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CHRONICA SEMANAL R EDICIOA POR UMA SOCIEDADE O "H O MENS SEM L.ETTRA3 PROPRIETARIO - H UMBERTO .$. PXNTO CORRE SPONOtHC IA Á LIVRARIA POPU LAR , R, AUGUSTA , 222 - l.. I SBOA lPlUXI X..XCA• S )(l: ÁN Q'l(J)Q:ol.r' K"A.S•lFlEXX•A.S PREÇO POR UMO OU 62 R." l&oOO IS - CIDA M. ' 20 RbS ANNO :Lº li LISBO .\, t8 DE DEZ EMBR O DE tm _j( NÚMER9 CHRO NI CA DA SE MANA su."""'"'º -A sessão rC3l dn abc:rtur.i dns c6rtes- Rcpublicas-Falta de policia. est ão abertas as côr tes consti- tuintes e vae começar a disc ussão das re- fo rmas politica s. A sessão da abe rt ura foi muito concorri da e observaram-se n 'ella as formalidades do estylo, que nos dispensamos de mencionar, porque trou- xemos d'alli uma unica impressão, a impressão desagradavel da pobreza de decorações e do as- pecto de miseria, que ofTerece a sala do parla- mento nacional. Não conhecemos nada mais pelintra do que t udo aqui ll o, desde as passadeiras da escad a, até as alcatifas dos co rr edores, que dão ingresso para a sala d as sessões, onde mais sens ivel se torna o descon fo rto, onde mais avu lta a po bre- za e onde se mani festa a miseria nas desbotad as sedas do doce( e das cor tinas . Entre o luxo e a i ndigencia ha o meio ter mo do aceio e esse meio termo é o que nós reclama- mos em nome do decoro nacional e cm nome da significação da palavra - parlamento-e em nome dos actos solemnes, que alli se praticam, t ão solemnes, que exigem exterioridades, que imponh am o r espe ito que se deve ao sanctuario d as le is . É necess ario refor ma r a qu illo tudo. Vão re- fo rmar -se alg uns artigos da ca rta, reforme-se ta mbem a sala elas sessões, refor me-se o ed ifi cio FUZILEIRO ABYSSINIO

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CHRONICA SEMANAL R EDICIOA POR UMA SOCIEDADE O "HO MENS SEM L.ETTRA3

PROPRIETARIO - H UMBERTO .$. PXNTO CORRE SPONOtHC IA Á L I VRARIA PO PU LAR , R , A U GU STA , 222 - l..I SBOA

lPlUXIX..XCA•S )(l: ÁN Q'l(J)Q:ol.r'K"A.S•lFlEXX•A.S

PREÇO POR UMO OU 62 R." l&oOO RÍIS - CIDA M.' 20 RbS

ANNO :Lº li LISBO.\, t8 DE DEZEMBRO DE tm _j(NÚMER9 ~

CHRONICA DA SEMANA

su."""'"'º -A sessão rC3l dn abc:rtur.i dns c6rtes­Rcpublicas-Falta de policia.

F1NA1..~1ENTE: estão abertas as côrtes const i­tuintes e vae começar a discussão das re­fo rmas politicas.

A sessão da a bertura foi mu ito concor rida e observaram-se n 'ella as formalidades do estylo, que nos dispensamos de mencionar, porque trou­xemos d'alli uma unica impressão, a impressão desagradavel da pobreza de decorações e do as­pecto de miseria, que ofTerece a sala do parla­mento nacional.

Não conhecemos nada mais pelintra do que tudo aqui llo, desde as passadeiras da escada, até as alcatifas dos corredores, que dão ingresso para a sala das sessões, onde mais sens ive l se to rna o desconforto, onde ma is avulta a pobre­za e onde se manifesta a miseria nas desbotadas sedas do doce( e das cor tinas.

Entre o luxo e a indigencia ha o meio termo do aceio e esse meio termo é o que nós reclama­mos em nome do decoro nacional e cm nome da significação da palavra - parlamento-e em nome dos actos solemnes, que alli se praticam, tão solemnes, q ue exigem exterioridades, que imponham o respeito que se deve ao sanctuario das le is .

É necessario reformar aqu illo tudo. Vão re­formar-se a lg uns artigos da carta , reforme-se ta mbem a sala elas sessões, reforme-se o ed ificio FUZILEIRO ABYSSINIO

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A ILLUSTRAÇÃO POPULAR

interiormente e se não podêmos dispeader o nccessar io para termos um cdificio como o da ca· mara dos pares, ao menos façam-se as obras in· dispensa veis para que fique decente e d ecoroso .

