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1 XII Seminário Nacional TCMSP Educação Ambiental Mudança de Cultura Período: 26 a 28 de novembro de 2007 Dia: 28/11/2007 Palestrante: Fabio Alberti Cascino Doutor em Educação pela PUC-SP, Pedagogo, Coordenador Pedagógico e Educacional, Formador de Professores, autor de trabalhos sobre Educação Ambiental, interdisciplinaridade e Ecoturismo Tema: A Importância da Educação Ambiental na Formação das Gerações O Sr. Presidente Antonio Carlos Caruso – Bem pessoal, uma boa tarde a todos. O tema desta tarde é a importância da educação ambiental na formação das gerações. O palestrante é Fabio Alberti Cascino, Doutor em Educação pela PUC-SP, Pedagogo, Coordenador Pedagógico e Educacional, Formador de Professores, autor de trabalhos sobre educação ambiental, interdisciplinaridade e ecoturismo. Doutor Fabio, é uma alegria recebê-lo, é uma satisfação muito grande que o senhor esteja entre nós. Nós temos discutido, nesses dias aqui, esse tema, de certa forma até contundente, e que todos nós estamos aprendendo, vamos dizer assim, no sentido geral. Aprendendo no sentido não só... Conhecimento, de certa forma, nós temos, eu diria que até um conhecimento relativo, mas essa troca de informações se torna muito importante a fim de que nós possamos, também, vamos dizer assim, transmitir os conhecimentos aqui adquiridos a outras pessoas, aos jovens em geral, e tentarmos formatar algo que possa vir a auxiliar nas transformações que nós necessitamos, pelo menos no nosso Município. Eu passo a palavra ao senhor. Fique à vontade porque o senhor está em casa.

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XII Seminário Nacional TCMSP

Educação Ambiental

Mudança de Cultura

Período: 26 a 28 de novembro de 2007

Dia: 28/11/2007

Palestrante: Fabio Alberti Cascino

Doutor em Educação pela PUC-SP, Pedagogo,

Coordenador Pedagógico e Educacional, Formador de

Professores, autor de trabalhos sobre Educação

Ambiental, interdisciplinaridade e Ecoturismo

Tema: A Importância da Educação Ambiental na

Formação das Gerações

O Sr. Presidente Antonio Carlos Caruso – Bem pessoal, uma

boa tarde a todos. O tema desta tarde é a importância da educação

ambiental na formação das gerações. O palestrante é Fabio Alberti

Cascino, Doutor em Educação pela PUC-SP, Pedagogo, Coordenador

Pedagógico e Educacional, Formador de Professores, autor de

trabalhos sobre educação ambiental, interdisciplinaridade e

ecoturismo.

Doutor Fabio, é uma alegria recebê-lo, é uma satisfação

muito grande que o senhor esteja entre nós. Nós temos discutido,

nesses dias aqui, esse tema, de certa forma até contundente, e que

todos nós estamos aprendendo, vamos dizer assim, no sentido geral.

Aprendendo no sentido não só... Conhecimento, de certa forma, nós

temos, eu diria que até um conhecimento relativo, mas essa troca de

informações se torna muito importante a fim de que nós possamos,

também, vamos dizer assim, transmitir os conhecimentos aqui

adquiridos a outras pessoas, aos jovens em geral, e tentarmos

formatar algo que possa vir a auxiliar nas transformações que nós

necessitamos, pelo menos no nosso Município.

Eu passo a palavra ao senhor. Fique à vontade porque o

senhor está em casa.

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O Sr. Fábio Alberti Cascino – Muito obrigado. Bom dia a

todos. Obrigado Doutor Caruso pela apresentação.

Eu fico muito honrado de poder participar deste encontro,

de poder conversar com todos a respeito destas questões

fundamentais, sem dúvida. Fundamentais na constituição das

sociedades, dos grupos, do ser humano. Fundamental nesse momento da

história pelo qual toda a humanidade passa, um momento dramático no

meu modo de ver.

Deixa eu antecipar, porque, muitas vezes, as pessoas me

colocam no campo de uma pessoa um tanto pessimista, mas, um dia

desses eu li uma frase do colega Paulo Arantes, da USP, um

filósofo, que diz que, em certo momento da história, nós precisamos

ir além das boas afirmações, das afirmações tranqüilas, porque a

situação exige, às vezes, um olhar um pouco menos generoso, ou

complacente. Eu penso que esse momento exige um olhar, senão menos

complacente, um pouco mais crítico e cuidadoso. E, portanto, eu

agradeço muito a oportunidade de vir conversar com esta Casa, aliás

uma segunda vez que eu venho conversar com os colegas desta Casa,

porque eu participei aqui, há uns cinco anos, de um encontro com os

funcionários do Tribunal de Contas, e, fiquei muito impressionado

com a conversa que nós tivemos. Realmente, quando eu recebi o

convite fiquei muito feliz de poder retornar e poder, justamente,

fazer essa observação com lideranças importantes do Município.

Penso que uma fala, aqui nesse momento, tem uma importância

significativa e eu fico muito honrado de poder ocupar este lugar,

esta mesa no encerramento do encontro. E, por isso, que tomo muito

cuidado nessa avaliação crítica deste momento que nós vivemos, mas,

ao mesmo tempo, digo que tratamos, sim, se apontar algumas questões

porque o nosso mundo, o nosso país, a nossa cidade, nós todos

estamos precisando refletir e atuar de uma maneira contundente

frente ao que aí se coloca.

Deixa eu resgatar um palitinho do que foi aquela

conversa, Doutor Caruso, acerca de cinco anos aqui no Tribunal. Na

época, eu fiz a leitura de um texto do Italo Calvino, contido no

livro “Cidades Invisíveis”, publicado pela Companhia das Letras, e,

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eu trouxe esse texto porque, naquela semana eu havia trabalhado com

os alunos na faculdade que eu ministrava aulas, naquela época,

justamente esse texto e, o convite do Tribunal de Contas me colocou

de frente com a brincadeira que eu fiz à época: “olha aqui, o Ítalo

Calvino está falando deste prédio”. Foi a brincadeira que eu fiz à

época com os colegas funcionários. Então, eu vou me permitir

começar por aí, porque este edifício tem uma arquitetura

interessante que eu acho que é a idéia original: eu estava

circulando onde estão as fotos da construção do Tribunal, aliás eu

queria saber se tinha algum texto do arquiteto que tratasse dessa

questão, mas eu não vi. Mas, eu vou ousar fazer a interpretação

deste edifício mais uma vez: ele possui pernas altas, ele é uma

espécie de nave um pouco descolada do terreno, me parece que ele

olha o Município, ele está um pouco descolado, ele está olhando de

cima. É um pouco a idéia que o Tribunal tem...

