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    Colgio Estadual Ansio Teixeira CEAT 1 Ano - Turma

    MITO E FILOSOFIA1

    Certa vez li um livro do poeta Louis Aragon (1897-1982), e uma frase sua despertou-me a reflexo. A frase era: o esprito do homem no suporta a desordem porque nopode pens-la (ARAGON, 1996, p. 215 e 241). E vrias perguntas povoaram meupensamento: o que ordem? E a desordem? Ordem e desordem existem narealidade ou so representaes de mundo criadas pelo pensamento, imaginao oupreconceito?

    Guernica de Pablo Picasso no Museu Rainha Sofia Madrid.

    Ordem e Desordem

    Ordem e desordem fazem parte da formao do senso comum e dos processos darazo e, a partir desses conceitos, tratemos de efetuar uma avaliao social ehistrica. Vivemos inseridos em certas ordens ou organizaes (sociais, polticas,religiosas, econmicas), as quais no dependem de nossa escolha. Pensemos, podeser que no exista desordem, mas ordens diferentes daquela que costumamos pensarque seja a ordem verdadeira, uma razo imutvel, que reina imperativa. Por exemplo:a civilizao ocidental diferente da civilizao oriental, o sul da Amrica e o norte daAmrica possuem culturas diferenciadas, ou seja, o mundo culturalmente diverso e

    isto enriquece os contatos e as relaes, preciso aprender a conviver com essasdiferenas para evitar confrontos, conflitos, guerras e sofrimentos.Assim tambm podemos pensar a origem do pensamento moderno ocidental: umaordem social que se construiu com elementos das mais antigas civilizaes ocidentaise orientais. Entre a herana que os antigos como Sfocles, Aristfanes, Hesodo eHomero nos legaram esto os mitos, maravilhosas narrativas sobre a origem dostempos, que encantam, principalmente, porque fogem aos parmetros do modo depensar racional que deu origem ao pensamento contemporneo. certo que as tradies, os mitos, e a religiosidade respondiam a todos osquestionamentos. Contudo, essas explicaes no davam mais conta de problemas,como a permanncia, a mudana, a continuidade dos seres entre outras questes.Suas respostas perderam convencimento e no respondiam aos interesses da

    aristocracia que se estabelecia naplis.

    1 Texto produzido por Eloi Corra dos Santos e Osvaldo Cardoso para a Secretaria de Estado da Educao do Paran.

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    Dessa forma, determinadas condies histricas, do sculo V e IV a.C., como oestabelecimento da vida urbana na plis grega, as expanses martimas, a invenoda poltica e da moeda, do espao pblico e da igualdade entre os cidados gestaramjuntamente com alguma influncia oriental uma nova modalidade de pensamento. Osgregos depuraram de tal forma o que apreenderam dos orientais, que at parece quecriaram a prpria cultura de forma original.Podemos afirmar que a filosofia nasceu de um processo de superao do mito, numa

    busca por explicaes racionais rigorosas e metdicas, condizentes com a vidapoltica e social dos gregos antigos, bem como do melhoramento de algunsconhecimentos j existentes, adaptados e transformados em cincia.

    O Mito de dipo

    Os mitos cumpriam uma funo social moralizante de tal forma que essas narrativasocupavam o imaginrio dos cidados da plis grega direcionando suas condutas. NaAtenas do sculo V a.C. existia tambm o espao para as comdias que satirizavamos poderosos e personagens clebres, e as tragdias que narravam as aventuras eprodgiosdos heris, bem como suas desventuras e fracassos. Haviam festivais em que ospoetas e escritores competiam elegendo as melhores peas e textos, estes festivaiseram muito importantes na vida da plis grega, era por meio destes eventos sociaisque as narrativas mticas se difundiam.

    O soberano consulta o Orculo, o que era comum na cultura grega antiga. O Orculoafirma que seu primognito ir desposar a prpria me e assassinar seu pai, o ReiLaio. Ento, Laio manda que eliminem o menino, mas a pessoa encarregada nocumpre a ordem e envia o menino para um reino distante onde ele se torna um grandeguerreiro e heri, numa de suas andanas ele encontra um homem arrogante e omata; chegando ao Reino de Jocasta, dipo se apaixona e a desposa. Anos maistarde, dipo descobre que ele prprio o personagem da profecia, e num gesto de

    desespero, arranca os prprios olhos e sai a vagar pelo mundo a fora. A profecia secumpriu, porque o rei se recusou a matar a criana.