Não somos exigentes, pedimos apenas o quanto baste para nos livrar da vergonha, que elevemos sentir, quando qualquer cstangeiro ap­pareça nas tribunas para assistir a uma secção parlamentar.

_\ economia não pôde ir tão longe que nos obrigue a parecer ridículos.

X ·/~epublicJs ! t um nome de baptismo litte­

rario e político, que nos agrada, quando a fe do ncophito é garantida por um padrinho que se chama T homaz Ribei ro.

f~ um semanario ele combate, que escolheu o ponto arriscado entre as alas aguerridas dos ini­migos da liberdade e da monarchia, em que ju· rou bandeiras o denoclaclo carnpeüo, com apra· zirnento dos proprios inimigos, que sabem ter n'elle ad,•ersario tüo leal corno esforçado.

Saudamos com prazer o aparecimento das Rep11blic:is, porque ternos a certeza de que o seu syrnpatico prograrnma político hadc ser religio­samente cumprido e ele qu..: nunca as paixões particlarias perturbarão a tranquilidade d 'alma do illustrc publicista, que o clictou, o qual na sua vida publica tem dado sobejas provas ela sua il­lustração e magnanim idade.

Sob o ponto ele vista littcrario esta publica· ção não tem advcrsario~, tem só admiradores; não tem quem lhe cli,put..: primazias, só tem quem lhe reconheça os mcritos: não tem quem queira usurpar-lhe a gloria, porque todos adoram o prosador das ]orn:id:is, todos rc~peitam o cantor do {). ]:iyme.

O primeiro numero e um primor. Lê-se de um folcgo e fica-se com pena ele nào ser exten­so, de não ser um grande volume o excellcnte hebdomadario, cm que collaboram os mais dis­t inctos escriptorcs do paiz.

Dem vindo, pois. X

Lisbõa está outra \ºCI. Ín\'adida pela praga das borboletas nocturna~.

São enxames dºcllas por essas ruas e perse­guem os que passam com uma tenacidade, que incommoda.

la rua dos Douradores, por exemplo, é um perigo arriscar-se qualquer a transpôr o quar· t eirào, que medeia entre n trarcssn da Assum­pção e a de St.' j usta.

t uma alu,•ião de noctiv.igas, que cabem so· bre o desgraçado transeunte, que não consegue com facil idade livrar-se cl 'cllas.

Pedimos á policia p rovidencias contra o facto e peclimol-as c m nome da mo ralidade e da dc­ccncia.

Não se pódeconscntir uma desvcrgonha d'csta ordem, nem se cornprchcndc, corno no centro mais populoso e concorrido da capital se toleram os cscandalos, que se praticam com uma desfa­çatez, que vexa os que os prcsencciam e dcsau­torisa a policia, que os não cohibe.

O sr. governador civil e os dignos commis­sarios de policia de certo ignoram isso; mas é necessario que o saibam para providenciarem, como lhes cumpre, porque e intolcravel o abuso, com que aquellas desgraçadas se di rigem a quem passa, se reunem cm grupos, que estacionam nos portacs e nos passeios, e convertem a baixa cm burgo de toleradas.

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DESCRIPÇÃO DAS NOSSAS GRAVURAS

ANOSSh primeira gra,·ura representa um/it{Í­

lciro abyssinio. A maior parte dos auctores collocam

os ab_yssinios na raça b ranca e na farn ilia semi­tica.

Esta opinião é fundamentada, apesar ele que a raça abyssinia actual é um producto do cruza­mento de duas raças, que segundo o doutor Ruppcl constituem dois typos principaes-o ara­bc e o negro. Os abyissinios pertencentes ao pri­meiro grupo (o arabe) possuem bcllas fórmas e nas feições e na expressão da physioaomia parecem-se com os Beduínos. Rosto oval, nariz delgado e bem contornado, bocca graciosa com labios finos, olhos vivos, den tes formosos e ca­bellos um pouco fri zados, e uma estatura bem proporcionada são os caracteres d istinctivos que carectcrisam os habitantes das elevadas monta· nhas de Samcn e dos valles que cercam o lago T czana.