O Sr. Presidente Antonio Carlos Caruso – Eu devo

interromper Vossa Excelência para dizer o seguinte: o autor,

realmente, do projeto um dele ainda é vivo, graças a Deus, e ele

está bastante idoso. Ele esteve aqui à questão de uns 11 meses

atrás, e, realmente, ele falou na concepção. Depois, eu pedi para

que ele nos escrevesse toda a concepção do projeto para nos mandar,

e ele não nos mandou ainda, e isso vai passando, não é? Mas, a

concepção era justamente essa.

O Sr. Fábio Alberti Cascino – Então, acertei.

O Sr. Presidente Antonio Carlos Caruso – Porque, como era

um prédio, em que teria que se decidir questões que estariam, vamos

dizer assim, não necessariamente dentro do conhecimento, de uma

casta do conhecimento, ele tinha que se sobrepor, ele tinha que

está acima de tudo e de todos. Mas, o senhor realmente matou a

charada.

O Sr. Fábio Alberti Cascino – Matei. Então, estou bom.

Estou acertando.

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Pois, então, faz muito sentido trazer de novo esse texto

do Italo Calvino, porque o que ele diz... Italo Calvino, ao longo

desses contos mágicos das Cidades Invisíveis relata passeios,

travessias, andanças, viagens do Marco Pólo, e conta a entrada, a

saída e a passagem por muitas cidades imaginárias que o Marco pólo

teria atravessado nas suas andanças pela Ásia, pela Europa. O conto

que trouxe à época, e, agora, de memória, vou comentar com vocês,

ele diz assim: o Marco Pólo chega em uma cidade que chama Bauci, e,

ele entra e é uma cidade belíssima de grandes edifícios, de casas

maravilhosas, aparentemente de muita riqueza, e, ele percebe aqui e

ali umas varas, umas pernas, uns troncos, umas colunas finas, as

“finas andas” ele relata assim. Ele olha para cima para ver aonde

vai dar essas “finas andas”, e, ele encontra as nuvens. Ele fica um

pouco impressionado, vê essas nuvens, tudo tão cheio de nuvens, e

ele presta um pouco de atenção e percebe que a cidade está vazia.

Ele olha a cidade com esses prédios e essas estruturas vazias, e,

de repente, ele olha e o povo está lá em cima olhando a cidade. Ele

fica estupefato, ele diz: “Ué, as pessoas estão lá em cima e a

cidade está vazia aqui embaixo?”. Aí ele se coloca a pensar que

algo estranho acontece nessa cidade e ele formula a seguinte idéia:

as pessoas estão ausentes da sua própria existência, estão

descoladas da sua própria existência.

E, eu fiquei pensando nisso à época, quando eu vim aqui,

e hoje novamente, que, de certa maneira, e isso é um paradoxo

interessante, porque ninguém, na verdade, que queira viver

integralmente a vida se ausenta, a vida se realiza na presença, na

presentificação da nossa condição. As nossas relações de

enfrentamento, de ruptura, de acolhimento, as nossas relações de

diálogo se fazem na nossa presença, nós nos presentificamos e

vivemos. E, evidente que este paradoxo entre ausência e presença,

de uma cidade que se vê de longe e lamenta a sua ausência, mas,

perplexa se pergunta: “Porque nós estamos ausentes?”, carrega este

paradoxo de se entender distante de si próprio, mas perguntando-se

porque nós estamos distantes. E, portanto, vivendo o exercício da

consciência, de se questionar: “porque eu não estou lá? Em que

lugar eu estou?”. De certa maneira, eu me levo a me perguntar se

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não seria essa a nossa condição, metaforicamente falando, do nosso

cotidiano. Qual é o nosso lugar hoje? Como nós nos posicionamos?

Que Tribunal é este? Agora, partindo para a metáfora que a

arquitetura nos oferece, e, evidente que eu não me refiro aqui ao

Tribunal de Contas, mas que Tribunal é este que nós nos colocamos

neste momento? Aqui descolados olhando um pouco o nosso mundo, o

nosso tempo.

De certa maneira, me vem um quê de angústia porque aquilo

que nós estamos vendo e nós nos colocamos a ver nesse momento é

algo muito ruim, o mundo vive uma situação muito ruim. Nós não

podemos, da nossa posição, hoje, aqui, agora, confortável,

acolhidos por este ambiente, dizer que as coisas vão bem.

Infelizmente as coisas não vão bem. E, aí, me levo a perguntar, me

coloco no lugar do perguntador, do inquiridor, que o Tribunal me

confere, este Tribunal metafórico, o que nós estamos fazendo para

que essas coisas se modifiquem, ou se mantenham?

Eu me arrogo o direito de me colocar na condição de um

cidadão que olha esta cidade-mundo e me pergunto estupefato: “o que

nós estamos fazendo com a nossa ausência-presença neste mundo?

Eu trouxe um vídeo que foi produzido na ECO-92, de um

discurso de uma menina de treze anos, à época, um discurso

pronunciado no fórum global que teve lugar no Rio de Janeiro, em

1992. Eu estava no Rio de Janeiro, sabia desse discurso, mas, por

alguma razão, nós não tínhamos acesso. E, recentemente, ele

circulou no youtube, e ele está ganhando popularidade. Talvez,

algumas pessoas já tenham visto esse vídeo, ele é excepcional.

Infelizmente a qualidade deste registro não é boa, mas é suficiente

para nós vermos e ouvirmos o que essa menina faz e o que ela fala.

E o que ela fala é algo extremamente contundente: ela se dirige aos

políticos, aos representantes dos países ali reunidos na ECO-92 e

conclama esses dirigentes a não repetir o que vinha sendo feito até

aquele momento, e que, obviamente, eles pensassem que o que eles

decidissem naquele momento não se referia exatamente à vida deles

porque eles eram ali todos adultos, mas se referia diretamente à

ela, porque era o futuro dela, da geração dela, representante das

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crianças do mundo. O mundo estaria sofrendo as transformações que

estariam sendo discutidas ali.

