vol. 1, nº 03, ano ii, janeiro - março de 2015 · trânsito, trazendo as principais vicissitudes...
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INSTITUTO SUPERIOR DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIA ALBERTO CHIPANDE
Rua Correia de Brito n˚ 952, Tel. +25823320794
Cidade da Beira - Moçambique
REVISTA CIENTÍFICA DO ISCTAC
Propriedade do ISCTAC Vol. 01, Ano II, Edição Nº 03, Janeiro - Março de 2015
Registo: Nº 82/GABINFO-DEC/2014 www.isctac.org
Email: [email protected]
DESTAQUES:
O Sistema Eleitoral Moçambicano e a Possibilidade da Ocorrência do Accountability dos Deputados: Análise do Círculo de Sofala.
Breve Análise da Tutela Penal do Ambiente à Luz do Direito Moçambicano e a Sua Importância no Desenvolvimento de Moçambique.
Vicissitudes do Teste do Álcool e a Sua Ineficácia Sob o Ponto de Vista Legal, no Âmbito da Polícia de Trânsito.
Incubadora de Empresas: Origem, Objectivos e Importância.
Boko Haram: Ameaça a Paz e Segurança do Sahel ao Corno de África.
Nº 03
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Director da Revista
Msc. Júlio Taimira Chibemo
Editor da Revista
Msc. Emílio J. Zeca
Registo Nº 82/GABINFO-DEC/2014
Propriedade:
Instituto Superior de Ciências e Tecnologia Alberto Chipande
Rua Correia de Brito, Nº 952
Cidade da Beira - Moçambique
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REVISTA CIENTÍFICA DO ISCTAC
Volume 1 Número 03 Janeiro - Março de 2014 Ano II
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Ficha Técnica:
Propriedade: ISCTAC
Director: Msc. Júlio Taimira Chibemo
Editor: Msc. Emílio J. Zeca
Redacção: Msc. Edumar Barreto,
Msc. Diana Pinto, Msc. Paulo de Sou-
sa, Msc. Júlio Taimira Chibemo e
Msc. Emílio J. Zeca.
Distribuição: ISCTAC
Beira, Março de 2015
REVISTA CIENTÍFICA DO ISCTAC
Vol. 01, Ano II Edição Nº 03
Vol. 1, Nº 03, Ano II, Janeiro - Março de 2015 Vol. 1, Nº 03, Ano II, Janeiro - Março de 2015
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NOTA EDITORIAL
A terceira edição da Revista Científica do ISCTAC aparece num con-
texto especial e complexo a nível nacional, continental e global. O
Fim da Guerra Fria proporcionou um conjunto de mudanças e trans-
formações no Sistema Internacional, onde os actores das relações
internacionais e os assuntos deixaram de ser dominados somente pelos Esta-
dos, passando a surgir outros actores não estatais com relevância dos Estados;
e os assuntos militares e de defesa e segurança passaram a ter o mesmo trata-
mento que as ameaças não militares. Moçambique não tem como escapar
dos efeitos negativos e positivos das transformações ocorridas no Sistema Inter-
nacional desde os início dos anos 1990.
A presente edição começa com a apresentação do artigo do Msc. Edu-
mar Barreto e o mesmo procura analisar o sistema eleitoral moçambicano e a
possibilidade da ocorrência do accountability dos deputados, fazendo uma
análise do Círculo Eleitoral de Sofala. A relação entre o deputado e o eleitora-
do é crucial para que a actividade do primeiro seja profícua em relação ao
segundo.
O segundo artigo é da autoria da Msc. Diana Pinto faz uma breve análise
da tutela penal do ambiente à luz do direito moçambicano e a sua importân-
cia no desenvolvimento de Moçambique e constata que no ordenamento
jurídico Moçambicano à luz do Direito Penal vigente, não existe, ainda,
nenhum capítulo ou qualquer outra lei extravagante direccionada para os
crimes ambientais. Ainda no domínio do direito, sobretudo o penal, Msc. Paulo
de Sousa, Jurista e Criminalista, Mestre em Ciências Jurídicas Público Forense,
problematiza a questão dos testes de álcool levados a cabo pela Polícia de
Trânsito, trazendo as principais vicissitudes deste teste, olhando para a e a Sua
Ineficácia Sob o Ponto de Vista Legal.
O artigo do Msc. Júlio Taimira Chibemo versa sobre as incubadoras de
empresas, mas conhecidas por ninho de empresas. O autor procura trazer os
contornos da sua origem, objectivos e importância, apresentando como uma
estratégia de edificação e desenvolvimento de Pequenas e Médias Empresas,
em Moçambique.
O último artigo, versa sobre a problemática do terrorismo, proliferação de
grupos radicais e as ameaças que a “cooperação terrorista” entre os grupos
terrorista que estão se implantando da região do Sahel até ao Corno de Áfri-
ca, procurando trazer o significado que isso pode apresentar. No caso em
apresso, o grupo terrorista em análise é o Bako Haram, procurando trazer as
actividades que leva a cabo no Estado Nigeriano, Estados vizinhos e a possibi-
lidade de cooperação com a al Qaeda do Magreb, al Shabab e Estado Islâ-
mico.
Continuamos a aguardar dos prezados leitores a vossa estimada cola-
boração com críticas, sugestões e contribuições positivas e oportunas para a
renovação da Revista Científica do ISCTAC.
O Editor
Msc. Emílio J. Zeca
Vol. 1, Nº 03, Ano II, Janeiro - Março de 2015
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O Sistema Eleitoral Moçambicano e a Possibilidade da Ocorrência do Accountability dos Deputados,
Análise do Círculo Eleitoral de Sofala
Msc. Edmar Barreto Jorge
Docente ISCTAC, licenciado em Direito e Historia,
Mestrado em Ciências Politicas e Relações Internacionais.
O presente estudo tem como objectivo analisar as possibilidades no sistema eleitoral moçambicano de repre-sentação proporcional, a ocorrência de accountability dos deputados para com os eleitores. O problema está ligado ao facto de que o sistema eleitoral de representação proporcional não favorecer de forma teórica o accountability dos deputados para com os eleitores, mas sim dos deputados para com os seus partidos políticos que os coloca na lista eleitoral. A pesquisa foi desenvolvida numa abordagem qualitativa, com base na amos-tragem por acessibilidade, foram realizadas entrevistas á deputados no ciclo eleitoral de Sofala e inqueridos eleitores nos distritos de Nhamatanda, Dondo e Beira. As conclusões apontam para a inexistência de accoun-tability por parte dos deputados, além de indicar que existe uma maior prestação de contas dos deputados aos partidos e não aos eleitores.
Vol. 1, Nº 03, Ano II, Janeiro - Março de 2015
Introdução
A s eleições representam a espinha
dorsal do processo de participa-
ção política democrática. Em
Moçambique os processos eleito-
rais têm, sido marcados por acusações de
fraude, alto nível de desconfiança entre os
partidos políticos e alguns incidentes graves,
o que sinaliza fragilidade das instituições
democráticas no país.
De acordo com a legislação eleitoral
vigente, o Presidente da República é eleito
por sufrágio universal e directo num círculo
eleitoral único ao nível nacional, em eleição
de cunho maioritário, ao passo que os depu-
tados da Assembleia da República são elei-
tos num sistema de representação proporcio-
nal assente em círculos eleitorais correspon-
dentes à actual divisão territorial do país em
províncias (aos 10 círculos eleitorais formados
pelas províncias se soma a cidade de Mapu-
to, resultando em 11 círculos eleitorais), sen-
do a cada círculo eleitoral atribuído um
número de assentos parlamentares propor-
cional ao número de eleitores recenseados.
Os eleitores votam em uma lista fechada pro-
posta e ordenada pelos partidos políticos.
Pretende-se nesta análise, apresentar a
possibilidade da ocorrência do accountabi-
lity, num sistema de representação propor-
cional de listas fechadas como é o caso do
Estado moçambicano. Um governo sob a
égide do sistema democrático, o seu povo
não estará directamente presente nos pro-
cessos de tomada de decisão significa que
uma parte da população (a maior) delega
seus poderes a uma minoria para que em
nome dela, possa-lhe representar. Sendo
assim, importa referir que o accountability é
um tema central dos regimes democráticos,
visto que ela se torna a principal garantia
que vincula os representantes aos represen-
tados e as reflexões mais desenvolvidas sobre
esse tema estão concentradas entre autores
da ciência política e, voltadas fundamental-
mente para o accountability eleitoral.
O Sistema de representação proporcio-
nal de lista fechada tem a particularidade
de fazer com que os eleitores possam ser
representados no processo de governação
por uma minoria pré-ordenada em listas par-
tidárias sem a possibilidade de escolher
directamente em quem os pode representar,
apenas ao partido político. Perante esse sis-
tema eleitoral, estudos demonstram que a
ligação entre os eleitores e o partido é muito
mais forte e coeso do que entre os eleitores
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com os seus representantes directos. O mes-
mo verifica-se também na relação entre os
partidos políticos com os representantes elei-
tos/deputados, que é bastante forte/coesa.
É nesta perspectiva surgiu a nossa inquie-
tação, a de saber até que ponto o sistema
eleitoral de Moçambique favorece a ocor-
rência do accountability dos deputados
para com os eleitores. Este estudo, tem a
particularidade de trazer um conceito da
Ciência Política, as suas dimensões e indica-
dores para ler, compreender um fenómeno
de extrema importância para a edificação e
sedimentação da democracia. Refere-se
aqui, a relação entre os representantes políti-
cos e os seus eleitores, mas concretamente
sobre accountability que é um dos garantes
da qualidade da democracia. Na mesma
perspectiva, este estudo torna-se relevante,
porque procura compreender o mecanismo
de prestação de contas entre os deputados
e o seu eleitorado.
Os Sistemas Eleitorais e Sua Importância
O sistema eleitoral adoptado num país
pode exercer — e em verdade exerce —
considerável influxo sobre a forma de gover-
no, a organização partidária e a estrutura
parlamentar, reflectindo até certo ponto a
índole das instituições e a orientação política
do regime.
A sociologia tem investigado com des-
velo o efeito das técnicas eleitorais e deduzi-
do a esse respeito, importantes conclusões
conforme se trate do emprego da represen-
tação maioritária ou da representação pro-
porcional. Vejamos as modalidades básicas
de sistemas eleitorais e a peculiaridade das
consequências que sua utilização tem produ-
zido nas formas democráticas do Ocidente.
Segundo Fernandes (2008) “ um sistema
eleitoral compreende um conjunto de ele-
mentos inerentes as eleições politicas de
cada pais”. Com efeito, o modo como está
estruturado as espécies e formas de sufrágio
legalmente previstas, o contencioso eleitoral,
o processo de escrutino são elementos inte-
grantes do sistema eleitoral. Segundo o autor
acima citado existem basicamente três siste-
mas eleitorais com as suas variantes: Sistema
maioritário de representação, sistema de
representação proporcional e o sistema mis-
to.
Sistema Maioritário de Representação
É o mais antigo Tecnicamente consiste
na repartição do território eleitoral em tantas
circunscrições eleitorais quantos são os luga-
res ou mandatos a preencher. Segundo
Bonavides Oferece os sistemas duas variantes
principais. Pela primeira — aquela adoptada
na Inglaterra — a eleição maioritária se faz
mediante escrutínio de um só turno, sendo
eleito na circunscrição o candidato que obti-
ver maior número de votos. Aqui a maioria
simples ou relativa é suficiente para alguém
eleger-se. Pela segunda, temos o escrutínio
de dois turnos. Caso nenhum candidato haja
obtido maioria absoluta (mais da metade
dos sufrágios expressos) apela-se para um
segundo turno ou eleição decisiva — a ballo-
tage dos franceses ou Stichwahl dos alemães
— e aí dentre os candidatos concorrentes
eleger-se-á aquele que obtiver maior número
de votos (maioria simples ou relativa). Foi o
sistema praticado no Império Alemão até
1918, ainda hoje vigente na França.
Vantagens e Desvantagens do sistema Maioritário
As vantagens proporcionadas pelo
escrutínio maioritário puro e simples se resu-
mem nos seguintes pontos: Produz governos
estáveis. Evita a pulverização partidária. Cria
entre os dois grandes partidos um eleitorado
flutuante, que serve de “fiel de balança”
para a vitória eleitoral necessária à formação
da maioria parlamentar.
Favorece a função democrática, quan-
do faz com nitidez emergir das eleições um
partido vitorioso apto a governar pela maio-
ria parlamentar de que dispõe. Permite
determinar facilmente, graças à simplicidade
do sistema o número de candidatos eleitos.
Aproxima o eleitor do candidato. O pri-
meiro vota mais na pessoa deste, em suas
qualidades políticas (a personalidade ou a
capacidade de bem representar o eleitora-
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do) do que no partido ou na ideologia. Colo-
ca o representante numa dependência
maior do eleitor do que do partido.
Afasta do Parlamento os grupos de inte-
resses, que não têm oportunidade de organi-
zar-se ou institucionalizar-se sob a forma parti-
dária e acabam integrados no seio das duas
principais agremiações. Utiliza as eleições
esporádicas, para substituição de represen-
tantes, como instrumento eficaz de sonda-
gem das tendências do eleitorado.
Empresta enfim à luta eleitoral carácter
competitivo e do mesmo passo educacional.
O eleitor não vota numa ideia ou num parti-
do, em termos abstractos, mas em pessoas
com respostas ou soluções objectivas a pro-
blemas concretos de governo.
No entanto oferece o sistema seus incon-
venientes. Apontam os críticos, entre outras
desvantagens, as seguintes: Pode conduzir
ao governo com maioria no parlamento um
partido que saiu vitorioso das eleições sem
contudo haver obtido no país uma quantida-
de superior de votos. Pesa também como
defeito grave do sistema maioritário a
influência positiva ou negativa que poderá
ter para os partidos o critério adoptado na
repartição do país em circunscrições eleito-
rais, em virtude do status social e económico
correspondente ao eleitorado dessas circuns-
crições. A repartição pode eventualmente
ser inspirada, manipulada ou patrocinada
por grupos empenhados na obtenção de
determinados resultados eleitorais, favoráveis
aos seus interesses. E a chamada “geometria
eleitoral” que às vezes caracteriza a prática
do sistema e não raro deforma a representa-
ção da vontade do eleitorado.
Finalmente, coroando a série de argu-
mentos que desaconselham o sistema, apon-
ta-se para ausência ou, na melhor das hipó-
teses, para a considerável dificuldade de
representação das correntes minoritárias de
opinião. Nesse sistema, as minorias em geral
nunca chegam ao governo. Quase não há
lugar para os pequenos partidos.
O sistema de Representação Proporcional
Igualmente chamado sistema de representa-
ção das opiniões, vem sendo adoptado por
vários países desde a primeira metade deste
século. A representação proporcional, segundo
Prélot, “tem por objecto assegurar às diversas
opiniões, entre as quais se repartem os eleitores,
um número de lugares proporcional às suas res-
pectivas forças” ou no dizer também claro de
Jeanneau é “o sistema em que os lugares a
preencher são repartidos entre as listas que dis-
putam proporcionalmente ao número de votos
que hajam obtido”.
Vantagens e Desvantagem do Sistema de Representação
Proporcional
Encarece-se em geral o princípio de justi-
ça que preside ao sistema de representação
proporcional. Ali todo voto possui igual par-
cela de eficácia e nenhum eleitor será repre-
sentado por um deputado em que não haja
votado. É também o sistema que confere às
minorias igual ensejo de representação de
acordo com sua força quantitativa. Constitui
este último aspecto alto penhor de protec-
ção e defesa que o sistema proporciona aos
grupos minoritários, cuja representação fica
desatendida pelo sistema maioritário.
Sendo por sua natureza, corno se vê, sis-
tema aberto e flexível, ele favorece, e até
certo ponto estimula, a fundação de novos
partidos, acentuando desse modo o pluralis-
mo político da democracia partidária. Torna
por conseguinte a vida política mais dinâmi-
ca e abre à circulação das ideias e das opi-
niões novos condutos que impedem uma
rápida e eventual esclerose do sistema parti-
dário, tal como acontece onde se adopta o
sistema eleitoral maioritário, determinante da
rigidez bipartidária.
A presença política de correntes ideoló-
gicas, sua institucionalização normal em par-
tidos com acesso ao parlamento ocorre com
mais facilidade pela representação propor-
cional. Através dela se reflecte a perfeita
diferenciação dos grupos ideológicos, todos
absorvidos pela actividade política ordinária.
Evita-se assim a clandestinidade ou a pressão
exterior nociva que tais grupos, se excluídos,
comandariam contra as casas legislativas,
nelas se infiltrando por outras vias.
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Aumenta também a representação pro-
porcional a influência dos partidos na esco-
lha dos candidatos, abrindo as listas partidá-
rias, quando necessário, para acolher e ele-
ger certas personalidades ou certos técnicos,
destituídos de clientela eleitoral, mas cuja
investidura é de interesse partidário.
Enfim, o sistema proporcional permite de
modo adequado a representação dos gru-
pos de interesses e oferece então um quadro
político mais autêntico e mais compatível
talvez com a realidade contida no pluralismo
democrático da sociedade ocidental de
nosso tempo. Neste sistema não só encontramos
aspectos positivos para Bonavides (2000) “A
experiência havida com a aplicação da
representação proporcional em mais de cin-
quenta anos e em diversos países patenteia,
porém, graves inconvenientes ou aspectos
negativos dessa técnica representativa”.
