- linguagem, sociedade e cognição (kenedy, 2013)

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    KENEDY, E. Linguagem, sociedade e cognição. In: PAES, R,. (Org.). Língua, uso e discurso:

    entremeios e fronteiras. 1ªed. Rio de Janeiro: Editora da UESA, 2013, v. 1, p. 5-34.

    Linguagem, sociedade e cognição 

    Capítulo 1 

    Eduardo KenedyUniversidade Federal Fluminense 

    A linguagem humana 

    Caro aluno, a linguagem humana é um fenômeno impressionante. Ela se

    faz presente em quase todos os momentos da vida de uma pessoa, desde o seu

    nascimento, quando recebe um nome e é inserido numa comunidade de fala,

    até a maturidade, quando transita diariamente pelos complexos sistemas decomunicação e interação social modernos. Concretizada numa das milhares de

    línguas hoje existentes no mundo, a linguagem humana nos  impressiona

    porque ela é capaz de fazer muito a partir de pouco. É com base em apenas

    três ou quatro dúzias de sons que nós, falantes de uma língua natural

    qualquer, como, por exemplo, o português, conseguimos dominar dezenas de

    milhares de palavras, as quais, quando combinadas entre si de maneira

    ordenada, nos  permitem a produção e a compreensão de um númeropotencialmente infinito de frases e textos. A posse da linguagem, com seu

    ilimitado poder expressivo, faculta aos humanos a organização e a veiculação

    de pensamentos, ideias, conceitos, valores e, dessa forma, insere cada

    indivíduo que domina (pelo menos) uma língua no dinâmico e intenso fluxo

    comunicativo das sociedades contemporâneas. Com efeito, os poucos sons da

    linguagem oral podem ser substituídos por algumas letras num sistema de

    escrita ou por centenas de sinais numa língua de surdos sem que, com isso, opoder mobilizador da linguagem seja significativamente alterado. Seja na

    fala, na escrita ou na sinalização, a experiência humana se faz rica e ilimitada

    com a linguagem e pela linguagem. 

    Para que você tome consciência da complexidade social e cognitiva

    subjacente a um simples ato da linguagem humana, pense no seguinte

    exemplo. Imagine um homem que caminha distraído pela cidade,

    aproveitando os momentos que ainda lhe sobram de seu horário de almoço.Subitamente, ele se dá conta de que pode estar atrasado para o retorno ao

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    entremeios e fronteiras. 1ªed. Rio de Janeiro: Editora da UESA, 2013, v. 1, p. 5-34.

    trabalho e diz para si mesmo, com aquela voz interna e silenciosa que muitas

    vezes ordena os nossos pensamentos: “Devo estar atrasado!”. Com essa

    impressão, o homem se dirige a um transeunte e pergunta: “Com licença. O

    senhor pode me informar as horas?”. O transeunte, por sua vez, compreende o

    estado mental de seu interlocutor – sua intenção de ser informado a respeito

    do horário – e busca o comportamento adequado para a situação: olha para o

    relógio de pulso e dele retira a informação necessária, que é codificada na

    frase-resposta “São doze e trinta”. A aparente banalidade de um evento como

    esse esconde sob si um fenômeno extraordinário: a interação entre a mente

    humana e a realidade sociocultural na tarefa de produzir e compreender

    estruturas e significados linguísticos. Podemos não nos dar conta, mas, na

    comunicação humana, o indivíduo que fala executa um trabalho

    sociocognitivo muito complexo. Ele deve codificar os seus pensamentos e

    ideias em palavras, que, por sua vez, devem ser combinadas entre si em

    frases, as quais, por fim, são pronunciadas para um interlocutor num dado

    contexto discursivo. Da mesma forma, a tarefa do indivíduo que compreende

    é também engenhosa: ele deve decodificar os sons da fala que lhe são

    dirigidos no ato do discurso, de modo a identificar palavras e frases para,

    assim, conseguir interpretar os pensamentos e as ideias de seu colocutor. Ora,

    podemos perguntar: como os humanos fazem isso? De que maneira essa

    sequência de codificação e decodificação de formas e significados linguísticos

    ocorre?

    Pense bem, pois as respostas para essas perguntas não são nada fáceis

    ou simples. Lembre-se de que as estruturas das frases e dos textos nas línguas

    naturais são geralmente muito complexas. Mesmo se analisássemos uma frase

    simples como “O senhor pode me informar as horas?”, encontraríamos nela

    regras de ordenação de palavras, concordância, regência, seleção de

    pronomes... enfim, verificaríamos a existência de uma suntuosa maquinaria

    gramatical a serviço da comunicação e da interação social. Entretanto, a

    despeito de toda essa complexidade, nós humanos somos capazes de produzir

    e compreender frases e textos com extrema facilidade. Numa conversa

    qualquer, produzimos e compreendemos dezenas, centenas, milhares de

    enunciados, um após o outro, numa velocidade incrivelmente rápida, muitas

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    entremeios e fronteiras. 1ªed. Rio de Janeiro: Editora da UESA, 2013, v. 1, p. 5-34.

    vezes medida em milésimos de segundo. Em circunstâncias normais, fazemos

    isso de maneira inconsciente e sem esforço cognitivo aparente. Ora, como

    somos capazes disso? De que maneira nossas mentes se  tornam aptas a

    estruturar nossos pensamentos em frases e textos codificados em sons

    socialmente compartilhados? 

    Ao formularmos essas perguntas, acreditamos ter despertado em você a

    consciência do complexo mundo sociocognitivo que se esconde sob cada uso

    cotidiano que fazemos da linguagem. De fato, esperamos ter também aguçado

    o seu interesse pelos estudos linguísticos. Você deve saber que encontrar

    respostas para tais perguntas é tarefa das ciências da linguagem. Essas

    ciências vêm alcançando um extraordinário desenvolvimento ao longo das

    últimas décadas e, assim, muitos segredos a respeito da estrutura e do

    funcionamento das línguas naturais estão sendo rapidamente revelados.

    Algumas dessas descobertas serão apresentadas a você neste livro. Nas

    próximas páginas, gostaríamos de ter você como nosso convidado durante uma

    breve incursão pelo fantástico universo sociocognitivo que pertence a mim e a

    você: a linguagem humana. 

    Neste capítulo inicial, vamos aprender alguns conceitos fundamentais e

    indispensáveis ao estudo da linguagem. Começaremos pelas noções de

    linguagem e língua. Os termos parecem se  referir a conceitos aproximados,

    mas teremos uma seção inteira para entendermos que se trata, na verdade,

    de duas realidades diferentes. Com base no que estudaremos sobre a noção

    de língua, seguiremos para a seção em que diferenciaremos a dimensão

    cognitiva da dimensão sociocultural da linguagem. Aprenderemos que uma

    língua sempre existe simultaneamente no interior do indivíduo que a fala e no

    seio da sociedade em que esse indivíduo se encontra inserido, sendo, por isso,

    um fenômeno sociocognitivo (ou cognitivossocial). Logo em seguida,

    trataremos do fantástico fenômeno da aquisição da linguagem. Vamos analisar

    alguns aspectos da árdua tarefa das crianças, que, de maneira inconsciente e

    compulsória, devem criar em suas mentes uma versão do sistema linguístico

    que a elas se revela indiretamente na fala das pessoas que a circundam.

    Também teremos, neste capítulo, uma seção dedicada às diferenças entre as

     formas  e as  funções  linguísticas. Estudaremos para que serve a linguagem

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    entremeios e fronteiras. 1ªed. Rio de Janeiro: Editora da UESA, 2013, v. 1, p. 5-34.

    humana e como ela dá conta de seus diversos ofícios. Por fim, apresentaremos

    os principais fatos imbricados no uso da linguagem pelos indivíduos adultos,

    que em tempo real precisam produzir e compreender frases e textos,

    codificando e decodificando mentalmente informações nas diversas formas de

    comunicação e expressão que se tornam possíveis pela língua. Esperamos que

    você tenha apreciado esse roteiro, pois nossa viagem pelo mundo da

    linguagem está apenas começando! 

    Linguagem e língua 

    Ferdinand de Saussure (1857/1913) foi um importante linguista franco-

    suíço que ainda hoje é considerado o pai das modernas ciências da linguagem.

    Foi Saussure quem formulou, explicitamente e com grande clareza, uma

    importante distinção entre aquilo que compreendemos por linguagem  e por

    língua. Vamos entender do que se trata.

