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1 GT13 CONTROLE SOCIAL, SEGURANÇA PÚBLICA E DIREITOS HUMANOS O PARADOXO SOBRE AS POLÍTICAS DE METAS DA SEGURANÇA PÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ (2011-2013): O CASO DAS UPS'S EM CURITIBA Dr. Vladimir Luís de Oliveira/ NPSPP Núcleo de Pesquisa em Segurança Pública e Privada Universidade Tuiuti Curitiba/PR./ ESPC - Escola Superior da Polícia Civil.

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    GT13 CONTROLE SOCIAL, SEGURANA PBLICA E DIREITOS HUMANOS

    O PARADOXO SOBRE AS POLTICAS DE METAS DA SEGURANA PBLICA

    NO ESTADO DO PARAN (2011-2013): O CASO DAS UPS'S EM CURITIBA

    Dr. Vladimir Lus de Oliveira/ NPSPP Ncleo de Pesquisa em Segurana Pblica e Privada Universidade Tuiuti Curitiba/PR./ ESPC - Escola Superior da Polcia Civil.

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    O PARADOXO SOBRE AS POLTICAS DE METAS DA SEGURANA PBLICA

    NO ESTADO DO PARAN (2011-2013): O CASO DAS UPS'S EM CURITIBA

    Dr. Vladimir Lus de Oliveira1

    Resumo: Procura-se discutir neste artigo as estratgias e as contradies na Segurana Pblica do Estado do Paran na

    poltica de controle de Homicdios que redundou na criao das UPSs Unidades Paran Seguro no municpio de Curitiba. A nfase em modelos puramente repressivos serviu como guia em reas degradadas da cidade

    marcadas pela anomia e pelas fragilidades das polticas sociais. A discusso principal est na anlise dos

    resultados ao evidenciar um incremento dos homicdios em razo da constituio destas unidades criadas pela

    Polcia Militar do Estado do Paran, com pouco ou nenhum relacionamento com outras esferas da

    administrao pblica ou mesmo com a Polcia Civil e com efeitos observveis sobre desorganizao do espao

    social.

    Palavras-chave: homicdios, segurana pblica, UPS - Unidade Paran Seguro.

    Introduo:

    A questo da segurana pblica uma das discusses mais emblemticas do Estado

    moderno e que evidencia claramente sinais de crise ao se considerar s demandas da ps-

    modernidade.

    Na tica da sociedade, todos vivemos sob o imprio do medo e da insegurana. Do

    outro lado, a sociedade brasileira possui aparelhos repressivos de segurana pblica que no

    foram modernizados pelo esprito democrtico da Constituio de 1988. Dada a manuteno

    desta lgica, praticamente todos os dias, continuamente a presuno da inocncia colocada

    em risco, contradizendo o esprito cvico do Art. 5. desta mesma Carta Magna. Estas

    estruturas tm favorecido a corrupo, a violncia e a letalidade da polcia brasileira que

    pode ser considerada como uma das mais altas do mundo2.

    H duas polticas de segurana pblica que so referncia contnua na imprensa e na

    opinio pblica no Estado do Paran: a poltica de controle de letalidade de homicdios

    dolosos (calculados com base na abertura de inquritos policiais) e a criao das UPS's -

    1 Professor da ESPC - Escola Superior da Polcia Civil em Mapeamentos de cenrios e Sociologia da Violncia.

    Professor da NPSPP Ncleo de Pesquisa em Segurana Pblica e Privada Universidade Tuiuti Curitiba/PR.Historiador UFPR, Especialista em Polticas Pblicas IFPR, Mestre em Sociologia Poltica UFPR, Doutor em Histria UFPR, Ps-Doutor em Geografia das Representaes UFPR. E-mail: [email protected] 2 Segundo o ABSP Anurio Brasileiro de Segurana Pblica, as Polcias Estaduais Brasileiras mataram quatro vezes mais que as polcias americanas e duas vezes mais que as polcias venezuelanas. A morte de

    pessoas pela polcia maior no Brasil do que inclusive no Mxico e frica do Sul. Fonte: FBSP - Frum

    Brasileiro de Segurana Pblica

    Acesso em: Disponvel em: 23/09/2014.

    Acesso em: Disponvel

    em: 20/08/2014.

  • 3

    Unidade Paran Seguro presente em vrios municpios. Questiona-se o xito destas aes da

    Secretaria de Segurana Pblica sob uma poltica de reduo de homicdios alimentadas

    quase que exclusivamente por aes administrativas de policiamento, mais especificamente:

    at que ponto as UPS's se concretizaram numa ao estratgica da segurana pblica

    para a reduo de homicdios dolosos, num contexto em que se busca um modelo

    democrtico de segurana cidad?

    O foco da anlise foram os registros de homicdios dolosos em Curitiba nas reas das

    UPSs. A fonte definida para este estudo de caso partiu dos inquritos policiais abertos pela

    Polcia Civil e que foram registrados como homicdios dolosos (com a inteno ou

    assumindo o risco de matar). No Estado do Paran os inquritos passaram a ser cadastrados

    no SCOL Sistema de Controle de Ocorrncias com Letalidade, criado em 2011, alm do

    sistema SINESP/JC.

    No SCOL esto cadastradas todas as mortes violentas que geraram a abertura do

    inqurito policial e que foram tipificadas como homicdios dolosos luz do art. 18 (crime

    doloso) e art. 121 (homicdio) do Cdigo Penal Brasileiro3. Estes inquritos, portanto, em

    caso de xito na identificao de autoria e materialidade a partir das investigaes, estariam

    aptos para subsidiar a abertura da ao penal presidida pelo MP - Ministrio Pblico.

