
voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no
campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em
Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que
natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar
36 IDEM 37 IDEM
29
As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila
pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com
a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma
mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila
natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na
narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do
casal
Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas
construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril
Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho
na faacutebrica ela me disse que
Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38
Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que
gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as
dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores
preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica
ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na
avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em
conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho
O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como
Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos
indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em
casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria
Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista
Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim
38 IDEM
30
de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por
menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes
oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc
como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado
na Escola do Trabalho
Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o
tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram
mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias
permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas
relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais
Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns
trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de
compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas
tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa
39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
31
CAPIacuteTULO 2
TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40
Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa
natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O
municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande
polo de empregos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de
investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade
de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um
grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41
Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo
como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem
indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e
aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de
desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente
O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de
julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do
Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para
bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda
afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um
terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio
A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral
retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o
40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013
32
processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no
ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir
Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa
fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda
bebecirc pra terra roxa
Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43
A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande
destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da
cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra
Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o
municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo
queacuterdquo
No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves
transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que
este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo
sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em
resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores
Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa
industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo
enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa
Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20
principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a
43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
33
janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos
registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores
vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e
desligamento nesses setores
Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa
Meses Jan de 2003 a Jan de 2011
CBO ndash Frequumlecircncia
Admissotildees Desligamentos
Saldo
1ordm Emp
Reemp
Reint
C Prz Det
Transf
Total
Disp sem J Causa
Disp com J Causa
A Pedido
Term Contr
Aposent
Morte
Term C Prz Deter
Transf
Total
Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da
confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390
Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443
Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie
271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109
Costureira de peccedilas sob encomenda
171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em
geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio
varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina
60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio
em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina
bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas
34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27
Trabalhador agropecuaacuterio em geral
19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador
de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5
Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39
Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie
6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras
10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente
administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio
32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa
24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27
Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013
34
Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
35
Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
36
mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
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curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
38
Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
48
era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
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55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
24
trabalho no campo tambeacutem este era disputado e caso natildeo fizesse bonito ficava sem
trabalho
Ainda que o agrotoacutexico - a meacutedio e longo prazo - tambeacutem possa trazer-lhe
complicaccedilotildees de sauacutede sua avaliaccedilatildeo associa o uso desse produto agrave reduccedilatildeo de trabalho
pesado e rendimento de sua produccedilatildeo - criteacuterio que aumento sua importacircncia agrave medida
que a concorrecircncia por essas vagas tambeacutem ampliaram
Eacute evidente no entanto que as alteraccedilotildees na dinacircmica de trabalho e produccedilatildeo no
campo reduziram as perspectivas de trabalhadores que tinham seus modos de viver e
trabalhar associados a esse processo Pois a aplicaccedilatildeo de herbicidas mata grande parte
das ervas daninhas diminuindo assim o trabalho para essa funccedilatildeo Como narra agrave
trabalhadora Diomara tambeacutem no trabalho de Frederico ao ser questionada sobre a
perda de trabalho que para a autora devia-se agrave ldquomodernizaccedilatildeo da agricultura
Mudou para pior porque o serviccedilo acabou acabou todo o serviccedilo eacute difiacutecil cada vez se fica mais pobre natildeo tem mais serviccedilo Antigamente [] nossa Na porta era cinco seis pessoas chamando vocecirc para trabalhar Vocecirc ficava ateacute dividida Porque um chamava vocecirc outro chamava Cinco seis queriam que vocecirc trabalhasse pra eles Hoje em dia [2000] natildeo tem mais [Pausa]27
Atraveacutes da narrativa da trabalhadora percebemos com clareza que o processo de
alteraccedilatildeo nas relaccedilotildees de trabalho no campo diminuiu a utilizaccedilatildeo de diaristas O que eacute
registrado pela trabalhadora diante da ausecircncia dos gatos e das possibilidades desses
trabalhadores diaristas decidirem pelos melhores pagamentos e tarefas
A procura por trabalhadores diminuiu drasticamente mesmo que a quantidade
de trabalhadores natildeo correspondesse agrave diminuiccedilatildeo de ofertas de trabalho As
oportunidades de serviccedilo foram se tornando cada vez mais escassas ocasionando um
maior empobrecimento da populaccedilatildeo terraroxense ao final da deacutecada de 1990 Essa
condiccedilatildeo associada a retirar de famiacutelias agregadas das terras fez com que muitos
desses trabalhadores se destinassem a outras cidades ou ainda comeccedilassem a se propor
a novos trabalhos como o trabalho nas induacutestrias de bordado
O secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo Moacir Carlos
Comerlatto apresenta em 2011 um panorama do municiacutepio neste periacuteodo
Se vocecirc buscar na Histoacuteria desse municiacutepio ateacute o iniacutecio dos anos 90 essa Terra Roxa talvez vocecirc natildeo estava nem nascida ainda mais essa
27 FREDERICO Liane Adiers Op Cit p 10
25
Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28
Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas
anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do
empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da
cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram
nesse processo
O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho
financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para
empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a
demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de
trabalhadores agrave disposiccedilatildeo
Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no
municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do
empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor
produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que
A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29
Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos
gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por
ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e
possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio
A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees
municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno
28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM
26
desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos
proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e
do APL do vestuaacuterio na cidade 31
No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi
substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e
mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e
vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa
aacutereardquo
Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do
Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos
profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes
tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o
interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo
de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores
tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo
foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal
finalidade
De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho
rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da
folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo
A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como
Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes
Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o
municiacutepio de Terra Roxa
30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
27
Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34
O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de
trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda
continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila
tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de
garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno
dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o
campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre
os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal
As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma
alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida
ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores
possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -
com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou
outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por
perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista
dentre outros natildeo os oferece
Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes
trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de
classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de
melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no
ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a
trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em
outra cidade ela me disse que
Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35
34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
28
Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave
mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem
organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de
novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar
com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as
expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita
vantagem assimrdquo
Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para
Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se
demo na faacutebricardquo36
Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram
trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar
mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia
com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando
pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que
Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37
Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter
voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no
campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em
Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que
natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar
36 IDEM 37 IDEM
29
As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila
pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com
a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma
mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila
natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na
narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do
casal
Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas
construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril
Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho
na faacutebrica ela me disse que
Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38
Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que
gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as
dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores
preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica
ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na
avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em
conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho
O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como
Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos
indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em
casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria
Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista
Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim
38 IDEM
30
de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por
menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes
oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc
como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado
na Escola do Trabalho
Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o
tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram
mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias
permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas
relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais
Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns
trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de
compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas
tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa
39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
31
CAPIacuteTULO 2
TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40
Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa
natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O
municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande
polo de empregos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de
investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade
de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um
grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41
Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo
como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem
indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e
aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de
desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente
O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de
julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do
Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para
bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda
afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um
terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio
A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral
retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o
40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013
32
processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no
ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir
Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa
fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda
bebecirc pra terra roxa
Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43
A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande
destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da
cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra
Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o
municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo
queacuterdquo
No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves
transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que
este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo
sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em
resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores
Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa
industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo
enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa
Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20
principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a
43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
33
janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos
registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores
vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e
desligamento nesses setores
Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa
Meses Jan de 2003 a Jan de 2011
CBO ndash Frequumlecircncia
Admissotildees Desligamentos
Saldo
1ordm Emp
Reemp
Reint
C Prz Det
Transf
Total
Disp sem J Causa
Disp com J Causa
A Pedido
Term Contr
Aposent
Morte
Term C Prz Deter
Transf
Total
Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da
confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390
Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443
Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie
271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109
Costureira de peccedilas sob encomenda
171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em
geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio
varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina
60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio
em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina
bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas
34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27
Trabalhador agropecuaacuterio em geral
19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador
de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5
Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39
Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie
6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras
10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente
administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio
32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa
24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27
Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013
34
Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
35
Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
36
mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
37
curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
38
Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
39
que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
40
faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
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era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
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55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
25
Terra Roxa era a cidade dos boias frias uma cidade pobre uma cidade com uma situaccedilatildeo muito difiacutecil uma cidade onde o poder puacuteblico chegou a ficar ai 6 ou 7 meses sem pagar os seus funcionaacuterios puacuteblicos Entatildeo o municiacutepio era um municiacutepio em decadecircncia um municiacutepio falido vamos dizer assim28
Ao procurar distinguir o momento da nova administraccedilatildeo com as deacutecadas
anteriores o secretaacuterio sugere que a falta de trabalho no municiacutepio aleacutem do
empobrecimento da populaccedilatildeo correspondeu a uma grande queda na economia da
cidade retirando os privilegiamentos e direcionamentos de atividades que ocorreram
nesse processo
O municiacutepio estava em crise natildeo havia perspectivas de trabalho e ganho
financeiro mas para quem A alternativa mais acessiacutevel e costumeira para
empregadores rurais vinculada ao trabalho de diaristas parecia natildeo suportar toda a
demanda ainda mais com baixos valores de pagamento devido ao grande nuacutemero de
trabalhadores agrave disposiccedilatildeo
Em 1990 comeccedila a despontar as primeiras induacutestrias de moda bebecirc no
municiacutepio que se vinculavam aos interesses de expansatildeo urbana e econocircmica do
empresariado e administradores municipais Sobre a noccedilatildeo de alternativa de setor
produtivo para as induacutestrias desse setor Moacir afirma que
A induacutestria da moda bebecirc ela veio ela trouxe um novo dinamismo pra nossa cidade Vocecirc pode vecirc que o municiacutepio de Terra Roxa quem passou aqui a 5 anos atraacutes e passa hoje ou passou a 10 [anos] passa hoje ou ficou 2 anos 1 ano sem visitar o municiacutepio a cada vez que vocecirc vem aqui percebe que o municiacutepio estaacute se modernizando a cidade eacute diferente Se vocecirc passar na avenida do municiacutepio as fachadas das lojas do comeacutercio ai estatildeo todas elas modernizadas todo mundo trabalhando nessa aacuterea Entatildeo houve um ganho muito grande Terra Roxa hoje eacute uma cidade em pleno desenvolvimento29
Na fala de Moacir percebemos que as induacutestrias de confecccedilatildeo e os empregos
gerados por esta vai promover uma movimentaccedilatildeo da economia da cidade indicada por
ele como ldquoum novo dinamismordquo pois as empresas e empregos geram renda e
possibilidade de consumo otimizando tambeacutem o comeacutercio
A fala do poliacutetico da cidade vem repleta da promoccedilatildeo das uacuteltimas intervenccedilotildees
municipais para apoio agraves induacutestrias de moda bebecirc Ao fazer isso retira desse pleno
28 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 29 IDEM
26
desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos
proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e
do APL do vestuaacuterio na cidade 31
No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi
substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e
mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e
vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa
aacutereardquo
Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do
Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos
profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes
tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o
interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo
de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores
tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo
foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal
finalidade
De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho
rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da
folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo
A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como
Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes
Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o
municiacutepio de Terra Roxa
30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
27
Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34
O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de
trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda
continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila
tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de
garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno
dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o
campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre
os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal
As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma
alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida
ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores
possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -
com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou
outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por
perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista
dentre outros natildeo os oferece
Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes
trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de
classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de
melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no
ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a
trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em
outra cidade ela me disse que
Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35
34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
28
Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave
mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem
organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de
novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar
com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as
expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita
vantagem assimrdquo
Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para
Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se
demo na faacutebricardquo36
Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram
trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar
mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia
com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando
pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que
Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37
Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter
voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no
campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em
Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que
natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar
36 IDEM 37 IDEM
29
As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila
pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com
a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma
mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila
natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na
narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do
casal
Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas
construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril
Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho
na faacutebrica ela me disse que
Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38
Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que
gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as
dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores
preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica
ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na
avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em
conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho
O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como
Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos
indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em
casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria
Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista
Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim
38 IDEM
30
de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por
menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes
oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc
como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado
na Escola do Trabalho
Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o
tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram
mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias
permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas
relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais
Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns
trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de
compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas
tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa
39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
31
CAPIacuteTULO 2
TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40
Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa
natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O
municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande
polo de empregos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de
investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade
de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um
grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41
Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo
como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem
indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e
aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de
desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente
O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de
julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do
Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para
bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda
afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um
terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio
A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral
retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o
40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013
32
processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no
ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir
Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa
fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda
bebecirc pra terra roxa
Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43
A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande
destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da
cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra
Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o
municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo
queacuterdquo
No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves
transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que
este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo
sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em
resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores
Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa
industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo
enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa
Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20
principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a
43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
33
janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos
registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores
vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e
desligamento nesses setores
Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa
Meses Jan de 2003 a Jan de 2011
CBO ndash Frequumlecircncia
Admissotildees Desligamentos
Saldo
1ordm Emp
Reemp
Reint
C Prz Det
Transf
Total
Disp sem J Causa
Disp com J Causa
A Pedido
Term Contr
Aposent
Morte
Term C Prz Deter
Transf
Total
Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da
confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390
Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443
Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie
271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109
Costureira de peccedilas sob encomenda
171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em
geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio
varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina
60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio
em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina
bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas
34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27
Trabalhador agropecuaacuterio em geral
19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador
de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5
Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39
Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie
6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras
10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente
administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio
32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa
24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27
Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013
34
Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
35
Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
36
mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
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curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
40
faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
41
que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
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era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
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A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
26
desenvolvimento as limitaccedilotildees experimentadas por trabalhadores e pequenos
proprietaacuterios ao se verem diante da expansatildeo dos empreendimentos agroindustriais30 e
do APL do vestuaacuterio na cidade 31
No entanto essa perspectiva leva a noccedilatildeo de que o trabalho como diarista foi
substituiacutedo pelo trabalho na induacutestria como se este uacuteltimo tivesse se extinguido e
mecanicamente contemplando os trabalhadores desempregados e advindos do trabalho e
vida no campo Jaacute que conforme o secretaacuterio ldquotodo mundo estaacute trabalhando nessa
aacutereardquo
Mas quando pergunto ao senhor Moacir tambeacutem secretaacuterio da Escola do
Trabalho se em algum momento houve dificuldades em fechar as turmas para os cursos
profissionalizantes32 ele diz que ldquohouve momentos onde haacute uns 4 ou 5 anos aiacute que noacutes
tiacutenhamos dificuldade em montar essas turmas natildeo tinha demanda a pessoa o
interessado em fazer o cursordquo33 Algo que permite observar contradiccedilotildees nesse processo
de industrializaccedilatildeo no municiacutepio desmistificando a noccedilatildeo de que os trabalhadores
tivessem se dirigido agraves faacutebricas assim que essas surgiram ou que ainda esse processo
foi plenamente aceito como melhoria para os trabalhadores e produzido para tal
finalidade
De forma que ainda hoje encontramos trabalhadores vinculados ao trabalho
rural e convivendo com vagas tambeacutem fora da cidade Como indica a reportagem da
folha de Satildeo Paulo intitulada ldquoAgricultura depende de migranterdquo
A mateacuteria data o ano de 2010 fala da falta de matildeo de obra em Estados como
Minas Gerais e Satildeo Paulo e a necessidade de migraccedilatildeo de trabalhadores para estes
Estados Dentre os Estados que fornecem trabalhadores estaacute o Paranaacute no qual eacute citado o
municiacutepio de Terra Roxa
30 Segundo o IPARDES (Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa) de 2011 dentre a produccedilatildeo geral do municiacutepio ano podemos destacar Galinaacuteceos (galinhas galos frangos(as) e pintos) com 1165800 animais soja com 166960 quilos mandioca com 63330 quilos bovinos com 30720 animais suiacutenos com 13100 animais e leite com 9 100 litros Cf IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 31 A APL (Arranjo produtivo local) da moda bebecirc de Terra Roxa caracteriza-se por conter um aglomerado de empresas especializadas na confecccedilatildeo de roupas infantis de 0 a 3 anos localizadas no municiacutepio Tem como objetivo central aumentar a competitividade e gerar novas ocupaccedilotildees nas empresas participantes do segmento Moda Bebecirc em Terra Roxa por meio da elevaccedilatildeo do grau de inovaccedilatildeo da participaccedilatildeo de mercado e da produtividade Essa especializaccedilatildeo produtiva se difere do perfil produtivo da regiatildeo especializada na agropecuaacuteria e na agroinduacutestria 32 A Escola do Trabalho de Terra Roxa oferece cursos profissionalizantes que qualifica trabalhadores para alguns setores das induacutestrias de confecccedilatildeo instaladas na cidade 33 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
27
Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34
O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de
trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda
continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila
tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de
garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno
dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o
campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre
os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal
As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma
alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida
ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores
possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -
com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou
outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por
perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista
dentre outros natildeo os oferece
Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes
trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de
classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de
melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no
ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a
trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em
outra cidade ela me disse que
Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35
34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
28
Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave
mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem
organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de
novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar
com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as
expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita
vantagem assimrdquo
Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para
Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se
demo na faacutebricardquo36
Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram
trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar
mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia
com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando
pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que
Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37
Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter
voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no
campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em
Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que
natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar
36 IDEM 37 IDEM
29
As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila
pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com
a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma
mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila
natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na
narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do
casal
Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas
construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril
Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho
na faacutebrica ela me disse que
Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38
Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que
gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as
dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores
preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica
ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na
avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em
conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho
O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como
Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos
indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em
casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria
Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista
Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim
38 IDEM
30
de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por
menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes
oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc
como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado
na Escola do Trabalho
Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o
tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram
mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias
permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas
relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais
Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns
trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de
compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas
tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa
39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
31
CAPIacuteTULO 2
TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40
Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa
natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O
municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande
polo de empregos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de
investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade
de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um
grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41
Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo
como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem
indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e
aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de
desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente
O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de
julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do
Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para
bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda
afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um
terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio
A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral
retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o
40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013
32
processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no
ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir
Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa
fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda
bebecirc pra terra roxa
Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43
A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande
destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da
cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra
Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o
municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo
queacuterdquo
No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves
transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que
este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo
sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em
resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores
Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa
industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo
enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa
Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20
principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a
43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
33
janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos
registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores
vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e
desligamento nesses setores
Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa
Meses Jan de 2003 a Jan de 2011
CBO ndash Frequumlecircncia
Admissotildees Desligamentos
Saldo
1ordm Emp
Reemp
Reint
C Prz Det
Transf
Total
Disp sem J Causa
Disp com J Causa
A Pedido
Term Contr
Aposent
Morte
Term C Prz Deter
Transf
Total
Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da
confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390
Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443
Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie
271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109
Costureira de peccedilas sob encomenda
171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em
geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio
varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina
60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio
em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina
bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas
34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27
Trabalhador agropecuaacuterio em geral
19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador
de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5
Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39
Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie
6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras
10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente
administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio
32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa
24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27
Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013
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Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
35
Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
36
mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
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curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
40
faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
41
que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
43
Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
44
industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
45
Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
46
Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
47
Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
48
era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
27
Terra Roxa no oeste paranaense eacute um exemplo Desde 2005 a prefeitura organiza a ida de trabalhadores para o Triacircngulo Mineiro paga metade do custo do transporte e o fazendeiro a outra metade34
O que nos chama a atenccedilatildeo nesta mateacuteria eacute que ela nos indica a presenccedila de
trabalhadores diaristas no municiacutepio e com essa disposiccedilatildeo - de ir e voltar - ou ainda
continuar vinculado ao trabalho no campo mesmo que em temporadas Uma presenccedila
tatildeo significativa que faz com que haja um investimento da economia local em funccedilatildeo de
garantir emprego a estes trabalhadores ao mesmo tempo que tenta garantir o retorno
dos mesmos para a cidade - trabalhando fora por temporadas Nota-se assim que o
campo de trabalho ofertado pela industrializaccedilatildeo natildeo eacute uma opccedilatildeo de ldquoexcelecircnciardquo entre
os trabalhadores e na proacutepria arrecadaccedilatildeo municipal
As possibilidades de trabalho ofertadas pela induacutestria aparecem como uma
alternativa para estes trabalhadores na perspectiva de melhorar suas condiccedilotildees de vida
ou de trabalho de acordo com as necessidades e interesses que os trabalhadores
possuem e elegem como prioridade ou ainda pela constante disponibilidade de vagas -
com contrataccedilatildeo quase que imediata Aleacutem disso alguns elementos aparecem ora ou
outra como pressatildeo para a decisatildeo por essas vagas seja pelo salaacuterio fixo seja por
perceber no trabalho fabril determinados ldquoconfortosrdquo que o trabalho como diarista
dentre outros natildeo os oferece
Neste sentido a trajetoacuteria de Maria pode nos indicar como parte destes
trabalhadores que compartilham determinadas condiccedilotildees de vida e experiecircncia de
classe passam a interpretar o trabalho fabril como possibilidade e perspectiva de
melhoria de condiccedilatildeo Maria se vinculou novamente ao trabalho na induacutestria apenas no
ano de 2009 antes disso ela trabalhava como diarista rural Quando indago a
trabalhadora se ela se mudaria de trabalho se conseguisse uma oportunidade melhor em
outra cidade ela me disse que
Ah tinha que ser muito bem estruturado muito bem organizado pra ver porque eu jaacute fui pra fora trabalhar assim e as crianccedila pequena pra mim natildeo teve vantagem natildeo35
34 AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 35 MARIA (pseudocircnimo)Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
28
Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave
mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem
organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de
novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar
com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as
expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita
vantagem assimrdquo
Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para
Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se
demo na faacutebricardquo36
Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram
trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar
mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia
com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando
pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que
Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37
Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter
voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no
campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em
Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que
natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar
36 IDEM 37 IDEM
29
As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila
pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com
a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma
mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila
natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na
narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do
casal
Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas
construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril
Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho
na faacutebrica ela me disse que
Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38
Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que
gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as
dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores
preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica
ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na
avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em
conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho
O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como
Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos
indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em
casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria
Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista
Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim
38 IDEM
30
de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por
menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes
oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc
como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado
na Escola do Trabalho
Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o
tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram
mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias
permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas
relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais
Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns
trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de
compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas
tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa
39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
31
CAPIacuteTULO 2
TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40
Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa
natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O
municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande
polo de empregos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de
investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade
de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um
grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41
Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo
como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem
indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e
aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de
desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente
O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de
julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do
Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para
bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda
afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um
terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio
A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral
retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o
40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013
32
processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no
ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir
Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa
fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda
bebecirc pra terra roxa
Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43
A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande
destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da
cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra
Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o
municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo
queacuterdquo
No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves
transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que
este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo
sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em
resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores
Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa
industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo
enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa
Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20
principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a
43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
33
janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos
registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores
vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e
desligamento nesses setores
Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa
Meses Jan de 2003 a Jan de 2011
CBO ndash Frequumlecircncia
Admissotildees Desligamentos
Saldo
1ordm Emp
Reemp
Reint
C Prz Det
Transf
Total
Disp sem J Causa
Disp com J Causa
A Pedido
Term Contr
Aposent
Morte
Term C Prz Deter
Transf
Total
Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da
confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390
Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443
Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie
271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109
Costureira de peccedilas sob encomenda
171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em
geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio
varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina
60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio
em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina
bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas
34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27
Trabalhador agropecuaacuterio em geral
19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador
de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5
Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39
Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie
6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras
10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente
administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio
32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa
24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27
Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013
34
Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
35
Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
36
mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
37
curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
38
Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
39
que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
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era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
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55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
28
Na fala da trabalhadora percebemos que tem uma certa inseguranccedila quanto agrave
mudanccedila Para ela se mudar teria que ser uma oportunidade muito boa ldquomuito bem
organizadardquo Pois Maria jaacute havia se mudado do municiacutepio outras vezes em busca de
novas oportunidades No entanto a experiecircncia que a trabalhadora teve ao se mudar
com os filhos e o marido para Conceiccedilatildeo da Aparecida-MG em 2001 natildeo atingiu as
expectativas que a trabalhadora tinha como ela mesmo afirma ldquonatildeo tive muita
vantagem assimrdquo
Em 2007 Maria o marido e os filhos se mudaram novamente Desta vez para
Uberlacircndia-MG A trabalhadora afirma que se mudaram porque ela e o marido ldquonatildeo se
demo na faacutebricardquo36
Em Uberlacircndia assim como em Aparecida da Conceiccedilatildeo ela e o marido foram
trabalhar de diaristas rurais Sobre essas tentativas de reorganizaccedilatildeo da vida - ganhar
mais acumular dinheiro construir possibilidades - a trabalhadora diz que ldquoEu mexia
com cafeacute na roccedila neacute Aiacute eu fui duas vezes mais me arrependi de ter idordquo Quando
pergunto o porquecirc se arrependeu ela diz que