Bem, isso aconteceu em 92. Eu gostaria de apresentar o

vídeo e, depois, discutir o que nós fizemos de lá para cá.

[VÍDEO]

Tradução

“Olá, eu sou Severn Suzuki.

Represento, aqui na ECO, a Organização das Crianças em

Defesa do Meio Ambiente. Somos um grupo de crianças canadenses, de

12 e 13 anos, tentando fazer a nossa parte, contribuir.

Vanessa Sultie, Morgan Geisler, Michelle Quigg e eu. Foi

através de muito empenho e dedicação que conseguimos o dinheiro

necessário para virmos de tão longe, para dizer a vocês adultos

que, têm que mudar o seu modo de agir.

Ao vir aqui hoje, não preciso disfarçar meu objetivo,

estou lutando pelo meu futuro. Não ter garantia quanto ao meu

futuro não é o mesmo que perder uma eleição ou alguns pontos na

bolsa de valores.

Estou aqui para falar em nome das gerações que estão pôr

vir.

Eu estou aqui para defender as crianças que passam fome

pelo mundo e cujos apelos não são ouvidos.

Estou aqui para falar em nome das incontáveis espécies de

animais que estão morrendo em todo o Planeta, porque já não têm

mais aonde ir.

Não podemos mais permanecer ignorados.

Eu tenho medo de tomar sol, pôr causa dos buracos na

camada de ozônio.

Eu tenho medo de respirar este ar, porque não sei que

substâncias químicas o estão contaminando.

Eu costumava pescar em Vancouver, com meu pai, até que

recentemente pescamos um peixe com câncer... e agora temos o

conhecimento que animais e plantas estão sendo destruídos e

extintos dia após dia.

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Eu sempre sonhei em ver grandes manadas de animais

selvagens, selvas e florestas tropicais repletas de pássaros e

borboletas e hoje eu me pergunto se meus filhos vão poder ver tudo

isso.

Vocês se preocupavam com essas coisas quando tinham a

minha idade?

Tudo isso acontece bem diante dos nossos olhos e mesmo

assim continuamos agindo como se tivéssemos todo o tempo do mundo e

todas as soluções.

Sou apenas uma criança e não tenho todas as soluções, mas

quero que saibam que vocês também não tem.

Vocês não sabem como reparar os buracos na camada de

ozônio. Vocês não sabem como salvar os peixes das águas poluídas.

Vocês não podem ressuscitar os animais extintos. E, vocês não podem

recuperar as florestas que um dia existiram e onde hoje é um

deserto. Se vocês não podem recuperar nada disso, por favor, parem

de destruir.

Aqui vocês são os representantes de seus governos, homens

de negócios, administradores, jornalistas ou políticos, mas na

verdade vocês são mães e pais, irmãos e irmãs, tias e tios e todos

também são filhos.

Sou apenas uma criança, mas sei que todos nós pertencemos

a uma sólida família de 5 bilhões de pessoas (1.992) e ao todo

somos 30 milhões de espécies compartilhando o mesmo ar, a mesma

água e o mesmo solo. Nenhum governo, nenhuma fronteira poderá mudar

esta realidade.

Sou apenas uma criança, mas sei que esses problemas

atingem a todos nós e deveríamos agir como se fôssemos um único

mundo rumo a um único objetivo. Eu estou com raiva, eu não estou

cega, e eu não tenho medo de dizer ao mundo como me sinto.

No meu país geramos tanto desperdício, compramos e

jogamos fora, compramos e jogamos fora, compramos e jogamos fora e

nós, países do norte, não compartilhamos com os que precisam, mesmo

quando temos mais que o suficiente temos medo de perder nossas

riquezas, medo de compartilhá-las.

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No Canadá temos uma vida privilegiada, com fartura de

alimentos, água e moradia. Temos relógios, bicicletas, computadores

e aparelhos de TV.

Há dois dias, aqui no Brasil, ficamos chocados quando

estivemos com crianças que moram nas ruas. Ouçam o que uma delas

nos contou: "Eu gostaria de ser rica, e se fosse, daria a todas as

crianças de rua alimentos, roupas, remédios, moradia, amor e

carinho.".

Se uma criança de rua que não tem nada, ainda deseja

compartilhar, pôr que nós, que temos tudo, somos ainda tão

mesquinhos?

Não posso deixar de pensar que essas crianças têm a minha

idade e que o lugar onde nascemos faz uma grande diferença. Eu

poderia ser uma daquelas crianças que vivem nas favelas do Rio, eu

poderia ser uma criança faminta da Somália ou uma vítima da guerra

no Oriente Médio ou ainda uma mendiga na Índia.

Sou apenas uma criança, mas ainda assim sei que se todo o

dinheiro gasto nas guerras fosse utilizado para acabar com a

pobreza, para achar soluções para os problemas ambientais, que

lugar maravilhoso que a Terra seria.

Na escola, desde o jardim da infância, vocês nos

ensinaram a sermos bem comportados. Vocês nos ensinaram a não

brigar com as outras crianças, resolver as coisas da melhor

maneira, respeitar os outros, arrumar nossas bagunças, não

maltratar outras criaturas, dividir e não sermos mesquinhos...

Então, por que vocês fazem justamente o que nos ensinaram

a não fazer?

Não esqueçam o motivo de estarem assistindo a estas

conferências e para quem vocês estão fazendo isso.

Nos vejam como seus próprios filhos, vocês estão

decidindo em que tipo de mundo nós iremos crescer.

Os pais devem ser capazes de confortar seus filhos

dizendo-lhes "Tudo vai ficar bem, estamos fazendo o melhor que

podemos, não é o fim do mundo...", mas não acredito que possam nos

dizer isso. Nós estamos em suas listas de prioridades?

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Meu pai sempre diz : "Você é aquilo que faz, não o que

você diz".

Bem, o que vocês fazem, nos faz chorar à noite.

Vocês adultos dizem que nos amam.

Eu desafio vocês, por favor, façam com que suas ações

reflitam as suas palavras.

Obrigada”

O Sr. Fábio Alberti Cascino – É para aplaudir de novo,

não é?