    Este artigo est dividido em trs sees: na primeira seo, intitulada reflexes

    tericas sobre a segurana pblica: a convergncia entre teorias criminais e o

    autoritarismo busca-se apresentar um esboo terico em torno das discusses sobre modelo

    criminolgico ambiental adotado pelas polcias, as polticas de metas segundo o paradigma

    do new management e como estas estratgias adaptaram-se s heranas autoritrias do

    sistema de polcia brasileiro, colaborando parcialmente para sua eficincia na busca de

    resultados. Na segunda seo, sob o ttulo O problema da segurana pblica: como

    decifrar o enigma procura-se evidenciar a hiptese norteadora do trabalho, ao apontar que

    a atividade policial repressiva, pode desorganizar ainda mais os espaos das regies

    perifricas abandonadas pelo Estado, favorecendo ainda mais a incidncia criminal. Na

    terceira parte A Segurana pblica deriva e a falta de planejamento e a inveno das

    UPSs, tenta recuperar parte das decises polticas que em termos discursivos defende o

    choque de gesto, mas que se esvazia pela falta de planejamento em termos prticos,

    3Decreto-Lei no 2.848, DE 7 de dezembro de 1940. Disponvel em:

    Acesso em: 05/10/2014.

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    configurando-se pela lgica do improviso em termos estratgicos: este foi o contexto da

    criao das UPSs. Ainda, com base nos inquritos de homicdios dolosos da Polcia Civil,

    avaliou-se os resultados destas unidades de policiamento mediante a aplicao de testes

    estatsticos sobre os registros de homicdios dolosos entre 2011 e 2013 nos territrios das

    UPSs.

    Nas consideraes finais, procura-se fazer um balano destes modelos que se

    converteram num paradigma tipo exportao, mas que apresenta pouca efetividade, mas

    atua positivamente como marketing poltico na formao da opinio pblica e no mercado

    eleitoral.

    1) Reflexes tericas sobre a segurana pblica: a convergncia entre teorias

    criminais e o autoritarismo

    No quadro democracias modernas, somente em perodos de guerra as polcias

    tornam-se auxiliares das foras armadas (ZAVERUCHA 2005, p. 68-79). A herana

    Republicana brasileira, porm, vivenciou a maior parte de sua histria sob a tutela de

    governos militares, o modelo de polcia no se alterou significativamente e ainda mantem o

    modelo repressivo do Estado Novo e do Regime Militar (1964-1985).

    Nos governos estaduais h duas corporaes em que cada uma assume uma parte do

    ciclo de polcia: uma polcia ostensiva militar e uma polcia judiciria burocratizada. Desde

    o PNSP - Plano Nacional de Segurana Pblica de 2002 do Governo Lula vem se sugerindo

    aes de integrao entre as polcias e medidas administrativas colaborativas por intermdio

    de polticas de metas e de atuao conjunta atravs da constituio de AISP - reas

    Integradas de Segurana Pblica.

    O que vem prevalecendo desde a criao da SENASP/MJ - Secretaria Nacional de

    Segurana Pblica (Decreto 2.315/97) durante o Governo de FHC (1994-2002) so aes

    articuladas de colaborao entre as corporaes sem alterar o paradigma repressivo alheios

    a modelos de preveno.

    As polticas de gesto das polcias so continuamente objeto de preocupao pelo

    Governo Federal que procura aprimorar tecnicamente a construo de indicadores criminais

    para os Estados e municpios, e assim monitor-los atravs do Ministrio da Justia.

    Em termos polticos o Governo Lula-Dilma (PT), apresentou mais continuidade do que

    ruptura com o Governo de FHC (PSDB). As parcerias entre Unio, Estados e municpios

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    apenas reforam estratgias de polticas tradicionais de policiamento, retroalimentadas e

    reatualizadas com novas tecnologias e indicadores de ocorrncias policiais.

    Os cursos de Anlise criminal se difundiram entre as polcias brasileiras, ganhando

    notoriedade entre as polcias civis, militares e guardas municipais. A matriz epistemolgica

    e a formao doutrinria seguem a concepo norte-americana da Escola de Chicago

    assentada na criminologia ambiental. A referncia que se tornou senso comum nestes

    cursos modelo repressivo "Broken Windows" que inspirou o projeto Tolerncia Zero na

    cidade de Nova York durante a gesto do Prefeito Giuliani na dcada de 90.

    Este modelo ganha fora na opinio pblica quando as pessoas no acreditam haver

    sada para um quadro desalentador da criminalidade. Uma pesquisa promovida pela CNT -

    Confederao Nacional de Transportes, por exemplo, em pesquisa de opinio em agosto de

    2014, em torno de 80,8% dos entrevistados acreditam que a Segurana pblica ficar igual

    ou pior para os seis prximos meses (CNT/MDA Ago/2011).

    A mdia tem exercido um grande papel na disseminao da violncia orientando a

    opinio pblica para a sensao do medo. Pesquisas em outros pases Sucia, frica do Sul

    e EUA vem mostrando problemas semelhantes ao evidenciar a influncia da mdia na

    potencializao do medo e da insegurana (ADORNO; LAMIN, 2008, p. 166). De acordo

    com Bauman (2009, p. 37-43) as cidades que outrora foram criadas para gerar segurana aos

    cidados, hoje esto associadas cada vez mais ao perigo, a necessidade a sistemas de

    segurana e a vigilncia crescente aos locais pblicos. O medo levou a desintegrao da vida

    comunitria e a mixofobia (medo de misturar-se). Afinal de contas, o senso comum

    maniquesta, sendo que o controle da criminalidade visto como uma ao blica da luta do

    bem contra o mal (BELI, 2004, p. 33).

    A panaceia para resolver os problemas da segurana pblica tem se concentrado cada

    vez mais na adoo de medidas etiolgicas, inspirado pelo programa "Tolerncia Zero" cuja

    estratgia estaria na reconquista dos espaos pblicos contra delinquentes reais ou

    imaginrios, mendigos, pobres e sem-tetos (BELI, 2004, p. 61; WACQUANT, 2011, p. 38-

    47). Num contexto de desesperana e medo, tal modelo se converteu num paradigma global

    na luta contra o crime.

    Desde ento, a criminologia ambiental, alicerado na Teoria da Escolha Racional,

    passou a se constituir num modelo global para as polcias modernas. O Brasil ao ser

    impactado por este paradigma, possibilitou a emergncia de um novo mercado em

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    tecnologias de Gesto e de monitoramento dos espaos pblicos. O crescente medo da

    violncia e a busca de solues rpidas via mercado, atropelou toda agenda pblica que

    visasse discutir novos modelos de polcia e de segurana pblica em uma sociedade

    democrtica.