Porque tive gasto neacute a gente natildeo teve lucro Da primeira vez que eu fui tivemos que vir agraves pressas porque minha sogra tinha falecido tivemo que gastaacute o que natildeo tinha neacute O que tinha ganhado neacute Nois foi com plano de na eacutepoca juntaacute dinheiro pra construir nossa casa que a gente natildeo tinha casa neacute [Antes] Morava nos fundo da casa da minha sogra a gente tinha nosso terreno entatildeo foi onde que natildeo deu certo neacute A gente tinha receacutem comeccedilado a vida tinha a Milena pequena ai fumo soacute voltemo pra buscar as crianccedila Que as crianccedila tinha ficado neacute A pessoa que cuidava das minha crianccedila Entatildeo foi tudo muito raacutepido natildeo deu pra trazer eles na eacutepoca porque ela tinha falecido neacute Entatildeo tinha que vim logo pra dar tempo de pegar o ocircnibus neacute senatildeo tinha que vim de aviatildeo e aviatildeo nois natildeo tinha condiccedilotildees de pagaacute neacute Entatildeo foi tudo muito raacutepido as crianccedila ficou laacute com a mulher ai enterremo tudo aqui ai voltemo peguemos as crianccedila trabalhamos mais uns dia (pra poder cobrir neacute as diacutevida) e viemos embora mais natildeo viemo embora com vantagem natildeo viemo embora com desvantagem37
Notamos na narrativa da trabalhadora que o maior motivo para o casal ter
voltado para Terra Roxa foi o falecimento da sogra nada estruturalmente definido no
campo de projetos econocircmicos Pois o que haviam construiacutedo diante das pressotildees em
Terra Roxa eacute que a saiacuteda era para ldquojuntaacute dinheiro pra construir nossa casardquo algo que
natildeo se realizou pela motivaccedilatildeo familiar
36 IDEM 37 IDEM
29
As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila
pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com
a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma
mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila
natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na
narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do
casal
Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas
construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril
Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho
na faacutebrica ela me disse que
Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38
Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que
gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as
dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores
preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica
ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na
avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em
conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho
O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como
Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos
indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em
casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria
Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista
Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim
38 IDEM
30
de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por
menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes
oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc
como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado
na Escola do Trabalho
Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o
tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram
mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias
permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas
relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais
Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns
trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de
compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas
tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa
39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
31
CAPIacuteTULO 2
TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40
Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa
natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O
municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande
polo de empregos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de
investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade
de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um
grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41
Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo
como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem
indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e
aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de
desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente
O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de
julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do
Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para
bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda
afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um
terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio
A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral
retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o
40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013
32
processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no
ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir
Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa
fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda
bebecirc pra terra roxa
Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43
A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande
destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da
cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra
Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o
municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo
queacuterdquo
No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves
transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que
este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo
sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em
resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores
Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa
industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo
enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa
Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20
principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a
43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
33
janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos
registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores
vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e
desligamento nesses setores
Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa
Meses Jan de 2003 a Jan de 2011
CBO ndash Frequumlecircncia
Admissotildees Desligamentos
Saldo
1ordm Emp
Reemp
Reint
C Prz Det
Transf
Total
Disp sem J Causa
Disp com J Causa
A Pedido
Term Contr
Aposent
Morte
Term C Prz Deter
Transf
Total
Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da
confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390
Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443
Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie
271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109
Costureira de peccedilas sob encomenda
171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em
geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio
varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina
60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio
em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina
bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas
34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27
Trabalhador agropecuaacuterio em geral
19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador
de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5
Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39
Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie
6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras
10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente
administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio
32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa
24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27
Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013
34
Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
35
Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
36
mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
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curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
40
faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
41
que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
42
Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
43
Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
44
industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
45
Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
46
Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
47
Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
48
era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
29
As dificuldades que a trabalhadora e o marido tiveram na primeira mudanccedila
pelo fato da sogra ter falecido e estes gastarem tudo o que tinham juntado ateacute entatildeo com
a viagem feita agraves pressas pode ser um dos motivos que levou o casal a tentar mais uma
mudanccedila para Uberlacircndia jaacute que os motivos para as expectativas da primeira mudanccedila
natildeo se realizar foram bem especiacuteficos e alheios agraves suas accedilotildees Mas como percebemos na
narrativa de Maria a segunda mudanccedila insuficiente para atender agraves expectativas do
casal
Nesta perspectiva a trabalhadora Maria nos daacute indiacutecios sobre as alternativas
construiacutedas e avaliadas pelos trabalhadores ao se decidirem ou natildeo pelo trabalho fabril
Quando lhe perguntei quais as diferenccedilas que percebia entre trabalho na roccedila e trabalho
na faacutebrica ela me disse que
Que na roccedila se levanta cedo eacute muito bom eu adoro ir pra roccedila se faz o rango que nem falava neacute Rango a comida taacute gelada chega toda suja cansada Agraves vezes vocecirc natildeo quer ir mais a precisatildeo fala mais alto entatildeo cecirc tem que ir pra ganhar um dia a mais neacute E na faacutebrica natildeo neacute Chega limpinha cecirc natildeo chega suja Cecirc chega cansada mais cecirc chega ali com os pezinho limpo com as matildeozinha limpa neacute Limpinha as vantagem eacute essa Tem muita vantagem neacute Cecirc quer uma coisa cecirc tem um dinheirinho pra vocecirc comprar agraves vezes vocecirc tem uma continha no mercado cecirc abre e vai laacute e pega o que vocecirc queacute neacute Entatildeo eacute isso na roccedila natildeo laacute na roccedila se trabaiava semana inteira pro cecirc recebecirc no saacutebado e era um dinheirinho sufrido neacute38
Podemos perceber a partir da narrativa de Maria que apesar de dizer que
gostava de ir para a roccedila o sofrimento do trabalhador diarista se sobressai De todas as
dificuldades relatadas pelos trabalhadores natildeo ter uma renda fixa eacute uma das maiores
preocupaccedilotildees e quase sempre aparece em suas narrativas Por isso o trabalho na faacutebrica
ganha um sentido de melhora na relaccedilatildeo com condiccedilotildees piores de trabalho - que na
avaliaccedilatildeo da entrevistada estatildeo na condiccedilatildeo visual que ela expotildee a dificuldade em
conseguir creacutedito no comeacutercio no ganho certo na faacutebrica e natildeo por dia de trabalho
O salaacuterio fixo eacute sinocircnimo de estabilidade para parte destes trabalhadores eacute como
Maria relata ela pode fazer a sua ldquocontinha no mercadordquo A fala da entrevista ainda nos
indica que o certo conforto que o trabalho da faacutebrica lhe oferece o ldquochegar limpinha em
casardquo aparece como mais uma motivaccedilatildeo para ter optado pelo trabalho na induacutestria
Eacute perceptiacutevel todas as dificuldades e precarizaccedilotildees de um trabalhador diarista
Para estes trabalhadores decorrentes desta realidade tatildeo difiacutecil um salaacuterio fixo no fim
38 IDEM
30
de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por
menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes
oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc
como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado
na Escola do Trabalho
Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o
tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram
mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias
permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas
relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais
Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns
trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de
compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas
tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa
39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
31
CAPIacuteTULO 2
TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40
Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa
natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O
municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande
polo de empregos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de
investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade
de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um
grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41
Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo
como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem
indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e
aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de
desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente
O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de
julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do
Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para
bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda
afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um
terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio
A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral
retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o
40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013
32
processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no
ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir
Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa
fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda
bebecirc pra terra roxa
Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43
A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande
destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da
cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra
Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o
municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo
queacuterdquo
No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves
transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que
este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo
sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em
resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores
Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa
industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo
enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa
Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20
principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a
43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
33
janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos
registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores
vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e
desligamento nesses setores
Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa
Meses Jan de 2003 a Jan de 2011
CBO ndash Frequumlecircncia
Admissotildees Desligamentos
Saldo
1ordm Emp
Reemp
Reint
C Prz Det
Transf
Total
Disp sem J Causa
Disp com J Causa
A Pedido
Term Contr
Aposent
Morte
Term C Prz Deter
Transf
Total
Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da
confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390
Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443
Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie
271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109
Costureira de peccedilas sob encomenda
171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em
geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio
varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina
60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio
em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina
bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas
34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27
Trabalhador agropecuaacuterio em geral
19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador
de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5
Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39
Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie
6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras
10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente
administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio
32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa
24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27
Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013
34
Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
35
Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
36
mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
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curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
38
Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
39
que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
40
faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
47
Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
48
era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
30
de cada mecircs o poder trabalhar na sombra a melhoria nas condiccedilotildees de trabalho por
menores que sejam e o campo de possibilidades que este trabalho fabril pode lhes
oferecer se tornam muito atrativos - mudar de funccedilatildeo e salaacuterio abrir uma facccedilatildeo etc
como perceptiacutevel em falas e fichas de inscriccedilatildeo para cursos de corte costura e bordado
na Escola do Trabalho
Quando do iniacutecio deste capiacutetulo citamos a fala de Carlos em que ele diz ldquoCom o
tempo depois que essas empresas de de crianccedila comeccedilou a surgi as coisas ficaram
mais faacuteceis neacuterdquo39 ele estaacute se referindo agraves possibilidades que o trabalho nas induacutestrias
permitem aos trabalhadores de Terra Roxa que natildeo querem continuar em determinadas
relaccedilotildees de trabalho tidas por ele como piores do que as industriais
Para tanto no proacuteximo capiacutetulo buscarei dialogar com a interpretaccedilatildeo de alguns
trabalhadores que atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc A fim de
compreender a partir de suas narrativas as possibilidades e limites de suas expectativas
tal qual como os motivos que os levam a tomar certas posiccedilotildees e interpretaccedilotildees sobre do
processo de industrializaccedilatildeo em Terra Roxa
39 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
31
CAPIacuteTULO 2
TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40
Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa
natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O
municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande
polo de empregos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de
investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade
de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um
grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41
Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo
como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem
indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e
aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de
desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente
O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de
julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do
Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para
bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda
afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um
terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio
A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral
retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o
40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013
32
processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no
ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir
Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa
fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda
bebecirc pra terra roxa
Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43
A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande
destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da
cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra
Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o
municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo
queacuterdquo
No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves
transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que
este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo
sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em
resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores
Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa
industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo
enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa
Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20
principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a
43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
33
janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos
registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores
vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e
desligamento nesses setores
Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa
Meses Jan de 2003 a Jan de 2011
CBO ndash Frequumlecircncia
Admissotildees Desligamentos
Saldo
1ordm Emp
Reemp
Reint
C Prz Det
Transf
Total
Disp sem J Causa
Disp com J Causa
A Pedido
Term Contr
Aposent
Morte
Term C Prz Deter
Transf
Total
Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da
confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390
Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443
Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie
271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109
Costureira de peccedilas sob encomenda
171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em
geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio
varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina
60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio
em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina
bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas
34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27
Trabalhador agropecuaacuterio em geral
19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador
de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5
Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39
Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie
6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras
10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente
administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio
32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa
24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27
Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013
34
Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
35
Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
36
mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
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curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
48
era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
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55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
31
CAPIacuteTULO 2
TRABALHO E TRABALHADORES LIMITES E POSSIBILIDADES ldquoTerra Roxa Capital da moda bebecirc Do Paranaacute para o Brasil uma onda de emoccedilatildeo e carinhordquo40
Ao analisarmos notiacutecias relacionadas agraves induacutestrias de moda bebecirc de Terra Roxa
natildeo eacute difiacutecil encontrar expressotildees como a indicaccedilatildeo de ldquoCapital da moda bebecircrdquo O
municiacutepio eacute frequentemente indicado como tal aleacutem de ser apontado como um grande
polo de empregos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo eacute que haacute um grande nuacutemero de
investimentos voltados para esse setor na cidade mesmo natildeo sendo a principal atividade
de conjugaccedilatildeo do produto interno bruto do municiacutepio Percebemos assim que haacute um
grande destaque dado ao desenvolvimento industrial na cidade pela miacutedia local41
Nota-se a necessidade do governo municipal em destacar a industrializaccedilatildeo
como carro-chefe mesmo natildeo sendo a principal atividade econocircmica Tais accedilotildees podem
indicar o interesse em expandir as atividades concentradas no campo para a cidade e
aleacutem disso investir na noccedilatildeo de cidade industrial que se destaca como sinocircnimo de
desenvolvimento e modernidade que possui a induacutestria como expoente
O site do deputado estadual Stephanes Junior traz uma notiacutecia datada de 04 de
julho de 2011 que declara ldquoo municiacutepio de Terra Roxa como Capital da Moda Bebecirc do
Paranaacute O tiacutetulo visa identificar o municiacutepio como polo de produccedilatildeo de roupas para
bebecircs a partir da implantaccedilatildeo de um arranjo produtivo local em 2004rdquo 42 O site ainda
afirma que as induacutestrias de moda bebecirc respondem a 30 da economia e emprega um
terccedilo da populaccedilatildeo do municiacutepio
A partir dessa indicaccedilatildeo atrelada agraves notiacutecias da miacutedia local ndash que em geral
retratam positivamente o panorama industrial de Terra Roxa ndash eacute possiacutevel observar que o
40 Slogan do municiacutepio utilizado no site da Prefeitura Municipal de Terra Roxa Disponiacutevel em lthttpwwwterraroxaprgovbrindexphpgt Acesso em 18102013 41 Conforme iacutendice do IBGE-2010 o PIB da cidade tem a seguinte composiccedilatildeo setor agropecuaacuterio 60579 induacutestria 28337 e setor de serviccedilos 148564 Disponiacutevel em httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia Acessado em 29112013 42 Disponiacutevel em lthttpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272gt Acesso em 12092013
32
processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no
ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir
Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa
fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda
bebecirc pra terra roxa
Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43
A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande
destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da
cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra
Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o
municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo
queacuterdquo
No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves
transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que
este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo
sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em
resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores
Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa
industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo
enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa
Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20
principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a
43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
33
janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos
registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores
vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e
desligamento nesses setores
Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa
Meses Jan de 2003 a Jan de 2011
CBO ndash Frequumlecircncia
Admissotildees Desligamentos
Saldo
1ordm Emp
Reemp
Reint
C Prz Det
Transf
Total
Disp sem J Causa
Disp com J Causa
A Pedido
Term Contr
Aposent
Morte
Term C Prz Deter
Transf
Total
Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da
confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390
Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443
Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie
271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109
Costureira de peccedilas sob encomenda
171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em
geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio
varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina
60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio
em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina
bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas
34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27
Trabalhador agropecuaacuterio em geral
19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador
de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5
Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39
Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie
6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras
10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente
administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio
32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa
24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27
Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013
34
Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
35
Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
36
mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
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curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
40
faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
43
Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
44
industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
45
Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
46
Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
47
Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
48
era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
32
processo de industrializaccedilatildeo desta tem sido visto como um avanccedilo no
ldquodesenvolvimentordquo econocircmico da cidade pois gera emprego e renda Na fala de Moacir
Carlos Comerlatto secretaacuterio municipal de induacutestria comeacutercio e turismo de Terra Roxa
fica visiacutevel este projeto Ao perguntar-lhe sobre a importacircncia da induacutestria de moda
bebecirc pra terra roxa
Com a vinda da induacutestria da moda bebecirc houve uma inversatildeo dos valores houve uma inversatildeo total da economia do municiacutepio Hoje noacutes natildeo temos matildeo de obra disponiacutevel no mercado noacutes somos aqui proporcional a populaccedilatildeo o municiacutepio com o menor iacutendice de desemprego do Estado do Paranaacute aqui natildeo trabalha quem natildeo queacute Entatildeo houve uma mudanccedila significativa Entatildeo hoje a agricultura ainda continua com 70 ela representa 70 da economia e a induacutestria da moda bebecirc e o comeacutercio elas representam 30 Mais o grande ldquoXrdquo da questatildeo eacute o fato social dessas empresas aleacutem dos 30 na fatia econocircmica na arrecadaccedilatildeo do municiacutepio a geraccedilatildeo de emprego e renda no municiacutepio Hoje noacutes somos uma cidade privilegiada no Brasil podemos dizer assim seguramente no Brasil E por consequecircncia noacutes somos conhecidos nacionalmente como Terra Roxa capital oficialmente capital Estadual da moda bebecirc isso jaacute eacute oficial isso jaacute eacute lei Estamos caminhando para se tornar lei tambeacutem estamos trabalhando em Brasiacutelia pra tornar Terra Roxa capital nacional da moda bebecirc43
A partir deste trecho da sua narrativa percebemos que eacute dado um grande
destaque agrave industrializaccedilatildeo mesmo esta natildeo garante a maior parcela da economia da
cidade Ainda assim as faacutebricas satildeo vistas como grande polo de empregos para Terra
Roxa resolvendo em parte o grande problema de desemprego que assolava o
municiacutepio haacute algumas deacutecadas atraacutes Como afirma Moacir ldquoaqui natildeo trabalha quem natildeo
queacuterdquo
No entanto devemos levantar algumas problemaacuteticas referentes agraves
transformaccedilotildees geradas por essa industrializaccedilatildeo que vatildeo nos ajudar a analisar por que
este processo estaacute sendo apresentado como sinocircnimo de desenvolvimento mesmo natildeo
sendo a principal atividade econocircmica da cidade e explicitar sua incapacidade em
resolver as desigualdades e expectativas de muitos trabalhadores
Diante disso por que o interesse em dar tanta visibilidade a essa
industrializaccedilatildeo Por que o grande investimento no setor Como os trabalhadores estatildeo
enfrentando esse mercado de trabalho e interpretando esse processo em Terra Roxa
Os registros presentes no CAGED destacados na Tabela 1 mostram as 20
principais ocupaccedilotildees no municiacutepio de Terra Roxa no periacuteodo de janeiro de 2003 a
43 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011
33
janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos
registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores
vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e
desligamento nesses setores
Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa
Meses Jan de 2003 a Jan de 2011
CBO ndash Frequumlecircncia
Admissotildees Desligamentos
Saldo
1ordm Emp
Reemp
Reint
C Prz Det
Transf
Total
Disp sem J Causa
Disp com J Causa
A Pedido
Term Contr
Aposent
Morte
Term C Prz Deter
Transf
Total
Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da
confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390
Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443
Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie
271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109
Costureira de peccedilas sob encomenda
171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em
geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio
varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina
60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio
em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina
bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas
34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27
Trabalhador agropecuaacuterio em geral
19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador
de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5
Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39
Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie
6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras
10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente
administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio
32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa
24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27
Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013
34
Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
35
Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
36
mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
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curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
38
Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
40
faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
41
que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
42
Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
43
Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
44
industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
45
Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
46
Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
47
Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
48
era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
33
janeiro de 2011 Percebemos que estes iacutendices demonstram (ainda que limitado aos
registros de trabalho com carteira assinada) um nuacutemero significativo de trabalhadores
vinculados agrave induacutestria de vestuaacuterio apontando tambeacutem o nuacutemero de admissotildees e
desligamento nesses setores
Tabela 1 - Iacutendices de contrataccedilatildeo e desligamentos de postos de trabalho - Terra Roxa
Meses Jan de 2003 a Jan de 2011
CBO ndash Frequumlecircncia
Admissotildees Desligamentos
Saldo
1ordm Emp
Reemp
Reint
C Prz Det
Transf
Total
Disp sem J Causa
Disp com J Causa
A Pedido
Term Contr
Aposent
Morte
Term C Prz Deter
Transf
Total
Auxiliar de corte (preparaccedilatildeo da
confecccedilatildeo de roupas) 281 1053 1 1 0 1336 485 11 258 190 0 2 0 0 946 390
Supervisor de embalagem e etiquetagem 475 788 0 23 0 1286 457 5 205 175 0 1 0 0 843 443
Costureiro na confecccedilatildeo em seacuterie
271 820 0 5 0 1096 578 3 292 113 0 1 0 0 987 109
Costureira de peccedilas sob encomenda
171 437 0 0 0 608 333 7 213 40 0 0 0 0 593 15 Passador de roupas em
geral 165 153 0 0 0 318 168 1 89 2 0 0 0 0 260 58 Vendedor de comeacutercio
varejista 70 237 0 0 0 307 210 0 53 8 2 0 0 0 273 34 Bordador agrave maacutequina
60 214 0 0 0 274 186 1 72 15 0 1 0 0 275 -1 Auxiliar de escritoacuterio
em geral 34 155 0 0 0 189 131 1 33 3 1 1 0 0 170 19 Operador de maacutequina
bordatriz 16 170 0 0 0 186 65 2 37 10 0 0 0 0 114 72 Cortador de roupas
34 136 0 1 0 171 117 2 44 3 0 0 0 0 166 5 Frentista 20 118 0 0 0 138 76 2 19 11 1 2 0 0 111 27
Trabalhador agropecuaacuterio em geral
19 108 0 6 0 133 75 1 26 14 1 0 0 0 117 16 Operador de laminador
de barras a quente 41 79 0 0 0 120 82 0 22 21 0 0 0 0 125 -5
Ajudante de confeccao 112 4 0 0 0 116 20 3 25 29 0 0 0 0 77 39
Costureiro a maacutequina na confecccedilatildeo em seacuterie
6 105 0 0 0 111 59 4 28 22 0 0 0 0 113 -2 Servente de obras
10 83 0 0 0 93 40 0 16 13 0 0 0 0 69 24 Assistente
administrativo 35 52 0 0 0 87 31 0 15 4 0 0 0 0 50 37 Zelador de edifiacutecio
32 54 0 0 0 86 43 0 16 4 1 0 0 0 64 22 Operador de caixa
24 60 0 0 0 84 47 0 9 3 1 0 0 0 60 24 Repositor de mercadorias 29 43 0 0 0 72 32 0 9 4 0 0 0 0 45 27
Fonte CAGED Disponiacutevel em lthttpswwwcagedgovbrgt Acesso em 29112013
34
Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
35
Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
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mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
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curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
40
faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
41
que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
42
Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
43
Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
45
Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
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era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
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Eacute possiacutevel perceber que os setores que mais contratam satildeo os setores ligados agrave
induacutestria de vestuaacuterio desde o primeiro emprego ateacute mesmo recontrataccedilotildees No qual
entre as 20 principais ocupaccedilotildees doze estatildeo ligadas a este setor industrial obtendo o
maior nuacutemero de contrataccedilotildees Ao mesmo tempo os setores ligados agrave industrializaccedilatildeo
tambeacutem satildeo os que mais possuem desligamentos
Para estes desligamentos satildeo citadas quatro principais causas em primeiro lugar
temos o maior nuacutemero de desligamento por dispensa sem justa causa em segundo lugar
temos desligamento a pedido em terceiro lugar desligamento por teacutermino de contrato e
soacute em uacuteltimo lugar desligamento por dispensa com justa causa Mas por que haacute tantos
desligamentos no setor industrial
Ana Paula Serra de Arauacutejo e Fernanda Raphaella Penhalver Marques realizaram
um estudo com trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa
com o objetivo de traccedilar o perfil constitucional coreano (CC) e a sua relaccedilatildeo com os
distuacuterbios osteomusculares relacionados ao trabalho (DORT)44 Nesse estudo foram
entrevistadas 47 trabalhadoras sendo divididas e classificadas em 4 tipologias
concluindo que essas doenccedilas estavam diretamente ligadas aos DORT
O que vai nos chamar atenccedilatildeo no trabalho das pesquisadoras eacute que atraveacutes dos
dados que estas trazem podemos perceber o desgaste que o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo causa aos trabalhadores
No estudo 41(8723) voluntaacuterias afirmaram sentir dor em pelo menos um local do corpo 31 (7560) relataram sentir dor agraves vezes 8 (1951) periodicamente e 8 (1951) constantemente Para a maioria 31(7560) a dor tem origem laboral45
As trabalhadoras entrevistadas para a pesquisa exerciam suas funccedilotildees laborais
no setor de corte e costura industrial Fica evidente atraveacutes do estudo que haacute um grande
desgaste fiacutesico nos trabalhadores destes setores considerando que 41 das 47
entrevistadas ldquoafirmam sentir dor em pelo menos um local do corpordquo Algo que tambeacutem
