vii vivas palavras

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Arte Carlos Colabone Escola Graduada de São Paulo 9º Ano

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Contos dos alunos do 9o ano da Graded School.

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Page 1: VII Vivas Palavras

Arte

Carlos Colabone

Escola Graduada

de São Paulo

9º Ano

Page 2: VII Vivas Palavras

É com muita alegria que apresentamos a revista eletrônica do 9º ano da

Escola Graduada de São Paulo. Esta publicação constitui a etapa final deum dos trabalhos de produção de textos realizados em aula, e inclui contosescritos em torno de um mesmo tema, sugerido para o concurso VivasPalavras para todo o High School : uma viagem no tempo.Coube aos autores escolher entre viajar ao futuro ou ao passado. Essapossibilidade de escolha, somada à competência criativa dos alunos,resultou em textos diversificados e interessantíssimos, gostosos de ler. Osleitores poderão entrar em contato com robôs, celulares de altíssimatecnologia e carros voadores, mas também com Elvis Presley, JFK eLeonardo da Vinci. Uma experiência e tanto!Viajem com estes alunos-escritores, caros leitores!Profa. Adriana Silveira Profa. Valeria Aranha

Page 3: VII Vivas Palavras

Ana Elisa Pacheco

O futuro me aguarda

Até hoje estou confusa sobre o queaconteceu naquele dia… Tudo começou quandoganhei uma viagem experimental para o futuro. Meligaram avisando que eu havia ganhado, portantoteria que ir até a empresa do jornal para fazer aviagem. E lá fui eu, sozinha.

Ao chegar, botei uma roupa branca, quediziam ser “especial”. Assim, toda empacotadanaquele traje insuportavelmente quente, entrei nanave. Ao fechar a porta, veio o breu, e em seguida anave começou a chacoalhar brutalmente por algunssegundos.

Um cara de... sei lá, vinte e poucos anos,abriu a porta. A única palavra que consigo pensarpara descrevê-lo é: UAU! Loiro, olhos azuis, alto,forte, e se chamava Zeca. O que percebi em seguidafoi a gente saindo de um porão de umsupermercado. Fiquei espantada quando eu falei quevinha do passado e ele respondeu que sabia. Ele sesentia tão à vontade ao meu lado que fui percebendoque eu não era a primeira a “visitar” o futuro. Ele játinha até um plano de como passaríamos o dia, doque ele me mostraria e me ensinaria.

Fiquei admirada ao sair do supermercado.O futuro era idêntico ao dos filmes que eu tinha vistona T.V.! Tudo tão colorido e tecnológico! Carrosvoavam, as roupas eram feitas de outro material, ummeio estranho, parecia metal! E também havia

robôs!Quando Zeca percebeu toda a minha

ansiedade, ele decidiu me levar para um “test-drive”.Aiiiiiiiiiii, que coisa gostosa! Parecia uma montanha-russa! Imagina dirigir aquilo todos os dias? MeuDeus! Em seguida, Zeca decidiu me levar para andarna moto do futuro. Ainda estava sendo testada, masdepois da experiência com o carro, tudo o que euqueria era aventura, né? E lá fomos nós...

Ao subir na motocicleta, o Zequinha meapertou com tudo, me deu até arrepios! Quando amoto estava em pleno ar, ela simplesmente desligousozinha, do nada! Em seguida, estava de volta naempresa, com no mínimo umas dez pessoas em voltade mim. Todos perguntando a mesma coisa: “O queque aconteceu?”, e o pior é que eu não sabia o queresponder! Estava curiosa para saber o queacontecera com o Zeca; quis voltar para o futuro,mas me impediram, falaram que era perigoso ir paralá mais de uma vez. Então estou aqui, meses depois,tentando lembrar o que aconteceu depois daquelaqueda, e até hoje, nada.

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Page 4: VII Vivas Palavras

Pelo buraco de minhocaCamila Ferreira

Viajei no tempo. O que por muitos anos parecia impossível é agora uma lembrança para mim. Passei por um longoprocesso de treinamento e, com curiosidade, embarquei na minha viagem para o passado. Recebi instruções para fotografar tudo dedesconhecido; eu passaria duas semanas no passado, até que o eclipse seguinte ativasse o buraco de minhoca que me levaria devolta.

Tinha chegado o dia. O primeiro dia do resto da minha vida. Eu estava nervosa, mas determinada. Um elevador melevou a uma torre muito alta e, lá, deitei-me em uma maca que me levou a um tubo. Muitos barulhos vinham do tubo, mas eu nãome incomodava; aproveitei para tirar uma soneca. O que vi ao acordar foram muitas árvores, a mata me cercando. É claro que eusabia onde estava! Os cientistas haviam me informado de que eu seria mandada para o Chile, milhares de anos atrás. Ainda umpouco tonta, ouvi uns barulhos de galhos se quebrando. Eu sentia que havia alguém me olhando. De repente, ouvi gritos e fuicercada por indígenas. O povo inca habitava o Chile naquele tempo e foi por eles que fui levada como prisioneira.

Cheguei a um vilarejo e fui levada para o xamã da tribo. As casas eram feitas de lama e possivelmente fezes deanimais. Os tetos de palha não permitiam a entrada de luz nas ocas, então eu não consegui ver a parte de dentro. Todos olhavampara mim com uma expressão de medo e curiosidade. Com a minha presença, as criancinhas haviam parado de brincar. Seusrostinhos sujos olhavam para os mais velhos, em dúvida. As mulheres agachadas pararam de cozinhar para observar a estranha. O arquente e seco começava a esfriar com o pôr-do-sol.