Uma das objecções feitas entende com
a multiplicidade de partidos que ela engen-
dra e de que resulta a fraqueza e instabilida-
de dos governos, sobretudo no parlamenta-
rismo. A representação proporcional amea-
ça de esfacelamento e desintegração o sis-
tema partidário ou incentiva uniões esdrúxu-
las de partidos — uniões intrinsecamente
oportunistas — que arrefecem no eleitorado
o sentimento de confiança na legitimidade
da representação, burlada pelas alianças e
coligações de partidos, cujos programas não
raro brigam ideologicamente.
Da ocorrência dessas alianças deduz-se
outro defeito grave da representação pro-
porcional: exagera em demasia a importân-
cia das pequenas agremiações políticas,
concedendo a grupos minoritários excessiva
soma de influência em inteiro desacordo
com a força numérica dos seus efectivos
eleitorais. Ofende assim o princípio da justiça
representativa, que se almeja com a adop-
ção daquela técnica, fazendo de partidos
insignificantes “os donos do poder”, em
determinadas coligações. É que de seu
apoio dependerá a continuidade de um
ministério no parlamentarismo ou a conserva-
ção da maioria legislativa no presidencialis-
mo. “Parlamentos ingovernáveis” e governos
instáveis contam-se pois entre os vícios que o
sistema produz e que se apontam em desa-
bono de sua adopção.
Ademais a representação proporcional
torna crepitante a luta ideológica e mais visí-
vel o penoso contraste da sociedade de
classes. Propicia por consequência um dog-
matismo de posições que poderá pôr em
perigo a ordem democrática, ao contrário
do sistema maioritário, que enquadra quase
sempre a formação de dois partidos apenas,
e integra e absorve as minorias ordinariamen-
te propensas a contestação e discrepância.
Até mesmo aquela simplicidade que se
apregoa na representação proporcional, por
definir com clareza as distintas correntes de
opinião, parece sucumbir à complicação
das técnicas de contagem eleitoral destina-
das à atribuição das cadeiras. Essa compli-
cação gera retraimento e desconfiança no
eleitorado quando se proclamam os resulta-
dos obtidos.
Os aspectos negativos da representa-
ção proporcional, que é simples na aparên-
cia, mas obscura e complexa no âmago,
foram também judiciosamente assinalados
por Vedei. Diz o publicista francês com res-
peito aos governos oriundos da prática desse
sistema e baseados em coligações, que se é
possível escolher proporcionalmente, não é
possível porém decidir segundo a noção de
proporcionalidade, porquanto — acrescenta
ele — decide-se sempre de forma maioritá-
ria, por isso ou por aquilo, pelo sim ou pelo
não. Ou como disse Naville: “a maioria é o
princípio da decisão, a proporcionalidade, o
da eleição”.
Sistema Misto
A insatisfação relativamente á represen-
tação proporcional e aos sistemas maioritá-
rios levou a elaboração de uma variedade
de sistemas mistos que são conhecidos e em
parte já aplicados já algum tempo.
Desde o princípio do Sec XX ate 1945, o
sistema maioritário foi declinando a favor da
representação proporcional (com excepção
para os países anglo-saxonico). Porem,
depois da II guerra, surgiram reacções contra
a representação proporcional que se tradu-
ziu, quer no regresso ao sistema maioritário
(caso da Franca em 1958), quer na adopção
de processo de sistema misto. Segundo Fer-
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nandes (2008) o sistema misto pode ser:
Sistema misto de predominância maiori-
tária, inspirando-se no processo inglês de sis-
tema maioritário de uma volta, consiste em
eleger vários deputados em cada circunscri-
ção por sufrágio uninominal, isto é cada elei-
tor vota apenas um candidato, sendo eleitos
candidatos que figurem cabeças de listas.
Sistema misto de predominância propor-
cional, esta modalidade de sistema eleitoral
traduz-se na combinação da representação
proporcional com o sistema maioritário, con-
cedendo grande liberdade ao eleito com
efeito, com base no método de Hare é pro-
clamado eleito todo o candidato cujo núme-
ro de votos obtidos ultrapasse o quociente
eleitoral rectificado (este é obtido dividindo
os sufrágios expressos pelo numero de lugar a
preencher mais sim um, acrescentando-lhe
depois uma unidade), sendo os votos exce-
dentes transferíveis para o outro ou outros
candidatos, conforme as preferências mani-
festadas.
Sistema misto equilibrado: atribui uma
importância igual a representação propor-
cional e ao sistema maioritário. Onde a
metade parlamentar é eleita por sistema por
escrutino uninominal maioritário de uma
votação no quadro das circunscrições, e a
outra metade é eleita segundo o método de
Hont por escrutino de lista
A Problemática da Relação Entre os Deputados e o Eleitorado
Olhando para a problemática da rela-
ção entre os deputados e o seu eleitorado, o
estudo feito pelo CEPKA (2007), com o objec-
tivo de identificar o grau de inter-
relacionamento entre os representantes do
povo e o seu respectivo eleitorado, no con-
texto de aprofundamento e consolidação
da democracia multipartidária em Moçambi-
que, constata que, embora o relacionamen-
to interpessoal dos deputados seja moldado
essencialmente pela combinação da discipli-
na partidária e o interesse do eleitorado, o
inter-relacionamento entre os deputados e o
seu círculo eleitoral é muito fraco. Enfatiza
ainda que “é indiscutível que o critério de
disciplina partidária domina o cenário do
relacionamento interpessoal da AR
(Assembleia da República), em detrimento
dos interesses do eleitorado” (CEPKA,
2007:15).
Estas constatações são também defen-
didas por JA (2003), onde mostra que peran-
te o sistema eleitoral em exercício no país, os
deputados pouco fazem para satisfazer os
interesses do eleitorado, mas sim, os interes-
ses partidários. Existe ainda um outro aspecto
levantado pelo CEPKA (2007), demonstrando
que existe um deficitário contacto entre os
deputados e o seu eleitorado. Este acto é
sustentado pela dificuldade nos transportes e
comunicações e a exiguidade de recursos
financeiros para poderem se deslocar até
aos seus círculos eleitorais. Quanto a este
aspecto, o estudo conclui que “a interacção
entre os deputados e o seu eleitorado corres-
ponde às condições específicas da demo-
cracia em Moçambique, particularmente
devido as dificuldades de ordem material e
financeira” (CEPKA, 2007:15).
Das explicações acima apresentadas,
fica subjacente o poder que o sistema eleito-
ral de representação proporcional e de listas
partidárias em exercício em Moçambique
tem de estruturar as relações entre os parti-
dos e os representantes dos eleitores
(deputados), assim como a relação destes
últimos com os respectivos eleitores, não dei-
xando de lado factores de ordem financeira.
De forma geral, todo o processo de pres-
tação de contas é feito na base das abertu-
ras que o sistema eleitoral adoptado possibili-
ta. Enfatiza Goetz (2004) citado por O’Neill et
all (2007), que a prestação de contas é algo
que varia entre as sociedades e contextos
políticos, dependendo das relações de
poder existentes, o ambiente favorável, a
natureza do Estado e suas instituições, que é
o contrato social entre o Estado e seus cida-
dãos. Contudo, para Nicolau (2002), no siste-
ma eleitoral em que o voto é centrado no
partido, o nível de responsabilização dos
representantes é menor do que no sistema
em que o voto se encontra centrado no can-
didato.
Dimensões de Accountability
Segundo Campos (1990), o accountabi-
lity é um conceito de expressão inglesa e ain-
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da não encontrou uma tradução tão fide-
digna quanto ao que o termo na sua essên-
cia pretende transmitir, mas na língua portu-
guesa tem sido traduzido como prestação
de contas. A autora refere ainda que o
accountability não se esgota a simples pres-
tação de contas, vai muito mais além, envol-
ve também a componente de responsabili-
zação, que nem sempre se associa ou se
pode confundir com a prestação de contas.
Para Maia (2006), accountability é um
conceito que encontra eco em sistemas
democráticos, visto que um dos seus objecti-
vos é aumentar cada vez mais o nível de res-
ponsabilização (accountability) dos repre-
sentantes/governantes. Importa referir que
accountability encontra-se intrinsecamente
ligado as democracias representativas e tor-
na-se “uma questão fundamental para a
qualificação das democracias moder-
nas” (Maia, 2006:2). De acordo com Miguel
(2005), accountability surge nas democracias
representativas para responder a um conjun-
to de problemas intrinsecamente ligados
entre si, a saber:
A separação entre governantes e gover-
nados, isto é, o facto de que as deci-
sões políticas são tomadas por um
pequeno grupo e não pela massa dos
que serão submetidos a elas;
A formação de uma elite política distan-
ciada da massa da população, como
consequência da especialização fun-
cional e;
A ruptura do vínculo entre a vontade dos
representados e a vontade dos repre-
sentantes, o que se deve tanto ao fac-
to de que os governantes tendem a
possuir características sociais distintas
das dos governados, quanto a meca-
nismos intrínsecos à diferenciação fun-
cional. Vários autores debruçam suas
análises cingindo-se em torno de
accountability, fazendo com que o
mesmo não tenha uma definição úni-
ca e consensual.
Para O’Donnel (2003), accountability Impli-
ca a capacidade do sistema político prestar
contas de suas promessas aos cidadãos, a
obrigação de responder por uma responsa-
bilidade outorgada, isto é, equivale a res-
ponsabilidade objectiva ou a obrigação de
responder por algo.
Para Schedler (1999), o termo accountabi-
lity suscita:
a capacidade de resposta dos governos
(answerability), ou seja, a obrigação dos
oficiais públicos informarem e explicarem
seus actos e,
A capacidade (enforcement) das agências
de accountability (accounting agencies)
de impor sanções e perca de poder para
aqueles que violaram os deveres públicos.
Para este autor, a noção de accountabi-
lity, é basicamente, bidimensional: envol-
ve capacidade de resposta e capacida-
de de punição (answerability e enforce-
ment). Contudo, pressupõe a existência
do poder e a necessidade de que este
seja controlado.
Mainwaring (2003) delimita o conceito
de accountability político “à existência de
um actor ao qual foi formalmente (através
de lei) atribuída a autoridade para supervisio-
nar ou penalizar agentes públi-
cos” (Mainwaring: 2003, 5). Trata-se portanto,
de uma relação formalizada de supervisão
de um agente público sobre outro.
O aspecto fundamental dessa definição
é a existência de um actor legalmente
encarregado de requisitar essa prestação de
contas. Importa referir que Mainwaring (2003)
exclui de seu conceito as formas de controlo
não fundamentadas em lei, como a impren-
sa e a sociedade civil. Nesse sentido, sua
definição recai não apenas sobre a necessi-
dade de o agente público responder por
seus actos mas, sobretudo sobre a obrigação
legal de ter de responder por eles ou sobre o
direito institucionalizado de um agente em
lhe impor sanções, defende Cubas (1999).
Dentro da concepção de accountability
acima referida, segundo Mainwaring (2003),
dois tipos de actores podem promover
accountability político: 1) eleitores, pois os
eleitos prestam contas aos seus eleitores, ao
menos nos casos em que é possível a reelei-
ção e 2) agências públicas formalmente
encarregadas de supervisionar e/ou aplicar
sanções aos agentes públicos. Nesse forma-
to, “tanto os agentes públicos escolhidos
para o cargo através de eleição quanto
aqueles que chegaram aos cargos por
outros meios estão submetidos ao accounta-
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bility de diferentes actores” (Mainwaring:
2003, 5).
No âmbito das discussões acima apre-
sentadas, O’Donnel (2003) desenvolve uma
abordagem inovadora, ao diferenciar os
tipos de prestação de contas segundo cate-
gorias. Para O’Donnel (2003), accountability
pode-se apresentar sob a forma de três
dimensões: Vertical, Horizontal e Societal.
Estas variantes de accountability são tam-
bém defendidas por Farejonh (1997) e Prze-
worski (1998). Mas, existem autores como
Schedler (1999), que vai mais além, afirman-
do que fora das dimensões mencionadas,
existem outras como: accountability política,
accountability administrativa, relações de
eleitorado e accountability de mercado.
A noção de accountability horizontal
aponta para a existência de: “Agências estatais que têm o direito e
o poder legal e que estão de facto
dispostas e capacitadas para realizar
acções, que vão desde a supervisão
de rotina a sanções legais ou até
impeachment contra acções ou emis-
sões de outros agentes ou agências do
Estado que possam ser qualificadas
como delituosas” (O´Donnell, 1998:40).
O accountability horizontal, entendida
dessa forma, é produto de uma rede de
agências internas principalmente do Estado.
Defende ainda O´Donnell (1998), que nor-
malmente o accountability horizontal ocorre
através da mútua fiscalização e controle
existente entre os poderes (os freios e contra-
pesos) ou, entre os órgãos, por meio dos Tri-
bunais de Contas ou Controladorias Gerais e
agências fiscalizadoras – pressupõe uma
acção entre iguais ou autónomos. Esse
accountability refere-se a “transparência das
acções da gestão pública em relação aos
agentes que podem fiscalizá-las e puni-
las” (O´Donnell, 1998:40).
Distante da accountability horizontal, o
societal segundo Smulovitz & Peruzzotti
(2000), é um mecanismo de controlo não
eleitoral, que utiliza ferramentas institucionais
e não institucionais, e envolve múltiplas asso-
ciações, movimentos ou mídia, com vista a
expor erros e falhas do governo, incluir novas
questões na agenda pública ou influenciar
as decisões políticas. Esta forma de accoun-
tability não está ligado ao cidadão e ao
voto, mas se encontra ligado as diversas enti-
dades sociais como associações, sindicatos,
ONGs, mídia, etc., que investigam e denun-
ciam abusos cometidos e cobram uma res-
ponsabilização.
Enfatizam ainda os autores Smulovitz &
Peruzzotti (2000), que accountability é uma
espécie de controlo social realizado pela
sociedade civil, que procura alcançar tam-
bém os burocratas gestores e não somente
políticos ou governos. A característica des-
sas entidades é a grande diferença
(assimetria) de recursos e a ausência de
mandato legal para o exercício de accoun-
tability.
Deste modo, o accountability societal é
incapaz de aplicar sanções contra os agen-
tes públicos em casos de transgressões pois,
não possui competência/poder legal para
isso e pressupõe a existência de liberdade
de expressão para denunciar os erros/falhas
dos governos e gestores públicos. As adver-
tências e denúncias ganham efectividade
apenas quando sensibilizam alguma institui-
ção de controlo: o Ministério Público, o Tri-
bunal de Contas ou o eleitorado.
Por fim, accountability vertical para
O’Donnel (2006), ocorre quando os cida-
dãos controlam os políticos e governos atra-
vés de plebiscito, referendo e voto ou
mediante o exercício do controle social –
pressupõe uma acção entre desiguais. Enfa-
tiza ainda o autor que o accountability verti-
cal refere-se à transparência das gestões
em relação aos eleitores que podem assim
fiscalizálas e puni-las, principalmente através
do voto em eleições livres e justas.
Contudo, accountability vertical, não só
tem carácter político mas, pode ser consi-
derado um mecanismo de soberania popu-
lar, incidindo sobre os actos dos políticos e
demais agentes públicos, refere O’Donnel
(2006). Enfatiza ainda que os principais
mecanismos/instrumentos de accountability
são o voto e a acção popular. Deste modo,
o accountability vertical são “os mecanis-
mos institucionais que possibilitam ao cida-
dão e à sociedade civil exigir a prestação
de contas pelos agentes públicos, sendo as
eleições livres e justas o princi-
pal” (O’Donnel, 2006: 26)
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Casos de accountability dos represen-tantes para com os representados em
Moçambique
A abordagem de accountability que inte-
ressa para este estudo é accountability verti-
cal, onde de forma geral, refere-se à vigilân-
cia e sanções que os eleitores, a imprensa,
as ONG´s, e outras organizações da socieda-
de civil (O’Donnel, 2006) fazem aos grupos
com dever de prestar serviços e contas aos
cidadãos. De forma específica, interessa-nos
para este estudo, accountability que se esta-
belece dos Deputados para com os eleito-
res.
Segundo AFRIMAP (2009), em termos de
interacção entre os parlamentares e o elei-
torado, o actual sistema eleitoral parece
conduzir a resultados pouco satisfatórios,
uma vez que muitos cidadãos apontam o
facto de não haver praticamente contacto
algum com os deputados, o que reduz as
possibilidades de accountability destes últi-
mos para com o eleitorado. Defende-se ain-
da nesta obra a ideia de que a acção dos
doadores pode prejudicar o desenvolvimen-
to de estruturas democráticas ao invés de
reforçá-las, uma vez que o apoio programá-
tico e ao orçamento tem levado ao governo
a preocupar-se mais com a chamada
“external accountability”, relegando para
um plano secundário ou mesmo à irrelevân-
cia, a prestação de contas aos seus parcei-
ros domésticos e aos eleitores (AFRIMAP,
2009:22).
Segundo Nuvunga, Mosse e Varela (2007),
no estudo sobre “Transparência, Áreas de
Risco e Oportunidades de Corrupção em seis
autarquias moçambicanas: Chibuto, Chi-
moio, Gurué, Nacala e Vilanculos” consta-
tam que existe prestação de contas de for-
ma vertical, que é feita para os munícipes.
