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1 Brasília, 6-7 de novembro de 2006 A história do Acordo TRIPS. Uma perspectiva multilateral sobre a implementação pelo Brasil de três de suas obrigações internacionais Secretaria da OMPI

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Brasília, 6-7 de novembro de 2006

A história do Acordo TRIPS. Uma perspectiva multilateral sobre a

implementação pelo Brasil de três de suas obrigações internacionais

Secretaria da OMPI

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Uma perspectiva multilateral

Sumário

1. Introdução: a) a História das negociações multilaterais que levaram ao Acordo TRIPS; b) o objetivo fundamental da L. 9.279/96

2. Três questões de direito brasileiro à luz de uma perspectiva multilateral

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Uma perspectiva multilateral. Introdução

1. Introdução: a) a história das negociações multilaterais que

levaram ao Acordo TRIPS

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Uma perspectiva multilateral. Introdução

1a faseTudo começou no séc. XVII, quando as grandes

potências européias começaram a estabelecer acordos bilaterais de comércio relativo à exportação e importação de têxteis1

1 Antes disso, os reis da Inglaterra e da França outorgavam proteção pessoal e salvos-condutos, mediante cartas-patente, aos comerciantes estrangeiros que faziam comércio em seus territórios

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Uma perspectiva multilateral. Introdução

1a fase

Alguns exemplos

França - Flandres (1604)França - Inglaterra (1623, 1787)Inglaterra - Espanha (1713)Rússia - Dinamarca (1782)Rússia - Portugal (1787)

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Uma perspectiva multilateral. Introdução

Cláusulas relativas à PI:

- reconhecimento das marcas de certificação nacionais (garantia à reciprocidade de tratamento)

- medidas contra a embalagem fraudulenta- proteção de segredos comerciais (os

comerciantes só eram obrigados a mostrar os livros comerciais em caso de ação judicial; jurisdição privilegiada)

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Uma perspectiva multilateral. Introdução

2a fase

No final do séc. XVIII e ao longo do séc. XIX, as grandes potências celebraram acordos bilaterais específicos sobre marcas e desenhos industriais (no começo, como um capítulo adicional aos acordos sobre direitos de autor), estabelecendo assim níveis mínimos harmonizados

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Uma perspectiva multilateral. Introdução

Alguns exemplos:

França - Bade, 1857

França - Estados Unidos, 1860

França - Brasil, 1876

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Uma perspectiva multilateral. Introdução

Nesta segunda fase, no entanto, não houve acordos na área de patentes (com a raríssima exceção de 2 acordos bilaterais, envolvendo países de menor importância, e de 1 em matéria de tratamento nacional entre a França e a Alemanha (Prússia), ditado por circunstâncias particulares da guerra que envolveu os dois países entre 1870-1872)

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Uma perspectiva multilateral. Introdução

Em termos de acordos bilaterais, há também a considerar a Convenção Secreta de 22 de outubro de 1807, entre Portugal e a Inglaterra, na qual, entre outras matérias, os dois países prometeram negociações comerciais no caso de se confirmar a transferência da família real (em troca da proteção da esquadra inglesa à viagem). Dois anos depois o Alvará de 1809 incluiria duas cláusulas protegendo invenções: o Artigo 5o prometia favores pecuniários aos introdutores de novas máquinas em determinadas indústrias “necessitadas de socorro”; e o Artigo 6o prometia, sem prejuízo desses favores, privilégios por 14 anos para os introdutores de novas máquinas e invenções em todos os domínios da indústria.

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Uma perspectiva multilateral. Introdução

Facsímile do Artigo 7o e das assinaturas da Convenção Secreta de 1807 a qual está na origem da transferência da família real, da abertura dos portos e da adoção da primeira lei de patentes do Brasil.