    De acordo com Saussure, “a língua não se confunde com a linguagem,  

    pois é somente uma parte determinada e essencial dela”  (1916: p. 17). O que

    o mestre genebrino nos  ensina nesta passagem é que a linguagem é um

    fenômeno muito mais geral e abrangente do que uma língua. Comparada com

    a linguagem, diz-nos Saussure, uma língua possui um caráter muito mais

    específico. Para entender melhor isso, pensemos no seguinte. Você acha que

    animais não humanos, como cachorros, gatos, macacos, pássaros etc.,

    possuem algum tipo de linguagem? A resposta é um tanto óbvia: é claro que

    sim. A maior parte dos animais possui algum sistema de comunicação que

    permite a expressão de seus estados internos e a interação com o seu

    ambiente. Por exemplo, se você possui um cão ou gatinho, certamente é

    capaz de perceber o tipo de latido (ou miado) que ele produz quando está

    com fome, com dor, quando se sente em perigo ou alegre. Embora as

    mensagens que cães e gatos possam transmitir com seus ruídos

    característicos, com a posição do corpo, do rabo e com a emissão de certos

    odores sejam um tanto limitadas, não há dúvidas de que se trata de um tipo

    de linguagem que permite a comunicação tanto entre os membros daquelas

    espécies animais, quanto entre eles e os seres humanos. Na verdade, alguns

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    entremeios e fronteiras. 1ªed. Rio de Janeiro: Editora da UESA, 2013, v. 1, p. 5-34.

    animais chegam a possuir sistemas de linguagem impressionantemente

    complexos, como é o caso das abelhas. As abelhas possuem um complicado

    sistema de dança em ziguezagueado que permite a indicação da direção e da

    distância em que se encontra uma fonte de néctar que tenha sido descoberta

    por alguma delas. As abelhas que, durante alguns minutos, observam a

    abelhinha que localizou o néctar dançar para lá e para cá, chacoalhando o seu

    corpo de maneira frenética, são capazes de “entender” a informação que está

    sendo transmita e, logo ao fim da dança, rumam para a fonte do néctar com

    bastante precisão. Ora, esse exemplo ilustra claramente a existência de uma

    “linguagem dos animais”, ou, mais precisamente, a linguagem específica de

    cada espécie animal em particular. 

    Você já deve ter entendido que a linguagem é um conceito bastante

    abrangente, que se refere a todo e qualquer sistema de comunicação e

    expressão. É por isso que podemos falar em “linguagem dos animais”,

    “linguagem das cores”, “linguagem dos cheiros”, “linguagem corporal”,

    “linguagem da arte” incluindo a “linguagem da dança”, “linguagem da moda”

    etc. Pois bem, se linguagem é qualquer sistema de comunicação e expressão,

    então o que é uma língua? Com efeito, língua  é um tipo específico de

    linguagem, como o próprio Saussure já havida dito. Afinal, uma língua

    também é um sistema de comunicação e expressão e, assim, é uma forma de

    linguagem. Acontece que a língua é uma forma singular de linguagem, com

    características próprias que a distinguem de todas as demais linguagens

    animais ou humanas não-verbais. Que características são essas, você deve

    estar se perguntando? Trata-se de dois fatores sociocognitivos muito

    importantes. Vejamos cada um deles a seguir. 

    O primeiro fator que distingue uma língua humana qualquer, como o

    português, o inglês ou o xavante, dos demais sistemas de linguagem é a

    existência de um léxico. O léxico pode ser compreendido como o conjunto de

    palavras e expressões que são socialmente compartilhadas pelos falantes de

    uma dada língua. No léxico, encontramos uma coleção de formas

    (significantes) que são associadas sistematicamente a certos conteúdos

    (significados). Assim, por exemplo, em português possuímos o significante

    [kaza] (representado na escrita pela grafia “casa”) que será sempre associado

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    ao significado [tipo de moradia] todas as vezes que usarmos essa palavra.

    Também temos no léxico de nossa língua o significante [a], sufixo presente ao

    fim da forma [menina], ao qual está associado o significado [pessoa do sexo

    feminino]. Da mesma maneira, temos o significante da expressão [dar uma

    mãozinha] que se associa, em língua portuguesa, ao significado [oferecer

    ajuda]. O número total de palavras e expressões existentes num léxico é

    bastante variável de língua para língua. A título de ilustração, saiba que um

    falante escolarizado do português do Brasil domina pelo menos 50.000 itens,

    sem contar as formas flexionadas das palavras (como as diversas expressões

    do verbo “estudar”: estudo, estuda, estudamos, estudava, estudarei,

    estudaria etc.), mas os dicionários da língua portuguesa chegam a registrar de

    200.000 a 400.000 palavras. Trata-se de números bem impressionantes, não?

    Pois bem, nos sistemas gerais de linguagem não existe nada parecido com o

    léxico das línguas humanas. Afinal, quantos tipos de latido, miado ou cantar

    podem ser discriminados pelos cães, pelos gatos ou pelos pássaros? Quantas

    “palavras” poderíamos transmitir com a linguagem corporal, com a linguagem

    dos cheiros ou pela dança? Ainda que consigamos catalogar um grande número

    delas, não encontraríamos algo tão organizado, sistemático e vasto como o

    léxico de uma língua. 

    O segundo fator que distingue uma língua dos demais tipos de

    linguagem é o mais importante: as línguas humanas possuem um sistema

    combinatório, que chamamos de gramática. Esse sistema é capaz de combinar

    entre si, de maneira ordenada e controlada por regras, as unidades do léxico,

    de modo a construir expressões compostas como as frases e os textos. Por

    exemplo, o léxico do português possui unidades como “casa”, “bonita”,

    “comprar”, “você”, “mais”, porém é a gramática dessa língua que permitirá a

    criação de expressões complexas como “que casa mais bonita você

    comprou!”. O interessante é que, se o número de itens existentes num léxico

    qualquer já é consideravelmente grande, ele não é quase nada quando

    pensamos no número de expressões que o sistema combinatório de uma língua

    pode gerar utilizando suas regras computacionais. De fato, o número de frases

    e textos que podemos construir numa língua ao combinarmos léxico  e

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     gramática é ilimitado. Quando falamos uma língua, somos capazes de produzir

    e compreender um número infinito de frases e textos.

    Se compararmos as línguas humanas com os sistemas mais gerais de

    linguagem (humanos ou animais), poderemos deduzir que a principal

    diferença entre eles é a recursividade  –  também denominada infinitude,

    criatividade  ou  produtividade –, que existe somente nas línguas. A

    recursividade é justamente a capacidade de criar um número infinito de

    frases e textos com base no número finito de palavras existentes no léxico. A

    recursividade emerge, portanto, da combinação entre os dois componentes

    fundamentais de uma língua: o léxico e o sistema combinatório (gramática).

    Neste momento, você talvez tenha curiosidade de saber se existe algum tipo

    animal não humano que possua língua (e não apenas linguagem). Muito bem,

    os cientistas ainda não conseguiram registrar nenhuma espécie de vida, além

    dos humanos, que use algum sistema de comunicação remotamente parecido

    com uma língua natural. Por tudo o que até hoje sabemos, somente nós

    humanos conseguimos usar um sistema de linguagem com recursividade. É por

    isso que as línguas parecem ser um verdadeiro patrimônio da humanidade,

    algo que nos distingue claramente de todas as formas de vida conhecidas pela

    ciência. A posse da linguagem, na forma de uma língua, é de fato uma das

    características mais distintivas e mais importantes do homo sapiens. Não

    obstante, existem muitos cientistas que vêm tentando ensinar uma língua

    humana a animais inteligentes, como os chimpanzés e algumas espécies de

    papagaios e de golfinhos. Nos links  a seguir, você poderá encontrar alguns

    documentários que registram essas tentativas de ensino de línguas entre

    espécies. 

    Washoe - chimpanzé fêmea que aprendeu a dominar diversas formas da línguanorte-americana de sinais. http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=UAJAV0PJmsw 

    Alex  –  papagaio cinza africano que conseguia comunicar-se usando váriaspalavras do inglês. http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=VZ2j1jOwAYU 

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    Você provavelmente ficará encantado com as proezas linguísticas

    desses animais raríssimos e geniais. Mas acreditamos que não ficará

    convencido de que eles de fato “aprenderam” a usar uma língua e

    demonstram domínio de um léxico e de um sistema combinatório. O máximo

    que podemos dizer é que esses adoráveis bichinhos são capazes de aprender,

    após intensos anos de treinamento, um sistema de linguagem bastante

    complexo e avançado, inspirado no léxico das línguas humanas –  algo

    fantástico que, por si só, já é merecedor de destaque científico. No entanto,

    usar essas pesquisas para alegar que macacos ou papagaios são realmente

    capazes de aprender e usar uma língua humana é um flagrante e descomunal

    exagero, o qual se motiva muito mais por questões ideológicas (por exemplo,

    conferir maior importância ao aprendizado sociocultural em oposição à

    natureza biológica humana na aquisição de conhecimento) do que linguísticas.

    Até o momento, com efeito, a linguagem,  na forma de um sistema

    combinatório que opera recursivamente sobre um léxico,  é um fenômeno

    identificado somente na espécie humana e ainda irreproduzível nos sistemas

    de inteligência artificial desta segunda década do século XXI.

    Muito bem, agora que você já sabe distinguir linguagem e língua, fique

    atento às expressões “linguagem” ou “linguagem humana”. Muitas vezes,

    essas expressões querem dizer “língua” (léxico e gramática) e não apenas

    “linguagem” (qualquer sistema de comunicação). É bem verdade que podemos

    usar esses termos de maneira um tanto livre e mais ou menos metafórica, no

    dia a dia ou mesmo ao longo de um livro mais especializado – como, de fato,

    já o fizemos e tornaremos a fazer aqui -, mas, sempre que necessário,

    devemos distinguir tais conceitos.