Bem, uma coincidência interessante, Freud nos ensinou que

coincidências não existem, quando eu redescobri esse vídeo, foi em

uma quarta-feira e na sexta-feira, no dia 02 de novembro de 2007,

Washington Novaes publicou o seguinte artigo, que fala por si – eu

não vou ler o artigo inteiro, mas eu vou citar o que Washington

Novaes escreveu, está quase em diálogo com o que está dito neste

vídeo. Vale lembrar que a ECO-92 aconteceu 20 anos depois da

reunião de Estocolmo, que foi a primeira reunião planetária,

global, a respeito de desenvolvimento, meio ambiente e

sustentabilidade. E, foi na ECO-92 que se oficializou o conceito de

desenvolvimento sustentável, por quê? Havia sido produzido um

texto, um texto gerador da Conferência Rio-92 com o título “nosso

Futuro Comum”, na verdade, era um relatório organizado pela

Primeira-Ministra da Noruega, à época, Gro Harlem Brundtland, e,

esse documento, “nosso futuro comum”, publicado pelas Nações

Unidas, pelo PNUMA, foi editado em 1987. Então, de 87 a 92 se

organizou a Conferência, com base no conceito de desenvolvimento

sustentável. Vão se lá quinze anos.

Vejam, então, o que Washington Novaes nos escreve, agora

dia 02 de novembro de 2007, está publicado no Estado de São Paulo:

“Embora não sejam novos, são inquietantes os diagnósticos e

prognósticos do Global Environment Outlook (Geo 4) divulgados no

final de outubro pelo Programa das Nações Unidas para o Meio

Ambiente (Pnuma). Porque, diz o relatório: ‘não há nenhuma grande

questão levantada no documento Nosso Futuro Comum, em 1987, cujas

tendências previstas sejam agora favoráveis’.”.

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Acho que fica claro que o mesmo órgão que organizou essa

Conferência, afirma agora, quinze anos depois, vinte anos depois,

que nós não evoluímos em nada. E, que, portanto, o discurso dessa

menina, esse puxão de orelha, infelizmente nós não entendemos, nós

não respeitamos. E, essa menina, que hoje deve ter 20 e tantos

anos, quase 30, está vivendo o nosso desrespeito, o desrespeito que

nós produzimos. Isto não é assunto nem do senhor George Bush, nem

do senhor Lula, nem dos políticos exclusivamente, esse é um assunto

relativo a todos nós.

Quando fui convidado para falar sobre a importância da

educação ambiental na formação das gerações, me ocorreu, então,

fazer esse vínculo. A futura geração naquele momento, a futura

geração hoje olha para nós estupefatos, na história do edifício,

perguntando: “o que vocês estão fazendo?”. E, eu decidi, portanto,

fazer essa pergunta aqui, o que nós estamos fazendo? Essa é a

pergunta que eu quero deixar para vocês, para nós nos fazermos

agora.

Washington Novaes, por exemplo, afirma que apesar do

Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas, o IPCC,

considerar necessário um corte radical nas emissões de gases, para

evitar que o aumento da temperatura global, essas emissões

continuam aumentando. Na ponta do lápis: nós não estamos deixando

de andar de carro, nós estamos comemorando a descoberta de um poço

de petróleo. Não é interessante? Eu vou em frente, depois nós

comentamos.

Outro dado do relatório que ele comenta que “o buraco na

camada de ozônio continua ‘maior do que nunca’.”, ele aumentou em

relação ao que já era grande em 92. A chuva ácida, que consumiu a

vegetação na Europa, continua aumentando no mundo inteiro. O

consumo humano já supera a capacidade de reposição, o estoque

planetário, em mais de 30%. Nós consumimos mais do que a terra

produz, na ordem de 30%, e continua aumentando. “Os estoques

pesqueiros continuam a reduzir-se, degradam-se terras férteis,

diminui a água de boa qualidade disponível, avança a

desertificação. A extinção de espécies e a perda da biodiversidade

ocorrem em progressão inédita.”, em progressão nunca vista.

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Em particular, ele trata da questão do Brasil e afirma:

“Neste momento, a tendência é de continuar avançando na ocupação de

áreas novas, a julgar por um relatório recente do Instituto

Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe)...”, o relatório diz que: “a

área plantada com cana-de-açúcar no Estado de Goiás cresceu 52%,

nos últimos anos e está prevista a instalação de mais 74 usinas no

Estado, onde as licenças para desmatamento em ‘áreas de mata

nativa’ atingiram 555,4 mil hectares em seis anos.”. Não só nos

comemoramos a descoberta de um novo poço de petróleo como nós

estamos comemorando, também, os biocombustíveis. É isso que nós

estamos fazendo. “De acordo com o mesmo relatório, do Inpe, a

expansão da área plantada com cana em Minas Gerais foi de 62,4%; no

Paraná, de 43%; no Mato Grosso do Sul, de 42%; em São Paulo, de

25,5%; e em Mato Grosso, de 16,2%.”. Na Amazônia o desmatamento

voltou a crescer, todos receberam um suplemento sobre a Amazônia,

do Estado de São Paulo, que é excelente e eu parabenizo pela

iniciativa de terem divulgado. Aí, nós encontramos coisas

dramáticas, para chorar mesmo.

O documento da Organização para a Cooperação e o

Desenvolvimento Econômico afirma que, provavelmente, haverá a

continuidade do desmatamento, e a projeção é que o Brasil passará

de 23% para 28% do mercado mundial de carnes, e, essa carne vem da

Amazônia.

Evidentemente que a questão é exclusivamente ambiental, e

esse, talvez, seja um ponto de virada importante. O problema é que

o que essa menina falou nessa Conferência, nós não entendemos

direito. Ela, na verdade, ela pautou a fala dela sobre um dado que

nós insistimos em não discutir, e eu não sei até quando o mundo

deixará de discutir esse tema, é verdade que muitos intelectuais já

têm feito este trabalho, e, nesse momento me arrisco a colocar este

tema que é muito polêmico em discussão, mas, de fato, o que nós

queremos dizer com desenvolvimento sustentável? O que nós queremos?

Essa é uma pergunta que parece ser coletiva, mas ela é respondida,

em primeiro lugar, no âmbito pessoal. O que cada um de nós quer,

pretende para o mundo, para o futuro do planeta? E, daí, podemos

fazer várias outras perguntas: o que este Tribunal quer? O que a

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Prefeitura quer? O que as escolas querem? O que as famílias querem?