Fui levada para uma oca grande, com estacas na frente e marcas de tinta vermelha e preta no teto de palha. Assim queentrei, vi uma fogueira e muita fumaça. Uma voz veio de trás da fumaça e aos poucos consegui identificar o perfil de um homem.Sentada ao lado, havia uma mulher, que se levantou e me trouxe uma bebida. Eu recusei, mas ela insistiu e até provou umpouquinho. Sem saber o que era, bebi tudo. Comecei a ficar com sono e meus olhos lentamente se fecharam. Não sei quanto tempofiquei dormindo. Quando acordei, estava vestida com um pano branco. Havia flores no meu cabelo e muitas joias de ouro. Logo,com o tempo que passei convivendo com o povo, descobri por que acordara vestida daquele jeito: o xamã insistiu que eu eraKatsu’tsey, que na sua língua significava “deusa da terra que nasceu das folhas”.

Naquelas duas semanas, fui tratada com muito carinho e cercada pela cultura do povo inca. Aprendi a cozinhar e conhecimuito sobre a vida naquela época. Até peguei um pouco da língua! Mas, infelizmente, as duas semanas se passaram muito rápido e,após uma festa que deram como agradecimento pela minha visita, o buraco de minhoca me trouxe de volta.

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Page 5: VII Vivas Palavras

AmnésiaAbri os olhos e não entendi; onde eu poderia estar? Parecia estar presa em uma cabine estreita e baixa; não

conseguia nem me levantar, pois lá dentro só havia lugar para uma cadeira, e eu provavelmente havia me soltado de suasduas travas (para que cintos de segurança em uma cabine assim?) e estava estirada no chão. Minha cabeça latejava e eutinha a sensação de que haviam sugado meu cérebro para fora do meu crânio, jogando-o novamente em seu lugar (ou umpouquinho para fora da onde ele devia estar.) Descobri um galo no topo da minha cabeça , após algum tempo de exames, edepois de uns quinze minutos deitada em um chão gelado, passei a enxergar algumas sombras.

A primeira sombra que consegui identificar foi a de um monitor. Nele, estava uma mulher que não parava demexer a boca, mas como não conheço leitura labial, não sei traduzir o que ela dizia. Depois de algum tempo encarando-a etentando me lembrar de alguma coisa, avistei um par de fone de ouvidos pendurados no teto da cabine, que por sinal era daaltura da minha cabeça. Coloquei-o sobre minha orelhas, como se o tempo estivesse em câmera lenta, mas incrivelmente eunão conseguia me movimentar mais rápido do que essa velocidade. Logo ouvi a mulher do monitor gritandorepetitivamente: "Carol? Carol? Carol? Carol? Está me ouvindo?" Não sei dizer com quem ela estava falando, mas comcerteza não era comigo. Eu não me chamo "Carol". Inclusive nuca conheci ninguém com esse nome! Afinal, como eu mechamo mesmo? Retirei os meus e fones e os pus no devido lugar onde eu os havia encontrado.

De repente, a cabine inteira ficou bem mais clara diante dos meus olhos e consegui enxergar centenas debotões vermelhos, verdes, amarelos e roxos ao meu redor. Um sorriso enorme se estendeu no meu rosto e junto com eleveio uma vontade imensa de apertar todos os botões.. Apertei logo o maior e mais vermelho de todos, assim como mamenininha escolheria o maior ursinho de pelúcia ao ganhar um prêmio.

Uma porta, até então inexistente naquele cubículo para formigas, abriu-se, revelando o que parecia ser umdesfile de milhares de soldados, marchando em fila única, com passos planejados como os de uma coreografia. Meu corpoparou por completo para admirá-los, e quase esqueci como se respirava, de tão pasma que fiquei. Percebi que eles não eramsoldados de verdade, mas sim, robôs. Os robôs marchavam sem pressa no meio de uma cidade constituída somente porprédios uniformes. As ruas estavam vazias, e ao procurar por algum sinal de vida, nada encontrei. Não havia árvores ouflores. Pássaros ou crianças. E nem um sinal de movimento ou música. Tudo que havia eram os prédios uniformes e os robôs,que não paravam de marchar.

Foi quando eu percebi que eles se aproximavam cada vez mais de mim que fui tentar me trancar de volta naminha cabine. Estava sozinha. Sem ideia do que fazer. Pensei que, apertando o grande botão vermelho novamente, faria aação contrária, mas isso não aconteceu. Continuei exposta. Tentava apertá-lo, enquanto lágrimas escorriam pelo meu rosto,mas os meus dedos pareciam nuca conseguir alcançar o botão. O tempo continuava em câmera lenta, como acontece no fimde um pesadelo onde você não consegue fugir rápido o suficiente. Peguei o fone de ouvidos novamente ,com esperanças depoder ser acudida pela mulher do monitor, mas tudo o que ela falava era: “Carol? Como está 3011? Carol? Como..?” E entãoeles chegaram, como o maior e melhor bichinho de pelúcia de todos, que aterroriza a menina com as sombras que faz no seuquarto e segue-a em seus piores pesadelos. Ainda marchando, chegaram, e em um instante tiraram de meus olhos a imagemdos prédios uniformes e dos robôs que marchavam em fila única.

Carolina Faria Lengyel

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Page 6: VII Vivas Palavras

A cada passo, uma nova história!Catarina Santiago

Estava lendo o jornal, como eu fazia todos os dias pela manhã, quando virei a página e vi umanúncio que chamou minha atenção: “Quer viajar no Tempo ?”. Parei para ler, afinal, viajar no tempo é algoimpossível, e queria saber o que eles estavam realmente vendendo. O anúncio era sobre uma empresachamada Navizix e chamava as pessoas a se inscreverem para viajar no tempo, caso fossem escolhidas. Fiqueicuriosa. Será que era verdade? Decidi pesquisar mais sobre esta Navizix , e acabei descobrindo que era umaempresa séria de pesquisa sobre viagens no tempo. Valia a pena arriscar!

