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COMENTÁRIO DO NOVO TESTAMENTO WILLIAM HENDRIKSEN

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  • COMENTRIO DO NOVO TESTAMENTO

    WILLIAM HENDRIKSEN

  • Caractersticas de cada Comentriodo Novo Testamento de WilliamHendriksen e Simon Kistemaker Uma traduo do texto bblico

    comentado de autoria doprprio comentarista.

    Uma introduo a cada livrodo NT aborda data, autoria,questes gramaticais, etc.

    Os comentrios propriamentetm o objetivo de esclarecerpara o pesquisador o sentidoda passagem.

    Resumos ao final de cadaunidade de pensamentoajudam os que preparam aulas,palestras ou sermes a partirdeste comentrio.

    Os esboos dos livros da Bbliaapresentam a sua estruturaorgnica. Antes de cadadiviso principal so repetidasas respectivas sees dosesboos.

    Os problemas tratados emnotas de rodap permitem aoestudante continuar a suapesquisa sem maioresinterrupes, detendo-se ondee quando desejar para obterinformaes adicionais.

    Poucos comentriosconseguem manterconsistente a sua linhateolgica como o fazerh oscomentrios desta srie. Essacoerncia teolgica dsegurana ao pesquisador.

    A piedade dos comentaristastransparece em cada pgina, aolado de sua erudio.Os textos no so ridos, masdenotam um profundo temorde Deus. So comentriosaltamente inspiradores.

  • Joo

  • COMENTRIO DO NOVO TESTAMENTO

    Joo

    s

    WILLIAM HENDRIKSEN

  • Comentrio do Novo Testamento - Exposio do Evangelho de Joo 2004, Editora Cultura Crist. Publicado originalmente em ingls com o ttulo New Testament Commentary, Exposition o f the Gospel According to John por Baker Books, uma diviso da Baker Book House Company, P.O. Box 6287, Grand Rapids, MI 49516-6287. 1953 by William Hendriksen. Todos os direitos reservados. A traduo da Escritura do texto de Joo do prprio autor. As citaes da Escritura, exceto as de outro modo indicadas, so da traduo de Almeida, Revista e Atualizada da SBB.

    1 edio em portugus - 2004 3.000 exemplares

    Traduo Elias Dantas

    Neuza Batista

    Reviso Valter Martins

    Editorao Eline Alves Martins

    Capa Expresso Exata

    Hendriksen, W illiam H 495e O Evangelho de Joo / W illiam Hendriksen. - So Paulo:

    Editora C ultura Crist, 2004. Traduo de Elias Dantas e Neuza Batista

    960 p. ; 14 X 21 cm. {Coleo C om entrio do N ovo Testamento)

    ISBN 85-7622-031-8

    1. Com entrio bblico 2. Exegese 3. Estudo Bblico 4. Teologia bblica. IT tu lo II. Srie.

    C D D 2 1 e d . 226.5

    Publicao autorizada pelo Conselho Editorial:Cludio Marra (Presidente), Alex Barbosa Vieira, Andr Lus Ramos, Mauro Fernando

    Meister, Otvio Henrique de Souza, Ricardo Agreste, Sebastio Bueno Olinto, Valdeci da Silva Santos.

    CDITOnn CUITURA CniSTARua Miguel Teles Jnior, 394 - Cambucl 01540-040 - So Paulo - SP - Brasil Fone (0**11) 3207-7099 - Fax (0**11) 3209-1255 www.cep.org.br - [email protected] 0 8 0 0 - 1 4 1 9 6 3Superintendente-, Haveraldo Ferreira Vargas

    Editor. Cludio Antnio Batista Marra

  • S u m r io

    Prefcio...................................................................................................................................7

    A breviaturas......................................................................................................................... 9

    Introduo ao E vangf.ijho di; J oo

    I. Autoria. D ata e L o c a l...........................................................................................13II. Leitores e P ropsito ............................................................................................. 49

    III. C aractersticas...................................................................................................... 55IV. G ram tica ............................................................................................................... 59V..Tema e D iv ises.................................................................................................... 93

    O L vANGEU-IO SliGUNDO Joo

    Esboo dos Captulos 1 - 6 ........................................................................................98

    Captulo I ..................................................................................................................... 99

    Captulo 2 ................................................................................................................... 155

    Captulo 3 ...................................................................................................................177

    Captulo 4 ................................................................................................................... 207

    Captulo 5 ................................................................................................................... 249

    Captulo 6 ................................................................................................................... 283

    Esboo dos Captulos 7 - 1 0 ................................................................................... 327

    Captulo 7 ...................................................................................................................329

    Captulo 8 ...................................................................................................................365

    Captulo 9 ...................................................................................................................413

    Captulo 10 .................................................................................................................445

    Esboo do.s Captulos 1 1 , 1 2 .................................................................................49D

    Captulo I I .................................................................................................................491

    Captulo 1 2 .................................................................................................................535

    Esboo do Captulo 13 ............................................................................................592

  • Captulo 13................................................................................................593Esboo dos Captulos 14-17.....................................................................644Captulo 14................................................................................................645Captulo 15................................................................................................685Captulo 16................................................................................................717Captulo 17................................................................................................751Esboo dos Captulos 18,19.....................................................................783Captulo 18................................................................................................785Captulo 19................................................................................................835Esboo dos Captulos 20,21 .....................................................................876Captulo 20................................................................................................877Captulo 21................................................................................................909

    B ib l io g r a f ia S e l e c i o n a d a ............................................................................... 945B i b l io g r a f ia G e r a l ..........................................................................................947Q u a d r o .............................................................................................................957

    ATENOPara localizar neste comentrio textos mencionados em notas dos comen

    trios de Mateus, Marcos e Lucas desta srie, favor consultar antes o quadro da pgina 957, no final deste volume.

    6 COMENTRIO DO NOVO TESTAMENTO

  • P r ef c io

    Os meus objetivos, ao escrever este comentrio, sao os seguintes:

    {1 ) Produzir uma traduo cuidadosa do texto. Bsta traduo deve ser feita num ingls moderno e idiomtico, e deve ser fiel ao original. Ela no deve ser uma simples pirfrase, mas deve acompanhar o texto de uma maneira muito prxima, revelando suas nfases, sempre que seja possvel.

    (2) Produzir uma discusso mais completa dos problemas introdutrios, do que as que so encontradas na maioria dos comentrios, com uma nfase especial nos problemas de autoria.

    (3) Produzir uma breve anlise do texto, penetrando em seus conceitos e relacionamentos. As passagens centrais, tais como 3.16, sero tratadas em mais detalhes do que as outras.

    (4) Produzir uma sntese, ao final de cada uma das longas unidades de pensamento, para que as principiis idias de cida parte sejam claramente expressidas. Nossa anlise deve ser sempre seguida por uma sntese. A exegese inclui ambas as partes. Se no for assim, a pessoa ver as rvores, mas no a floresta; ou seja, conhecer alguns dos pontos que discutiremos, mas no ter um a idia geral do assunto coberto em cada seo.

    (5) Produzir uma defesa da posio conservadora. Ns cremos que o Evangelho de Joo exige isso.

    (6) Produzir uma apresentao atualizada. Grandes avanos tm acontecido, durinte os ltimos anos, em muitas reas do estudo do Novo Testimento. Livros importantes, que tratam de certas fases do assunto, tem sido ocasionalmente escritos, bem como excelentes artigos nas revistis teolgicas, lanando novas perspectivas sobre o sentido de certas

  • palavras e expresses (ex,, Jo 2.4; 4.9). Tm sido apresentadas dissertaes doutorais que tratam de conceitos que ocoirem com freqncia no quarto evangelho; esse material foi utilizado por ns. Foi preparada tambm uma Bibliografia Selecionada, que ser includa na segunda parte desta obra.

    (7) Produzir um resumo completo de certas construes gram aticais que ocoiTem em grande quantidade neste Evangelho. Referncias sero feitas, ao longo do texto do comentrio, a pontos importantes de gramtica e sintaxe, sem contudo encher o comentrio com esse tipo de material, para evitar que algum, que no seja instrado na lngua grega, perca o interesse em l-lo. Tambm tentaremos fazer justia aos elementos teis na teoria aramaica, sem assumirmos que concordamos com a tese de um texto original escrito em aramaico.

    Estamos bem conscientes do fato de que esses objetivos no foram completamente alcanados. Contudo, a recepo bondosa que tiveram nossas obras anteriores nos encorajam a este esforo. Que Aquele, cujo amor revelado neste Evangelho, receba toda a glria.

    William Hendriksen

    8 COMENTRIO DO NOVO TESTAMENTO

  • A br ev ia tu r a s

    As letras das abreviaturas de ttulos de livros so seguidas por pontos. As de peridicos os omitem. Desse modo, possvel saber, primeira vista, se a abreviatura refere-se a um livro ou a um peridico.

    A.R.V.A.V.B.D.B.

    D . C . G .

    Oram .N.T.

    H .B.AI.S.B.E. L.N.T.

    N .N.

    R.S.V. S.BK.

    Th.W.N.T.

    Vv .^D.B.W .H.A.B

    A. Livros

    American Standard Revised Version Authorized Version (King James) Brown-Driver-Briggs, Hebrew and English Lexi

    con to the Old Testament Hastings, Dictionary o f Christ cmd the Gospels A T. Robertson, Grammar o f the Greek New Tes

    tament the in Light o f Historical Research Hurlbut, Bible Atlas (edio mais recente) Internationcd Standard. Bible Encyclopedia Thayer's Greek-English Lexicon o f the New tes

    tamentNovum Testamentum graece, organizado por D.

    Eberhard Nestl e D. Erwin Nestl (edio mais recente)

    Revised Standard VersionStrack e Billerbeck, Kommentar zum Neuen Tes

    tament aus Talmud und IVIidrasch Theologisches Wrterbuch zum Neuen Testament

    (organizado por G. Kittel)Westminster Dictionary o f tlie Bible Westminster Historical Atlas to the Bible

  • B. Peridicos

    10 COMENTRIO DO NOVO TEST/\MENTO

    AJTh American Journal o f TheologyChrC Christian CenturyCIW Classical WeeklyCQR Church Quarterly ReviewCThM Concordia Theological M onthlyEQ E van g eli cal Q ua rte rlyExT Expository TimesG ThT Gereformeerd Theologisch TijdschriftH J H ibhert JournalHThR Harvard Theological Review-JBL Journal o f Biblical LiteratureJT hS Journal o f Theological StudiesPThR Princeton Theological ReviewRThPh Revue de Thologie et de Philosophier h c Theologie und GlaubeVD Verbum DominiWE Watchman-Exam i n e rZNTW Zeitschrift fu r die neutestamentl. Wissenschaft

  • In t r o d u oAO

    E v a n g e l h o de J o o

  • I. Autoria, Data e Locao Evangelho de Joo o livro mais maravilhoso j escrito. Tire as

    sandlias dos teus ps, porque o lugar em que ests terra santa. Essa pode muito bem ser a atitude de quem comea o estudo deste livro pois se o testemunho contido nele verdadeiro, a f em Jesus Cristo, como o Filho de Deus, recebe um a confirmao gloriosa. A razo para isso se tornar imediatamente evidente.

    O livro nos conta que. durante os dias do imperador Tibrio e do tetrarca Herodes Antipas, vivia na Palestina um judeu (4.9) cujo nome era Jesus. Este judeu afirmava ser o dono de todas as coisas, o Po da Vida, a gua Viva, o Bom Pastor, aquele que daria sua vida por suas ovelhas, que ressuscitaria os mortos no ltimo dia, o prprio M essias, o Ciiminho para Deus, o Objeto prprio da f e adorao e uma pessoa (o completamente divina, que podia dizer: Eu e o Pai somos um .

    Isso , de fato, impressionante. Mas, ainda mais maravilhoso o fato de que o escritor do livro aceita as afirmaes dele como verdadeiras! Ele d os ttulos mais exaltados para o Jesus da H istria chamando-o Logos (Palavra) de Deus , e nos conta que esta Palavra estava com Deus desde toda a eternidade, habitando na presena imediata do Pai. O autor, de um a maneira audaciosa, at mesmo o chama Deus, e faz isso no primeiro versculo! Para o escritor, Jesus tudo o que alega ser. Ele o Deus encarnado (1.1, 14).