Os abyssinios do segundo grupo dcstinguem­sc pelo nariz menos afilado, pelos olhos rasga­dos lateralmente e pouco animados, pelos ca­bcllos muito encarapinhados, quasi lanosos e por tal modo espessos que se mantcem levan­tados na cabeça.

Este g rupo habita a província de 1 lamasem e outras regiões visinhas da fro nte ira austral da Abyssin ia .

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A ILLUSTRAÇÃO POPULAR

O exercito abyssinio eleva-se a quarenta mil homens. divididos cm dilfcrcntcs armas.

A nossa gravura representa um fuzileiro. X

A nossa segunda gravura representa um sa­lão de uma casa da ,\rmenia.

A Armcnia é um paiz privilegiado, não só pelas suas condições climatericas, como pela fcrtiliclacle cio seu solo.

Os cereaes, os vinhos, as fructas, o tabaco e o algodão dão abundantes colheitas.

Nas montanhas encontram-se jazigos ele ou ro, de prata, ele cobre, ele ferro e ele chumbo, mas estes jazigos tcem sido pouco explorados. Os ca­val los ela Armenia passam por ser os melhores ela Asia Occidcntal. i\ cochon ilha, p roducto im­po rta nte d'cstas regiões, vive em grande quan­tidade ao pé cio monte Ararat. N'estc paiz ha cxcclle ntc maná e a ílora armen ia é rica cm va­riedades.

O caractcr dos povos da Armenia é alfavel, hospitaleiro, grave e intelligcntc e na maior parte vivem com invcjaveis commodidades e meios de conforto appctcciveis.

X A nossa terceira g ravura apresenta uma tenda

de arabes nomadas. Os arabes distinguem se pelo perfil alon­

gado, pelo nariz aquilino, pela linha das maxi­las um pouco reentrante, pela bocca pequena, pelos dentes bem dispostos, pelos olhos um pou­co cavados, pela elegancia das fórmas, pelo apu­rado dos sentidos, pela intelligencia brilhante e pelos sentimentos profundos e perseverantes.

Todos esses caracteres manifestam uma ver· dadeira e notavcl superioridade sobre todas as raças, e o barão J,arrey encontrou essa superio­ridade até na conformação c raneana e no desen­volvimento d;is circumvoluções do cerebro, na consistcncia dos nervos, nc. aspecto da fibra mus­cular e do tecido ossco, r>a regularidade e desen­volvimento do coração e cio systema arterial.

Os arabcs ou vivem em tribus sedentarias, como os cultivadores, ou são nomadas, como os pastores.

Os beduínos, filhos do deserto, são ageis, sobr ios, valentes, e apesar de franzinos, suppor­tam com faciliiiade as fadigas e as privações da sua vida errante.

Os agricultores ou fchles são mais altos e de uma apparencia mais robusta. Os primeiros tcem um ar desconfiado e feroz.

X

A nossa ultima gr:l\•ura representa um joven principe de Siam.

O reino de Siam tem cinco milhões de ha­bitantes.

Os siamezcs, segundo os apontamentos de viagem de.\\. llenri de .\\ouhot, naturalista fran· cez, conhecem-se sem clilliculdade pelo seu an­dar desleixado e preguiçoso e pela sua physio­nomia servil.

Téem quasi todos o nariz achatado, as ma­çãs do rosto sal ientes, o olhar sem intelligencia, narinas la rgas, a bocca grande, os labio!. ensan­guentados pelo uso do bctcl e os cientes negros como o ebano. Usam a cabeça completamente rasgada exceptuando o alto da cabeça, onde dei­xam crescer uma especie de penacho.

Os cabcllos são pretos e asperos. Os siamezes adoram as joias, e com quanto

que brilhem, pouco lhes importa que sejam lisas ou falsas.

O filho do rei anda de tal modo carregado, que o pezo das joias é superior ao do corpo.

~~-~:EE-r-~~~-

CARTEIRA UTIL

A LO:--cEv10AoE depende de causas indepen­dentes da vontade do homem e de causas absolutamente sobordinadas ao seu liHe

arbi trio e de umas e outras faremos menção para utilidade dos nossos leitores.

As causas independentes são: 1 . • A boa constit11iç:io. Elia é a base princi­

pal sobre que repousa a longevidade; porque ella por s i só imprime ao organismo essa força de resistencia vital, que se oppõe á consumpção dos orgãos.