    Língua = fenômeno cognitivo e sociocultural 

    As línguas humanas são uma autêntica maravilha do mundo natural e

    sociocultural. Talvez você já se tenha dado conta de que, desde que estejam

    inseridos num ambiente de interação social, todos os indivíduos saudáveis, de

    todos os tempos da história e de todas as culturas humanas, desenvolvem, de

    maneira natural e espontânea, a habilidade de produzir e compreender

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    oralmente palavras, frases e textos na língua de seu ambiente. Por exemplo,

    uma criança que nasça no Brasil desenvolverá, já nos primeiros anos de vida,

    a capacidade linguística de produção e compreensão de enunciados em

    português, numa de suas modalidades socioculturais –  se não o português,

    então uma das línguas minoritárias do país (por exemplo, uma língua

    indígena), que será assim a língua ambiente dessa criança. Essa capacidade

    permanecerá na mente da criança no curso de sua vida saudável e será

    modificada, na adolescência e na vida adulta, de acordo com suas

    experiências particulares. Como maravilha do mundo natural e sociocultural,

    o fenômeno das línguas humanas comporta necessariamente duas dimensões:

    uma dimensão individual e mental e uma dimensão coletiva e sociocultural.

    Sempre que temos o fenômeno linguagem humana, temos, de um lado, o

    indivíduo particular que possui a capacidade mental de produzir e

    compreender expressões linguísticas e, do outro lado, temos a sociedade em

    que esse indivíduo se insere, a qual lhe forneceu não só os contextos de uso

    da linguagem em interação com outros humanos, mas também os sons e as

    palavras necessários à expressão verbal. 

    O influente linguista norte-americano Noam Chomsky (nascido em 1928

    e ativo até o presente) formulou dois importantes conceitos para dar conta da

    diferença entre a dimensão individual e psicológica das línguas e a sua

    dimensão social e cultural. Chomsky, em seu clássico livro de 1986, propôs

    que a dimensão mental e cognitiva do fenômeno da linguagem seja

    sintetizada pelo conceito de Língua-i, em que “i” significa interna, individual.

    Já a dimensão sociocultural das línguas é denominada por Chomsky como

    Língua-e, em que “e” quer dizer externa, extensional. Vejamos melhor esses

    conceitos. 

    A noção de Língua-e corresponde  grosso modo ao que comumente se

    interpreta como língua ou idioma no senso comum. Por exemplo, o português

    é uma Língua-e no sentido de que é esse fenômeno sociocultural, histórico e

    político que compreende um conjunto sons, palavras, regras gramaticais e um

    sistema de escrita que, em conjunto, permitem a comunicação e a interação

    entre os seus falantes. Trata-se de um fenômeno supra-individual, na verdade

    exterior ao indivíduo. Quando dizemos que o russo é a língua da Rússia ou que

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    o chinês é a língua da China, entendemos língua como esse fenômeno

    desincorporado dos falantes, a Língua-e. Da mesma forma, quando dizemos

    que uma criança nascida no Paraguai provavelmente aprenderá a falar

    espanhol e guarani, mais uma vez nos referimos a um fenômeno cuja

    existência é externa às pessoas e, nesse caso, do qual elas devem se

    apropriar: as línguas do ambiente, as Línguas-e.

    A noção de Língua-i, por sua vez, corresponde ao conjunto de

    habilidades mentais que permitem ao indivíduo a produção e a compreensão

    de um número potencialmente infinito de expressões na sua língua ambiente.

    Uma Língua-i diz respeito, portanto, àquilo existente no interior da mente das

    pessoas, que lhes faculta a aquisição e o uso cotidiano de uma língua natural.

    Nesse sentido, se  entende que uma língua seja parte do sistema cognitivo

    humano. Uma Língua-i é uma faculdade psicológica ou, por assim dizer, um

    órgão mental. Todo indivíduo humano sem deficiências neuropsicológicas

    graves é capaz de manipular, em sua língua, diversos recursos gramaticais e

    textuais que veiculam significados do indivíduo para o mundo exterior e desse

    para a consciência do indivíduo. Essa competência cognitiva para a

    manipulação das estruturas e dos significados da linguagem é individual e

    inconsciente. É a ela que nos referimos com o conceito de Língua-i. 

    É muito importante que você compreenda que uma língua é ao mesmo

    tempo  um fenômeno cognitivo e individual (uma Língua-i) e um fenômeno

    coletivo e sociocultural (uma Língua-e). Embora nem sempre usemos os

    termos chomskianos, essa dualidade está lá inevitavelmente todas as vezes

    em que falamos sobre as línguas. Às vezes, quando pensamos sobre a

    linguagem humana, precisamos ter clareza se estamos discutindo aspectos

    cognitivos ou aspectos socioculturais da língua –  ou mesmo se estamos

    considerando ambos os aspectos em interação. Fique, portanto, sempre

    atento a esse particular. 

    Aquisição da linguagem 

    Para que você compreenda a dramática situação sociocognitiva em que

    se encontra um bebê na fase de aquisição da linguagem, vamos liberar a

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    imaginação com a seguinte história fantástica. Suponha que você seja

    abduzido por alienígenas. Você acordaria numa galáxia distante, cercado de

    criaturas diferentes, cujos comportamentos você não compreende. Apesar de

    toda a estranheza inicial, não lhe seria difícil notar que tais criaturas possuem

    uma espécie de orifício em sua extremidade superior (algo como uma boca),

    de onde certos sons são regularmente emitidos. Com um pouco de

    observação, você consegue perceber que esses estranhos seres parecem se 

    comportar de alguma maneira relacionada aos sons que trocam entre si. Por

    exemplo, você vê um ser alto emitindo sequências de sons enquanto um

    baixinho o observa. Ao final da produção de sons, o baixinho se  desloca no

    espaço, toma um objeto para si e o  leva até o altão, como se tivesse

    cumprido um pedido ou uma ordem. Para você, parecerá coerente concluir

    que os sons compartilhados entre esses alienígenas sejam uma espécie de

    sistema de comunicação e você, para conseguir descobrir o que aconteceu

    consigo, onde você está, quem são essas criaturas etc., terá de aprender a

    usar esse sistema. Tal tarefa não será nada fácil, pois você não contará com

    nenhum professor de “alienígena para terráqueos”, nenhum livro ou curso

    preparatório e, além disso, o aparente sistema de comunicação usado por

    aquelas criaturas não é semelhante a nenhum outro que você já tenha visto

    antes...

    Se você conseguiu compreender o quão dramática seria essa situação,

    está apto a entender que a aquisição da linguagem pelos bebês e pelas

    crianças é um autêntico milagre do mundo biocultural. Note bem, os bebês

    chegam a um mundo completamente desconhecido, retirados que foram do

    aconchegante útero materno. Esse mundo é povoado por seres estranhos ao

    bebê (os seres humanos) cujo comportamento parece estar estreitamente

    relacionado aos sons que todos trocam entre si. Tais sons mais parecem ao

    bebê uma grande confusão, um continuum  de ruídos quase indecifráveis.

    Afinal, como um bebê poderia identificar, no fluxo da fala humana, onde um

    som termina e o outro começa? No entanto, já ao nascer, os bebês parecem

    ser muito espertos e, para eles, não é difícil deduzir que os sons emitidos

    pelas criaturas que o circundam constituem, na verdade, um sistema de

    comunicação. Talvez em razão do que famoso psicólogo de Harvard, o

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    KENEDY, E. Linguagem, sociedade e cognição. In: PAES, R,. (Org.). Língua, uso e discurso:

    entremeios e fronteiras. 1ªed. Rio de Janeiro: Editora da UESA, 2013, v. 1, p. 5-34.

    canadense Steven Pinker, denominou de instinto para a linguagem, um bebê

    humano rapidamente “compreende” que precisa dominar esse sistema para

    descobrir o que os seres ao seu redor dizem e também para que ele próprio

    possa dizer alguma coisa e comunicar-se com as outras pessoas. Mas bebês e

    crianças estão, em grande parte, quase sozinhos no interior de suas mentes

    durante a odisseia pela descoberta e pelo domínio da língua do seu ambiente.

    Eles não possuem um professor particular de “língua  humana para bebês

    recém-nascidos” e, o que é mais grave, o seu cérebro é ainda um

    protocérebro, ou seja,  apenas um rascunho do potente processador de

    informações que é o cérebro de um indivíduo maduro. Suas capacidades

    cognitivas são, portanto, enormemente inferiores às do adulto abduzido para

    outra galáxia de nosso exemplo.