    Quem esse autor, que aceita essas reivindicaes e faz essas declaraes surpreendentes? Ser que se trata de um total estranho, que vive num pas situado muito longe das cenas que ele descreve, de modo que a distncia d encantamento viso? E ser que ele escreve depois que j tinha se passado um bom tempo depois dos acontecim entos, de tal maneira que o heri da histria foi, gradualmente, tornando-se um operador de milagres, e, em estrita obedincia s leis da lenda c do folclore, foi finalmente transformado num deus? No! O contrrio que o caso! O autor do Quarto Evangelho apresentado como

  • algum que pertence mesma etnia, grupo e famlia do seu heri . Ele apresentado como uma testemunha ocular (21.24; cf. IJo 1.1-4), que pertence no somente ao crculo amplo de seguidores do Mestre, mas, de acordo com a tradio, um dos Doze e, dentro desse grupo seleto, um dos trs (Mc 5.37; 9.2; 14.33). Mas, mesmo se algum se opuser s referncias dos Sinticos, e desejar se limitar apenas ao testemunho do Quarto Evangelho, essa pessoa ter de aceitar que o autor apresentado como um dos dois primeiros discpulos (1.35,40). Essa a concluso natural qual se chega, a menos que algum resolva adotar 0 entendimento improvvel de que o discpulo de Joo 1.35, 40 no 0 mesmo de 21.24. Ele, tambm, o que se apresenta como .sendo o discpulo a quem Jesus am ava (Jo 13.23).

    Ningum conhecia Jesus m elhor do que ele. Ele caminhou com o Senhor diariamente, tendo tido amplas oportunidades de observar suas falhas de carter e seus defeitos de personalidade, caso existisse algum. Na noite mais sagrada de todas, a noite da Ceia, ele reclinou-se em seu peito. Por ocasio da crucificao, ele foi o discpulo que permaneceu nas proximidades do Calvrio, tendo tambm, posteriorm ente, entrado no tmulo (13.25; 19.26; 20.8). No entanto, esse mesmo discpulo que, como autor do Quarto Evangelho, no se envergonha de proclamar a todos que este mesmo Jesus da Histria, que ele to bem conhecia, o prprio Deus.

    E no somente isso, mas j no primeiro captulo ele introduz outras testemunhas oculares, ao nos contar que certos homens ficaram to profundam ente impressionados com o encontro que tiveram com Jesus, que expressaram suas emoes com as seguintes palavras:

    Andr: "Achamos o M essias .Filipe: Achamos aquele de quem M oiss escreveu na lei, e a quem

    se referiam os profetas .Natanael: Rabi, o senhor o Filho de Deus, o senhor o Rei de

    Israel! (1.41, 45, 49).

    A isso tudo podemos ainda acrescentar o testemunho de Joo Batista, que tambm se encontra registrado no captulo primeiro:

    No sou digno de desatar-lhe as correias das sandlias... Eis o

    14 COMENTRIO DO NOVO TESTAMENTO

  • Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo!...Eu de fato vi e tenho testificado que ele o Filho de Deus ( 1.27, 29, 34).

    Os que se opem a esse entendimento tradicional no podem permitir que esse testemunho se estabelea. Eles entendem que, se o m esmo no for contestado, tero perdido no somente um a batalha, mas a prpria guerra. O que a Alta Crtica tem a oferecer que poderia abalar esse testemunho? Como os liberais tentam provar que o Quarto Evangelho no pode ter sido composto por um a testemunha ocular do Senhor; que ele no foi escrito na sia M enor pelo idoso apstolo .loo, como diz a tradio? Seus argumentos podem ser resumidos como segue:'

    I . Qualquer pessoa que leia a lileratura a seguir - uma seleo entre as cenlenas de obras escritas sobre este assunto -, encontrar tanto os argumentos dos crticos quanto as respostas dadas por aqueles que se alinham com a viso tradicional, no que diz respeito autoria do Quarto Evangelho. Ns somos devedores a todos os seguintes:Albright, W. F., From lhe Stone Age Io Cbrisrianily. Baltimore, 1940, especialmente pp.

    298-.300.Andrews. Mary E.. The Autorship and Significance o f lhe Gospel o f John. .IBL 64 ( 1945).

    Pl>, 183W92.Hacon. B. VV., '/'he Foiirih Gospel in Research and Dehaic. Nova York. 1910.Bernard. .1. H.. A Critical and lUegelical Comnienlary on the Gospel according m Sr. .lohn.

    .2 vols, {ill International Critical Coinmciilary). Nova York. 1929.Burney, C. F., The Aramaic Origin o f the Fourth Gospel. Oxford. 1922, especialmente pp.

    126-152.Dods, M. The Gospel o f St. John (in The Expositors Greek Testament). 2 vols., reedio

    Criand Rapids, ,sem data, vol. 1, especialmente pp. 655-681.Gardner-Smith. Percival. St. John and the Synoptical Gospels. Cambridge. 1938.Godet. F., Commentary on the Gospel o f John (traduzido por T. Dwight), 2 vols.. Nova

    York. 1886. ' "Goguel. M.. Le Quairiine Evangile. Paris. 1924.Goodenough. E. R.. John. ,4 Primitive Gospel. JBL 64 (1945). pp. 145-182.Grosheide, F. W.. Johanne.s {in Koinmenlaar op liet Nieiiwe Testament) 2 vols. Amsterd,

    1950, especialmente vol. I, pp. 1-42.Hoskyns, E. C., The Fourth Gospel. 2 vols.. Londres, 1940.Howard. W. F., The Fourth Gospel in Recent Criticism and hiterpretation. Londres, 1945, Howard, W. F., Christianity According to St. John, Filadlfia, 1946, especialmente pp. 11

    33; tambm sua crtica de Hoskyns. The Fourth Gospel, J'ThS 42 (1941). pp. 75-81. Luthardt, C. E.. St. John the Author o f the Fourth Gosj>el, Edimburgo, 1875.Menoud, P. H., L 'vangile de .lean dprs les recherches recentes. Neuchate) e Paris, 1943. Nunn, H. R V The Fourth Gospel in the Early Church". EQ 16 (1944). pp. 173-191. Nunn. H. P. V.. The Fourth Gospel. An Outline o f the Problem and Evidence. Londres.

    1 946.Redlich, E. B.. A;i Introduction to the Fourth Gospel, Londres. 1939.

    INTRODUO 15

  • (1) Joo, o apstolo, morreu muito cedo para ter escrito um Evangelho em feso, no fina l do sculo 1" d.C. A evidncia que apresentam a seguinte: No Cdice Coisliniano, Paris 305, que um dos manuscritos das crnicas de Georgius Harmatolus, um monge que viveu no sculo 5 d. C., encontra-se declarado que, de acordo com Papias, o apstolo Joo e seu irmo, Tiago, morreram a morte dos mrtires. Ns sabemos que Tiago foi morto, por ordem de Herodes Agripa I, por volta de 44 d.C., e que Pedro sobreviveu a ele (At 12). Ora, se Joo tivesse sofrido o martrio na m esm a ocasio, ele no pode ter sido o autor do Quarto Evangelho. Prova: o autor deste Evangelho sobreviveu at mesmo a Pedro (Jo 21.18-24). Essa a essncia deste primeiro argumento.

    As passagens importantes no Cdice supra mencionado so as seguintes (observe as palavras que colocamos em itlico):

    Depois de Domiciano, Nerva reinou p o r um ano. Foi ele quem. trouxe Joo da ilha, e perm itiu que vivesse em feso. Ele era o nico dos doze apstolos que ainda estava vivo por aquela poca, e, depois de com por o Evangelho que leva seu nome, fo i julgado digno do martrio. Papias, bispo de Hierpolis, que o conhecia pessoalmente, diz, no segundo livro de seus Orculos do Senhor, que ele foi morto pelos judeus. Desse modo, juntam ente com seu irmo, ele cum priu a profecia de Cristo: ... o clice que eu bebo, vocs bebero, e com meu batismo vocs sero batizados . E claro que aconteceria desse modo, porque Deus no fala nada falso! Na sua exegese de Mateus, Orgenes, o muito estudioso, tambm confirma o martrio de Joo, com base nas informaes que havia recebido dos sucessores dos apstolos. Alm do mais, Eusbio, o grande historiador, diz, em sua Eclesias-

    Robcrts, C. H.. An Unpublished Fragment o f lhe Fourth Gospel. Manchesler, 1935. Robertson. A. T., .lohn. in Word Pictures, Nova York e Londres, 1932. vol. V. especialmen

    te pp. Ix-xxvii (Introduo).Robinson. J. A., The Historical Character o f St. .lolin's Gospel. Londres e Nova York. 1908. Sanday. W., The Authorship and Historical Character o f the Fourth Gospel, Londres, 1872. Sanday. W,. The Crilici.sm o f the Fourth Gospel. Oxford, 1905.Scott, E. R. The Fourth Gospel. Its Purpose and Theology. Edimburgo, 1906 Slrachan. R. H., The Fourth Evangelist. Dramatist or Historian? Londres, 1925.Streeter, B. H., The Four Gospels. Nova York. 1925.Taylor, Vicent, The Fourth Gospel and Some Recent Criticism, in Contemporary Thinking

    About .lesus (organizado por T. S. Kepler), Nova York, Nashville, 1944, pp. 99-106.

    16 COMENTRIO DO NOVO TESTAMENTO

  • ical History:: Prtia caiu, por sorte, para Tom; enquanto que a sia caiu para Joo. Ali ele viveu, tendo morrido em feso .

    Observe, antes de tudo, que apesar de esse manuscrito declarar que Joo, de acordo com Papias, foi morto pelos judeus, outros m anuscritos desse autor dizem que ele descansou em paz.

    Em segundo lugar, esse relato tambm no declara que Joo e Tiago sofreram o martrio ao mesmo tempo.

    E, finalmente, tambm de acordo com esse testemunho, o apstolo Joo apresentado como tendo vivido em feso depois do seu retorno de Patmos. e tendo morrido ali depois de ter escrito o Evangelho que leva seu nome.

    Portanto, o que acontece que os crticos, na sua tentativa de refutar a posio conservadora, que afirma ter sido Joo o autor do Quarto Evangelho, apelam para um documento que declara, explicitamente, que pelo menos esse elemento da viso tradicional est correto!

    Com relao ao martrio de Joo e Tiago, existe tambm um manuscrito (Baroccianus 142), que foi publicado por C. De Boor (7e\:- tc und Untersuchungen, vol. 2, p. 170), e que apresenta a obra de I'ilippus Sidetus, um historiador da igreja, que viveu no comeo do 5 sculo. O manuscrito contm a seguinte declarao:

    Papias, bispo de Hierpoles, um discpulo de Joo, o Telogo, e um companheiro de Policarpo, escreveu cinco livros de mensagens do Senhor... No segundo livro, Papias diz que Joo, o Telogo, e Tiago, seu irmo, foram mortos pelos judeus .

    Tambm existem antigos calendrios eclesisticos nos quais se comemora o martrio comum de Tiago e Joo.

    Com relao a isso, ainda procedente o argumento detalhado de j. A. Robinson, The Historical Character o f St. Jo h n s Gospel, Londres e Nova York, 1908, pp. 64-80. Sua concluso a seguinte:

    No h evidncia suficiente para lanar srias dvidas sobre a tradio universal da igreja, de que So Joo, o Apstolo, morreu em paz na cidade de feso, como um ancio de idade muito avanada. A declarao atribuda a Papias, de que Joo e seu irmo Tiago foram mortos pelos judeus, goza de pouca autoridade. quase inconcebvel que, se Papias tivesse realmente dito isso, Irineu, Eusbio e outros, que

    INTRODUO 17

  • leram sua obra, no tivessem feito neniiuma referncia a ela. E no difcil de se explicar que a atribuio dessa declarao a Papias devase a uma interpretao descuidosa. Alm disso, essa contradio, isolada da tradio geral, no encontra qualquer apoio, tanto na descrio ocasional do apstolo como um mrtir, quanto na posio da com em orao do seu martrio, nos calendrios da igreja. A palavra mrtir , que um vocbulo grego comum para indicar um a testem unha, no era originalmente restrita queles que haviam selado seu testemunho com o prprio sangue .