O que os bancos querem? O que as empresas de carro, as montadoras

querem? De tal forma que, talvez, a gente comece a ir de encontro

com as contradições que, até agora, nós evitamos. É compatível

pretender anunciar defesa do meio ambiente e, ao mesmo tempo,

anunciar um plantio de cana, de biocombustíveis, criando no

imaginário coletivo, na consciência das populações uma autorização

tácita para um maior consumo de carros? Vocês entendem? Eu faço

essa pergunta no lugar de um educador, é como se eu fosse fazer uma

palestra sobre tabagismo, sobre fumo, sobre câncer do pulmão e

estivesse fumando. Tem cabimento nós produzirmos todo um discurso

sobre desenvolvimento sustentável e, ao mesmo tempo, afirmar, de

maneira absolutamente contraditória, maneiras de exploração e

destruição da natureza sem precedente? É o que nós estamos

produzindo hoje neste nosso país.

O que nós esquecemos? No meu modo de entender, nós

esquecemos de produzir no âmbito da educação ambiental uma lógica

de confrontação do modelo de desenvolvimento. É disto que eu estou

falando. Nós produzimos educação ambiental e ambientalismo quase

que de uma maneira ideal, como se não fosse necessário ir ao

encontro do modo de desenvolvimento que nós estamos vivendo. O

modelo de organização da nossa vida. É dramática esta questão

porque nós não temos uma resposta posta no mundo, hoje. Nós não

temos. A discussão entre capitalismo e comunismo se foi, não é

aquela discussão. As múltiplas frentes de organização da sociedade

já aconteceram. Homens e mulheres se organizam de muitas maneiras,

nós não temos mais apenas os partidos políticos. A escola não é o

único lugar que educa. As ONGs... Há várias formas de organização.

As pessoas podem dialogar e se apresentar de maneira diferente em

várias frentes. Portanto, quais são os modos de discussão, de

crítica, de crivo do sistema que aí está? É muito sério esse

problema. E, nós tendemos a colocar o tema da educação ambiental e

do ambientalismo apenas e tão somente na questão da exploração da

natureza, esquecendo da necessária política, da questão política e

econômica. Muitas pessoas falam hoje da tal da economia verde, mas

a economia verde, na verdade, são produtos esverdeados que vão

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sendo criados. Estão, aí, os bancos vendendo agora planos e planos

com tarjetinhas verdes e tal. Efetivamente, colocar em discussão o

sistema capitalista, qual de nós está fazendo de frente? É

possível, hoje, se contrapor ao modo de desenvolvimento do

consumismo, da propaganda? Teremos nós coragem de afirmar que nós

não necessitamos de tantas bugigangas novas, como as fábricas nos

impõe? Cada um de nós aqui quererá romper com esta cadeia infernal

e acelerada, compulsiva de ter mais? Ter, comprar, adquirir mais.

Nós estamos preparados, então, para enfrentar o modelo de

desenvolvimento que nós vivemos e colocar em xeque toda a nossa

organização? É uma utopia isso, não é? Mas nós estamos aqui em cima

olhando para baixo e dizendo: “o que nós vamos fazer com isso?”. Ou

nós vamos assumir o risco de construirmos usinas nucleares e...

Bom, o Mad Max, afinal de contas, pode se realizar, não é? Vocês

lembram do filme? Tudo bem, desde que nós possamos andar de carro,

vamos em frente. Carros elétricos, Ferraris elétricas. Como seria o

anúncio de uma Ferrari elétrica? Será que uma Ferrari elétrica

atingiria 350 km/h? Será que o som do motor de uma Ferrari elétrica

é aquele som que seduz homens maravilhosos e mulheres

escandalosamente belas?

Na verdade, se me permite, Doutor Caruso, meus colegas, o

que nós estamos escapando, por um desvio metodológico perverso, é

de nos confrontar com a nossa própria existência. O enfrentamento é

o modo de produção como está aí, que é o que devora a nossa própria

vida e não é confrontada porque ele nos seduz, ele abastece a nossa

subjetividade de um sem número de coisinhas que cria essa imagem de

que, afinal de contas, a nossa vida é melhor. É verdade que a

tecnologia descobriu muita coisa, mas é verdade que a nossa vida

vive problemas dramáticos cujo a solução nenhum de nós tem. Nós não

temos solução, hoje, para o número de pessoas que vivem o drama da

obesidade e todos os problemas decorrentes de saúde pública. 60% da

população mexicana é obesa hoje, 40% da população européia, que era

uma população tendencialmente magra, ou enfim, está engordando de

maneira perversa. É tão grave que o Governo inglês já decretou que,

pela questão da obesidade e dos problemas de saúde social, e, eu

estou me referindo a países ricos de propósito, porque eles têm

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tecnologia e recurso de saúde pública para solucionar grande parte

dos problemas de saúde que aqui nós não solucionamos, mas o Governo

inglês já reduziu a expectativa de vida porque a população está

engordando. E, é muito interessante estudar a metáfora da

obesidade, porque ela carrega muito claramente o que significa uma

sociedade que não tem limites no ter coisas, no devorar. É

interessantíssimo, porque é o exatamente o contraditório absoluto

do que a Semana de Arte Moderna dizia, a antropofagia, “devorar o

outro para devolver como si mesmo, enriquecido”. Aqui é um devorar

a imagem do sucesso. Nós somos seduzidos pelas imagens que dizem

que com isto, ou aquilo, nós seremos bem sucedidos. A imagem de um

aparelho que, isto sim, fará com que você se comunique sem limites

com tudo. Os celulares. A imagem dos carros que são a extensão, a

potência peniana. É disso que nós estamos falando. De um imaginário

que está absolutamente escavacado, manipulado, controlado por algo

que, obviamente, não diz respeito ao efetivo exercício da vida. Ao

mesmo tempo em que nós assistimos esse avanço irrefreável para

essas doenças sociais. Nunca nós vivemos doenças tão graves na

intimidade como hoje. Questão anunciada por Freud, por Nietzsche.

Não é a toa que o Viagra é, sem dúvida, um dos medicamentos que

mais vende no mundo inteiro. A incapacidade do diálogo é uma

condição sistêmica de suporte do modelo de desenvolvimento

capitalista como nós temos hoje. Eu repito: a incapacidade do

diálogo é uma condição sistêmica. O sistema capitalista depende da

incapacidade do diálogo. Se nós nos aquietarmos e frearmos a nossa

busca por coisas, e olharmos para os lados, o que nós

encontraremos? Gente. Gente querendo conversar. E a conversa é tão

potente, o diálogo é tão potente que é suficiente para suplantar

toda a neurose que a propaganda impõe como busca, desejo de consumo

e de coisas.