    A criminologia ambiental parte do princpio que todo ser humano racional e que,

    portanto, toda ao humana baseada num princpio hedonista, baseado em clculos meios

    e fins. Portanto, convencionou-se afirmar que a rapidez e a severidade da punio seriam as

    garantias da reduo das pulses humanas frente s prticas delitivas. Da a necessidade da

    aplicao de tcnicas de neutralizao para impedir as prticas do crime (CLARKE, 1997).

    Acredita-se que, por meio da estatstica espacial possvel se antecipar e prever aes

    criminosas e enfim preveni-las atravs de atividades de policiamento. Estas so ferramentas

    bsicas da Teoria da atividade de rotina que est mais centrada no modus operandi do crime

    do que no criminoso (COHEN; FELSON, 1993).

    As atividades de policiamento no Brasil no seguiam e ainda no seguem, salvo

    rarssimas excees, a uma estratgia tcnico-operacional orientado por um planejamento.

    Mediante as ferramentas de novas tecnologias, tem-se procurado substituir estas atividades

    aleatrias de policiamento por medidas estratgicas preditivas no controle do delito. Este

    corolrio, porm, no alterou significativamente a presena do Estado nos bairros pobres das

    grandes cidades, reduzidos a aes repressivas da polcia.

    Em termos de segurana pblica, as UPSs seguem a tradio de uma estrutura

    burocrtica inspirada na DSN - Doutrina de Segurana Nacional. Figueiredo (2005, p. 131-

    193) assinalou que o SNI controlava o DOI - Destacamento de Operaes e Informaes e

    o CODI - Centro de Operaes de Defesa Interna. Os primeiros cuidavam de operaes anti-

    subverso, podendo prender, torturar e matar, j os segundos, seriam centros de

    planejamento e coordenao, com assento no SNI e nos servios secretos das foras armadas.

    Embora estas estruturas j no mais existam, a crise do sistema de segurana pblica do

    Brasil decorre da presena desta herana ideolgica e autoritria. Precisa-se conceber um

    novo policiamento para uma sociedade democrtica, em substituio ao atual modelo em

    que as foras de segurana estariam organizadas para uma poltica de Estado autoritrio.

    Raws (2002, p. 4) tivera sensibilidade ao perceber que leis e instituies, por mais eficientes

    e organizadas que possam se apresentar, devem ser reformadas ou abolidas se forem injustas.

  • 7

    Na Europa e nos EUA, a emergncia do Estado penal conservador tem elevado a

    populao carcerria dos pobres e excludos socialmente. No Brasil, a populao carcerria

    tem crescido significativamente, sem grandes efeitos sobre a queda dos indicadores

    criminais. A taxa de encarceramento no sistema penitencirio, segundo o DEPEN/MJ,

    cresceu 9% entre 2011-2012 ao passar de 471.254 para 515.482 detentos. Esta poltica de

    encarceramento tem refletido no dficit de 211 mil vagas em 2012. Parte desta demanda

    corrigida artificialmente por meio do encarceramento precarizado nas delegacias das polcias

    civis brasileiras. Neste corrente ano foram identificados 34.304 presos que cumprem penas

    nestas dependncias (DEPEN/MJ, 2013).

    As prticas de policializao e represso cada vez mais militarizadas (estratgia

    presente em todas as foras de segurana) imprimem a ampliao da discricionariedade no

    processo de criminalizao da sociedade. A criao de leis cada vez mais draconianas4, em

    contramo aos princpios da era dos Direitos defendida por Bobbio (2004), encontrou no

    binmio criminologia ambiental X represso policial a validade cientfica para a defesa da

    civilidade e das pessoas de bem.

    So estratgicas as concluses de Wacquant (2007, 2011) que enfatiza a criminalizao

    dos excludos, e de Garland (2008) que se dedica a anlise do fortalecimento da cultura do

    controle, mediante aes mais retributivas do que restaurativas das penalizaes em meio

    crise poltica do Welfare State, dada a emergncia das ideologias neoliberais.

    No menos importante, so as concluses de Zaffaroni em sua crtica ao sistema de

    justia criminal na Amrica Latina, dado ao seu grande teor discricionrio e seletivo na

    aplicao das penas. (SILVEIRA; SANCHES, 2012).

    Os sistemas policial e penal no Brasil so orientados para controle dos riscos e

    desordem, alheio aos princpios democrticos dado ao seu carter militarista e burocrtico-

    autoritrio. Por outro lado, os sistemas prisionais no Brasil vm evidenciando as dificuldades

    4 O Jurista Luiz Flvio Gomes discute a falcia da reforma penal conduzida pelo Ministrio da Justia no Brasil

    em 2013, alcunhando-a de populista-autoritria. O MJ, sob a gesto de Jos Eduardo Cardozo (PT-SP) no

    aceitara as sugestes de juristas que apontavam a necessidade da despenalizao e reduo das penas para

    crimes de pequeno potencial. Segundo o mesmo autor, as leis penais foram reformadas 150 vezes no Brasil

    entre 1940-1913, sendo que 72% das vezes adotou-se o rigorismo penal. A consequncia foi um crescimento

    da populao carcerria em 508% entre 1990-2012. Disponvel em:

    Acesso em: 04/10/2014. Uma crtica igualmente importante sobre a reforma apareceu numa palestra do Prof.

    Juarez Cirino dos Santos no EMERJ Escola da magistratura do Rio de Janeiro intitulada A ideologia da reforma penal e publicada na revista EMERJ n. 60. Disponvel em: Acesso em:

    04/10/2014.

  • 8

    em se adotar medidas cautelares que inibam ou desestimulem a violncia dentro e fora das

    prises5.