Logo no dia seguinte, acordei cedo e me informei sobre o horário certo para fazer a minhainscrição, seria às 14 horas do dia 22 de setembro de 2020. Faltavam ainda dois dias para o momento maisexcitante da minha vida. Uma hora passava tão lentamente que era como dias, eu não conseguia me segurar,meu maior desejo era pegar uma caneta e preencher os formulários. Serei escolhida? Serei famosa? Rica?Advogada? Vou me casar?

Depois de dois dias, que se passaram lentamente, o grande dia chegou. Acordei cedo e fiqueiarranjando coisas para fazer, esperando o tempo passar. Olhei para o relógio, 13:30, tinha chegado a hora. Saícorrendo de casa e cheguei à Navazix às duas horas em ponto. Entrei e havia um tumulto, todos queriam fazera inscrição. Depois de uma hora na fila, consegui finalmente pegar o formulário, que perguntava praticamentetudo de nossas vidas, e procurei responder com o maior número de detalhes possíveis e com o maior cuidado.A moça que recebeu meus papeis me deu um sorriso e disse que eles entrariam em contato com a pessoaescolhida.

Dois meses se passaram e eu não tinha recebido nenhum telefonema. Quando estava prestes adesistir, recebi uma ligação, avisando que eu era uma das selecionadas. Não conseguia acreditar, meu coraçãodisparou, parecia um sonho. Na semana seguinte, como combinado, fui correndo para a Navizix ansiosamente,sem saber o que me esperava. Fui recebida por um senhor com cabelos grisalhos, bem magro, que usavaóculos grandes e tinha uma voz fina e baixa. O nome dele era Frederico e foi ele que começou com as viagensno tempo no Brasil. Frederico me falou sobre os procedimentos e me levou até a máquina. Meu coraçãodisparou, e a única coisa que conseguia dizer era, “futuro...futuro”. Frederico olhou para mim e disse, “então épara o futuro que a senhora vai!”.

Entrei na máquina, tudo começou a mexer e pular, fiquei tonta e, assim que abri meus olhos,comecei a ver imagens desconexas que não entendia; vi o rosto de uma menina chorando, eu brigando com umhomem, uma casa. Quando eu estava começando a entender o que estava acontecendo, a máquina parou etudo voltou ao normal. Fiquei brava e comecei a gritar com Frederico, aquilo não era o futuro. Saí da Navizix efui para casa pensar no que eu tinha acabado de ver.

Acabei percebendo que aquilo poderia ser a ideia atual sobre meu futuro, mas as minhas metas,sonhos e prioridades iriam mudar e meu futuro mudaria comigo. Parei de ficar brava e decidi que viver opresente é muito mais importante do que saber o futuro, porque o futuro eu faço agora.

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Page 7: VII Vivas Palavras

HolocaustoEric Bissell

Era 2017. Eu tinha 20 anos eprecisava de dinheiro. Vi um panfletopara um trabalho, “seja um dosprimeiros para viajar no tempo”, e tireiuma das tirinhas de papel.

No dia seguinte, eu fui para olaboratório, cujo endereço estavaescrito no panfleto. Quando eucheguei lá, me sentaram em umamáquina que se parecia com umamáquina de bronzear; apertaram unsbotões e...

Eu estava no meio da TimesSquare em Nova York, mas ela estavavazia, deserta, com um ar deabandono. Havia carros abandonadosnas esquinas e não tinha nenhuma luzligada.

Todas as portas estavamabertas e as janelas quebradas. Em umlugar, eu achei um jornal, parecia servelho, de um ano ou mais atrás.

Eu lia e lia, e virei cadapágina; eu estava horrorizado sobre oque eu via: o mundo que conhecemos,em só 10 anos, tinha acabado. O fimtemido por gerações, o fim para acabarcom todos os fins, um HolocaustoNuclear.

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Page 8: VII Vivas Palavras

Sozinho pelo tempo – Fernão Mesquita

Abri os olhos. Minha cabeça latejava incontrolavelmente, e um enorme corte em minha face me causava profunda dor. Quando finalmente recobrei os sentidos, o medo e a solidão tomaram meu corpo. Estava sozinho, naquele chão de terra batida. Sem ninguém.

Não havia muito tempo, um anúncio em uma de minhas várias revistas (que normalmente passavam despercebidas) chamara minha atenção. Física sempre fora um de meus fascínios, e quando bati os olhos no anúncio, já estava automaticamente convencido a aceitar.

Este, que vinha acompanhado de um panfleto explicativo, narrava uma descoberta surpreendente: era possível, com treinamento, viajar no tempo. Imediatamente, intoxicado pelo desejo de descoberta, ofereci-me como cobaia para o ousado treinamento. Afinal, não havia nada a perder. Vivia sozinho, como encontrava-me naquele exato momento, em um casarão campestre nos arredores suíços e, tendo um breve conhecimento no estudo da Física, estava cotado para embarcar no que parecia ser loucura.

Em um ano, estava pronto para ir ao futuro e arrecadar informações sobre o avanço da raça humana.

Assim, acompanhado por um pequeno grupo de pesquisadores, entrei na claustrofóbica cabine. Ao afivelar os cintos, as portas fecharam-se, privando-me de meu último contato humano com os cientistas que há pouco haviam me orientado. No mesmo instante, o ar deixou meu corpo, e caí em sono profundo.

Sem ninguém... Depois de anos me conformando com a solidão de minha vida no presente, encontrava-me, por incrível que pareça, ainda mais só no futuro.

Fiz um esforço desumano para levantar. Quando observei os arredores, deparei-me com um barraco em ruínas.

A princípio, imaginei que um erro havia ocorrido. Só podiam ter me mandado para o passado, ao invés do futuro. Logo, tirei essa desconfiança da cabeça, pois, com os anos de pesquisa empenhados naquele projeto, nada poderia ter dado errado.

Mas mesmo assim, eu me perguntava como um celebrado centro de pesquisas da Suíça poderia ter sido devastado num futuro que deveria ser perfeito.