    A respeito deste assunto, no devemos desprezar o fato de que, nos escritos antigos, vrias pessoas por nome .loo so, em muitos casos, confundidas umas com as outras. E o mesmo tambm se aplica com relao a Tiago. Se Papias disse: Joo e Tiago, ele pode muito bem ter se referido a Joo Batista e tanto a Tiago, o filho de Zebedeu, quanto a Ticigo, o irmo do Senhor. Este ltimo foi, de acordo com Josefo e Eusbio, morto pelos judeus . Pelo menos ns sabemos que Sidetus no est citando Papias corretamente, pois o ttulo -- o Telogo - s foi usado para designar o apstolo Joo muito mais tarde. Papias com certeza no deve t-lo usado. Conseqentemente, toda a citao com ea a parecer meio dbia. Ser que Sidetus realmente leu Ptipias, ou apenas leu Eusbio, e mesmo assim o interpretou erroneamente? Certamente que o ttulo, tratado acadmico, no pode ser dado a uma inferncia (a respeito da autoria do Quarto Evangelho) baseada numa citao corrompida das palavras de um escritor (supostamente P apias), com reputada "pequena inteligncia", cuja citao os crticos acharam num resumo da obra de um historiador impreciso!

    E, em relao ao calendrio eclesistico, um a das primeiras listas cartaginesas de mrtires, diz o seguinte:

    Dec. 25 viii Kal. Jan. Domini nostri Jesu Christi, fllii Dei.Dec. 27 vi Kal, Jan. Sancti Johannis Baptistae, et Jacobi Apos-

    toli, quem Herodes occidit.

    Aqui tambm Tiago e Joo so comemorados juntos, embora o Joo a quem se faz referncia seja o Joo Batista! Numa antiga lista siraca de mrtires, Joo e Tiago, os apstolos de .Jerusalm, so postos jun tos. A esse respeito, concordamos com a afirmao de W. M. Ramsay:

    18 COMENTRIO DO NOVO TESTAMENTO

  • O fato de Tiago e Joo, que no foram sacrificados na mesma ocasio, serem comemorados juntos, uma evidncia muito fraca de que Joo tenha sido morto, num estgio inicial, em Jerusalm . Essa com emorao conjunta pode simplesmente indicar que Tiago e Joo, que eram proeminentes entre os Doze, eram tambm irmos, bem como pode ser um a interpretao equivocada da profecia de Cristo, em M arcos 10,39, relacionada a eles.

    (2) E. R. Goodenough, em seu artigo John a Primitive Gospel JBL 64 (1945, p. 148), afirma que o entendimento de que o apstolo Joo escreveu o Quarto Evangelho j havia, no comeo do sculo 4" d.C., sido rejeitado principalm ente por Eusbio, que cita uma sentena de Papias na qual ele m enciona dois Joos, com o se gundo sendo no o apstolo, mas um ancio (presbtero). A concluso qual Eusbio chega que esse presbtero Joo foi o escritor do Evangelho .

    Porm, 0 que declarado nesse artigo, com relao a Eusbio, tambm no verdadeiro," pois esse historiador nunca disse que o ancio ou o presbtero Joo (para distingui-lo do apstolo Joo) escreveu o Quarto Evangelho. Eusbio, definitivamente, acreditava que o apstolo Joo era o evangelista. Devemos adm itir ser deplorvel que ele tenha inventado uma pessoa fictcia. Ns concordamos com a declarao de T. Zahn: Sem entrarmos em muitos detalhes, seguro dizer que o presbtero Joo um produto da fraqueza crtica e exegtica de E usbio {The New Schqff-H erzog Encyclopedia o f R eligious Knowledge, artigo John the Apostle). No h nenhuma evidncia histrica que indique que essa pessoa tenha sequer existido. Entretanto, os crticos tm escrito inmeras pginas acerca dessa nebulosidade (ver, p. ex., B. H. Streeter, The Four Gospels, Nova York, 1925, cap. 14).

    A declarao de Papias, que confundiu Eusbio, foi a seguinte: E eu no devo hesitar em aceitar todas as interpretaes que tenho aprendido dos presbteros, as quais devo recordar muito bem, pois estou inteiramente seguro da sua verdade. Porque, diferentemente de muitos, eu no me regozijo com os que falam muito, mas sim com os que ensinam

    2. Cf. R. R Casey. "Prof. Goodenough and the Fourth Gospel". JBL 64 (1945), pp. 535542.

    INTRODUO 19

  • a verdade; no com aqueles que recontam os mandamentos de outros, mas com aqueles que repetem os que foram dados pelo Senhor, e so derivados da prpria verdade. Mas, sempre que vem algum, que tem seguido os presbteros, eu lhe pergunto sobre as palavras dos presbteros, ou seja, aquilo que Andr, Pedro, Filipe, Tom, Tiago, Joo, Mateus, ou qualquer outro dos discpulos do Senhor tem dito, e o que Aristio e o presbtero Joo, os discpulos do Senhor, esto dizendo (Eusbio, Ecie- siastical History, III, xxxix, 3-4).

    A maneira mais natural de interpretar as palavras de Papias seria entend-las como um a referncia, em ambos os casos, ao'mesmo Joo (que tambm chama a si mesmo de o presbtero, em duas epstolas do Novo Testamento, comumente conhecidas como 2 e 3 Joo). Se tivermos em mente que, como a tradio crist diz, o apstolo Joo viveu at um a idade muito avanada, sobrevivendo a todos os outros apstolos, ento no difcil entender por que Papias, depois de ter primeiramente includo Joo no grupo de discpulos, o m enciona um a vez mais: ele, que havia dito algumas coisas enquanto os outros discpulos ainda estavam vivos, ainda estava dizendo-as, mesmo depois da morte deles.

    Mas Eusbio da opinio de que Papias estava pensando em dois Joos, o primeiro deles sendo o apstolo e escritor do Quarto Evangelho, enquanto o segundo (o presbtero) seria o autor do livro do Apocalipse. No que diz respeito autoria do Apocalipse, Eusbio foi claramente influenciado por Dionsio (200-265 d.C.), cujos argumentos vigorosos, apresentados contra o entendimento tradicional, merecem um estudo cuidadoso, mesmo que discordemos de suas concluses. Ser que essas concluses deveram-se, pelo menos em parte, sua averso ao quiliasmo, que estava sempre apelando para Apocalipse 20? Sobre isso, ver o livro de N. B. Stonehouse, The Apocalypse in lhe Early Church, p. 151. Porm, para o nosso propsito presente, a pergunta : De acordo com Eusbio, quem escreveu o Quarto Evcmgelho? A resposta se tornar evidente diante do seu comentrio sobre as palavras de Papias, que mencionamos acima. Eusbio as interpreta da seguinte maneira (observe as palavras que colocamos em itlico):

    digno de nota que ele mencione o nome de Joo por duas vezes, e inclua o prim eiro Joo com Pedro, Tiago, M ateus e os

    20 COMENTRIO DO NOVO TESTAMENTO

  • outros apstolos, claramente significando o evangelista, enquanto que, mudcuido sua declarao, coloque o segundo ju n to com os outros, que no faziam parte do nmero dos apstolos, pondo Aristio na frente dele e o chamando claramente de presbtero . Isso confirma a verdade da histria daqueles que tm dito que existiram dois discpulos com o mesmo nome na sia, e que existem dois tmulos em feso, ambos ainda chamados tmulos de Joo. Isso chama nossa ateno: Porque provvel que o segundo (a menos que algum prefira 0 outro) viu o Apocalipse, que passa a ser conhecido pelo nome de Joo (Eusbio, op. cit., III, xxxix, 5-6) .

    Claramente, ento, Eusbio considera o segundo Joo, ou o presbtero, como tendo sido o provvel autor do livro do Apocalipse. Entretanto, importante que enfatizemos que ele considerava que Joo, o apstolo, era o evangelista que escreveu o Quarto Evangelho. Ele expressa a mesma convico em III, xxiv, 5.

    Assim, esse apelo dos crticos a Papias falha to completamente quanto falharam os outros. A fonte para a qual os crticos apelam confirma o entendimento tradicional!

    (3) Os algios, uma seita hertica da Asia Menor, atribuiu, por volta de 170 d.C., a autoria do Quarto Evangelho e do Apocalipse a Cerinto. Portanto, isso mostra que, j naquela poca, havia dvida a respeito da autoria jocuiina.'"

    Esse argumento no to formidvel quanto aparenta. Atribuir a Cerinto um Evangelho que proclama, claramente, tanto a divindade de Jesus como a encarnao da Palavra (ou Logos), absurdo, pois esses dois pontos de f eram exatamente os que aquela seita hertica negava. Isso seria um absurdo equivalente a tentar atribuir-se ao papa o Comentrio de Glatas, escrito por Luterol Os algios, como Epi- fnio sugeriu ao dar-lhes esse nome, eram os oponentes ilgicos do Evangelho do Logos, e os rejetadores irracionais da Razo divina e pessoal.

    A teoria desses algios, apesar de ser absurda, contm um elem ento de valor: ela, pelo menos, mostra que essa seita reconhecia que o Quarto Evangelho havia sido escrito numa data muito antiga da histria

    3. Ver, por exemplo, M. Goguel, Le Quatrime vangile. Paris, 1923, pp. 161-162.

    INTRODUO 21

  • da igreja, pois, de acordo com a tradio, Joo e Cerinto eram contem porneos. E se o Quarto Evangelho for assim to antigo, os crticos ainda so confrontados com um enigm a insolvel, declarado nas pginas iniciais deste comentrio.

    (4) A Cristologia deste Evangelho elevada dem ais para ter sido escrita por um. discpulo da prim eira gerao de cristos.''

    Porm, este no nem mesmo um argumento. Isso significa adm itir como verdadeiro algo que ainda precisa ser provado. Trata-se de um a afirmao audaciosa, pois na verdade no existe um a nica prova. Alm do mais, um a pergunta pode muito bem ser feita; A Cristologia de Paulo menos sofisticada e mais baixa do que esta? A resposta inquestionvel pode vir da leitura de Colossenses 2.9 ou Filipenses 2.6, ou ainda da muito perturbadora passagem de Romanos 9.5, que, por mais que os crticos tentem, nunca conseguem ser bem-sucedidos em elim in-la como um texto-prova da divindade de Cristo, E, o que dizer da Cristologia dos sinticos? Ser que ela m enor do que esta? Leia M ateus 11.27, 28.

    (5) Na form a como esto registrados, os acontecim entos no apresentam progresso ou desenvolvimento. Desde o comeo, Jesus o M essias, o Filho de Deus. Quase que desde o com eo, seus inimigos planejam sua morte. E difcil acreditar que um dos doze teria escrito dessa maneira. Alm do mais, isso o oposto do que se encontra nos Sinckicos.

