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Integração do componente pastoril em sistemas agrícolas Paulo C. de F. Carvalho 1 , Anibal de Moraes 2 , Ibanor Anghinoni 1 , Davi T. da Silva 1 , Taíse R. Kunrath 1 , Raquel S. Barro 1 , Felipe C. Carmona 1 , Armindo B. Neto 1 , Amanda P. Martins 1 , Thiago Barros 1 , William S. Filho 1 1. Introdução O foco na produtividade no curto prazo, sem levar em consideração os impactos ambientais, tem sido apontado como causa primária da degradação dos sistemas agrícolas e da falta de sustentabilidade dos atuais modelos de produção. Os processos de intensificação e de especialização que hoje predominam na agricultura contemporânea, e que estão associados a impactos ambientais negativos, tais como poluição e aquecimento global, derivam da chamada “Revolução verde” (Griffon, 2006). Após a II guerra mundial, as necessidades globais de alimento impuseram enorme desafio tecnológico aos sistemas agrícolas. Os sistemas de produção e suas variantes tecnológicas convergiram, então, para sistemas cada vez mais especializados, de menor diversidade, ao mesmo tempo que incrementaram sobremaneira o uso de insumos. Por exemplo, o uso de fertilizantes nitrogenados aumentou oito vezes nos últimos 50 anos (Subbarao et al., 2013). O resultado foi o forte incremento em produtividade, que triplicou a produção global de grãos (Lemaire et al., 2015). Além dos incrementos oriundos do melhoramento genético vegetal, a “tecnologia de insumos” foi a principal determinante da escalada produtivista que se observa nas últimas décadas. Após 60 anos deste modelo de produção, a despeito dos inegáveis ganhos em produtividade, é consenso que o mesmo esteja esgotado (Foley et al., 2011). Relatos de degradação do solo, da água, da biodiversidade e do clima estão citados em inúmeras publicações (e.g., Millenium Ecossystems Assessments, 2005; Russele & Franzluebbers, 2007; Dumont & Tallowin et al., 2011, Lemaire et al., 2015) que concluem pela necessidade de mudanças. Além disso, sistemas agrícolas que resultam em severos impactos ambientais, são cada vez mais considerados como inaceitáveis pela sociedade mundial (Lemaire et al., 2014) Há, portanto, necessidade urgente de correção de rumo. Correção de perspectiva na produção de alimentos (Carvalho, 2005). Apesar de lentas, iniciativas nesse sentido são observadas pela expansão do sistema plantio direto, a integração da lavoura com a pecuária, a preocupação sobre a utilização racional da água e de agroquímicos, as exigências de maior competitividade e sustentabilidade, acesso a linhas de crédito sob contrapartida ambiental (e.g., plano ABC - agricultura de baixa emissão de carbono), dentre outras. Esses novos requerimentos aos sistemas de produção visam a redução dos custos, ao mesmo tempo em que se conserve atributos ambientais (Kluthcouski & Stone, 2003). Neste sentido, o renovado interesse nos sistemas de produção integrados (Entz et al., 2005) tem relação com o potencial deste conceito de produção em mudar, positivamente, a dinâmica biofísica e sócio-econômica dos sistemas de produção (Keulen & Schiere, 2004). É de amplo reconhecimento pelo meio científico de que os 1 GPSIPA UFRGS Porto Alegre-RS, Brasil. mail to: [email protected] 2 NITA - Departamento de Fitotecnia e Fitossanitarismo UFPR Curitiba-PR, Brasil.

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Integração do componente pastoril em sistemas agrícolas

Paulo C. de F. Carvalho

1, Anibal de Moraes

2, Ibanor Anghinoni

1, Davi T. da Silva

1, Taíse R. Kunrath

1,

Raquel S. Barro1, Felipe C. Carmona

1, Armindo B. Neto

1, Amanda P. Martins

1, Thiago Barros

1, William

S. Filho1

1. Introdução

O foco na produtividade no curto prazo, sem levar em consideração os impactos

ambientais, tem sido apontado como causa primária da degradação dos sistemas

agrícolas e da falta de sustentabilidade dos atuais modelos de produção. Os processos de

intensificação e de especialização que hoje predominam na agricultura contemporânea,

e que estão associados a impactos ambientais negativos, tais como poluição e

aquecimento global, derivam da chamada “Revolução verde” (Griffon, 2006).

Após a II guerra mundial, as necessidades globais de alimento impuseram enorme

desafio tecnológico aos sistemas agrícolas. Os sistemas de produção e suas variantes

tecnológicas convergiram, então, para sistemas cada vez mais especializados, de menor

diversidade, ao mesmo tempo que incrementaram sobremaneira o uso de insumos. Por

exemplo, o uso de fertilizantes nitrogenados aumentou oito vezes nos últimos 50 anos

(Subbarao et al., 2013). O resultado foi o forte incremento em produtividade, que

triplicou a produção global de grãos (Lemaire et al., 2015). Além dos incrementos

oriundos do melhoramento genético vegetal, a “tecnologia de insumos” foi a principal

determinante da escalada produtivista que se observa nas últimas décadas.