    2) O problema da segurana pblica: como decifrar o enigma

    As polticas pblicas de segurana pblica nas UF's recaem predominantemente

    sobre duas corporaes: as Polcias Civis, que tm funo investigativa e que possui prticas

    cartoriais e as Polcias Militares, que tem a misso preventiva e repressiva. Esta possui uma

    estrutura militar e possui uma legislao prpria, orientada pelo RDE - Regime Disciplinar

    do Exrcito.

    Na polcia civil, os elementos autoritrios no so menores. Uma polcia

    burocratizada, autoritria e baseada em prticas cartoriais sob os auspcios dos delegados de

    polcia que presidem os inquritos policiais.

    O inqurito no se confunde com investigao e uma pea inteiramente inquisitorial e

    no possui o princpio do contraditrio. Baseia-se quase inteiramente em depoimentos e no

    processo de indiciamento dos suspeitos. Quem faz a denncia o MP - Ministrio Pblico.

    Quando as provas no so suficientes, o MP reenvia o inqurito novamente para as

    delegacias para a tomada de novas oitivas, estabelecendo-se novos prazos para o relatrio

    final desta pea administrativa. Sua ambivalncia leva ao um fenmeno de "pingue-pongue"

    podendo-se passar meses ou anos at que se decida pelo seu arquivamento (MISSE, 2010,

    p. 9-18).

    Nenhuma das polcias possui ciclo completo e esto subordinadas a seus respectivos

    comandos. Esta complexa diviso do trabalho de difcil grau de colaborao, marcado pelas

    tentativas incuas de planos estaduais e da Unio que buscam estabelecer integrao e

    parcerias entre as polcias. Mas o que se v so quase sempre situaes cada vez mais

    individualizadas, descontnuas e sobrepostas entre as organizaes de segurana, que

    concorrem cada vez mais em disputas que envolvem projees polticas e distribuio de

    recursos pblicos.

    5 O agravo e a desumanizao do sistema de justia criminal no Brasil ganharam um novo captulo com a

    organizao do crime. Hoje observa-se a organizao de faces criminosas nas prises brasileiras, que

    procuram sistematizar atividades criminosas dentro e fora das prises. ADORNO, Srgio; SALLA, Fernando.

    Criminalidade organizada nas prises e os ataques do PCC. Estudos Avanados, So Paulo , v. 21, n.

    61, Dec. 2007. Disponvel em: . Acesso

    em: 24/09/2014.

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  • 9

    Ambas as polcias so autoritrias em suas gestes e nas suas relaes com seus

    quadros e com a sociedade. Este perfil ideolgico pouco afeto democracia, tem

    influenciado e orientado as polticas estaduais de segurana pblica para modelos

    predominantemente repressivos (alheio represso ttica qualificada) e em detrimento de

    aes preventivas, e desarticuladas das polticas intersetoriais de proteo e de incluso

    social6.

    Como consequncia destes modelos arcaicos de polcia, a represso tem se tornado a

    tnica predominante sobre a juventude j estigmatizada por sua condio social, geogrfica

    e racial, que vive nas periferias dos grandes centros urbanos. A estratgia repressiva, segundo

    Moraes (2006) segue uma lgica extremamente autoritria baseada na militarizao da

    polcia e na policializao da sociedade.

    H que se considerar, todavia, que as relaes de violncia nas regies perifricas

    no so produzidas de forma exclusiva pelas polcias. No raras vezes, a interveno policial

    se faz pela prpria exigncia das comunidades imersas que esto numa rede de violncias,

    que redundam por aes de conflito direto entre as partes sem a mediao do sistema de

    justia criminal. Dados preliminares de estudos de vitimizao em Curitiba-PR, alertam que

    apenas 12,5% das vtimas de crime sexual, 20% de agresso fsica, 32% dos furtos e 41% de

    roubos so noticiados s polcias.7 A presena da Polcia Militar, neste sentido, em reas

    especficas tende em aumentar os registros de crimes patrimoniais, dada alta subnotificao

    e a desconfiana que as populaes marginalizadas sentem em relao polcia.

    Uma das consequncias mais imediatas foi a colocao em xeque da mxima que

    sustenta quanto maior o nmero de policiais menores so os indicadores criminais. Esta

    premissa fora questionada com reticncia por Claudio Beato ao afirmar que no haveria

    evidncias cientficas que pudessem dar sustentabilidade a esta ideia. A greve de polcias

    poderia at aumentar crimes patrimoniais como em Helsinque em 1944, e pela ocupao

    6 O Projeto Paran Seguro afirma que as instalaes das UPSs foram orientadas pela anlise de Inteligncia Policial, ao identificar as reas com alta letalidade e trfico de drogas. Tambm afirma que a ao subsequente

    criao destas unidades seria a oferta de servios pblicos, ao estas que no ocorreram a no ser

    excepcionalmente, e no em razo do projeto da polcia. O mesmo questionamento pode ser aplicado ao sistema

    de inteligncia sobre a criao das UPSs, ao se comparar as concentraes de homicdios em Curitiba, como ser demonstrado ao longo deste trabalho. O Projeto AIDC pode ser resumido mais como uma carta de

    intenes. Fonte: Aes Integradas de Desenvolvimento e Cidadania nas Unidades Paran Seguro. Disponvel

    em: Acesso em: 05/10/2014. 7 Relatrio da Pesquisa de Vitimizao na cidade de Curitiba. CRISP/SESP-PR: Curitiba, Agosto/2006.

  • 10

    nazista em Copenhagen (BEATO FILHO, 1999, p. 9). Estes exemplos, porm, seriam casos

    excepcionais decorrentes de um quadro de profunda anomia social.

    H tambm, as teses da criminologia crtica. Para Juarez Cirino dos Santos quanto

    maior a represso maior sero os crimes, cuja consequncia uma maior reincidncia

    criminal decorrente da ao discricionria da polcia (SANTOS, 2012).

    A hiptese sugerida neste trabalho varia sensivelmente dos trabalhos anteriores. Ela

    sustenta que estratgias repressivas, podem ampliar a criminalidade na medida em que

    promovem a desorganizao do espao social. Com efeito, a interveno em reas anmicas

    mediante o estabelecimento de territorialidades de controle pela Polcia, pode elevar ainda

    mais o nmero de homicdios.