    Este argumento no faz justia aos fatos:a. Desde o comeo, Jesus reconhecido como o M essias; no

    somente no Quarto Evangelho, mas tambm nos Sinticos. Nos Sinticos, ele reconhecido por Joo Batista (Mc 1.7, 8) e pelos demnios (Mc 1.24, 34; 3.11). Em Joo, Joo Batista, Andr, Filipe e Natanael (captulo 1) reconhecem sua messianidade.

    b. O fato de o reconhecimento de Jesus como o M essias e Filho de Deus receber uma nfase maior no Quarto Evangelho do que nos demais se deve ao propsito declarado do autor, como registrado em Joo 20.31; para que continuem a acreditar que Jesus o Cristo, o Filho de Deus . Dentre todos os inmeros fatos, o escritor escolheu cuidado-

    4. Cf. E. F. Scou, The Literature o f the New Testainent, Nova York, 1940, p. 242.

    22 COMENTRIO DO NOVO TESTAMENTO

  • sainente os que mais se encaixavam na execuo do seu objetivo. Ele, freqentemente, omite o que os Sinticos j tinham registrado (ver p. 49).

    c. Se Jesus realmente o M essias, o Filho de Deus, e se seu aparecimento, desde o comeo, produziu admirao e assombro (cf. Mc1.27, 28), ento no difcil aceitar que um dos doze tenha escrito dessa maneira .

    d. Entretanto, h uma progresso no reconhecimento de Jesus como 0 Messias e Filho de Deus. Os discpulos vem mais da sua glria em 2.1 1 do que no captulo 1. Se esse no fosse o caso, qual seria o propsito de se mencionar isso em 2 .11 ? No podemos assumir que, inicialmente, os discpulos tenham concebido o ofcio messinico como sendo, at certo ponto, terreno e nacionalista? Mas quando, por ocasio do milagre da alimentao dos cinco mil, Jesus abala as esperanas da multido, ao m ostrar claramente que ele no era o tipo de Messias que eles esperavam, levando muitos dos seus discpulos a abandonarem-no (Jo 6.66), Simo Pedro, diante da pergunta que Jesus fez aos Doze se eles tambm o abandonariam, responde: Senhor, para quem iremos? O senhor tem as palavras da vida eterna; e ns cremos e conhecemos tiue o senhor o Santo de Deus (Jo 6.67-69).

    Essa confisso, sob as circunstncias ali vividas, deve ser considerada como um passo adiante. E la mostra um progresso real, apesar de no eliminar os momentos posteriores de recorrente ignorncia e dvida. Uma confisso at mais importante dos discpulos feita em 16.30: Agora, vemos que o senhor sabe todas as coisas e no precisa de que algum pergunte ao senhor; por isso, cremos que de fato o senhor veio de D eus. Aqui, pelo menos por um momento, a luz radiante do dia penetra nas nuvens de tristeza e ignorncia. Os discpulos comeam a reconhecer Jesus, num sentido ontolgico, como o Filho de Deus.

    A gloriosa exclamao de Tom: Senhor meu e Deus m eu! (Jo 20.28) deve ser vista luz de todo o contexto precendente (20.24-27), no qual o Senhor ressurreto revela sua oniscincia (cf. 16.30). Contudo, mesmo nessa adorao falta a perfeio, como Joo 20.29 claramente indica. O Quarto Evangelho nos mostra que um a medida mais completa de conhecimento, em relao pessoa e obra de Jesus, seria dada mais tarde, no Pentecostes e no perodo que se seguiria a esse acontecimento. Ns lemos:

    INTRODUO 23

  • Tenho ainda muito o dizer a vocs, mas vocs no o poderiam suportar agora; quando vier, porm, o Esprito da verdade, ele os guiar a toda a verdade, porque no falar por si mesmo, mas dir tudo o que tiver ouvido e anunciar a vocs as coisas que ho de vir (Jo 16.12, 13).

    Assim, podemos afirmar, luz da passagem citada acima, que o Evangelho de Joo

  • de Cristo. Nos captulos ] e 2 (1.51; 2.19), essa auto-revelao pode ser considerada no to avanada quanto nos captulos mais frente. Subseqentemente, .lesus muitas vezes apresentado no ato de reveJar seu ofcio e divindade messinica. Mas o significado compreensivo desta doutrina no pode ser revelado at a descida do Esprito Santo (16.12, 13). O mesmo tambm se aplica s outras doutrinas concernentes pessoa e obra do Senhor (13.7).

    Com relao confisso dos discpulos, o progresso relatado neste Evangelho j foi indicado.

    Com relao prpria posio do autor, ela sempre a mesma, ao longo de todo o livro.

    e. Semelhantemente, com respeito ao plano para matar Jesus, tambm existe progresso e desenvolvimento no Quarto Evangelho. Tambm, a este respeito, devemos nos lembrar que o autor goza da grande vantagem da perspectiva histrica. Ao escrever muitos anos depois dos acontecimentos registrados no livro, ele discerne o fin a l no comeo; o ^dlho no broto.

    Assim, ele v a disposio de m atar Jesus, estabelecida no corao c na mente dos lderes judeus, imediatamente depois da aparente quebra do sbado, quando Jesus curou o paraltico, em Betesda, e chamou Deus de Pai (5.17, 18), Por ocasio da Festa dos Tabernculos, esses lderes fizeram um a tentativa abortada de prender Jesus (7.32). Um pouco mais tarde, os judeus chegaram at mesmo a pegar em pedras para arremess-las sobre o Senhor (8.59). A reunio formai do Sindrio, na qual se exigiu a execuo de Jesus, somente acontecer algum tempo mais tarde. Ela vir depois da ressurreio de Lzaro e da enorme fama gozada por Cristo, como conseqncia desse tremendo milagre. Os planos so de fato formalmente estabelecidos por um grupo e uma assemblia legalmente oficiais (11.47-53; cf, 12.10, 11). O julgamento vem logo a seguir (cap. 18), e Jesus entregue pelos judeus nas mos dos gentios. Em tudo, essa narrativa m ostra progresso e desenvolvimento.

    (6) Se os Sinticos foram escritos por (ou baseados nos relatos de) testemunhas oculares, ento impossvel acreditar que o apstolo Joo, ou qualquer outra testemunha ocular, tenha escrito o

    INTRODUO 25

  • Quarto Evangelho, pois as diferenas so muitas e muito grandes. Nossa resposta a seguinte;

    a. No h contradio quanto doutrina.Ainda est para ser demonstrada a existncia de qualquer diferen

    a doutrinria entre os Sinticos e Joo. Certamente, a abordagem diferente. Os Sinticos indicam que este homem, chamado Jesus, o profeta de Nazar, o M essias, o Filho de Deus. O Quarto Evangelho, por outro lado, ensina que o Filho de Deus tornou-se encarnado. Essas duas idias se encaixam de maneira bela e perfeita.

    b. O esquema geral dos acontcimentos tambm o mesmo em ambos os casos.

    Em ambos, somos introduzidos ao ministrio de Joo Batista. Em ambos, Jesus retratado como Aquele que fala a grandes multides e opera milagres.

    Em ambos os casos, ele alimenta os cinco mil e caminha sobre a gua. Ele tambm se retira do meio da multido que o havia rejeitado, e ensina seus discpulos.

    Em ambos, ele entra triunfantemente em Jerusalm e ungido em Betnia. Ele tambm descrito como participando de uma refeio com seus discpulos, durante a qual o traidor. Judas, foi indicado.

    Em ambos, ele adverte seus discpulos contra a desero e, subseqentemente, entra no Getsmani. Logo a seguir, ambos os textos relatam sua priso e seu julgam ento diante de (Ans, em Joo, e depois) Caifs. Tambm relata-se em ambos a negao de Pedro, o julgam ento perante Pilatos, a cracificao, a viglia das mulheres e a visita delas ao tmulo, do qual o Senhor havia ressuscitado.

    Algumas vezes tem-se feito um a tentativa de reduzir a semelhana entre os Sinticos e Joo a dois blocos de pensamentos; o material contido em Joo 6 e a histria da semana da Paixo, que comea no captulo 18. Mas isso no justo, pois, antes de tudo, a semelhana entre Joo 1.32, 33 e Marcos 1.10 notvel. Alm disso, a uno em Betnia e a entrada triunfal em Jerusalm so relatadas em Joo 12, e tambm encontram-se nos Sinticos (Mc 14; M t 21; Mc 11; Lc 19). O cenrio histrico para os acontecimentos que envolvem a Ceia do Senhor e os discursos da Ceia encontra-se em Marcos 14.12-18, ou seja,

    26 COMENTRIO DO NOVO TESTAMENTO

  • num dos Sinticos. Portanto, quem ainda no fechou a mente para a possibihdade de os Sinticos e Joo estarem se referindo mesma Ceia, ver que o material que se encontra nos captulos 13-17 de Joo encaixa-se no quadro de Marcos. E, mesmo o M inistrio Inicial na Judia, de Joo 2.13-4.42, e o Ministrio Posterior na Judia, de Joo 7.1-10.42, no conflitam com nada que se encontra nos Sinticos. Ser que M ateus 23.37-39 no est at mesmo sugerindo que houve uma extensiva atividade na Judia? E Lucas 4.44, de acordo com a interpretao que apoiada pelos melhores manuscritos, no ensina que Jesus estava pregando nas sinagogas d Ju d ia l Cf. tambm Lucas 5.17, que pressupe que os fariseus e doutores da lei haviam tomado conhecimento das aes de Cristo na Judia. E, por outro lado, no possvel que Joo 2.12; 4.43-54 e o captulo 6 mostrem que o Quarto Evangelho permite a existncia das atividades de Cristo na Galilia?

    c. As palavras de Jesu s, conforme se encontram nos Sinticos, no so inconsistentes com. aquelas registradas no Q uarto ilvangelho.

    O.s Sinticos diferem, em muitos aspectos, do Quarto Evangelho, como poderemos ver abaixo. Isso tambm aparente nas palavras e no.s discursos de Jesus. Mas as diferenas no so fundamentais. O tom das palavras e dos discursos mencionados em Joo no , em hiptese nenhuma, inconsistente com o tom do registro encontrado nos Sinticos. E a inconsistncia, e no meramente a diferena, que os crticos devem provar, se quiserem que seu argumento seja considerado. Usando a traduo Revista e Atualizada para esta lista, o que realmente encontramos, o seguinte:

    JOO:

    3.3: A islo, respondeu Jesus: Em ver- Mateus 18.3: E disse: Em verdade vosdade, em verdade te digo que, se al- digo que, se no vos converterdes egum no nascer de novo, no pode no vos tornardes com o crianas, dever o reino de Deus. modo algum entrareis no reino dos

    cus.

    3.5: ...Quem no nascer da gua e do M arcos 10.23: "Quo dificilmenteEsprito no pode entrar no reino de entraro no reino de Deus os que tmDeus. riquezas .

    INTRODUO 27

  • 28 COMENTRIO DO NOVO TESTAMENTO

    4.35: No dizeis vs que ainda h quatro meses at ceifa? Eu, porm, vos digo: Erguei os olhos e vede os campos, pois j branqueiam para a ceifa,

    3,35; 10.15; 14.6: O Pai ama ao Filho, e todas as coisas tem confiado s suas m os...O Pai me conhece a mim, e eu conheo o Pai;... Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida; ningum vem ao Pai seno por m im .

    5.8, 9: Levanta-te, toma o teu leito e anda.

    5,35,36: Ele (Joo Batista) era a lmpada que ardia e alumiava... M as eu tenho maior testem unho do que o de Joo .

    5.39: Examinais as Escrituras, porque julgais ter nelas a vida eterna, e so elas mesmas que testificam de mim.

    6.20: Sou eu. No temais!

    6.44-46: Ningum pode vir a mim se o Pai, que me enviou, no o trouxer; e eu 0 ressuscitarei no ltimo dia... No que algum tenha visto o Pai, salvo aquele que vem de Deus; este o tem visto .

    8.12; 12.36: Eu sou a luz do mundo... Enquanto tendes a luz, crede na luz, para que vos torneis filhos da luz .

    Mateus 9.37: E ento se dirigiu a seus discpulos: A seara na verdade grande, mas os trabalhadores so poucos .

    Mateus 11.27,28: Tudo me foi entregue por meu Pai. N ingum conhece o Filho seno o Pai; e ningum conhece o Pai seno o Filho e aquele a quem o Filho o quiser revelar. Vinde a mim, todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei .

    Marcos 2.9 (numa ocasio diferente): Levanta-te, toma o teu leito e anda?

    M ateus 11.11: Em verdade vos digo: entre os nascidos de mulher, ningum apareceu maior do que Joo Batista; mas 0 menor no reino dos cus maior do que ele .

    Lucas 24.44, 45: Imporrava se cum prisse tudo o que de mim est escrito na Lei de M oiss, nos Profetas e nos Salmos. Ento, lhes abriu o entendimento para com preenderem as Escrituras".