Após 60 anos deste modelo de produção, a despeito dos inegáveis ganhos em

produtividade, é consenso que o mesmo esteja esgotado (Foley et al., 2011). Relatos de

degradação do solo, da água, da biodiversidade e do clima estão citados em inúmeras

publicações (e.g., Millenium Ecossystems Assessments, 2005; Russele &

Franzluebbers, 2007; Dumont & Tallowin et al., 2011, Lemaire et al., 2015) que

concluem pela necessidade de mudanças. Além disso, sistemas agrícolas que resultam

em severos impactos ambientais, são cada vez mais considerados como inaceitáveis

pela sociedade mundial (Lemaire et al., 2014)

Há, portanto, necessidade urgente de correção de rumo. Correção de perspectiva na

produção de alimentos (Carvalho, 2005). Apesar de lentas, iniciativas nesse sentido são

observadas pela expansão do sistema plantio direto, a integração da lavoura com a

pecuária, a preocupação sobre a utilização racional da água e de agroquímicos, as

exigências de maior competitividade e sustentabilidade, acesso a linhas de crédito sob

contrapartida ambiental (e.g., plano ABC - agricultura de baixa emissão de carbono),

dentre outras. Esses novos requerimentos aos sistemas de produção visam a redução dos

custos, ao mesmo tempo em que se conserve atributos ambientais (Kluthcouski &

Stone, 2003).

Neste sentido, o renovado interesse nos sistemas de produção integrados (Entz et al.,

2005) tem relação com o potencial deste conceito de produção em mudar,

positivamente, a dinâmica biofísica e sócio-econômica dos sistemas de produção

(Keulen & Schiere, 2004). É de amplo reconhecimento pelo meio científico de que os

1 GPSIPA – UFRGS – Porto Alegre-RS, Brasil. mail to: [email protected]

2 NITA - Departamento de Fitotecnia e Fitossanitarismo – UFPR – Curitiba-PR, Brasil.

sistemas integrados sejam eficientes na ciclagem de nutrientes e energia (Entz et al.,

2005), e sejam mais sustentáveis (Ryschawy et al., 2013) e resilientes (Lemaire et al.,

2014). Os sistemas integrados não são importantes somente pela produção de serviços

ecossistêmicos, mas porque predominam em boa parte das pequenas propriedades no

mundo. Dos pobres das áreas rurais, 2/3 têm animais em suas pequenas propriedades e

60 % desses utilizam sistemas mistos de exploração (Thomas, 2001). Segundo Keulen

& Schiere (2004), os sistemas integrados alcançam 2,5 bilhões de hectares no mundo,

sendo responsáveis por mais de 50 % da produção mundial de alimentos (Herrero et al.,

2010)

Portanto, a associação de animais com cultivos agrícolas é rara opção de sistema de

produção que associa produção de alimentos com redução de impactos ambientais.

Moraes et al. (2002) afirmam que a inclusão de forrageiras em sistemas agrícolas

assegura inúmeras vantagens. Dentre elas destacam-se a manutenção das características

físicas, químicas e biológicas do solo, o controle da erosão, o uso mais eficiente dos

recursos ambientais. Além desses, os autores mencionam o aumento nos níveis de

produção animal e vegetal, a rentabilidade maior e mais estável das culturas, o

incremento no controle de plantas daninhas e a quebra de ciclos de pragas e doenças.

No centro do país, os sistemas integrados têm sido propostos como estratégia de

recuperação de solos com baixa fertilidade, sendo empregada particularmente na

recuperação de áreas de pastagens degradadas no Cerrado brasileiro (Zimmer et al.,

2004). Já no sul do Brasil esses sistemas têm sido propostos pela diminuição de risco no

negócio agrícola e alternativa ao menor interesse nas rotações com culturas de inverno

(Carvalho et al., 2006).

Não obstante, o sucesso de um sistema integrado depende de diversos fatores que, por

sua vez, são dinâmicos e interagem entre si. Carvalho et al. (2010) citam alguns pré-

requisitos básicos a serem priorizados na adoção dos sistemas integrados, dentre eles: o

plantio direto, a rotação/diversificação de cultivos, o uso de insumos e genótipos

melhorados, o manejo correto dos pastos, sempre preconizando a manutenção de

estruturas de pasto que otimizem a colheita de forragem pelo animal e o mantenham sob

intensidades de pastejo que não venham a comprometer o sistema.

No contexto do acima exposto, e na medida em que boa parte das relações solo-planta-

animal decorrentes da integração da pecuária com a lavoura seja mediada pelo efeito

dos animais no sistema, este trabalho tem por objetivo discutir o impacto da introdução

do pasto e do efeito do pastejo em sistemas agrícolas.

2. Diagrama conceitual da entrada do pasto e de animais em pastejo em sistemas

agrícolas

Neste manuscrito, assumiremos a definição de sistema integrado proposta por Carvalho

et al. (2014), adotando o acrônimo SIPA em aderência a terminologia internacional.

Segundo os autores, o Sistema Integrado de Produção Agropecuária (SIPA) é aquele

caracterizado por ser planejado para explorar sinergismos e propriedades emergentes,

frutos de interações nos compartimentos solo-planta-animal-atmosfera, de áreas que

integram atividades de produção agrícola e pecuária.