    No se pode afirmar que a letalidade aumenta em razo das mortes promovidas pela

    polcia. Isto exigiria uma pesquisa muito mais exaustiva de investigao em torno dos

    inquritos policiais: um trabalho incuo pois sabe-se que a Delegacia de Homicdios no

    consegue identificar nem 10% da autoria destes delitos no primeiro ano em que estes eventos

    ocorreram8. O foco aqui mais especfico. Afirma-se que polticas pblicas militarizadas e

    puramente repressivas desorganizam o espao, produzindo conflitos com a polcia ou no,

    mas, sobretudo, em razo da sua presena orientada para a atividade belicosa.

    Em termos gerais, a presena da polcia mediante aes repressivas sem a mediao

    de outras formas de interveno orientadas para a pacificao, pode estimular ainda mais os

    conflitos entre delinquentes e a polcia, aumentando a violncia e a letalidade. Pode ainda

    acirrar conflitos ou colaborao entre diferentes grupos delinquentes, ou mesmo ainda,

    estimular a violncia dos delinquentes sobre potenciais vtimas. Todos estes efeitos tm

    como consequncia a elevao do nmero de mortes violentas9.

    8 Foi o balano preliminar da DH Delegacia de Homicdios Curitiba relativo aos homicdios em que foram identificados a autoria. Em Minas Gerais, apenas 15% das ocorrncias de homicdios foram encaminhados

    Justia. (MISSE,2010, p.128). Segundo o CNMP Conselho Nacional de Ministrio Pblico apenas 20% dos inquritos converteram-se em Ao Penal. Como o programa Meta 2 do ENASP Estratgia Nacional de Justia e Segurana Pblica, promovido pelo Ministrio da Justia, este nmero melhorou sensivelmente. Em

    2009, os inquritos que se converteram em ao penal no Brasil foram de 37%. No entanto, extremamente

    baixo ao se comparar com os dados internacionais Este percentual de 65% nos Estados Unidos, no Reino

    Unido de 90% e na Frana de 80%. Disponvel em:

    Acesso em: 05/10/2014. 9 Dos 531 homicdios dolosos registrados em Curitiba em 2013, dentre os fatores dominantes estariam: 51,41%

    resultou de conflito com drogas, 14,31% rixa e 11,49% por motivo de vingana. Fonte: SCOL/SESP-PR. A

    morte de policiais outro legado das atividades de represso. A taxa no Brasil de 143,3 mortes por 100 mil

    habitantes entre 2010-2012 entre policiais militares. A taxa de policiais civis de 60,64 mortes por 100 mil

    habitantes. So diversos fatores que alimentam estas taxas: treinamento para o confronto, embate com gangues

    e delinquentes armados, condies dos armamentos e estratgias inadequadas para a ao (ABSP, 2013).

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  • 11

    As UPSs orientaram-se pelo novo gerencialismo policial, que encontrou espaos de

    legitimao na criminologia administrativa/ambiental e tambm na difuso da cultura do

    management10 associado ao modelo repressivo.

    H uma srie de utopias do Estado Penal que alimentam este projeto: uma leitura

    seletiva da filosofia beccariana sustenta que a certeza da punio que garante a preveno

    dos delitos (BECCARIA, 2003, p. 78) ideologia penal conservadora, marcada pelo carter

    defensivista-periculosista. Esta viso, que senso comum entre os operadores do direito e

    entre os operadores de segurana pblica, glorificam a funo normativa das prises

    (ANDRADE 2012, 43 min 53%). Como consequncia, as representaes do sistema penal

    converteram as utopias de segurana em distopias da represso, em plena contraposio ao

    esprito da ps-modernidade, ancorado na liberdade e autodeterminao.

    No cabe negar a necessidade de uma gesto mais profissional na esfera da segurana

    pblica, at porque as carncias so visveis neste segmento, mas, o questionamento pode se

    colocar sobre a forma em que se apresentam como um substitutivo ad hoc participao e

    controle social das policiais pela sociedade civil. Esta a chave da proposta de modernizao

    conservadora ps-regime militar.

    A tentativa de explicar este fenmeno da criminalidade na periferia de grandes

    centros urbanos j foi objeto de intenso debate na criminologia. Sutherland (1883-1950),

    socilogo da escola de Chicago, ao conceber a teoria da organizao social diferenciada

    (ANITUA, p. 491) observa que nos bairros violentos dominado por gangs juvenis, longe de

    no haver regras, havia regras especficas que davam o tom da subcultura da violncia.

    A presena da polcia pode ensejar a disputa territorial por novos espaos entre os

    delinquentes e pode em alguns casos deslocar acerto de drogas de usurios endividados

    para reas circunvizinhas que possuem menor vigilncia.

    10 Nas dcadas de 80 e 90 emergiram diversos modelos gerenciais do setor privado que buscavam influenciar

    a gesto da administrao pblica. Dentre seus elementos mais significativos, destacam-se: a crtica s

    organizaes burocrticas, a valorizao da cultura do management e, a converso de tcnicas e prticas da

    administrao em modismos gerenciais. (PAULA, 2011, p. 53-54)

  • 12

    3) A segurana pblica deriva e a falta de planejamento e a inveno das UPSS

    Desde que o PSDB assumiu o governo do Estado do Paran em 2011 at o fim do

    primeiro mandato, apesar dos discursos sobre choque de gesto11, manteve a tradio de

    coalizes partidrias anteriores e tambm no se preocupou com a elaborao formal de um

    planejamento estratgico da segurana pblica. O mximo de interveno no campo do

    planejamento foi a elaborao do PPA em 2012-201512. Nele aparece a inteno de reduzir

    os homicdios do Estado. O parmetro adotado foi a mdia de homicdios dolosos dos

    Estados do Sul. Valor arbitrado sem grande preciso tcnica, pois desconsiderou as diferenas

    das realidades regionais sobre os dados de homicdios.

    A completa ausncia do planejamento, a lgica do improviso e a falta de uma

    epistemologia criminolgica crtica que possibilitasse nortear o debate sobre a violncia, tem

    reforado diferentes esferas governamentais, seja em termos nacionais, regionais ou

    municipais, a propostas de senso comum sobre a conteno da violncia.