2 .• A lur111011ia entre todas as funcções orga-11icas, e principa lmente aqucllas sobre as quaes repousa a vida, isto é a innervaçào, a circula­ção e a respiração e conseguintemente o preen­chimento regula r elas outras funcções, por meio das quaes a vida se conserva e se sustenta, como são as funcções nutritivas (digestão e nutriçüo) e finalmente a regularidade das que conservam a saude, ás quaes se chama funcções depurativas.

3.• q'{egularidade do desenvolvimento phisico. Esta reconhecido que os indivíduos que crescem lentamente e de uma maneira regular, sem aba­los nem crises notaveis de saude, sobre tudo quando a estatura é mediana, nem muito aca­nhada, nem muito desenvolvida, têem proba­bilidades de durar mais que os que nasceram

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A ILLUSTRAÇÃO P OPULAR

rachiticos ou se desenvolvem extraordinaria­mente.

A p:itria. Esta circumstancia, que depen­de cm parte da vontade do homem é, em ge­ral, favoravel ou desfavoravel â longevidade; porque o homem não chega a edade avança­da nos climas da zona torrida, nem tão pou­co na gel ida circumfusa dos paizes polares: to­davia encontram-se mais velhos nas regiões do norte, do que nas meridionaes, como a Italia e a

desde que o homem subjei ta os seus instinctos â razão, conserva a harmonia do phisico e do moral, sobre os quaes repousa a saude, e por tanto a duração da vida.

2.0 O soccf!O do espirito. E' facil de apreciar a influencia que t~em na duração da vida a con­sciencia tranquilla, os costumes puros e as do­ces emoções da família; porque tudo isso con­corre para desenvolver a actividadc das func­ções vitaes e irradiar cm todo o organismo esse

SALÃO D'UMA CASA NA ARMl::N IA

1 lespanha. Po r exemplo no norte da Ing laterra, na Escossia, na Succia e na Noruega, ha exem­plos e numerosos de individuos, que chagaram aos 110 annos e mais.

í-:ntre as causas de longevidade, que depen­dem absolutamente do homem, mencionaremos as seguintes:

1 .º . '\ harmonia entre o pliisico e o mornl. Essa harmonia resulta dos princípios de uma boa edu­cação até á puberdade, desde a puberdade até â edadc viril e desde a edade viril até â velhice e resume·sc no uso regular e com·eniente, que o homem faz das duas faculdades essenciaes, que possuc, a iotcligencia e o senso moral; porque

principio de energia e de força , que sustentam a saude e robustecem a vida.

'3 ·º O exercicio regular e com1enicnle das for­ças e das j:iculdades.

É pelo exercício das suas funcções organicas que o homem dispcndc a somma de vitalidade, que recebeu e e facil de provar que o organismo se gasta na porporçào da actividade.

l~ pois ncccssario regularisar o exercício das funcções organicas de modo que o organismo se não gaste inutilmente, ou antes de tempo, e só assim podemos chegar a essa edade provecta, a que chegaram nossos avós, os quacs, por uma regularidade de habitos, contrahidos pela educa-

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A ILLUSTRAÇÃO POPULAR 197

ção e impostos pelo uso do tempo em que vive­ram, chegaram á senilidade, sem os achaques que que nós contraimos na mocidade, pelos exces­sos que praticamos e pelas irregularidades de que fazemos norma de vida.

poesia espiritualista, ungidos de caridade evan­gelica, entretecidos de naturalismo, passa todo um mundo de visões luminosas a desdobrar oo azul as brancas azas de cysne.

O seu inspirado e casto lyrismo manifesta-se arrancando·nos ao temperamento emint:ntemente realista, á plastica tangivel, para nos levar a ai-

TENDA D'ARABES NOMADAS

MINIATURAS

T l-l O MA Z Rll:lEIRO

PARECE que toda a nossa alma se illumina e reflori na madre silva das suas lucidas pri­maveras, quando rei~ os poemas de Tho­

maz Ribeiro. A vasta imaginação, que tem de posse, traos­

luz sempre em suas obras com a opulenta fres­cura de Rubens.

Nos seus livros reavivam-se extinctas memo­rias, reaccendem-se, na chamma latente da sau­dade, a esperança perdida, as illusões desfeitas, a mocidade fugitiva, tudo quanto ha de bom e suavisador.