Referem os autores, que os autarcas prestam
explicações aos munícipes sobre as decisões
e acções por si tomadas. Explicam sobretu-
do, o que fizeram, por que fizeram, como
fizeram, custos entre outros aspectos que
podem carecer de justificação ou explica-
ção. A prestação horizontal de contas é fei-
ta, principalmente para a Assembleia Muni-
cipal e, em segundo plano, para os órgãos
de tutela designadamente os Ministros que
superintendem as áreas da administração
estatal e finanças.
Diferentemente do estudo acima mencio-
nado, estudo feito por Forquilha (2007) sobre
o impacto das Reformas da Descentraliza-
ção no processo da Governação local em
Moçambique, refere que no contexto muni-
cipal, a lógica de Estado neo-patrimonial
enfraquece a ligação entre a elite detentora
do poder político e os munícipes. A este pro-
pósito, a pesquisa feita em cinco municípios
mostra que os munícipes têm mais contactos
com os líderes não eleitos (líderes religiosos,
comunitários e pessoas influentes) do que
com líderes eleitos (presidente do município
e os membros da assembleia municipal).
Segundo Bilério (2011), no seu trabalho de
dissertação de mestrado intitulado
“Dinâmica de accountability vertical no con-
texto de governação local em Moçambique
entre 1998-2010: estudo de caso do municí-
pio da Matola”, refere que estudo feito por
Forquilha (2007), embora não tivesse centra-
do a sua atenção na análise da dinâmica
de accountability, mostra que em Moçambi-
que ainda persiste a centralização do poder
ao nível dos governos locais, o que fragiliza
ou torna nula a possibilidade de prestação
de contas dos governos municipais aos seus
munícipes (eleitores). Tal como refere o
autor, “o modelo de dominação personaliza-
do recorrente do funcionamento das institui-
ções públicas municipais se caracteriza tam-
bém pela fraca prestação de contas das
próprias autoridades municipais e fraca
inclusão e institucionalização dos mecanis-
mos de consulta aos munícipes no processo
de governação”, (Forquilha; 2007: 17).
Deste modo, refere Bilério (2011), que a
manutenção da lógica centralizadora nos
espaços municipalizados fragiliza o envolvi-
mento dos munícipes nos processos da
governação local e a prestação de contas
dos governos municipais aos munícipes. Tan-
to Forquilha (2007) como Bilério (2011), estes
factores acima mencionados estão na ori-
gem, do baixo grau de contactos entre as
autoridades municipais e os munícipes, fraca
influência dos munícipes no processo de
tomada de decisão, pouco uso dos meca-
nismos existentes nos municípios, por parte
dos munícipes, para denunciar actos ligados
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à corrupção, discriminação, maus serviços
aos munícipes, etc.
Refere ainda Bilério (2011), que as conclu-
sões do estudo feito por Forquilha (2007) ofe-
recem um panorama geral sobre o que
pode estar a acontecer ao nível da gover-
nação local no país e traz consigo alguns
factores que concorrem, na óptica do autor,
para o fraco exercício da democracia ao
nível local e da prestação de contas de for-
ma específica. Por exemplo, o autor refere
que apesar de haver corrupção nos municí-
pios, poucos munícipes apresentam queixas
porque têm medo de serem conotados
como partido da oposição, facto que pode
conduzir a represálias, que se manifestam,
essencialmente, sob forma de exclusão polí-
tica. Este medo de represálias tem também
implicações na escolha das formas de parti-
cipação dos munícipes em períodos não
eleitorais.
Como resultado do acima exposto dificil-
mente os munícipes escolhem as formas de
participação que conduzem à manifesta-
ção aberta de opinião, como protesto ou
reivindicação. Pois, tal como defende For-
quilha (2007), neste contexto, a participação
política circunscreve-se essencialmente às
eleições, (Forquilha; 2007:21). Estes factores
podem limitar o exercício de accountability
vertical, visto que inibem o munícipe de fazer
denúncia, protesto no âmbito da governa-
ção municipal. Apesar da legislação autár-
quica abrir espaço para um maior exercício
de accountability vertical ao nível da gover-
nação, as conclusões dos estudos já feitos,
tendem a mostrar que isso não está a acon-
tecer, refere Bilério (2011).
Além das razões apresentadas anterior-
mente que inibem o exercício da accounta-
bility, a falta do conhecimento por parte dos
munícipes dos seus direitos e deveres, afigura
-se como sendo também uma das razões.
Macuácua (2004) no seu estudo sobre “A
experiência de cidadania no contexto
Autárquico” refere que “quanto aos seus
direitos poucos foram os cidadãos que toca-
ram no aspecto da obrigatoriedade da aus-
cultação e de prestação de contas aos
munícipes por parte dos órgãos munici-
pais” (Macuácua, 2004:74). Uma visão dife-
rente sobre o exercício de accountability
vertical ao nível da governação local é
apresentada por Kulipossa (2004).
Kulipossa (2004) em “Local Governments
Resources and Service Provision in Mozambi-
que” reconhece que, para o caso de
Moçambique, a descentralização democrá-
tica acontece num país em que não existem
alguns pré-requisitos considerados cruciais
para o seu sucesso, sem experiência anterior
de governos locais democráticos, com pou-
ca experiência de democracia a todos os
níveis, com graves problemas de pobreza e
analfabetismo e com um sistema multiparti-
dário que ainda não está consolidado. Refe-
re ainda Kulipossa (2004), que no caso de
Vilankulo e também em alguns municípios
tem-se desenvolvido relações de accounta-
bility entre o governo municipal e a popula-
ção no que se respeita ao uso de recursos:
mensalmente, são publicadas as contas e os
residentes são convidados a apresentarem a
sua análise e opinião sobre a forma como os
fundos estão a ser usados. Enfatiza Bilério
(2011), há um déficit de accountabilty ao
nível da governação municipal em Moçam-
bique. Por exemplo, fala-se da fragilidade
das Assembleias Municipais no desempenho
do seu papel fiscalizador o que nos remete a
um déficit no exercício da accountability
horizontal.
Contudo, ainda na esteira de Bilério
(2011), aponta-se também a não prestação
de informação, explicação e justificação
das acções e decisões dos Conselhos Muni-
cipais aos munícipes, falta de acções de
protesto ou reivindicação por parte dos
munícipes em relação aos maus actos dos
órgãos municipais, o que também remete à
fragilidade no exercício da accountability
vertical. Refere o autor que as razões dessa
fragilidade no exercício de accountability
são várias dentre as quais apontam-se: a fal-
ta de inclusão política; ausência de alternati-
va política devido a fraqueza dos partidos
da oposição; manutenção da lógica centra-
lizadora por parte das elites governantes;
falta de conhecimento dos seus direitos e
deveres por parte dos munícipes.
Possibilidade de Accountability aos Deputados Para Com os Eleitores
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A questão de accountability é funda-
mental para a qualificação da democracia
representativa. Deste modo, é reservado os
próximos pontos à apresentação de refle-
xões em torno das possibilidades de accoun-
tability que a interacção/comunicação
entre os deputados e os eleitores podem
criar num sistema eleitoral de representação
proporcional.
Contacto entre os eleitores e Deputados
Segundo Maia (2000), “a interacção
social é um processo através da qual as pes-
soas se relacionam umas com as outras, num
determinado contexto social”. Nesta pers-
pectiva ela apoia-se no princípio da recipro-
cidade da acção e é reconhecida como
condição necessária para manutenção das
relações sociais e organização espácio-
temporal.
No pensamento de Dallari (1991) citado
por Grau (2000), uma das dimensões que se
refere na operacionalização do conceito
accountability é a questão da participação
e da interacção. Enfatiza o autor que a parti-
cipação popular juntamente com a interac-
ção é uma das maiores características da
democracia.
Dos dados colhidos na pesquisa apon-
tam uma divergência entre a opinião dos
deputados e o eleitorado se não vejamos
segundo as entrevistas feitas com os deputa-
dos, são unânimes em afirmar que existe con-
tacto com os seus eleitores. Alguns vão mais
longe, afirmando que o contacto é algo
constante, uma vez que trabalham com
base nos eleitores, reforçando a ideia de que
foram eles que os elegeram por via do parti-
do, daí a necessidade de um maior contacto
com o eleitorado. Esta resposta dada pelos
deputados entra em contraste com as res-
postas do eleitorado, quando perguntamos
desde logo se os eleitores conheciam os
deputados que representavam o ciclo eleito-
ral de Sofala, 100 eleitores responderam que
conhecem, 300 responderam que não
conhecem e apenas 50 dizem conhecer
alguns. Como se pode analisar 67% dos elei-
tores inqueridos não conhecem os deputa-
dos do ciclo eleitoral de Sofala, e 22% conhe-
cem e 11% conhecem algum, o que nos leva
a dizer que o eleitorado não vota no lista
(partido) por conhecer os integrantes das
listas ou com o intuito de ver o Deputado X
na Assembleia da Republica, a defender os
seus interesses mas sim, vota por outros moti-
vos que em pesquisa apropriada podemos
levantar esses dados. De acordo com Maia
(2006), accountability pressupõe não apenas
o contacto, mas acima de tudo diálogo, tro-
ca de dizeres, exigência de explicação, etc.
Neste âmbito, alegam os deputados que
sempre interagem com os eleitores.
Diferentemente dos deputados, os elei-
tores têm opiniões e sensibilidades diferentes
em relação ao contacto que se devem esta-
belecer entre os deputados e os eleitores
Muitos dos eleitores por nós inqueridos defen-
dem insistentemente que não conhecem
seus deputados e consequentemente nunca
interagiram com eles. Mas, estas opiniões
não são partilhadas por todos, havendo uns
com opiniões distantes daquelas, reconhe-
cendo que actualmente diferentemente de
épocas passadas, têm havido muitos e mais
encontros com os eleitores, situação que era
bastante rara.
Para AFRIMAP (2009), o nível de contac-
to entre o deputado e o eleitor realmente
mudou, e estas aparentes mudanças estão
também relacionadas com o nível de exi-
gência e consciência que os deputados da
assembleia da república vêm ganhando
sobre os seus reais papéis assim como, pelo
nível de investimento que nos últimos anos se
têm feitos aos deputados, criando melhores
condições para que as actividades de fiscali-
zação do executivo junto aos cidadãos, de
facto aconteçam.
Dados colhidos, apontam 45% do eleito-
rado inquirido afirma que nunca tiveram con-
tacto com os deputados, 33% dizem as vezes
e 22% dizem ter contacto, uma vez que os
deputados são representantes do povo verifi-
ca-se que estes têm pouco contacto com o
eleitorado, o que subentende-se que tam-
bém não conhecem as preocupações dos
eleitorados. Para este caso concreto, mas do
que haver contacto entre deputado e elei-
tor, importa a frequência com que o mesmo
ocorre. Dados colhidos principalmente pelos
eleitores, tendem a afirmar que embora
actualmente haja contacto com os deputa-
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dos, a frequência da mesma é muito fraca.
Dos 100 eleitores que responderam ter con-
tacto, 40% disseram ter contacto 1 vez por
ano, 25% duas vezes ao ano, 20% três vezes
ao ano e 10% dizem ter contacto 4 vezes ao
ano, o que representa uma frequência bas-
tante fraca, na nossa opinião é que o con-
tacto deveria ser feito sempre que houvesse
sessões parlamentares, de modo que o plano
de actividade do deputado constasse preo-
cupações do eleitorado a ser levada a AR,
só assim o deputado estaria a ser fiel repre-
sentante do povo na medida que iria defen-
der os interesses do povo e não interesse par-
tidário.
Portanto, a crise de representação políti-
ca que Miguel (2005) diz estar a acontecer
nas democracias eleitorais o que enfraquece
o accountability, está intrinsecamente ligado
ao sistema eleitoral adoptado por um país.
Para o caso de Moçambique, em que o siste-
ma eleitoral é de representação proporcio-
nal e de listas partidárias, os deputados pro-
curam manter uma interacção mais próxima
com o seu partido político do que com os
eleitores, a quem os representam.
Defende também AFRIMAP (2009), “que
nos países em que vigora a escolha eleitoral
via lista fechada, como Moçambique, a fide-
lidade e a coesão partidária tendem a ser
maiores e o sistema as incentiva, não haven-
do fortes incentivos a um maior contacto
entre os parlamentares e seu eleitora-
do” (AFRIMAP, 2009:9).
Esta situação é similar ao que é defendi-
do ainda por AFRIMAP (2009), onde alega
que “…muitas pessoas acreditam que o
governo tem prestado mais atenção às
demandas e pedidos dos doadores interna-
cionais do que às demandas e necessidades
de seus cidadãos” (AFRIMAP, 2009:5). Embo-
ra o sistema eleitoral em vigor no país abre
espaços para um contacto entre os deputa-
dos e os eleitores), parece o mesmo não
conduzir a resultados satisfatórios em termos
de níveis de contacto e por conseguinte o
accountability. Contudo, na perspectiva de
Miguel (2005), o fraco contacto afecta as
possibilidades de accountability dos repre-
sentantes para com os representados, mas
não exclui a possibilidade de nestes poucos
encontros que existem, se possam explorar
situações de accountability.
3.2. Acesso e Justificação das Informações aos Eleitores.
Com base na explicação de Akutsu
(2005), Importa referir, que o accountability
como um dos mecanismos de controlo de
poder político, pressupõe uma relação bilate-
ral entre o representado (eleitor) ou quem
delega o poder político para com o seu repre-
sentante e, este processo gera a obrigação
do representante em prestar contas das suas
actividades. Para que esta relação seja efi-
ciente, é necessário que haja um certo con-
tacto entre ambos, entre quem busca respos-
tas e fiscaliza e aquele que tem a obrigação
de responder e que ao mesmo tempo está
sujeito a sanções. Portanto, o contacto acon-
tece tanto em presença física dos actores
sociais como por via de canais de comunica-
ção social.
Segundo os nossos entrevistados, com
particular destaque para os deputados, afir-
mam que o principal momento em que intera-
gem com os eleitores é no momento em que
partem para os seus círculos eleitorais de for-
ma a auscultar as preocupações dos cida-
dãos, em actividades das comissões de traba-
lho, quando realizam actividades de fiscaliza-
ção sobre as realizações do governo segundo
o PES, assim como em trabalhos de emergên-
cia e por sua vez, estes encontros são realiza-
dos uma, duas a três vezes ao máximo em
cada ano. Importa referir que estes encontros
não são somente organizados pelos deputa-
dos, por iniciativa e preocupação dos eleito-
res, dos régulos, etc, os deputados são convo-
cados para estarem presentes e responderem
as preocupações colocadas.
Neste âmbito dos meios de contacto,
consta que alguns dos deputados de que a
media (meios comunicação social como
rádio, televisão, jornais, etc.) tem sido um dos
meios bastante utilizado não apenas para
difundir algum tipo de informação útil para o
eleitorado, mas também quando escalam os
círculos eleitorais para realizarem suas activi-
dades, informando com antecedência sobre
suas actividades, isto é, a agenda, os dias e as
horas.
A mesma opinião é partilhada pelos elei-
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tores, 56% do eleitorado afirma que o contac-
to é feito através dos midias, mas temos uma
ressalva, pois quando falamos de contacto
por midias, os eleitores referem-se o local
onde tomam conhecimento de alguma acti-
vidade do seu “representante”, os que res-
ponderam que tem contacto face a face
quando analisamos o perfil deste individuo
(22%) vimos que de alguma forma tem uma
ligação com o partido, assim como os que
tem acesso a informações via telefone, o que
nos leva a dizer os que tem contacto com
directo com os Deputados são os eleitores
que tem um contacto com o partido. Ora,
vale a pena recordar que faz parte das obri-
gações dos deputados como consta nos seus
estatutos, manter-se em constante interac-
ção com os eleitores para deles buscar cons-
tantemente inspiração e informação para
avaliar criticamente a acção do Governo e
apontar possíveis caminhos. Para melhorar a
interacção em termos de regularidade entre
os deputados e os eleitores, por exemplo no
Brasil, segundo Louzada (2010) são divulgados
e-mail, número de telefone, foram desenvolvi-
dos canais para discussão de actividades
como twiter, blogs ou redes sociais dos depu-
tados para que os eleitores sempre que
necessitarem puderem entrar em contacto
com os seus representantes. Mas, o uso destes
instrumentos todos, depende de alguns facto-
res como o activismo social dos eleitores.
De acordo com Schedler (1999)
accountability suscita: A capacidade de res-
posta dos governos (answerability) ou seja, a
obrigação dos oficiais públicos informarem e
explicarem seus actos e; a capacidade
(enforcement) das agências de accountabi-
lity (accounting agencies) de impor sanções
e perca de poder para aqueles que violaram
os deveres públicos. Assim, a noção de
accountability é basicamente bidimensional:
envolve por um lado a capacidade de res-
posta e por outro a capacidade de punição
(answerability e enforcement).
