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Vincent van Gogh e as cores do vento Chiara Lossani Tradução Maurício Santana Dias Ilustrações Octavia Monaco Temas Arte oitocentista • Pintores holandeses • Pós-impressionismo Fraternidade • Loucura • Suicídio Temas transversais Pluralidade cultural • Ética • Saúde GUIA DE LEITURA PARA O PROFESSOR 48 páginas SOPROS DE VIDA E ARTE EM VAN GOGH Desde o título, Chiara Lossani atiça a curiosidade do leitor. Fenômeno da natureza, intangível por princípio, que cores teria o vento? Por que prisma poético o espírito tem de soprar para adquirir matizes? Lossani se inspira na correspondência do pintor com seu ir- mão quatro anos mais novo, Theodorus van Gogh (1857-1891), impelida por questões desse tipo. As Cartas a Theo revelam quan- to, para Vincent, o trabalho artístico pressupunha amar a natu- reza e captar-lhe as mensagens, subjetivando os dados sensíveis. Aqui se percebem, pois, as forças conflitantes que sopraram sobre o pintor, desafiando-o a conciliar construção e expressão, sentimento e técnica. A esse desafio somava-se o impasse de vi- ver material e espiritualmente da arte, satisfazendo-se ou frus- trando-se, comunicando-se ou isolando-se, em maior ou menor grau, dos outros e da sociedade.

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Page 1: Vincent van Gogh e as cores do vento - … Vincent van Gogh e as cores do vento. C. HIARA OSSANI. designado missionário de uma comunidade de mineiros em Was-mes. Impressionado com

Vincent van Gogh e as cores do ventoChiara Lossani

Tradução Maurício Santana DiasIlustrações Octavia MonacoTemas Arte oitocentista • Pintores holandeses • Pós-impressionismo

Fraternidade • Loucura • SuicídioTemas transversais Pluralidade cultural • Ética • Saúde GUIA DE LEITURA

PARA O PROFESSOR

48 páginas

SoproS de vida e arte em van GoGh

Desde o título, Chiara Lossani atiça a curiosidade do leitor.

Fenômeno da natureza, intangível por princípio, que cores teria

o vento? Por que prisma poético o espírito tem de soprar para

adquirir matizes?

Lossani se inspira na correspondência do pintor com seu ir-

mão quatro anos mais novo, Theodorus van Gogh (1857-1891),

impelida por questões desse tipo. As Cartas a Theo revelam quan-

to, para Vincent, o trabalho artístico pressupunha amar a natu-

reza e captar-lhe as mensagens, subjetivando os dados sensíveis.

Aqui se percebem, pois, as forças conflitantes que sopraram

sobre o pintor, desafiando-o a conciliar construção e expressão,

sentimento e técnica. A esse desafio somava-se o impasse de vi-

ver material e espiritualmente da arte, satisfazendo-se ou frus-

trando-se, comunicando-se ou isolando-se, em maior ou menor

grau, dos outros e da sociedade.

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OBRA EM CONTEXTO

• Explosivas naturezas-mortas

Publicado em Letras e Artes a 5 de dezembro de 1948, “Van

Gogh, holandês e visionário” é o título de um significativo ensaio

de Otto Maria Carpeaux (1900-1978), útil para entender o con-

texto histórico-social em que o artista se formou, bem como os

traços por meio dos quais sua obra acedeu à universalidade.

Segundo Carpeaux, da Holanda vieram as primeiras influên-

cias sofridas pelo pintor. Dali proveio, por exemplo, o gosto de Van

Gogh por naturezas-mortas, gênero praticado por artistas como

Jacob Henricus Maris (1837-1899), Anton Mauve (1838-1888), Jo-

zef Israëls (1827-1911), George Hendrik Breitner (1857-1923) e,

antes deles, Gerard Dou (1613-1675), Nicolas Maes (1634-1693),

Pieter de Hooch (1629-1684) e Johannes Vermeer (1632-1675).

De tons escuros, a pintura desses mestres, “modestamente rea-

lista” e estática, transformava tudo – paisagens marinhas, cenas

de interiores e até retratos – em naturezas-mortas. No entanto,

se Van Gogh pintou naturezas-mortas a vida inteira, elas nunca

foram estáticas, e sim “cheias de força explosiva”.