Decidi sair do barraco, e, ao colocar o pé na rua, deparei-me com uma paisagem perturbadora.

Tanques de guerra desfilavam pelas ruas desertas. Fumaça negra tomava conta do ar poluído. À distância, era possível ver algumas fábricas ou fornalhas (não sabia ao certo). Um cheiro insuportável de enxofre e combustível pairava no ar. E, bem em frente, numa enorme praça central, reinava sobre todos um monumento. A imagem era perturbante.

Abaixo, quase a nível da praça, dezenas de cabeças desfiguradas e distorcidas eram prensadas por um trono dourado. Meus olhos fitavam com nojo a escultura do ditador que pisoteava as raças “inferiores”.

Lentamente, direcionei o olhar aterrorizado às mãos do tirano, que agarrava uma réplica do planeta com uma clara voracidade.

Finalmente, algo no semblante idoso do líder chamou minha atenção: uma grotesca cicatriz, que atravessava metade da face do autócrata.

Senti uma gota gélida de suor misturar-se ao sangue que escorria do corte profundo. Naquele momento, percebi minha sina: estaria só no meu passado no presente, no meu presente no futuro e em meu destino final.

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Page 9: VII Vivas Palavras

Amor repetidoKaique Castro

Bom, a definição de muito bom ou muito belo, excelente, encaixa-se perfeitamente à palavra magnífico, que com mais perfeição

descreve a melhor experiência da minha vida. Alguém sozinho, como eu, que não tem ninguém para conversar, deve se expressar com

algum tipo de arte. No meu caso, com os livros. Esse novo livro no qual eu trabalho não vai ser de historinhas bobas de ação, em cujo

final o mocinho sempre acaba ficando com uma linda donzela. Agora, nessa minha obra-prima, eu conto a história da minha vida.

Eu me apresento no livro como o personagem principal, Jaques Merrier, que também é meu segundo nome: Pietro Jaques Merrier

Castro. Conto toda minha vida pelo personagem Jaques, logo depois de seu lindo, inesquecível casamento com sua eterna amada, Olivia.

Jaques perde-a em um feio acidente de barco nas praias de Itaguaçu. Infeliz, transtornado e depressivo, ele volta para casa, quando se

depara com as toneladas de cartas novas, contas de água e luz, e também com o seu dinheiro mais bem gasto; sua revista semanal de

ciências. Ao passar entre as informativas páginas da revista, ele depara com uma proposta imperdível. Um grupo de cientistas precisava

de cobaias para uma viagem no tempo e a cobaia teria o privilégio de escolher entre o passado e o presente. Sem pensar duas vezes,

Jaques ligou, inscreveu-se, e com muita sorte foi aceito imediatamente, pois tinha sido o primeiro a ligar, com o propósito de viajar ao

passado, viver intensamente o seu amor com sua querida Olivia e até tentar salvá-la do acidente e quem sabe até trazê-la de volta ao

futuro.

Nos dois meses seguintes, Jaques preparou-se, esforçou-se ao máximo, com a ajuda dos cientistas Tico e Teco. Ele estava pronto,

instruído a filmar tudo que visse e nunca, jamais, interferir no passado, pois isso poderia estragar todo o presente drasticamente. Também,

estava equipado, em sua cintura, com um botão vermelho com um “X”. Esse botão, após uma semana, traria-o de volta ao presente, são e

salvo. Preparado e determinado a viajar ao passado, Jaques não pensava em mais nada além de recuperar o seu amor perdido, disposto a

mudar o passado, o presente e o futuro.

Já no passado, em busca de sua preciosa amada, Jaques encontrou-a no mesmo lugar em que haviam se conhecido, na lanchonete da

R.Barão de Albuquerque, na pequena cidade de Tourinho. Com a missão de reconquistar Olivia, Jaques foi ao seu encontro e teve uma

surpresa que o deixou confuso. Assim que ele entrou na lanchonete, ela o recebeu com um abraço e com um belo sorriso no seu formoso

rosto, que alegrava todos ao redor. Sem dar explicações de como o havia reconhecido, Olivia segurou firme sua mão e correu, rindo para

o mundo.

Sentados na praia, na véspera do dia de partida, Olivia parecia não ser do passado, parecia conhecê-lo há anos. Sem muito tempo, no

dia seguinte, Jaques revelou tudo a Olivia, com a intenção que ela considerasse sua ideia e fosse com ele de volta para o futuro, mas ela

simplesmente olhou-o com olhares profundos, porém doces, e sorriu. Deu-lhe um abraço forte, abraço de despedida, e também revelou

algo. Olivia explicou que ele estava no passado, portanto tudo já havia acontecido antes, ele já tinha vindo anteriormente com o mesmo

propósito. Ele ficou chocado, pois não esperava essa resposta, e preocupado, pois não queria deixar Olivia antes que um deles pudesse

arranjar uma solução. Ela deu um beijo em seu rosto e apertou o botão vermelho, quando uma forte luz iluminou o grande céu azul.

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Page 10: VII Vivas Palavras

Leonardo Oliveira

O que é tempo? Já não seiO mundo girava ao meu redor- Tudo deu certo! Ainda estou vivo!O pensamento me aliviava, porém não foi uma sensação duradoura. Apesar de ainda ter lembranças dos acontecimentos anteriores

àquele momento, havia um problema: minha máquina do tempo estava em péssimo estado.- Gravação número um. Como pedido, estou gravando imagens para futura análise. Impressiona-me que esta câmera funcione aqui.

Como podem ver, estou em um lugar totalmente desconhecido e a minha máquina transportadora está quebrada. Vou em busca de informações elogo mais tentarei consertá-la.

Desligando a câmera, caminhei até uma pequena casa que encontrei em minha frente. Pela condição em que se encontrava, acrediteique ela havia sido abandonada, então entrei e deitei-me no chão frio e duro.