Por isso que é fundamental que a grande busca hoje para o

sistema, é que nós, ao invés de nos preocuparmos com as questões da

saúde humana, intelectual, espiritual, sentimental, ou como

quiserem, da subjetividade, nós nos preocupamos com as novas telas

planas digitais que o Governo, agora, colocou a nossa disposição

por dez mil reais. É muito mais importante; hoje, os meninos fazem

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isso e eu vejo que as crianças lidam com essa questão, não é

brincadeira, vocês têm filhos, filhas, sobrinhos, amigos jovens,

netos; as meninas, os meninos, as crianças querem este equipamento.

Eles são levados a querer esse equipamento. Mas, o que significa

uma televisão digital? O que vai melhorar a vida de cada um nessa

coisa de televisão digital? Porque que é absolutamente

imprescindível que nós tenhamos televisão digital? O que aconteceu?

Eu não entendi até agora. A rede neural vai trabalhar melhor e nós

vamos ser mais... Eu não estou entendendo. É uma bobagem. Mas, eu

estou me permitindo sair, descolar dessa realidade e dizer assim:

“Mas, escuta, para onde nós estamos indo?”. Porque eu tenho que

ficar conectado o tempo todo, por quê? Porque eu não posso mais

ficar em silêncio? Porque eu não posso ficar sozinho?

O mundo que a menina estava criticando e que é o mundo em

que nós estamos vivendo hoje é um mundo em que nós não fazemos as

perguntas simples, é um mundo que nós queremos que as crianças não

sejam crianças, nós queremos que as crianças sejam adultas. E, o

que é um adulto? O adulto é um chato que não faz mais perguntas. É

só isso. Adulto é exatamente aquele sujeito que passou por uma

série de situações e acha que agora já conhece o suficiente para

poder dizer para o outro: “faz assim ou faz assado”. E, essa

ruptura com as perguntas essenciais da vida fazem com que nós

percamos de vista o que, afinal de contas, é fundamental para a

existência. Esse modelo de desenvolvimento, por que nós não

criticamos mais? Por que ficou tão fácil de achar que “bom, afinal

de contas, o capitalismo venceu, então, é assim”.

A menina falou dos armamentos. Tem um dado muito pior, eu

acho, hoje: é verdade que, se nós estancássemos as guerras, nós

resolveríamos todo o problema de alimentação. Aliás, é mais fácil

ainda, dando curso para especialistas em comércio exterior, eu

descobri que o problema do alimento não tem nada a ver com

produção, é distribuição e incentivo, impostos, comércio. Alimento

existe para todos. Por que não há distribuição? Porque não há

interesse.

Bom, nós não fazemos mais essas perguntas fundamentais,

nós deixamos que esse processo avassalador invada a nossa vida.

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Nós, então educadores, nos preocupamos menos em realizar as tarefas

mais simples, e as mais importantes, e vamos ao encontro das

grandes tecnologias e das grandes didáticas. E, penso que fazer

educação, essencialmente significa fazer essas perguntas. E, retomo

essa metáfora de impressionado, assim como Marco Pólo, ver uma

população que está estupefata, incontrolável, angustiada,

deprimida, vendo a sua própria destruição e, ao mesmo tempo, se

locupletando com esse mecanismo avassalador que leva a própria

destruição. Nós estamos locupletando esse sistema. Nós não o

freamos, não. Nós fomos responsáveis por tudo isso, nós não freamos

o nosso desejo de consumo. E, nós não criamos uma massa crítica tal

que não coloque apenas o Governo do PT, ou do PSDB em discussão,

mas nós não colocamos a lógica que rege a nossa vida em discussão.

Conseqüentemente a minha pergunta, que vai se complexificando a

cada instante por essa reflexão, nos leva a perguntar: “estamos nós

dispostos a nos mudar, a mudar o nosso modo de agir? Nós aqui

queremos mudar esse modo de agir? Nós que estamos, nesse momento,

metaforicamente olhando a nós mesmo lá embaixo queremos voltar, mas

voltar diferentes? Nós queremos substituir os jogos tolos dos

controles e das políticas de contenção do outro, da circunscrição,

das oposições? Nós que queremos a tempo expulsar a diferença e a

oposição, aquele que discorda da gente, buscando só quem concorda,

nessa crise infinita, egóica. Nós só queremos alguém que nos elogie

o tempo todo. Será que algum dia nós vamos realmente amadurecer e

não nos preocupar com a crítica, ou com o elogio, mas,

simplesmente, fazer aquilo que nós achamos correto, e, aí, sim

assumir a vida adulta de verdade? Eu me lembro que, só para citar

um exemplo bem bacana disso aqui, afinal de contas é a criança, e o

que é fazer educação, o Picasso evoluiu da fase do retrato, da fase

mais acadêmica para maior abstração possível, criando rostos

grotescos, imagens distorcidas, e uma senhora importante na

Espanha, com muito dinheiro, enfim, patrocinou uma exposição do

Picasso, e, ele ousa colocar seus quadros mais recentes, os mais

abstratos, os mais agressivos, os mais contundentes, os mais

críticos, irônicos. E, essa senhora, na abertura da exposição, vai

com o seu neto e ela não se sente bem, porque afinal de contas ela

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patrocinou tudo aquilo, então, ela fala: “Seu Picasso, eu não estou

entendendo. O senhor tinha uma produção tão interessante, tão

bonita. Essas obras, essas obras o meu neto faz.”. Então, ele

disse: “Pois é. O seu neto sim, a senhora não.”. O que mostra uma

coisa muito interessante, que o artista percorreu toda uma vida,

para poder viver depois aquela simplicidade de fazer as perguntas

simples, o desenho simples, a simplicidade de pensar o mundo. O que

é, afinal de contas, importante? Para que nós possamos responder,

no retorno a nossa vida, o que continuamente nós podemos fazer.

Porque, guardar o silêncio, interiorizar e, depois, se abrir para

uma conversa, é sair do mundo, se colocar um pouco por cima. É

viver um certo Tribunal de si próprio, consigo mesmo, e retornar.

Retornar para o diálogo com o mundo, para a troca com o mundo. Esse

é o caminho para mudar o modo de agir, de reconsiderar as relações,

de não mediocrizar a oposição, de não mediocrizar as decisões, de

decidir fortemente pela mudança.