    A criao da UPS Unidade Paran Seguro foi um projeto tardio concebido pelo

    comando da Polcia Militar, com uma tentativa de resposta em reduzir homicdios em meio

    ao vazio de proposies para este objetivo. No tem por base as diretrizes estratgicas da

    SESP-PR e muito menos as orientaes do PPA (2012-2015). A concepo de UPS sequer

    aparece no Plano Plurianual do Governo do Estado do Paran. A ausncia de direo clara

    na Secretaria ficou configurada no quadro de sucesses da pasta que, num perodo de menos

    de 4 anos, experimentou a gesto de trs secretrios distintos com pouca ou nenhuma

    experincia sobre a segurana pblica estadual. Na ausncia de projetos organizados e

    consistentes, sob o comando Cel. Roberson Luiz Bondaruk - PMPR, foi concebido o projeto

    Nereu13 que deu origem s UPSs. Buscava-se atravs da criao destas unidades alguma

    11 A ideia de Gesto Pblica para Resultados ou choque de gesto est recorrentemente presente nas administraes do PSDB Partido da Social Democracia Brasileira, sendo o marketing do partido. Estas terminologias encontram-se recorrentemente no plano Metas de Governo (2011-2014) do ento candidato ao Governo do Estado em 2010 Beto Richa. 12 O Plano Plurianual do Estado do Paran (2012-2015) apresenta oficialmente o programa Paran Seguro, responsabilizando as Polcia Civil e Militar para a reduo de homicdios. A taxa dos homicdios dolosos no

    Estado do Paran em 2010 era de 30,4 hom./100.000 hab. A meta estaria em reduzi-la para 21,5 hom./100.000

    hab at 2015. O critrio utilizado no foram programas especficos para a reduo dos crimes violentos, mas

    sim uma mdia matemtica com base nos dados dos Estados da Regio Sul do Brasil (PR-SC-RS) cuja taxa

    estaria em 20,4 hom./100 mil hab.. Para maiores detalhes, consultar : PARAN. Acompanhamento do Plano

    Plurianual (2012-2015). SEPLAN-PR - Programa Paran Seguro PROGRAMA-13. p. 131. Disponvel em: Acesso em: 01/10/2014. 13 O Projeto Nereu nasceu da ideia da criao de territrios de pacificao similares ao menos em parte a

    experincia das UPPs nas favelas cariocas. Segundo uma lenda reproduzida continuamente dentro da

  • 13

    notoriedade poltica tmida presena do Estado em termos de inovao na Segurana

    Pblica.

    Aes de integrao e participao com outras esferas da administrao no foram

    concebidas sistematicamente e exerceram funes residuais, apresentando-se apenas nas

    inauguraes das unidades. O contexto poltico da criao das UPSs foi elaborado em meio

    a uma acirrada disputa eleitoral municipal em Curitiba, em que aes desta envergadura,

    espelhadas modelo de UPP14 Unidade de Polcia Pacificadora do Rio de Janeiro, que

    devido a notabilizao adquirida na imprensa brasileira, foi exportado para vrias UFs

    Unidades da Federao incluindo-se o Estado do Paran.

    Ao total foram criadas dez UPS's em Curitiba: UPS Uberaba, UPS Caiu, UPS

    Ludovica, UPS NSL - Nossa Senhora da Luz, UPS Osternack, UPS Parolin, UPS Sabar,

    UPS Trindade, UPS V. Sandra e UPS V. Verde. A diviso e as dimenses territoriais foram

    arbitradas politicamente. No seguiram, a rigor, nenhuma metodologia de distribuio

    criminal em reas mais vulnerveis. Mesmo as que foram criadas em bairros mais violentos,

    os postos foram implantados em permetros menos problemticos. Algumas UPSs foram

    criadas nas divisas entre bairros adjacentes, e em outros casos, foram criadas mais de uma

    unidade por bairro.

    Quando se observa as manchas criminais de homicdios, fica claro a escolha poltica

    dos territrios. Algumas reas sequer estavam entre as mais vulnerveis: das dez Unidades

    apenas quatro das reas acertadamente estavam entre as mais vulnerveis podemos apontar

    para as UPSs do Parolin, Trindade, Ludovica, Vila Verde e Caiu. Os mapas a seguir

    confirmam esta assertiva:

    corporao da PMPR, o nome deveria ser Prometeu pois havia a metfora da ideia de trazer o fogo sagrado dos deuses aos homens o que lhe dera o poder da inteligncia e da razo. BRANDO (p. 174-178). Nereu, no entanto, era um deus secundrio, retratado como um velho homem metamorfo, meio homem meio peixe e

    que vivia no fundo do Mar Egeu. Sua habilidade estava em seus poderes profticos, metfora que no se encaixa

    bem ao se falar em poltica pblicas de segurana. Fonte: Disponvel em:

    Acesso em: 01/10/2014. 14 Diversas anlises crticas vem evidenciando o rpido esgotamento das UPPs aps passado meu momento de euforia e aprovao pblica. Ficou cada vez mais evidente e sua clara transformao em aparatos de controle

    das populaes residentes nas favelas do Rio de Janeiro, o controle das classes perigosas. Ver: (CARVALHO, 2013; FLEURY, 2012).

  • 14

    MAPAS 1 E 2: REGISTROS DE HOMICDIOS NAS UPSS EM CURITIBA 2011

    Fonte: Elaborado pelo autor

    Fonte 2: SCOL/SESP-PR- Sistema de Controle de Ocorrncias com Letalidade

    Nota: As fontes para a anlise estatstica foram o sistema SCOL - Sistema de Controle de Ocorrncias com

    Letalidade que gerenciada pela CAPE/SESP-PR, cadastro criado para a Polcia Civil em que se contabilizam

    todos os inquritos policiais de mortes violentas do Estado do Paran. Para a produo de mapas temticos

    com bases nos registros criminais foi utilizado o software ArcView 10.3.