    Esta narrativa possui um fundo moral, o alerta para os desgnios dos deuses, que nodevem ser contrariados, e o percurso de dipo, de toda sua saga, de ter vencido aEsfinge e decifrado seu enigma, seu destino no o poupou. Contudo, um novopensamento se formava e a vida na plis cada vez mais direcionada pela poltica, eaos poucos a moral estabelecida pelas narrativas mticas foram sendo substitudaspela tica e pelos valores da cidadania grega. O cidado grego cada vez maisparticipativo no considerava a idia de no controlar a prpria vida. Na vida da plis,os homens livres manifestavam suas posies escolhendo entre iguais odirecionamento das decises e das aes da cidade-estado.

    O Nascimento da Filosofia

    O nascimento da filosofia pode ser entendido como o surgimento de uma nova ordemdo pensamento, complementar ao mito, que era a forma de pensar dos gregos. Umaviso de mundo que se formou de um conjunto de narrativas contadas de gerao agerao por sculos e que transmitiam aos jovens a experincia dos ancios. Comonarrativas, os mitos falavam de deuses e heris de outros tempos e, dessa forma,misturavam a sabedoria e os procedimentos prticos do trabalho e da vida com areligio e as crenas mais antigas.Nesse contexto, os mitos eram um modo de pensamento essencial vida dacomunidade, ao universo pleno de riquezas e complexidades que constitua a suaexperincia. Enquanto narrativa oral, o mito era um modo de entender o mundo que foisendo construdo a cada nova narrao. As crenas que eles transmitiam ajudavam acomunidade a criar uma base de compreenso da realidade e um solo firme de

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    certezas. Os mitos apresentavam uma religio politesta, sem doutrina revelada, semteoria escrita, isto , um sistema religioso, sem corpo sacerdotal e sem livro sagrado,apenas concentrada na tradio oral, isso que se entende por teogonia. Valesalientar que essas narrativas foram sistematizadas no sculo IX por Homero e porHesodo no sculo VII a.C.Ao aliar crenas, religio, trabalho, poesia, os mitos traduziam o modo que o gregoencontrava para expressar sua integrao ao cosmos e vida coletiva. Os gregos a

    partir do sculo V a.C. viveram uma experincia social que modificou a cotidianidadegrega: a vivncia do espao pblico e da cidadania. A cidade constitua-se da unio deseus membros para os quais tudo era comum. O sentimento que ligava os cidadosentre si era a amizade, a filia, resultado de uma vida compartilhada.

    Acrpole Atenas Grcia

    A Vida Cotidiana na Sociedade Grega

    Quando dizemos que a filosofia nasceu na Grcia, pontuamos que a Grcia do sculoV a.C. no possua um Estado unificado, mas era formada por Cidades-Estadosindependentes, as chamadas plis, que foram o bero da poltica, da democracia edas cincias no ocidente. Transformaram a matemtica herdada dos orientais emaritmtica, geometria, harmonia e lapidaram o conceito de razo como um pensarmetdico, sistemtico, regido por regras e leis universais.Os gregos eram um povo comerciante, propensos a navegao e ao contato comoutras civilizaes. A filosofia nascera das adaptaes que os pensadores gregosregimentaram aos conhecimentos adquiridos por meio dessas influncias, e dasuperao do pensamento mitolgico buscando racionalmente aliar essa nova ordemde pensamento propriamente grega, a vida naplis. Mas afinal, o que aplis? Comose constitua?

    Uma certa extenso territorial, nunca muito grande, continha uma cidade, onde havia olar com o fogo sagrado, os templos, as reparties dos magistrados principais, agora, onde se efetuavam as transaes; e, habitualmente, a cidadela na acrpole. Acidade vivia do seu territrio e a sua economia era essencialmente agrria.Competiam-lhe trs espcies de atividade: legislativa, judiciria e administrativa. No

    menores eram os deveres para com os deuses, pois a plis assentava em basesreligiosas e as cerimnias do culto eram ao mesmo tempo obrigaes cvicasdesempenhadas pelos magistrados. A sua constituio dependia da assemblia

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    popular, do conselho, e dos tribunais formados pelos cidados. (PEREIRA, In:GOMES & FIGUEIREDO, 1983 p. 94 - 95).