    Usamos a palavra “milagre” para descrever a aquisição da linguagem

    pelos bebês e pelas crianças porque, apesar de todas as dificuldades que

    descrevemos, os pequenos humanos conseguem dominar a língua de seu

    ambiente, para a compreensão e a produção da linguagem, com extrema

    eficiência e num intervalo de tempo incrivelmente pequeno, que não

    ultrapassa três ou quatros anos. As crianças pequenas sequer parecem fazer

    esforço cognitivo para adquirir a sua língua materna. De fato, a aquisição da

    linguagem é muito mais algo que simplesmente acontece com os bebês e com

    as crianças – e não algo que elas façam deliberadamente com o seu pequeno

    cérebro em formação. 

    A par de ser um fenômeno sociocognitivo extraordinário, a aquisição da

    língua do ambiente (ou das línguas do ambiente, no caso das comunidades

    bilíngues ou multilíngues) é um dos eventos mais importantes na vida de um

    ser humano. Esse fenômeno é ao mesmo tempo a porta de entrada para as

    relações sociais humanas, que são quase sempre mediadas pela linguagem, e a

    janela para o aperfeiçoamento cognitivo individual, uma vez que grande parte

    da cognição humana se  utiliza da linguagem como instrumento de

    desenvolvimento e de complexificação. Na verdade, o que chamamos de

    aquisição da linguagem é um fenômeno duplo, que envolve a aquisição de dois

    diferentes tipos de habilidades sociocognitivas. Vejamos isso em mais

    detalhes. 

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    KENEDY, E. Linguagem, sociedade e cognição. In: PAES, R,. (Org.). Língua, uso e discurso:

    entremeios e fronteiras. 1ªed. Rio de Janeiro: Editora da UESA, 2013, v. 1, p. 5-34.

    Um tipo particular de aquisição da linguagem é aquele que

    denominamos de aquisição em sentido amplo, ou aquisição da linguagem lato

    sensu. Em seu sentido amplo, adquirir linguagem significa apropriar-se das

    habilidades de comunicação, expressão e interação social. Esse tipo de

    aquisição demanda dos bebês e das crianças a absorção dos aspectos mais

    gerais da linguagem, tais como a interação sociocomunicativa, a organização

    de conceitos e de pensamentos e envolve, também, o desenvolvimento das

    noções de autoconsciência e de individualidade nas relações humanas. Na

    aquisição da linguagem lato sensu, a criança adquire, na verdade, os

    fundamentos da interação entre os humanos: os valores e as ações imbricados

    nos usos da linguagem, a própria noção de si, a percepção do(s) outro(s), os

    modos de interagir socialmente e assim por diante. 

    O outro tipo de aquisição da linguagem é muito mais específico e, por

    isso mesmo, denomina-se aquisição em sentido restrito  ou aquisição da

    linguagem stricto sensu. Em seu sentido restrito, adquirir linguagem significa

    apropriar-se do léxico e do sistema combinatório existentes na língua do

    ambiente. Esse tipo de aquisição demanda dos bebês e das crianças a

    habilidade de discriminação perceptual e de articulação intencional de toda a

    maquinaria gramatical necessária ao funcionamento da língua. Na aquisição

    stricto sensu, a criança adquire, de fato, o aparato linguístico formal que

    estará a serviço das interações sociais e da organização cognitiva do indivíduo

    em desenvolvimento.

    Se você já entendeu a diferença entre aquisição da linguagem lato

    sensu e stricto senso, podemos agora falar um pouco mais sobre a aquisição

    em sentido restrito. Um dos fatos mais intrigantes a respeito do processo de

    aquisição do léxico e do sistema combinatório da língua do ambiente é que

    ele parece ser universal. As fases pelas quais passam os bebês e as crianças

    durante a aquisição stricto sensu são muito semelhantes em todas as culturas

    do mundo, seja qual for a língua do ambiente e seja qual for o nível de

    inteligência geral da criança. O que isso quer dizer é que todas as crianças

    parecem atravessar as mesmas etapas, nos mesmos estágios de

    desenvolvimento biológico, desde o nascimento até o domínio completo da

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    KENEDY, E. Linguagem, sociedade e cognição. In: PAES, R,. (Org.). Língua, uso e discurso:

    entremeios e fronteiras. 1ªed. Rio de Janeiro: Editora da UESA, 2013, v. 1, p. 5-34.

    língua, estejam onde estiverem, em qualquer classe social e sob qualquer tipo

    de cultura. Vejamos alguns exemplos.

    Já ao nascer, todas as crianças normais balbuciam no ritmo da sua

    língua ambiente. Na verdade, algumas pesquisas recentes descobriram que o

    choro de bebês recém-nascidos transcorre conforme o ritmo e a melodia da

    língua que a circunda (Wermke e al., 2011). Esses fatos parecem indicar que a

    aquisição da linguagem tem início ainda no útero materno, quando aspectos

    sonoros da língua do ambiente (como o ritmo, a entoação e o acento) já

    parecem ser discriminados pelo feto. Você pode conferir um interessante

    vídeo sobre a precocidade na aquisição de sons e ritmos de uma língua no link 

    abaixo.

    Robert Lent (UFRJ) – Os bebês choram em que língua?http://www.youtube.com/watch?v=e1vqLu_qFv4

    Não obstante, o grande salto qualitativo na produção linguística dos

    bebês ocorre aos 12 meses, quando eles já são capazes de produzir suas

    primeiras palavras reconhecíveis como tais. Essas são, na verdade, mais do

    que simplesmente “palavras”, pois sempre assumem o valor   de uma frasecompleta inserida num contexto discursivo. Independente da língua do

    ambiente, as primeiras palavras produzidas por uma criança são sempre

    monossilábicas e seguem a estrutura [consoante + vogal]. Em pouco tempo,

    essa estrutura vai tornando-se cada vez mais complexa e caminha em direção

    à complexidade existente na fala adulta circundante. Por exemplo, uma

    criança brasileira, pode dizer algo como “bó”, parar significar uma frase

    inteira, como “olhe, a bola”, ou “onde está a bola?”, ou “ele furou a bola”,

    conforme o contexto permita compreender. Pouco meses depois, “bó”

    ganhará complexidade fonológica e tomará a forma convencional de “bola”. O

    mesmo fenômeno pode ser observado com as centenas de outras palavras que

    as crianças adquirem durante essa fase, que os linguistas nomeiam  fase

    holofrástica. 

    Com pouco menos de 24 meses, as crianças já atingem a fase de duas

    palavras (também chamada de  fase sintagmática). Nessa etapa de seu

    desenvolvimento linguístico, frases com estruturas do tipo sujeito e predicado

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    KENEDY, E. Linguagem, sociedade e cognição. In: PAES, R,. (Org.). Língua, uso e discurso:

    entremeios e fronteiras. 1ªed. Rio de Janeiro: Editora da UESA, 2013, v. 1, p. 5-34.

    semelhantes às dos adultos começam a ser produzidas pelos bebês. São frases

    como “qué papá”, “mais colinho”, “meia papai” e “banho não”. O

    interessante é que os enunciados produzidos pelos bebês durante a fase

    sintagmática não são apenas uma combinação entre duas palavras soltas. Pelo

    contrário, tal como ocorre na fase holofrástica, essas palavras também

    assumem o valor de um ato comunicativo completo, cuja interpretação é

    dependente do contexto interacional e comunicativo.

    Por volta dos 30 meses de vida, as crianças já conseguem criar frases

    com extensão ilimitada, compostas por três, quatro, seis, nove, dez

    palavras... Interessantemente, ao longo dessa fase, chamada de  fase 

    telegráfica, artigos, preposições, conjunções e pronomes estão ainda ausentes

    na fala infantil. Com efeito, até o terceiro ano de vida, as palavras que as

    crianças inserem em frases e textos são sempre itens de conteúdo referencial,

    como substantivos, adjetivos e verbos. As partículas gramaticais, que possuem

    conteúdo puramente formal, só emergem na fala das crianças de modo

    consistente a partir dos 36 meses de vida – embora haja intensas variações

    individuais sem causa aparente registradas pelos cientistas. É possível dizer

    que, ao mais tardar, aos quatro anos de vida, a língua que uma criança

    domina para a produção e para a compreensão da linguagem é indistinguível

    da de um adulto. As únicas diferenças, é claro, dizem respeito aos aspectos

    linguísticos que envolvem letramento, escolarização e certas regras de

    comportamento social que se desenvolvem posteriormente, na adolescência e

    na vida adulta. 

    Infelizmente, parece existir um fim para o período da aquisição da

    linguagem. Isto é, os humanos não podem adquirir a língua do ambiente tão

    rapidamente e sem esforço em qualquer momento de sua vida, da infância à

    velhice. O neurocientista alemão Erick Lenneber (1921-1975) denominou de

     período crítico (ou idade crítica) a fase de desenvolvimento físico e cognitivo

    humano no limite da qual a aquisição da linguagem deve acontecer. Há muitas

    discussões sobre qual seria o fim dessa fase, mas, como existem muitas

    variações individuais no desenvolvimento humano, não é possível defini-lo

    com precisão. A maioria dos estudiosos aponta a puberdade, por volta dos 12

    ou 13 anos, como o momento em que “a janela automática” para a aquisição

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    KENEDY, E. Linguagem, sociedade e cognição. In: PAES, R,. (Org.). Língua, uso e discurso:

    entremeios e fronteiras. 1ªed. Rio de Janeiro: Editora da UESA, 2013, v. 1, p. 5-34.

    da linguagem se fecha. A partir de então, a aquisição da linguagem não é mais

    possível e tudo o que podemos fazer para dominar uma (nova) língua é

    aprendê-la por meio de estudos formais, em escolas ou cursos de idioma. O

    conceito de aquisição  opõe-se ao de aprendizado  porque a aquisição da

    linguagem ocorre na infância de maneira espontânea, natural e mesmo

    involuntária, enquanto o aprendizado de línguas estrangeiras demanda do

    adolescente e do adulto esforço consciente e instrução mais ou menos formal.