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Uma perspectiva multilateral. Introdução

O objetivo inglês era o de transformar o Brasil numa plataforma de exportação de produtos industrializados para as duas Américas caso as suas relações com os EUA continuassem a deteriorar-se. Por isso era preciso convencer Portugal a aceitar a idéia de conceder patentes para introdutores (ingleses) de indústrias, fábricas e equipamentos aqui inexistentes. Isto explica por quê o Artigo 5o do Alvará de 1809 é tão parecido com o Estatuto dos Monopólios de 1624.

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Uma perspectiva multilateral. Introdução

Os industriais ingleses não se mostraram interessados (o Brasil não dispunha de mão-de-obra qualificada) e o Alvará acabou sendo usado por alguns poucos inventores brasileiros e estrangeiros residentes, cujas preocupações técnicas ilustram bem as prioridades industriais do Brasil de então.

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Uma perspectiva multilateral. Introdução

Patente de 1814, por 14 anos, concedida a João Baptista Ferreira de Souza Coutinho, por duas máquinas próprias de serviço mineral

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Uma perspectiva multilateral. Introdução

Parecer da Junta Real do Comércio, de 29 de agosto de 1822, favorável à concessão de privilégio para uma máquina de prensar algodão, mas com reservas quanto à novidade, em face da existência de uma máquina alegadamente seelhante, importada de Calcutá

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Uma perspectiva multilateral. Introdução

Privilégio de 13 de julho de 1822, concedido por cinco anos a um inventor (Luís […]) de uma máquina de descascar café (assinado por José Bonifácio de Andrade e Silva)

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Uma perspectiva multilateral. Introdução

A falta de tratamento nacional permitia que a Inglaterra, primeiro, e depois os EUA, fossem vítimas de free riding (passageiro clandestino) pela indústria de países concorrentes nas áreas têxtil e metalúrgica (França, os EUA, a Alemanha, a Holanda e outros encorajavam a importação de artesãos ingleses e praticavam a espionagem industrial; além disso, só concediam patentes a quem residisse em seus territórios e obrigavam a exploração local das patentes; por vezes concediam patentes secretas para evitarem serem vítimas das mesmas práticas oportunistas)

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Uma perspectiva multilateral. Introdução

3a faseA resposta a essa situação foi a adoção da

Convenção de Paris, em 1883

a) tratamento nacional (o qual evita – mas não totalmente — o comportamento oportunista)

b) prioridade e independência, os quais permitem a articulação de sistemas nacionais, independentemente dos respectivos níveis de proteção

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Uma perspectiva multilateral. Introdução

c) níveis mínimos de proteção aplicáveis inicialmente só às marcas (em matéria de patentes, as principais potências já mantinham níveis muito próximos uns dos outros)

d) proteção provisória nas feiras e exposições internacionais (este havia sido o pretexto, aliás, para iniciar as negociações)

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Uma perspectiva multilateral. Introdução

De 1883 a 1967, a Convenção sofreu alterações no sentido de se reduzir as brechas que ainda permitiam práticas oportunistas (imposição de barreiras às licenças obrigatórias por falta de exploração, proteção obrigatória dos desenhos industriais, e repressão à concorrência desleal)

Dentro da União, evoluíu-se no sentido da proteção das indicações geográficas, e dos registros internacionais de marcas, indicações e desenhos industriais, bem como do depósito de pedidos de patentes – tudo isto muito formal e pouco substantivo

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Uma perspectiva multilateral. Introdução

Mas depois da 2a Guerra Mundial um número grande de jogadores aderiu à União de Paris sem a preocupação de jogar pelas mesmas regras; as duas grandes potências emergentes (a China e a Índia) continuavam de fora; o Brasil obrigava-se ainda pelo texto da Haia

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Uma perspectiva multilateral. Introdução

4a faseDepois de apenas três anos (1988-1991) de negociações

numa Rodada que durou oito (1986-1994), os países em desenvolvimento (PED) aceitaram a harmonização. Por quê?