Dentre os holandeses, a obra de Jean-François Millet (1814-

-1875) – precursor do realismo, com suas representações de tra-

balhadores rurais – foi uma revelação para Van Gogh. Em carta

a Theo, Vincent declara:

Estou pensando no que diz Millet: “Não quero suprimir de maneira alguma o sofrimento, pois com frequência é ele que faz os artistas se expressarem mais energicamente”.

Quando digo que sou um pintor de camponeses, isto é bem real e você verá adiante que é aí que eu me sinto em meu ambiente. Não foi por nada que durante tantas noites meditei junto ao fogo, entre os mineiros, os turfeiros e os tecelões, salvo quando o trabalho não me deixava tempo para a reflexão. Eu me envolvi tão intima-mente com a vida dos camponeses de tanto vê-la continuamente e todos os dias que realmente não me sinto atraído por outras ideias.

(GoGh, Vincent van. Cartas a Théo. Tradução de Pierre Ruprecht. 2a ed. Porto Alegre: L&PM, 2010, p. 96.)

Filho de pastor protestante, Vincent van Gogh começa a tra-

balhar no mercado de arte em 1869, aos dezesseis anos, por reco-

mendação de um tio. Assim, atua como marchand nas filiais da

Casa Goupil, em Haia, Londres e Bruxelas, e também na matriz

parisiense. Demitido em 1876, tenta ingressar, sem sucesso, na

Universidade de Teologia de Amsterdã. Muda-se então para a Bél-

gica, onde, apesar do mau desempenho na Escola Protestante, é

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designado missionário de uma comunidade de mineiros em Was-

mes. Impressionado com as péssimas condições de vida ali vigentes,

luta para transformá-las e acaba sendo dispensado. A partir daí, com

o apoio de seu irmão, Theo, opta pela carreira artística. Embora en-

tão vivesse em meio às paisagens luminosas de Brabante, no norte

da Bélgica, os quadros de Van Gogh dessa época são escuros, retra-

tando camponeses e tecelões da região, deformados pela miséria.

Um exemplo é Mulheres carregando sacos de carvão, de 1882.

Em 1885, Van Gogh segue para Antuérpia, também no norte

da Bélgica, onde visita museus, apreciando obras do pintor fla-

mengo Peter Paul Rubens.

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MESTRE BARROCOPeter Paul Rubens (1577-1640) foi

considerado o maior expoente do

barroco setentrional. Tendo estudado

em Milão, Gênova, Florença e Roma,

ele realizou diversas obras sob

encomenda, principalmente pinturas

de igrejas e retratos da aristocracia.

Foi pintor da corte em Antuérpia e

organizou um grande ateliê, com

promissores discípulos.

FLASHES DA REALIDADESurgido na França por volta de

1860, o movimento impressionista

buscava o aproveitamento máximo

da luminosidade e privilegiava

manchas cromáticas (em detrimento do

contorno rígido), defendendo a pintura

ao ar livre, com pinceladas rápidas, a

fim de captar a realidade de

forma instantânea.

• O contato com os impressionistas

Em 1886, Van Gogh desembarca em Paris, para onde viaja ao

encontro de Theo. Este, marchand como o irmão outrora, pro-

picia o contato de Vincent com pintores impressionistas como

Claude Monet (1840-1926), Edgar Degas (1834-1917) e Pierre-

-Auguste Renoir (1841-1919).

Van Gogh assim incorpora em sua pintura a luminosidade do

impressionismo, deixando de lado os tons sombrios. Para perceber

a mudança, basta comparar a paleta escura de telas como Os co-

medores de batatas, de 1885, e Três pares de sapatos, de 1886, com a

luz presente em obras posteriores, como Mulher sentada no Café du

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Tambourin, A ponte Grande Jatte sobre o Sena, Natureza morta com

absinto (1887), os retratos de Père Tanguy (1887-1888), entre outras.

No entanto, Van Gogh, bem como Paul Gauguin (1848-1903)

e Paul Cézanne (1839-1906), é considerado por muitos críticos

de arte como representante do pós-impressionismo, pela con-

traposição à subjetividade enevoada e aos limites sensoriais do

realismo impressionista, conforme se vê na seguinte passagem

do livro de Lossani e Monaco (p. 22):

Em meio àquela natureza prodigiosa, ele joga fora o que apren-deu com os impressionistas, observa as cores e inventa outras: o roxo das azeitonas para as sombras nas oliveiras, o prateado das cavalas para o mar, tons quentes como o da crosta de pão para o trigo.

O vento encoraja-o:

“Pinte aquele campo: observe-o bem, Vincent, é um oceano de sol!”.