- Gravação número dois. Para os cientistas que não sabem quem sou, me chamo Lucas. O tempo corre muitoestranhamente aqui e algo está acontecendo comigo. Ontem à noite, encontrava-me em períodos de guerra, porém hoje acordei nomeio de uma cidade que pelos meus estudos parece ser São Paulo. Acredito que estou mudando de época sem a ajuda da máquina.Não sei como parar isso, as pessoas aparentemente não me veem... Minhas esperanças de voltar para casa começam a desaparecer.

Minhas roupas de cientista já se encontravam sujas. Como não era visto, entrei em uma pequena casa e peguei roupase comida. Ao levantar as mangas longas de meu palito, notei em meu braço algo do qual havia esquecido completamente; não era amáquina do tempo que me levaria para casa, era o rastreador em meu relógio que avisaria meus companheiros sobre a hora e localcerto para me buscarem. Apertei rapidamente o botão e abri a torneira para lavar minhas mãos. Tudo que eu poderia fazer eraesperar, mas não naquele lugar. Notando o espanto na cara daqueles moradores ao verem a torneira abrir sozinha, achei melhorprocurar outro lugar para ficar.

- Gravação número três. Vou repousar agora, porém deixarei minha câmera ligada, assim poderei ver a passagem dotempo mais claramente...

Agora sei que nunca voltarei. Olhando a gravação de ontem, vi que meus companheiros estiveram aqui,porém não conseguiram me ver, apenas viram minhas roupas de cientista sujas jogadas no canto...

- Gravação número 4. Esta será provavelmente minha última gravação... Percebo agora que meuscompanheiros de trabalho e as outras pessoas só conseguem ver coisas não adaptadas a mim... Não devia ter dormindosegurando minha câmera. Decidi então deixar minhas gravações junto com a minha triste aventura, que escreverei nestecaderno de anotações que trouxe comigo, com a esperança de que alguém no futuro descubra um jeito de me levar de volta,pois, por enquanto, sei que estou perdido no tempo.

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Page 11: VII Vivas Palavras

O preço da vidaMoony

O coração acelerava, as mãos tremiam e podia sentir o suor lentamente deslizando sobre minha face. Nunca haviapensado que acabaria daquele jeito. A multidão lentamente crescia, e os olhares de desprezo intensificavam-se. A fibraapertava, dificultando a respiração. Um homem robusto, de meia-idade, abria o pergaminho em suas mãos e começava a ler.

-Cidadãos de Salem! Hoje temos presente em nosso vilarejo a causa de nosso sofrimento, o atormentado, o anticristo, oDiabo!- declarava o juiz.

-Danforth!- gritava eu - Isso tudo é um engano! Você não pode fazer isso! As garotas estão mentindo!-Cale-se, capeta! Seus dias de tormento chegaram ao fim. Hoje, dia 3 de fevereiro de 1693, será seu último dia neste

mundo.A esperança esgotava-se e a multidão enlouquecia. À distância, podia-se ver uma garota. Seu rosto era magro e pálido e

tinha um ar sinistro nela. Seu olhar fixado nos meus me indicava satisfação. Somente se eu pudesse alcançar meu bolsodianteiro eu poderia voltar para casa. Somente um aperto necessário para a liberdade...

O sol começava a baixar: seus raios aconchegavam a minha alma. “Não”, eu pensei. Eu não podia deixar aquiloacabar daquele jeito. Não permitiria ser mais uma vítima das mentiras de Abigail. Só havia uma saída. Uma saída que talvezatrapalhasse o contexto histórico inteiro. Era arriscado, mas era necessário.

Eu desesperadamente tentava me livrar das cordas e, a cada empurrão, minha mão parecia cada vez maispróxima da esperança. Após grande esforço e gotas de suor, pude alcançar meu bolso traseiro e agarrei dentro dele a chavepara a salvação. Dei um suspiro final e liguei meu celular. Imediatamente, apertei o “play” e o mais belo som já ouvido pelahumanidade tomou o lugar.

Silêncio. Todos haviam parado, paralisados e comovidos pela inovação.-Que bruxaria é esta que você está fazendo?- perguntou Danforth.-É o dom da música. Ela e mais todos os mistérios do universo poderão ser seus com uma condição: liberte-me.O juiz hesitou, não tinha certeza do que fazer. Havia um brilho em seus olhos. Por um lado, suspeitava da

situação; por outro, desejava a oferta, afinal era um homem ambicioso. Levantou a mão. Silêncio novamente. Fez um sinal comos dedos, e após segundos eu podia sentir o ar entrando em meus pulmões novamente. Estava livre!

-Dê-me agora. Dê-me os mistérios do universo- disse ele, com a voz firme.Joguei no ar o aparelho que se encontrava em minhas mãos e dei um tapa no meu bolso dianteiro, acionando o

mecanismo que me levaria de volta para casa. De volta para um futuro alterado e desconhecido. Um preço que eu havia depagar pela vida.

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Page 12: VII Vivas Palavras

Casando escondido

Paty Kim

– Se você realmente me amasse, me deixaria tomar as minhas próprias decisões! – disse Ofélia, com a voz trêmula e os olhos lacrimejando. – É pro seu próprio bem, Ofélia! Ele não te merece! – gritei. Estava furiosa e minhas mãos tremiam sem parar.

Em junho de 2011, fui escolhida para fazer um treinamento exclusivo. Um treinamento para viajar no tempo. Depois de me preparar por 24 horas, todo dia da semana por um ano e meio, finalmente comecei minha expedição.

– Nervosa? – perguntou John, meu companheiro de cabine.

` – Nem um pouco! Nasci para fazer isso! – falei, com ânimo.