influencia diretamente nos desligamentos voluntaacuterios e involuntaacuterios nos setores
industriais devido ao desgaste causado pelo trabalho e intensificaccedilatildeo do mesmo em
periacuteodo de mudanccedila de coleccedilotildees
44 ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 45 IBIDEM
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Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
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mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
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curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
45
Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
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era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
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Para aleacutem das questotildees de desgaste e doenccedilas aos quais os desligamentos estatildeo
relacionados natildeo podemos deixar de levar em consideraccedilatildeo a trajetoacuteria destes
trabalhadores suas experiecircncias diversas e como esses sujeitos avaliam e percebem seu
espaccedilo de trabalho bem como as motivaccedilotildees que os levaram agrave escolha do mesmo
Nesta perspectiva a partir da anaacutelise de algumas fontes orais do trabalho de
conclusatildeo de curso de Marcela da Silva intitulado ldquoO cotidiano dos trabalhadores das
faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004)46rdquo que foi elaborada a partir
da anaacutelise das experiecircncias cotidianas dos trabalhadores de faacutebricas de bordado de Terra
Roxa com a intenccedilatildeo principal de dialogar com a visatildeo dos funcionaacuterios das faacutebricas
bem como perceber e discutir as atividades desenvolvidas no interior da induacutestria de
vestuaacuterio A partir de seu trabalho procurou problematizar as relaccedilotildees interesses e
motivaccedilotildees que permeiam o cotidiano destes trabalhadores
Podemos perceber essas intenccedilotildees de Silva quando ela discute a entrevista da
trabalhadora Aparecida 31 anos divorciada e matildee de dois filhos que trabalhava em
uma faacutebrica de bordado
Eu trabalhava na P mas parei de trabalhar pra fazecirc um tratamento neacute e fiquei sem trabalha aiacute eu separei do meu marido e fui mora com meus pais e o uacutenico serviccedilo que tinha era trabalha na faacutebrica mesmo aiacute resolvi procurar outra faacutebrica pra vecirc como eacute que era minhas amigas falaram pra mim que estaacute que eu trabalho hoje era melhor dava mais precircmio de produccedilatildeo tinha ateacute churrasco no fim do ano e tudo aiacute eu fui trabalha laacute era perto de casa mesmo aiacute eu fui Soacute que sei laacute eacute gostoso trabalha laacute eu me do bem com todo mundo eacute um povo legal natildeo tenho ldquorichardquo de ningueacutem mais eu acho que eacute muita patroa pra uma faacutebrica soacute satildeo cinco chega enche o saco47
O fato de a trabalhadora ser divorciada e matildee de dois filhos ajuda a
compreender a necessidade que possuiacutea quando indica natildeo ter outra opccedilatildeo a natildeo ser
procurar emprego novamente em uma faacutebrica No entanto o que queremos ressaltar em
sua fala eacute que a escolha pelo novo local de trabalho se deu pelo fato de oferecer algumas
condiccedilotildees que o antigo trabalho natildeo a oferecia
Desta forma os desligamentos no setor industrial tambeacutem estatildeo relacionados a
esta rotatividade entre os trabalhadores Que procuram se movimentar pelos postos de
trabalho oferecidos pela induacutestria na busca de uma empresa que garanta maior salaacuterio
46 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 47 IBIDEM p 45
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mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
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curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
45
Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
46
Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
47
Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
48
era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
36
mais ldquobenefiacuteciosrdquo como o chamado precircmio produccedilatildeo ou mesmo que faccedila ateacute
ldquochurrasco final do anordquo48
Ao analisamos as fichas para inscriccedilatildeo em cursos profissionalizantes produzidas
no Centro de Formaccedilatildeo Profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do Trabalho) foi
possiacutevel avaliar - a partir do questionaacuterio soacutecio-econocircmico dos trabalhadores inscritos -
alguns elementos de sua disposiccedilatildeo a realizar aquele curso A ficha apresenta questotildees
sobre o atual (ou uacuteltimo) emprego e o que levou o trabalhador a procurar o curso
profissionalizante tambeacutem podemos considerar algumas possibilidades para o excesso
de desligamentos em determinados setores da induacutestria assim como o viacutenculo aos
mesmos a idade dos trabalhadores condiccedilotildees de vida etc
Entre as respostas que mais aparecem nas fichas quando eacute perguntado o porquecirc
da escolha desse curso encontramos respostas como ldquoPorque quero mudar minha
funccedilatildeo e trabalhar em alguma empresa no setor de bordadordquo49 Observamos que a
trabalhadora em questatildeo estava no setor de serviccedilos gerais em uma empresa Isso nos
indica que na maioria das vezes satildeo trabalhadores buscando se especializar em um
setor da induacutestria que aumente o seu salaacuterio ou que proporcione melhores condiccedilotildees de
remuneraccedilatildeo atividade a ser realizada dentre outros interesses
Aleacutem de trabalhadores que estatildeo procurando se profissionalizar em um setor da
induacutestria que possibilite uma renda mais alta percebemos tambeacutem que estes analisam
o grande nuacutemero de postos de trabalho dessas empresas na cidade como uma
possibilidade que lhes permite abrir outras frentes de trabalho vinculadas ao ramo
infantil ldquoquero aprender a costurar para fazer artesanato como bonecos de pano urso
de peluacutecia almofadas etcrdquo50
O grande nuacutemero de desligamentos no setor da induacutestria podem ser
relacionados tambeacutem com a busca pelo proacuteprio negoacutecio ou ainda em aumentar a renda
se desvencilhando das atividades que realizam ateacute aquele momento em outras aacutereas ou
mesmo no setor de vestuaacuterio
Eacute preciso considerar que ao se inscrever para o curso de qualificaccedilatildeo estes
trabalhadores jaacute estatildeo se candidatando a uma vaga de trabalho - garantida muitas vezes
antes de terminarem o curso (devido agrave falta de matildeo de obra nos setores aos quais o
48 IBIDEM p 45 49 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 50 Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 23072012
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curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
38
Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
39
que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
40
faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
48
era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
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55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
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curso qualifica) Natildeo podemos deixar de entender que as respostas que encontramos
nestas fichas podem estar diretamente ligadas agrave intenccedilatildeo destes trabalhadores de saiacuterem
do curso jaacute empregados
As fichas satildeo uma forma de preacute-seleccedilatildeo de alunos pois cada curso tem um
nuacutemero de vagas limitadas Neste sentido as respostas destas fichas podem ser uma
maneira desses trabalhadores ldquoconvenceremrdquo que satildeo os melhores ldquocandidatosrdquo ao
curso como se fosse uma preacute-entrevista de emprego
Essa possiacutevel manipulaccedilatildeo das respostas por parte dos trabalhadores natildeo
significa que natildeo possamos interpretar determinados interesses necessidades e pressotildees
que os motivam a procurarem o curso Mas e os trabalhadores que natildeo se
ldquoespecializamrdquo
Carlos que trabalha na mesma empresa haacute oito anos natildeo realizou essa
qualificaccedilatildeo Quando entrou na empresa trabalhava no setor de corte especificamente
na reposiccedilatildeo de peccedilas apoacutes um tempo foi promovido para operador de maacutequina e desde
entatildeo estaacute no mesmo setor Perguntei ao trabalhador se ele ainda possuiacutea a pretensatildeo de
crescer dentro da empresa e ele disse que
Acho que hoje no momento natildeo Porque eu preciso evoluir minha capacidade ainda Tem que esperar os outros desocuparem essas vagas que tatildeo melhor que eu pra poder eu desejar pra mim uma vez que eu esteja capacitado assim Eu acho no momento ainda natildeo tocirc capacitado pra ter um cargo de mais responsabilidade51
Na fala do trabalhador percebemos certa inseguranccedila em relaccedilatildeo agrave sua
qualificaccedilatildeo para cargos superiores ao seu Algo que aparece como entrave a Carlos
tambeacutem se relaciona com sua trajetoacuteria de curta escolarizaccedilatildeo por se dedicar
prioritariamente ao trabalho mas que acaba indicando como vagas natildeo disponiacuteveis e
necessidade de evoluir para natildeo problematizar em demasia o seu caminho de trabalho
e decisotildees na vida
A questatildeo eacute que natildeo haacute como este trabalhador se qualificar para certos cargos
atraveacutes de cursos profissionalizantes oferecidos no municiacutepio A Escola do trabalho
oferece apenas cursos em setores da induacutestria que estejam com matildeo de obra em falta e
de habilidades iniciais Como o secretaacuterio da escola afirma quando lhe pergunto sobre
como decidem os cursos que seratildeo ofertados
51 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
40
faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
41
que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
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era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
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Temos que oferecer aquilo que os empresaacuterios precisam Entatildeo o que que o empresaacuterio precisa hoje Precisa de costureiro Entatildeo noacutes optamos em costura porque eacute costura que eles precisam Precisam de bordadores Entatildeo eacute bordadores que temos que preparar Precisam de pessoas pra trabalhar na aacuterea de risco e corte o risco e corte de tecido pra que as pessoas possam costurar Entatildeo eacute eacute eacute a demanda eu tenho que oferecer aquilo que o empresaacuterio precisa52
Os cursos ofertados pela escola hoje satildeo os de costura bordado risco e corte e
maacutequina Plotter Portanto trabalhadores como Carlos que jaacute trabalham em algum
destes setores natildeo possuem meios de se qualificar em cargos superiores e que tenham
uma remuneraccedilatildeo mais alta Se Carlos pretende crescer na empresa em que estaacute teraacute
que se capacitar dentro da mesma a partir da experiecircncia adquirida no trabalho do seu
proacuteprio esforccedilo e dedicaccedilatildeo ou por formaccedilatildeo de iniciativa particular
Neste sentido perguntei ao Secretaacuterio da Escola do trabalho a quem os cursos de
qualificaccedilatildeo profissional beneficiariam mais aos trabalhadores por possibilitar a eles
uma melhoria de vida ou aos empresaacuterios Diante de tal questatildeo sua resposta foi
Entatildeo beneficia sem duacutevida nenhuma a pessoa que precisa do emprego A pessoa que quer mudar de emprego por exemplo que quer entrar no mercado de trabalho mais tambeacutem beneficia tanto quanto o empresaacuterio que precisa dessa matildeo de obra53
Eacute evidente que beneficia o empresaacuterio por ter matildeo de obra qualificada que natildeo
precisa de formaccedilatildeo dentro da faacutebrica ateacute mesmo porque os cursos ofertados satildeo de
acordo com a matildeo de obra que estatildeo em falta para certos setores da induacutestria No
entanto natildeo podemos esquecer qual eacute o perfil dos trabalhadores que procuram os cursos
de qualificaccedilatildeo conforme o secretaacuterio
Satildeo pessoas que nunca trabalharam formal pessoas que estatildeo atingido a idade miacutenima de 16 anos para entrar no mercado de trabalho ou pessoas com o niacutevel de escolaridade um pouco baixa que querem encontrar um emprego com carteira registrada e a uacutenica forma que encontra eacute atraveacutes desses cursos54
Quando analisamos as fichas de inscriccedilatildeo notamos que trabalhadores com o
perfil que Moacir descreve satildeo uma pequena minoria Grande parte dos trabalhadores
52 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 53 IDEM 54 IDEM
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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
47
Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
48
era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
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que buscam a Escola do Trabalho estaacute ligada haacute algum setor da induacutestria de moda bebecirc
e buscam se qualificar na expectativa de aumentar renda ou ainda abrir o proacuteprio
negoacutecio ateacute mesmo parceria com as induacutestrias maiores como observamos
anteriormente
Supomos que em sua fala Moacir tenta legitimar a ideia de que o trabalho ligado
aos setores da induacutestria eacute a uacutenica opccedilatildeo de emprego em Terra Roxa Jaacute que para ele o
curso eacute a ldquouacutenica formardquo dos trabalhadores do municiacutepio entrarem no mercado de
trabalho e adquirirem carteira assinada
No entanto natildeo podemos desconsiderar totalmente a concepccedilatildeo de que os cursos
profissionalizantes da Escola do trabalho possibilitam aos trabalhadores oportunidades e
expectativas na melhoria da condiccedilatildeo de suas vidas Pois como observamos
anteriormente o trabalhador que faz o curso sai de laacute empregado Assim como a
trabalhadora Berenice nos fala porque decidiu fazer o curso e ir trabalhar na faacutebrica
Eu tinha jaacute vontade de trabaiaacute Eacute que quando eu completei 16 anos ele [marido] natildeo queria que eu fosse trabaiaacute Aiacute depois que ele caiu preso eu tive a chance de fazer o curso e eu jaacute gostava via os otro costuraacute e pra mim aquilo ali era pra mim Ai a tia Maria (pseudocircnimo) comeccedilou o curso e eu nem sabia Aiacute ela chegou assim pra mim ldquoBerenice (pseudocircnimo) vocecirc quer fazer um cursordquo ndash Quero Ai eu falei bem assim mas do quecirc Ela de costura Ai ela falou bem assim ldquoSe quiser trabaiaacute de manhatilde laacute porque taacute precisandordquo Porque faacutebrica eacute difiacutecil pegar outro serviccedilo eacute mais de costura mesmo costureira eles pegam direto Agora em outro serviccedilo jaacute eacute mais demorado E como eu tenho moleque pequeno e moro com minha matildee minha matildee natildeo trabaia desde que quando eu vim morar com ela assim Ela operocirc aiacute depois ela cuida da minha voacute tambeacutem e minha voacute ela natildeo anda Viu Eacute tudo na matildeo Aiacute tipo assim agora que acho que eu vou dar uma coisa melhor pra ela porque nunca trabaiei55
A trabalhadora tem 17 anos e um filho de 1 ano e meio estudou ateacute a 7deg seacuterie do
ensino fundamental e quando perguntei se ainda pretendia estudar Berenice me diz que
natildeo Casou-se aos 15 anos e como podemos observar em sua fala o marido natildeo a
deixava trabalhar mas quando o marido foi preso ela optou em comeccedilar fazer o curso
por indicaccedilatildeo da tia e por natildeo contar com a restriccedilatildeo anterior - era preciso trabalhar para
ajudar na casa da matildee
Percebemos que a condiccedilatildeo financeira da trabalhadora eacute muito limitada pois a
matildee a voacute ela e o filho satildeo sustentados por um tio e como ela mesmo diz ldquoestaacute sempre
55 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
41
que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
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era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
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lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
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faltando as coisardquo56 Para ela o novo emprego traz a possibilidade de melhorar a sua
condiccedilatildeo de vida e de seus familiares
Quando realizei a entrevista com Berenice fazia apenas uma semana que ela
havia comeccedilado a trabalhar na induacutestria Antes do atual emprego a trabalhadora
somente tinha trabalhado para uma vizinha onde fazia de tudo um pouco mesmo que
apontasse anteriormente que nunca trabalhou Ela narra
Eu trabaiei uma vez soacute numa vizinha minha Eu trabaiava de auxiliar pra ela Virava os pano porque ela era custureira Levava a filha dela na creche Cuidava da casa dela De tarde ia buscar a minina Ai fazia janta pra ela Deixava tudo arrumado e no outro dia de manhatilde era a mesma coisa57
Costureiras que trabalham em domiciacutelio ganham por peccedila assim quanto mais
produzirem maior seraacute a renda Neste sentido os trabalhos que Berenice desempenhava
(limpar a casa e cuidar da filha da trabalhadora que a contratou) eram vitais para que sua
empregadora conseguisse aumentar sua produccedilatildeo e consequentemente sua renda
A tese de doutorado de Terezinha Carvalhal que tem como tiacutetulo ldquoDinacircmica
territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPRrdquo tem como proposta
analisar as contradiccedilotildees referentes ao trabalho domiciliar como repercussatildeo da
informalizaccedilatildeo A autora demonstra como essa informalizaccedilatildeo do trabalho tem se
tornado precarizado Buscando com isso apontar a exploraccedilatildeo da mulher em sua dupla
jornada de trabalho em que o trabalho domiciliar vinculado agrave moda bebecirc mistura-se
com o trabalho domeacutestico58
No entanto Terezinha a autora natildeo menciona o fato de que os trabalhadores
que saem das induacutestrias para trabalharem em casa natildeo visam apenas agrave comodidade do
trabalho domiciliar mas tambeacutem um aumento consideraacutevel na renda familiar Como
aparece na fala de uma das trabalhadoras entrevistadas por Carvalhal ldquoEu prefiro em
casa do que na faacutebrica Trabalhei 20 dias mas eu natildeo dava a produccedilatildeo que eles queriam
mas eu ganho mais em casa do que na faacutebrica59rdquo
A narrativa da trabalhadora nos indica um campo interpretativo para outras
trabalhadoras que avistam possibilidades nessa organizaccedilatildeo do trabalho e da vida ainda
56 IDEM 57 IDEM 58 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 59 IBIDEM p 166
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que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
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Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
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era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
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55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
41
que na dinacircmica dessas relaccedilotildees o que se tem como evidecircncia eacute um aumento
significativo de pressotildees para muitos desses trabalhadores e trabalhadoras
Para tanto quando analisamos a situaccedilatildeo das atividades laborais desempenhadas
pela trabalhadora Berenice natildeo podemos esquecer que quem pagava o seu salaacuterio era
uma trabalhadora assalariada neste caso o salaacuterio que Berenice recebe aparece como
um valor simboacutelico contribuindo para que natildeo o contabilize como trabalho na sua
primeira avaliaccedilatildeo sobre o primeiro emprego ser o da faacutebrica
Podemos compreender assim o universo de expectativas de Berenice em relaccedilatildeo
ao atual emprego quando ela diz que ldquomeu sonho eacute ter uma moto e eu tenho feacute em Deus
que eu vou consegui Batalha ali na faacutebrica ali pra eu consegui e dar uma vida melhor
pro meu filho e pra minha matildee60rdquo
O salaacuterio que a trabalhadora recebia em seu primeiro emprego natildeo permitia as
possibilidades que ela vecirc agora No entanto A trabalhadora eacute uma iniciante nestas
relaccedilotildees de trabalho e pouco percebeu sobre os limites da realizaccedilatildeo de suas
expectativas tratando apenas dos primeiros sentimentos de exploraccedilatildeo vivenciados com
o trabalho que exerceu na casa da vizinha
Um pouco distantes do limites que aparecem para o trabalhador Joseacute que
trabalha na induacutestria de confecccedilatildeo faz 20 anos que ainda natildeo tem casa proacutepria mas que
