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EE de repente ela move-se. A investi-gação científica feita em Portugalganhou visibilidade e tornou-seapetecível não só para portugue-ses como também para estrangei-ros. Segundo os últimos dados, re-colhidos em 2010 pela Fundaçãopara a Ciência e Tecnologia (FCT),mais de 15% dos cerca de 23 mil in-vestigadores que trabalham noscentros de investigação e nas uni-versidade nacionais são nativos deoutro país. Em 2012, num inquéri-

to realizado a 1550 cientistas, a re-vista norte americana “The Scien-tist” destacava a Fundação Cham-palimaud (FC), em Lisboa, como omelhor local do mundo para traba-lhar em ciência. Um ano antes, namesma revista, um outro inquéri-to colocava o Instituto Gulbenkianpara a Ciência (IGC), em Oeiras, emnono lugar entre os dez melhoresinstitutos europeus para bolseirosem fase de doutoramento.

Investigar em Portugal trazvantagens para o currículo doscientistas do século XXI? ZacharyMainen, responsável pelo progra-ma de neurociência do Centro deInvestigação da Fundação Champa-limaud (FC), não hesita em dizerque, nesta área, o centro que dirige“pode considerar-se entre os me-lhores do mundo”. Quando, em2006, recebeu o convite de Antó-nio Coutinho, então diretor do IGC,para montar e coordenar o progra-ma das neurociências da FC, emparceria com a Gulbenkian, Mai-nen — então investigador e profes-sor no Cold Spring Harbour Labora-tory — mudou-se de Nova Iorque

para Lisboa sem pensar duas vezes.“Construir um programa a partirdo zero, com todos os meios, e po-der escolher as pessoas que vão fa-zer parte desta aventura é umaoportunidade única na vida de umcientista.” E como se monta de raizum centro de investigação? Comose dirige? Zach — como é informal-mente conhecido o cientista de 44anos — não tem muito tempo paraconversas de pormenor. “Ah, comolhe posso explicar?! Organizar pes-soas é difícil, ser diretor de um cen-tro de investigação científica aindamais difícil é. Faço a gestão de umnegócio que não vende nada emconcreto. Todo o investimento quese faça aqui é capital de risco. Nãopodemos garantir até onde vamoschegar.” Tanta coisa que lhe ocupaa cabeça, quando só deveria estar apensar no Cérebro. Em janeiro des-te ano, Mainen recebeu a notícia deque ele e o colega Rui Costa esta-vam entre os 200 investigadoresde 80 instituições europeias selecio-nados para integrar um dos mega-projetos científicos da União Euro-peia para a próxima década: o Pro-

jeto do Cérebro Humano, que temum financiamento de 1,19 mil mi-lhões de euros e a tarefa messiâni-ca de recolher todo o conhecimen-to existente sobre o cérebro para omapear, peça por peça, através demodelos e simulações produzidospor um supercomputador a que to-dos os cientistas terão acesso.

Mainen sonha com a possibili-dade de a sua equipa vir a deixar asua marca na complexa galáxia donosso sistema cerebral. “Tal como

NORTE-AMERICANO, 44 ANOSESTUDOU NA UNIVERSIDADE DEYALE E DOUTOROU-SE EMNEUROCIÊNCIAS NAUNIVERSIDADE DA CALIFÓRNIA. FOIPROFESSOR NO LABORATÓRIO DECOLD SPRING HARBOR, DE NOVAIORQUE, E EM 2007 VEIO PARAPORTUGAL, CONTRATADO COMOINVESTIGADOR PRINCIPAL ECOORDENADOR DO PROGRAMA DENEUROCIÊNCIA DA FUNDAÇÃOCHAMPALIMAUD. EM 2010 RECEBEUUMA BOLSA DE 2,3 MILHÕES DEEUROS DO EUROPEAN RESEARCHCOUNCIL E AGORA FOISELECIONADO PARA PARTICIPARNO PROJETO CÉREBRO HUMANO,DA UNIÃO EUROPEIA.

ZACHARY MAINEN

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os portugueses que partiram da-qui para a descoberta do mundo,sinto-me um descobridor a explo-rar, sem bússola nem norte, a últi-ma fronteira do mais misteriosodos órgãos humanos.”