As pinceladas sucedem-se, as cores fluem como palavras em um texto; na tela inclinam-se as espigas de trigo.

“Os girassóis, Vincent! Os feixes! O sol!”

Vincent espreme os tubinhos de tinta sobre a tela. Seu sol é tão luminoso que nem o ocaso consegue apagá-lo. Seus feixes são montes de ouro.

• Dos girassóis aos corvos

Em 1888, Van Gogh muda-se para Arles, na Provença, sul da

França, onde sonha fundar uma comunidade de artistas. Denomina

Casa Amarela sua residência-ateliê e cria a série Girassóis para deco-

rá-la. É sua fase mais produtiva, em que pinta cerca de quatrocen-

tas telas com pinceladas vigorosas, de amarelo intenso e vermelho

vivo. Dentre as obras produzidas nesse período, destacam-se A Casa

Amarela; Terraço do café na Place du Forum, Arles, à noite; A cadeira

de Van Gogh; A cadeira de Gauguin; A vinha encarnada; Noite estre-

lada sobre o Ródano (1888); Quarto de dormir em Arles (1889).

Contudo, apenas Gauguin aceita o convite para residir na Casa

Amarela, onde passa dois meses. A penúria material, divergências

entre os artistas e incompatibilidades de temperamento terminam

por provocar várias rusgas entre os dois. O auge da crise ocor-

re quando, em um momento de grande desequilíbrio, Van Gogh

ameaça o amigo com uma navalha. Gauguin então retorna a Paris,

e Vincent, fora de si, decepa a própria orelha. Envia-a de

presente a uma prostituta, sendo internado em um hospi-

tal em seguida.

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Em 1889, de volta a sua casa, Van Gogh pinta Autorretrato com

cachimbo e orelha enfaixada. Pouco tempo depois, busca internação

em uma instituição psiquiátrica nas imediações de Saint-Rémy, na

Provença. Ali, inspirado pelos vinhedos, campos de trigo e olivais

da região, pinta vários quadros, como Árvores no jardim do hospital

Saint-Paul e Campo de trigo com ciprestes. No ano seguinte, dirige-se

a Auvers-sur-Oise, perto de Paris e de Theo, a fim de submeter-se a

consultas com o doutor Gachet. Sem conseguir se livrar das crises,

em Auvers ele pinta cerca de oitenta quadros, dentre eles Retrato do

doutor Gachet, A sesta e Campo de trigo com corvos (1890).

A fertilidade criativa, porém, não abranda a forte depressão

nem a morte precoce, em 1890, aos 37 anos.

o Suicidado pela Sociedade

A marca da loucura (incomunicabilidade, automutilação,

crises, internações e morte) na obra do pintor holandês pode

ensejar algumas reflexões sobre o lugar marginal da arte e seu

papel transgressivo em certos contextos histórico-sociais, princi-

palmente a partir do romantismo. O estereótipo do artista como

tipo excêntrico, devasso, vagabundo, bandido, “cabeça de vento”,

desequilibrado frequenta o imaginário das pessoas, recebendo

diversas representações literárias. Da cigarra preguiçosa, im-

previdente ante a escassez do inverno, em A cigarra e a formiga,

ao músico sequestrador de crianças, em O flautista de Hamelin,

muitas são as histórias que expressam formas de reagir àqueles

que põem em xeque as convenções, os valores e os limites expres-

sionais de seu grupo, sua cultura, sua época.

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Quando não funciona como uma máscara ficcional positiva, em

sintonia com o projeto criativo do autor (como o desvario conver-

tido em plataforma poética em Pauliceia desvairada, de Mário de

Andrade, um dos mentores do movimento modernista), a figura

do louco pode expressar algo daquela hostilidade social antiartística.

No caso específico de Van Gogh, a hipótese da loucura como

sacrifício social do gênio criador, transformado em bode expia-

tório, é o que encontramos no célebre ensaio do escritor francês

Antonin Artaud (1896-1948) “Van Gogh: o suicidado pela socie-

dade”, publicado em 1947:

Van Gogh não estava louco, mas suas telas eram jorros de subs-tância incendiária, bombas atômicas cujo ângulo de visão, ao con-trário de toda a pintura com prestígio na sua época, teria sido ca-paz de perturbar seriamente o conformismo espectral da burguesia do Segundo Império [...] Assim a sociedade mandou estrangular em seus manicômios todos aqueles dos quais queria desembaraçar-se ou defender-se porque se recusavam a ser seus cúmplices em algumas imensas sujeiras.