    A produo do mapa esquerda foi efetuada pela tcnica de Kernel considerando-se

    uma projeo de 700 m do epicentro das ocorrncias. O mapa direita foi efetuado por

    pontos e visa identificar in loco cada uma das ocorrncias individualmente registradas

    pelas polcias. Estes mapas foram produzidos considerando-se os homicdios dolosos que

    ocorreram dentro e fora dos polgonos das UPSs. Os crculos em vermelho apontam as reas

    em que as UPSs seguiram o diagnstico da SESP-PR. As reas inseridas nos retngulos

    apesar do grande nmero de ocorrncias, situado nos bairros da Fazendinha, Novo Mundo,

    Pinherinho, Alto Boqueiro e Stio Cercado ficaram desassistidos pelo programa.

    Independentemente da crtica ao programa devido ao seu aspecto conservador, o que se

    procura apontar aqui so os vcios do programa devido sua autonomia poltica frente aos

    diagnsticos que apontam a concentrao da distribuio territorial dos homicdios.

    Procurando-se se afastar do impacto inicial do programa, optou-se por avaliar as dez

    UPSs um ano aps a sua implantao, que ocorreram entre maro a outubro de 2012. O ano

  • 15

    de 2012, portanto, foi desclassificado porque as UPSs foram implantadas em perodos

    distintos nos bairros de Curitiba.

    Para fins de comparao, portanto, foram selecionados os anos de 2011 e 2013. O

    ano de 2011 corresponde aos registros de ocorrncias de homicdios um ano antes da

    implantao do Projeto Nereu. Normalmente a criao do programa tem um impacto

    considervel nos trs primeiros meses, voltando a condio de estabilidade ou a retomada

    dos registros criminais passada esta fase inicial. O ano de 2013 tem a vantagem de ser um

    ponto da anlise do programa no momento frio. Passada a euforia inicial, reflete o

    momento de estabilidade aps o impacto do programa e que, portanto, h uma expectativa

    de variao menor nos registros criminais.

    MAPAS 3 E 4: REGISTROS DE HOMICDIOS NAS UPSS EM CURITIBA 2013

    Fonte: Elaborado pelo autor

    Fonte 2: SCOL/SESP-PR- Sistema de Controle de Ocorrncias com Letalidade.

    UPS Trindade: em 2011 a mancha criminal era acentuadamente menor. Em 2013 ela

    cobriu boa parte do territrio da UPS.

    UPS Uberaba: comparando-se os mapas de 2011-2013 percebe-se que no havia

    formao de uma mancha de registros de homicdios dentro do territrio, embora houvesse

  • 16

    nas adjacncias, no interior do Bairro do Uberaba. Em 2013 a mancha deslocou-se para

    dentro do territrio de pacificao.

    UPS Parolin: havia uma pequena mancha a noroeste da respectiva UPS. Com a

    presena da Unidade, a macha deslocou-se para fora da UPS, na divisa dos bairros Rebouas

    e Jardim Botnico, de forma mais intensa do que havia antes da presena da UPS.

    UPS Ludovica: na anlise comparada entre 2011-2013 observou-se que no houve

    interferncia na migrao criminal dos homicdios. No entanto, a mancha ficou mais intensa,

    o que evidencia um aumento dos registros criminais nas proximidades setor. Isto fica claro

    ao se comparar os mapas de homicdios por ponto entre os anos de 2011-2013 na divisa com

    a respectiva UPS.

    UPS Vila Verde: Havia uma forte mancha criminal neste territrio em 2011. Em 2013

    no se formou uma mancha criminal (hot spot) no setor e nem houve sinais de deslocamento

    dos homicdios para outras reas.

    As manchas criminais de homicdios presente nos bairros Stio Cercado, Alto

    Boqueiro e Pinheirinho foram suavizadas. No entanto, estavam fora da rea da cobertura

    da UPS Osternack e, portanto, no h indcios qualquer desta unidade na reduo dos delitos

    em outros bairros.

    Alm das manchas criminais aplicou-se um teste estatstico visando medir a variao

    dos registros em cada uma das 10 UPSs. A Estatstica dos homicdios dolosos nas UPSs

    aplicou um Tratamento dos dados atravs da Estatstica no-paramtrica utilizando-se Teste

    U de Mann-Whitney. Para aplicao da tcnica na anlise comparada entre 2011-2013

    considerou-se as seguintes hipteses:

    H0: A criao de UPSs controlaram satisfatoriamente os homicdios dolosos em

    2013.

    H1: a criao de UPSs perderam o controle dos homicdios dolosos em 2013.

  • 17

    QUADRO 2 - APLICAO DO TESTE U DE MANN-WHITNEY EM DADOS DE

    HOMICDIOS DOLOSOS NAS UPSs EM CURITIBA (2011-2013)

    U-valor crtico (tabelado) =26

    P-Value=0,02574

    SE U

  • 18

    gerais, a SESP-PR afirma que vem conseguindo controlar os homicdios atravs da

    imposio de uma poltica de metas15. O fato que no houve grandes inovaes em termos

    de atividade operacional nas polcias civis e militares, exceto pela criao da UPSs e mais

    tardiamente, foi criado a Diviso de Homicdios em substituio a delegacia de Homicdios.

    Estas iniciativas podem ser consideradas paliativas porque reafirmam uma misso para as

    polcias que est para alm de suas capacidades que j so limitadas: o de conter a

    criminalidade com uma presena mais repressiva. A poltica da polcia vem apenas

    reforando seus mitos, pressionados pelos meios de comunicao que exigem respostas

    rpidas para problemas de soluo de longo curso.

    As polticas de metas e tecnologias de monitoramento tm uma importncia relativa.

    Ainda que subsidiem as polcias no entendimento e na interveno do fenmeno criminal,

    isoladamente no permitem reduzir a criminalidade. E, de outro lado, dissimulam uma

    discusso mais profunda com a sociedade civil sobre a necessidade de reformas das polcias

    e do sistema de justia criminal.

    Esta concepo setorializada da administrao pblica na segurana que se alimenta

    da cultura do medo, no apenas eleva os gastos com segurana, como desestimula uma

    leitura sistmica dos problemas sociais do nosso tempo.