Antes do Acordo TRIPS, a PI correspondia a uma lógica: uma política de industrialização, a qual, desde o séc. XV, era considerada de âmbito exclusivamente nacional

Mas o Acordo TRIPS resultou da introdução de duas lógicas relativamente recentes:

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Uma perspectiva multilateral. Introdução

a) Aumento dos fluxos de comércio internacional de bens e serviços e a consequente necessidade de reduzir as distorções e as barreiras resultantes da falta de ou insuficiente proteção da PI (barreiras não-tarifárias) – a PI como um elemento de acesso a mercados

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Uma perspectiva multilateral. Introdução

b) A transferência de unidades de produção de países desenvolvidos para PED e a consequente transferência de instituições jurídicas (incluindo – mas não só – a PI) – a PI como um elemento de acesso ao investimento estrangeiro direto

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Uma perspectiva multilateral. Introdução

Qual é a diferença entre o espírito negociador que presidiu à Conferência de Paris, em 1880, e o que presidiu à Conferência de Marraqueche, em 1994?

Em Paris, os principais jogadores dispunham de cartas muito parecidas: a única coisa de que precisavam era uma regra que evitasse que os adversários fizessem trapaça: o tratamento nacional.

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Uma perspectiva multilateral. Introdução

Mas, em Marraqueche, um número grande jogadores não se preocupava com as cartas que os principais jogadores tinham na mão, pois sabiam que havia uma grande desigualdade na distribuição das melhores cartas; a sua única solução era “trapacear” e por isso haviam adotado níveis mais baixos de proteção no âmbito nacional (para se beneficiarem do tratamento nacional da C.P.).

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Uma perspectiva multilateral. Introdução

Note-se que, por duas vezes, os PeD, liderados pelo Brasil, recusaram-se a rever os níveis de proteção da Convenção de Paris; a primeira vez foi nas Conferências Diplomáticas de revisão da Convenção; a segunda, já quando as negociações sobre o TRIPS estavam quase no fim (1991), nas negociações em torno do chamado PLT I.

Os principais jogadores tiveram, portanto, que mudar as regras do jogo e introduziram no jogo um novo trunfo que interessava a todos por igual: o comércio.

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Uma perspectiva multilateral. Introdução

Isto explica os dois objetivos do Acordo TRIPS:

a) Reduzir distorções e barreiras ao comércio internacional

b) Proteger direitos de propriedade privada

Mediante a introdução de um princípio de tratamento nacional subordinado aos níveis mínimos de proteção, ao mfn, e à adopção de níveis mínimos horizontais, eliminaram-se as “assimetrias” permitidas pela C.P.

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Uma perspectiva multilateral. Introdução

b) o objetivo fundamental da L. 9.279/96

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Uma perspectiva multilateral

Em 14 de maio de 1996, ao assinar a lei, o Presidente Fernando Henrique Cardoso disse que

“Nenhum país cresce com base na rapinagem. O que estamos fazendo agora, ao assinar a Lei de Patentes, é pôr um termo à mentalidade colonialista, a mentalidade daqueles que pensam que o Brasil não tem competência, daqueles que acham que os estrangeiros sabem tudo e que vão nos dominar. O nosso país tinha de ter sua lei regulamentando a propriedade industrial, pois isso atualiza seus compromissos na área internacional, principalmente no sentido de ampliar seu poder de discussão na Organização Mundial do Comércio (OMC), sem que houvesse sempre a pressuposição de que nós éramos trapaceiros. Pior, trapaceiros e bobos, pois a trapaça nunca nos levou a lugar algum.” (excertos do discurso em www.radiobras.gov.br)

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Uma perspectiva multilateral

A adoção de obrigações na área de PI na OMC fez parte de um pacote; em troca da aceitação desse pacote:

- o Brasil pôde aumentar suas exportações de forma significativa (em bilhões USD: 31.4 [1990]; 46.5 [1995]; 55.1 [2000]; 118.3 [2005])

- o Brasil ganhou a possibilidade de contestar em Genebra medidas de outros Membros da OMC que criam barreiras às exportações, tais como a subsídios nos setores da aviação civil, no algodão, no frango, etc

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Uma perspectiva multilateral

Isto é, o objetivo fundamental da L. 9.279/96 é o acesso a mercados estrangeiros de produtos brasileiros (manufaturados ou não). A lógica é que os ganhos do Brasil com esse acesso compensam eventuais acréscimos de custos na importação de ativos protegidos pelos TRIPS.