Na mesma lógica Schedler (1999) e
Carneiro (2000), defende-se que além de
informar e justificar, o accountability envolve
ainda um terceiro item, relativo aos elemen-
tos que obrigam ao cumprimento da lei atra-
vés de sanções, inclusive legais. Assim, a infor-
mação, a justificação e a punição são os três
grandes indicadores de accountability e, os
três podem ou não estar juntos para que exis-
tam actos de accountability. De acordo com
os autores acima, tanto para informar, justifi-
car como para impor sanções, um mínimo de
contacto entre quem deve informar e justifi-
car e quem deve impor sanções é exigida
para que estes actos aconteçam, facto que
faz da interacção social um elemento crucial
da noção de accountability.
A pesquisa indicou 56% dos eleitores
afirmam que os deputados não justificam as
suas actividades ao eleitoral, e 22% dizem
que sim e 22% dizem que as vezes, facto que
torna-se preocupante ou que faz com que
não ocorram o fenómeno de accountability,
se o deputado é eleito pelo povo, ele deve
prestar conta das suas actividade, mas obser-
va-se que este sente-se mais obrigado em
prestar contas ao partido que o nomeou na
lista que ao povo que lhe elegeu.
Esta informação colhida dos eleitores
mais uma vez entra em contraste com os
depoimentos dados pelos deputados, De
acordo com as entrevistas feitas com os
deputados, os mesmos são unânimes em afir-
mar que a disponibilização de informação e
justificação das suas actividades junto aos
eleitores tem sido uma prática. Defendem-se
ainda, alegando que existe por parte dos
eleitores uma curiosidade em saber como os
planos ou promessas feitas pelos governantes
estão sendo implementados e para isto, antes
de prestação de contas junto aos eleitores
tem havido fiscalização ou trabalhos de con-
sulta dos deputados junto do executivo.
Um dado importante é que, a curiosida-
de manifestada pelos eleitores em exigir infor-
mação e explicação, não tem sido geral,
pertence a um pequeno grupo de cidadãos,
os mais informados e preocupados com ques-
tões políticas/governação e económicas do
país. Sendo assim, fica a ideia de que o nível
de exigência de accountability depende não
só de acesso a informação mas também da
vontade de quem delega o poder em exigir.
Quero com isto dizer que nem todo eleitora-
do pede a prestação de conta ao Deputa-
do, mas devia, uma vez que o Deputado esta
na AR para representar o cidadão Moçambi-
cano
Com base nestes depoimentos, o aces-
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so a informação como um dos indicadores
bases de accountability é de facto algo pre-
sente nas relações que se estabelecem entre
os deputados e os eleitores e estes por sua
vez, não acedem a informação apenas por
via dos deputados mas também por via de
comunicação social, como televisão, rádio,
jornais, etc. Os principais assuntos que os elei-
tores procuram saber dos deputados está
ligado acima de tudo aos problemas que as
suas comunidades vivem, como por exemplo
acesso a água, longevidade das unidades
sanitárias, insuficiência de medicamentos,
expansão da rede de energia eléctrica, esco-
las, acesso aos órgãos de comunicação
social como televisão e de forma geral, servi-
ços básicos prestados pelo governo. Portanto,
os deputados não se limitam apenas a trans-
mitir o que o governo tem feito e como tem
implementado os seus planos mas também
explicam as motivações ou causas que pode-
rá estar por detrás duma dada situação.
O accountability pressupõe como ficou
mencionado acima, a dimensão da answera-
bility, que traduz-se como capacidade de
resposta e engloba por sua vez dois tipos de
questões: uma dimensão relativa a informa-
ção das decisões e outra condizente com a
necessidade dos parlamentares explicarem
tais decisões e o que de facto está aconte-
cendo de forma muito deficitária. Estes
aspectos configuram uma dimensão informa-
cional e outra argumentativa.
Para Schedler (1999), a informação, jus-
tificação e punição, podem ser vistas como
diferentes modos para se evitar e corrigir abu-
sos cometidos por governos, políticos e gesto-
res públicos, obrigando que seu exercício seja
transparente, obrigando que os actos prati-
cados sejam justificados e sujeitando o poder
a ameaça de sofrer sanções. Para o caso
deste último ponto, relativamente as puni-
ções, importa referir que dados por nós colec-
tados apenas reforçam a ideia de que os
eleitores não têm poder legal de impor san-
ção junto aos deputados. Com base nas
entrevistas feitas pelos eleitores, percebe-se
que os mesmos apenas se confinam a recla-
mar em bastidores e devido ao sistema eleito-
ral, no lugar dos deputados serem sanciona-
dos pelos eleitores aquando da realização
das eleições, os mesmos por via de listas
fechadas tornam-se outra vez os seus repre-
sentantes.
Como podemos constatar tanto na
legislação assim como na opinião do eleitora-
do sobre a possibilidade do eleitorado sancio-
nar o Deputado, a maioria respondeu que
nunca sancionou o deputado, a única atitu-
de é como nos referimos, apenas comentá-
rios e murmuro de que os deputados estão na
AR, para dormir e se apoderarem dos benefí-
cios regalias e defenderem o partido e não
verdadeiramente o povo, os que dizem já
sancionaram referem-se a queixas que fazem
ao partido ou a presidente do partido, a
quando das visitas de trabalhos. Como nos
referimos a verdadeira sanção seria a não
reeleição do deputado que não satisfaz os
interesses do povo, mas no sistema de listas
fechada como é o nosso sistema não é possí-
vel tal forma de sanção nem mesmo a legisla-
ção não existe nenhum artigo a indicar no
sentido de sancionar os deputados.
Conclusões e Recomendações
Em jeito de conclusão importa salientar o
seguinte:
De acordo com a legislação eleitoral
vigente, o Presidente da República é eleito
por sufrágio universal e directo num círculo
eleitoral único ao nível nacional, em eleição
de cunho maioritário, ao passo que os
deputados da Assembleia da República são
eleitos num sistema de representação pro-
porcional assente em círculos eleitorais cor-
respondentes à actual divisão territorial do
país em províncias (aos 10 círculos eleitorais
formados pelas províncias se soma a cidade
de Maputo, resultando em 11 círculos eleito-
rais), sendo a cada círculo eleitoral atribuído
um número de assentos parlamentares pro-
porcional ao número de eleitores recensea-
dos. Os eleitores votam em uma lista fecha-
da proposta e ordenada pelos partidos polí-
ticos. Até as reformas introduzidas em 2006,
uma “cláusula de barreira” na legislação
eleitoral proibia a entrada no parlamento
de partidos que não tivessem obtido, no
mínimo, 5% do total de votos nacionais.
Em termos de interacção entre os parla-
mentares e o eleitorado, o actual sistema
eleitoral parece conduzir a resultados pou-
Vol. 1, Nº 03, Ano II, Janeiro - Março de 2015
18
co satisfatórios, uma vez que muitos cida-
dãos apontam o facto de não haver pratica-
mente contacto algum com os deputados.
Nos países em que vigora a escolha eleitoral
via lista fechada, como Moçambique, a fide-
lidade e coesão partidária tendem a ser
maiores e o sistema as incentiva, não haven-
do fortes incentivos a um maior contacto
entre os parlamentares e seu eleitorado.
Sendo participação e interacção social
características principais da democracia e
particularmente o contacto como elemento
chave do accountability, constatamos em
primeiro lugar que este contacto no círculo
eleitoral de Sofala acontece, mas como nos
referenciamos ao longo do trabalho, não
importa apenas o contacto temos que ver
outros elementos como o nível de contacto
e frequência da ocorrência deste contacto,
neste ponto concluímos que existe sim um
contacto, mas que ocorre com pouca fre-
quência e a nível superficial, o que de certo
modo vem a comprometer a qualidade da
democracia moçambicana.
Este facto está associado principalmente
pela ligação que o sistema eleitoral de repre-
sentação proporcional cria entre os deputa-
dos com os seus partidos, deixando de lado
os eleitores. Portanto, esta situação sobre o
nível de representação política que poderia
se estabelecer, coloca em causa as possibili-
dades de accountability, visto que apesar
de, encontramos principais indicadores de
accountability, isto é, informação e justifica-
ção no circulo eleitoral de Sofala esse é mui-
to fraco o que leva a concluir que não há
possibilidade de ocorrência de accountabi-
lity.
Entretanto embora ainda não tenham
sido estabelecidos padrões internacionais ou
africanos a favorecer um sistema eleitoral em
relação a outros, há um considerável número
de obras académicas, assim como um
importante estudo comparativo do Interna-
tional Institute for Democracy and Electoral
Assistance (IDEA International), a sugerir siste-
mas que podem favorecer uma ligação mais
próxima entre os parlamentares e os seus
eleitores. Na actual situação da democracia
moçambicana, parece-nos que os legislado-
res deveriam considerar seriamente a possibi-
lidade de transição para um sistema propor-
cional de lista aberta, na qual os eleitores
podem escolher dentre os candidatos selec-
cionados pelo partido, ao invés de votar em
uma lista completa e fechada anteriormente
definida pelo partido. Tal reforma poderia
promover uma nova dinâmica no ambiente
político do país e merece ser discutida pelos
partidos políticos e cidadãos moçambica-
nos. Eventuais reformas deverão ser formula-
das com cuidado, e suas chances de suces-
so são maiores se sua formulação for partici-
pativa e responder aos anseios da popula-
ção.
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Breve Análise da Tutela Penal do Ambiente à Luz do Direito Moçambicano e a Sua Importância no
Desenvolvimento de Moçambique
Msc. Diana Sousa Pinto
Docente e Jurista, Mestre em Direito Administrativo,
Docente e Investigadora na Universidade Zambeze.
À luz do direito penal vigente, não existe ainda nenhum capítulo ou qualquer outra lei extravagante sobre crimes ambientais. O código penal vigente data dos finais do Seculo XVIII, quando ainda vigorava uma visão antropocêntrica, que partia do entendimento que o meio ambiente era apenas fonte de utilidade para o Homem, um veículo de satisfação de necessidades vitais e de incremento do bem-estar. Hoje esta visão já não é aceite, o Homem foi tomando consciência de que não é mais senhor absoluto da Natureza. Deve-lhe respei-to total, sob pena de colocar em risco a própria subsistência humana e a de todos os seres vivos, o que pressu-põe uma exploração sustentável e equilibrada dos diversos componentes ambientais. Nas palavras de Germa-no Marques da Silva “A consciência da relevância da qualidade do meio ambiente para a saúde e bem -estar dos cidadãos erigiu o ambiente natural em bem jurídico a exigir tutela criminal, porque é essencial para a qualidade da vida colectiva e individual. A razão da incriminação e a relevância dos bens protegidos e a gra-vidade das sanções aplicáveis aos infractores das normas é justificada pela gravidade do dano e pelas conse-quências indirectas para a vida e a saúde das pessoas.” Bem se sabe que hoje a defesa do ambiente assume uma dimensão de bem jurídico fundamental, integrado no âmbito dos valores essenciais da sociedade, adqui-rindo mesmo um estatuto constitucional de direito fundamental e de princípio geral das tarefas do Estado, artigo 90º e 117º da constituição de 2004. Não obstante a inércia do legislador ordinário nacional no domí-nio do Direito Penal do Ambiente é possível identificar no Código Penal e outra legislação extravagante alguns tipos legais de crimes nos quais estão em causa comportamentos susceptíveis de ofender este bem jurídi-co fundamental. Não obstante essa breve e ínfima referência é de todo o modo pertinente que se considere a possibilidade da criação de crimes ambientais no ordenamento jurídico Moçambicano, no sentido de reprimir manifestações mais agressivas de actividades ou condutas que ponham em causa os valores ambientais prote-gidos. Até porque tendo em conta a conjectura que Moçambique atravessa no sentido das importantes desco-bertas de recursos naturais e a consequente exploração desses importantes recursos corre-se o risco de criar gra-ves agressões ao meio ambiente, pondo em causa desde logo a subsistênciados ecossistemas. Há, no entanto, uma pertinente questão que se levanta nesta matéria, isto é, saber se é ou não possível criminalizar condutas agressivas para o bem jurídico ambiente à luz da própria natureza do Direito Penal, no sentido da sua não banalização, reservando este ramo do Direito Público para situações de violação dos valores fundamentais da sociedade. Independentemente da tutela sancionatória do ambiente adoptar a via penal ou via administrati-va, é de suma importância que o legislador crie um pacote legislativo que vise o combate aos abusos ao meio ambiente, quer através da inclusão no Código Penal de crimes ambientais, quer através da penalização de determinadas condutas na legislação extravagante.
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20
N o ordenamento jurídico Moçam-
bicano à luz do Direito Penal
vigente, não existe, ainda,
nenhum capítulo ou qualquer
outra lei extravagante direccionada para os
crimes ambientais. Aliás o Código Penal
vigente data dos finais do Século XVIII, quan-
do ainda vigorava uma visão antropocêntri-
ca do ambiente, esta partia do entendimen-
to que o meio ambiente era apenas fonte de
utilidade para o Homem, um veículo de satis-
fação de necessidades vitais e de incremen-
to do bem-estar. Contudo nos dias de hoje
esta visão já não é aceite, o Homem foi
tomando consciência de que não é mais
senhor absoluto da Natureza. Deve-lhe res-
peito total, sob pena de colocar em risco a
sua própria subsistência e a de todos os seres
vivos, o que pressupõe que se adoptem
comportamentos no sentido de uma explora-
ção sustentável e equilibrada dos diversos
componentes ambientais.
Bem se sabe que hoje a defesa do
ambiente assume uma dimensão de Bem
Jurídico Fundamental, integrado no âmbito
dos valores essenciais da sociedade, adqui-
rindo mesmo um estatuto constitucional de
direito fundamental e de princípio geral das
tarefas do Estado, o que acontece no orde-
namento jurídico de Moçambique nos artigos
90º e 117º da Constituição de 2004.
Contudo e para além desta consagra-
ção Constitucional, surge a necessidade de
se tutelar este bem jurídico através dos outros
ramos do direito, mormente o Direito Penal,
nas palavras de Germano Marques da Silva
“A consciência da relevância da qualidade
do meio ambiente para a saúde e bem-estar
dos cidadãos erigiu o ambiente natural em
bem jurídico a exigir tutela criminal, porque é
essencial para a qualidade da vida colectiva
e individual. A razão da incriminação e a
relevância dos bens protegidos e a gravida-
de das sanções aplicáveis aos infractores das
normas é justificada pela gravidade do dano
e pelas consequências indirectas para a vida
e a saúde das pessoas”1.
Esta protecção por este ramo do direito
mostra-se essencial no sentido de assegurar a
efectiva protecção do meio ambiente. For-
ma pela qual também podemos assegurar o
desenvolvimento económico e social de um
país, pois o meio natural envolvente mostra-
se de suma importância para a sobrevivên-
cia das populações mais carenciadas, facto
que se sente de forma mais frequente nos
países em desenvolvimento, como é o caso
de Moçambique.
1. A Necessidade de Protecção
Ambiental
A Estratégia Ambiental para o Desenvol-
vimento Sustentável de Moçambique foi
aprovada na 9.ª Sessão Ordinária do Conse-
lho de Ministros, de 24 de Julho de 2007, esta
é o resultado das aspirações nacionais a um
modelo de desenvolvimento socioeconómi-
co que permita a Moçambique ter uma
população saudável, capacitada, activa,
financeiramente estável e com uma atitude
positiva para com ela própria, com o seu
país e com a humanidade.
Para tal em Moçambique defende-se o
modelo de desenvolvimento sustentável,
enquanto desenvolvimento que satisfaz as
necessidades do presente, sem comprome-
ter a habilidade de as gerações futuras satis-
fazerem as suas necessidades.
Esta Estratégia assenta no entendimento
de que a boa governação deve basear-se
na adopção de políticas socioeconómicas e
ambientais correctas e em instituições que
respondam às necessidades do Povo, consti-
tuindo um mecanismo para criar abordagens
integradas e parcerias entre o Governo,
sociedade civil, sector empresarial, institui-
ções académicas, doadores e outros, para
questões e desafios ambientais de desenvol-
vimento sustentável, porque são demasiado
complexos para serem resolvidos por um gru-
po de forma isolada.
O advento da protecção ambiental
ocorreu essencialmente após a Conferência
das Nações Unidas sobre Ambiente e Desen-
volvimento, realizada no Rio de Janeiro, em
1992, daqui saiu a necessidade de ser criado
um quadro jurídico ambiental específico não
só em Moçambique, como na grande maio-
ria dos países.
Vol. 1, Nº 03, Ano II, Janeiro - Março de 2015
21
Nesta senda o país possui hoje um consi-
derável acervo legislativo no domínio do
ambiente e recursos naturais, começando
pela Constituição da República (2004), pas-
sando por um conjunto de convenções e
protocolos internacionais, culminando nos
diversos instrumentos legislativos ordinários,
entre Leis da Assembleia da República
(destacando-se as Leis do Ambiente, da Ter-
ra, de Florestas e Fauna Bravia e do Ordena-
mento do Território), Decretos e Resoluções
do Governo e Diplomas emitidos pelos vários
Ministérios com atribuições e competências
relevantes.
Neste sentido temos como ponto assen-
te que no contexto nacional o quadro jurídi-
co-legal apresenta alicerces suficientes que
garantem uma efectiva gestão do ambiente
e dos recursos naturais. Contudo e apesar da
existência de um certo consenso sobre a
qualidade desse mesmo quadro jurídico-
ambiental, não podemos deixar de salientar
que ainda existem algumas zonas de penum-
bra, imprecisões ou procedimentos que pre-
cisam de ser clarificados, mormente o pro-
blema da incipiente capacidade de imple-
mentação das políticas e da legislação.