(ArtAud, Antonin. Van Gogh: o suicidado pela sociedade. In: Escritos de Antonin Artaud. Seleção, tradução e notas de Cláudio Willer. Porto Alegre: L&PM, 1986, p. 133.)

Tendo ele mesmo padecido nas mãos dos psiquiatras, pas-

sando por experiências traumáticas como o eletrochoque e a

internação por longos períodos, Artaud escreve com conheci-

mento de causa, identificando-se com o sofrimento do com-

panheiro holandês. Assim, segundo ele, a medicina reguladora

e punitiva cria a patologia mental para se autojustificar, impe-

dindo os artistas de dispor da própria angústia, transforman-

do sua loucura (em verdade, uma espécie de superlucidez) em

doença mental.

Dessa perspectiva, ele destaca a força insurrecional da pintura

de Van Gogh, cujas telas conciliam tensão e inércia, paz e turbi-

lhão – seja nas paisagens alucinadas como rostos, seja nas pin-

celadas produzidas como golpes de açougueiro, tiros de canhão,

labaredas de fogo, jorros de lava.

A fim de neutralizar tal força, explica Artaud,

a sociedade inoculou-se em seu corpo [...]apagou nele a consciência sobrenatural que acabara de adquirir

e, como uma inundação de corvos nas fibras da sua árvore interna,submergiu-o num último vagalhãoe, tomando seu lugar,o matou.

(ArtAud, Antonin, op. cit, p. 135.)

Artaud então responsabiliza diretamente o doutor Gachet e o

próprio Theo pela morte do pintor.

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Vincent van Gogh e as cores do vento Chiara Lossani

Independentemente do acerto ou do exagero em tais conside-

rações, o fato é que o ensaio do poeta francês desloca de modo

significativo a visão socialmente hegemônica acerca das relações

entre arte e loucura, além de oferecer comentários muito origi-

nais sobre alguns quadros específicos, destacando detalhes ma-

teriais como estrutura compositiva, seleção cromática, tipo de

pincelada etc. Quanto a Campo de trigo com corvos, por exemplo,

ele chama a atenção para a linha do horizonte muito baixa, o

amarelo sujo dos girassóis combinado com a terra cor de vinho

(que mais parece um mar revolvido por golpes de enxada), o ne-

gro trufado dos corvos e o céu prenhe de ameaças, uma espécie

de “sufocação vinda do alto”.

Pertinentes são também as observações sobre a tensão contida

nos demais quadros do autor, tensão que jamais ultrapassa os li-

mites representacionais da pintura. Van Gogh enxerta um nervo

na natureza sem desfazê-la, subverte o tema sem o abolir – por isso

suas tempestades são detidas; sua convulsão, organizada.

Enfim, trata-se de uma leitura poética abastecida por afinida-

des espirituais entre os dois artistas, ambos esmagados pela mão

pesada da psiquiatria.

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Vincent van Gogh e as cores do vento Chiara Lossani

• Reflexões postais

A narrativa de Chiara Lossani apoia-se em grande parte na

correspondência trocada entre Vincent e Theo, testemunho

de uma história de amor fraternal em que ressaltam as difi-

culdades do processo criador e os embates de um sujeito em

busca de um caminho próprio dentro da pintura.

Desse modo, as cartas oferecem mais informações sobre a

vida, a obra e a época do autor, além de conter descrições,

esboços e croquis de quadros, pensamentos sobre arte, infor-

mações sobre quase duzentos pintores, arquitetos, escritores e

filósofos relevantes para a formação do artista.

A edição de Cartas a Théo que a L&PM, de Porto Alegre,

com tradução de Pierre Ruprecht, é uma seleção de duzen-

tas dessas cartas. Obedece à antologia organizada por Geor-

ges Philippart, editada em Paris na década de 1930. A corres-

pondência completa, porém, totaliza 652 missivas, que foram

guardadas por Jo van Gogh-Bonger, viúva de Theo, e publi-

cadas em 1914 em um volume de mais de mil páginas pela

editora holandesa Maatschappif Voor Goede.