    A linha divisora entre aquisição e aprendizado é justamente a idade crítica. 

    Formas e funções linguísticas 

    Muito bem, já sabemos diferenciar linguagem e língua, compreendemos

    as dimensões cognitiva e sociocultural de uma língua natural e temos noção

    da pequena epopeia que cada ser humano atravessa, em tenra infância, ao

    longo da aquisição da(s) língua(s) de seu ambiente. Mas e se perguntassem a

    você para que serve uma língua (como o português), qual seria a sua resposta?

    Muito provavelmente, você diria algo como  para permitir a comunicação

    entre as pessoas. Em essência, tal resposta está correta. Contudo, a pergunta

    é mais complexa do que parece, de tal modo que é preciso esmiuçá-la um

    pouco mais. Façamos isso. 

    A questão  para que serve uma língua  pressupõe dois conceitos

    fundamentais: (1º) as línguas possuem um conjunto de formas e (2º) cada uma

    dessas formas “serve” para algum fim, isto é, cada forma linguística possui

    uma dada  função  ou um conjunto de funções. As formas existentes numa

    língua podem ser também denominadas como estrutura. Trata-se da

    superfície ou o meio concreto pelo qual uma língua se realiza nos atos de fala

    humanos. Por exemplo, uma palavra e uma estrutura sintática são ilustrações

    de  formas  que usamos quando produzimos e compreendemos enunciados

    numa língua. Quando estudamos linguística e falamos dos aspectos formais de

    uma língua, estamos fazendo referência exatamente a essa aparato estrutural

    que precisamos utilizar para que a língua tome vida num ato linguístico

    qualquer. Por outro lado, sabemos que as formas de uma língua não existem

    por si mesmas. Com efeito, a razão de ser de cada forma linguística é

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    KENEDY, E. Linguagem, sociedade e cognição. In: PAES, R,. (Org.). Língua, uso e discurso:

    entremeios e fronteiras. 1ªed. Rio de Janeiro: Editora da UESA, 2013, v. 1, p. 5-34.

    desempenhar uma determinada  função. O escritor Graciliano Ramos

    compreendeu isso perfeitamente ao afirmar que “A palavra não foi feita para

    enfeitar, brilhar como ouro falso; a palavra foi feita para dizer”. No caso, “o

    dizer da palavra” é justamente a sua função. Dizendo de outra maneira, uma

    forma linguística não existe senão para provocar algum efeito de significado

    ou de sentido, isto é, uma forma não existe senão pela sua função. 

    Para que você entenda melhor a dualidade entre forma e função, pense

    nos seguintes exemplos. Em português, usamos um determinado som (e não

    outro) em razão de sua função distintiva, e assim conseguimos dizer, por

    exemplo, [sorte] e não [forte] pela oposição entra as formas [s] e [f].

    Podemos usar uma forma de entonação ascendente para caracterizar a função

    de uma pergunta (ex. “João saiu?”) e uma forma descendente para a função

    assertiva (ex. “João saiu.”). Podemos usar a forma de um sufixo diminutivo,

    como em [casinha], para conferir uma função afetiva ou depreciativa à

    palavra “casa”. Podemos usar uma frase na forma da voz ativa com a função

    de destacar o agente de um determinado processo (ex. “ João  cometeu

    erros”), ou podemos usar a forma da voz passiva para esconder o agente da

    ação e destacar o objeto do verbo (ex. “Erros foram cometidos”). Em suma, o

    que queremos dizer é que uma forma linguística (um som, uma entonação, um

    sufixo, uma voz verbal etc.) é a maneira pela qual uma dada função se realiza

    materialmente na língua. 

    Se você compreendeu o que são formas e funções linguísticas, talvez

    possa agora repensar a sua resposta à questão  para que serve uma língua

    (como o português)? . Na verdade, as formas existentes numa língua se

    prestam a inúmeras funções. Não é possível descrever todas elas neste

    capítulo, mas podemos dizer a você que, em sua grande maioria, as funções a

    que se destinam as formas linguísticas são eminentemente comunicativas. É

    por isso que importantes estudiosos, como o já citado Steven Pinker,

    acreditam que as línguas “servem” para a comunicação humana. Não

    obstante, cientistas não menos ilustres, como o também já mencionado Noam

    Chomsky, um dos linguistas mais influentes de todos os tempos, destacam

    outras funções linguísticas que são tão importantes ou ainda mais vitais do

    que a comunicação, tais como a organização do pensamento e a criação do

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    KENEDY, E. Linguagem, sociedade e cognição. In: PAES, R,. (Org.). Língua, uso e discurso:

    entremeios e fronteiras. 1ªed. Rio de Janeiro: Editora da UESA, 2013, v. 1, p. 5-34.

    conhecimento individual. De fato, muitas vezes nós humanos usamos a língua

    internamente, em voz alta ou em silêncio, como se falássemos com o nosso

    próprio eu –  e isso, é claro, não pode ser considerado literalmente

    comunicação. Isso quer dizer que, ainda que a comunicação possa ser a

    primeira e mais fundamental função das línguas, não podemos desprezar as

    outras funções, tais como a metacognitiva, isto é, a função de organização do

    pensamento, e a instrumental, isto é, a função adquirir e organizar outros

    tipos de cognição, como o conhecimento matemático, o conhecimento sobre a

    História, o conhecimento sobre as relações sociais etc.

    Atento à natureza comunicativa das línguas, o psicólogo austríaco Karl

    Buhler (1879-1963) foi um dos primeiros a tentar sintetizar, de maneira

    esquemática, as correlações entre linguagem e comunicação. Foi ele quem

    destacou que os usos da linguagem pressupõem (1) um emissor, (2) uma

    mensagem e (3) um destinatário. Esse modelo tripartido de comunicação se

    tornou mais complexo na análise do linguista russo Roman Jakobson (1896-

    1982), que introduziu as noções de (4) referente, de (5) canal comunicativo e

    de (6) código linguístico. É desse modelo de Buhler e Jakobson que se derivam

    as famosas funções da linguagem, que são estudadas no ensino médio: (1) a

    “função emotiva”, em que o emissor da mensagem se destaca; (2) a “função

    poética”, em que a própria mensagem transmitida é destacada; (3) a “função

    conativa”, na qual o destinatário da mensagem assume a função central; (4) a

    “função referencial”, em que o referente é o foco da comunicação; (5) a

    “função fática”, em que o canal comunicativo é meramente testado e (6) a

    “função metalinguística”, que se estabelece quando é o próprio código

    linguístico (a língua) o fator de destaque na comunicação. Na realidade, as

    funções linguísticas, entendidas como as funções que determinadas formas

    podem desempenhar nos usos da língua, são muito mais numerosas do que

    essas seis, todavia tal modelo parece ser bom caminho para começarmos a

    entender as funções comunicativas e expressivas que as formas da linguagem

    humana podem desempenhar. 

    Se você for uma pessoa curiosa, talvez tenha pensado: será que existe

    alguma relação natural entre uma determinada forma e sua respectiva

    função? Ou será que formas e funções linguísticas são associadas de uma

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    KENEDY, E. Linguagem, sociedade e cognição. In: PAES, R,. (Org.). Língua, uso e discurso:

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    maneira um tanto imprevisível, que precisa ser memorizada pelos falantes de

    uma determinada comunidade? Boa pergunta. Na verdade, esse é um

    questionamento milenar, que remonta à antiga Grécia clássica. Os filósofos

    gregos que se dedicavam ao estudo da linguagem dividiam-se, basicamente,

    entre os analogistas  e os anomalistas. Em termos muito simples, os

    analogistas afirmavam que as formas da linguagem eram análogas às suas

    funções e era somente em razão da passagem do tempo que, para as novas

    gerações de falantes, a analogia entre forma e função deixava de ser

    percebida. Por seu turno, os anomalistas sustentavam que as relações entre

    forma e função sempre foram totalmente acidentais e improvisadas, um

    verdadeiro acordo social tacitamente estabelecido entre os falantes de uma

    língua humana. Contemporaneamente, a controvérsia entre analogistas e

    anomalistas é reanalisada na oposição iconicidade  versus arbitrariedade.

    Vejamos o que é isso. 