Segundo Moraes et al. (2012), as interações entre os componentes do SIPA (i.e. árvores,

grãos e gado) “exigem estratégias de manejo altamente desafiadoras, que não são

empregadas em sistemas baseados em monocultivos” (Lin et al., 1999). O efeito

resultante dessas interações, ecológicas e econômicas, pode ser positivo

(favorecimento), neutro ou negativo (competição) (Callaway & Walker, 1997). Como as

interações são dinâmicas, os efeitos podem oscilar do favorecimento à competição, e

vice-versa, com estágios interativos coexistindo no tempo e espaço (Anderson &

Sinclair, 1993). Portanto, o manejo de sistemas complexos como o SIPA não pode ser

interpretado por fatores isolados, requerendo visão sistêmica desse tipo de

agroecossistema de produção (Wilson et al., 1990; Nair, 1993; Ong & Leakey, 1999;

Lin et al., 1999; Torquebiau, 2000; Jose et al., 2004).

Para ilustrar essas interações, consideremos a constituição de um SIPA a partir de duas

possibilidades: a introdução do componente animal num sistema puramente agrícola, ou

a introdução de um cultivo agrícola num sistema puramente pastoril (Figura 1).

PlantaAnimal

Solo

Planta

Solo

Introdução do componente animal em sistemas agrícolas

PlantaAnimal

Solo

Introdução do componente agrícola em sistemas pastoris

PlantaAnimal

Solo

Figura 1. Diagrama conceitual das relações solo-planta e solo-planta-animal em

sistemas de produção que integram o componente animal a sistemas

puramente agrícolas, ou integra o componente agrícola a sistemas

puramente pastoris.

O diagrama considera o componente vegetal como sendo pastos, cultivos de grãos,

árvores, enfim, toda e qualquer planta envolvida no sistema. As flechas, dentro das

áreas sobrepostas, representam as interações entre componentes, interações essas que

ocorrem em diferentes escalas temporais. Já a área hachurada representa a mediação do

componente solo. É ele a “memória física” do sistema (Anghinoni et al., 2013).

Enquanto os demais componentes se alternam no tempo e no espaço, é o solo que vai

incorporando as consequências de longo prazo da sucessão dos componentes e seu

manejo.

Os nutrientes ciclam entre compartimentos. Segundo Soussana & Lemaire (2014), os

ciclos de C e N são acoplados segundo princípios de estequiometria. Os compartimentos

solo e planta são acopladores de C e N na formação da biomassa vegetal e na

constituição da matéria orgânica. Já o compartimento animal é desacoplador pela ação

do pastejo, por exemplo liberando metano pela eructação e N nas excreções a partir do

consumo da biomassa vegetal. O balanço entre compartimentos depende

fundamentalmente da intensidade de pastejo (Carvalho et al., 2010; Soussana &

Lemaire, 2014). Intensidades de pastejo moderadas favorecem o acoplamento de C e N

pela ciclagem de N via urina, estímulo de renovação da área foliar pelo pastejo e

favorecimento a rizodeposição situação em que frequentemente se observa incremento

nos estoques de C no solo (Balesdent & Balabane, 1996) No entanto, em altas

intensidades de pastejo, o desacoplamento é maior que o acoplamento, e o sistema passa

a operar de forma negativa. Portanto, o manejo dos fluxos de nutrientes entre

compartimentos, ou o controle dos processos de acoplamento e desacoplamento de

nutrientes, é condição essencial para que se obtenha resultados positivos em SIPA.

Pode-se depreender do diagrama acima que, do ponto de vista de funcionamento do

sistema, a introdução do componente agrícola altere menos a condição anterior que a

introdução do componente animal. Enquanto a introdução de um cultivo agrícola em um

sistema pastoril represente o incremento em diversidade do componente vegetal, a

introdução do componente animal representa o ingresso de novos fluxos e interações

dentro sistema. Segundo Bonaudo et al. (2014), o papel do animal é o de reciclar e

incrementar a eficiência de uso dos recursos tróficos. Logo, dado os novos níveis de

complexidade atingidos a partir da ação do pastejo, a probabilidade de surgir

propriedades emergentes (Anghinoni et al., 2013) com a entrada do componente animal

num sistema agrícola é, teoricamente, bem maior.

As interações entre componentes podem ocorrer em diferentes escalas espaciais e

temporais. Por exemplo, quando o componente vegetal são os pastos, a interação com o

componente animal é direta e imediata pela ação do pastejo, das excretas e do pisoteio.

Quando o componente vegetal é uma lavoura de milho em sucessão, então a escala

temporal é deslocada para o tempo equivalente ao da rotação, e a interação é mediada,

por exemplo, por um resíduo de fezes do ciclo pastagem. Tendo o animal em pastejo um

impacto tão importante na eficiência e funcionamento dos SIPA, foquemos a partir de

agora os impactos particulares do pastejo nos sistemas integrados.