No centro de investigação daFC trabalham 150 investigadores(40% são estrangeiros, de 30 nacio-nalidades), que integram 15 labora-tórios em áreas das neurociênciase da computação. Entre eles estátambém Megan Carey, uma das in-vestigadoras principais nos labora-tórios da FC, que estuda os circui-tos neurais e o seu comportamen-to. Está interessada em perceber oque acontece quando realizamospequeníssimos movimentos auto-máticos, quase impercetíveis, co-mo apanhar uma bola ou contrairum músculo, e como esta ativida-de se processa nos circuitos neu-rais. “É impossível medir um pen-samento, mas já é possível medir omovimento do circuito neuralquando fazemos gestos automáti-cos sem pensar”, diz Carey, de 37anos, que chegou da Escola de Me-dicina de Harvard em 2010. Já ti-

nha passado por Lisboa, em 2005,numas férias de verão com o mari-do, o inglês Michael Organ, agoratambém investigador na funda-ção. Megan recorda-se de se terapaixonado pela cidade e de Mi-chael lhe ter dito que poderiam vi-ver aqui. Ela não via como: “Estáva-mos na América, certo? O lugarmais indicado do mundo para fa-zer neurociências.” Michael tinhaouvido falar de um novo institutonesta área, programado para abrirem Portugal. Passados algunsanos, quando começaram a ponde-rar no passo seguinte de progres-são na carreira, Lisboa cruzou-sena lista das possibilidades. Meganenumera as razões pelas quais es-colheu Portugal. Em primeiro lu-gar, a oportunidade de ela e Mi-chael poderem instalar o seu pró-prio laboratório. Também conhe-ciam os outros convidados queiriam formar as equipas: “Este as-peto é muito importante. Aqui, ca-da um dos laboratórios trabalha asua área em open lab. É um espaçoúnico, aberto e multidisciplinar,que permite uma troca permanen-

te de informação. São raros os cen-tros que funcionam assim. A arqui-tetura do edifício foi desenhada pa-ra a troca de conhecimento”.

No ano passado, entre seiscientistas a trabalhar em Portugalnomeados pelo Instituto HowardHughes, nos EUA, como os futuroslideres científicos dos seus países,Carey foi a única estrangeira a re-ceber a bolsa de investigação parao seu laboratório, no valor de 513mil euros. Ficou boquiaberta com

NORTE-AMERICANA, 38 ANOSINVESTIGADORA PRINCIPAL DOLABORATÓRIO DE CIRCUITOSNEURAIS E DO COMPORTAMENTO,DO CENTRO DE INVESTIGAÇÃO DENEUROCIÊNCIAS DA FUNDAÇÃOCHAMPALIMAUD, ONDE ESTÁDESDE 2010. FEZ ODOUTORAMENTO NAUNIVERSIDADE DA CALIFÓRNIA EUM PÓS-DOC NA FACULDADE DEMEDICINA DE HARVARD. ENTRE OSVÁRIOS PRÉMIOS QUE RECEBEU,FOI NOMEADA PELO INSTITUTOMÉDICO HOWARD HUGHES, NOSEUA, COMO UMA DAS FUTURASLÍDERES DE CIÊNCIA NO SEU PAÍS.

MEGAN CAREY

“TAL COMO OS POR-TUGUESES QUE PAR-TIRAM DAQUI PARAA DESCOBERTA DOMUNDO, SINTO-MEUM DESCOBRIDORA EXPLORAR A ÚLTI-MA FRONTEIRA DOMAIS MISTERIOSODOS ÓRGÃOS HUMA-NOS”, DIZ MAINEN

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a reação dos portugueses. “Tornei--me uma figura mediática. Apare-ci na televisão, e no dia seguintetodos me cumprimentavam narua. Nos EUA, nunca seria uma es-trela.” Mas a maior surpresa foi vera sala de conferências da funda-ção, com capacidade para 500 pes-soas, várias vezes esgotada...

CIÊNCIA É TRENDY?Prémios, bolsas, conferênciascheias, projetos em parcerias comescolas, toda a gente quer saber oque os cientistas andam a fazer. Pa-lavras como inteligência artificial,genoma, Bosão de Higgs, “a partí-cula de Deus”, disparam a curiosi-dade de um público cada vez maisalargado para a ciência. Na últimadécada, investiram-se os milhõesnecessários para que Portugal des-se um salto qualitativo para figu-rar no mapa internacional e na cor-rida às bolsas e aos financiamen-tos para projetos de investigação.Segundo um trabalho apresentadono jornal “Público” em dezembropassado, com dados recolhidos jun-to do Ministério da Ciência e da

Educação, nos últimos cinco anosos centros de investigação e as ins-tituições científicas portuguesasconseguiram captar perto de 80milhões de euros de financiamen-to internacional. “Só as candidatu-ras ao 7º Programa-Quadro daUnião Europeia cresceram 23 porcento neste período, e o acesso àsbolsas do European ResearchCouncil (ERC) atingiram os maio-res números de sempre este ano”,lê-se na mesma notícia.