    O Mito e a Origem de Todas as Coisas

    A multiplicidade de idias e vertentes que formam o mito pode aparecer, muitas vezes,como desordem. A filosofia pode ser entendida como a tentativa de subordinar a

    multiplicidade de expresses ordem racional, de enfrentar a dificuldade de entenderos contrrios misturados que povoam a vida. Entre mito e filosofia tm-se duas ordensou duas concepes de mundo e a passagem da primeira segunda expressa umamudana estrutural da sociedade. Identificar ou pensar as vrias ordens seria comoidentificar as constelaes na imensido do cu.As narrativas mticas tentavam responder as questes fundamentais, como: a origemde todas as coisas, a condio do homem e suas relaes com a natureza, com ooutro e com o mundo, enfim, a vida e a morte, questes que a filosofia desenvolveu nodecorrer de sua histria. Mas aqui podemos formular outra questo: a filosofia nasceuda superao dos mitos, mas foi uma superao gradual ou um rompimento sbito?Para tanto, temos que primeiramente identificar algumas diferenas bsicas entre osmitos e a filosofia.

    O Mito (Mythos) narrado pelo poeta-rapsodo, queescolhido pelos deuses transmitia o testemunhoincontestvel sobre a origem de todas as coisas, oriundasda relao sexual entre os deuses, gerando assim, tudo queexiste e que existiu. Os mitos tambm narram o duelo entreas foras divinas que interferiam diretamente na vida doshomens, em suas guerras e no seu dia-a-dia, bem comoexplicava a origem dos castigos e dos males do mundo. Ouseja, a narrativa mtica uma genealogia da origem dascoisas a partir de lutas e alianas entre as foras que regem

    o universo.A filosofia, por outro lado, trata de problematizar o porqudas coisas de maneira universal, isto , na sua totalidade.Buscando estruturar explicaes para a origem de tudo nos

    elementos naturais e primordiais (gua, fogo, terra e ar) por meio de combinaes emovimentos. Enquanto o mito est no campo do fantstico e do maravilhoso, afilosofia no admite contradio, exige lgica e coerncia racional e a autoridadedestes conceitos no advm do narrador como no mito, mas da razo humana, naturalem todos os homens.

    Numa Perspectiva Filosfica

    Na origem da filosofia encontramos o mito e a poesia. Entre estas, as que chegaramat ns so as poesias de Homero e Hesodo, que contam detalhes da vida dassociedades gregas antigas. Os mitos dos quais temos notcia so formas de narrativaoral sobre os tempos primordiais, isto , sobre a origem ou a criao, o modo comoas sociedades arcaicas representavam coletivamente a gerao de todas as coisas,isto , a sua maneira de exprimir suas experincias. preciso esclarecer que os chamados primeiros filsofos oriundos da Jnia, mais oumenos no sculo IV a.C, foram tambm astrnomos, gemetras, matemticos,mdicos e fsicos, isto , as divises do saber, as quais estamos acostumados, somodernas e no faziam parte do universo dos antigos. A distino entre o que afilosofia e o que poesia, fsica, etc., herana platnica. Existem duas versesprincipais sobre a origem da filosofia: a verso mais conhecida aquela que acentua osurgimento de uma metodologia nova de abordagem dos problemas no esforo decertos pensadores em explicar os fenmenos naturais com mtodos que

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    possibilitavam medir, verificar e prever os fenmenos. Nessa verso a filosofia aonascer, ope-se ao mito e o substitui, a partir de uma nova racionalidade.A segunda verso diz que no houve um rompimento com o mito e a religiosidade dosantigos continuou a aparecer nas formas de conhecimento filosfico.

    No sabemos se os contemporneos dos primeiros filsofos gregos acreditavamverdadeiramente que a Via Lctea era o leite espalhado pelo seio de Hera, mas

    quando Demcrito afirma que no se trata seno de uma concentrao de estrelas, amaioria considera isso como uma blasfmia. Quanto a Anaxgoras, que deu comocerto ser o Sol um aglomerado de pedras, chegou mesmo a ter conflitos com ospoderes pblicos. verdade que as doutrinas dos primeiros filsofos estavam aindamarcadas pela mitologia, mas isso no deve esconder-nos a sua orientaofundamentalmente antimitolgica. (OIZERMAN, in: GOMES & FIGUEIREDO, 1983 p.80 -81)

    As duas respostas podem ser consideradas extremadas. A filosofia surgiugradualmente a partir da superao dos mitos, rompendo em parte com a teodicia.Outras civilizaes apresentaram alguma forma de pensamento filosfico, contudo,sempre ligado tradio religiosa. A filosofia, por sua vez, abandona e supera acrena mtica e abraa a razo e a lgica como pressupostos bsicos para o pensar.Ento podemos dizer que a filosofia surgiu por meio da racionalizao dos mitos, massob a influncia dos conhecimentos adquiridos de outros povos gerando algo novo, ouseja, houve uma superao e transformao do antigo, gestando o novo de maneiradiferente.