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Uma perspectiva multilateral

2. Três questões de direito brasileiro à luz de uma perspectiva multilateral

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Uma perspectiva multilateral. 3 questões

Sumário:

(i) a entrada em vigor da L. 9.279/96(ii) a extensão da duração das patentes em vigor no

momento da entrada em vigência da L. 9.279/96 (iii) as patentes pipeline

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Uma perspectiva multilateral. 3 questões

(i) a entrada em vigor da L. 9.279/96

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Uma perspectiva multilateral. 3 questões

O fato de o Brasil ter antecipado a implementação de suas obrigações perante os TRIPS significou a renúncia aos períodos de transição?

Não.

1) pergunta do Chile: um país que queira usar os prazos de transição deve notificar a OMC? resposta do Secretariado da OMC: não; só a renúncia é que deve ser expressa; por isso, como o Brasil não notificou a renúncia à transição, os demais Membros da OMC entendem que o Brasil podia fazer uso dela

2) a questão da antecipação é, pois, uma questão puramente interna

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(ii) a extensão da duração das patentes em vigor no momento da entrada em vigência da L.

9.279/96

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Questão já amplamente debatida na OMC e objeto de uma decisão pelo Órgão de Solução de Controvérsias

- todas as patentes que estivessem em vigor no dia 1o de janeiro de 2000 no Brasil teriam que ter sua vigência prorrogada por um período adicional de 5 anos; todas as que tivessem expirado (por qualquer razão) antes dessa data não teriam que ter sido prorrogadas

- antecedentes (consultas EUA x Japão, em matéria de direito de autor; consultas EUA x Portugal, em matéria de patentes; painel EUA x Canadá, em matéria de patentes) (o painel interpretou o Artigo 70.2 dos TRIPS)

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Uma perspectiva multilateral. 3 questões

- mas, ao contrário do tema anterior, esta é uma questão puramente externa, pois a L. 9.279/96 deixa claro que a lei nova só se aplica aos pedidos de patente em andamento (Art. 229), modificando assim, na ordem interna, o Art. 70 dos TRIPS

- além disso, a extensão do prazo de vigência, se aplicável, só seria obrigatória para as patentes em vigor em 31.12.1999 e não para aquelas em vigor em 14.05.1996 (ou, se aplicada a vacatio legis, em 14.05.1997), pois essa extensão dar-se-ia por força dos TRIPS e não da lei nacional (a qual, repito, só se aplica aos pedidos de patente em andamento, e não às patentes concedidas)

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- isto, claro, para não discutir um outro tema que é de ordem interna e de ordem externa também:

- ordem interna: a concessão das patentes por um período de quinze anos, à luz da L. 5.772/71, era um ato jurídico perfeito e acabado, inatacável pela lei superveniente (C.F., Art. 5o, XXXVI; qualquer norma que estendesse a vigência dessas patentes teria que, pelo menos, proteger os direitos de terceiros prejudicados pela extensão — como o faz o Art. 232 com relação às patentes pipeline, ainda que de forma incompleta, como se verá a seguir; e como o faz o Art. 70.4 dos TRIPS, com relação à extensão dos prazos de proteção)

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- ordem externa: mas se a extensão do prazo é inconstitucional, então há um problema de incompatibilidade com os TRIPS, pois a obediência à ordem constitucional dos Membros da OMC não os isenta das suas obrigações multilaterais, a menos que haja uma previsão expressa nos TRIPS (como é o caso da obrigação de proteger informação comercial e técnica em segredo de justiça, a menos que a Constituição disponha de outra forma — Artigo 42 dos TRIPS).