pretende compraacute-la Entretanto quando pergunto ao trabalhador se ele acha que com o
salaacuterio que ganha ele vai conseguir adquirir a casa ele me diz que ldquoAh natildeo com o
salaacuterio neacute[]61rdquo Entatildeo como o trabalhador vai fazer para poder ter a sua casa Diante
desse argumento explicitamos (ele e eu) nossa compreensatildeo sobre a dureza das
conquistas dos trabalhadores a partir dos viacutenculos de trabalho que assumem
Quando relacionamos os limites que estes trabalhadores enfrentam na realizaccedilatildeo
de suas expectativas e as respostas das fichas de inscriccedilatildeo na Escola do trabalho ou
mesmo com a fala da trabalhadora Aparecida citada anteriormente compreendemos
que a mudanccedila de trabalho e a busca por novas possibilidades natildeo depende apenas da
faacutebrica e do projeto administrativo da cidade mas da atuaccedilatildeo desses trabalhadores que
estatildeo vendo qual trabalho pode lhe garantir maior salaacuterio e mais benefiacutecios
60 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 61 JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 23092011
42
Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
43
Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
44
industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
45
Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
46
Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
47
Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
48
era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
42
Para Berenice que natildeo tem muito estudo e nem grande acuacutemulo de relaccedilotildees de
trabalho o curso de costura foi importante neste processo pois como o secretaacuterio da
Escola do trabalho diz
Por existir um demanda dessa matildeo de obra Eacute uma procura muito grande Entatildeo a pessoa que faz o curso eacute 100 de chance de encontrar o emprego [] soacute se natildeo quiserem mais elas jaacute saem daqui empregadas62
Percebemos na fala do Senhor Moacir a facilidade em se conseguir trabalho na
aacuterea da induacutestria de moda bebecirc para aqueles que fazem o curso teacutecnico Assim como a
trabalhadora Berenice afirma ldquoQuando tinha 15 dias de curso jaacute pedi pra professora me
ponhaacute na faacutebricardquo63 Os trabalhadores jaacute ingressam no curso profissionalizante com a
seguranccedila de saiacuterem empregados
Devido agrave facilidade e a rapidez das contrataccedilotildees o trabalho disponiacutevel nas
induacutestrias de confecccedilatildeo apresenta-se como um campo de possibilidades para os
trabalhadores principalmente diante de suas urgecircncias ou condiccedilotildees adversas como
Berenice - filho pequeno marido preso etc Essa trabalhadora mesmo sem a
qualificaccedilatildeo indicada - pois soacute possuiacutea 15 dias de curso e baixa escolaridade foi
rapidamente contratada
Eu levantei e disse assim ldquoMatildee eu acho que eu vou laacute na faacutebrica vou escrever uma ficha hoje jaacute comeccedilou memo neacute Quem sabe eles natildeo me chamamrdquo Fui sozinha Na intenccedilatildeo assim uma hora eles iriam me chamar Ai escrevi a fixa deixei laacute escrevi laacute e deixei laacute Ai demorou coisa de duas semanas e jaacute me chamaram Pergunto se eu tava trabaiando jaacute ai quando a mulher desligou o celular me matei de dar risada Porque eacute felicidade neacute64
Fica evidente na fala da trabalhadora a certeza que ela tem de que ldquouma hora ou
outrardquo ela seria contratada Berenice reconhece nas conversas entre trabalhadores a
rotatividade nas empresas de bordado mas sabem tambeacutem das vagas abertas que elas
disponibilizam
Outra evidecircncia da facilidade das contrataccedilotildees nos setores da induacutestria de
confecccedilatildeo eacute a pergunta feita agrave Berenice nessa ficha se esta jaacute estaria trabalhando
62 COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho Terra Roxa 03102011 63 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013 64 IDEM
43
Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
45
Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
46
Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
47
Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
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era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
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Pois a empresa na qual Berenice preencheu e deixou a ficha natildeo eacute a uacutenica que precisa
de matildeo de obra e sabe que os trabalhadores procuram outros trabalhos natildeo soacute em
periacuteodos de desemprego mas principalmente quando estatildeo empregados Haacute um grande
nuacutemero de induacutestrias de confecccedilotildees no municiacutepio oficialmente 113 empresas65 e
consequentemente uma grande demanda de vagas de trabalho nestes setores
Para tanto esta ldquofacilidade e rapidezrdquo de se conseguir trabalho em algum setor
da induacutestria natildeo significa a permanecircncia destes trabalhadores Pelo contraacuterio a
confianccedila que estes tecircm de que sempre seratildeo (re)contratados encoraja-os a se
movimentarem por estes e outros postos de trabalho - como no campo no comeacutercio por
conta proacutepria etc buscando melhores salaacuterios e condiccedilotildees de trabalho mais favoraacuteveis a
seus interesses
Esta movimentaccedilatildeo dos trabalhadores nos permite entender o grande nuacutemero de
vagas de trabalho sempre disponiacuteveis nos setores da induacutestria de confecccedilatildeo O que vai
nos indicar uma dificuldade das empresas que haacute mais de uma deacutecada insistem em
dizer que esse eacute o trabalho de excelecircncia no municiacutepio mas que no entanto disputam
natildeo soacute com as vagas no trabalho rural mas tambeacutem com outras praacuteticas de trabalho e
aquisiccedilatildeo de renda destes trabalhadores
As evidecircncias dessa disputa estatildeo principalmente na grande falta de matildeo de
obra que haacute nas induacutestrias na necessidade de um curso teacutecnico que qualifique os
trabalhadores e na abertura de vaacuterias faacutebricas em distritos do municiacutepio Como
podemos perceber neste fragmento de uma reportagem do jornal online Rio Paranazatildeo
A comunidade de Bela Vista [distrito de Guaiacutera-PR] recebeu na quinta-feira dia 06 uma faacutebrica de confecccedilatildeo de moda bebecirc A faacutebrica recebeu investimentos de R$ 7729581 para a conclusatildeo de um barracatildeo de 226 msup2 localizado em frente ao ginaacutesio de esportes e mais R$ 5890730 em 32 maacutequinas de costura recursos proacuteprios do municiacutepio66
Nota-se atraveacutes desta mateacuteria o grande investimento da economia local voltado
para o setor industrial Entendemos que esta parceria pode indicar o interesse em
expandir as atividades concentradas no campo para a cidade aleacutem disso o processo de
65 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 out 2013 66 Disponiacutevel em lthttpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866gt Acesso em 10102013
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
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era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
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A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
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industrializaccedilatildeo do municiacutepio de Terra Roxa e cidade limiacutetrofes como Guaiacutera tem sido
visto como avanccedilo no desenvolvimento econocircmico pois gera emprego e renda ateacute
mesmo nos distritos
No entanto o que nos chama a atenccedilatildeo nesta reportagem eacute o deslocamento de
algumas empresas para distritos e cidades vizinhas Bela Vista eacute um distrito do
municiacutepio de Guaiacutera que faz divisa com Terra Roxa
Assim como nesta localidade distritos do municiacutepio de Terra Roxa como Santa
Rita DOeste Alto Alegre e Satildeo Joseacute possuem alguma facccedilatildeo ou ldquobraccedilordquo de faacutebricas
maiores para disponibilizar vagas a trabalhadores que tecircm dificuldades de deslocamento
ateacute as sedes das empresas Percebemos assim que as induacutestrias estatildeo se deslocando para
distritos ou mesmo cidades vizinhas em busca de matildeo de obra mais barata e em grande
quantidade Atraveacutes destas accedilotildees fica evidente que haacute uma disputa das induacutestrias por
trabalhadores - inclusive com os trabalhadores diaristas rurais e trabalhadores que
possuem viacutenculo com frigoriacuteficos em cidades proacuteximas
O trabalho na induacutestria de confecccedilatildeo nesta perspectiva se torna a opccedilatildeo mais
conveniente para alguns trabalhadores de Terra Roxa Pois haacute uma grande facilidade em
se conseguir trabalho neste setor Quando indago o trabalhador Carlos sobre a escolha
por esse trabalho ele afirma que
Acho que eacute uma opccedilatildeo mesmo Por exemplo eu mesmo se sair da P hoje se sair quero trabalhar em outro lugar que natildeo seja mexer com vestuaacuterio Quero mexer com outras coisas aprender outras coisas Se eu for sair de uma empresa pra entrar em outra de vestuaacuterio pra mim acho que natildeo vai valer agrave pena mudar de um setor pro outro de uma empresa pra outra soacute mudar de nome67
Nota-se atraveacutes da narrativa de Carlos que ele jaacute estaacute saturado com o trabalho
que desempenha na induacutestria ou mesmo com qualquer outro trabalho que seja na aacuterea
da induacutestria de vestuaacuterio O trabalhador natildeo vecirc vantagem em mudar de empresa e ter
que ldquocomeccedilar do zerordquo Apesar de no iniacutecio de sua fala dizer que eacute uma opccedilatildeo sua estar
vinculado agrave empresa de moda bebecirc sua narrativa prossegue indicando que natildeo
Percebemos que se estivessem disponiacuteveis outros postos de trabalho fora da
induacutestria que remunerasse Carlos igual ou superior ao seu atual rendimento talvez ele
jaacute tivesse trocado de emprego haacute algum tempo
67 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
47
Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
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era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
45
Cabe ressaltar aqui as colocaccedilotildees de E P Thompson em ldquoTempo disciplina e
trabalho e capitalismo industrialrdquo68 em que procura analisar a disciplinalizaccedilatildeo do
trabalhador atraveacutes da introjeccedilatildeo de uma noccedilatildeo de tempo mecacircnico e mostrar que a
transformaccedilotildees se dariam natildeo apenas no plano tecnoloacutegico mas tambeacutem a niacutevel
cultural Mesmo se remetendo a outra realidade e momento histoacuterico sua reflexatildeo
contribui para pensar quais satildeo os sentidos e viacutenculos que interessam aos trabalhadores
nessa relaccedilatildeo Segundo o autor
Eacute muito comum que nos paiacuteses onde os viacutenculos da nova classe proletaacuteria da faacutebrica com seus parentes (e talvez com propriedades de terra ou direitos agrave terra) nas vilas satildeo muito mais estreitos ndash e mantidos por muito mais tempo ndash do que na experiecircncia inglesa o problema parece ser o de disciplinar uma forccedila de trabalho que estaacute apenas parcial e temporariamente ldquocomprometidardquo com o modo de vida industrial69
Neste trecho da obra Thompson discute ateacute que ponto houve uma reestruturaccedilatildeo
radical da natureza social do homem e de seus haacutebitos de trabalho Para isso o autor faz
uma anaacutelise de como certos trabalhadores vatildeo lidar com essa nova dinacircmica de tempo
trabalho e disciplina Neste sentido Thompson aponta as dificuldades de disciplinar um
trabalhador que estaria ldquotemporariamente comprometido com o modo de vida
industrialrdquo Percebemos assim a partir da narrativa do trabalhador Carlos que natildeo haacute
uma fidelidade do trabalhador agrave causa industrial ele vai se relacionar com essa praacutetica
enquanto ela responder agraves suas urgecircncias e aos planejamentos que ele produz de acordo
com suas necessidades e interesses
No entanto Carlos ainda avalia o trabalho na induacutestria de moda bebecirc de forma
positiva em sua vida - natildeo pelo que a empresa lhe rendeu mas o que - com suas
decisotildees e empenho - conquistou Quando lhe pergunto se acha que o trabalho na
induacutestria foi importante para mudar algumas coisas em sua vida ele diz que
Eacute mais responsabilidade mais prioridade Natildeo depender tanto dos meu pais neacute Eacute sei laacute como vou te explicar tem uma palavra que natildeo consigo lembrar agora Sei laacute independecircncia independecircncia essa era a palavra que eu queria lembrar Independecircncia financeira de poder neacute Independecircncia de ser mais tranquilo neacute70
68 THOMPSON E P ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo Companhia das letras 1998 69 IBIDEM p 300 70 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
46
Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
47
Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
48
era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
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FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
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lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
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Como Carlos afirmou durante sua entrevista sua infacircncia foi ldquoSem muito
recurso entende Meus pais trabalhavam na roccedila neacute Mas falaacute pra vocecirc que eu tive uma
infacircncia tranquila assim recursos se vestir melhorrdquo71 Retomando a trajetoacuteria de vida
dele podemos compreender o sentido que a palavra ldquoindependecircnciardquo toma em sua
narrativa Quando realizei esta entrevista o trabalhador tinha 25 anos e estava na
empresa de moda bebecirc a 8 anos
Isso nos indica que ele comeccedilou a trabalhar aos 17 anos na faacutebrica Para Carlos
que natildeo teve uma infacircncia ldquotranquila e com muitos recursosrdquo o salaacuterio que passou a
receber pelo seu trabalho de certa forma mudou sua condiccedilatildeo proporcionando ao
trabalhador a condiccedilatildeo financeira de poder adquirir bens materiais que almejava e que
seus pais natildeo poderiam lhe dar Natildeo deixou de contribuir em casa mas agora natildeo era soacute
isso que seu trabalho garantia
Como destaca Maria que atualmente estaacute vinculada ao trabalho na induacutestria
mas que desempenhou trabalho como diarista ateacute o ano de 2009 avaliar esse percurso -
como fez Carlos - passa por destacar restriccedilotildees que procuram deixar para traacutes
A gente trabalhava na roccedila num era um dinheirinho certo dinheiro de roccedila eacute um dinheiro que eacute sufrido eacute um dinheiro bom mais eacute sufrido sabe Ai sempre assim tava faltando as coisa a gente tinha que taacute correndo atraacutes As vezes chuvia se chuvia cecirc natildeo ia trabalhar cecirc natildeo comia daiacute neacute Se comeccedilasse a semana chovendo cecirc jaacute perdia a semana neacute72
O trabalho de diarista no campo estaacute sempre presente na fala desses
trabalhadores ou na trajetoacuteria familiar As dificuldades e inseguranccedilas que este trabalho
carrega tambeacutem Na fala da trabalhadora Maria percebemos a anguacutestia da incerteza de
natildeo saber o valor da remuneraccedilatildeo ao fim de cada semana o que talvez seja a maior das
dificuldades para estes trabalhadores que possuem filhos pagam aluguel e natildeo possuem
conta nos armazeacutens
Maria hoje matildee de dois filhos necessita de certa seguranccedila que avaliou como
sendo uma renda fixa algo que - a curto prazo - o trabalho na induacutestria lhe possibilita
Ela trabalhou no campo durante grande parte de sua vida e sabe bem da precariedade do
trabalho como diarista e das dificuldades que se enfrentam quando se tem uma renda
instaacutevel
71 IDEM 72 MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
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era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
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A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
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No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
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FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
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lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
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Eu trabalhei na roccedila desde meus 11 anos com meu pai Entatildeo natildeo tinha nois passou apurado Era meu pai que sustentava a casa Mais noacuteis ia na roccedila assim soacute por ir neacute A gente natildeo trabalhava neacute Catava algodatildeo ajudava os pai e tudo mais eu fui trabalhar mesmo assim na roccedila depois que eu casei mesmo carpir cataacute algodatildeo arrancaacute mandioca de tudo um poco sabe colhecirc cafeacute Ai fui dar mais valor o que era um serviccedilo braccedilal neacute E intendecirc melhor o que era ter o suor no seu dinheiro ali73
A trabalhadora se casou aos 15 anos e ateacute o ano de 2009 quando Maria e o
marido comeccedilaram a trabalhar na faacutebrica pela segunda vez ambos estiveram sempre
evolvidos com o trabalho no campo Em sua fala Maria nos mostra o sofrimento de
trabalhar como boia-fria No entanto o que nos chama atenccedilatildeo em sua trajetoacuteria eacute que
esta nos mostra que a inserccedilatildeo dos trabalhadores na induacutestria natildeo foi automaacutetica jaacute que
somente quase duas deacutecadas depois da implantaccedilatildeo do projeto APL Vestuaacuterio Moda
Bebecirc em Terra Roxa que Maria e seu marido se inseriram neste setor com maiores
expectativas Pois havia tido uma experiecircncia no trabalho industrial haacute alguns anos
atraacutes como ela relata
Trabalhava na faacutebrica da Ivatilde que tinha aqui na cidade soacute que natildeo me lembro o nome era ali perto do coleacutegio Carlos Gomes uma antiga faacutebrica ai a Iva foi embora pro mato grosso na eacutepoca porque tinha falido a faacutebrica Tinha quatro meses que eu tava na faacutebrica soacute daiacute dero as conta pros funcionaacuterio porque a faacutebrica tinha falido neacute [] Eacute daiacute madaro os funcionaacuterio embora os mais novo os mais velho eu natildeo sei o que eles fizero os mais novo mandaro embora Mais eu demorei muito pra arrumar esse outro emprego aqui eacute porque foi em 2003 que eu fui trabalha laacute na faacutebrica da Iva ai eu fui trabalha aqui agora quando eu comecei foi em 2009 entatildeo demoro bastante neacute 6 anos depois74
Considerando que as induacutestrias comeccedilaram a ampliar o seu mercado na cidade
em meados da deacutecada de 1990 Maria ainda demorou algum tempo ateacute ter a primeira
experiecircncia com o trabalho na induacutestria mais de uma deacutecada De forma que no
intervalo de 2003 a 2009 Maria continuou como diarista rural
Ah eu trabalhava na roccedila ai tinha um projeto aqui de fazer tapete mexia com tapete artesanato custura neacute Foi onde a gente foi se desenvolveno neacute daiacute como o projeto natildeo existe mais que agora o projeto eacute ali em cima ai eu optei pela faacutebrica neacute Que o projeto funcionava assim vocecirc ganhava o tanto que vocecirc produzia neacute Natildeo
73 IDEM 74 IDEM
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era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
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No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
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FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
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lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
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era um serviccedilo por mecircs assim garantido cecirc natildeo tinha no que acreditaacute entatildeo tinha que trabaiaacute muito uma peccedila valia R$500 reais as vezes vocecirc natildeo chegava nem R$20000 reais por mecircs neacute Se natildeo rendia[] Natildeo compensava Taacute certo que era pertinho de casa neacute Mais os filho tudo natildeo compensava porque o salaacuterio era muito poco neacute E boia-fria naquela eacutepoca natildeo era nem R$3000 reais o dia agora taacute R$4000 neacute O dia de boia-fria e nois sempre mexemo com roccedila75
A busca por uma renda fixa ou pelo em maior volume aparece novamente na
fala da trabalhadora pois o momento narrado a trabalhadora jaacute tinha os filhos e o
trabalho de diarista estava em baixa natildeo lhe dava seguranccedila para o sustento da famiacutelia