2. Protecção Ambiental no Ordena-mento Jurídico Moçambicano
Como vimos na senda do advento da
defesa do ambiente este ramos do direito, o
Direito ao ambiente, é hoje visto como um
direito do Homem, integrado na terceira
geração dos direitos fundamentais, resultado
da necessidade de se repensar a posição do
individuo na comunidade. É neste sentido
que a protecção do ambiente passa pela
protecção dos direitos fundamentais, quer
na sua dimensão individual, quer colectiva,
pois só assim é possível garantir a sua efecti-
va e adequada defesa contra agressões ile-
gais.
Esta tarefa de defesa do bem jurídico
Ambiente é no limite um problema do Estado
e neste sentido a sua protecção constitucio-
nal foi significativamente reforçada na Lei
Fundamental de 2004, tendo sido não só rei-
terado o direito fundamental de todo o cida-
dão ao ambiente equilibrado e respectivo
dever de o defender, no seu artigo 90º, n.º 1
“todo o cidadão tem o direito de viver num
ambiente equilibrado e o dever de o defen-
der”, como a necessidade de se efectivar
essa prevenção nas obrigações gerais e
específicas do Estado no n.º 2 do artigo 90º
“O Estado e as autarquias locais, com a cola-
boração das associações de defesa do
ambiente, adoptam políticas de defesa do
ambiente e velam pela utilização racional de
todos os recursos naturais”, e o artigo 117º nº
1 “O Estado promove iniciativas para garantir
o equilíbrio ecológico e a conservação e
preservação do ambiente visando a melho-
ria da qualidade de vida dos cidadãos” e nº
2 do mesmo artigo “com o fim de garantir o
direito ao ambiente no quadro de um desen-
volvimento sustentável, o Estado adopta polí-
ticas visando: a) prevenir e controlar a polui-
ção e a erosão; b) integrar os objectivos
ambientais nas políticas sectoriais; c) promo-
ver a integração dos valores do ambiente
nas políticas e programas educacionais; d)
garantir o aproveitamento racional dos
recursos naturais com salvaguarda da sua
capacidade de renovação, da estabilidade
ecológica e dos direitos das gerações vin-
douras; e) promover o ordenamento do terri-
tório com vista a uma correcta localização
das actividades e a um desenvolvimento
sócio- económico equilibrado”.
Para além da consagração constitucio-
nal do bem jurídico Ambiente, também a Lei
Ordinária teve o seu papel, nomeadamente
com a aprovação da Lei do Ambiente (Lei nº
20/97 de 1 de Outubro), esta configura-se
como uma espécie de Lei-quadro, fixa os
pilares do regime de protecção jurídico-legal
do ambiente e “tem como objecto a defini-
ção das bases legais para uma utilização e
gestão correctas do ambiente e seus com-
ponentes, com vista à materialização de um
sistema de desenvolvimento sustentável no
país”- artigo 2º da referida Lei.
De certa forma esta Lei centrou-se na
definição de um conjunto de conceitos e
princípios fundamentais da gestão ambien-
tal, na fixação do quadro institucional básico
de protecção do ambiente bem como na
caracterização do sistema de infracções,
penalidades e fiscalização.
No que concerne ao tema que trata-
mos, a tutela penal do ambiente, o artigo 27º
Vol. 1, Nº 03, Ano II, Janeiro - Março de 2015
22
da Lei do Ambiente dispõe o seguinte “As
infracções de carácter criminal, bem como
as contravenções relativas ao ambiente, são
objecto de previsão em legislação específi-
ca”, contudo, até aos dias de hoje, não hou-
ve esse seguimento, isto é, não foi criada
uma legislação específica em matéria de
crimes ambientais. Bem sabemos que essa
necessidade se sente diariamente pois no dia
-a-dia se verificam comportamentos por
demais ofensivos ao meio ambiente.
Ora tendo como ponto assente a inda-
gável dignidade jurídico-constitucional do
bem jurídico ambiente, há muito que é dese-
jado e merecido a implementação de um
estatuto de ofensas penais ao nível nacional,
especialmente na conjuntura que se vive em
Moçambique com as descobertas de enor-
me relevo para a economia mundial. Ainda
assim o legislador continua, na sua maioria,
inerte, pois ainda não se deu um efectivo
passo significativo na criação de uma lei
sobre Crimes Ambientais ou, pelo menos, na
introdução de crimes ambientais no Código
Penal em vigor.
3. A Importância da Tutela Penal no âmbito Ambiental
Bem se sabe que o principal papel do
Direito Penal é preservar o funcionamento do
modelo social em que se encontra inserido,
este objectivo essencial faz-se essencialmen-
te através da manutenção das expectativas
de convivência dos cidadãos. A lei penal
deve ser criada de modo a assegurar os
valores fundamentais de determinado Estado
e através desta manter a estabilidade políti-
ca e social. A missão do Direito Penal é pois
garantir a identidade de uma sociedade em
todos os seus quadrantes, no qual se inclui
indubitavelmente o Direito ao Ambiente.
Para melhor se prosseguir esta missão os
institutos do direito penal estão directamente
vinculados a interesses políticos e sociais pre-
ponderantes numa dada comunidade, e
estes variam conforme a conjuntura histórica,
social e política da sociedade.
Tendo em conta o papel que o bem jurí-
dico Ambiente desempenha num Estado de
Direito Democrático (como é o caso de
Moçambique) não podemos indagar a sua
protecção a todos os níveis, quer seja civil,
administrativa ou penalmente. A utilização
do Direito Penal como instrumento funcional
de estabilização político-social não pode
criar institutos contrários às premissas funda-
mentais do Estado, em especial as premissas
Constitucionais, o seu conteúdo material
deve estar inclinado para a confirmação dos
princípios basilares do Estado do qual faz par-
te. Neste sentido e baseado no modelo do
Estado Moçambicano, em que o valor supre-
mo é a Dignidade da Pessoa Humana todas
as normas em vigor devem estar organizadas
por forma a garantir essa efectivação.
Podemos definir sucintamente a Dignida-
de da Pessoa Humana como a autodetermi-
nação do homem, que consiste no direito
que todo ser humano tem a um livre desen-
volvimento numa sociedade caracterizada
pela diversidade de culturas e valores. É um
atributo inerente a todos os seres humanos:
pelo simples fato de ser humana a pessoa
merece todo o respeito, independentemen-
te da sua origem, raça, sexo, idade, condi-
ção económico-social ou estado civil.
Não podemos esquecer que o Direito
Penal na sua génese acaba por atacar
directamente a dignidade humana, nomea-
damente através da aplicação das penas
restritivas de liberdade – pena de prisão, e é
por essa mesma razão que a cominação
deste tipo de penas só pode ter a sua actua-
ção nas condutas que, de uma forma direc-
ta ou indirectamente, sejam uma ameaça a
esse valor essencial a integridade da digni-
dade humana.
A legitimidade e os limites da actuação
do Direito Penal estão necessariamente liga-
dos a necessidade de garantir a existência
de bens jurídicos essenciais à conservação
da dignidade humana. Facto é que cabe
indubitavelmente a este ramo do direito
actuar sobre os bens jurídicos que de alguma
forma sirvam para a materialização da digni-
dade humana, bens esses intimamente
conectados a este valor supremo.
Na senda destas considerações, concluí-
mos que os bens jurídicos individuais, tais
como a vida, a integridade física, a saúde e
a liberdade são inegavelmente passíveis não
só de tutela constitucional como de tutela
penal. Ora assim sendo o ferimento a qual-
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23
quer um destes bens jurídicos impede o ser
humano de gozar da sua plena dignidade.
Então, e mesmo tendo presente que o bem
jurídico ambiente se insere no âmbito dos
direitos difusos, também este merece de pro-
tecção ao nível penal, pois a sua realização
é uma das formas de se alcançar a dignida-
de humana.
Uma das correntes que defendem este
entendimento é de Cruz Bottini2, este autor
acredita que para responder a este questio-
namento é preciso ter em mente que o
desenvolvimento do indivíduo não ocorre de
forma egoísta e isolada. A construção de
cada ser humano decorre das mútuas rela-
ções existentes entre todos, de maneira que
o compartilhamento de bens entre os cida-
dãos é uma consequência inevitável. Neste
sentido, a supressão do bem jurídico meio
ambiente, mediante a sua constante degra-
dação, poderá prejudicar o desenvolvimen-
to individual de cada cidadão. Sendo assim
fica claro que a preservação da dignidade
humana de cada um de nós depende sem
margem para dúvida da preservação
ambiental, de tudo o que nos rodeia.
Em jeito de conclusão, tendo em conta
a suma importância do Direito Penal como
um importante meio de coacção de condu-
tas que possam ofender os bens jurídicos a
sua inserção no âmbito do Direito Ambiental
pode contribuir para a manutenção de um
meio ambiente equilibrado e adequado
para que o homem se possa desenvolver
hoje assegurando também o desenvolvimen-
to das gerações futuras. Assim protegendo o
meio ambiente estaríamos no limite a garan-
tir o desenvolvimento e a preservação da
dignidade da pessoa humana, quer para a
geração presente, quer para as gerações
futuras.
Ao defender esta vertente não podemos
esquecer que na maioria dos casos os danos
ao meio ambiente não são passíveis de uma
eficiente reparação. Muitos dos elementos
ambientais são infungíveis, depois de se per-
derem não mais é possível a sua recupera-
ção, a extinção de uma espécie animal ou
vegetal não pode ser revertida. Vezes há
que o impacto ambiental é de tal forma
extenso que torna a lesão ao meio ambiente
praticamente irreversível, por exemplo, o
reflorestamento de uma área desmatada ou
a descontaminação de um rio poluído dificil-
mente é capaz de restabelecer o status quo
ante do local danificado. O impacto gerado
sobre o meio ambiente não se limita à esfera
individual do bem jurídico atingido este pode
afectar irremediavelmente o equilíbrio ecoló-
gico da região como um todo, de modo que
as suas características primitivas dificilmente
são recuperadas.
Dada peculiaridade deste ramo do direi-
to (Direito do Ambiente) sobressaem na sua
génese os princípios da precaução e da pre-
venção. Precaver e prevenir os danos é mais
eficaz e viável do que a sua reparação a
posteriori, até porque, como vimos, muitas
vezes a recomposição do bem lesado não é
possível e, quando o é, os danos podem ser
de tal forma colossais que tenham atingido
bens jurídicos aparentemente alheios à situa-
ção.
Da análise do direito penal vigente verifi-
camos que não existe ainda nenhum capítu-
lo, ou qualquer outra lei extravagante direc-
cionada para os crimes ambientais. O códi-
go penal vigente data dos finais do Século
XVIII, quando ainda vigorava uma visão
antropocêntrica, que partia do entendimen-
to que o meio ambiente era apenas fonte de
utilidade para o Homem, um veículo de satis-
fação de necessidades vitais e de incremen-
to do bem-estar. Hoje esta visão já não é
aceite, o Homem foi tomando consciência
de que não é mais senhor absoluto da Natu-
reza. Deve-lhe respeito total, sob pena de
colocar em risco a própria subsistência
humana e a de todos os seres vivos, o que
pressupõe uma exploração sustentável e
equilibrada dos diversos componentes
ambientais.
Da leitura deste instrumento legal pode-
mos encontrar pouco mais que uma mão
cheia de artigos referentes ao meio ambien-
te, nomeadamente o artigo 254º que versa
sobre caça proibida; o artigo 255º sobre pes-
ca proibida e os artigos 476º a 480º, respecti-
vamente sobre danos em árvores, danos em
searas ou vinhas, danos em animais, e morte
ou ferimento de animais. Temos pois uma ínfi-
ma referência no Código Penal a esta maté-
ria. Quanto a Legislação extravagante já
encontramos em alguns instrumentos legais
Vol. 1, Nº 03, Ano II, Janeiro - Março de 2015
24
normas com cominações de natureza penal,
como é o caso da Lei das Floresta e Fauna
Bravia, entre outros.
Mesmo assim torna-se de todo o modo
pertinente que se considere a possibilidade
da criação de crimes ambientais no ordena-
mento jurídico Moçambicano, quer pela
inclusão de um capítulo no Código Penal,
quer pela elaboração e uma lei dedicada a
esta matéria, à semelhança do que aconte-
ce no Brasil. Esta efectivação seria no sentido
de reprimir manifestações mais agressivas de
actividades ou condutas que ponham em
causa os valores ambientais protegidos. Até
porque tendo em conta a conjectura actual
que Moçambique atravessa, na senda das
importantes descobertas de recursos naturais
e a sua consequente exploração, corre-se o
risco de criar graves agressões ao meio
ambiente, pondo em causa desde logo a
subsistência dos ecossistemas.
Uma das formas de implementar esta
tutela penal é a sua inclusão no âmbito dos
crimes de perigo. Estes buscam evitar a ocor-
rência do dano, através da criminalização
das condutas por se considerar que são peri-
gosas à integridade do bem jurídico protegi-
do. De certa forma pretende-se antecipar a
incidência da norma penal, ao invés de se
aguardar o resultado lesivo para só então
punir o agente, prefere-se sancionar a mera
ameaça à lesão, garantindo-se a segurança
e a integridade do bem jurídico de maneira
mais efectiva. Neste tipo de crimes, os crimes
de perigo, basta a probabilidade de lesão
ao bem ou ao interesse para se consuma-
rem.
O objectivo destas normas seria evitar
que o indivíduo, ao caçar, ao cortar árvores
em determinados locais ou ao extrair recur-
sos minerais viesse a acarretar um irreparável
prejuízo ao meio ambiente local. Em razão
disso presumir-se-ia que o indivíduo que
caça, extrai minerais ou corta árvores em
locais de preservação sem a devida licença
ou fora dos seus trâmites poria em risco, em
perigo, os bens jurídicos protegidos por essas
normas.
Nestes casos não seria necessária a constata-
ção de uma situação real de perigo ao meio
ambiente, logo verificar-se-ia a desnecessidade
de produção de provas para incriminar o ofen-
sor, a mera prática da conduta descrita nos
tipos seria suficiente para a sua punição. Foi
este sentido que a Lei dos Crimes Ambientais
Brasileira3 seguiu4.
4. Porque da necessidade de protecção ambiental a todos os
níveis?
É bem sabido que os problemas ambien-
tais constituem nos nossos dias uma das
maiores preocupações do Homem a sua pre-
venção é uma das prioridades da agenda
política mundial, a qual Moçambique não
foge. A degradação do ambiente pelo
Homem, tem vindo a provocar mudanças
climáticas que por sua vez estão na origem
de vários fenómenos, nomeadamente, as
inundações, secas, doenças e insegurança
alimentar. Estes problemas afectam toda a
humanidade, mas incidem com mais fre-
quência nos países subdesenvolvidos.
Neste sentido grande questões se levan-
tam no seio da comunidade, entre elas saber
quem são os principais responsáveis pela
degradação ambiental? E quais as suas con-
sequências no desenvolvimento social de um
País? A degradação ambiental tanto é pro-
vocado por países desenvolvidos, como por
países subdesenvolvidos, e nestes tanto os
segmentos mais pobres quanto os mais ricos
são responsáveis por essa degradação
ambiental.
Uma das conclusões a que chegou o 1.º
Relatório de Monitoria de Boa Governação
na Gestão Ambiental e dos Recursos Naturais
em Moçambique (2010 – 2011)5 foi que há
evidências que apontam para uma relação
complexa de exclusão social e económica,
bem como o fracasso institucional, como os
principais promotores da degradação
ambiental e pobreza, isto é, degrada-se o
ambiente com o lançamento de resíduos
poluentes para a água, solo e ar degrada-se
o ambiente pela exploração intensiva dos
recursos naturais e outros.
Contudo e apesar de todos nós contri-
buirmos, todos os dias, para a destruição do
ambiente, quem mais sofre com as conse-
quências são os segmentos mais pobres da
sociedade. Se não vejamos um exemplo prá-
Vol. 1, Nº 03, Ano II, Janeiro - Março de 2015
25
tico, enquanto os ricos podem comprar equi-
pamento para filtrar a água para o consumo
no caso de contaminação dos rios, o pobre
não possui esses recursos, acabando por
consumir a água contaminada.
Assim podemos chegar a conclusão que
há uma relação entre pobreza e ambiente.
Ambiente aqui deve ser visto no sentido
daquele que reflecte a ligação entre as con-
dições naturais, ou seja, o meio natural e as
condições de vida dos seres humanos: os
ecossistemas6, por sua vez entendido como o
conjunto de plantas, animais, microorganis-
mos, e o seu integrante mais interveniente, o
homem.
Quando falamos de degradação do
ambiente, falamos inevitavelmente da
degradação dos ecossistemas e de seus ser-
viços, isto é, degradação da capacidade da
natureza oferecer bens e produtos necessá-
rios ou desempenhar a sua função natural,
nomeadamente purificação da água e do
ar, renovação das florestas, preservação dos
rios.
No que toca a realidade Moçambicana
a pobreza é comum para a grande maioria
dos moçambicanos, de forma geral, a
pobreza pode ser definida como “a impossi-
bilidade por incapacidade ou por falta de
oportunidade de indivíduos, famílias e comu-
nidades de terem acesso a condições míni-
mas básicas, segundo as normas da socieda-
de”7.