3. O processo de pastejo e as particularidades inerentes aos sistemas integrados

de produção agropecuária

O pastejo é um intrincado processo pelo qual os herbívoros buscam seu alimento. Ele se

caracteriza pelas ações do animal na procura, seleção e captura da forragem. O

desferimento do bocado é o clímax do pastejo e resulta de uma complexa série de

decisões por parte do animal. Dentre elas, as de maior relevância estão na definição do

sítio de alimentação dentro da pastagem, das espécies a serem consumidas dentro do

sítio escolhido, e a definição sobre as partes das plantas a serem consumidas (Carvalho

& Moraes, 2005).

Essas decisões terminam por influenciar as características de como o animal transita

pela pastagem, bem como a intensidade com que ele apreende o pasto, justamente dois

aspectos de importância capital para os sistemas integrados. O primeiro determina os

fenômenos de adensamento e compactação do solo. O segundo, afeta o acoplamento de

C e N, e o resíduo de palhada a ser utilizado em plantio direto. Neste sentido, para se

controlar o impacto do pastejo animal nesses sistemas, é importante que se compreenda

a natureza dos processos num SIPA, particularmente aqueles que dão sustentação à

produção vegetal e animal do sistema. Para tanto, propõe-se a discutir tais processos a

partir de um digrama conceitual do processo de pastejo no contexto do sistemas

integrados (Figura 2).

Massa de f orragem

Produt ividade do sistema

Produção/ cb Produção/ ha

Rendimento da lavoura

Taxa de acúmulo Produção t otal de f orragem

Ambiente Físico- quimico

Ambiente biológico

Lotação

Nível de ingest ão

Biomassa na semeadura

Compact ação/adensament o Ciclagem de

nut rient es

Figura 2. Diagrama conceitual de como a intensidade de pastejo, ao longo da fase

pastagem, afeta o sistema integrado de produção agropecuária (adaptado de

Carvalho et al., 2010).

O diagrama conceitual baseia-se em tipos de SIPA que alternam ciclos de pastagem e de

lavoura em rotação na mesma área, que são sistemas típicos utilizados no Brasil (mas

vide . Ele sugere que a intensidade de pastejo empregada numa pastagem afetaria a

estrutura e a quantidade do pasto em oferta para os animais, pois quanto maior a

intensidade de pastejo empregada, menor a massa de forragem. A produção da fase

pastagem é afetada pelo fato da massa de forragem afetar ao mesmo tempo a produção

primária (taxas de acúmulo de matéria seca) e a produção secundária (desempenho

animal). As taxas de acúmulo dependem da massa de forragem pois o índice de área

foliar e a interceptação luminosa estão diretamente relacionados às massas de forragem.

Alterações na capacidade fotossintética do dossel, determinadas por variações na

intensidade de pastejo, afetam o ritmo de crescimento do pasto e a quantidade de

forragem disponível (Silva & Pedreira, 1997). Já do ponto de vista de desempenho

animal, as massas de forragem afetam diretamente a ingestão de matéria seca por afetar o

volume do bocado que o animal em pastejo é capaz de retirar do pasto. Por consequência,

isso afeta o desempenho individual e o desempenho por unidade de área.

Até este ponto, as relações entre intensidade de pastejo e massa de forragem que

determinam o desempenho animal são clássicas das relações planta-animal de sistemas

pastoris. O que conecta este ciclo à fase agrícola é a massa de forragem final do ciclo

pastagem, que se constitui na palhada que receberá o plantio direto nas primeiras ações

de manejo do ciclo lavoura. Quanto maior a intensidade de pastejo empregada no ciclo

pastagem, menor a biomassa no momento da semeadura da lavoura e maior a

compactação que se transfere ao ciclo lavoura (Carvalho et al., 2011). Ademais, em

situações de elevada intensidade de pastejo, o desacoplamento de nutrientes é maior que

o acoplamento, conforme mencionado anteriormente. Todo esse contexto acaba por

determinar o ambiente químico, físico e biológico do solo que recebe o ciclo da lavoura.

O ciclo da lavoura estará afetado pelos resíduos da fase pastagem, pois a quantidade e

natureza desses resíduos definem a magnitude e as taxas de liberação de nutrientes da

biomassa do pasto para a lavoura. Além disso, a quantidade de palhada afeta a biomassa

de plantas invasoras presentes ao longo da cultura. Quanto menor a biomassa, maior a

incidência de plantas invasoras. Outro fator associado com a biomassa de palha que

cobre o solo é a unidade do solo. Quanto menor a biomassa, menor a capacidade do solo

em reter água. Soma-se a isto as dejeções dos animais, que se transferem para o ciclo da

lavoura criando heterogeneidade na distribuição espacial de nutrientes.

Após o ciclo da lavoura, novo ciclo de pastagem retorna sobre resíduos da cultura, e é

então a vez da lavoura afetar o estabelecimento do pasto (Crusciol et al., 2012; Barth

Neto et al., 2014). Desta maneira, dependendo da quantidade e qualidade dos resíduos

das lavouras deixados sob o solo, poderá resultar em maior imobilização de nutrientes do

solo, durante o processo de decomposição dos resíduos. Por conseguinte, maior limitação

dos nutrientes disponíveis no solo, menor a velocidade de estabelecimento do pasto.