    Comecemos pela arbitrariedade. Dizer que uma forma está

    arbitrariamente associada a uma função significa assumir que não é possível

    deduzir espontaneamente a que função determinada forma se presta. Sendo

    assim, torna-se preciso aprender e memorizar, caso a caso, a correspondência

    entre cada forma e sua respectiva função numa dada língua, tal como

    apregoavam os anomalistas. Um bom exemplo disso é a relação existente

    entre o significante (forma) e o significado (conteúdo) de cada uma das

    palavras do léxico do português. Só sabemos que a forma [kaza] (que

    escrevemos “casa”) deve ser associada ao conteúdo [tipo de moradia] porque

    aprendemos isso durante a aquisição da linguagem. Mas a relação entre forma

    e conteúdo nessa palavra é totalmente arbitrária, isto é, não é natural ou

    motivada por algum princípio lógico. Isso tanto é verdade que, noutras

    línguas, o mesmo significado (conteúdo) pode ser codificado por outro

    significante (forma), tal como o termo “house”, que em inglês é a forma

    correspondente do conteúdo [tipo de moradia]. Noutras palavras, ao

    afirmarmos que uma forma é arbitrária em relação à sua função, estamos

    dizendo que não existem semelhanças entre o feitio de determinada  forma e

    o seu respectivo conteúdo. Por exemplo, a aparência física de uma “casa” não

    se assemelha em nada à forma [kaza], em português, ou à forma [hauz], em

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    KENEDY, E. Linguagem, sociedade e cognição. In: PAES, R,. (Org.). Língua, uso e discurso:

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    inglês. Com efeito, a língua portuguesa, no curso de sua história, poderia ter

    escolhido arbitrariamente qualquer outra forma para expressar o conceito

    [tipo de moradia]. A escolha por [kaza] foi arbitrária. 

    Vejamos outros exemplos de arbitrariedade entre forma e função. Em

    língua portuguesa, a forma de entonação ascendente ao fim da frase

    desempenha a função de formular perguntas. Dizemos que a relação entre

    essa forma e essa função é arbitrária porque não há nada natural entre uma

    subida melódica e a “expressão de perguntas”. Trata-se de uma associação

    arbitrária que todos os falantes do português precisam aprender e memorizar.

    Também a sequência “sujeito > verbo > objeto” é uma forma arbitrária de

    codificar, numa dada frase, a relação entre um agente, uma ação  e um

     paciente. Embora a nós,  falantes de português,  pareça razoável pensar em

    codificar os participantes de uma ação na ordem “quem fez o que a quem”,

    não existe nada que torne essa ordem “mais natural” do que outra: trata-se,

    novamente, de uma arbitrariedade. De fato, a maioria das línguas do mundo

    apresenta a ordenação “sujeito > objeto > verbo” e, assim, codifica na frase

    os participantes de uma ação na sequência “quem fez a quem o quê”, noutro

    tipo de seleção arbitrária. 

    Pelo que expusemos acima, você talvez já possa deduzir que a

    iconicidade é o justo oposto da arbitrariedade. Sendo assim, uma forma é

    icônica quando reflete com clareza a função a que se destina, conforme

    pensavam os analogistas. Um rápido exemplo pode bem ilustrar o conceito.

    Imagine que uma pessoa lhe tenha apresentado desculpas por um determinado

    incômodo. Essa pessoa teria discursado por um longo tempo, mas, ao fim e ao

    cabo, não teria dito nada que de fato reparasse o problema. Você poderia

    descrever a tediosa conversa com essa pessoa dizendo algo como “Fulano

    falou, falou, falou e não disse nada”. Ora, nessa frase a repetição do verbo

    “falar” é praticamente um ícone, isto é, um representação evidente do fato

    de a pessoa ter falado repetidamente. Trata-se, portanto, de uma forma (um

    verbo repetido) que com clareza reflete a sua função (indicar a repetição de

    um ato). Outro exemplo de iconicidade é o alongamento de vogais, que

    podemos usar numa determinada palavra quando queremos enfatizar o

    tamanho ou a duração de algo. Se você quer dizer que alguma coisa é

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    KENEDY, E. Linguagem, sociedade e cognição. In: PAES, R,. (Org.). Língua, uso e discurso:

    entremeios e fronteiras. 1ªed. Rio de Janeiro: Editora da UESA, 2013, v. 1, p. 5-34.

    exageradamente grande, pode dizer algo como “Era muito

    graaaaaaaaaaande”. Mais uma vez, a forma (alongamento da vogal) reflete

    claramente sua função. Também no plano do léxico, na relação entre

    significante e significado, existem casos de iconicidade. Trata-se das famosas

    onomatopeias, palavras cuja forma se assemelha ao conteúdo representado.

    Por exemplo, a forma “tique-taque” possui uma expressão fonética parecida

    com o som das batidas de um relógio. Da mesma maneira, “miar” é um verbo

    inspirado na forma acústica do miado dos gatos e “tim-tim” é um substantivo

    que iconicamente representa o som produzido pelo rápido toque entre taças

    quando se faz um brinde.

    As relações icônicas entre forma e função são bastante regulares, tanto

    que há muitos estudiosos, não por acaso denominados como  funcionalistas,

    que defendem a ideia segundo a qual as formas existentes nas línguas em

    grande medida refletem as funções a que se destinam. A motivação funcional

    para a existência de certas formas pode ser, de fato, encontrada em todos os

    domínios de uma língua, tal como vemos nos seguintes exemplos do

    português:

      fonologia - pense na palavra “sussurrar”, que se parece com os sons

    emitidos quando alguém su... ssu... rra; 

      morfologia - pense, por exemplo, nas palavras compostas como “saca-

    rolha”, “guarda-roupa”, cujas funções são rapidamente dedutíveis pela

    análise de suas formas constituintes;

      semântica - lembre-se de expressões como “pé-da-mesa” ou “braço da

    cadeira”, que transferem para objetos a estrutura do corpo humano e,

    assim, iconicamente permitem a codificação formal de suas funções;

      sintaxe – tal como se vê na famosa sequência atribuída ao romano Júlio

    César: “Vim, vi e venci”, que reflete de forma icônica a sequência

    temporal com que os atos se deram: o general primeiro veio, depois

    viu, para enfim vencer . 

    Se você está curioso para saber quem vence a batalha entre analogistas

    e anomalistas, saiba que temos aqui um empate técnico. As línguas humanas

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    KENEDY, E. Linguagem, sociedade e cognição. In: PAES, R,. (Org.). Língua, uso e discurso:

    entremeios e fronteiras. 1ªed. Rio de Janeiro: Editora da UESA, 2013, v. 1, p. 5-34.

    estão repletas de casos claros de arbitrariedade e casos evidentes de

    iconicidade. Ambos os fenômenos são encontrados em todas as línguas quando

    cotejamos formas e funções. Com efeito, a análise mais interessante que os

    cientistas da linguagem vêm apresentando ao longo dos últimos anos é

    interpretar a relação entre arbitrariedade e iconicidade numa espécie de

    continuum, isto é, como uma sequência gradual de várias etapas que separam

    um extremo de arbitrariedade, de um lado, e um extremo de iconicidade de

    outro – mais ou menos como representamos a seguir:

    [+ icônico]  [+/- icônico]  [+/- arbitrário]  [+ arbitrário].

    Sendo assim, não devemos pensar que as relações entre forma e função

    numa língua sejam sempre uma questão de tudo ou nada, ou temos

    arbitrariedade ou temos iconicidade. A escalaridade parece ser uma boa

    chave para entendermos a dualidade  forma  e  função. Pense, por exemplo,

    que no uso de uma língua como o português podemos deslizar rapidamente da

    forma dos substantivos para a forma dos adjetivos, a depender da função de

    um item no interior de um contexto sintático. Vemos isso acontecer na

    célebre citação de Memórias Póstuma de Brás Cuba, de Machado de Assis: em

    [um autor defunto], “autor” é substantivo e “defunto” é adjetivo, mas em

    [um defunto autor], “defunto” é substantivo e “autor” é adjetivo. Do mesmo

    modo, formas como “furado” podem ser analisadas como adjetivos ou como

    verbos (na forma de particípio) a depender de sua função na frase, tal como

    vemos acontecer em “isso é papo  furado” versus  “a roupa foi  furada  pelo

    alfinete”, respectivamente. Na verdade, mesmo certas formas verbais, a

    depender de sua função na frase, podem ser reanalisadas como substantivos,

    tal como acontece na expressão “sala de jantar ”.

    Em suma, você deve ter em mente que a gradiência no mapeamento

    entre formas e funções linguísticas ocorre de maneira generalizada tanto no

    léxico quanto na gramática de uma língua. 

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    KENEDY, E. Linguagem, sociedade e cognição. In: PAES, R,. (Org.). Língua, uso e discurso:

    entremeios e fronteiras. 1ªed. Rio de Janeiro: Editora da UESA, 2013, v. 1, p. 5-34.