A pobreza pode ser entendida em duas
vertentes, a pobreza absoluta, quando pes-
soas com renda baixa não conseguem com-
prar alimento e abrigo, ou pobreza relativa,
referente a situações em que as pessoas têm
como suprir as necessidades básicas, mas
que o seu ambiente social é desvantajoso,
obrigando-as a uma incessante luta pela
sobrevivência8.
É de senso comum que os ecossistemas
contribuem para o bem-estar dos seres
humanos através da produção de alimentos,
plantas, animais, produtos medicinais, com-
bustíveis (lenha), água doce, materiais não
vivos (minerais). Estes asseguram a sobrevi-
vência do Homem pois garantem a purifica-
ção do ar e da água, a renovação da fertili-
dade dos solos, redução das inundações e
secas, a desintoxicação, moderação das
temperaturas, da força dos ventos e das
ondas, controle das pestes agrícolas, polini-
zação das culturas entre outros.
Em muitos locais do mundo, os ecossiste-
mas estão a ser explorados a níveis que supe-
ram a sua capacidade de regeneração, o
que causa a sua destruição. Este facto tem
inúmeras consequências, como é o caso da
cada vez maior escassez de alimentos, o
desaparecimento de importantes espécies
vegetais, a diminuição de fontes de energia
deixando as pessoas cada vez mais pobres e
vulneráveis.
Dada a importância dos ecossistemas se
mostra que a população pobre, sobretudo
dos meios rurais, tem uma forte dependência
dos recursos naturais locais para a satisfação
das suas necessidades diárias. Essa forte
dependência significa que se o ambiente
não for devidamente considerado ou se os
recursos naturais forem excessivamente
explorados, a situação de pobreza dessa
população pode ser agravada formando-se
um ciclo vicioso inquebrável em que a
pobreza é causa da degradação ambiental
e a degradação ambiental, por sua vez,
causa da pobreza.
Na realidade de Moçambique em que a
grande maioria da população depende
directamente dos ecossistemas, daquilo que
a natureza e o meio envolvente lhe propor-
cionam a sua protecção mostra-se de suma
importância, dai a necessidade da sua pro-
tecção em todos os quadrantes, mormente
no ramo do Direito Penal.
Conclusão
Do exposto podemos concluir que o
estudo da tutela penal no âmbito do direito
ambiental é de extrema importância, ainda
mais num país em franco desenvolvimento
como Moçambique. Nestes países a protec-
ção do meio ambiente é um meio de prote-
ger as populações mais desfavorecidas, pois
são estes segmentos da população que mais
dependem da natureza e do meio envolven-
te. Proteger o meio ambiente é por força da
Constituição uma tarefa do Estado, e este
deve assegurar a sua protecção da forma
mais eficaz.
Vol. 1, Nº 03, Ano II, Janeiro - Março de 2015
26
Sendo o Direito ao Ambiente um direito
fundamental dos cidadãos Moçambicanos,
consagrado na Constituição, caberá ao
Direito Penal reprimir as manifestações mais
agressivas a esses valores, dando consagra-
ção material ao artigo 27º da Lei do Ambien-
te. Pois devemos enveredar pela tutela san-
cionatória do ambiente quer seja pela via
penal quer pela via administrativa.
Posto isto é de suma importância que o
legislador crie um pacote legislativo que vise
o combate aos abusos ao meio ambiente,
quer através da inclusão no Código Penal de
crimes ambientais, quer através da penaliza-
ção de determinadas condutas na legisla-
ção extravagante.
Notas e Referências Bibliográficas 1 Silva, Germano Marques da, “A Tutela Penal do
Ambiente”, in Estudos de Direito do Ambiente, Colec-
ção Actas, Porto, 2003. 2 BOTTINI, Pierpaolo Cruz. Crimes de Perigo Abstracto.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.
3 Lei nº 9.605 de 1998. 4 Posição defendida por Palma, Fernando Oliva em
“Tutela Penal do Meio Ambiente: a Importância dos
Tipos Penais de Perigo na Difícil Tarefa de Evitar o
Dano Ambiental”. Revista Magister de Direito
Ambiental e Urbanístico, nº 39, dez-jan. 2012, p. 33-45. 5 Elaborado pelo Centro Terra e Vida, Estudos e Advo-
cacia Ambiental, Maputo, 2012. 6 Vide Lei nº 10/99 de 7 de Julho. 7 1.º Relatório de Monitoria de Boa Governação na
Gestão Ambiental e dos Recursos Naturais em
Moçambique (2010 – 2011), Centro Terra e Vida,
Maputo, 2012. 8 Ibidem. 1.º Relatório de Monitoria de Boa Governação na
Gestão Ambiental e dos Recursos Naturais em
Moçambique (2010 – 2011), Centro Terra e Vida,
Maputo, 2012.
Amaral, Cláudio do Prado “Princípios do Direito
Ambiental: a perspectiva de um Direito Penal sem
preconceitos”;
Dia Mundial do Ambiente, Um dia de Reflexão, Não
de Comemoração, Justiça Ambiental, Newsletter nº
23, 5 de Junho de 2013;
Dias, Jorge Figueiredo “O PAPEL DO DIREITO PENAL
NA PROTECÇÃO DAS GERAÇÕES FUTURAS”;
Palma, Fernando Oliva. “Tutela Penal do Meio
Ambiente: a Importância dos Tipos Penais de Perigo
na Difícil Tarefa de Evitar o Dano Ambiental”. Revista
Magister de Direito Ambiental e Urbanístico, nº 39,
dez-jan. 2012, p. 33-45;
Poverty and Environment Project Team “Pobreza e
Ambiente (Manual de Planificação) ”, MICOA, 2009;
Quadro das demandas e propostas de Moçambique
para o desenvolvimento de um programa de coope-
ração sul-sul e norte-sul para a implementação da
Convenção das Nações Unidas de Combate a
Desertificação (UNCCD) nos países da CPLP, 2009;
Serra (Jr.), Carlos “Lei da ambiente anotada e
comentada”;
Serra (Jr.), Carlos “Manual de Direito do Ambiente”,
Centro de Formação Jurídica e Judiciaria, 2004;
Silva, Vasco Pereira da, “Verde a Cor do Direito”,
Lições de Direito do Ambiente, Almedina, 2001; Legislação
Constituição da República de Moçambique;
Lei nº 20/97 de 1 de Outubro.
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20Navigandi%20-%20O%20site%20com%20tudo%
20de%20Direito.htm
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20de%20reac%C3%A7%C3%A3o%20aos%20delitos%
20ambienta i s%20%20ref lex%C3% A3o%20em%
20torno%20das%20figuras%20da%20tutela%20penal%
20e%20da%20tutela%20contra-ordenacional.htm
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20crime%20_%20Envi ronmental%20crime%20_%
20Crime%20areas%20_%20Internet%20_%20Home%20-
%20INTERPOL.htm
Vol. 1, Nº 03, Ano II, Janeiro - Março de 2015
27
Vicissitudes do Teste do Álcool e a Sua Ineficácia Sob o Ponto de Vista Legal,
no Âmbito da Polícia de Trânsito
Msc. Paulo Sandro Aboobacar de Sousa
Jurista e Criminalísta, Mestre em Ciências Jurídicas Público Forense – ISCTAC
O Decreto-lei nº 1/2011 de 23 de Março (código de estrada), especificamente no artigo 81º e ss, realça a aspectos atinente a condução sob efeito de álcool, estupefacientes ou de substâncias psicotrópicas, no mes-mo artigo fundamenta o pressuposto de determinação destes, a partir do teste do ar expirado e o teste san-guíneo, cuja percentagem de determinação de influência é de 0,3 mg/l para o teste de ar expirado e 0,6 mg/l em teste sanguíneo. Por sua vez, para realização destes testes e obtenção de resultados fidedignos a que seguir um conjunto de pressupostos, oque se vê contrário no nosso ordenamento jurídico, ora, para a realização do teste do ar expirado usa-se fundamentalmente um aparelho especifico, determinado bafóme-tro, cujo resultado é fundamentalmente qualitativo e o teste sanguíneo (que pouco faz-se) é quantitativo, feito em laboratório específico (o de toxicologia), inexistente em quase todo território Nacional com excep-ção da Cidade de Maputo, outro teste que devia ser complementar a estes é o teste clínico, nesta ordem de ideias, a ignorância dos mecanismos viciadores destes poderão a qualquer instante serem levantados, sen-do para impugnar algum facto acusatório, pois, a figura do “in dubio pro reo” há-de aplicar-se.
Introdução
A s normas reguladoras atinentes a
condução sob efeito de álcool ou
outras drogas, reencaminham
para sanções, deste multas com
valores diversos, relacionados a quantidade
ou a percentagem determinada, suspensão
ou retirada de direito de condução de veícu-
los até a reclusão.
Por sua vez, os mecanismos de deten-
ção de consumo destes são ineficazes sob
ponto de vista científico, cuja ineficácia fun-
damentada e provada absolve o cidadão
indiciado de ter consumido, de qualquer
fórum de averiguação respeitante. Nos dias
que correm, nota-se uma certa ignorância
ou desconhecimento destes factores, desde
pelos membros da P.R.M. (polícia de trânsito),
magistrados, advogados e os próprios con-
dutores.
Os autos de notícia levantados pelos
agentes da polícia de trânsito que por regra
legal transmite fé em juízo, cujo corpo identi-
fica percentagem de álcool no automobilis-
ta, quase sempre, se não sempre, não sofrem
censura por outros intervenientes da adminis-
tração da justiça, subscrevendo simplesmen-
te o conteúdo. Inúmeros são os cidadãos
que de alguma forma efectuaram estes tes-
tes, desde em campanhas eventuais de trân-
sito, em acidentes de viação, entre outros,
que em algum momento não ingeriram algu-
ma bebida alcoólica como tal, ou se o fize-
ram, já com algum intervalo de realce.
Neste âmbito, com intuito de introduzir
conteúdo de respostas as questões, relativa-
mente de dúvidas destes procedimentos,
passam a citar alguns pressupostos de real-
ce.
A ciência explica que o álcool é produzido a
partir de matérias-primas com origem vegetal
que possuem altos índices de frutose. A principal
matéria-prima utilizada é a cana-de-açúcar,
mas existe também o uso de outras matérias
como o milho, a mandioca e o eucalipto1.
Vol. 1, Nº 03, Ano II, Janeiro - Março de 2015
28
O Método Quotidiano Usado Pela Polícia de Trânsito Para Identificação de Álcool
no Organismo Humano
A Polícia de trânsito nas suas contínuas
jornadas de luta contra o consumo de
álcool enquanto condutor, ou, condução
sobre efeito de álcool, de forma a evitar e/
ou reduzir os acidentes estradais, têm usado
instrumentos para identificação desta subs-
tância no organismo, com maior destaque
aos vulgo “bafômetros”, onde o condutor
deve expelir o ar sobre um tubo ou o orifício
determinado para o efeito. Neste mesma
ordem, a resposta imediata deste aparelho
é mostrar se o indivíduo possui ou não possui
o álcool no organismo, na eventualidade
com a respectiva percentagem, para a
prossecução do plasmado no código de
estrada, especificamente no artº. 81º e ss.,
para o efeito de aplicação da sanção, con-
forme especificidade da quantidade per-
centual.
Da Identificação do Álcool no Sangue
A ciência medica, determina que um
dos métodos de identificação recomendá-
vel para determinação efectiva da existên-
cia da substancia determinada álcool é o
teste de sangue, feito em um laboratório
recomendável, ou seja, o laboratório de toxi-
cologia, onde este por sua vez vai identificar
a substância e sua quantidade, na eventua-
lidade poderá retirar uma amostra.
Aspectos Críticos da Metodologia Usada
Em alguns pontos do Pais, exemplo con-
creto da Cidade da Beira, não existe um
laboratório de toxicologia, crucial para iden-
tificação da substancia e presumível quanti-
dade no sangue, o método actualmente
usado pela policia de transito é altamente
duvidoso e susceptível de impugnação e/ou
reclamação/recurso, ora:
- É um facto notório e do conhecimento
cientifico que a pesquisa de percentagem
de álcool no sangue através da expiração é
um método que enferma de precisão e que
não tem o rigor do método quantitativo de
pesquisa do álcool no sangue;
- A principal dificuldade que a pesquisa
efectuada pelo método qualitativo
(aparelhos tipo “bafômetro”) apresenta é na
conversão dos valores de etanol no ar “para
taxa de álcool no sangue, dado os vários
factores de erro introduzidos, nomeadamen-
te a técnica de expiração, condições
ambientais de temperatura, pressão e humi-
dade, etc., podendo ser outro facto de erro
a calibração dos próprios aparelhos e a utili-
zação do mesmo factor de TAE (taxa de
álcool no ar expirado) para TAS independen-
temente das circunstâncias verificadas em
concreto;
- Os analisadores qualitativos ou de tria-
gem são meramente indiciadores da alcoo-
lemia, sendo apenas usados como testes de
triagem, sendo incapazes de traduzirem
com fidedignidade suficiente para permiti-
rem a aplicação automática das sanções
legais previstas.
Em resultado da falta de fiabilidade do
aparelho de recolha qualitativa, cientifica-
mente reconhecida e explicada e em conju-
gação de não existência de um laboratório
específico (toxicologia), e a luz do princípio
“in dubio pro reo”, emergente do princípio
da presunção da inocência consagrado no
art. 59.º, n.º 2 da C.R.M. existindo um laivo de
dúvida, por mínimo que seja, sobre a veraci-
dade de um facto em que se alicerça um
imputação delituosa, ninguém pode ser
condenado com base nesse facto; logo, a
sanção aplicada, multas ou outras sanções,
poderão a qualquer instante (conforme pra-
zos) serem impugnadas.
Conclusão
Para o efeito, da conjugação dos facto-
res levantados, poderá concluir-se que os
testes ate então aplicados pela P.T. (polícia
de trânsito) nas vias públicas, aos condutores
em campanhas rotineiras ou em suspeita de
consumo de álcool, a partir do uso do apa-
relho denominado “bafômetro” não são
Vol. 1, Nº 03, Ano II, Janeiro - Março de 2015
29
fidedignos, podendo para o efeito, num
futuro breve despertar no seio da popula-
ção visada ou aos intervenientes da admi-
nistração da justiça, especificamente a
advogados e magistrados, um conjunto de
impugnações e/ou reclamações a esta
prática, fragilizando para o efeito o papel
da polícia.
Recomendações
- Manter em permanente manutenção
as famosas máquinas “bafômetros”;
- Conjugar os testes a partir do bafô-
metro (do ar expirado) com testes clínicos
(aptidão física e psicológica) e de sangue;
- Apetrechar os nossos hospitais com
um laboratório de toxicologia.
Referências Bibliográficas
1 http://pt.wikipedia.org/wiki/%C3%81lcool
Constituição da República de Moçambique (2004),
Imprensa Nacional, Maputo.
Decreto Lei nº 1/2011 de 23 de Março (código de
estrada)
Código Penal português – na doutrina e na jurispru-
dência, 2ª edição, Almedina.
Roland, Paul, Cenas de Crime, publicações Dom Qui-
xote, Lisboa-2007
França, Genival, Medicina Legal; 8ª Edicção.
Zacarias, Eugénio – Temas de Medicina legal e segu-
ros.
Acórdão da relação do Porto: margem de erro dos
alcoolímetros. Processo nº 0617247 de 14/03/2007.
Renato, Luis, et all, A perícia médico-legal; Millennium
Editora.
Passagli, Marcos, Toxicologia Forense; Millennium Edi-
tora.
INCUBADORAS DE EMPRESAS: Origem, Objectivos e Importância
Msc.Júlio Taimira Chibemo
Director da Faculdade de Ciências Económica, Director da Revista Científica do ISCTAC,
Doutorando em Ciências de Educação na Universidade Piaget de Moçambique,
Mestre em Auditoria Internacional e Gestão de Empresas,
Especialista em Empreendedorismo, Coching e Marketing.
O presente artigo tem como objectivo central apresentar a origem, objectivos e importância de incubado-ras de empresas, enquanto projecto ou empresa que tem como objectivo a criação ou o desenvolvimento de pequenas empresas ou microempresas, apoiando-as nas primeiras etapas de suas vidas. Trata-se de um dos mecanismos que vêm sendo mundialmente utilizado para induzir a criação de empresas inovadoras, com vista a responder a questões pontuais relacionadas com o empreendedorismos e as Pequenas e Médias Empresas. As incubadoras proporcionam um conjunto de vantagens para os seus membros, visto que são autênticas promotoras da base e o suporte necessários para pequenas empresas, por meio da transferência de conhecimento e de tecnologias desenvolvidas por Universidades e Instituições de Ensino e Pesquisa. Portanto, trata-se de uma boa estratégia para criação e desenvolvimento de pequenas empresas, em Moçambique.
Conceito de Incubadora de Empresas
U ma incubadora de empresas é
um projecto ou uma empresa
que tem como objectivo a cria-
ção ou o desenvolvimento de
pequenas empresas ou microempresas,
apoiando-as nas primeiras etapas de suas
vidas.