Me anima muito vir falar nesse fórum porque sei que

lideranças importantes que pensam o nosso Município estão aqui, e

eu acho que nós temos que fazer um apelo de ordem política. Sejamos

mais ousados, dando respostas mais ousadas e mais contundentes ao

que aí está. Não haverá partido a se beneficiar disso, não. Seremos

nós, não nós aqui sentados nessas cadeiras, mas as crianças que

hoje têm 13, 10, 5, 2, 1 ano, e as crianças que virão. Isso

significa que uma importante tem que acontecer. Uma mudança de

caráter humano e não técnico e nem tecnológico. Não me peça,

evidentemente, para dizer como tem que ser feito isso nas escolas,

ou aqui no Tribunal, ou nas ações, enfim, dos vários momentos da

organização da nossa vida. Interessa saber que, talvez, nós

possamos afirmar juntos, é uma mudança no jeito de pensar a relação

conosco e com o outro. E, modifiquemos essa forma de nos doar para

o mundo. Eu peço com muita calma e com muita tranqüilidade, sejamos

um pouco mais silenciosos, um pouco mais lentos e escutemos um

pouco mais. Com calma. Para nós combatermos o que, penso, define no

fundo, no fundo, o mundo em que nós estamos vivendo: veloz,

fragmentado e superficial. Não nos contentemos com essa velocidade,

com essa superficialidade, com essa fragmentação contínua. Não nos

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contentemos, aliás, com nada. Nos realizemos, no silêncio, na calma

e na profundidade.

Obrigado.

O Sr. Presidente Antonio Carlos Caruso – Podemos notar

aqui que o querido Fabio Alberti Cascino tocou no coração de todos.

Espero que tenha tocado, também, na nossa consciência, e, que nós

saíamos daqui realmente conscientizados de todas as afirmações que

ele aqui o fez, e são afirmações deveras contundentes, que nós

sentimos aí no dia-a-dia e estamos atravessando por ela.

Fabio, em nome do Tribunal de Contas, do Município, da

nossa comissão de meio ambiente, e de todos aqui presentes, nós o

agradecemos de todo o coração por esta sua estada aqui conosco.

Eu quero passar as suas mãos um pequeno mimo do Tribunal

de Contas do Município: o XII Seminário Nacional do Município.

Educação Ambiental, mudanças de cultura. Esta Casa certifica e

agradece a participação do Ilustre Palestrante Fabio Alberti

Cascino, nesse curso que ficou enriquecido sobremaneira com o

brilho de sua contribuição ao estudo do tema a importância da

educação ambiental na formação das gerações. E, enriquecido mesmo.

Muito obrigado.

O Sr. Fábio Alberti Cascino – [FORA DO MICROFONE]

O Sr. Presidente Antonio Carlos Caruso – Olha, o Fabio

está se colocando a disposição para eventuais perguntas. Eu queria

solicitar, já para vir fazer parte da mesa, o nosso querido

palestrante o Cássio Roberto da Silva, que é o Presidente do Centro

de Educação, Preservação e Pesquisa Ambiental Reservas do Brasil;

ele é o Gestor Ambiental da Fazenda Multiambiental Reserva

Particular do Patrimônio Natural de Tapiari. Cássio, é uma alegria

recebê-lo.

E, nós vamos abrir a oportunidade, então, para os

senhores e as senhoras, para aquele que desejar, que quiser fazer

alguma pergunta ao Fabio, porque ele estará pronto para respondê-

la. Cavalheiro lá, por favor.

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O Sr. Nelson – Fabio, na verdade, eu não quero perguntar,

eu quero te agradecer por você nos fazer pensar, por você nos fazer

refletir, por você nos fazer compartilhar esperança, por você fazer

brotar, eu acho que dentro de mim e provavelmente de todos, pelo

menos dos que estão aqui do meu lado, a indignação para poder

reagir a uma situação dessa, ousar, como você bem falou, não

atribuir essas tarefas apenas às crianças. A tarefa é nossa, não

são as crianças que estão aí que vão fazer algo que, nós quando

crianças criticávamos e, de repente, nós fazemos nesse momento.

Mas, eu quero agradecer também, porque você tocou em um ponto que

não foi tocado aqui anteriormente, e que, no meu entender, também é

fundamental, a questão política, a questão ambiental está

fundamentalmente associada a uma alteração política, a uma

alteração econômica, e é muito simples de nós entendermos isso, é

necessário apontar para uma direção. Nós temos que fazer uma opção

política. Eu lembro o que o professor Toshio Mukai falou aqui no

primeiro momento, no primeiro dia, desculpe. “Nós temos que tratar

a questão ambiental como uma questão de dignidade humana, porque

está ali no artigo 1º, da nossa Constituição.”. As colegas do Rio

de Janeiro, agora pela manhã, citaram o texto constitucional. E, eu

gostaria de citar dois artigos dele, respondendo, então, a minha

indagação, e, no meu modo de ver, apontando para o norte no qual

nós deveríamos nos direcionar. São os artigos 1º, que complementa,

então, o que o professor Toshio Mukai falou, tratando dos

fundamentos do nosso Brasil, além da dignidade humana, ela está

associada a cidadania e aos valores do trabalho e da livre

iniciativa. Muitas vezes nós esquecemos esses dois pontos. Mas,

muito mais do que isso, nós buscamos, e eu até confesso para as

colegas do Estado do Rio que não havia reparado a imposição que se

faz no artigo 225, no sentido de tratar o meio ambiente. E, eu

entendo que, se nós tratarmos do artigo 3º, da Constituição, seria

uma imposição também, para o Estado e para todos nós, do que se

busca na nossa República Federativa: a construção de uma sociedade

livre, justa e solidária; a garantia do desenvolvimento nacional,

dentro desta orientação que você está colocando; a erradicação da

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pobreza e da marginalidade, de modo a reduzir a desigualdade, que

um outro colega colocou aí também; e a promoção do bem de todos. Eu

acho que, se nós tratarmos todos esses parâmetros associados, nós

teremos o nosso norte, nós teremos a direção que você muito bem nos

apresenta e nos faz, então, buscar esse novo caminho.

O Sr. Presidente Antonio Carlos Caruso – Mais alguma

questão? Muito obrigado ao Nelson pela extraordinária colocação.

Mais alguma questão, alguma pergunta? Nada mais?

O Sr. Fábio Alberti Cascino – Se me permitem, eu farei

apenas uma observação em relação a sua fala. Agradeço imensamente o

seu elogio, fiquei emocionado pela reação de vocês. Eu fiquei

emocionado e comovido, e espero que tenha ocorrido o mesmo.