    A linguagem humana em ação

    Para finalizarmos este capítulo, passemos a descrever e analisar alguns

    fenômenos sociocognitivos que ganham vida todas as vezes em que colocamos

    a língua em ação nas inúmeras tarefas comunicativas e interacionais de nossa

    vida cotidiana. Antes de mais nada, devemos explicitar que existem duas

    modalidades fundamentais no uso da linguagem humana: a produção e a

    compreensão. Além disso, não podemos nos esquecer de que, em sociedades

    letradas, como é o caso da maior parte das comunidades brasileiras, a língua

    pode se realizar pelo canal oral ou pelo canal escrito. Sendo assim, as quatro

    habilidades sociocognitivas envolvidas no uso de uma língua natural são a

    produção oral, a compreensão oral, a produção escrita e compreensão escrita.

    Comecemos pela produção linguística. Essa habilidade demanda do

    falante (ou do escritor) uma séria de tarefas cognitivas que se articulam

    dinamicamente com o contexto social da interação linguística. Por exemplo,

    para produzir a fala (ou a escrita), uma pessoa deve primeiramente selecionar

    de sua memória de longo prazo os itens lexicais que expressarão os conceitos

    que se deseja veicular no ato de linguagem. Essa seleção de palavras na

    mente é o que os psicolinguistas chamam de  planejamento de fala  ou

     planejamento conceitual. Durante tal planejamento, o sujeito que produz o

    ato linguístico se vê motivado a dizer certas coisas a seus interlocutores e é

    essa intenção de dizer que faz com que certos itens lexicais sejam

    selecionados e colocados em estado de ativação em sua memória de trabalho.

    Uma vez ativados e disponíveis na mente, tais itens são acessados pelo

    sistema combinatório da linguagem humana e, então, são arranjados

    sintaticamente entre si, de maneira ordenada e regida por regras. Dessa

    combinação regrada, resultam as frases que fazem emergir o texto do falante,

    o qual se realiza concretamente por meio da articulação fonética (pronúncia)

    que projeta as ondas sonoras que chegarão ao sistema auditivo dos

    interlocutores. Esquematicamente, podemos representar a produção

    linguística oral pela sequência ilustrada a seguir.

    Plano Conceitual  Seleção Lexical  Combinação Sintática  Expressão Fonética

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    KENEDY, E. Linguagem, sociedade e cognição. In: PAES, R,. (Org.). Língua, uso e discurso:

    entremeios e fronteiras. 1ªed. Rio de Janeiro: Editora da UESA, 2013, v. 1, p. 5-34.

    Você deve ter notado que acabamos de descrever a produção da fala

    fazendo com que ela parecesse semelhante à produção da escrita. Pelo que

    sugerimos, a diferença entre essas duas modalidades residiria no simples fato

    de que, na escrita, usaríamos grafemas para representar a expressão fonética

    do texto. No entanto, essa descrição é, na verdade, uma supersimplificação.

    De fato, a produção oral é muito diferente da produção escrita. De uma

    maneira bem resumida, podemos dizer que as pessoas, quando escrevem,

    estão muito mais conscientes do uso que fazem da linguagem, sendo, por isso

    mesmo, bem mais atentas e vigilantes tanto em relação ao que dizem, como

    em relação a como dizem. Ora, essa tomada de consciência e essa vigilância

    comuns na produção escrita estão em flagrante contraste com a caráter mais

    espontâneo e automático da fala natural. Não é por outra razão que a escrita

    fluente, típica das pessoas bem escolarizadas e treinadas nessa arte, demanda

    muitos anos de aprendizado formal, desde a alfabetização até o letramento

    profundo na vida adulta. Por sua vez, a produção fluente da fala emerge já

    em crianças bem pequenas e se torna visível em qualquer conversa oral entre

    humanos, independente da escolarização ou do letramento dos sujeitos

    falantes. Portanto, atente para  essa ressalva: apesar de os mecanismos

    básicos envolvidos na produção oral e escrita serem semelhantes, falar e

    escrever são fenômenos sociocognitivos dramaticamente diferentes.

    No eixo da compreensão linguística, o ouvinte (ou leitor) deve perceber

    as formas manifestadas no sinal da fala (ou da escrita) de seu interlocutor

    para então acessar, em sua memória de longo prazo, os conteúdos por elas

    evocados. Podemos dizer que a compreensão é o espelho invertido da

    produção. Vejamos por quê. Na produção linguística, começamos com um

    plano conceitual. Esse plano nos leva a dizer certas coisas por meio de dadas

    palavras, as quais são inseridas nas frases que conduzem os textos. Já na

    compreensão da linguagem, tudo começa pela detecção, nos textos, dos

    elementos do ato linguístico, tais como frases e palavras. É com base na

    identificação desses elementos que se torna possível compreender o plano

    conceitual e os valores comunicativos que moveram a produção do

    interlocutor. Vemos a sequência das etapas da compreensão linguística

    representada no esquema seguinte.

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    KENEDY, E. Linguagem, sociedade e cognição. In: PAES, R,. (Org.). Língua, uso e discurso:

    entremeios e fronteiras. 1ªed. Rio de Janeiro: Editora da UESA, 2013, v. 1, p. 5-34.

    Percepção Fonética  Análise Sintática  Identificação Lexical  Representação Conceitual

    Mais uma vez, as semelhanças entre oralidade e escrita estão aqui

    exageradas. No caso, a especificidade da compreensão da escrita diria

    respeito, de maneira muito simplificada, apenas à decodificação ortográfica

    (leitura) que faria as vezes da percepção fonética. Na realidade, porém, a

    compreensão linguística pela leitura é muito mais complexa do que o esquema

    acima sugere. Infelizmente, não podemos tratar de tantos detalhes no espaço

    limitado deste capítulo, mas, se você estiver interessado em compreender as

    minúcias que diferenciam oralidade e escrita, sugerimos a leitura do

    excelente livro “Os neurônios da leitura”  (2012), do neurocientista francês

    Stanislas Dehaene.1 

    Para sintetizar o que acabamos de  dizer sobre a produção e a

    compreensão linguística, a figura a seguir parece ser um bom recurso

    didático. Nela, vemos representado o que se conhece como circuito da fala.

    Note que as setas que correm da esquerda para a direita indicam que o “plano

    conceitual” presente na mente de A é transformado na informação linguística

    veiculada para B. Por sua vez, B recebe essa informação linguística e

    rapidamente consegue interpretar os conceitos ali representados. A figura é

    interessante também porque nela podemos perceber que a produção e a

    compreensão da linguagem são automaticamente intercambiáveis no fluxo da

    fala normal. Pelas setas que correm da direita para a esquerda, notamos que

    agora é B quem produz a informação linguística que será veiculada para A.

    Figura 1: o circuito da fala (adaptado de Saussure, 1916: p. 19)

    1 No presente capítulo e também ao longo do livro de Dehaene, são deliberadamente deixadas de lado

    todas as questões socioafetivas, sociointeracionais e político-ideológicas que entram em ação sempre

    que usamos a linguagem, tanto para a produção, quanto para a compreensão linguística. Você terá aoportunidade de estudar as questões sociológicas imbricadas nos usos da linguagem noutros capítulos

    deste livro.

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    KENEDY, E. Linguagem, sociedade e cognição. In: PAES, R,. (Org.). Língua, uso e discurso:

    entremeios e fronteiras. 1ªed. Rio de Janeiro: Editora da UESA, 2013, v. 1, p. 5-34.

    Na dinâmica da produção e da compreensão da linguagem, o

    intercâmbio de posições entre aquele que fala e aquele ouve dá origem ao

    fenômeno conhecido como enunciação. A enunciação deve ser compreendida

    como o ato de criação de um enunciado linguístico. Na enunciação, a pessoa

    que produz a fala (ou a escrita) é o enunciador –  a primeira pessoa do

    discurso. Já a pessoa que compreende a fala (ou a escrita) é o enunciatário – a

    segunda pessoa do discurso, a quem a fala (ou a escrita) se destina.

    Chamamos de terceira pessoa, ou de não-pessoa - num termo interessante

    formulado pelo linguista francês Émile Benveniste (1902-1976) -, os objetos e

    as pessoas sobre os quais falamos (ou escrevemos) durante a enunciação.

    Em termos linguísticos e comunicativos, é interessante notar que a

    enunciação explicita, na produção da linguagem, as chamadas  pessoas do

    discurso. Os  pronomes pessoais, que você certamente conhece das aulas de

    português na escola básica, são, justamente, categorias linguísticas que

    indicam a figura da primeira pessoa (eu, nós), da segunda pessoa (você, vocês)

    e da terceira pessoa (ele, ela, eles, elas e todas as expressões referenciais,

    como os substantivos). É com base na existência do enunciador, do

    enunciatário e dos referentes do discurso, que diversas expressões linguísticas

    são colocadas sob perspectiva durante a enunciação. Por exemplo, pronomes

    como [meu/minha/nosso/nossa] indicam a  posse  de algo em relação à

    primeira pessoa do discurso, enquanto pronomes como [seu/seus/sua/suas]

    indicam a posse relativa à segunda pessoa e expressões como

    [dele/deles/dela/delas] denotam a posse da terceira pessoa. Na verdade,

    mesmo o espaço ocupado pelas pessoas do discurso é posto em perspectiva

    durante a enunciação. Assim, termos como [aqui/este] indicam o espaço da

    primeira pessoa, enquanto [aí/esse] denotam o espaço da segunda pessoa e

    [lá/aquele] apontam o espaço do referente, o lugar da terceira pessoa.