    Mito e Lgos

    Orfeu e Euridice,George FrederickWatts,1869.

    Como as pesquisas atuais entendem o mito? Conforme Vernant (2001) parece que osestudiosos do mito no conseguem definir seu objeto de estudo e o vem desvanecer-se:

    (...) o tempo de reflexo esse olhar lanado para trs sobre o caminho percorrido no marcaria, para o mitlogo, o momento em que, acreditando como Orfeu ter tirado

    sua Eurdice das trevas, impaciente de contempl-la na claridade da luz, ele se voltapara v-la desvanecer e desaparecer para sempre a seus olhos? (VERNANT, 2001, p.289)

    Os mitlogos questionam a prpria existncia dos mitos, percebendo que, no mundogrego, (...)eles existiram no pelo que eram em si, e sim como relao quilo que, poruma razo ou outra, os excluam e os negavam(...). (VERNANT, 2001, p. 289) Emoutras palavras, o mito existe do ponto de vista de uma razo que pretende separar-seda narrativa oral e da religio. medida que a razo filosfica constitui-se comomtodo lgico de argumentao e discurso verdadeiro sobre o real, rejeita (...) oilusrio, o absurdo e o falacioso. Ele (o mito) a sombra que toda forma de discursoverdadeiro projeta, por contraste, na hora em que a verdade no aparece mais como

    mensurvel (...) (VERNANT, 2001, p.291) e perde-se nas brumas da narrativa. ,portanto, ao discurso metdico que o mito deve a sua existncia.

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    O Mito Hoje

    FriedrichNietzsche 1844-1900.

    Na modernidade, podemos pensar filosoficamente outros conceitos para o mito. Umdos modos de entender o mito pens-lo como fantasmagoria, isto , aquilo que asociedade imagina de si mesma a partir de uma aparncia que acredita ser a

    realidade. Por exemplo: mtica a idia de progresso, porque uma idia que nosmove e alimenta nossa ao, mas, na realidade no se concretiza. A sociedademoderna no progride no sentido que tudo o que novo absorvido para amanuteno e ampliao das estruturas do sistema capitalista. O progressoapresenta-se como um mito porque alimenta o nosso imaginrio.Boaventura, (2003), defende que todo conhecimento cientfico socialmenteconstrudo, que o rigor da cincia tem limites inultrapassveis e que sua pretensaobjetividade no implica em neutralidade, da resulta que acreditar que a cincia levaao progresso e que o progresso e a histria so de alguma forma linear, pode serconsiderado como o mito moderno da cientificidade. Quando, ao procurarmos analisara situao presente nas cincias no seu conjunto, olhamos para o passado, a primeiraimagem talvez a de que os progressos cientficos dos ltimos 30 anos so de umaordem espetacular que os sculos que nos precederam no se aproximam emcomplexidade. Ento juntamente com Rousseau (1712 - 1778) perguntamos: oprogresso das cincias e das artes contribuiro para purificar ou para corromper osnossos costumes? H uma relao entre cincia e virtude? H uma razo de pesopara substituirmos o conhecimento vulgar pelo conhecimento cientfico?

    Desde sempre o iluminismo, no sentido mais abrangente de um pensar que fazprogressos, perseguiu o objetivo de livrar os homens do medo e de fazer delessenhores. Mas completamente iluminada, a terra resplandece sob o signo do infortniotriunfal. O programa do iluminismo era o de livrar o mundo do feitio. Sua pretenso, ade dissolver os mitos e anular a imaginao, por meio do saber. Bacon, o pai da