“Sem ciência não há tecnolo-gia", confirma Elvira Fortunato.Ela foi a primeira portuguesa a ga-nhar um prémio do ERC, graças aum artigo revolucionário sobretransístores em papel, que permi-tiu à sua equipa receber em 2008uma bolsa de 2,25 milhões de eu-ros para desenvolver um projetopioneiro na área da microeletróni-ca transparente. A investigadorasublinha que o salto qualitativo daciência feita em Portugal se deve àpolítica implementada por Maria-no Gago, quando tomou conta dosministérios da Ciência e da Tecno-logia, entre 1995 e 2011: “É precisodizer que foi ele, com a sua equipa,que reorganizou a ciência em Por-tugal. Chamou equipas internacio-nais e implementou uma políticade financiamento em parceriacom os laboratórios associados.Neste momento há 24 laboratóriosde topo associados que trabalhamcom as universidades. Foi esta me-dida que tornou os centros de in-vestigação competitivos e permi-tiu desenvolver um trabalho de ex-celência”, diz a cientista, que dirige

o Centro de Investigação de Mate-riais (Cenimat), integrado na Facul-dade de Ciências e Tecnologia daUniversidade Nova de Lisboa.

Fortunato, que tem neste mo-mento vários projetos em cursocom financiamentos europeus, re-fere que o que leva os estrangeirosa escolher Portugal é o nome dequem dirige e dá qualidade aos la-boratórios. “Para o currículo de uminvestigador, o mais importante éa quantidade de artigos que possaproduzir. Isto só é possível em luga-res com condições e equipamen-tos excecionais.” Por isso, não temdúvidas de que os inúmeros pedi-dos que recebe do mundo inteiropara virem fazer doutoramentosse devem ao facto de o Cenimat“ser uma referência mundial nouniverso das nanotecnologias e daeletrónica transparente”. Entre as50 pessoas que fazem parte daequipa, metade são estrangeiros,de países como Brasil, Itália, Alema-nha, Irão, Bielorrússia, Polónia, Ín-dia ou Espanha, e há desde enge-nheiros químicos a biólogos e in-vestigadores da área da eletrónica.

FRANCÊS, 35 ANOSINVESTIGADOR DA UNIDADE DETELECOMUNICAÇÕES EMULTIMÉDIA DO LABORATÓRIOASSOCIADO INESC-TEC, NO PORTO,CHEGOU A PORTUGAL EM 2007,COM UM CONTRATO DOPROGRAMA CIÊNCIA 2007 DA FCT.DOUTORADO EM INFORMÁTICAPOR UMA UNIVERSIDADE DEBARCELONA E COM UM PÓS-DOCEM VIENA EM INTELIGÊNCIAARTIFICIAL, ORGANIZOU EM 2010,NO PORTO, A CONFERÊNCIAINTERNACIONAL ISMIR, O MAIORENCONTRO MUNDIAL NA ÁREA DASTECNOLOGIAS DA MÚSICA.

FABIEN GOUYON

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COMUNIDADE EM REDE“A ciência é planetária, não tem na-cionalidade”, garante Yerali Sandi-ca, venezuelana, investigadora depós-doutoramento na Faculdadede Ciências e Tecnologia da Univer-sidade de Coimbra (FCTUC). “A vi-da de um pós-doc é instável, nemtodos têm o espírito para a percor-rer.” Ela sabia que para ser investi-gadora na área que lhe interessavateria de sair da Venezuela e vir pa-ra a Europa ou para os EUA. Sandi-ca estudou Física e investiga siste-mas complexos. Está interessadaem aplicar as leis da Física aos siste-mas em rede e perceber como fun-cionam em sistemas sociais comoo Facebook ou o Twitter. “É umaárea muito recente, não tem nadaa ver com a Física tradicional. Nãohaverá mais de 100 pessoas nomundo a trabalhar neste tema.”