“As incubadoras de empresas promo-
vem e nutrem o desenvolvimento dos
empreendedores e dos seus negócios, aju-
dando-os a sobreviver e a crescer durante a
fase de ‘startup’, quando estão mais vulnerá-
veis”. Na prática, as incubadoras de empre-
sas são espaços onde as empresas jovens
Vol. 1, Nº 03, Ano II, Janeiro - Março de 2015
30
podem instalar-se e onde recebem todo o
tipo apoio para a concretização de uma
ideia de negócio como são os casos de
acesso a financiamento, apoio logístico,
redes de empreendedores, entre outros
apoios1.
As incubadoras de empresas procurar
abrigar empresas inovadoras frutos de pro-
jectos de pesquisa e desenvolvimento cientí-
fico e tecnológico, buscando fornecer um
ambiente propício ao desenvolvimento da
empresa, dando assessoria empresarial, con-
tabilística, financeira e jurídica, além de divi-
dir entre as várias empresas lá instaladas os
custos de recepção telefonista, acesso a
internet etc. formando um ambiente em que
essas empresas selecionadas têm maior
potencial de crescimento.
De acordo com State of the Business
Incubation Industry 2006 apresentado por
Knopp (2007), as incubadoras, normalmente,
oferecem um conjunto de serviços básicos
aos incubados que incluem a ajuda com a
modelagem básica do negócio, atividades
de networking, assistência de marketing,
acesso a internet, ajuda com contabilidade /
gestão financeira, acesso a empréstimo ban-
cários, fundos de empréstimo e programas
de garantia, ajuda com técnicas de apre-
sentação, acesso a recursos de ensino supe-
rior, acesso a parceiros estratégicos, acesso
aos investidores anjo ou capital de risco, trei-
namento de negócios, conselhos consultivos,
ajuda na identificação do time, ajuda na
etiqueta empresarial, assistência na comer-
cialização de tecnologia, ajuda no cumpri-
mento das normas, gestão da propriedade
intelectual, entre outros serviços.
As incubadoras de empresas não servem
para todo tipo de empresas. Normalmente,
os empreendedores que desejam entrar em
programas de incubação devem aplicar
para admissão. Os critérios de aceitação
variam de programa para programa, mas
geralmente apenas aqueles com ideias e
planos de negócios viáveis são admitidos.
Este é um dos fatores responsáveis pela difi-
culdade de comparar as taxas de sucesso
de empresas incubadas em relação às esta-
tísticas de sobrevida geral de negócios
(Erlewine, 2007).
Embora a maioria das incubadoras ofe-
reçam a seus clientes espaços para escritório
e serviços administrativos compartilhados, o
coração de um verdadeiro programa de
incubação de negócios são os serviços pres-
tados a empresas nascentes. O tempo que
uma empresa passa no programa de incu-
bação pode variar bastante, dependendo
de alguns fatores, isso inclui o tipo do negó-
cio e o nível de expertise do empreendedor.
As empresas que necessitam de longos ciclos
de pesquisa e desenvolvimento, requerem
mais tempo de incubação a empresas de
prestadoras de serviço ou de fabricação,
que imediatamente podem produzir e colo-
car produtos ou serviços no mercado.
Os programas de incubação abrangem
uma grande variedade de sectores de negó-
cios. Mais da metade dos negócios incuba-
dos são normalmente projetos multiárea que
estão voltados para clientes de diferentes
indústrias (Ibidem).
CAIXA: Incubadora
Incubadora de empresas é um dos mecanismos que vêm sendo mundialmente utilizado para induzir a criação de empresas inovadoras. Pode ser entendida como um ambiente que abriga o desenvolvimento de novos empreendimentos, cujos resulta-dos esperados deverão garantir em prazo determinado a autonomia e a autossustentação da empresa. A incubadora fornece serviços assistenciais, suporte e condições de sobrevivência para os negócios emergentes, que ficam “incubados” até que este-jam preparados para a sua inserção no mercado. Existem três fases no processo de incubação de empresas: a pré-incubação, a incubação e a graduação. De forma sistemática, a figura a seguir apresenta as fases que compõem o processo de incubação. Nesse processo a empresa é estimulada quanto ao empreendedorismo e à geração de inovações. Também recebe serviços e suporte da incubadora para ter condições de se inserir no mercado de forma competitiva. A pré-incubação é a fase que anteci-pa a incubação, visa dar vazão a ideias empreendedoras que surgem entre estudantes, professores e pesquisadores, auxilian-do na transformação dessas ideias em negócios de sucesso. Na pré-incubação são preparados projetos/protótipos de negócios para o futuro ingresso na Incubadora. Esse é o período no qual uma empresa é estimulada a desenvolver com profundidade o potencial de seu negócio, beneficiando-se de serviços assistenciais para iniciar efetivamente o empreendimento. O programa
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31
de pré-incubação é de fundamental importância, pois atua na orientação de pesquisadores/empreendedores nas diferentes etapas de desenvolvimento de uma ideia inovadora. A fase de incubação é o processo de apoio ao desenvolvimento de empreendimentos iniciantes ou de empresas nascentes e de promoção das condições favoráveis ao seu crescimento (suporte operacional – infraestrutura física, serviços básicos, suporte técnico e administrativo; suporte estratégico – treinamento para o empreendedor ou auxílio gerencial/empresarial capacitação e acompanhamento, intercambio entre pesquisador-indústria; suporte tecnológico – acesso a equipamentos de investimento elevado, treinamentos;) em troca do pagamento de uma men-salidade, que ajuda a incubadora a manter a sua estrutura. A outra fase é a da graduação que é a inserção de uma empresa no mercado. Depois de fortalecida por um determinado período, a empresa incubada se gradua, se insere no mercado, poden-do ou não manter algum vínculo com a incubadora.
Adaptado de: http://www.nintec.ufla.br/inbatec/programa-de-incubacao/sobre-as-incubadoras-de-empresas/
O conceito formal de incubação de
empresas começou nos EUA, em 1959,
quando Joseph Mancuso abriu a Batavia
Industrial Center, num armazém situado na
Cidade de Batavia, Nova Iorque. O proces-
so de incubação se expandiu na década
de 1980, nos EUA, e logo se espalhou pelo
Reino Unido e Europa, em vários formatos
diferentes: centros de inovação, polos de
pesquisa, parques tecnológicos, entre
outros.
De acordo com Morais (1997, p. 42-43),
“na Europa, as incubadoras surgiram inicial-
mente na Inglaterra, a partir do fechamen-
to de uma subsidiária da British Steel Corpo-
ration, que estimulou a criação de peque-
nas empresas em áreas relacionadas com
a produção do aço, preconizando uma
terceirização, e também em decorrência
do reaproveitamento de prédios subutiliza-
dos”. Atualmente, o Japão também pas-
sou a utilizar incubadoras de empresas,
assim como muitos países em desenvolvi-
mento, a exemplo da China, Índia, México,
Argentina. Turquia e Polônia, entre outros
(Lalkaka, 1996).
A National Business Incubation Associa-
tion estima que há cerca de 7.000 incuba-
doras no mundo todo. Para se ter uma
noção da expansão das incubadoras, de
1980 para 2006 o número de incubadoras,
na América do Norte, subiu de 12 para
1400; no Reino Unido, essa variação foi de
25 em 1997 para 270 até 2005; na Europa
Ocidental, em 2002, um estudo identificou
cerca de 900 ambientes de incubação
(Centre for Strategy and Evaluation Servi-
ces, 2002).
A actividade de incubação não tem-
se limitado a países desenvolvidos. Esses
ambientes vêm sendo implementados
cada vez mais em países em desenvolvi-
mento, aumentando interesse por suporte
financeiro de grandes organizações glo-
bais. Desde a primeira década do 2000, as
incubadoras vem tomando novas formas.
Novos experimentos como Incubadoras
Virtuais de Empresas estão levando recur-
sos de grandes centros de actividades.
Objectivos das Incubadoras de Empresas
As incubadoras de empresas têm
como objectivo central apoiar as empresas
na sua fase inicial, disponibilizando espaço
para escritório e outros recursos a preços
mais acessíveis2. A maioria das incubadoras
de empresas é composta por projectos
que atuam em diversos segmentos e ramos
de produção industriais. A incubação de
empresas tem um papel importante no
ecossistema socioeconômico de uma
região, uma vez que se traduz em benefí-
cios que incluem a criação de empregos e
riqueza; o fomento à comunidade
empreendedora, comercialização de tec-
nologia; diversificação da economia local;
a construção ou aceleração do crescimen-
to de indústrias locais; a criação e reten-
ção de negócios; e a revitalização da
comunidade.
Em muitos países, programas de incu-
bação são financiados pelo governo como
parte de uma estratégia de desenvolvi-
mento económico. No país berço desse
conceito – nos Estados Unidos - a maior
parte dos programas são, no entanto, inde-
pendentes.
4.4. Tipos de Incubadoras de Empresas
Vol. 1, Nº 03, Ano II, Janeiro - Março de 2015
32
Uma Incubadora é um mecanismo
que estimula a criação e o desenvolvimen-
to de micro e pequenas empresas indus-
triais ou de prestação de serviços, de base
tecnológica ou de manufaturas leves por
meio da formação complementar do
empreendedor em seus aspectos técnicos
e gerenciais e que, além disso, facilita e
agiliza o processo de inovação tecnológi-
ca nas micro e pequenas empresas. Por-
tanto, conta com um espaço físico espe-
cialmente construído ou adaptado para
alojar temporariamente micro e pequenas
empresas industriais ou de prestação de
serviços e que, necessariamente, dispõe de
uma série de serviços e facilidades.
De acordo com MCT (2000, p.6), as
incubadoras podem ser de três tipos,
dependendo do tipo de empreendimento
que abriga.
Incubadora de Empresas de Base Tec-
nológica: é a incubadora que abri-
ga empresas cujos produtos, proces-
sos ou serviços são gerados a partir
de resultados de pesquisas aplica-
das, nos quais a tecnologia repre-
senta alto valor agregado.
Incubadora de Empresas dos Setores
Tradicionais: é a incubadora que
abriga empresas ligadas aos setores
tradicionais da economia, as quais
detém tecnologia largamente difun-
dida e queiram agregar valor aos
seus produtos, processos ou serviços
por meio de um incremento em seu
nível tecnológico. Devem estar com-
prometidas com a absorção ou o
desenvolvimento de novas tecnolo-
gias.
Incubadoras de Empresas Mistas: é a
incubadora que abriga empresas
dos dois tipos acima descritos.
No processo de incubação, as empre-
sas podem ser classificadas de quatro for-
mas: pré-residentes, residentes, não-
residentes, associadas e graduadas3.
As empresas pré-residentes têm um
período determinado de tempo para se
prepararem em que são estimuladas a pla-
nejar o potencial do seu negócio, utilizan-
do serviços de assistência para iniciarem o
projeto na incubadora. Podem ainda se
denominar “pré-incubadas” uma vez que
os seus projetos passam por um processo
de avaliação e acompanhamento para a
verificação de sua viabilidade antes de
serem incubadas;
As empresas residentes são projetos
que foram instalados nas dependências
físicas de uma incubadora. Podem tam-
bém ser chamadas de “incubadas” por
estarem abrigadas por uma incubadora. As
empresas não-residentes ou associadas são
empreendimentos incubados à distância
que utilizam os serviços oferecidos pela
incubadora visando o aprimoramento de
suas atividade. As empresas graduadas são
organizações que já alcançaram o desen-
volvimento suficiente para deixar a incuba-
dora.
Importância das Incubadoras de Empresas
A incubadora proporcionar um conjun-
to de vantagens para os seus membros.
Uma incubadora visa proporcionar a base
e o suporte necessários, por meio da trans-
ferência de conhecimento e de tecnolo-
gias desenvolvidas por Universidades e Insti-
tuições de Ensino e Pesquisa, às empresas
que estão incubadas para que tenham
condições de ingressar no mercado.
Nessa perspectiva, a incubadora con-
fere capacitação e assistência técnica e
de gestão para que novas empresas
tenham condições de enfrentar os obstá-
culos que surgem em seus primeiros anos
de vida. Além disso, a incubadora favore-
ce a criação de parcerias e redes de rela-
cionamento (universidade-empresa) que
busquem promover um ambiente propício
a inovação e ao empreendedorismo, fato-
res fundamentais para a viabilização de
novos negócios.
Dentro das inúmeras vantagens que
uma incubadora proporciona pode-se des-
tacar a diminuição da taxa de mortalidade
das empresas; o desenvolvimento socioe-
Vol. 1, Nº 03, Ano II, Janeiro - Março de 2015
33
conômico da região em que está inserida
por meio da criação de postos de traba-
lho; a redução dos riscos e custos até a
inserção de uma inovação no mercado;
facilidade com relação ao intercâmbio
entre empresa, academia e centros de
pesquisa e tecnologia; a resolução de pro-
blemas enfrentados pelas pequenas
empresas em seus primeiros anos; e a redu-
ção de custos operacionais.
No caso das vantagens em termos de
incentivos, pode-se destacar a vertente da
orientação na elaboração, submissão e
gestão de projetos institucionais; o acom-
panhamento e revisão dos planos de
negócios; a prospecção de editais de
fomento; a orientação na busca de finan-
ciamento; a assessoria administrativa e
estratégica; a promoção de capacitação
e treinamentos gerenciais; e a orientação
na gestão da propriedade intelectual e no
registro de marcas e patentes. No que tan-
ge à vantagens em termos de estrutura físi-
ca, ela proporciona uma sala de recepção
disponível às empresas, equipada com fax,
computador e telefone; refeitório; auditó-
rio; biblioteca; data-show; participação de
pesquisadores; serviços externos; laborató-
rios e toda a infraestrutura institucional.
Para além das vantagens acima men-
cionadas, podem participar do programa
de incubadoras de empresas qualquer pes-
soa que tenha um projeto inovador e que
deseje abrir sua própria empresa. As
empresas já existentes também podem
participar do programa e receber o apoio
da incubadora. Para tanto, é preciso ter
um projeto para melhoria ou desenvolvi-
mento de novos produtos e serviços. Em
ambos os casos, o empresário/
empreendedor deve se inscrever no pro-
cesso de seleção de projetos e observar os
critérios de entrada adotados por cada
Incubadora.
Em termos práticos, uma incubadora
dispõe de uma série de serviços e facilida-
des:” espaço físico individualizado, para a
instalação de escritórios e laboratórios de
cada empresa admitida; espaço físico
para uso compartilhado, tais como sala de
reunião, auditórios, área para demonstra-
ção dos produtos, processos e serviços das
empresas incubadas, secretaria, serviços
administrativos e instalações laboratoriais;
recursos humanos e serviços especializados
que auxiliem as empresas incubadas em
suas atividades, quais sejam, gestão
empresarial, gestão da inovação tecnoló-
gica, comercialização de produtos e servi-
ços no mercado doméstico e externo, con-
tabilidade, marketing, assistência jurídica,
captação de recursos, contratos com
financiadores, engenharia de produção e
Propriedade Intelectual, entre outros;
capacitação, formação e treinamento de
empresários-empreendedores nos princi-
pais aspectos gerenciais, tais como gestão
empresarial, gestão da inovação tecnoló-
gica, comercialização de produtos e servi-
ços no mercado doméstico e externo, con-
tabilidade, marketing, assistência jurídica,
captação de recursos, contratos com
financiadores, gestão da inovação tecno-
lógica, engenharia de produção e Proprie-
dade Intelectual; acesso a laboratórios e
bibliotecas de universidades e instituições
que desenvolvam atividades tecnológi-
cas” (MCT, 2000, p. 6-7).
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o-que-e-e-para-que-serve-uma-incubadora-de-
empresas-1674317.
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Athens, Ohio.
Vol. 1, Nº 03, Ano II, Janeiro - Março de 2015
34
Boko Haram: Uma Ameaça a Paz, Segurança e Estabilidade do Sahel
ao Corno de África
Msc. Emilio J. Zeca
Mestre em Resolução de Conflitos e Mediação
Pesquisador de Paz, Conflito e Segurança
De 2010 a 2015, o Estado nigeriano e seus vizinhos enfrentam graves crises e ameaças levadas a cabo pelo movimento radical, fundamentalista e terrorista Boko Haram. Essa ameaça tende a estender-se pelos Estsa-dos do Sahel em direcção ao Corno de África, tendo em conta as ligações que existem entre esse movimento e os grupos Al Shabab, Al Quaeda do Magreb e Estado Islâmico. Ao se materialização a “cooperação terroris-ta” entre estes grupos, o continente uma divisão continental ocorreria com o Magreb e a África Subsaariana a serem separados por um cordão controlado por grupos radicais, fundamentalistas e terroristas. O presente artigo procura analisar os contornos do surgimento e expansão do movimento radical islâmico Boko Haram e as ameaças que o mesmo representa ao Estado Nigeriano, aos Estados da região do Sahel e Corno de África, bem como o resto de África e o mundo, no geral.
Boko Haram: Origem, Expansão e Objectivos
B oko Haram é um grupo radical, fun-
damentalista, islâmico e terrorista
fundado por Mohammed Yusuf, em
2002. Essencialmente, o termo Boko
Haram traduzido em línguas nativas nigeria-
nas, significa “luta ou posição contra educa-
ção ocidental” (Sani 2011:24; Osumah
2013:541). O contexto do surgimento deste
grupo é mais alargado do que esse, uma vez
que não é somente a questão da educação
ocidental que contextam,mas há outros fac-
tores como é o caso da implementação da
Sharia como uma lei de orientação política,
social e até económica do povo nigeriano.