    Marcos 6.50: Tende bom nimo! Sou eu. No temais!

    M ateus 1 1.27, 28: citado acima.

    M ateus 5.14-16: Vs sois a luz do m undo...Assim brilhe tambm a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem a vosso Pai que est nos cus .

  • INTRODUO 29

    12,25: Quem ama a sua vida perde-a; mas aquele que odeia a sua vida neste m undo preserv-la- para a vida eterna .

    12.27: Agora est angustiada a minha alma, e que direu eu? Pai, salva- me desta hora? M as precisam ente com este p ropsito vim para esta hora .

    13.16, 20: Em verdade, em verdade vos digo que o servo no m aior do que seu senhor, nem o enviado, maior do que aquele que o enviou... em verdade vos digo: quem recebe aquele que eu enviar, a mim me recebe; e quem me recebe recebe aquele que me enviou .

    1.13S: Em verdade, em verdade te digo t|iic Jamais cantar o galo antes que inc negues trs vezes .

    Lucas 9.24: pois quem quiser salvar a sua vida perd-la-; quem perder a vida por m inha causa, esse a salvar .

    M ateus 26.37, 38; E...comeou a entristecer-se e a angustiar-se. Ento, lhes disse; A minha alma est profundam ente triste at m orte . Cf. tam bm Lucas 12.50.

    M ateus 10.24, 40; O discpulo no est acima do seu mestre, nem o servo, acim a do seu senhor... Quem vos recebe a mim me recebe; e quem me recebe recebe aquele que me enviou .

    M ateus 26.34; Em verdade te digo que, nesta mesma noite, antes que o galo cante, tu me negars trs vezes .

    verdade que .Tesus, nos Sinticos, muitas vezes fala por parbolas. O mesmo no acontece em Joo. Mas, realmente to estranho assim que ele, que declarou as palavras do reino conforme se encontram em Joo 3.3-5, possa tambm contar as parbolas do reino? E deve a figura do Bom Pastor, em Joo 10, ser considerada com o impossvel de ter sido dita pela boca daquele que contou a parbola da ovelha perdida, em Lucas 15?

    10.27, 28; As minhas ovelhas ouvem a minha voz; eu as conheo, e elas me seguem. Eu lhes dou a vida eterna; Jamais perecero, e ningum as arrebatar da m inha m o .

    Lucas 15.3-6; Ento lhes props Jesus esta parbola; Qual dentre vs o homem que, possuindo cem ovelhas, e perdendo uma delas, no deixa no deserto as noventa e nove e vai em busca da que se perdeu, at encontr- la? Achando-a, pe-na sobre os om bros, cheio de Jbilo. E, indo para casa, rene os amigos e vizinhos, dizendo- lhes: Alegrai-vos comigo, porque J achei a minha ovelha perdida .

  • d. No fo i provado, nem mesmo nos detalhes secundrios, que o Quarto Evangelho esteja em conflito com os Sinticos.

    Tem-se afirmado que, com base em Joo 13.1, 29 e 18.28, o Quarto Evangelho est em conflito com os Sinticos, os quais, claramente ensinam que Jesus comeu a Pscoa no tempo normal (Mc 14.12; Lc 22.7). Mas seria de fato muito estranho se a ceia descrita em Joo 13, que diferente de um a maneira notvel e que, em relao qual, houve tantos acontecimentos importantes, no fosse a ceia normal da Pscoa que foi servida na quinta-feira noite, o dia quatorze do ms de Nisan. De fato, a combinao; antes da Festa da Pscoa (v. 1), seguida por; Durante a ceia (v. 2), parece indicar que a refeio aqui indicada a Ceia da Pscoa. Quando se argumenta que essa Ceia da Pscoa, em harmonia com Nmeros 28.16, 17, era seguida por sete dias de celebrao, e particulamente pelo banquete juhWoso da Pscoa (no dcimo quinto dia de Nisan), o que se est tentando encontrar um a soluo para a ltim a clusula de 18.28. Qualquer que seja seu mrito, ela pelo menos se apresenta como sendo mais razovel do que a teoria de que o Quarto Evangelho devota um espao exagerado - cinco captulos! - , bem como confere muita importncia a um a ceia que, supostamente, foi com ida na noite anterior grande Ceia da Pscoa.

    De acordo com Joo 19.14, era cerca da hora sexta quando Pilatos levou Jesus para fora e sentou-se na cadeira do juzo, num lugar chamado Gbata. De acordo com M arcos 15.25, Jesus foi crucificado por volta da hora terceira. No precisamos concluir precipitadamente que existe um conflito aqui. Uma soluo razovel a seguinte: Joo descreve a maneira romana de medir o tempo, contando as horas que vo da meia-noite ao meio-dia, assim como o fazemos no dia de hoje (D. C. G , art. Hour). Portanto, quando ele diz hora sexta, essa indicao poderia significar algo entre seis e seis e m eia da manh. Por outro lado, o evangelista M arcos mede o tempo de acordo com a m aneira judaica, e portanto nos informa que Jesus foi crucificado cerca de trs horas depois do nascer do sol. Essa soluo no somente resolve o aparente conflito, como tambm, um a vez adotada, ajuda a tornar claras outras passagens do Quarto Evangelho. Ver as explicaes de 1.39; 4 .6 ,52 ,53 .

    (7) Os argumentos de menor importncia, geralmente muito sub

    30 COMENTRIO DO NOVO TESTAMENTO

  • jetivos em carter, e que portanto no exigem uma refutao detalhada, so os seguintes:

    a. Um ju d eu de nascim ento no poderia ter escrito de modo to injurioso a respeito dos prprios judeus, apresentando-os como os prprios inimigos de Deus (5.18; 7.1; 9.22). Alm do mais, ele no usaria o pronom e na terceira pessoa ao se referir a eles. A resposta que damos a seguinte: Quando o apstolo Joo escreveu esse Evangelho, os judeus, como um a nao, tinham rejeitado o Cristo. Alm do mais, os que inicialmente haveriam de ler este livro eram, em sua grande maioria, cristos gentios. portanto natural que, ao escrever a eles, o autor use a terceira pessoa em referncia aos judeus.

    b. Um discpulo de Jesus no atribuiria a Cristo o mesmo estilo de discurso que ele mesmo [o discpulo] usaria. Resposta: Apesar de ser, em alguns casos, difcil de determinar onde Jesus termina e Joo comea (ver, p. ex., 3.16-20; 12.44-50), esse fato no deveria nos causar nenhuma surpresa. Ns deveramos nos lembrar que o autor era o discpulo a quem Jesus amava. Ele estava to prximo de Jesus que comeou a pensar como Jesus, a falar como seu M estre e a escrever IR) mesmo estilo usado por ele.

    c. Se o apstolo Joo escreveu o Apocalipse, ele no pode ter escrito o Evangelho, pois os dois so muito diferentes, no somente em contedo, mas tambm nas caractersticas de linguagem.

    Para sugestes de possibilidades de soluo para este problema difcil, ver o livro. More than Conquerors, de m inha autoria (Grand Rapids, Mich, 1940; pp. 17-19. Ver tambm p. 37). Tudo o que desejamos dizer a este respeito que durante o tempo em que morou em feso e escreveu o Evangelho, Joo pode tambm ter tido auxiliares que, sob a orientao do Esprito Santo, e sujeitos aprovao final do apstolo, que assumia responsibilidade pelo contedo e influenciava, at certo ponto, o estilo e a fraseologia, o ajudaram em seus escritos. Cf. 21.24. A ausncia desses ajudadores, quando ele escreveu o Apocalipse, pode explicar, pelo menos em parte, as diferenas lingsticas (cf. A. T. Robertson, Word Pictures in the New Testament, Nova York e Londres, 1932, vol. V, p. xix). De qualquer maneira, a menos que conheamos completamente todas as circunstncias envolvidas na confeco de cada livro, seria precrio dizer, de forma categrica, que.

    INTRODUO 31

  • quem quer que tenha escrito o Apocah'pse, no pode ter escrito o Quarto Evangelho.

    Acredito que j dissemos o suficiente a respeito da inadequao dos argumentos apresentados pelos crticos.

    A respeito da suposio de que o Evangelho de Joo foi escrito por ltimo, e que seu propsito difere do dos Sinticos, o principal problema j foi resolvido, pelo menos em grande parte.

    De acordo com as informaes fornecidas pelo prprio Evangelho, o autor dele era:

    (1) Vm judeu:a. Isso evidente pelo estilo. Ver p. 92.b. Isso tambm provado por seu grande conhecimento e fam ilia

    ridade com o Antigo Testamento, o qual ele capaz de citar, tanto diretamente do texto hebreu quanto da Septuaginta. Ver as seguintes passagens: 2.17; 10.34, 35; 12.40; 13.18; 17.12; 19.24,28,36, 37.

    c. Esse fato corroborado por suas referncias s crenas judaicas (e samaritanas), particularm ente as que se referem ao Messias: ] .41, 46 ,49; 4.25; 6.15; 7.27, 42; 12.34.

    d. Ele apoiado pela evidncia que indica que o autor conhece as condies polticas e religiosas da Palestina: 4,9; 7.35; 11.49; 18.13,28, 31, 39; e, tambm as festas e os rituais de purificao judaicos, a saber: A Pscoa: 2.13, 23; 6.4; 13.1; 18.28, talvez tambm 5.1; a Festa dos Tabernculos: 7.2, 37, 38; a Festa da Dedicao: 10.22, 23. Ver tam bm 3.25; 11.55; 12.12; 18.28,39; 19.31.

    e. Isso explica a maneira natural e fcil pela qual o autor introduz os costumes judaicos, praticados em casamentos e funerais: 2.1 - 10; 11.38, 44, 19,40.

    (2) Vm judeu da Palestina.Ele tem um conhecimento detalhado da topografia da Palestina:

    1.28,cf. l l . l ; 2 . l , 12 ;3 .23 ;4 .11 ,20 ; 11.54; 12.21; particularmente, de Jerusalm e sua vizinhana imediata: 5.2; 9.7; 11.18; 18.1; 19.17; e do Templo: 2.14, 20; 8.2; 10.22,23; 18.1,20,

    (3) Uma testemunha ocular.Como tal, ele se lembra da data dos acontecimentos, e algumas

    32 COMENTRIO DO NOVO TESTAMENTO

  • vezes at mesmo a hora exata dos mesmos: 1.29, 35, 39; 2.1; 3.24; 4.6, 40, 52, 53; 6.22; 7.14; 11.6; 12.1; 13.1,2; 19.14, 31; 20.1, 19,26.

    Ele sabe que Jesus estava exausto quando se assentou junto fonte (4.6); recorda as palavras ditas pelos vizinhos do homem que tinha nascido cego (9.8-10); ele prprio viu o sangue e a gua que saiu de ura dos lados de Jesus, perfurado pela lana de um dos soldados (19.3335); sabe o nome do servo do sumo sacerdote, cuja orelha foi decepada por Pedro (18.10); e tambm conhece o sumo sacerdote (18.15). Esses, e muitos outros detalhes, claramente mostram que o autor foi um a testemunha ocular dos acontecimentos que registrou em seu livro.

    (4) Um dos Doze.O fato de ter participado da Ceia com seu Senhor mostra que ele

    deve ter sido um dos Doze (13.23). Sua relao muito prxim a com Pedro aparentemente prova isso (1.35-42; 13.23, 24; 18.15, 16; 20.2; 21.20-23). O conhecimento ntimo das aes, das palavras e dos sentimentos dos apstolos aparentemente revela que o autor era um deles:

    17, 22; 4.27; 6.19; 12.16; 13.22, 28; e 21.21. E se algum ainda pode dizer que no est convencido de que, em todos esses casos, os discpulos, cujas reaes so mencionadas, pertencem ao grupo ntimo do Senhor, e portanto a inferncia que poderamos tirar no com pletamente convincente, ns chamamos sua ateno para outras passagens, onde a referncia claramente aos Doze : 6.66-71; 20.24-29. O autor sabe, com exatido, o que foi dito na intimidade do grupo. A concluso inescapvel que ele pertence ao crculo ntimo dos discpulos.