Cumpre assinalar ainda que o estudo das cartas, também

conhecido como epistolografia, constitui um ramo dos mais

fecundos no campo dos estudos literários. Afora todas as in-

formações sobre o contexto histórico-relacional do artista, a

correspondência muitas vezes funciona também como diário

de campo, um espaço crítico propício a experimentações for-

mais no nível da linguagem. No caso de Van Gogh, Artaud, no

ensaio anteriormente citado, reproduz trechos da correspon-

dência enfatizando a simplicidade do estilo, a um só tempo

objetivo e miraculoso.

Assim, a leitura das cartas

que serviram de base à ficção

de Lossani pode ser útil ao lei-

tor interessado em saber mais

sobre o homem por trás de Os

girassóis, não apenas por seu

conteúdo explícito, mas tam-

bém pelo padrão estilístico

adotado ao longo da corres-

pondência.

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Vincent van Gogh e as cores do vento Chiara Lossani

ATIVIDADES PRÁTICAS

Julgando pela capa

Um aquecimento interessante antes da leitura consiste em

estimular os alunos a observar a capa, destacando alguns tra-

ços característicos da ilustração de Octavia Monaco, que se

repetem nas ilustrações internas. Assim, depois de instar os

alunos a manifestarem suas impressões iniciais, o professor

pode destacar:

• O uso sistemático da cor amarela: no girassol sobre o qual

se situam o cavalete com a tela e o homem que a pinta,

também de amarelo, sentado em uma cadeira de palha; na

planície sobre a qual se assenta a figura central; no casario

ao fundo; no céu, em laivos sobre a superfície azul-clara.

• A mistura de técnicas (pintura + recorte e colagem).

• O caráter metalinguístico da composição (uma pintura

sobre alguém que pinta), com toque meio surrealista (o

girassol gigante que serve de base para o pintor).

• A caracterização da figura humana por meio de alguns

objetos que se repetem ao longo do livro: o cachimbo, a

cadeira de palha, o chapéu, o casaco azul.

Os traços arrolados nessa observação da capa podem ser reto-

mados no contato posterior com as demais ilustrações e compa-

rados com as reproduções de telas do próprio Van Gogh.

pintura verbal (produção textual de carta, seguida de

criação de desenhos)a) Em um primeiro momento, o professor observa, com os

alunos, a reprodução de alguns quadros de Van Gogh, pro-

curando associá-los a determinados estados subjetivos. Po-

de-se partir das reproduções contidas no livro de Lossani

e Monaco, arroladas ao final do volume, na seção “Icono-

grafia”. Se preferir, caso disponha de recursos técnicos, ele

também pode apresentar aos alunos reproduções em ta-

manho ampliado, presentes em manuais ou enciclopédias

da biblioteca da escola, ou mesmo convidá-los a visitar o

acervo virtual de instituições como o Musée d’Orsay (http://

www.musee-orsay.fr) ou o Van Gogh Museum (http://www.

vangoghmuseum.nl).

A associação de estados subjetivos deve ser justificada com

base em elementos composicionais: a luz nas representações

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de paisagens; o uso da cor e a disposição de objetos nas ce-

nas de interiores; a posição, os gestos e a expressão facial nos

retratos (por exemplo: é possível falar em uma atitude com-

passiva ante o esforço de trabalhadores pobres nos retratos

de camponeses?) etc.

b) Após a observação dos quadros, a produção textual se inicia

com descrições. Cada aluno “pinta com palavras” três qua-

dros: primeiro, descreve a paisagem de um lugar para onde

foi ou viajou (por exemplo: a rua e a fachada de uma loja;

uma praia); a seguir, um ambiente interno (por exemplo: a

sala de espera do consultório, um quarto de hotel); finalmen-

te, o retrato de um trabalhador (secretária, médico, funcio-

nário do hotel).

c) Em seguida, cada aluno escreve uma carta para um colega,

com uma narração sobre o deslocamento, passeio ou via-

gem, e as descrições já feitas.

d) Divididos em duplas, os alunos trocam as cartas e, com base

no texto recebido, constroem representações plásticas das três

descrições textuais criadas pelo colega.

e) Ao final, desenhos e textos são expostos em um mural para o

restante da escola.