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(iii) as patentes pipeline

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Uma perspectiva multilateral. 3 questões

- as patentes pipeline dizem respeito a produtos farmacêuticos cuja composição já foi divulgada mas dependem ainda de registro sanitário (e estão, por isso, no pipeline para serem comercializados)

- vários países (por exemplo, o Chile e a China) deram essas patentes em razão de negociações bilaterais com parceiros comerciais

- houve uma tentativa de introdução do pipeline nas negociações dos TRIPS mas essa proposta foi rejeitada pelos países em desenvolvimento (ver Art. 70.3 dos TRIPS - os Membros da OMC não são obrigados a proteger matéria que tiver caído em domínio público)

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- em troca, foram introduzidos os Artigos 70.8 e 70.9 que estabeleceram o que se chama de pipeline suíço, segundo o qual os países que em 1o de janeiro de 1995 não dessem patentes para produtos farmacêuticos e não estabelecessem essa patenteabilidade imediatamente (isto é, sem transição), deveriam imediatamente ter criado um mecanismo para depósito dos pedidos de patente (caixa do correio) e outorga, mediante certas condições, de um período de exclusividade de comercialização de no máximo 5 anos

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Uma perspectiva multilateral. 3 questões

- este sistema só se aplica aos pedidos novos, isto é, depositados no Brasil a partir de 1o de janeiro de 1995 (eventualmente com base em pedidos estrangeiros depositados a partir de 1o de janeiro de 1994 — prioridade da União de Paris)

- é possível que haja meia dúzia de pedidos de patentes depositados no Brasil com direito ao pipeline suíço, isto é, que tenham sido depositados a partir de 1o de janeiro de 1995 e que não tenham se beneficiado do pipeline da L. 9.279/96

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Uma perspectiva multilateral. 3 questões

- as patentes pipeline ofendem o princípio da novidade?

- tudo depende do que se entende por novidade

- a novidade pode ser técnica (diz respeito à divulgação da invenção) ou comercial (diz respeito à comercialização da invenção)

- a novidade (quer a técnica, quer a comercial) pode ser relativa ou absoluta

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Uma perspectiva multilateral. 3 questões

- a novidade absoluta é aquela que não admite exceções: qualquer espécie de divulgação (que ensine a outras pessoas a reproduzir a invenção) é impedimento à concessão da patente

- a novidade relativa pode referir-se ao espaço, ao tempo e aos meios de prova

- novidade relativa quanto ao espaço: é novo tudo o que não tiver sido divulgado no país em questão (o Japão aplica este conceito com relação aos desenhos industriais)

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Uma perspectiva multilateral. 3 questões

- novidade relativa quanto ao tempo: a invenção é nova:a) mesmo se foi divulgada entre a data do primeiro depósito

num país da União de Paris ou da OMC e se o depósito no Brasil foi feito dentro de um ano (prioridade; Art. 4o da Convenção de Paris);

b) ou mesmo se foi exposta numa feira internacional numa data que não seja anterior a um ano antes de ser depositada num país da União de Paris (ou um Membro da OMC) (proteção temporária; Art. 11 da Convenção de Paris);

c) ou mesmo se foi divulgada pelo titular ou por outrem sem autorização do titular durante o período de um ano antes do depósito no Brasil (perído de graça, Artigo 12 da L. 9.279/96)

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Uma perspectiva multilateral. 3 questões

- novidade relativa quanto aos meios de prova: não destrói a novidade a divulgação feita no exterior se não comprovada por meio de prova escrita (solução em vigor nos EUA)

- novidade comercial relativa admite a proteção de inventos ainda que tenham sido divulgados antes da data do pedido desde que não tenham sido comercializados (ou no país, ou no exterior) — é o caso das cultivares à luz da Convenção da UPOV; é o caso dos conhecimentos tradicionais, à luz da lei portuguesa; e é o caso das patentes pipeline

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Uma perspectiva multilateral. 3 questões

- a novidade é uma matéria constitucional brasileira?