Entramos na grande nave branca, que nos levaria através do tão falado “buraco da minhoca”. De repente, senti meu celular vibrar; tinha recebidouma mensagem da minha irmã de 12 anos, Ofélia: “Boa sorte, Fabi! Vou sentir saudades”. Desde pequenas, éramos grudadas uma à outra. Nos amávamosintensamente e sabíamos tudo uma sobre a outra. Respondi à mensagem, desliguei o celular e embarquei na viagem que mudaria a minha vida.

Subindo, subindo, subindo. A nave parecia flutuar e estávamos mais e mais próximos do “buraco da minhoca”, o túnel que levaria a gente parafuturo ou passado. Olhei pela janela e vi o planeta que nós habitávamos. Tão pequeno, comparado com as outras maravilhas no espaço! Quando finalmentechegamos, o túnel sugou a nave com um poder tão incrível que mal tivemos tempo para falar “boa sorte” um para o outro. Lembro que estava tonta eapaguei.

Acordei em um quarto agradável e branco. Confusa, levantei e olhei ao redor. De repente, entrou uma mulher alta, bonita, mas ao mesmo tempodelicada.

– Tá melhor, Fá? Nossa, que susto viu! Você simplesmente apareceu depois de 10 anos desaparecida! Mamãe quase teve um treco... – disse amulher.

– Desculpa, mas quem é... – eu lentamente perguntei.

– Sou eu, Fá! A Ofélia! Não acredito que não me reconheça! – disse a mulher.

– Querida! Ela acordou? – disse uma voz de um homem, que vinha de fora do quarto.

– Sim! Vem cá, amor! – Ofélia exclamou.

Entrou no quarto um homem alto, vestido de forma simples e com a barba mal feita. Ele tinha um leve hálito de cachaça. Logo de início, não fuicom a cara dele.

– Fá, esse é o Paulo. Ele não tem trabalho nem casa, por isso está morando comigo. – Ofélia disse.

Fiquei chocada.

– E... nós vamos nos casar escondido da mamãe, ela nunca permitiria... – ela continuou.

A raiva dentro de mim explodiu e tivemos uma discussão horrível. Não acredito que ela pensou em fazer isso com a mamãe. Ela estava prestes aescolher aquele homem em vez da família? No dia em que voltei para o presente, impedi Ofélia de conhecer o homem que arruinaria a vida dela e a da nossafamília. Se isso foi um erro? Eu sinceramente não sei. Mas agora é tarde demais para voltar atrás.

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Page 13: VII Vivas Palavras

Só de idaVic Vergara

27 de março de 2999.Meus olhos estavam fechados. Era silêncio e escuridão. As palmas de minhas mãos, lentamente,

começaram a suar; meu coração acelerou e o frio no meu estômago me consumia. Eu estava lá, deitada em umaespécie de máquina do tempo, que mais parecia um caixão cromado. Abri os olhos e vi o que parecia umacalculadora, teclas de zero a nove e uma pequena tela estreita. De um pequeno aparelho sonoro que estava emmeu ouvido, uma voz quase robótica me disse para escolher qual data, passado ou futuro, eu gostaria de visitar.Para onde queria ir?

Ir ao passado seria interessante. Descobrir de uma vez por todas se os malditos livros de Históriaestavam corretos. Mas, por outro lado, nunca gostei muito de História, sou o tipo de pessoa que gosta de inovar,que gosta de Matemática, Ciências, Arquitetura, coisas que evoluem. Então, decidi ir para o futuro. Escolhi adata de 31 de dezembro do ano de 2999. Apertei o pequeno botão verde que dizia: “Go”.

A viagem pareceu levar quinze minutos. Não via nada além da cobertura metálica da nave e não ouvianada, absolutamente nada. Eu sentia a força G me empurrando contra a maca acolchoada do meu “caixão”.Então, tudo parou e ouvi apenas um estrondo.

31 de dezembro de 2999. Estava morrendo de medo de abrir a porta, mas sabia que tinha que ser feito. Ao abrir a nave, vi uma

multidão e um grupo de cientistas que aplaudiram, surpresos. Pelo visto, eles tinham sido avisados, de geraçãoem geração, sobre onde e quando o primeiro viajante do tempo ia pousar.

Fui muito bem recepcionada por esses humanos. A diferença não era tão grande quanto eu pensava.Fisicamente, éramos muito parecidos, mas era difícil entender o que eles estavam falando. Falavam muitorápido, suas roupas eram interessantes, cores neutras como preto, branco e bege. Homens e mulheres sevestiam de forma similar, todos elegantes, com um porte alto e ereto. Porém, o que mais me impressionou foi oshow de fogos do Ano Novo. Fogos que dançavam, mudavam de cores e se desenrolavam em lindas frases, emcima de arranha-céus que tinham formatos bizarros, que desafiavam as leis da gravidade. E foi nesse momentoque decidi que não ia voltar para o presente.

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De volta para o presentePedro Rocha

No ano de 1963, um dos eventos mais polêmicosda História aconteceu, porém eu iria mudar isso. Eu,Pedro Rocha, iria embarcar em uma viagem no tempo emque mudaria a história de um país inteiro.

A minha classe foi ao museu de ciências de SãoPaulo. Quando nós chegamos, eu e meus amigosdecidimos andar pelo museu inteiro,vimos tudo, excetouma sala onde se dizia que não se podia entrar. A partirdo momento em que eu olhei para aquela porta comaquele aviso, eu fui possuído pela curiosidade. Eu tinhaque saber o que havia naquela sala.

Então, separei-me dos meus amigos e fui à porta;abri-a e não vi nada. Quando eu entrei, havia muitapoeira e muitas teias de aranha. No momento em que iaembora, vi um objeto enorme embaixo de um lençol. Oobjeto parecia um carro. Com vontade de saber o quetinha embaixo do lençol, eu o tirei e vi o que me pareciauma nave espacial. Abri a porta da nave, e logo depoisentrei na máquina, quando a porta fechou-seautomaticamente. Dentro, havia um painel de controlecom várias datas. Assustado e ansioso, pois nunca haviavisto alguma coisa igual, escolhi qualquer uma delas, e derepente a nave espacial começou a se mexer. Em umpiscar de olhos, eu não estava mais naquela salaempoeirada, mas em cima de um prédio.