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Vincent van Gogh e as cores do vento Chiara Lossani

as vozes do vento

Uma das invenções do texto de Chiara Lossani em relação à

correspondência que lhe serviu de inspiração é o personagem do

vento, espécie de alterego ou voz interior de Van Gogh. Essa voz

interior funciona como uma espécie de conselheiro, que explica

as decisões tomadas por Vincent, suas mudanças de percurso e

seus destemperos. Assim, a alteração na paleta de cores, da fase

holandesa, mais sombria, para a fase parisiense, mais iluminada,

parece sugerida pelo vento: “Sua paleta precisa de cores claras,

Vincent, mas a Holanda não é um bom lugar para encontrá-las”,

sopra o vento. “Por que não vai a Paris e fica com Theo, para ver

como os impressionistas pintam?” (p. 17). Da mesma forma, a

ideia da Casa Amarela (“Olhe aquela casinha amarela, Vincent!

Vai ser a casa dos pintores”, p. 22) e os momentos de desequilí-

brio, como o pega-pega da página 35, em que Van Gogh tenta

agarrar o vento e fixá-lo em suas telas.

A personificação do vento funciona, portanto, como uma ale-

goria da loucura, da falta de juízo. Da pessoa que age de maneira

inconstante, insensata não se diz que tem “cabeça de vento”?

Com base nessas considerações, propõe-se a realização de um

jogo teatral com a turma, um jogo de pantomima baseado na

atribuição de diferentes “vozes internas” a determinada sequên-

cia de gestos. A atividade transcorre do seguinte modo:

a) Divide-se a classe em grupos de quatro ou cinco alunos. Cada

grupo concebe uma sequência de gestos, encadeados segundo

uma história implícita que lhes dê sentido.

b) Uma vez definida a sequência de gestos e a história subjacente,

um ou mais alunos de cada grupo são incumbidos de executar

a sequência para o restante da classe, sem pronunciar palavra

alguma.

c) Após as pantomimas, cada grupo elabora uma “voz interna” (a

voz do vento) que dê sentido às pantomimas dos demais gru-

pos, com uma ou duas frases para cada gesto da pantomima.

d) As pantomimas são repetidas, dessa vez com a participação

de um representante de outro grupo, que atuará como “voz

interna exteriorizada”.

e) Ao final, avaliam-se os resultados, pensando na possibilidade

de diferentes “vozes internas” ou motivações passíveis de asso-

ciação a um mesmo gesto.

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Vincent van Gogh e as cores do vento Chiara Lossani

LEITURA DE IMAGEM

campo de trigo com corvos, 1890Como preparação para a atividade, o professor apresenta à

classe uma reprodução da tela (http://www.vangoghmuseum.

nl/vgm/zoom.jsp?page=3343&lang=en), enquanto lhe dirige

perguntas como: “O que se vê nessa tela?”; “Como descrever a

relação entre o céu e a terra na paisagem”?; “Que tipos de mo-

vimento é possível identificar na composição?”; “A luz permite

definir algum momento específico do dia (manhã, tarde, noite)

para a cena?; “Que significados simbólicos podem ser atribuídos

ao trigo e aos corvos representados na tela”?; “Os corvos são re-

presentados de modo realista, fotográfico?”, “Como descrever as

pinceladas que compõem a imagem?”.

O professor aproveita as respostas dos alunos para destacar al-

guns elementos, começando pela intensidade dos movimentos que

compõem a cena: movimento das hastes de trigo e das nuvens no

céu, ambas impelidas pelo vento; movimento dos corvos em voo,

deslocando-se predominantemente de baixo para cima, em direção

ao canto superior direito, e em menor número para a esquerda,

em um plano mais aproximado. A trifurcação de caminhos de ter-

ra, na parte inferior, também contém um movimento implícito,

referente à decisão quanto a que caminho seguir.

A impressão de movimento é ainda reforçada pelo jogo entre

ortogonais (a linha do horizonte, no terço superior da tela, e o

eixo de simetria dado pelo atalho central) e diagonais (as hastes

de trigo, os caminhos à direita e à esquerda, o bando de corvos

ascendendo à direita e à esquerda), o que contribui para criar a

ilusão de profundidade, perspectiva.

As pinceladas grossas e imprecisas correspondem ao vigor do ges-

to que as engendra e também determinam um forte contraste entre

as cores, que praticamente não se misturam: quase não há transições

nem dégradé. Os matizes quentes da terra cor de vinho e dos campos

amarelos e cor de ocre opõem-se violentamente ao frio dos azuis-

-celestes e ao fino negror das asas dos corvos. Estes últimos são repre-

sentados de modo esquemático, pequenos “vês” no céu tumultuado.

Por fim, concorrem para a impressão de dramaticidade a au-

sência de elementos humanos na cena e o valor simbólico ligado

à presença dos corvos. Enquanto o trigo é comumente associa-

do ao alimento, simbolizando abundância, fertilidade, riqueza, o

corvo é tido como ave de mau agouro, arauto da morte.