    Referncias:

    1) ADORNO, Srgio. (et.al.). Segurana pblica e violncia. So Paulo: Contexto, 2008.

    2) ANDRADE, Vera Regina Pereira de. Pelas mos da criminologia: o controle penal para

    alm da desiluso. Rio de Janeiro: Revan/ICC, 2012.

    3) ANITUA, Gabriel Ignacio. Histrias dos pensamentos criminolgicos. Rio de Janeiro:

    REVAN/Instituto Carioca de Criminologia, 2008.

    4) BAUMAN, Zigmunt. Confiana e medo na cidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2009.

    15Segundo a poltica de metas o Governo do Estado do Paran estaria havendo uma queda contnua nos registros

    de homicdios dolosos a partir dos registros de inquritos policiais. A variao nos dados do sistema

    DATASUS no pde ser confirmada porque no esto disponveis para 2013. A variao da taxa de homicdios

    passou de 30,66 hom./100.000 em 2011 para 31,65 em 2012. Os dados da SESP-PR tambm indicaram uma

    variao positiva de 28,40 hom./100.000 para 28,64 hom./100.000 entre 2011 e 2012. O marketing da reduo

    dos homicdios aparece em 2013, ao apresentar uma taxa de 23,33 hom./100.000. A meta estabelecida para a

    reduo seria de 24,33 hom./100.000. FONTES: 1) WAISELWICZ (2014). Disponvel em:

    Acesso em: 05/10/2014. 2) CAPE/SESP-PR. Disponvel em:

    Acesso em: 05/10/2014. Obs.: as taxas foram construdas pelo autor com base na projeo populacional do

    IPARDES a partir dos dados do CENSO do IBGE de 2010.

  • 19

    5) BEATO FILHO, Cludio. Polticas pblicas de segurana e a questo social. So Paulo

    em Perspectiva, So Paulo, v 13, n 4, 1999. Disponvel em: Acesso em: 29/09/2014.

    6) BELLI, Benoni. Tolerncia Zero e a democracia no Brasil: vises da segurana

    pblica na dcada de 90. So Paulo: Perspectiva, 2004.

    7) BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Elsvier/Campus, 2004.

    8) BRANDO, Junito de Souza. Mitologia Grega. v. I-II-III. Petrpolis: Vozes, 2009.

    9) BRASIL. ENASP - Estratgia Nacional de Segurana Pblica. Meta 2: A impunidade

    como alvo - Diagnstico da investigao de homicdios no Brasil, Braslia: CNMP, 2012.

    10) BRASIL. Ministrio da Justia. Anurio Brasileiro de Segurana Pblica. So Paulo:

    Frum Brasileiro de Segurana Pblica, 2013.

    11) CNT/MDA Confederao Nacional do Transporte. Relatrio Sntese: Pesquisa

    CNT/MDA. Rodada 119. Perodo: 08/08/2014-14/08/2014.

    12) CARVALHO, Monique Batista. A poltica de pacificao de favelas e as contradies

    para a produo de uma cidade segura. In: O Social em Questo. Rio de Janeiro: PUC-RJ,

    Ano XVI - n 29 2013. Disponvel em: Acesso em: 01/10/2014.

    13) CLARKE, Ronald; FELSON, Marcus. Routine activity and rational choice. London:

    Transaction Publishers 1993.

    14) CLARKE, Ronald. Situational crime prevention: successful case studies. NY: Harrow

    and Heston, 1997.

    15) FIGUEIREDO, Lucas. O Ministrio do Silncio: a histria do Servio Secreto

    Brasileiro de Washington Lus Lula (1927-2005). Rio de Janeiro: Record, 2005.

    16) FLEURY, Sonia. Militarizao do social como estratgia de integrao: o caso da UPP

    do Santa Marta. In: Sociologias, Porto Alegre, ano 14, n. 30, mai./ago. 2012, p. 194-222.

    Disponvel em: Acesso em: 02/10/2014.

    17) GARLAND, David. A cultura do controle: crime e ordem social na sociedade

    contempornea. Rio de Janeiro: Revan, 2008.

    18) MISSE, Michel (org.). O inqurito policial no Brasil. Rio de Janeiro: UFRJ/Booklink,

    2010.

    19) MORAES, P. R. B. Juventude, medo e violncia. Ciclo de Conferncias Direito e

    Psicanlise: novos e invisveis laos sociais, 2004, p. 1 - 17. Disponvel em:

  • 20

    Acesso em: 05/07/2014.

    20) PARAN. Relatrio da Pesquisa de Vitimizao na cidade de Curitiba.

    CRISP/SESP-PR: Curitiba, agosto/2006.

    21) PAULA, Ana Paula Paes de. Por uma nova gesto pblica. Rio de Janeiro: FGV, 2011.

    22) RAWS, John. Uma teoria da justia. So Paulo: Martins Fontes, 2002.

    23) SANTOS, Juarez Cirino dos. O adolescente infrator e os direitos humanos. ICPC:

    Curitiba, 2012. Disponvel em: Acesso em: 04/10/2014.

    24) SILVEIRA, Vladimir Oliveira da; SANCHES, Samyra Naspolini. Direito Penal Mnimo

    e Direitos Humanos na Poltica Criminal de Eugenio Raul Zaffaroni. Revista Direito & Paz.

    So Paulo, v. 1, n. 1 (2012). Disponvel em:

    Acesso em:

    06/07/2014.

    25) WACQUANT, Luic. As prises da misria. Rio de Janeiro: Zahar, 2011.

    26) WACQUANT, Luic. Punir os pobres: a nova gesto da misria nos EUA. Rio de

    Janeiro: Revan, 2007.

    27) WAISELWICZ, Jacobo. Mapa da violncia 2014: os jovens do Brasil. Braslia:

    FLACSO, 2014.

    28) ZAVERUCHA, Jorge. FHC, foras armadas e polcia: entre o autoritarismo e a polcia

    (1999-2002). Rio de Janeiro: Record, 2005.