    Note tambm que em 1.35-51 um discpulo annimo mencionado, juntam ente com Andr, Simo Pedro, Filipe e Natanael, todos eles pertencendo aos Doze.

    (5) O Apstolo Joo.Esta certamente a inferncia mais natural de todos os fatos apre

    sentados. Devemos notar que o autor, apesar de mencionar outros apstolos por nome, nunca indica, de uma maneira distinta, Joo ou seu irmo Tiago. Esse fato importante, e parece apontar para a direo da identidade do escritor.

    Se aplicarmos um processo eliminatrio, no ser difcil de responder pergunta sobre quem o autor deste Evangelho.

    INTRODUO 33

  • H um a antiga rima que ajuda a lembrar o nome dos doze (cf. Mt 10.2-4; Mc 3.16-19; Lc 6.14-16; At 1.13):

    Pedro e Andr, Tiago e Joo,Filipe e Bartolomeu,

    Mateus e tambm Tom,Tiago o Menor, e Judas o Maior,

    Simo 0 Zelote, e Judas o Traidor ,

    Como o Quarto Evangelho tambm fala a respeito dos Doze (6.67, 70, 71; 20.24), podemos assumir que estejam se referindo ao mesmo grapo de homens. Qual deles foi o autor?

    Obviamente, podemos elim inar Judas, o traidor, imediatamente. Sempre que o autor o menciona, o chama por seu nome (6.71 ; 12.4; 13.2, 26,29; 18.2,3,5).

    Comparando 21.24 com o versculo 20, ns aprendemos que o escritor 0 discpulo que se reclinou sobre o peito de Jesus durante a Ceia. Definitivamente, ele no Pedro, de quem distinguido. Isso ainda deixa outros dez discpulos para escolher.

    Entretanto, o nome de M ateus pode ser eliminado imediatamente, pois ele associado com outro Evangelho. A seguir, um a pergunta precisa ser feita: Ser que o autor do Quarto Evangelho, que o amigo mais ntimo do Senhor (13.23), seria um discpulo mais ou menos obscuro, como Tiago o M enor (o filho de Alfeu), ou Simo o Zelote? Judas (chamado o M aior na rima, mas Judas de Tiago, Lebeu, Tadeu e Judas, no o Iscariotes, nas referncias das Escrituras), e tambm Tom (tambm chamado Ddimo) so mencionados pelo nome no Quarto Evangelho (14.5, 22). Isso os distingue claramente do autor, que no nomeado.

    Assim, ainda restam os nomes de Tiago, Joo, Andr, Filipe e Bartolomeu. Joo relata como Filipe levou Natanael a Jesus, e nas listas dos Doze, nos outros trs Evangelhos, Filipe e Bartolomeu so sempre mencionados juntos. Joo nunca menciona Bartolomeu; os Sinticos nunca mencionam Natanael. E assim muito provvel que o Natanael de Joo seja o Bartolomeu de Mateus, M arcos e Lucas, com Natanael sendo seu nome principal, e Bartolomeu indicando seu relacionamento

    34 COMENTRIO DO NOVO TESTAMENTO

  • l'ilial, que significa filho de Tolmai (cf. C. E. Macartney, O fthem He Chose Twelve, Filadlfia, 1927, pp. 63-64). E se o discpulo sem nome a mesma pessoa em todo o Evangelho, ns o encontramos tambm em 1.35-51. A ele claramente distinguido de Andr (v. 40) e de Simo Pedro (vs. 41,42), cujo nome j eliminamos com base na informao fornecida pelo captulo 21, de Filipe (vs. 43, 44) e de Natanael (Baitolomeu, vs. 45-51 ),

    Subtraindo tambm os nomes de Andr, Filipe e Natanael, somente restam Tiago e Joo. No entanto, claramente evidente, em 21.19-24, que 0 autor do Quarto Evangelho estava ainda vivo e dando testem unho quando o livro foi publicado pela primeira vez (note o tempo presente, no versculo 24), apesar de Pedro j ter recebido a coroa do martrio (v. 19). E apesar de sabermos que Pedro sobreviveu a Tiago (At 12), este ltimo no pode ter escrito o Quarto Evangelho. Assim, resta o apstolo Joo.

    Devemos observar que, na argumentao que temos desenvolvido, lemos baseado nossa concluso inteiramente nos dados fornecidos pelo prprio Quarto Evangelho. Uma comparao com os Sinticos confirma nossa concluso. Aprendemos em Joo 1.35-40 que o autor do QuartoI ivangelho foi um dos primeiros discpulos de Cristo, com os outros dois sendo Andr e Simo Pedro. O Evangelho de M arcos tambm tem uma lista dos primeiros discpulos (1.16-20, 29). Nela so mencionados quatro nomes: Simo, Andr, Tiago e Joo. Ao compararmos as duas listas, fica mais uma vez evidente que o discpulo sem nome, do Quarto Evangelho, um dos filhos de Zebedeu.

    As tentativas feitas para dim inuir a fora desses argumentos devem ser consideradas deficientes. Elas freqentemente se centram no fato de que em 21.2 h uma meno a dois outros discpulos (alm de Simo Pedro, Tom, Natanael e os filhos do Zebedeu). Os que advogam essas tentativas dizem que esses dois podem no ter pertencido ao grupo dos Doze, e que um deles - talvez o presbtero Joo? - pode 1er sido o autor. Mas todo esse arrazoado no consegue captar por completo o ponto central, por no levar em conta todas as evidncias que apresentamos nas pginas anteriores.

    Alm do mais, essa argumentao no ajuda em nada, pois mesmo que 0 autor no tenha sido o apstolo Joo, e sim algum discpulo obs

    INTRODUO 35

  • curo mencionado em 21.2, permanece o fato de que ele era um a testem unha ocular que, de acordo com a histria relatada em Joo 21, havia visto o Senhor ressurreto e proclam ou igreja de todas as pocas que Jesus o que afirmou ser Deus no sentido mais com pleto do termo (1.1-18), havendo sido reconhecido como o M essias, o Filho de Deus, por seus primeiros discpulos. Como isso possvel? Como isso pode ser explicado psicologicam ente? Em ltim a anlise, h somente um a soluo com pletam ente satisfatria para este problem a, e ela que Jesus de fato o que ele mesmo disse ser; O Messias, Filho de Deus e objeto de nossa adorao. Quando se aceita como verdade o testemunho dele e dos outros discpulos, os problemas comeam a desaparecer.

    O testemunho da igreja primitiva est em harmonia com a concluso apresentada pelo prprio Quarto Evangelho. Eusbio, depois de fazer um a investigao completa da literatura sua disposio, diz;

    Venham, vamos indicar os escritos inquestionveis desse apstolo. Deixemos que o Evangelho escrito por ele seja primeiro reconhecido, pois lido em todas as igrejas debaixo do cu... Assim Joo, no curso do seu Evangelho relata o que Cristo fez antes de o Batista ser lanado na priso, enquanto os outros evangleistas narram os acontecimentos posteriores ao aprisionamento de Joo Batista {Histria E clesistica III, xxiv, 1 -13). O famoso historiador escreveu essas palavras no comeo do sculo 4.

    Antes dele, Orgenes (ativo entre 210-250) declarou que Joo, o discpulo amado, escreveu tanto o Quarto Evangelho quanto o Apocalipse. Orgenes escreveu um comentrio do Evangelho, no qual diz;

    Os Evangelhos so quatro, apesar de que aquele que eu considero o mais importante deles ser o mesmo que voc (Ambrsio) recomendou-me pesquisar, de acordo com minhas capacidades - o Evangelho de Joo ... {Comentrio de Joo I, vi). No mesmo pargrafo, ele indica que o autor do Quarto Evangelho o mesmo Joo que se recostou no peito de Jesus.

    De Orgenes podemos voltar ainda mais no tempo e consultar Clemente de Alexandria (ativo entre 190-200), o professor de Orgenes. Ele conhecia somente um Joo, e este era o apstolo. Alm do mais, ele definitivamente atribui ao apstolo Joo a autoria do Evangelho;

    36 COMENTRIO DO NOVO TESTAMENTO

  • Por fim Joo, percebendo que os fatores externos estavam bem claros nos Evangelhos, atendendo aos pedidos dos seus amigos, e inspirado pelo Esprito, comps um Evangelho espiritual (Eusbio, H istria Eclesistica VI, xiv, 7). Clemente preservou um a bela histria sobre 0 ancio apstolo Joo; para referncia, ver p. 49, Nascido em meados do sculo 2, Clemente sempre permaneceu perto dos sucessores dos apstolos, Ele foi uma pessoa de um conhecimento considervel, tendo tambm viajado extensivamente.

    Por volta dessa mesma poca, Tertuliano atribuiu o Quarto Evangelho ao apstolo Joo {Contra Marcio IV, v).

    Irineu foi contemporneo de Clemente. Ele foi um discpulo de Policarpo que, por sua vez, havia conhecido o apstolo Joo. Num a carta para Elorino, que tambm havia recebido instruo de Policarpo, mas havia se afastado da verdade, Irineu declara;

    Essas opinies, Florino, e eu falo com cuidado, no indicam uma boa doutrina. Elas so inconsistentes com a igreja e conduzem aqueles que acreditam nelas para a maior das iniqidades. M esmo os hereges lio lado de fora da igreja nunca ousaram expressar tais opinies. Tambm os presbteros que serviram antes de ns, e que acompanharam os apstolos, no lhe transmitiram essas opinies. Pois quando eu ainda era um gai'oto, e o conheci na sia Menor, na casa de Policarpo, onde voc era um homem de posio no trio real e desejava permanecer de bem com ele. Eu relembro os acontecimentos daqueles dias muito mais claramente do que os que os recentes, pois o que aprendemos como criana cresce com nossa alma e se une a ela. Assim, eu posso falar at mesmo do local onde o bem-aventurado Policarpo sentou-se e argumentou. Lembro-me de como ele entrou e saiu, o carter de sua vida, a aparncia do seu corpo, o sermo que pregou para o povo, a meno que fez do seu relacionamento com Joo e com os outros que linham visto o Senhor. Recordo tambm a maneira como relembrou suas palavras e as coisas relacionadas com o Senhor que ouviu deles, bem como seus milagres e ensinos, e como Policai-po havia recebido tais palavras e ensinos das testemunhas oculares, que tinham visto a Palavra da Vida e registrado todas estas coisas, de acordo com as Escrituras (Eusbio, Histria Eclesistica V, xx, 4-7).

    E Irineu que tinha viajado da sia M enor para a Glia, e mantinha

    INTRODUO 37

  • freqentes contatos com a igreja em Roma, no somente conhecia o Quarto Evangelho como tambm atribua, definitivamente, sua autoria a Joo. Esse testemunho, vindo de algum que havia sido um discpulo de um dos discpulos de Joo, no pode ser desconsiderado. Alm do mais, devido s suas muitas viagens, e ao seu conhecimento ntimo com quase toda a igreja dos seus dias, o que Irineu diz a respeito da autoria do Quarto Evangelho deve ser levado em conta como algo de grande significado. Sua voz, num assunto de tanta importncia, pode ser considerada como a voz da igreja. Suas palavras, registradas por Eusbio, so:

    Ento Joo, o discpulo do Senhor, o mesmo que havia reclinado sua cabea sobre o peito do Senhor, durante o tempo em que viveu em feso, na sia, nos deu o Evangelho {Histria Eclesistica V, viii, 4).

    O prprio Irineu argumenta que s podem existir quatro Evangelhos {Contra Heresias III, xi, 8).