O TRIGO E OS CORVOS: SIMBOLOGIAO simbolismo do trigo evidencia-se com

força no ritual da epopsia, cerimônia

que integra os mistérios de Elêusis na

mitologia grega. Trata-se de um ritual

que ocorre no decurso das bodas entre

Zeus e Deméter: nele um grão de trigo

é apresentado em um ostensório, em

homenagem a Deméter, deusa das

colheitas e das estações. Esse ritual

marca a alternância morte-vida do

grão, que morre para se multiplicar.

A espiga de trigo é também um

símbolo de Osíris, deus egípcio morto

e ressuscitado, e aparece ainda no

Evangelho de São João (“É chegada a

hora em que será glorificado o filho

do Homem. Em verdade, em verdade

vos digo: se o grão de trigo que cai na

terra não morrer, permanecerá só; mas

se morrer produzirá muito fruto. Quem

ama sua vida a perderá e quem odeia

sua vida neste mundo guardá-la-á para

a vida eterna” – João, 12, 23-25).

O corvo, em contrapartida, assume

valores antagônicos ao longo do

tempo em diversas culturas. Animal

psicopompo, isto é, capaz de conduzir

as almas pelo reino das trevas sem se

perder, mensageiro dos deuses, segundo

Chevalier e Gheerbrant, o corvo tende

a assumir um valor mais positivo no

lendário de povos nômades que vivem

da caça e da pesca, tornando-se negativo

com o desenvolvimento da agricultura e

a sedentarização. Na Europa, converte-

se na terrível ave negra dos escritores

românticos, que sobrevoa os campos de

batalha para se alimentar de cadáveres.

(Ver Chevalier, Jean; Gheerbrant, Alain.

Dicionário de símbolos. 24. ed. Rio de

Janeiro: José Olympio, 2009.)

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Vincent van Gogh e as cores do vento Chiara Lossani

A carga dramática da obra mais o simbolismo mortífero dos

corvos alimentaram por muito tempo o mito de que esse qua-

dro seria o último pintado por Van Gogh e de que ele conteria

algo de premonitório em relação a sua morte. O texto de Los-

sani, assim como outras obras ficcionais sobre o artista, ajuda a

perpetuar esse mito, na medida em que sobrepõe o momento de

criação do quadro ao clímax de angústia que conduziu o pintor

ao suposto suicídio.

Segundo biografia recente, Van Gogh, de Steven Naifeh

e Gregory White Smith (São Paulo: Companhia das Letras,

2012), o pintor teria morrido em decorrência de tiro acidental,

disparado por um estudante em uma estrada perto de Auvers-

-sur-Oise.

Mitos à parte, a verdade é que não se sabe ao certo se este

foi mesmo o último quadro produzido por Vincent, pois não há

cartas documentando o período imediatamente anterior a sua

morte. De qualquer modo, muitos críticos consideram Campo

de trigo com corvos uma das mais significativas obras do fim do

século XIX, prenúncio da vanguarda expressionista e fonte de

inspiração para grandes nomes da pintura moderna, como Hen-

ri Matisse (1869-1954) e Pablo Picasso (1881-1973).

um quadro e Sua reinterpretação

A título de encerramento da “leitura” de Campo de trigo com

corvos, os alunos são instados a comparar a reprodução da tela

de Van Gogh com a reconstrução realizada por Octavia Mona-

co nas páginas 36 e 37 do livro.

Tal reconstrução aproveita os principais elementos da obra

original: o amarelo do trigo, o céu carregado, o caminho de

terra e os corvos. No entanto, se os elementos são os mesmos,

absolutamente diverso é o tratamento plástico dado a eles. No

lugar das pinceladas espessas e agressivas, a superfície amarela

do trigal e o azul do céu formam campos mais homogêneos,

que se encontram sem atrito. O impasse do tríplice caminho

desaparece, pois os atalhos de terra viram inofensivas faixas on-

duladas, verdes e amarronzadas, na parte inferior da ilustração.

Os corvos esquemáticos são substituídos por recortes colados,

de contorno mais definido. A impressão geral é de abranda-

mento da “agressividade” gestual da tela-fonte. É como se a car-

ga dramática desse gesto fosse de alguma forma compensada

pela inclusão da figura humana ensanguentada, representando

o pintor ferido.