    filosofia experimental (conf. Voltaire), j havia coligido as suas idias diretrizes. (...)Apesar de alheio matemtica, Bacon, captou muito bem o esprito da cincia que seseguiu a ele. O casamento feliz entre o entendimento humano e a natureza dascoisas, que ele tem em vista, patriarcal: o entendimento, que venceu a superstio,deve ter voz de comando sobre a natureza desenfeitiada. Na escravizao dacriatura ou na capacidade de oposio voluntria aos senhores do mundo, o saber que poder no conhece limites. Esse saber serve aos empreendimentos de qualquer um,sem distino de origem, assim como, na fbrica e no campo de batalha, est aservio de todos os fins da economia burguesa. Os reis no dispem sobre a tcnicade maneira mais direta do que os comerciantes: o saber to democrtico quanto osistema econmico juntamente com o qual se desenvolve. A tcnica a essnciadesse saber. Seu objetivo no so os conceitos ou imagens nem a felicidade da

    contemplao, mas o mtodo, a explorao do trabalho dos outros, o capital.(ADORNO e HORKHEIMER, 1975, p. 97-98).

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    O iluminismo partiu do pensamento de que a razo seria um instrumento capaz deiluminar a realidade, libertando os homens das trevas da ignorncia, da ingenuidadeda imaginao e do mito. O animismo, a magia e o fetichismo teriam sido finalmentesuperados e o mundo estaria livre desses flagelos. O entendimento e a razoassumiriam o comando sobre a natureza e transformar-se-iam em senhores absolutose imperativos.No entanto, o iluminismo no deu conta da tarefa que se props. Suas luzes no

    iluminaram tanto quanto se pretendia e a libertao do mito, do dogma e da magiamedieval no teve o xito afirmado por alguns autores. O iluminismo pretendeu retiraro mito e a fantasia de seu altar, mas colocou a razo e a tcnica em seu lugar, logo,no derrubou o mito, apenas inverteu, dando cincia e tcnica o brilho daverdade, gestando, assim, o mito moderno da racionalidade.Para Nietzsche (1844 1900) o iluminismo no cumpriu o que se props a fazer. Nolibertou os homens de seus prejuzos, os mitos no foram abandonados, massubstitudos por novos e mais elaborados heris. O que pode ser to escravizadorquanto o dogma, isso porque a tcnica e o saber cientfico podem estar a servio docapital. Alm disso, este saber tcnico pode coisificar o homem e neste sentido osmitos modernos apresentam-se camuflados. Por isso, a crena na razo de formaabsoluta gera um mito, o que caracterizaria um retrocesso no percurso do mito aologos que, de certo modo, no era a inteno.

    Mas enfim o que o mito?

    Interpretaoda alegoria da Caverna

    O pensamento mtico por natureza uma explicao da realidade que no necessitade metodologia e rigor, enquanto que o logos caracteriza-se pela tentativa de darresposta a esta mesma realidade, a partir de conceitos racionais. Mas existe razo nosmitos? No seria tambm a racionalidade, um mito moderno disfarado? Assim comona antigidade, o mito estava a servio dos interesses da aristocracia rural e, portantono interessava aristocracia ateniense, surgindo assim o pensamento racional ligado plis, no mundo contemporneo, no estariam o pensamento tecnicista e a cincia,a servio do capital e das elites que financiam a produo do conhecimento cientfico?O homem moderno continua ainda a mover-se em direo a um valor que o apaixonae s posteriormente que busca explicit-lo pela razo. Entende-se, pois, que o mitomanifesta-se por meio de elementos figurativos, enquanto que o logos utiliza-se deelementos racionais, portanto preciso deixar bem claro que no se pretende aquicolocar o pensamento racional no mesmo plano do pensamento mtico, mas sim, quea partir de uma releitura percebemos que o Iluminismo no deu conta nem mesmo derealizar a tarefa de que se props: iluminar as trevas da ignorncia; quanto maisdissolver os mitos e anular a imaginao.

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    Referncias:

    ARAGON, L. O campons de Paris. Rio de Janeiro: Editora Imago, 1996.BLACKBURN, S. Dicionrio Oxford de Filosofia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1994.GOMES, L. C.; FIGUEIREDO, Ilda. Antologia filosfica: a reflexo filosfica, do mito

    razo; dialtica da aco e do conhecimento; valores tico-polticos. Lisboa:Livros Horizonte, 1983.HORKHEIMER, M. e ADORNO, T. W. Conceito de Iluminismo., So Paulo:Pensadores, 1975.SANTOS, B. de S. Um discurso sobre as cincias. So Paulo, Cortez, 2003.VERNANT, J. P. Entre Mito e Poltica. So Paulo: Editora da USP, 2001._________. Mito e Pensamento entre os gregos. So Paulo: Editora da USP, 1973.

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