 Art. 5o, XXIX:  a lei assegurará aos autores de inventos industriais privilégio temporário para sua utilização, bem como proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos, tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País;

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Uma perspectiva multilateral. 3 questões

Quando a C.F. se refere a inventos, ela estabelece apenas dois conceitos:

- trata-se de inventos, não de descobertas (portanto, as criações pressupõem a artificialidade e a alternatividade)

- as criações têm que ser dotadas de inventividade: isto porque um invento não tem que ser novo e útil para ser um invento; ele tem é que ser inventivo

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Uma perspectiva multilateral. 3 questões

“[…] É possível que uma invenção não cumpra todos os requisitos [de patenteabilidade], por exemplo, por não apresentar novidade ou utilidade. A engenharia reversa de uma técnica que o emulador ignorava ter sido previamente divulgada é uma invenção, apesar de não ser nova. O único critério que é redundante com relação à noção de ‘invenção’ é o da atividade inventiva. Não há invenções que não sejam inventivas. Mas há invenções mais inventivas do que outras. […] A patenteabilidade depende do nível inventivo.” OMPI, Documento WIPO/GRTKF/IC/5/8, de 28 de abril de 2003, pág. 19. Ênfase acrescentada.

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Uma perspectiva multilateral. 3 questões

Ou, por outras palavras, a reinvenção da roda pode não ser nova; ou pode não ser útil (a roda no alto dos Andes não tem qualquer utilidade e por isso os incas não a usavam, apesar de a conhecerem) mas não deixa de ser uma invenção...

Quando o Art. 5o, XXIX se refere a “inventos”, o Constituinte não incluíu nessa palavra o requisito da novidade pois esse requisito não é intrínseco do invento; caso contrário, o Constituinte teria que lhe ter feito referência expressa (e, claro, nesse caso, teria que ter mencionado a que tipo de novidade queria referir-se — se relativa ou absoluta, se comercial ou técnica)

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- Na verdade, o constituinte deu ao legislador ordinário o poder para estabelecer os requisitos extrínsecos da patenteabilidade (tendo em vista os fins sociais); por exemplo, o período de graça foi incluído para beneficiar os pesquisadores universitários e proteger os inventores dos abusos de espiões industriais

- Assim, o legislador ordinário pode definir a novidade em termos absolutos ou relativos — aliás, tem que definí-los em termos relativos, a não ser que queira cometer lesão aos tratados internacionais que tratam da matéria...

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- Portanto, para os fins do inciso XXIX, as patentes pipeline protegem inventos; se essas patentes não cumprem sua função social, isso não é uma questão para o judiciário resolver, claro, mas para o Parlamento (que entendeu que elas, sim, atendiam os fins sociais do inciso XXIX)

- Dizer que as patentes pipeline são inconstitucionais por serem uma exceção à novidade é o mesmo que dizer que a prioridade e a proteção temporária da União de Paris são inconstitucionais pois elas também constituem exceções à novidade — e não deixam de ser por isso o ponto fulcral do atual regime internacional de patentes

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- Quer isto dizer que as patentes pipeline estão de acordo com a Constituição?

- Não. As patentes pipeline são efetivamente inconstitucionais, mas por ofenderem o inciso XXXVI do Art. 5o (“a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”), e não o inciso XXIX

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- A diferença entre uma patente pipeline e uma patente que simplesmente contém uma exceção à novidade absoluta é que a patente pipeline contém matéria que a lei anterior expressamente excluía da patenteabilidade

- Isto é, os Arts. 230 e 231 da lei 9.279/96 permitiram a apropriação de algo que estava em domínio público porque a lei anterior proibía a sua apropriação privada

- Só que o domínio público não resulta da simples divulgação do invento: resulta da divulgação de matéria cuja patenteabilidade é proibida

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- A idéia de que não se pode privatizar a tecnologia que está em domínio público é uma das mais antigas do sistema de patentes; tanto os regimes europeus medievais quanto os pós-medievais (Veneza, França, Inglaterra, Espanha, Sicília, Portugal) não permitiam a concessão de privilégios relativos à introdução de uma indústria em prejuízo dos artesãos que já estivessem instalados exercendo essa profissão