Ao longo dos seus cantos, repassados de

ma , espontaneamente preza, aos ideaes da es­thetica, á methaphysica translucida, aos ethe­reos platonismos de Miguel ./\ngclo e Dante.

Scintilla nos seus versos, delicadamente la­pidados, o bom e alegre devaneio; palpita n 'el · les uma boa phantazia sonhadora, no azul da qual enxameiam as doiradas chimeras, iriantes, ligeiras como o capricho d'uma meiga adoles· cente, viçosos como um ramalhete de margari­tas, colhidas de madrugada.

Leiamos Thomaz Ribeiro, e esqueceremos Zola, Baudelaire e o pessimista Fitche, ao passo que sentiremos desejos de evocar a theoria de Leopardi n'este mundo extravagante das suas antitheses, coberto de ílôres e de ceus profun­dos e lucilantes.

Effecti1·amente, cada volume que nos trans-

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A ILLUSTRAÇ.\O POPULAR

mitte, elegante, clistincto e perfumado, como alcova nupcial, impregnada de ixonia brion ia, tem a irradiação, a candu ra, o fie profundamente pa­thetico, a pratica relig iosa e a lição moral, que nos accendem o sentimento fervoroso, a incom­paravel vassallagem para todo um desabrocha­mento collossal de crenças, quando as viboras do cynismo se vão enroscando ao coração hu­mano e matam n 'elle lentamente as mais ferteis illusões.

É preciso ser J ob para saber-se, como Tho­maz Ribeiro, um espírito inventivo, organisar resistencia ao esboroamento de todas as fel ici­dades, sem que d 'essa derrocada nüo surja, sob a escuridão cio solTrimento, o phantasma da des­crença.

Deve ter soffrido mu ito o poeta, que hoje apresentamos em miniatura; os seus suspiros descobrem-lhe as tempestades da alma, a resi­gnação, mesmo a candura.

O infinito do sentimento, que elle infiltra no rithmo, deixa advinhar-lhe o genio e os pen­samentos que, o inspiram .

As flores e os passaros, os prados e as fon­tes, os amores c os canticos, as saudad es e o patriotismo, a virtude e a fami lia, os perfumes e os zephyros, os beijos e os abraços, as tran­ças e os labios, tudo o que é bom e grande, como a alegria interior e o ecco da natureza, logram perfumar·lhe a atmosphera inspirativa, t ranspa­rente, onde só ha pureza e sinceridade.

Um deslumbramento! Parece que o poeta bebeu no seio do chris­

tianismo essa paixão febril do Oriente, irradia­da da As ia por todo o orbc; a sua poesia idea­l isa, entristece e dóe como a flor cortada do caule viriden te .

cl1 Delpliina do tJvfa l : !) . J ayme, Vesperas e Sons que passam, além de algumas comedias e poesias soltas, formam o reportorio poetico que todos lhe admiramos.

.\l A:"UEL PLORES.

CORRESPONDENCIA

AGRADECE)!Os aos nossos collegas ela impren­sa o favo r que nos tccm dispensado re­commendando o nosso despretencioso se­

manario e enviando-nos os seus jornaes. Aprovei tamos a occasião de accusar e agra­

decer tambem a recepçâo do exce llente jornal artístico e li tterario a Ga:eta [;\fusical, que entre

as publicações d'aquelle genero se torna distin­cta, não só pela belleza da impressão, como tam­bem pela sclccçüo dos seus ar tigos e especial­mente pela novidade dos trechos ele musica que offercce aos seus assignantcs.

Para firmar os creditos, de que já gosa a Ga­::o_eta ;;\fusical, basta dizer que é dirig ida pela il­lustre professora madame Amann, nome vanta­josamente conhecido no mundo artístico e res­peitado entre nós, que lhe devemos aquelles ma­gnifieos concertos, que fizeram do Passeio Pu­blico o rendez.-vous da alta sociedade lisbonense.

Lisboa.

---Tfi+-

UM CONSELllO BE"1 ACATADO

Quando eu era pequenino, minha mãe me disse um dia. - :"ão ,·cjo, filho. a alegria cm teu rosto scintillar ! Que fizeste dos teus risos das loucuras de <reança, orgulho, jubilo, esperança do nosso modesto lnr? Já não és meu amiguinho; já te custa dar·me um beijo; envergonhas-te, tens pejo, se um ca rinho cu te fize r ! ... - Minha mãe, respondi cu, Se meu pac inda hontem disse que o homem que se sentisse nunca beijava a mulher?! ... - E a santa, na doçura d'um sorriso, dõces gozos mostrou no paraizo.