Disto podendo resultar em menor período de utilização do pasto pelos animais em

pastejo e menores possibilidades de ganhos com produto animal durante o período. E

assim se sucedem pastos e lavouras, em inúmeras possibilidades de combinações de tipos

e sistemas. O único componente permanente do sistema é o solo, que em longo prazo

incorpora todos os efeitos das rotações e do manejo dos cultivos e da pastagem. Por essa

razão, Anghinoni et al. (2013) consideram o componente solo como a “memória do

sistema”, pois nele é possível detectar os efeitos das rotações em parâmetros químicos,

físicos e biológicos que descrevem a trajetória de construção dos atributos do solo.

4. Exemplos do impacto da introdução do componente pastoril em sistemas

agrícolas

Os itens anteriores apresentaram a importância da intensidade de pastejo na definição

do sucesso ou insucesso de um SIPA. No intuito de avançar nesse tema, abordemos em

detalhe alguns exemplos de como a intensidade de pastejo afeta os componentes solo e

planta do sistema.

A quantidade de forragem presente no ciclo pastagem define o ritmo de aquisição de

forragem pelo animal em pastejo, pois afeta a frequência com que os animais

apreendem os bocados (Carvalho et al., 2005). De forma geral, quanto menor a massa

de forragem, maior a frequência de bocados que os animais desferem no pasto. A massa

de forragem afeta, também, outro parâmetro associado ao ritmo de aquisição de

forragem. Conforme Carvalho (2005), o nível de oferta imprime dinâmica particular aos

ciclos de alimentação que ocorrem ao longo do tempo em que o animal pasteja, ciclos

esses denominados refeições, cujo número e extensão são reflexos do nível de saciedade

atingido pelo animal. Quanto menor este nível (situações de massas de forragem

limitantes), maior o tempo despendido no processo de alimentação, maior o

deslocamento dos animais na busca pelo alimento e maior o número de estações

alimentares visitadas (Figura 3).

Figura 3. Características do processo de pastejo de novilhos na fase pastagem de um

sistema de integração lavoura-pecuária (dados calculados a partir de Baggio,

2007).

Como pode ser observado, o tempo em que um animal passa pastejando é função direta

da massa de forragem, e os animais chegam a aumentar em até 50% o tempo de pastejo

em situações de restrição de alimento. Em tal situação, os animais pastejam por período

de tempo maior, procurando manter o consumo diário em níveis satisfatórios. O

aumento no tempo de pastejo diário é conseguido pelo animal tanto por meio do

aumento do tempo de duração médio da refeição, como pela diminuição do tempo de

duração média do intervalo entre refeições (Carvalho, 2005).

O aumento do tempo de pastejo faz com que o impacto do animal no sistema seja

incrementado, na medida em que implique em aumento do tempo em deslocamento do

animal pelo piquete. A restrição de pasto não aumenta simplesmente esse tempo, mas

aumenta também a velocidade com que eles transitam na mesma unidade de tempo em

pastejo (Baggio, 2007), ou seja, os animais passam a dar maior número de passos por

unidade de tempo na tentativa de encontrar mais forragem para consumir. A

consequência final é que o número total de passos incrementa em quase 100% quando

se compara com situações não limitantes de alimentação (Figura 3).

y = 472,5 - 13,4x

R2 = 0,5330

P=0,0165

CV= 15,20%

200

250

300

350

400

450

500

550

0 4 8 12 16Oferta de forragem (kg MS/100 kg PV)

Tem

po d

e p

aste

jo (

min

/dia

)

Altura (cm)

Massa de forragem (kg/ha MS)

2530 3870 5200 6530

19 30 41 52

y = 5624,6 - 183,3x

R2 = 0,6053

P=0,0080

CV= 15,44%

2500

3000

3500

4000

4500

5000

5500

6000

6500

7000

0 4 8 12 16Oferta de forragem (kg MS/100 kg PV)

Núm

ero

tota

l de p

assos

Altura (cm)

Massa de forragem (kg/ha MS)

2530 3870 5200 6530

19 30 41 52

y = 4098,1 - 150,7x

R2 = 0,6685

P=0,0039

CV= 15,63%

1500

2000

2500

3000

3500

4000

4500

5000

0 4 8 12 16Oferta de forragem (kg MS/100 kg PV)

Núm

ero

tota

l de e

sta

ções a

lim

enta

res

Altura (cm)

Massa de forragem (kg/ha MS)

2530 3870 5200 6530

19 30 41 52

y = 90,7 - 3,6x

R2 = 0,6095

P=0,0077

CV= 19,81%

30

50

70

90

110

0 4 8 12 16Oferta de forragem (kg MS/100 kg PV)

Tem

po d

e d

ura

ção d

a r

efe

ição (

min

.)