Na verdade, é uma situação tão grave a que nós estamos

vivendo que nós precisamos nos mobilizar. Então, a intensidade da

minha fala é relativa à intensidade da minha crença na nossa

capacidade de mudarmos as coisas. Por isso que eu não aceito o

rótulo de nem catastrofista, nem pessimista, como eu disse quando

comecei a minha fala. Porque é da indignação ousadamente

pessimista, radical que surge a capacidade da transformação ousada

e radical. E, nós precisamos é dessa.

Com relação a essas questões políticas, sim, é muito

grave esse tema. Eu sinto ter que dizer, mas, muito dos nossos

colegas, dos meus colegas, dos meus amigos, não neste encontro, mas

em muito encontro, têm produzido essa lógica que é perversa, e eu

tenho insistido muito nessas questões. Infelizmente até para muito

desconforto pessoal de ter que lidar com isso, mas há muito

interesse de sobrevivência, de poder estar no mundo ocupando

lugares, a partir de um jogo de interesses, de um certo respeito às

condições atuais para a obtenção de fundos, de bolsas, de recursos

governamentais, ou privados, para acessar os patrocínios. Isso

significa dizer que, não raro, muitos pensadores da educação

ambiental e do ambientalismo sabem, perfeitamente, que a questão da

preservação deste planeta está ligada diretamente com a

substituição urgente do modelo de produção e desenvolvimento, e,

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isso significa afrontar radicalmente as lógicas imperialistas e

toda a lógica da guerra, de todas as formas de guerra, e, aí,

também as guerras de consumo, as guerras das relações

interpessoais, além daquelas do Estado, do Estado terrorista, do

Estado patrocinador de conflitos. Então, eu me refiro desde as

questões territoriais entre Irã/Iraque, Israel, enfim, da Al-Qaeda,

enfim, culminando, chegando, desdobrando nas questões nossas, mais

locais, dos conflitos entre a pobreza e a riqueza, a marginalidade,

e, daí, toda a violência simbólica que as imposições dos

comerciais, do sexismo, das drogas, da sexualidade desenfreada em

relação a pai e mãe, e tal, estão postas.

Então, é enfrentar essa questão imperial, do ponto de

vista da guerra, ao lado de uma reforma radical do que significa

Democracia hoje.

Na verdade, nos primórdios do ambientalismo, e aí me

refiro a fundadores, a pensadores do pensamento ambientalista,

dentre eles Hebert Marcuse, e, aí, sem referência a momentos da

história em que esses autores produziram, eu vou fazer uma certa

mistura de datas, mas aqui, na verdade, são referências

conceituais. Herbert Marcuse, Henry David Thoreau, o próprio

Gandhi, o Félix Guattari, Milton Santos, Paulo Freire, Edgar Morin

são todos pensadores que nos colocam de frente dessa condição

radical do ser humano, ao lado de uma realização política do

humano.

Então, vejam, realizando, portanto, e eu vou até pedir

desculpa para o meu colega, porque eu estou me alongando um

pouquinho na resposta, mas é só para completar alguns dados que me

parecem importantes, perdão, perdão Doutor Caruso.

Realizando, portanto, uma conexão fundamental, já

encontrada nos pré-socráticos e elaborada por Epicuro, na

realização ética do ser humano. Na relação entre o jardim e a rua,

entre o íntimo, a casa, o canto, o nosso canto, o nosso lugar de

descanso, portanto, o jardim, em relação a rua, o lugar das

relações, do encontro, da troca, e, portanto, o lugar da política.

A melhor política é a que pensa o encontro desses dois mundos.

Então, neste momento, eu me refiro aos últimos 30 anos, muitos

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pensadores sabem do que nós estamos falando, sabem que repensar as

relações significa repensar este universo, da política e de todos

os impérios que nos controlam. Ocorre que há muitos interesses,

interesses imediatos, de sobrevivência imediata, que se sobrepõe a

um projeto de transformação, na verdade, me refiro a uma utopia.

O que nós estamos vivendo, na verdade, meus colegas,

amigos e todos vocês, nós estamos vivendo os estertores do que foi

o projeto da Revolução Francesa, nós estamos vivendo os momentos

finais de um modelo de organização da sociedade. Para muitos

autores nós estamos vivendo a pós-modernidade, a super-modernidade,

enfim, algo que tem início no final da Idade Média, com a passagem

pelo renascimento, e que mostra, então, seus limites. Porque nós

chegamos, de fato, em limites materiais, em limites concretos que

estão aí. Mais dez, vinte, trinta anos, em termos de população

planetária é nada, é nada, absolutamente nada. Mas, sem dúvida que

nós precisamos colocar os temas desta maneira. Ocorre que há muita

hipocrisia, muita falsidade, porque se coloca na frente, o projeto

pessoal. Na verdade, com Stefan Zweig, o minuto decisivo. Stefan

Zweig que tem um famoso texto que chama O Minuto Decisivo. Muitas

decisões acontecem em momentos em que a subjetividade atua. Aliás,

todas as decisões acontecem assim, na subjetividade. Eu até

comentava com um colega, o Marcos, como o nosso sistema jurídico,

hoje, carece de formação filosófica. Essas faculdades formando

rapidamente advogados, e que passam por cursos em que não há essa

reflexão. E, eu sempre fico pensando: “como uma menina de 28 anos,

um menino de 28, 29 anos, que assume lá um cargo de juiz, qual é a

subjetividade desse rapaz, dessa moça quando olha um caso de um

casal que está se destruindo em uma separação? Ou em uma venda de

imóvel? Ou em um assassinato? O que acontece na cabeça desse povo

que sofre exatamente todas essas influências?”. Então, são

perguntas graves que nós não fazemos, por quê? Porque nós nos

colocamos antes com esses projetos imediatos.

O tema da política, portanto, nessa dimensão a que eu me

refiro, ética, maior, ele está posto desde o início para o

movimento ambientalista. Mas, quis, o movimento ambientalista,

principalmente este mais ligado aos corredores do Congresso, as

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gestões das grandes empresas, que outras decisões fossem tomadas,

até para viabilizar aquisições mais imediatas. É uma pena para

todos nós, mas concordo com Freud, “todos nós mudamos com o

trauma”. Sinto informar a todos nós que haverá de acontece um

grande trauma, a humanidade mudará.