Coimbra surgiu como uma pri-meira oportunidade no percursodesta venezuelana de 37 anos, queconcorreu a uma bolsa da FCT pe-la internet e fez a entrevista viaSkype. Divorciada, chegou sozi-nha, com os filhos, de 11 e 13 anos.“Estou a trabalhar em sistemas vas-culares no laboratório de Rui Tra-vassos, era o lugar disponível quehavia para um bolseiro”, conta. Pa-ra evoluir na carreira, terá de par-tir em breve para outro país. “Tal-vez um dia possa montar o meulaboratório e voltar ao meu país.”

Isaac Bidanã, investigador es-panhol em Física Nuclear, que parti-lha a mesma sala de trabalho comYerali, confirma: “O cientista solitá-rio é uma imagem romântica quenão corresponde ao perfil do inves-tigador. Para evoluir precisamos deestar em diálogo com os que estãoa investigar o mesmo que nós.” Napequena sala da Faculdade deCoimbra, Bidaña contacta todos osdias, via email ou Skype, os seis ami-gos que fazem parte do seu grupode trabalho, espalhados pelos EUA,Espanha, França, Itália e Alemanha.

Natural de Barcelona, Bidañadedica-se a estudar processos nu-cleares nas estrelas de neutrões.“Sou um teórico puro”, diz. “Avançohipóteses, cálculos e modelos queoutros poderão comprovar. O quefaço só serve para aumentar o co-nhecimento do mundo, o que jánão é pouco”, ironiza. Bidanã, que

ESPANHOL, 33 ANOSDOUTORADO EM FÍSICA NUCLEAR NAUNIVERSIDADE DE BARCELONA E COM UMPÓS-DOC NA UNIVERSIDADE DE PISA E OUTRONA ALEMANHA, CHEGOU À UNIVERSIDADE DECOIMBRA COM UM CONTRATO DO PROGRAMACIÊNCIA 2007 DA FCT.VENEZUELANA, 37 ANOSDOUTORADA EM FÍSICA NO INSTITUTOVENEZUELANO DE INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA,ESPECIALIZADA EM SISTEMAS COMPLEXOS,CHEGOU A COIMBRA EM 2012 COM UMA BOLSADE PÓS-DOUTORAMENTO DA FCT.

ISAAC BIDAÑAE YERALI SANDICA

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tem 40 artigos publicados em revis-tas especializadas, um deles citado81 vezes, chegou a Portugal em2007, depois de ter estado em uni-versidades da Alemanha, Itália e Es-panha (Barcelona). E o que é queum físico nuclear com este currícu-lo faz em Coimbra? “Sou um merce-nário da ciência”, responde. “Vouonde houver trabalho.” Quando sur-giu a possibilidade, concorrer auma bolsa da FCT, pois conheciapessoas da FCTUC com quem já ti-nha colaborado. “Coimbra é uma ci-dade que me agrada. Tem um am-biente de trabalho tranquilo, o queé muito importante. Pode-se andara pé, e tem uma vida cultural bastan-te ativa. Parecem-me motivos sufi-cientes para gostar de viver aqui.”Agora começa a ficar inquieto. Nopróximo ano termina a bolsa e, coma crise instalada, terá poucas possi-bilidades de ficar. Já começou a pes-quisar a sua próxima paragem.

Fabien Gouyon, francês, dou-torando contratado do INESC-TECdo Porto, o laboratório associadodo Instituto de Engenharia de Siste-mas e Computadores, fala fluente-mente português. Trabalha emcomputação musical e revela, sempresunção, que, na sua área, a inte-ligência artificial ligada ao campoda música e da produção de siste-mas de som conseguiu colocar oPorto no mapa. Tenta explicar umsistema complexo entre aplica-ções para MP3 ou medidores desom e abrevia: “Investigo análisesde som e processamento de sinalutilizando ferramentas e conceitoscientíficos.” Começou por estudarFísica e depois fez telecomunica-ções; esteve seis meses na Califór-nia, na Universidade de Stanford,“um dos melhores lugares do mun-do para fazer investigação científi-ca no campo da música”; e, maistarde, fez um doutoramento emBarcelona em algoritmos e ritmose um pós-doc num centro de inves-tigação em inteligência artificialem Viena. Aterrou no Porto comuma bolsa FCT Ciência 2007, desti-nada a contratar investigadoresdoutorados e com duração de cin-co anos. Depois de correr o mundoa fazer currículo, voltar a um paísdo Sul da Europa, com um contra-to de “cerca de três mil euros (bru-tos) por mês” e um programa