Altura (cm)

Massa de forragem (kg/ha MS)

2530 3870 5200 6530

19 30 41 52

No que diz respeito às estações alimentares, essas são como “pratos de forragem”, cuja

definição significa a área alcançada pelo animal quando pastejando e sem que se

movam suas patas dianteiras. Quanto maior a quantidade de nutrientes existentes na

estação alimentar, maior o tempo de permanência do animal nela. Na medida em que o

tempo de permanência na exploração da estação alimentar seja diretamente relacionado

à quantidade de forragem nela presente (ou quanto de pasto existe no prato), quanto

menor esta quantidade, mais rapidamente o animal se vê obrigado a escolher um novo

prato. Consequentemente, o número de estações alimentares visitadas aumenta em

situação de limitação de forragem (Figura 3). Para visitar maior número de estações

alimentares é necessário que o animal caminhe mais e mais rapidamente, o que aumenta

o seu gasto energético, com prejuízo ao seu desempenho e à produtividade da fase

pastagem. Já a fase lavoura pode ser afetada na medida em que o maior deslocamento

dos animais signifique incremento no número de impactos do casco no solo e na área

potencialmente atingida (Figura 4).

Figura 4. Efeito do manejo do pasto nos padrões de deslocamento de novilhos na fase

pastagem de um sistema integrado de produção agropecuária (dados

calculados a partir de Baggio, 2007, considerando área de impacto de 90

cm2/casco como sugerido por Di et al., 2001). Os dados se referem apenas ao

deslocamento diurno em pastejo.

Os resultados ilustram o efeito da confluência de diferentes parâmetros afetados pela

natureza do manejo e que se associam na determinação última do impacto dos animais

no sistema. Em altas intensidades de pastejo, não somente cada animal individualmente

caminha mais, mas o grupo de animais é maior, o que faz com que a área física de

impacto seja, finalmente, três vezes maior quando se compara os extremos de altura de

manejo do pasto (Figura 4).

Carvalho et al. (2011) compilaram dados de atributos físicos do solo num experimento

de longa duração, após 10 anos de alternâncias entre ciclos de pastagem e de lavoura. A

despeito do solo ser um Latossolo Vermelho Distroférrico, com teores de argila de 0,54

kg/kg de solo, observou-se que a compactação do solo só ocorria em elevadas

intensidades de pastejo, mas não afetava o rendimento da cultura em sucessão. Além de

superficial (camada de 0-5 cm), a compactação nos tratamentos de maior intensidade de

pastejo era revertida pela soja a cada ciclo de sucessão. O estado de agregação, que é

um dos mais importantes atributos de qualidade do solo, é favorecido pelo pastejo

moderado tanto em camada superficial quanto em camadas mais profundas. Segundo

y = 3715505 - 68199x

R2 = 0,6730

P=0,0011

CV= 38,19%

500000

2000000

3500000

5000000

5 15 25 35 45Altura (cm)

Núm

ero

tota

l de im

pacto

s n

o s

olo

(passos/h

a)

Oferta de forragem (kg MS/100 kg PV)

Massa de forragem (kg/ha MS)

3 6 9 13

200

0

3240 4470 5700

y = 25,53 - 0,47x

R2 = 0,6729

P=0,0011

CV= 38,20%

0

6

12

18

24

30

36

5 15 25 35 45Altura (cm)

Áre

a d

e im

pacto

(m

2/h

a/d

ia)

Oferta de forragem (kg MS/100 kg PV)

Massa de forragem (kg/ha MS)

3 6 9 13

2000 3240 4470 5700

Carvalho et al. (2011), os dejetos orgânicos favorecem a agregação das partículas,

atuando como agentes cimentantes entre as partículas do solo.

Do ponto de vista químico, o efeito do animal quando se comparam áreas puramente

agrícolas com áreas integradas é impactante (Figura 5).

Figura 5. Atributos de acidez, cálcio e magnésio trocáveis em profundidade no solo em

áreas integradas e sem pastejo, após 24 meses da calagem (Carvalho et al.,

2011)

Como se pode observar, todos os atributos químicos são favorecidos pela entrada da

pastagem em rotação com a lavoura. Em áreas pastejadas, há descida de partículas finas

pelos bioporos ou megaporos do solo. O efeito do animal também se dá pela diminuição

da acidez por ácidos orgânicos de baixo peso molecular, liberados pela decomposição

das dejeções, associado a exsudação de compostos orgânicos pelas raízes do ciclo

pastagem.

Martins et al. (2014) registraram balanços de Ca e Mg negativos em áreas não

integradas, comparadas com áreas integradas com pastagens. Independentemente da

intensidade de pastejo, a acidificação do solo foi menor em áreas integradas comparadas

a áreas com agricultura pura. Áreas pastejadas apresentaram maior saturação por bases e

menor saturação por alumínio na camada 0-40 cm.

Assmann et al. (2014) investigaram o impacto da entrada de pastagens em rotações com

soja nos estoques de C e N do solo e nas frações particuladas e associadas a minerais.

Os autores concluíram que elevadas intensidades de pastejo diminuíram os teores de C e

N orgânicos total e particulados, comparado ao tratamento sem pastejo. A maior

intensidade de pastejo (pastos manejados a 10 cm) levou a uma perda de N da ordem de

1,17 Mg ha−1

devido a degradação da MO. A adição de C no solo foi entre 0,54 e 8,68

Mg ha−1

das áreas sem pastejo para áreas pastejadas com intensidade moderada (entre

20 e 40 cm de altura de manejo).