JoR<a; SA'<DOYAo,.

~~-~~+-~~-

POR U:!v.1: BEIJO

ROMANCE OE ERNESTO CAPENOU

IContinuado d4 numero a1ttectdentet

xm As •ny o;;oot:c ...

- N ÃO, mi~ha s~nhora, res~ondi eu. Nada ha mais seno que a minha resolução.

- O que! Pois deseja deveras mor-rer?

- Desejo . - Pois nada o prende á vida ? -Nada. -Nem o amor, nem uma saudade, nem uma

esperança?

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A ILLUSTRAÇAO POPULAR 199

- Se no meu coração houvesse uma recor­dação, se no meu ccrebro se balouçasse uma es­perança, evidentemente eu não sentiria o tedio da 1·ida e ficaria no mundo para recordar-me e para esperar.

Chega1·amos n'cstc momento a Bale. Eu offereci a mão á marqucza e clla saltou

com rapidez para a gare. -Eis o trem de D. Paco, disse-me ella, in­

dicando-me um elegante caleche, que estaciona­va all i perto. :\leu cunhado está alli com certe­za ...

-Consinta, marqucza, que a acompanhe até lá, disse cu, segurando-lhe o braço, que ella tra­tava de desprender do meu.

./\travessamos o pequeno intervallo, que nos separava da sala de espera . Quando cstavamos perto a marqucza parou e disse-me em voz baixa:

-Prohibo·o de matar-sc.-Prohibo-o, ouve­me bem? Não responde? O senhor disse-me, ha pouco, que para viver carecia de uma recordação e de uma esperança. Pois bem! Eu dou-lhe essa recordação e essa esperança. Ordeno-lhe que viva.

E deixando escorregar o seu braço pelo meu depoz·me na mão aberta um ramo de flores de amyosotis, que uma creança lhe ti nha offereci­do na gare de .\lulhausen.

Fiquei assombrado e senti subir-me em on­das o sangue ao rosto. O peito pareceu-me pe­queno para amparar as pulsações do coração.

- E a esperança? balbuciei eu. J\ marqueza não me respondeu, deixou-me

bruscamente e entrou na sala. Eu segui-a. Um grave personagem, o mesmo que o se­

nhor viu esta noite na opera, dir igiu-se para ella e beijou-lhe a mão.

A marqucza voltou-se para mim. -Alylord, disse clla, tenho a honra de apre­

sentar-lhe meu cunhado o duque ele Sancloval. E, cm quanto cu me inclinava, ella innume·

rou os meus nomes, titulos e qualidades, a D. Paco, que se incl inou lambem.

- Este cavalheiro, continuou clla, apontando para mim, foi meu companheiro de viagem e devo-lhe tantas attenções, que nunca as poderei esquecer.

- Eu irei pessoalmente agradecer-lhas, disse D. Paco com frieza, e pcrmitta-me Vossa Graça que pergunte cm que hotel vac alojar-se.

Em quanto o duque me foliava cu olha1·a para Regina e via-a contrair-se e cmpallide­cer.

Voltei-me para D. Paco e respondi: -Para o hotel dos Trcs Reis. -~·esse caso, mylord, amanhã o procurarei. -Terei a honra de esperai-o, senhor duque. O. Paco saudou-me gravemente e offereceu o

braço á marqucza. Xo momento, cm que clla subia para o trem,

cahiu-lhe o leque. O duque abaixou-se para apanhai-o e ella dis­

se-me vivamente: -Parta hoje mesmo. Sou cu que o quero. O. Paco deu-lhe o leque, saudou·me de novo,

e o trem partiu a trote largo. -Que significa isto ?-perguntei a mim pro­

prio, conservando-me immovel no mesmo logar . Depois meus olhos fixaram-se nas pequeni­

nas flores azucs, que cu t inha na mão esquerda . P ois Tony perderia o seu tempo encommen·

dando o fatal aparelho ?- disse cu interrogan­do-me a mim mesmo. O meu coração parecia agitado por sensações nunca sentidas. A mar­queza é realmente encantadora e bem feliz seria o homem que tivesse o direito de dizer-lhe ao ouvido palavras de amor, murmurava eu. Elia ordena-me que viva, clla dá-me uma recordaç.ão. Quanto á esperança, o meu pedido era destitui­do de senso commun, e uma mulher não podia attendel-o. Agora quer que cu parta hoje mes­mo. Partir! E porque? Não posso pois tornar a vel-a n'esta cidade? Se cu ficar é para vel-a par­tir e seguil-a. A questão é saber se a amo ou não. Ora n'este momento é me impossível res­ponder. Tenho cento e quinze dias deante de mim para rcflectir e resolver o problema.