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Vincent van Gogh e as cores do vento Chiara Lossani

A comparação pode ensejar um debate sobre diferentes

modos de representar o drama da experiência: uma via mais

indireta, ligada à gestualidade, às transições violentas de cor e

ao poder de sugestão da humanidade ausente, e outra mais di-

reta, associadas à imagem, imediatamente decodificável, de um

homem se esvaindo em sangue.

para Saber maiS

SITESMuseus em cujo acervo há obras de Vincent van Gogh:

• Van Gogh Museum, Amsterdã (Holanda)

http://www.vangoghmuseum.nl

• Musée d’Orsay, Paris (França)

http://www.musee-orsay.fr

• Rijksmuseum Kröller-Müller, Otterlo (Holanda)

http://www.kmm.nl/collection

• Museu de Arte de São Paulo (Masp), São Paulo (Brasil)

http://masp.art.br/Masp dispõe de cinco quadros de Van Gogh em sua coleção

permanente: Natureza-morta com prato, vaso e flores, O filho

do carteiro, Passeio ao crepúsculo, Banco de pedra e A arlesiana.

Tais telas podem ser visitadas virtualmente digitando a pala-

vra “Gogh” no campo de busca reservado ao autor.

LIVROS PARA O PROFESSOR• AndrAde, Carlos Drummond de. “A cadeira (Van Gogh)” e

“Café noturno (Van Gogh)”. De “Arte em exposição”. In: Fa-

rewell. Rio de Janeiro: Record, 1996, p. 31, 33.

Poemas de um dos maiores poetas brasileiros do século

XX dedicados à obra do pintor holandês.

• ArtAud, Antonin. Van Gogh: o suicidado pela sociedade.

In: Escritos de Antonin Artaud. Seleção, tradução e notas de

Cláudio Willer. Porto Alegre: L&PM, 1986.

Publicado em 1947, recebeu o prêmio Sainte-Beuve de

ensaios. O autor destaca o valor da loucura lúcida de Van

Gogh, apreendendo que ele criou para os “simples de espí-

rito” telas com “extraordinária força insurrecional”.

• CArPeAux, Otto Maria. Van Gogh, holandês e visionário. In:

Ensaios reunidos – 1946-71 v. II. Prefácio de Ivan Junqueira.

Rio de Janeiro: UniverCidade & Topbooks, 2005, p. 391-3.

Ensaio que nos ajuda a compreender a formação de

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Vincent van Gogh e as cores do vento Chiara Lossani

Van Gogh, sua inserção cultural e o alcance universal de

sua singularidade artística.

• GoGh, Vincent van. Cartas a Théo. Tradução de Pierre Ru-

precht. Porto Alegre: L&PM, 2010.

Seleção das cartas do pintor a seu irmão e protetor, que

oferecem informações sobre o contexto histórico-cultural

em que viveu e deixam ver suas concepções e projetos ar-

tísticos, dramas, amizades.

• nAifeh, Steven; White SMith, Gregory. Van Gogh: a vida.

Tradução de Denise Bottmann. São Paulo: Companhia das

Letras, 2012.

Biografia do pintor de Os girassóis, fruto de dez anos de

pesquisa sobre mais de dez mil cartas, que questiona mitos

amplamente difundidos, como o do suicídio do artista.

• thoMSon, Belinda. Pós-impressionismo: movimentos da

arte moderna. Tradução de Cristina Fino. 2. ed. São Paulo:

Cosac Naify, 2001.

Livro que procura apreender as singularidades de artistas

como Seurat, Cézanne, Gauguin e Van Gogh em seu mo-

vimento de aprofundar conquistas do impressionismo e

explorar novas possibilidades.

DVD• Van Gogh: vida e obra de um gênio. (Vincent

& Theo). Direção: Robert Altman. Holanda/

Reino Unido/França/Itália/Alemanha, 1990.

Colorido. 138 min. Elenco: Tim Roth, Paul

Rhys and Adrian Brine.

O filme retrata a intensa relação de amor

e ódio entre o pintor holandês Vincent van

Gogh e seu irmão mais novo, Theo. Voo

poético em cores fortes pela vida de um ar-

tista de temperamento tempestuoso.

Elaboração do guia ieda lebensztayn, doutora em literatura brasileira pela FaCuldade de FilosoFia, letras e CiênCias humanas da universidade de são paulo; PrEParação Fabio Weintraub; rEvisão marCia menim.