Outro efeito importante da presença de animais em rotações agrícolas está em seu

impacto na biomassa e diversidade microbiana. A primeira responde de forma positiva e

linear à intensidade de pastejo (Carvalho et al., 2011), enquanto a segunda responde de

forma curvilinear; intensidades de pastejo moderadas favorecendo a diversidade da

microbiota (Chávez et al., 2011). Em todas as situações, áreas que não têm pastagens

em rotação são desfavorecidas.

Em suma, a incorporação da pastagem a um sistema agrícola pode ter efeitos positivos

ou negativos, dependendo da intensidade de pastejo empregada. Em intensidades de

pastejo moderadas, há elevada probabilidade de se melhorar o solo nos seus atributos

químicos, físicos e biológicos. Mas na medida em que o desempenho desse sistemas

também dependa da produção de grãos, ilustremos alguns resultados relacionados ao

impacto da rotação com pastagens no rendimento de grãos da lavoura em sucessão.

5. Impacto da entrada da pastagem em rotação sobre as lavouras em sucessão

Os principais métodos de pastoreio em uso nos sistemas integrados são o pastoreio

contínuo e o rotativo. No pastoreio contínuo os animais permanecem num mesmo

piquete por um longo período de tempo. Já no pastoreio rotativo o piquete é dividido em

diversas unidades e os animais circulam nas diferentes subdivisões em ritmo dependente

da definição do ciclo de pastejo empregado (tempo de ocupação + tempo de descanso).

Há diversas variações em ambos os métodos, mas a diferença fundamental está na

quantidade e efetividade das ações passíveis de controle espaço-temporal do processo

de pastejo. Do ponto de vista espacial, enquanto o pastoreio rotativo procura distribuir o

pastejo de forma homogênea, obrigando os animais a explorarem toda a área do piquete

ao longo do ciclo de pastejo, o pastoreio contínuo tem pouco controle sobre a

distribuição dos animais.

Muito embora o assunto métodos de pastoreio ainda seja polêmico no meio comercial,

no meio científico há razoável concordância de que os resultados, em termos de

produção animal, sejam muito semelhantes quando do uso de intensidades de pastejo

adequadas (Briske et al., 2008). Já o impacto dos métodos de pastejo nos sistemas

integrados é desconhecido. Para ilustrar tal temática, exemplificar-se-á o efeito dos

métodos de pastoreio por meio de um modelo de integração concebido para

propriedades familiares, onde na fase pastagem se faz a recria e terminação de cordeiros

e na fase lavoura sucede-se soja ou milho em rotação (Figura 6).

Figura 6. Efeito de intensidades e métodos de pastoreio aplicados na fase pastagem sob

o rendimento de lavouras de soja ou milho em modelos de sistemas integrados

de produção agropecuária adaptados para a pequena propriedade familiar. Os

resultados da soja referem-se a uma média de quatro anos, enquanto os de

milho referem-se a um único ano de sucessão. As letras C e R referem-se aos

839

1354

946

1185

700

0

200

400

600

800

1000

1200

1400

1600

C2,5 C5,0 R2,5 R5,0 Sem Pastejo

Tramentos de manejo do pastejo

Re

nd

ime

nto

de

so

ja (

kg

/ha

)

5443

6424

5517 5668 5469

0

1000

2000

3000

4000

5000

6000

7000

C2,5 C5,0 R2,5 R5,0 Sem Pastejo

Tratamentos de manejo do pastejo

Re

nd

ime

nto

do

milh

o (

kg

/ha

)

métodos de pastoreio contínuo e rotativo, enquanto os números indicam níveis

de ofertas de forragem de 2,5 ou 5,0 vezes o potencial de consumo dos animais

(adaptado de Carvalho et al., 2010).

A Figura 6 ilustra o efeito preponderante da intensidade sobre o método de pastoreio no

que diz respeito ao impacto na lavoura de soja. Nota-se que os tratamentos com maior

oferta de forragem, onde maiores massas de forragem cobrem permanentemente o solo,

são os que registram os maiores rendimentos de soja. Já para o milho, embora se

considerando o efeito de um único ano, o efeito de intensidades e métodos é menos

evidente, mas ainda assim sugere maiores rendimentos para o manejo em pastoreio

contínuo com elevada oferta de forragem (C5,0). É interessante concluir que as áreas

testemunha sem pastejo, onde a pastagem funciona apenas como cobertura vegetal e

tem função apenas de palhada para a lavoura em sucessão, não produzem mais do que

as áreas em pastejo. Para sistemas em semeadura direta, a presença de animais em

pastejo na área representa um paradigma e estes resultados são importantes para

demonstrar que o pastejo controlado não vem em prejuízo das lavouras em sistema de

semeadura direta.

Moraes et al. (2014) compilaram diversos experimentos realizados no sub-trópico

brasileiro que compararam o rendimento de grãos de lavouras puras ou integradas com

pecuária em áreas sob plantio direto (Figura 7).