    O Fragmento Muratoriano, que apresenta uma lista incompleta dos livros do Novo Testamento, escrito num latim pobre e que derivou seu nome do cardeal L. A. Muratori (1672-1750), que o descobriu na Biblioteca Ambrosiana de Milo, pode ser atribudo ao perodo entre 180-200 d.C. Ele contm o seguinte:

    O quarto livro do Evangelho o de Joo, um dos discpulos. Respondendo a exortaes dos seus amigos, discpulos e bispos, ele disse; Jejuem comigo por trs dias, e ento deixemos que cada um conte aos outros tudo 0 que deve ser revelado a cada um , Naquela m esm a noite foi revelado a Andr que Joo, um dos apstolos, deveria relatar, em seu prprio nome, o que eles coletivamente relembravam, E assim no h discrdia para a f dos crentes, mesmo apesar de que, em cada um dos Evangelhos, so mencionados diferentes selees de fatos, visto que, sob a orientao de um mesmo Esprito, todas as coisas relacionadas com sua natividade, paixo, ressurreio, conversas com os discpulos e seu advento duplo: o primeiro em sua humilhao, e o segundo em seu glorioso poder real, que ainda est por acontecer, foram declaradas. maravilhoso, pois, que .loo coloque estas vrias coisas, de um a forma to consistente, em suas epstolas, dizendo: O que temos visto com nossos prprios olhos, o que contemplamos, e nossas mos apalparam com respeito ao Verbo da vida... anunciamos tambm a vs

    38 COMENTRIO DO NOVO TESTAMENTO

  • outros. Portanto, dessa maneira ele professa ser no somente uma testemunha ocular, mas tambm um ouvinte e narrador de todas as coisas maravilhosas do Senhor .

    Imagina-se que o fragmento seja uma traduo do grego, e que tenha se originado em Roma, ou pelo menos na regio sob a influncia romana. Para o nosso objetivo, importante que observemos que o discpulo .loo, que como Andr era um dos apstolos, apresentado como sendo o autor do Quarto Evangelho. A histria interessante sobre a exata origem desse Evangelho deve ser considerada lendria, pois certamente improvvel e contrrio a todas as tradies que os outros discpulos tenham vivido at aquela poca, quando o Evangelho foi produzido. Por essa mesma razo, muito impradente, embora j tenha acontecido em alguns casos, tirar qualquer inferncia dessa histria. Isso s vezes feito. Primeiro, as palavras iniciais da clusula: r recognoscentibus cunctis Johannes suo nom ine cuncta describe- iv l (Que Joo deveria relatar, em seu prprio nome, o que eles cole- tivunente relembraram), so traduzidas: ... Eles todos atuando como revisores". A seguir, a concluso a que chegam a de que, por causa (k Iodos aqueles revisores, o apstolo Joo pode ter tido apenas uma [jcquena participao na forma escrita final do texto. Finalmente, o presbtero Joo, figura completamente fictcia, aparece um a vez mais como 0 autor do livro! Mas isso basear m uito em to pouco! A nica concluso legtima que algum pode tirar do Fragmento Muratoriano a de que, por volta dos anos 180-200, a igreja em Roma (pelo menos algumas pessoas de importncia na regio de influncia romana) atribua a autoria do Quarto Evangelho ao apstolo Joo.

    Polcrato, que escreveu por volta da mesma poca, era um bispo da igreja em feso. Tanto o local quanto a data so importantes. Em feso, por volta daquela poca (aproximadamente 196 d.C.), a tradio com respeito ao apstolo Joo, que havia vivido ali, ainda estava bastante fresca na mente de todos. Polcrato diz: Sete dos meus parentes foram bispos, e eu sou o oitavo. Ele d conselhos a respeito da controvrsia pascal (se a Pscoa deveria ser celebrada no dia 14 lunar, sem importar se esse dia fosse ou no um domingo). Em ,sua carta ele no s se refere a Joo 13.25 (pelo menos ao fato afirmado naquela passagem), mas tambm residncia e m orte de Joo em feso. Ele escreve:

    INTRODUO 39

  • Alm do mais, Joo, que reclinou sua cabea no peito do Senhor, e que se tom ou um sacerdote, vestido com a mitra, bem como um a testemunha e mestre, est enterrado em feso {Carta a Vtor e a Igreja Romana quanto ao Dia da Observncia da Pscoa, preservada por Eusbio, Histria Eclesistica V, xxiv).

    Tefilo, escrevendo provavelmente alguns anos antes, e tendo sido, de acordo com Eusbio, o sexto bispo de Antioquia da Sria, desde os dias dos apstolos, indica expressamente que Joo foi o autor inspirado do Quarto Evangelho. Sua declarao a seguinte:

    E como os escritos sagrados e todos os homens inspirados, entre os quais encontra-se Joo, nos ensinam: No princpio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus {Para Autoyciis II, xxii).

    Sob a luz do que foi dito acima, alguns fatos se tornam claros:(1) Na igreja ortodoxa existe um a tradio uniform e a respeito da

    autoria do Quarto Evangelho. Essa tradio pode remontar-se de Eusbio, no incio do sculo 4, a Tefilo, que provavelmente atuou entre os anos 170-180.

    (2) De acordo com essa tradio uniforme, Joo foi o escritor do Quarto Evangelho. Geralmente, ela mesma deixa muito claro que este Joo, mencionado na tradio, era o apstolo, o discpulo amado, que se reclinou sobre o peito de Jesus. As testemunhas mais importantes dessa tradio so: Eusbio, Orgenes, Clemente de Alexandria, Tertuliano, Irineu, o escritor do Cnone M uratoriano e Tefilo.

    (3) Irineu, uma das mais antigas dentre essas testemunhas, foi discpulo de Policaipo que, por seu turno, havia sido discpulo do apstolo Joo. A inferncia, que parece ser legtima, a de que a tradio da autoria apostlica pode assim remontar-se at o discpulo a quem Jesus amava.

    (4) Irineu, devido s suas muitas viagens e ao amplo conhecimento que tinha de toda a igreja, pode ser chamado um a testemunha representativa. Ele representa a f de toda a comunidade crist. Tertuliano, Clemente de Alexandria, Irineu e Tefilo mostram que, nos ltimos 25 anos do sculo 2, o Quarto Evangelho era conhecido e lido atravs de todo 0 mundo cristo, na frica, sia Menor, Itlia, Glia e Sria, e que o mesmo era atribudo a Joo.

    40 COMENTRIO DO NOVO TESTAMENTO

  • (5) A evidncia externa, derivada dessa tradio m uito uniforme e antiga, est em iiarmonia com a evidncia interna, que derivada do prprio Evangelho.

    (6) As evidncias que examinamos at aqui prova trs coisas muito importantes:

    a. Que o Quarto Evangelho deve ter existido desde uma data muito antiga. Certamente que, quando, por voltado ano 170 d.C., esse livro foi chamado de Santa Escritura, escrito por uma pessoa inspirada pelo Esprito Santo, e quando esse Evangelho sagrado usado, ainda hoje, para provar certas posies doutrinrias que so consideradas to preciosas que muitos esto dispostos morrer para defend-las, podemos inferir, com segurana, que sua origem volta no tempo, para um a data que talvez seja ainda mais antiga.

    b. Que ele era considerado, pelo menos, igual em autoridade e valor aos outros Evangelhos.

    c. Que ele era considerado como tendo sido escrito pelo apstolo Joo.

    Entre as pessoas que podem ser classificadas como herticas est 'liiliano (por volta do ano 170 d.C.), que tornou-se herege depois da morte de seu mestre, Justino Mrtir, aceita o Quarto Evangelho e o usa (10 compor sua Harmonia (Diatessaron). De fato, o livro de Tatiano comea com os primeiros cinco versculos do Quarto Evangelho.

    Heracleon, da escola de Valentino, que atuou entre 140 e 180, at mesmo escreveu um comentrio sobre o Quarto Evangelho. Ptolomeu, lambm dessa escola, atribuiu-o ao apstolo . M arcio, por volta de meados do sculo 2, rejeitou todos os Evangelhos e preparou um de sua prpria autoria, usando como sua fonte uma verso mutilada de Lucas. O que no est claro que tenha negado que o apstolo Joo (cnha sido o autor do Quarto Evangelho. Sua rejeio desse Evangelho parece ter sido devida ao fato de que ele considerava seu autor como sendo um judaizante. Ele baseou sua concluso nas palavras de Paulo, cm Glatas 2.9,11-13, que ele, por seu tutno, interpretou de modo equivocado (cf. Tertuliano, Contra Marcio, IV, iii).

    E ntc, o fa to que deve ser enfatizado que, se esses hereges, (jiic sabiam muito bem que o prprio ensino deles no estava em

    INTRODUO 41

  • harmonia com o ensino do Quarto Evangelho, pudessem ter a tribudo esse Evangelho a um escrito no-apostlico, eles o teriam fe ito .

    Entre os escritores ortodoxos que floresceram durante o perodo entre 100-170, encontramos as citaes do Quarto Evangelho feitas por Justino M rtir {Apologia I, 61 ). Ele usa algumas expresses desse Evangelho. (Ver tambm seu Dilogo com Trifo, cap. 105.) Alm do mais, sua doutrina do Logos quase que inteiramente derivada do Quarto Evangelho. E alm disso no devemos esquecer que Tatiano, o pupilo de Justino, o incluiu em sua Harmonia.

    Era relao a Papias e Policarpo, nos reportaraos ao que j disse- raos. Eusbio declara que Papias citou partes da Prim eira Epstola de Joo {Histria Eclesistica III, xxxix, 17). Se algum argumento pode ser desenvolvido cora referncia ao seu conhecimento do Quarto Evangelho, que muito prximo em estilo, isso algo sobre o qual h uraa grande diferena de opinio.

    O esprito do Quarto Evangelho est evidente em todo o tratado conhecido como as Epstolas de Incio (breve reviso). Apesar de no se poder afirmar, com certeza absoluta, que ele, ao ser enviado para o martrio (por volta de 110), tinha realmente visto este Evangelho, bem como se referido a ele, esta concluso, no entanto, parece ser a mais natural. As semelhanas tm despertado a curiosidade de rauitos estudiosos, por serem numerosas e impressionantes demais para permitir qualquer inferncia conflitante. verdade que essas aluses no so citaes exatas, mas quem esperaria mais do que isso de um prisioneiro que est sendo levado a Roma para sofrer o martrio? As colunas paralelas, a seguir, fornecem a evidncia;

    IGNCIO O QUARTO EVANGELHO

    Pois se eu, num curto perodo de tem- Eu neles, e tu em mim, a fim de quepo, desenvolvi tal com unho espiri- sejam aperfeioados na unidade... (Jotual com seu bispo, que era no hu- 17.23).m ano, mas espiritual, quanto maisvocs so abenoados, pois estounidos com ele, como a Igi-eja est comJesus Cristo, e com o Jesus Cristo est

    42 COMENTRIO DO NOVO TESTAMENTO

  • INTRODUO 43

    com o Pai, para que todas as coisas possam se harm onizar em unidade {Aos Efsios V, i).

    "Como o Senhor estava unido com o Pai, e nada fez sem ele, nem por si rncsmo, nem por meio dos apstolos, assim tambm vocs no deveriam l'a/,cr nada sem o bispo e os presbteros {Aos Magnsios VII, i).

    "liu desejo 0 po de Deus, que a carnc de Jesus... e para beber, eu desejo seu sangue, que o amor incor- l'uplivcl {AosRomanosNW , iii).

    lori|ue ele (o Esprito) sabe quando vil i1, c sc vir (Aa Filadelfos VII, i).

    O Filho nada pode fazer de si m esmo, seno somente aquilo que vir fazer o Pai (Jo 5.19).

    Quem com er m inha carne e beber meu sangue tem a vida eterna, e eu o ressuscitarei no ltimo dia. Pois m inha carne verdadeira comida, e meu sangue verdadeira bebida (Jo 6.54, 55).

    O vento sopra onde quer, ouves a sua voz, mas no sabes donde vem, nem para onde vai; assim todo o que nascido do Esprito (Jo 3.8).

    Se essas e vrias outras expresses que nos recordam as que se i*ncontram em Joo, indicam que Incio conhecia o Quarto Evangelho, suii data de origem deveria ser antecipada para algum tempo antes de 110 d.C. Isso permitiria uma harmonizao com a reivindicao da crcna tradicional que afirma que o Quarto Evangelho foi escrito entre os iinos 80-98.