Para Maria assim como para outros trabalhadores que vecircm do trabalho no campo a
renda fixa que o trabalho na faacutebrica oferece se torna uma importante oportunidade para
mudanccedila na condiccedilatildeo financeira e consequentemente social da vida desses
trabalhadores Maria nos fala um pouco dessas mudanccedilas
Quando comeccedila a trabaia e vecirc o dinheirinho dele ali suado todo mecircs chega laacute no banco e fala ldquopuxa vida neacute Oacuteia meu dinheirinho na matildeordquo final do ano vocecirc recebe feacuterias deacutecimo terceiro Final do ano vocecirc recebe dinheiro se vocecirc natildeo sabe controlaacute seu dinheiro cecirc gasta tudo neacute Mais cecirc recebe um dinheirinho bom feacuterias deacutecimo terceiro salaacuterio Daacute pra vocecirc imprimi [empreender] de fazer alguma coisa algo mais na sua casa pros seus filho neacute76
Como podemos observar nos trechos acima a trabalhadora Maria ldquotem uma
trajetoacuteria de vida difiacutecilrdquo com praacuteticas expectativas e pressotildees comuns tambeacutem a
outros trabalhadores E natildeo podemos esquecer que ateacute pouco tempo era trabalhadora
diarista no campo e o fato de natildeo possuir grande margem de outras ocupaccedilotildees mais
rentaacuteveis tornava sua condiccedilatildeo de vida e de seus familiares precaacuteria Nota-se na fala da
trabalhadora a emoccedilatildeo com que ela narra em receber uma renda fixa e as possibilidades
que essa renda fixa oferece hoje aos seus familiares
Como destaca eacute a partir do ldquodinheirinho a maisrdquo que os trabalhadores recebem
no fim do ano que estes conseguem adquirir um bem material de valor mais alto Como
a proacutepria trabalhadora Maria que juntamente com o marido conseguiram economizar e
comprar o primeiro veiacuteculo motorizado da famiacutelia
75 IDEM 76 IDEM
49
A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
50
Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
53
FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
55
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
56
PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
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A moto a gente comprocirc agora ano passado [2012] A gente tinha um dinheirinho meio guardado ai fomo laacute demo entrada e financiamo o resto tamo pagando mais com muito sofrimento muito sacrifiacutecio77
Observamos na fala dos trabalhadores entrevistados que a aquisiccedilatildeo de alguns
bens materiais eacute interpretada como uma ascensatildeo do niacutevel de vida No entanto
percebemos na fala de Maria o ldquosofrimentordquo financeiro do casal assalariado para
adquirir tal bem O que temos que ter claro eacute que as interpretaccedilotildees positivas dos
trabalhadores sobre a expansatildeo industrial do municiacutepio estatildeo diretamente ligadas agrave
trajetoacuteria de vida que possuem e como interpretam esse processo dando sentidos ao
trabalho e agraves decisotildees que encaminham
Pois estamos falando de trabalhadores que vieram de uma condiccedilatildeo de trabalho
muito mais precaacuteria que a atual A grande quantidade de postos de trabalho ofertada
pela induacutestria facilita a inserccedilatildeo destes trabalhadores nesse ramo poreacutem natildeo determina
sua fixaccedilatildeo aleatoacuteria nele
Notamos assim que o trabalho na induacutestria a princiacutepio eacute interpretado por muitos
trabalhadores positivamente De forma que estes enxergam neste trabalho a
possibilidade de mudanccedila na condiccedilatildeo de suas vidas No entanto eacute importante ressaltar
os limites das possibilidades oferecidas Ateacute que ponto o trabalho na induacutestria de
confecccedilatildeo possibilita a estes trabalhadores melhoria na qualidade e no padratildeo de suas
vidas
A sauacutede no municiacutepio eacute uma das principais queixas dos trabalhadores Pois o
hospital municipal encontra-se sempre em situaccedilatildeo precaacuteria muitas vezes sem a menor
condiccedilatildeo de prestar atendimento A questatildeo eacute que para problemas de sauacutede mais seacuterios
os trabalhadores satildeo obrigados a procurar hospitais particulares ou aguardar a
transferecircncia para atendimentos em outras cidades Como a trabalhadora Berenice nos
narra quando a indago sobre quais mudanccedilas o municiacutepio necessita
Ah o que deveria muda mais memo eacute a sauacutede da gente porque a pessoa chega ali natildeo tem medico natildeo tem nem enfermeiro tem gente que ta ali ta passando mal ali e natildeo tem nem como ser internado ali tem que ser internado laacute na clinica soacute que a clinica fecho agora tem que paga e aonde que agente daqui tipo assim de um lugar que nem essa comunidade aqui eacute tudo gente humilde da onde a gente vai tirar dinheiro pra pagar quarto pagar neacute internaccedilatildeo78
77 IDEM 78 BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa da entrevistada Terra Roxa 30012013
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Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
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CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
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No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
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FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
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Como na fala da trabalhadora Maria citada acima a trabalhadora Berenice
tambeacutem nos narra as dificuldades dos trabalhadores ao viverem com um salaacuterio miacutenimo
diante das deficientes estruturas de sauacutede puacuteblica lazer e educaccedilatildeo do municiacutepio
voltados para o universo dos trabalhadores Assim percebemos o limitado campo de
possibilidades para estes sujeitos que estes estatildeo cientes de sua condiccedilatildeo de exploraccedilatildeo
e da desigualdade que experimentam socialmente Pois quando os indaguei sobre quem
ganha com a expansatildeo da induacutestria no municiacutepio as respostas foram unacircnimes como a
que destaco abaixo
Quem ganha eacute o patratildeo Quem tem empresa ganha quem eacute dono de empresa soacute ganha com isso neacute Esse eacute meu ponto de vista os patratildeo satildeo os mais bem beneficiados neacute Os funcionaacuterios nem tanto porque ainda eu eu vejo o salaacuterio de quem trabalha na empresa de vestuaacuterio ainda muito abaixo das perspectivas Pelo que eu pelo meu ponto de vista os empregadores arrecadam muito bem79
Dos quatro trabalhadores entrevistados todos eles me disseram que satildeo os
empresaacuterios que mais ganham com esta expansatildeo da induacutestria O trabalhador Carlos
ainda questiona os baixos salaacuterios Percebemos assim que os trabalhadores tecircm
consciecircncia de que existe exploraccedilatildeo se mostram como seres ativos e conscientes deste
processo No entanto natildeo se identificam com determinados processos de luta - como o
sindicato dos trabalhadores da induacutestria de moda bebecirc mas procuram tirar proveito de
situaccedilotildees e relaccedilotildees que atendam agraves necessidades e interesses que possuem e
identificam em comum
Desta forma levando em conta o amplo campo de trabalho que este processo de
industrializaccedilatildeo oferece percebemos que estes trabalhadores estatildeo interpretando
mesmo em um processo de exploraccedilatildeo permeado de baixos salaacuterios ritmo de trabalho
intenso e com condiccedilotildees de trabalho limitadas que este processo de expansatildeo da
induacutestria de moda bebecirc pode ser revertido como uma possibilidade de reorganizarem
relaccedilotildees que estavam fragilizadas - como a saiacuteda do meio rural a diminuiccedilatildeo de postos
de trabalho no campo a queda nos valores da diaacuteria etc Com isso se propuseram a
construir alternativas e estatildeo se debatendo com elas
79 CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida a Carem Aline de Oliveira na casa do entrevistado Terra Roxa 17092011
51
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
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FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
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lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
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CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Nesta pesquisa busquei traccedilar uma discussatildeo acerca das relaccedilotildees de trabalho no
processo de industrializaccedilatildeo na cidade de Terra Roxa a partir da visatildeo dos proacuteprios
trabalhadores estabelecendo um diaacutelogo com os mesmos
Para tanto propus-me a interpretar a trajetoacuteria de quatro trabalhadores que
atualmente estatildeo vinculados agraves induacutestrias de moda bebecirc do municiacutepio percebendo as
avaliaccedilotildees limites e contradiccedilotildees presentes na produccedilatildeo das entrevistas com esses
sujeitos
Cabe ressaltar que a escolha pela fonte oral se deu tambeacutem a partir de um
interesse proacuteprio na medida em que meu interesse esteve ligado a compreender como
os trabalhadores de Terra Roxa estatildeo interpretando o processo de industrializaccedilatildeo no
municiacutepio Neste sentido a produccedilatildeo e uso de entrevistas propicia uma gama de
questotildees obtidas por meio do diaacutelogo com os entrevistados mas tambeacutem atraveacutes das
expressotildees de valores sentimentos e interpretaccedilotildees de suas vidas
Ao longo deste trabalho busquei investigar as condiccedilotildees de vida destes
trabalhadores problematizando suas relaccedilotildees de trabalho como se inserem e interpretam
o mercado de trabalho oferecido pela induacutestria de vestuaacuterio no municiacutepio
principalmente discutindo suas inscriccedilotildees em cursos do setor na Escola do Trabalho
As inuacutemeras vagas de trabalho que a induacutestria oferece propiciam a estes
trabalhadores a possibilidade de se movimentarem por este amplo campo de trabalho
buscando melhorar sua condiccedilatildeo de vida ou lidar com as pressotildees e alteraccedilotildees em
outras relaccedilotildees de trabalho como no campo
O diaacutelogo desses trabalhadores com o empreendimento econocircmico da moda
bebecirc natildeo eacute apenas lidar com um mercado mas com a produccedilatildeo de novas expectativas
em relaccedilatildeo ao seu padratildeo atual de vida e sua inserccedilatildeo social na cidade
Natildeo identifico o trabalho fabril de forma beneacutefica para os trabalhadores de Terra
Roxa Estamos conscientes da exploraccedilatildeo dos baixos salaacuterios ritmo de trabalho intenso
e das condiccedilotildees de trabalho limitadas Para tanto busquei trazer os limites da realizaccedilatildeo
das expectativas que estes trabalhadores constroem e as contradiccedilotildees dessa dinacircmica de
trabalho
52
No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
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FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
54
lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
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No entanto percebemos que os trabalhadores mesmo neste processo de
exploraccedilatildeo consideram que o processo de industrializaccedilatildeo pode ser revertido como uma
possibilidade de melhoria nas condiccedilotildees de suas vidas no qual podem produzir
alternativas Pois estes trabalhadores estatildeo cientes de sua situaccedilatildeo de exploraccedilatildeo e se
mostram como seres ativos neste processo buscando se aproveitar da loacutegica capitalista
das formas que conseguem movimentando-se por este mercado de trabalho de acordo
com os interesses e necessidades que possuem e produzem - abrir uma facccedilatildeo oscilar
entre o trabalho na faacutebrica de bordado e no trabalho como diaristas no campo etc
A conclusatildeo neste trabalho eacute parcial como em todo trabalho de pesquisa O
objeto investigado as relaccedilotildees de trabalho tendo como sujeitos os trabalhadores
vinculados agraves induacutestrias estatildeo em constante mudanccedila e reavaliaccedilatildeo
De forma que ainda diversas questotildees acerca da produccedilatildeo de entrevistas do
roteiro da problematizaccedilatildeo dessas relaccedilotildees acabaram surgindo posteriormente e foram
sendo observadas no decorrer desta pesquisa O fato de eu ter realizado somente quatro
entrevistas com trabalhadores tambeacutem prejudicou a problematizaccedilatildeo que me propus
realizar a cerca da trajetoacuteria destes Neste sentido as questotildees que natildeo foram
trabalhadas nesta pesquisa possibilitam a sua continuidade
Como por exemplo a anaacutelise mais especiacutefica acerca de como a imprensa
jornaliacutestica noticia e se posiciona frente agraves condiccedilotildees de vida em Terra Roxa e a
expansatildeo da Induacutestria de Vestuaacuterio problematizando o interesse que o poder puacuteblico
municipal tem em legitimar a industrializaccedilatildeo como principal atividade econocircmica da
cidade Para tanto essas questotildees abrem para a possibilidade de continuar a
investigaccedilatildeo sobre o processo de industrializaccedilatildeo no municiacutepio
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FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
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lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
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FONTES FONTES ORAIS BERENICE (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR CARLOS (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 17 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa- PR COMERLATTO Moacir Carlos Entrevista Concedida em 03 de outubro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira na escola do trabalho em Terra Roxa-PR JOSEacute (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 16 de setembro de 2011 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia do entrevistado em Terra Roxa-PR MARIA (pseudocircnimo) Entrevista Concedida em 30 de janeiro de 2013 Realizada por Carem Aline de Oliveira nas dependecircncias da residecircncia da entrevistada em Terra Roxa-PR SITES httpwwwfieprorgbrboletimobservatorioNews10739content156924shtml httpwwwstephanesjuniorcombrnoticiaphpidnoticia=272 httpwwwterraroxaprgovbrindexphp httpcidadesibgegovbrxtrasperfilphplang=ampcodmun=412740ampsearch=parana|terra-roxa httpswwwcagedgovbr httpwwwibgegovbrhomeestatisticaeconomiapibmunicipiossub_economia JORNAIS AGRICULTURA depende de migrante rural Folha de Satildeo Paulo Satildeo Paulo 13 de junho 2010 Disponiacutevel em lthttpwwwfolhauolcombrfspmercadome1306201011htmgt Acesso em 15102013 APL da moda bebecirc em Terra Roxa faz balanccedilo anual em setembro Agecircncia SEBRAE de Notiacutecias Curitiba 21 ago 2012 Disponiacutevel em lthttpwwwpragenciasebraecombrnoticia18764013setores-estrategicosapl-moda-bebe-de-terra-roxa-faz-balanco-anual-em-setembroindice=130gt Acesso em 25 102013 ESCOLAS na fronteira perdem alunos para o contrabando e o narcotraacutefico Gazeta do Povo Maringaacute 13 de agosto de 2012 Disponivel em
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lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
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lthttpwwwgazetadopovocombrvidaecidadaniaconteudophtmlid=1285852gtAcesso em 22102013 PARO Denise Em Terra Roxa a moda bebecirc sai do siacutetio e vai para as lojas Gazeta do Povo Curitiba 04 out 2013 Disponiacutevel em lthttpwwwgazetadopovocombreconomiabem-feito-no paranaconteudophtmlid=1413937gt Acesso em 25 102013 httpwwwrioparanazaocombrhomepag=cidadeintampmateria=866 acessado em 10102013 FICHAS Ficha de inscriccedilatildeo para o curso de qualificaccedilatildeo do centro de formaccedilatildeo profissional Benjamin Jose Coelho (Escola do trabalho) 17032011 e 23072012 IacuteNDICES ESTATIacuteSTICOS IPARDES Caderno estatiacutestico do municiacutepio de Terra Roxa Curitiba IPARDES 2011 IPARDES et al Arranjo produtivo local de moda bebecirc de Terra Roxa estudo de caso Curitiba IPARDES UNIOESTE Secretaria de Estado de Planejamento e Coordenaccedilatildeo Geral 2006
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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
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REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS ARAUacuteJO P S MARQUES F R Perfil constitucional coreano de mulheres trabalhadoras de uma induacutestria de confecccedilatildeo e bordados de Terra Roxa- PR e sua relaccedilatildeo com os DORT In VII Encontro Internacional de Produccedilatildeo Cientiacutefica Cesumar Anais Maringaacute CESUMAR 27 a 30 de outubro de 2009 CARVALHAL Terezinha Brumatti Dinacircmica territorial do trabalho domiciliar das mulheres em Terra RoxaPR 2009 Tese (Doutorado em Geografia) Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciecircncias e Tecnologia Presidente Prudente 2009 CAMARANO Ana Ameacutelia ABRAMOVAY Ricardo Ecircxodo rural envelhecimento e masculinizaccedilatildeo no Brasil Panorama dos uacuteltimos 50 anos Rio de Janeiro Instituto de pesquisa econocircmica aplicada - IPEA 1999 Texto para discussatildeo Nordm 621 CARDIN Eric Gustavo Mesa PARA UMA HISTOacuteRIA DO TRABALHO INFORMAL I Seminaacuterio do GT Mundos do Trabalho ANPUHPR ndash 2013 Universidade Estadual do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon Disponivel emlthttpwwwyoutubecomwatchv=ChpuUP3FC1kgt Acesso em 22102013 FREDERICO Liane Adiers Mulheres e trabalho experiecircncias de mulheres boacuteias-frias de Santa Rita DacuteOeste entre as deacutecadas de 1970 e 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2000 GUARESCHI Maria Luiza O uso de agrotoacutexicos no municiacutepio de Terra Roxa de 1970 a 1990 Trabalho de conclusatildeo de curso(Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1995 GODOY Joatildeo Miguel T A faacutebrica e o Mundo fabril nos Estudos Acadecircmicos brasileiros Histoacuteria Questotildees amp Debates Curitiba nordm 52 p 175-203 JanJun 2010 KHOURY Yara Aun O historiador as fontes orais e a escrita da Histoacuteria In Outras histoacuterias memoacuterias e linguagens (Org) Laura A Maciel Paulo Roberto de Almeida Yara A Khoury Satildeo Paulo Olho drsquo Aacutegua 2006 OLIVEIRA Carem Aline Trabalhadores do vestuaacuterio em Terra Roxa relaccedilotildees de trabalho e modos de vida (1990 -2011) Projeto de Iniciaccedilatildeo Cientiacutefica Voluntaacuteria sob orientaccedilatildeo da Profordf Drordf Sheille Soares de Freitas UNIOESTE Marechal Cacircndido Rondon Trabalho vinculado ao Grupo de Pesquisa Histoacuteria Social do Trabalho e da Cidade e Laboratoacuterio de Pesquisa Trabalho e Movimentos Sociais Junho de 2011 a Maio de 2012 PAOLI Maria Ceacutelia SADER Eder TELLES Vera Silva da Pensando a Classe Operaacuteria Os Trabalhadores Sujeitos no Imaginaacuterio Acadecircmico Revista Brasileira de Histoacuteria Satildeo Paulo nordm 06 p 14 198 PORTELLI A O que faz a histoacuteria oral Projeto histoacuteria Satildeo Paulo n 14 p 25-39 fev 1997
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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987
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PORTELLI A A filosofia e os fatos Narraccedilatildeo interpretaccedilatildeo e significado nas memoacuterias e nas fontes orais Tempo Rio de Janeiro v 1 nordm 2 1996 SCHENATO Gladis Bettoni Boacuteias-frias em Terra Roxa de 1975 a 1994 Trabalho de conclusatildeo de curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 1994 p 32-33 SILVA Marcela da O Cotidiano dos trabalhadores das faacutebricas de bordado da cidade de Terra Roxa (1985-2004) 2004 Trabalho de Conclusatildeo de Curso (Graduaccedilatildeo em Histoacuteria) Centro de Ciecircncias Humanas Educaccedilatildeo e Letras Universidade Estadual do Oeste do Paranaacute Marechal Cacircndido Rondon 2004 THOMPSON E P A miseacuteria da teoria ou um planetaacuterio de erros uma critica ao pensamento de Authusser Rio de Janeiro Zahar editores 1981 _____ ldquoA histoacuteria vista de baixordquo In _____ As peculiaridades dos ingleses e outros artigos Org Antocircnio Luigi Negro Seacutergio Silva Campinas Ed UNICAMP 2001 p185-201 _____ ldquoIntroduccedilatildeordquo In _____ A formaccedilatildeo da classe operaacuteria Inglesa a aacutervore da liberdade Rio de Janeiro Paz Terra V I 1987 p 11-12 _____ ldquoTempo disciplina de trabalho e capitalismo industrialrdquo In _____ Costumes em comum Estudos sobre cultura popular tradicional Satildeo Paulo ed ScharezLTDA companhia das letras 1998 VIEIRA M P PEIXOTO M R KHOURY Y A A pesquisa em Histoacuteria 4ordf ed Satildeo Paulo Aacutetica 1987