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- Como disse o juiz que presidiu o julgamento de Darcy v. Allen, em 1602, “a common law neste ponto coincide com a Lei de Deus, tal como aparece no Deuteronômio, cap. xxiv, ver. 6 Non accipies loco pignoris inferiorem et superiorem molam, quia animam suam apposuit tibi. Não deverás aceitar como penhor nem a mó de baixo nem a mó de cima, pois essa é a sua vida, toda a profissão do homem mantém a sua vida, e portanto ele não pode ser destituído ou despossuído de sua profissão, tal como da sua vida…”

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- A existência de lei anterior proibindo a patenteabilidade foi levada especialmente em conta pelo painel da OMC em EUA v. Índia, Proteção patentária dos produtos farmacêuticos e dos produtos químicos para a agricultura (1997). Segundo o painel, o fato de a Índia ter estabelecido, depois de 1o de janeiro de 1995, uma prática de receber pedidos de patente para fármacos (a caixa do correio) não eliminava uma inconsistência com os TRIPS, em face da lei então vigente que proibia essa patenteabilidade.

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- Não é o fato de essas invenções não serem novas que as faz de domínio público: é o fato de a sua apropriação ser proibida por lei.

- Assim, até maio de 1996, a sociedade brasileira tinha, por lei, garantido o acesso àquelas invenções. Esse acesso, ademais, não dependia de qualquer condição: podia ser exercido a qualquer momento.

- A L. 9.279/96 veio negar acesso a alguma coisa a que a sociedade tinha, por virtude da lei anterior, acesso livre.

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- A L. 9.279/96 poderia até ter criado uma outra exceção à regra da novidade (além da prioridade, da proteção temporária e do período de graça) e permitir patentes pipeline mas só para invenções que fossem depositadas pela primeira vez após a sua entrada em vigor, evitando assim a apropriação de matéria de domínio público

- Ao retroagir e permitir a apropriação privada “da mó de baixo e da mó de cima,” a Lei 9.279/96 violou o direito adquirido (difuso) da sociedade brasileira de fazer uso livre daqueles inventos

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- Direito, efetivamente, e não uma simples expectativa, posto que o direito de usar o objeto das patentes pipeline não dependia de qualquer condição ou evento futuro

- Imagine-se um investidor que comprasse uma indústria genérica no dia 1o de maio de 1996. No preço dessa indústria estaria computado naturalmente a possibilidade dela começar a fabricar ou a importar, a qualquer momento, ingredientes ativos que estivessem em domínio público. Quinze dias depois esse investimento seria seriamente afetado, pois os ingredientes ativos de maior valor econômico foram simplesmente “recapturado” por empresas estrangeiras.

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- O fato de a L. 9.279/96 assegurar o direito de quem já estivesse explorando ou tivesse feito preparativos sérios para explorar as invenções cobertas pelas patentes pipeline (Art. 232) não muda a situação, pois o simples fato de se poder (eventualmente) usar essas invenções não-patenteáveis já dava uma vantagem competitiva às indústrias genéricas nacionais ou estrangeiras em relação às companhias farmacêuticas de investigação.

- A proibição de apropriar certas invenções, pela L. 5.772/71, não beneficiava apenas algumas empresas, mas toda a sociedade.

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- O objetivo, aliás, da L. 5.772/71 ao proibir a patenteabilidade de certos produtos era reduzir os preços de importação, como disse o Min. Pratini de Morais, perante o Congresso, em 1971. Ora, o Art. 232 da L. 9.279/96 só isenta do efeito das patentes pipeline a produção ou o uso no Brasil, retirando assim à sociedade brasileira a possibilidade de se beneficiar de preços mais baixos no mercado internacional.

- As patentes pipeline prejudicaram, assim, o direito adquirido difuso da sociedade brasileira de acessar medicamentos mais baratos mesmo que de origem estrangeira.

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