    Entretanto, a crena tradiciom em relao data do Quarto l'arigelho tem recebido uma fo r te confirm ao devido desco- hcrla de um fragm ento de papiro, muito antigo, do Evangelho de Joo. Esse fragmento, juntam ente com outros papiros gregos, foram iichados no Egito e comprados pela John Rylands Library. Ele o fragmento mais antigo que se conhece de qualquer poro do Novo Testamento, e pode ter se originado na comunidade crist do Imprio Mdio (Io Hgito. Com base nas provas paleogrficas, os estudiosos chegaram concluso de que esse fragmento de papiro pertenceu a um cdice ijue circulou naquela regio por volta da primeira metade do sculo

    O fragmento contm palavras do captulo 18 do Evangelho de Joo.

  • De um lado, ele contm partes dos versculos 31 -33, enquanto do outro, encontram-se partes dos versculos 37, 38.

    Ora, se esse Evangelho j estava circulando no Imprio M dio do Egito, na primeira metade do sculo 2, ele deve ter sido escrito antes disso. H uma grande distncia entre feso, onde, de acordo com a tradio, acredita-se que o Evangelho tenha sido composto, at a parte do Egito em que esse cdice circulou. Por essa razo, algumas autoridades advogam um perodo de cerca de trinta anos entre a data de sua composio e a circulao no Egito. A declarao de W. F. Albright, a esse respeito, importante:

    A publicao sensacional de um fragmento do Evangelho, datado da prim eira metade do sculo 2, bem como a de um fragmento contemporneo de um evangelho apcrifo, muito dependente de Joo, tem produzido um coup de grce em todas as dataes posteriores de Joo, e tem provado que o Evangelho no pode ter sido produzido mais tarde que no final do sculo 1 d.C. {From Stone Age to Christianity, p. 299; ver tam bm C. H. Roberts, An Unpublished Fragment o f the Fourth Gospel, Manchester, 1935).

    Portanto, isso quer dizer que a viso tradicional com respeito . data da composio do Quarto Evangelho confirmada, abundantemente, pela evidncia irrefutvel. Isso significa que aqueles crticos negativos, que p o r muito tempo tinham afirm ado que a posio conservadora est equivocada, sofreram uma grande derrota! Hoje, mais do que nunca, podemos endossar a exclamao de Volkmar: O que certo que a tese dos crticos que afirmam a com posio do Quarto Evangelho numa data cerca da metade do sculo 2, no pode mais ser sustentada!

    44 COMENTRIO DO NOVO TESTAMENTO

    5. Estas so as datas que o Quarto Evangelho tem recebido de vrios crticos: F. C. Bauer: 160-170; Volkmar: 155; Zeller e Schlten: 150; Hilgenfeld: 130-140; Keim: 130; Schenkel: 115-120; Reuss, Nicolas, Renan, Sabatier, Hase; 110-125; Scott (E. F.); 95-115.

    R H. Menoud, L vangile de Jean d'apr.'i les recherches recentes, Neuchtel e Paris, 1943, conclui com estas palavras remarcveis;

    On peut dire, sans trop s avancer que les dfenseurs de l autenticit johannique occupent aujourdhui des positions plus favorables quau dbut du sicle, par exemple. Car les recherches recentes tendent carter les obstacles que la critique a dresss sur la voie de 1 identification du Bien-Aim avec le fils de Zbde. E, do mesmo autor; Le problme Johannique, RThPh, 29 (1941), pp. 236-256; 30 (1942), pp. 155ss; 31 (1943), pp. 80-101.

  • Alm do mais, agora que temos essa evidncia externa que nos permite saber que o Quarto Evangelho existiu na sia M enor no com eo do 2 (e provavelmente j no 1 ) sculo, torna-se cada vez mais fcil acreditar que Incio, que escreveu suas Epstolas na sia M enor, o (cnha lido.

    verdade que nem Justino Mrtir, Incio, ou qualquer outra pessoa antes da metade do sculo 2, fez qualquer referncia ao apstolo Joo como sendo o autor desse Evangelho. Isso, entretanto, no deveria nos causar surpresa. Esses homens viveram to prximos da poca do discpulo amado, que lhes era completamente desnecessrio mencionar seu nome ao citarem o texto do seu Evangelho ou fazerem meno ao mesmo. Alm do mais, os apstolos eram tidos em alta honra por Incio. Ele escreve:

    No lhes ordeno como o fizeram Pedro e Paulo. Eles eram aps- lolox, enquanto eu sou um prisioneiro {Aos Romanos IV, iii).

    Portanto, seguro afirmar que, ao usar as expresses que lembra- Villil o Quarto Evangelho, Incio estava consciente do fato de que so- nicnlc um apstolo genuno seria o responsvel pelas verdades que lhe loi arn passadas, de tal maneira que ele deseja imprimi-las no corao (lc outros.

    Outro fato que favorece uma data mais antiga para o Quarto Evan- jclho seu tom fortemente semtico. (Ver pp. 92, 93.)

    A primeira comprovao de autoridade apostlica encontra-se no prprio Evangelho. Depois que o apstolo Joo, divinamente inspirado, escreveu os primeiros vinte captulos que terminam com o belo desfecho que se encontra em 20.30, 31, e um outro lder em feso, sob a orientao do Esprito Santo, e com a aprovao total de Joo, acrescentou uma histria muito bonita que havia escutado com freqncia, dos lbios do seu querido amigo, e a qual terminava com um a referncia distinta ao discpulo a quem Jesus amava (21.20-23), os presbteros de feso acrescentaram as seguintes palavras importantes:

    Este o discpulo que d testemunho a respeito dessas coisas e (]ue as escreveu; e sabemos que seu testemunho verdadeiro (21.24).

    li Vincent Taylor, j em 1927, falou sobre o colapso da posio tradicional (!) in The l'iirlh Gospel and Some Recent Criticism, HJ 25 (1927), pp. 725-743.

    INTRODUO 45

  • Portanto, podemos ver que tanto o testemunho interno, quanto o externo, apiam essa certificao.

    Joo, como os Evangelhos nos informam, era filho de Zebedeu e Salom (Mc 1.19; 16.1, 2, cf. Mt 27.56). Zebedeu parece ter sido um pescador muito prspero. Ele tinha alguns empregados (Mc 1.20). A idia que tem sido aceita pela tradio que Salom era irm da Virgem M aria (Mt 27.56; cf. Jo 19.25). Se isso correto, Jesus e Joo eram primos. O nome de Tiago, o irmo de Joo, normalmente mencionado primeiro, talvez por ter sido o mais velho dos dois irmos.

    O apstolo Joo, antes de ter se tornado um seguidor de Jesus, era um discpulo de Joo Batista. Em seus ltimos anos, o apstolo relem brou vividamente o momento quando encontrou Jesus e decidiu segui- lo, dizendo: Sendo, mais ou menos a hora dcim a (Jo 1.39). Aquele primeiro encontro, do qual no temos qualquer registro, foi seguido, depois de um pequeno intervalo, pela deciso de se tornar um discpulo regular (Mc 1.16ss; Lc 5.10), e mais tarde um apstolo (Mt 10.2), enviado e comissionado por Jesus.

    Joo e Tiago parecem ter sido homens de emoes controladas, que somente afloravam esporadicamente. Jesus os chamou de filhos do trovo (Mc 3.17). Quando Jesus est se dirigindo para Jerusalm, e os habitantes de uma vila samaritana recusam-se a hosped-lo, a ira veemente dos filhos de Zebedeu manifesta-se nas palavras: Senhor, queres que mandemos descer fogo do cu para os consum ir? (Lc 9.54). Joo, com certeza, era o discpulo do am or. O amor e a ira ocasional no so mutuamente excludentes. Foi o amor genuno por Jesus que se manifestou nesse modo esquisito de falar. Foi o amor a Jesus que tambm levou Joo a se intrometer com o homem que expulsava demnios em nome de Cristo, por ele no ser um discpulo regular (Lc 9.49, 50).

    Um a das marcas da humildade genuna de Joo o fato de ele nunca mencionar nominalmente aqueles que pertencem ao crculo ntimo de seus parentes. Apesar de amar intensamente o Mestre, ele no enfatiza, em seu Evangelho, seu amor pelo Senhor, mas sim o amor de Cristo pelo apstolo. Ele apenas diz, a respeito de si mesmo, que era o discpulo a quem Jesus amava (13.23).

    46 COMENTRIO DO NOVO TESTAMENTO

  • Tanto nos Evangelhos quanto em Atos, freqentemente encontramos Joo na companhia de Pedro (At 3.1; 4.19; 8.14). Depois da ressurreio, ele foi um dos pilares da igreja em Jerusalm (G1 2.9; At 15.6). E provvel que ele tenha deixado Jerusalm no incio da Guerra ludaica. T. Zahn declara:

    Portanto, seguro dizer que o apstolo Joo, com os outros discpulos de Cristo, deixou a Palestina e mudou-se para a sia Menor. Se i^olicarpo, no dia de sua morte (23 de fevereiro de 155), mencionou seus 86 anos de vida como cristo, e no como homem, tendo assim sido batizado em 69, e se sua converso (de acordo com Irineu, Contra Heresias III, iii, 4) foi o resultado da obra de um apstolo, essa m igrao para a sia M enor deve ter ocorrido antes daquela data, possivelmente como resultado do comeo da Guerra Judaica. Joo, pois, tendo talvez no mais que 60 ou 65 anos, pode ter devotado os ltimos trinta anos de sua vida promoo da vida crist naquela provncia (John lhe Apostle , in The New Schqff-Herzog Encyclopedia o f Religious Knowledge).

    Joo viveu por vrios anos em feso. Porm, em alguma poca durante o reinado de Domiciano (81-96), ele foi banido para a ilha de Ptmos. Com a ascenso de Nerva, ele recebeu permisso para retornar a feso, onde morreu no comeo do reinado de Trajano, ou seja, por voltado ano 98.

    A tradio quase unnime ao afirmar que feso foi o local onde o apstolo escreveu seu Evangelho (Eusbio, Histria Eclesistica III, xxiii, 1, 6, viii, 4; Clemente de Alexandria, Quem o Homen Rico que Ser Salvo? XLIl, ii).'" As vrias tentativas de desacreditar essa forte tradio, at mesmo na literatura recente, no tm alcanado sucesso.

    A pergunta a ser feita, no entanto, esta: O Quarto Evangelho foi escrito antes ou depois de Joo ter sido banido para Patmos? Ele foi escrito antes ou depois da composio do Apocalipse?

    Aparentemente, a data mais antiga para sua composio seria por volta do ano 80, e para isso nos baseamos nas seguintes consideraes:

    INTRODUO 47

    6. Ver F. Godet, Commentaire .sur l'vangile de Saint .han, Paris, 1881, vol. 1, pp. 354.156.

  • Pedro havia recebido sua herana, como o texto de 21.29 parece indicar. Paulo j tinha recebido a sua coroa. Este ltimo, em nenhum lugar indica a obra do apstolo Joo na sia Menor. considerado provvel que os Sinticos j tivessem sido escritos, e que o autor do Quarto Evangelho j os tivesse lido. Os judeus haviam se tornado os inimigos confirmados da Igreja. A queda de Jerusalm no mais mencionada, provavelmente porque j teriam se passado vrios anos desde que a mesma tinha ocorrido.

    Por outro lado, a data mais recente possvel para a composio do Evangelho o ano 98, se que os testemunhos de Irineu e Jernimo so confiveis. Jernimo declara:

    E assim, um a vez mais a igreja de feso, fundada por Paulo, e tendo Joo permanecido entre eles, permanentemente, at o tempo de Trajano, um a testemunha verdadeira da tradio dos apstolos (Contra Heresias III, iii, 4).

    A data, pois, deve ser entre 80 e 98. possvel ser mais objetivo e determinar a data com maior preciso? De acordo com Epifnio (sculo 4), Joo no escreveu seu Evangelho at ter regressado de Patmos, quando j tinha mais de 90