Apertei o botão para abrir a porta e me lanceipara fora da nave. Olhei para baixo do prédio e vi queuma parada estava acontecendo, e logo após vi opresidente Kennedy!!! Após isso, percebi que eu haviavoltado ao passado. Desesperado, entrei na nave espaciale apertei o botão que dizia “volta-se ao presente”, porémnada aconteceu, e depois de alguns minutos descobri quea máquina estava sem gasolina. Eu saí rapidamente danave espacial, desci do prédio e corri para o posto maispróximo. Na hora em que eu iria pegar a gasolina, eupercebi que não havia dinheiro para pagar. A partir dessemomento, comecei a chorar. Eu não sabia como eu iria

voltar ao ano de 2011 e para a minha família.De novo, vi o presidente Kennedy passando de

carro, só que dessa vez este estava sem vidro e essaimagem voltou a minha cabeça, pois já tinha visto aquelacena. Quando me dei conta de que era o dia do seuassassinato, no instinto, corri, lutei contra a multidão, queme dava empurrões e cotoveladas. Finalmente , passeipela multidão e corri até o carro e abaixei a cabeça deKennedy. No mesmo momento, um tiro raspou minhascostas. Eu havia salvado o presidente dos EUA!

No mesmo dia, ele me perguntou o que euqueria como recompensa, e eu simplesmente respondi: -Um litro de gasolina.

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O verdadeiro destino de HitlerVictor Chang

O dia era 22 de fevereiro de 2011, e nós, os russos, havíamos finalmente construído a nossa primeira máquina do tempo.Após anos e anos de pesquisa e desenvolvimento, estávamos prontos para voltar ao passado para prevenir o suicídio de Adolf Hitler e queele fosse capturado por nós. Adolf Hitler havia se suicidado em 30 de abril de 1945, às três e meia da tarde.

Eu, Viktor Krachenkof, agente da primeira divisão do centro de inteligência da Rússia, inscrevi-me numa importante e muitodesejada missão. Um sonho. Fui escolhido pelas minhas habilidades extraordinárias e por ser fluente em alemão. Às 6 horas daquele dia, fuichamado pelos cientistas responsáveis pela construção da máquina do tempo e me informaram que tudo estava de acordo com os planos.Eles me instruíram que eu devia simplesmente correr em direção da máquina e que eu seria enviado ao passado. Deram-me um braceleteordinário, que tinha um botão verde, para voltar ao presente. O ponto em que eu acordaria seria a 2 quilômetros de distância do “banker”,construído nos jardins da Chancelaria do Reich; abrigo de Adolf Hitler. Em 30 de abril de 1945, às onze e meia da manhã, em Berlim,Alemanha, estava finalmente preparado; dei alguns passos para trás e corri em direção à máquina. De repente, desmaiei.

Acordei com tontura e vi que o mundo estava girando ao meu redor, mas em alguns segundos, havia melhorado. Só tinhaquatro horas para alcançar o meu objetivo, pois esse era o limite do tempo e, passadas as quatro horas, eu voltaria automaticamente aopresente. Eu estava com o uniforme de um comandante da Gestapo e me disfarcei com o nome Heinrich Stauffenburg. Tinha comigo um riflede assalto Sturmgewhr 44 e duas pistolas Walther P38, com supressores e muita munição. Em instantes, encontrei um jipe e fui diretamenteao “banker”. Chegando lá, vi dois soldados apontando suas armas. Eles disseram, em alemão:

- Mãos para cima!Respondi com rigor, em alemão:- Abaixem suas armas! Sou Heinrich Stauffenburg! Comandante da Gestapo!Os dois soldados abaixaram suas armas e eu rapidamente peguei as minhas duas pistolas e atirei neles. Os dois caíram no chão e

finalmente entrei no “banker”. Ao longo do caminho, havia quatro soldados jogando cartas, mas tive que interromper o jogo, pois tinha umamissão a cumprir. Cada pessoa que eu encontrava acabava morta. Por minha conta, matei cada nazista no caminho, com raiva e orgulho.Nenhum nazista no “banker” sabia que havia um infiltrado matando todos, por causa dos supressores, que reduzem o barulho alto dos tiros.Olhei para um relógio de parede que havia encontrado e já eram três e quinze; eu sabia que precisava me apressar. Enquanto isso, nessehorário, Fuhrer estava se despedindo formalmente das pessoas mais próximas que ainda o seguiam, mas percebeu que alguns estavamfaltando. Adolf Hitler estava a sete metros de distância e percebi que as pessoas próximas a ele estavam desarmadas. Então, eu rapidamentecorri em sua direção e consegui matar todos, menos Hitler. Em seguida, Adolf Hitler disse, em alemão:

- Nai! Nai! Nai! Quem é você?! Você vai para o inferno! Desgraçado!E respondi:- Sou Heinrich Stauffenburg, um russo, quer dizer, um soviético, e vou levar você para casa!Agarrei-o e apertei o botão verde do bracelete. Mas enquanto carregava, vi que um dos soldados que estava na entrada do “banker”

havia sobrevivido, e ele apontou sua arma e me deu um tiro no abdômem. Percebi que o bracelete havia carregado e apertei o botão. Eudesmaiei, e com a dor insuportável, eu acordei rapidamente. Mas de repente comecei a ficar inconsciente e não consegui acordar.

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Maléfica finalidade de um programa experimentalBrian Wolfson

Olhava ao meu redor, estava num barco. Mas eu não estava sozinho. Aliás, podia ver mais pessoas juntas agorado que já havia visto a minha vida inteira. Estava no Canal Inglês, indo em direção à França. Junto comigo havia milhares desoldados americanos, espalhados em dezenas de barcos, que carregavam o mesmo objetivo: tomar a praia de Omaha.