!!Rendimento de grãos (kg/ha) Rendimento de grãos (kg/ha)

Ren

dim

ento

de

grã

os

(kg/h

a)

Ren

dim

ento

de

grã

os

(kg/h

a)

controle sem pastejo

controle sem pastejo

Figura 7. Rendimentos de grãos de diferentes lavouras (a - soja, feijão, trigo; b - milho)

em áreas pastejadas comparadas com áreas não pastejadas. Os símbolos

referem-se a culturas, enquanto os números às fontes bibliográficas - vide

Moraes et al. (2014) para detalhes.

Como se pode depreender, considerando a linha de equivalência, a grande maioria dos

resultados está acima, indicando que o rendimento de grãos da mesma cultura é maior

em áreas pastejadas comparadas a áreas sem pastejo. Portanto, aquelas melhorias nos

atributos do solo indicadas nos itens anteriores se materializa em rendimentos de cultura

superiores quando a lavoura sucede uma área pastejada.

Essa síntese de resultados contrapõe-se ao paradigma predominante, segundo o qual a

entrada de pastagens em rotações com agricultura, notadamente sob plantio direto,

afetaria negativamente a cultura de grãos via impacto negativo do animal em pastejo.

Como pode ser visto nos itens anteriores, há inúmeras evidências científicas de que o

componente animal traz benefícios ao sistema, e não o contrário.

Mas talvez tão importante quanto a melhoria que o animal traz aos componentes solo-

planta, a resiliência econômica aumenta de forma notável com a rotação de pastagens,

comparado a sistemas puramente agrícolas, em particular quanto maior o risco climático

no qual o ciclo lavoura opera (Figura 8).

Lavoura + Pecuária - Pastejo modeado

0

20

40

60

80

100

120

140

2002 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011

Sa

co

s p

or

áre

a (

sc

/ha

)

Ano

Lavoura - Sem pastejo

Lavoura - Pastejo moderado

Figura 8. Rendimentos de soja em áreas com e sem rotação com pastagens. Os

rendimentos da parte pastagem são transformados em equivalente soja pelos

preços relativos da soja e da carne de cada ano específico (adaptado de

Carvalho et al., 2011).

Os resultados ilustram os benefícios que a pastagem aporta a operação agrícola. Entre

2002 e 2011, os resultados da lavoura de soja (em amarelo) variam entre ~ 5 e 70 sacos

ha-1

. De forma geral, os custos da lavoura, em equivalente sacos de soja, variam entre

25 e 30 sacos.ha-1

, no período. Em verde estão os rendimentos das mesmas lavouras que

estão integradas com a pastagem, sendo que em verde escuro está apresentado o

rendimento da fase pastagem (kg de peso vivo ha-1

) transformado em equivalente soja.

A soja em monocultura produz na média dos anos 49 sacos ha-1

, enquanto o sistema que

integra soja com bovino de corte produz o equivalente a 81 sacos ha-1

(Carvalho et al.,

2011). Além da maior rentabilidade obtida nos sistema integrado, é importante ressaltar

o papel da produção do ciclo pastagem em anos onde há frustração quanto ao

rendimento da lavoura. É a pastagem que aporta resiliência a agricultura, e quando

integrados ambos são superiores aos rendimentos individuais de sistemas puros.

6. Considerações finais

O ponto chave da sustentabilidade dos sistemas integrados de produção agropecuária

diz respeito à intensidade de pastejo empregada. A estrutura do pasto pode variar

consideravelmente em relação ao manejo imposto, com consequências na produção

animal durante a fase da pastagem, bem como nas condições de solo e na palhada para a

produção de grãos. Pastagens manejadas com intensidade de pastejo moderadas podem

permitir maiores ganhos individuais devido ao aumento da forragem disponível para

cada animal e à melhor qualidade da forragem consumida. Nessas condições, o animal

possui a sua disposição uma estrutura de pasto na qual é possível otimizar seu processo

de pastejo, o que conduz a melhor oportunidade de seleção de sua dieta. Assim ele

pasteja por menos tempo, caminha menos e sobre uma maior quantidade de tecido

vegetal para proteger a superfície do solo do impacto do casco. Os métodos de pastoreio

parecem não ser importantes quando do emprego de intensidades de pastejo adequadas.

Isto significa que a escolha, por um ou outro método, deva levar em conta fatores outros

que não a produtividade do sistema. O importante é trabalhar com intensidades de

pastejo que não sejam excessivas.

Este manuscrito não teve o propósito de abordar esse tema, mas a introdução de

pastagens em sistemas agrícolas tem implicações na operacionalidade do sistema de

produção agrícola. É importante considerar que a introdução da pastagem em áreas

puras de agricultura traz necessidades de estrutura para manejo de animais, bem como

mão-de-obra especializada. Em outras palavras, operadores de máquinas deveriam

também saber montar a cavalo para uma lida de rebanho, o que torna complexo a gestão

de recursos humanos e de estrutura.

Para concluir, a introdução da pastagem em rotações agrícolas tem elevado potencial

para intensificar a produção de alimentos de forma sustentável (e ambos se beneficiam),

mas torna o sistema mais complexo e exigente em tecnologia de processos (i.e.

conhecimento).

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