    De maneira muito interessante, o próprio tempo que utilizamos quando

    produzimos e compreendemos a linguagem só assume alguma interpretação

    coerente quando é colocado sob perspectiva durante a enunciação. Desse

    modo, sabemos que [ontem] é um termo que denota um momento anterior ao

    tempo da enunciação, ao passo que [hoje] indica o momento que coincide

    com a criação do enunciado, enquanto [amanhã] marca um tempo futuro, que

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    KENEDY, E. Linguagem, sociedade e cognição. In: PAES, R,. (Org.). Língua, uso e discurso:

    entremeios e fronteiras. 1ªed. Rio de Janeiro: Editora da UESA, 2013, v. 1, p. 5-34.

    acontecerá depois de a enunciação ter sido concluída. Se você se lembrou da

    piada do bar “Fiado só amanhã”, já poderá agora explicar por que esse dizer,

    na prática, torna a venda a crédito impossível: sempre que a pessoa lê o

    aviso, a enunciação desloca para o dia seguinte a possível venda. Mas, no dia

    seguinte, uma nova leitura do aviso cria uma nova a enunciação e isso faz com

    que o “amanhã” seja novamente deslocado para o dia posterior – e assim por

    diante, ad infinitum.

    Para que você tenha uma boa noção de como  pessoa, espaço e tempo 

    são categorias linguísticas cujas referência e interpretação dependem

    crucialmente da enunciação, imagine que você esteja andando pelo centro de

    sua cidade quando, de repente, encontra um bilhete que flutua em sua

    direção. Como pessoa curiosa, você abre o bilhete e encontra a seguinte

    mensagem: “Eu estive aqui hoje.”  Ora, você será capaz de compreender o

    significado básico dessas expressões (afinal, é possível depreender do bilhete

    que “alguém esteve em algum lugar, em algum dia”), mas não será possível

    identificar o sentido do enunciado, justamente porque você não participou da

    enunciação – e, portanto, não conseguirá encontrar o referente da primeira

    pessoa (eu), nem poderá deduzir o lugar (aqui) que ela ocupava ao produzir o

    bilhete, tampouco descobrirá qual foi o tempo presente (hoje)  naquela

    enunciação. Algo totalmente diferente aconteceria se o bilhete contivesse

    uma frase como “A presidente Dilma esteve na Prefeitura do Rio de Janeiro

    em 04 de maio”. Nesse caso, a identificação referencial da pessoa, do espaço

    e do tempo do enunciado não é totalmente dependente do contexto

    estabelecido na enunciação. Sabemos apenas que a produção dessa frase

    ocorreu depois da visita da Presidente à Prefeitura –  e deduzimos isso em

    função do tempo verbal passado expresso em “esteve”. 

    Das pessoas do discurso que são acionadas sempre que usamos a

    linguagem para a produção e a compreensão, a mais curiosa em termos

    científicos é a terceira. Como dissemos, a terceira pessoa é, na verdade, a

    não-pessoa, isto é, é a ausência da primeira e da segunda pessoas. Trata-se do

    referente ou dos referentes discursivos de um dado uso da língua. O já citado

    linguista Roman Jackobson havia destacado a existência da não-pessoa ao

    batizar com o termo “referencial” a função da linguagem que privilegia a

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    KENEDY, E. Linguagem, sociedade e cognição. In: PAES, R,. (Org.). Língua, uso e discurso:

    entremeios e fronteiras. 1ªed. Rio de Janeiro: Editora da UESA, 2013, v. 1, p. 5-34.

    terceira pessoa como o referente do discurso. A função referencial é muitas

    vezes considerada a mais proeminente dentre as funções da linguagem, já que

    os humanos tipicamente usam a língua para falar do mundo, seus objetos,

    ações e pessoas. Todavia, a proeminência da “função referencial” pode nos

    passar a falsa ideia de que a linguagem humana, quando colocada em ação,

    seja essencialmente referencial. É bem verdade que muitos usos linguísticos

    são objetivos, isto é, focam-se no objeto (terceira pessoa) de maneira

    puramente referencial, entretanto, uma grande parte da experiência

    linguística humana é metafórica. Vejamos o que isso quer dizer.

    Nossa tradição escolar se  esforça para nos fazer crer que o uso

    cotidiano e comum da linguagem seja referencial, isto é, somos ensinados

    que, quando produzimos e compreendemos a fala e a escrita, fazemos

    referências a coisas e pessoas de maneira mais ou menos objetiva. A

    linguagem metafórica, nos ensinam, seria característica dos usos linguísticos

    mais elaborados e artísticos, como a poesia e os romances. Essa ideia é

    reforçada quando, na escola, estudamos as “figuras de linguagem” e ficamos

    com a impressão de que elas só acontecem nos textos literários. A bem da

    verdade, o uso metafórico da linguagem não é exclusividade da arte. Com

    efeito, todos os seres humanos comuns, no dia a dia, também utilizam

    metáforas ao produzir enunciados linguísticos. Por exemplo, quando dizemos

    alguma coisa como “Decidirei se vou casar ou não só mais à frente ao longo da

    minha vida”  estamos fazendo referência a uma realidade temporal (a

    passagem da vida) por meio de uma categoria espacial (a localização no

    espaço, “à frente”). Quando produzimos frases assim, estamos na verdade

    cruzando domínios de sentidos para fazer referência às coisas que queremos

    dizer. No caso do exemplo, estamos transferindo propriedades do espaço para

    fazer referência à noção de tempo. Ora, é precisamente esse o princípio de

    toda a linguagem metafórica: a transferência de domínios de significados.

    A linguagem metafórica é, na verdade, generalizada nos usos

    linguísticos. Podemos dizer que ela é a regra, e não a exceção, quando

    produzimos e compreendemos a linguagem humana. Um uso de linguagem

    estritamente objetivo e referencial é raro. Só o encontramos em abundância

    no discurso científico das áreas da natureza, como a física, a química e a

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    KENEDY, E. Linguagem, sociedade e cognição. In: PAES, R,. (Org.). Língua, uso e discurso:

    entremeios e fronteiras. 1ªed. Rio de Janeiro: Editora da UESA, 2013, v. 1, p. 5-34.

    biologia. Mesmo noutras áreas da ciência, como a economia, encontramos

    fartos exemplos de linguagem metafórica em frases como “O mercado está

    aquecido”, “Os preços estão nas alturas”, “Esperamos uma queda brusca na

    taxa de juros” etc. Para os cidadãos comuns, em seu cotidiano linguístico, a

    metáfora é muito mais do que uma mera figura de estilo: ela é um produtivo

    recurso natural de pensamento e de linguagem.

    Para concluir

    Neste primeiro capítulo, começamos nossa pequena incursão pelo

    fantástico e complexo mundo da linguagem humana. Aprendemos aqui

    diversos conceitos importantes, como a diferença entre linguagem e língua, a

    distinção entre Língua-i e Língua-e, as noções e as fases da aquisição da

    linguagem, a oposição entre formas e funções linguísticas e os fundamentos

    da linguagem em ação. Nosso objetivo ao longo do capítulo foi apresentar a

    você uma visão panorâmica dos principais temas e figuras do estudo científico

    da linguagem que tem em conta a interação dinâmica entre sociedade e

    cognição. Você terá boas oportunidades de ampliar seus conhecimentos sobre

    o assunto ao consultar os vídeos e os livros que indicamos ao longo das seções.

    Nos próximos capítulos deste livro, você entrará em contato com

    muitas outras facetas da linguagem humana. Com efeito, as línguas naturais

    são um dos fenômenos mais complexos do mundo biocultural. Não é por outra

    razão que seus fundamentos serão apresentados a você em diversos capítulos,

    os quais selecionam, para o debate, diferentes dimensões do universo

    linguístico humano. Desejamos a você boas leituras e bons estudos!

    Referências bibliográficas

    CHOMSKY, N. O conhecimento da língua. Sua natureza, origem e uso. Lisboa:Caminho, 1986.

    DEHAENE, S. Os neurônios da leitura. PA: Pense, 2012.

    PINKER, S. O instinto da linguagem: como a mente cria a linguagem. SP:

    Martins Fontes, 2003.

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    KENEDY, E. Linguagem, sociedade e cognição. In: PAES, R,. (Org.). Língua, uso e discurso:

    entremeios e fronteiras. 1ªed. Rio de Janeiro: Editora da UESA, 2013, v. 1, p. 5-34.

    SAUSSURE, F. Curso de linguística geral. SP: Cultrix, 1916 (ed. 2004).

    WERMKE, K. et al. Cry Melody in 2‐Month‐Old Infants With and Without Clefts.The Cleft Palate-Craniofacial Journal: Vol. 48, No. 3, 2011. pp. 321-330.