Mais do que isso, o grupo acusa o Estado
nigeriano de ser corrupto, recorrendo à
implementação da Sharia para combater os
males, nomeadamente, perversão ocidental
cristã, prostituição e corrupção.
“Oficialmente o Boko Haram alega que
luta pela Sharia, combate a corrupção do
governo, a falta de pudor das mulheres, a
prostituição e outros vícios. Segundo eles os
culpados por esses males são os cristãos, a
cultura ocidental e a tentativa de ensinar
algo a mulheres e meninas”1. O conceito
Boko Haram significa coisas diferentes, para
pessoas diferentes. Para uns, trata-se de um
grupo terrorista, mas para outros “lutadores
de libertação” face a perversão trazida pelo
Ocidente. Mas, a Resolução 1514 da ONU
distingue claramente o terrorista do lutador
de libertação. Portanto, o terrorista usa terror
nas suas incursões e acções, com objectivos
políticos, enquanto o lutador de libertação
tem um ideal mais abrangente, que é a liber-
tação de um povo. Não há dúvida que o
grupo Boko Haram usa terror. Este emergiu no
estado nigeriano, fundado por indivíduos
apologistas da Al Qaeda, tendo como ele-
mento ideológico a questão do cristianismo,
e educação ocidental como uma vida per-
vertida.
O Boko Haram não concorda com o
regime político nigeriano, porque pensa que
é corrupto. O norte da Nigéria é uma região
pobre, o sul é rico por causa do petróleo e
Vol. 1, Nº 03, Ano II, Janeiro - Março de 2015
35
gás, e em muitos estados há sempre essa dis-
puta de lugares onde há recursos. Só com
“lentes” podíamos perceber a relevância da
revindicação deste grupo que não poupa
crianças e mulheres nos seus ataques. Boko
Haram detém o controlo de vários Estados
do norte que têm o nível de escolaridade
baixo, alta taxa de pobreza, e onde a edu-
cação religiosa islâmica é um dos elementos
de instrumentalização e politização.
Portanto, em termo prático, o Boko
Haram é um grupo terrorista que surgiu na
Nigéria. Trata-se de um grupo radical e fun-
damentalista islâmico que tem como objecti-
vo central acabar com a democracia na
Nigéria e promover a educação exclusiva-
mente em escolas islâmicas. Os líderes desse
movimento são críticos em relação ao gover-
no nigeriano, porque o consideram de cor-
rupto e querem estabelecer a lei Islâmica no
Estado nigeriano, condenando a educação
ocidental e são contra que as mulheres fre-
quentem a escola oficial.
Boko Haram a Insegurança na Nigéria: Governação em Crise
O Boko Haram é uma grande ameaça à
segurança do Estado nigeriano (Pham
2011:1; Aghedo and Osumah 2012:859). Este
grupo cria instabilidade e insegurança devi-
do ao seu modus operandi que concentra-se
em ataques terroristas, sequestros e intimida-
ções. Por muito tempo, pensava-se que o
exército nigeriano era um dos mais fortes de
África, todavia menosprezaram as potenciali-
dades deste grupo.
Em estratégia, há um princípio básico
que preconiza que “nunca se pode menos-
prezar o adversário sob o risco de ter surpre-
sas estratégicas.” Tudo indica que houve
menosprezo das capacidades do grupo
Boko Haram em fazer face as autoridades do
Estado nigeriano, sobretudo as Forças de
Defesa e Segurança.
Data Incidente Danos
26/07/2009 Ataque à Esquadra de Polícia, em Bauchi, pro-
vocando uma revolta de cinco dias que se
estende até Maiduguri.
Mais de 40 membros dos
Boko Haram foram mortos e
mais de 200 presos.
07/09/2010 Ataque a uma prisão, em Bauchi, e libertação
de 700 presos, antigos membros do Boko
Haram.
5 Guardas Prisionais Mortos
24/12/2010 Atentado bombista, em Jos. 8 Pessoas Mortas
28/12/2010 Revindicação da responsabilidade pelo aten-
tado na véspera do Natal, em Jos. 38 Pessoas Mortas
29/05/2011 Bombardeamento a Quartéis do Exército, em
Bauchi e Maiduguri 15 Pessoas Mortas
26/06/2011 Ataque-Bomba a um bar, em Maiduguri. 25 Pessoas Mortas
16/08/2011 Bombardeamento ao complexo de escritórios
das Nações Unidas, em Abuja. Mais de 34 Pessoas Mortas
25/12/2011 Ataque bombista a Igreja Católica Santa Tere-
za, em Madalla. Mais de 46 Pessoas Mortas.
21/01/2012 Várias explosões abalaram Cidade de Kano Mais de 185 Pessoas Mortas
15/02/2012 Ataque a Cadeia em Koton Karfe, Estado de
Kogi, no qual 119 presos foram libertados. Um guarda prisional foi mor-
to
19/02/2012 Explosão de bomba perto de uma Igreja Cristã
e Embaixada do Estado do Níger, em Suleija, 5 Pessoas Mortas
26/02/2012 Explosão de Bomba na Igreja de Cristo da
Nigéria, em Jos. 2 Pessoas Mortas e 38 Feri-
dos
Vol. 1, Nº 03, Ano II, Janeiro - Março de 2015
36
Com a actução do Boko Haram, cons-
tatou-se que o exército nigeriano, por
exemplo, tinha muitas lacunas e que a
questão da prontidão militar supostamente
demonstrada era defeituosa. Para perce-
ber esses aspectos, um dado importante a
reter é o facto da estrutura político-
administrativa da Nigéria ser essencialmen-
te formada de Estados Federados, com
uma certa autonomia administrativa e
segurança. As acҫões deste grupo sempre
foram ataques terroristas se sequestros. Eles
levaram a cabo os seus ataques em
momentos em que todos pensavam que a
segurança estava garantida. Portanto,
pode-se afirmar com alguma segurança
que as Forças de Defesa e Segurança nige-
rianas falharam na componente de inteli-
gência2, em grande escala nas previsões
ou antevisões, que este grupo rebelde
podia representar em termos de ameaça.
Devidas as incursões levadas a cabo
pelo movimento Boko Haram, o processo
governativo, na Nigéria entrou para uma
situação de crise (Okoro, 2014:103). O Esta-
do nigeriano sentiu algumas dificuldades
em fazer face a este grupo. Quase sempre
que as Forças de Defesa e Segurança
foram solicitadas para intervir com vista a
fazer face a uma situação em que o grupo
agiu teve dificuldades de trazer resultados
positivos. Um dos exemplos é o do seques-
tro das 200 raparigas que não se conseguiu
identificar onde foram colocadas.
Em Março de 2015, o Estado nigeriano
vai a eleições. A liderança do Boko Haram
ameaçou boicotar o processo com actos
de terror. Tudo indica que dificilmente a
Nigéria irá fazer face ao grupo Boko
Haram. Neste contexto, será muito difícil
08/03/2012 Um italiano, Franco-Lamolinara, e um britânico,
Christopher McManus, funcionários expatriados
de Stabilim Visioni, Empresa de Construção
Civil, sequestrados em meados de 2011, foram
mortos por um grupo dissidente do Boko
Haram.
2 Pessoas Mortas
11/03/2012 Explosão de Bomba na Igreja Católica de St.
Finbarr, Rayfield, Jos 11 Pessoas Mortas e Vários
Feridos
26/04/2012 Explosão de três Estações de mídia: (A) Este
Dia, Abuja (B) Este Dia; O Sol e os momentos,
Kaduna.
5 Pessoas Mortas e 13 Feri-
das, em Abuja, 3 Pessoas
Mortas e Várias Feridas, em
Kaduna
29/04/2012 Ataque na Universidade Bayero, Kano. 16 Pessoas Mortas e Vários
Feridos
30/04/2012 Explosão de uma bomba em Jalingo 11 pessoas morreram e
várias ficaram feridas
23/09/2012 Homem-bomba atacou a Igreja Católica São
João, em Bauchi 2 Pessoas Mortas
05/12/2012 Ataque ao Posto Policial na Cidade de Kano e
a um autocarro de transporte de passageiros 2 Polícias Mortos e Vários
Feridos.
23/03/2013 Ataque a Bancos, Posto Policial e Cadeia em
Kano, Adamawa e Borno. 28 Mortos e Vários Feridos.
12/04/2013 Ataque a Posto Policial em Yobe 4 Polícias e 5 Cidadãos Mor-
tos
22/06/2013
Ataque em Yobe e Cidade de Bama
40 Polícias, 13 Guardas Pri-
sionais e 3 Soldados Mortos.
29/09/2013 Ataque ao Colégio Estatal de Agricultura no
Estado de Yobe 78 Estudantes Mortos
Fonte: Okoro (2014:111-113)
Vol. 1, Nº 03, Ano II, Janeiro - Março de 2015
37
organizar eleições livres e justas, com
ameaças terrorista. Consequentemente,
dificilmente haverá eleições livres, justas e
transparentes. Todavia, as eleições consti-
tuem um imperativo nacional e uma mani-
festação da democracia. Todavia, realizar
eleições num Estado de emergência impli-
ca o desdobramento de todo exército, o
que seria difícil, “um polícia e um militar
para cada cidadão”. Trata-se de um cená-
rio impensável.
Curioso é o facto do grupo Boko
Haram pretende instaurar a Sharia como a
lei de orientação política, económica e
social da Nigéria, sem recorrer aos moldes
democráticos que vigora no país. Espera-
ríamos o Boko Haram se transformasse num
partido político, e que concorresse nas pró-
ximas eleições. Contudo, este grupo é con-
siderado terrorista, logo, não tem reconhe-
cimento nacional e internacional de todos,
muito menos uma convivência política
aceitável. O tipo de reivindicação manifes-
tado por este grupo desajusta-se ao meca-
nismo ideal que é apresentado para se
ascender e controlar o poder, o modelo
democrático.
Boko Haram, “Cooperação Terroris-ta” e Ameaça a Estabilidade e Seguran-
ça de África
AS acções do Boko Haram e grupo
extrapolaram as fronteiras nigerianas e pas-
saram a afectar Estados vizinhos como
Camarões, Costa de Marfim e Tchad. Este
avanço coloca em perigo vários Estados
da região do Sahel, com a agravante de
que no Corno de África e África Oriental
existir o grupo terrorista Al Shabab que
semeia terror, instabilidade e insegurança
naquela região.
Por muito tempo se menosprezou a
capacidade de expansão, a extensão e
alcance internacional do Boko Haram.
Vários estudos e relatórios demonstra que
este grupo rapidamente iria se expandir
para os Estados vizinhos e rapidamente se
tornaria numa ameaça regional, continen-
tal e global. De acordo com o AFRICOM, o
comando do Pentágono para a África, há
evidências fortes de ligações entre o Boko
Haram e a a-Qaeda do Magreb Islâmico.
Para além disso, há evidência de ligações
com o al Shabab, porque informações da
inteligência revelam que combatentes do
Boko Haram teria viajado até a República
Centro-Africana e à Somália para juntar-se
com o al Shabab3. Importa recordar que
recentemente, a liderança do Boko Haram
identificou-se com o Estado Islâmico do
Iraque e do Levante
Uma “cooperação terrorista” entre
estes grupos radicais e fundamentalistas
criariam uma espécie de “zona tampão”,
entre o Norte de África, Magreb, e África
Subsariana onde surgiria uma zona contro-
lada por grupos radicais, fundamentalistas
e terroristas. Vários campos de treino seriam
instalados e a partir dai várias aclções
seriam preparadas para levar acabo no
Estado nigeriano, bem como em retaliação
contra alvos ocidentais nos Estados que se
encontram entre o Sahel e o Corno de Áfri-
ca e, possivelmente, no Ocidente mesmo.
Há uma clara necessidade de fortificar
a coligação regional e implantar uma mais
alargada com Estados fortes do Ocidente
para lançar uma ofensiva de “guerra total”
contra o Boko Haram como aconteceu em
relação aos protagonistas da Primeira
Guerra Mundial (1914-1919) e Segunda
Guerra Mundial (1939-1945). Em termos de
estabilidade, paz e segurança, o Boko
Haram passou a ser uma grande ameaça
não só para o Estado nigeriano, mas para
os seus vizinhos aqueles onde actuam o al
Qaeda do Magreb e al Shabab.
As incursões do Boko Haram vieram
deteriorar todas as condições de paz que
nesta região existiam, passando a propor-
cionar uma situação de paz precária, instá-
vel e condicional, uma “paz de cemitérios”
como apontou Immanuel Kant na sua obra
Paz Perpétua, segundo o qual a paz conse-
guida e imposta por via de armas, imposi-
ção e coerção não era a verdadeira paz.
Considerações Finais: Que fazer
Importa referir que o combate ao ter-
rorismo não pode ser uma acção unilateral.
Recomenda-se que sejam levadas a cabo
acções no âmbito multilateral e multissec-
Vol. 1, Nº 03, Ano II, Janeiro - Março de 2015
38
torial. Em termos de resolução do problema
do terrorismo, há uma doutrina dominante,
segundo a qual não se negoceia com ter-
rorista. O terrorista é um elemento por se
abater, tendo em conta os métodos que
este usa nas suas acções. Todavia, há uma
outra abordagem em emergência, mas
ainda não consolidada, que procura saber
quais são as reais motivações dos terroristas
para que se avance com os mecanismos
alternativos da resolução do conflito. Por-
tanto, o terrorista na sua essência é um
actor político ou social, o qual se encontra
numa situação da percepção de ser mar-
ginalizado. Ele usa o terror como instrumen-
to de luta, por isso, alguns teóricos defen-
dem que terrorismo é um mecanismo de
luta de pobres, e a guerra estratégia de
luta de ricos.
A segunda abordagem chama a
necessidade de diálogo e negociação
com os radicais e terroristas, com o objecti-
vo de perceber as suas reais motivações e
revindicação. Esta parece ser a forma mais
alternativa, para o contexto actual do ter-
rorismo. Desde a emergência do Estado
Islâmico, nota-se uma mudança na acção
dos terroristas: antes levavam a cabo as
suas actividades na clandestina, mas hoje
em dia temos Boko Haram de um lado,
Estado islâmico do outro, e a al Qaeda de
Magrebe ainda por outro lado, formando
um triângulo de acções bárbaras.
Tudo indica que uma espécie de
negociação, com a tentativa de percep-
ção das reais motivações terroristas, pode
ajudar na resolução de um conflito desta
natureza. A partir desta via, podem dese-
nhar-se políticas públicas de integração
destes grupos, para que não olhem o terro-
rismo como meio para a obtenção, e con-
trolo, do poder. Esta dimensão toma o
carácter multidisciplinar, implicando coor-
denações de acções a nível multilateral e
multissectorial envolvendo o exército, polí-
cia, serviços de inteligência, antropólogos,
juristas e técnicos de resolução de conflitos
para pacificar e propor mecanismo alter-
nativos ao uso da força.
Notas e Referências Bibliográficas
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Wikileaks. Por A.P. Mavangira. The African Ren-
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(CENCOD), Ikeja, Nigeria. Lagos, Panaf Press.
Vol. 1, Nº 03, Ano II, Janeiro - Março de 2015
39
A Revista Científica do ISCTAC é um veículo informativo do Instituto Superior de Ciências e Tec-nologia Alberto Chipande – ISCTAC com tiragem trimestral que se destina a servir de foro livre para a apresentação e publicação de conhecimentos e ideias inovadoras sobre os diversos temas candentes da sociedade moçambicana e internacional, tendo em conta as linhas de pesquisa do ISCTAC e outras áreas afins. As opiniões expressas ou insinuadas nesta revista per-tencem aos seus respectivos autores e não representam, necessariamente, as do ISCTAC ou qualquer outro órgão da instituição. Os artigos que constam desta edição podem ser reprodu-zidos no todo ou em parte, para fins académicos, desde que a revista e o autor sejam citado como fonte.
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O Instituto Superior de Ciências e Tecnolo-
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ensino superior de Direito Privado, dotada
de autonomia financeira, pedagógica e admi-
nistrativa, juridicamente reconhecida pelo
Decreto 27/2009 e publicado no BR nº 32
série I de 12 de Agosto de 2009. Tem a sua
sede na Cidade da Beira - Sofala, Av. Correia
de Brito nº 952 , e Delegação na cidade de
Pemba e Maputo. O ISCTAC oferece cursos
de Licenciatura (1º ciclo) e Mestrados Inte-
grado (2º ciclo) nas seguintes áreas: Ciências
Jurídicas e Investigação Criminal, Ciências
Económicas, Ciências Políticas e Sociais,
Ciências de Saúde, Ciências Agrárias e Ciên-
cias Tecnológicas. Cada uma das áreas de
formação citadas acima é constituída por
uma estrutura bietápica, contemplando um
tronco comum onde durante 3 anos (1º
ciclo) se providência uma formação básica
em várias ciências, que culminará deste
modo com a obtenção do grau de Licenciatu-
ra. O 1º ciclo dá acesso imediato ao 2º ciclo
(mestrado integrado), onde durante (1,5 à 2
anos) se realiza o processo que culminará
com formação atribuindo o grau de Mestre.