ARGENTINO, 37 ANOSDOUTORADO EM BIOLOGIA E GENÉTICA NAUNIVERSIDADE DE BUENOS AIRES, CHEGOU APORTUGAL HÁ CINCO ANOS PARA FAZER UMPÓS-DOUTORAMENTO NO INSTITUTOGULBENKIAN DE CIÊNCIA (IGC).POLACO, 30 ANOSDOUTORANDO EM BIOQUÍMICA E BIOLOGIA NAUNIVERSIDADE DE VARSÓVIA, CHEGOU EM MAIODE 2012 COM UMA BOLSA DE INVESTIGAÇÃO DAFCT PARA PARTICIPAR NO PROGRAMA“ARTERIOSCLEROSE”, COORDENADO PELOLABORATÓRIO DE MIGUEL SOARES NO IGC.

GASTON GUILGURE JUREK KOTUNOWSIC

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“bem estruturado”, onde poderiacriar uma linha de investigação deponta, parecia-lhe uma oportuni-dade excelente. Formou um grupode 15 pessoas, com seis doutoran-dos a seu cargo. “Adoro viver noPorto”, confessa. O contrato com oFCT termina no ano que vem, masFabien não está preocupado. “Que-ro continuar a viver aqui. Sei queirão aparecer outras oportunida-des para realizar novos projetos.”

DE LISBOA PARA O MUNDOGaston Guilgur e Jurek Kotunow-sic não se conheciam até ao mo-mento em que se sentaram no re-feitório do IGC e partilharam a ho-ra de almoço. Gaston é argentino,Jurek polaco. “A Argentina é umbom sítio para trabalhar em investi-gação?”, indaga o polaco: “Começaa ser bom”, responde-lhe Gaston.Trabalham em Oeiras, em laborató-rios diferentes; fazem parte dos120 estrangeiros (num total de 257investigadores) que estão no IGC.

Kotunowsic, de 30 anos, aca-bou praticamente de chegar. Biólo-go, trabalha em desenvolvimentomolecular, “uma matéria centralda genética”, e faz investigação naárea da arteriosclerose. Veio direta-mente da Cracóvia para um pós--doc. “Foi a minha primeira esco-lha. Queria vir para o laboratóriode Miguel Soares.” Tinha-se cruza-do com o cientista português nu-ma conferência na sua cidade,anos antes de o grupo de Soarespublicar na revista “Cell” um arti-go que revelava uma importantedescoberta para o tratamento damalária e ganhar uma bolsa de in-vestigação europeia de 2 milhõesde euros. Confessa que ficou ra-diante quando recebeu a notíciade que tinha sido aceite para traba-lhar com o cientista do IGC, “ape-sar de ter deixado a família na Po-lónia, a mulher e dois filhos peque-nos”. Sabe que para estar nos labo-ratórios que marcam a ciência te-rá sempre de emigrar, temporaria-mente, em prejuízo da família. “Es-te é o lado mais duro da ciência.”

Para Gaston Guilgur, estaquestão não se pôs. É um pião soli-tário. Partiu há uns anos de uma“terra muito pequenina, Santa Te-resinha, no sul da Argentina, pertode Buenos Aires”, onde estudou.

Quando terminou a licenciaturaem Biologia e optou por estudarGenética, foi para o Japão fazer umpós-doutoramento antes de che-gar ao Algarve. Voltou à Argentinapara completar o doutoramento ecandidatou-se a uma bolsa euro-peia. Tinha Portugal na cabeça:“Foi uma opção poética. Sentia-memuito bem aqui. O que move umcientista é a procura incessante deuma resposta, e o trabalho tem deser ponderado num equilíbrio en-tre três coisas: viagem, oportunida-de, bem-estar.” Encontrou estascondições no IGC, onde esteve du-rante três anos. Em breve terminaa bolsa. Provavelmente, voltará pa-ra a Argentina, onde poderá mon-tar o seu laboratório. “Os anos aquideram-me crescimento, foram im-portantes para o meu currículo.”Levará na bagagem o aperfeiçoa-mento que fez no trabalho commoscas, “uma ferramenta genéti-ca importantíssima”, e um artigo,feito com o seu grupo, que esperapublicar em breve e que, se correrbem, lhe assegurará o reconheci-mento da comunidade científica.

Seja feita por investigadoresportugueses ou da Argentina, deEspanha, dos EUA ou de qualqueroutro país, toda a ciência que seproduz em Portugal é portuguesa.Ficará impressa no conhecimentoque faz avançar o mundo comouma marca nossa. R

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