Raciocinando assim, dei ordem ao criado que me acompanhava de fazer conduzir as bagagens ao hotel dos trez Reis.

Eu nunca gostei de lfalc, meu caro Roberto, mas a prohibição, que me fez a marqucza de demorar-me, in spi rou-me o desejo de passar alli algum tempo. Eu não so desejava tornai; a vcl-a, como tambem conhecer a direcção que el la se­guiria deixando a cidade. Alem d'isso aparecia-me tão cercada de mystcrios, que era nccessario que eu os desvendasse. Para isso era preciso que eu podesse vigiai-a.

Todo o dia estive mergulhado n'um verda­deiro oceano de estranhos pensamentos, cujo fluxo e refluxo me faziam a cada instante mudar de opinião.

Finalmente, depois de ter lançado o chumbo da sonda o'esse abysmo, a que se chama coração humano, sem conseguir determinar-lhe a pro-

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200 A ILLUSTRAÇÃO POPULAR

fundídade, semilhante ao navio que se aventu ra a naveg, r n 'um dcdalo de syrthcs, deixei-me arrastar pela corrente dos meus pensamentos entregando-me á mcrçê cio oceano.

Eu tí nha a certeza de encontrar , sempre que eu quizesse, o porto da morte e esse jogo de azar a que ía entregar-me, pareceu-me uma distracção agradavel para os quatro mezes de espera, que tinha deante de mim.

XIV

.A .s l o.ra njas d o A lic unt e e o s l nrn njno;i

d o l\-Cal tu.

No dia seguínte, às oito horas da manhã, víeram annunciar-me a visi ta do duque de San· doval.

JOVEN PRINCIPE DE SIM\

Tratei de vesti r-me e não me demorei a ap­parecer na sala, muito mal mobilada, do hotel, a qua l os creados davam o pomposo titulo de sal5o.

D. Paco eaperava-me de pé. Eu apressei-me a fazer as honras da casa. Depois dos comprímentos do estyllo: - ,\lylord, disse-me elle, venho renovar os

agradecímentos que lhe foz hontem a senhora de Sandoval. Parece que v. ex.· foi para ella um companheiro de viagem tão galante, como bem educado, e, por não duvidar d'isso, é que me apressei a vir aqu i. Talvez minha cunhada abu­sasse mesmo da ext rema bondade de v. ex.•, e n 'esse caso, peço lícença para apresentar em meu e no nome d'ella as nossas descu lpas.

As palavras que acabava de pronunciar D. Paco, eram deéerto muito delicadas, mas havía na sua pronuncia um não sei quê de iron ico e motejador, que me obrigou a levantar brusca­mente a cabeça.

(Contimía.) ----~g~~~-

PASSATEMPO CJIARAOAS

Tu me vês onde ha lad róes-1.

Vivo n'agua e cm chão enchuto-J. Marco á terra as dimcnsões-1.

A rvore, foi ha, Oor e fructo tudo tem mil perfciçócs.

o. J\I. c. Q.

Entre muitas irmãs sou a primcira-1 E' primeira a segunda em gernrchio-2. E o mesmo que a primeira é a tcrccira-1.

O todo é mineral. commum producto Como é, por commum, dos mais valiosos E onde ma is e melhor se encon tra sempre É junto ao mar e aos rios caudalosos.

D. M. C.Q.

CHARADAS NOVISSIMAS

A primeira conduz esta ave-1-2 . A segunda é um animal liquido--1-2. A terceira é um pronome no inferno--1-1. A quarta é um estimulo que gcrn os vicios-1-2 A quinta é do jogo camarnda-1-2.

EXPLICAÇÃO DO PASSATE~IPO DO N. 0 24

Enigma-Pelas e obras e não pelo vestido é o homem co11hecido.

Pergunta enigmatica-Passadei1·a. C harada cm quadro-Charadas novissimas- Arpáo-Desp1·e;o-Solla- Doca

-Cunhado.