O céu estava nublado e, naquele dia, 4 de junho de 1944, tinha certeza de que algo iria dar errado. Eu, que nascie vivi minha vida toda na Califórnia, nunca imaginei que me encontraria lutando para defender meu país. Sempre fui umapessoa calma e o exército não era o lugar para mim. Infelizmente, naquele momento eu não podia escolher o meu destino.

Estávamos a um minuto da costa e eu já conseguia perceber o nervosismo entre todos. O capitão dizia para nãoter medo, mas tenho certeza de que ele também não estava confortável na sua situação.

Foi a partir desse momento que eu percebi de verdade o que estava acontecendo. Os barcos que estavam naminha frente foram fuzilados por metralhadoras operadas por alemães no topo da montanha. Que horror! Soldados saíam dosbarcos apenas para serem fuzilados e caírem no mar, que estava vermelho. Os que pulavam na água para escapar dos tiroseram metralhados do mesmo jeito, ou morriam afogados, pois o equipamento era muito pesado.

Assim que meu barco bateu na areia, tive a sorte de as metralhadoras estarem massacrando outros soldados.Por isso, pude correr até a toca, ouvindo gritos de misericórdia durante o caminho.

De todos os lugares possíveis, por que havia parado ali? Quando optei para entrar em um programaexperimental de viagens no tempo, nunca achei que iria acabar naquela situação. O pior de tudo era que eu não me lembravade como ativar o botão de emergências e voltar para 2011.

Agora, restava-me sobreviver a esse aniquilamento que os nazistas estavam fazendo. A questão em jogo era seeu iria sair dessa tristeza vivo ou morto; se eu seria um dos milhares de americanos que tiveram suas vidas terminadas naqueledia...

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O temporário viajanteCarlo Krell

- Todos a bordo!A absurda ansiedade havia atingido o meu sangue durante o alto aviso do marinheiro. Palavras, vírgulas e letras circulavam em meu

cérebro, algo semelhante a filmes, como se eu conseguisse visualizá-las. Era muita coisa para pensar, como estratégias, táticas e em como desenvolvê-las,em uma mínima quantidade de tempo. Era pouquíssimo tempo para predizer quando e onde eu iria elaborar as minhas ações. Obviamente, eu estavanervoso, admito, mesmo com tantos anos de treinamento.

Lentamente, eu andava sobre a ponte em direção à entrada do navio. Durante a grande maioria do tempo que passei nessa entrada, eupermanecia pasmo. Isto é, eu estava perdido no meu próprio mundo, repleto de pensamentos completamente desligados do mundo verdadeiro.

- Bem vindo, senhor. Por favor, diga-me o seu nome completo para eu encontrá-lo no sistema e entregar-lhe as chaves do seu quarto. –Havia dito a recepcionista do enorme navio.

Eu continuava desconectado, como estava ao adentrar o lugar. Sentindo-me relativamente envergonhado e certamente abobado, decidiprestar atenção no que realmente importava.

- Desculpa, a senhora quer meu nome? Eu estava visualizando o ambiente sofisticado que está mantido aqui dentro, por isso não lherespondi. Bem, meu nome é Senhor Joseph Charles.

Agradecida, a amorosa mulher entregou-me a chave da cabine número um. Eu havia rezado para conseguir aquele quarto especificamente,pois, de acordo com o mapa do excepcional barco, ele era o mais próximo da torre de controle. Exatamente do que eu precisava, porque a torre era o meuúnico objetivo da... viagem, digamos assim.

Como eu já havia percebido anteriormente, enquanto eu caminhava em direção ao tão desejado quarto, analisava a incrível estrutura doambiente. Obviamente, era diferente do que eu estou acostumado, pois era uma atmosfera antiga, contradizendo a época em que eu realmente vivo. Asparedes eram lindas, compostas de pintura cor de madeira, caramelizada a óleo. Eu estava bobo com a preservação e a qualidade do navio.

Dias comuns haviam se passado após a minha entrada. Eu me encontrava agora no dia 22 de março de 1909, solitário na minha cabine,esperando a hora certa e pensando. Se eu achava que eu estava nervoso entrando no navio, alguns dias antes, eu nem sabia o que eu estaria sentindonaquele momento, honestamente. Durante o meu curso envolvendo um programa experimental de viagens no tempo, eu tinha uma apostila que dizia quese eu não cumprisse a minha designada tarefa, eu ficaria preso no passado. Eu tinha acabado de encontrar a raiz da minha preocupação.

Saí do meu quarto, porém, dessa vez, apressado. Estava na hora. Na tão esperada hora. Eu precisava mudar a rota do navio para a salvaçãode todos os hóspedes ao meu redor. Mas a questão era que em todos aqueles dias pensando, eu não conseguia decifrar como eu iria mudar a rota.

Deliberadamente, olhei para o lado e encontrei a minha salvação. O alarme de incêndio. Sem sequer tomar precauções, eu abruptamenteapertei o botão vermelho. Depois de alguns minutos, lá estava eu, correndo, aproximadamente a quarenta metros do meu objetivo, desesperadamente. Omeu objetivo, nesse caso, era a torre de controle. Vi uma alta mulher ruiva na pose do cristo redentor na frente do navio, com um homem abraçando-a.Mas esse não era o ponto.

Felizmente, após ter dado uma olhada no quarto do comandante, eu vi que não tinha ninguém lá dentro, pois todos tinham ido ver qualera o problema para o disparo do alarme de incêndio, incluindo o comandante em si. Adentrei a sala de comando, visualizei o timão, agarrei-o e virei –ointeiramente para a esquerda. Eu já conseguia ver uma enorme montanha de gelo.

Subitamente, após ter desmaiado, eu acordei na cama em que deitara antes de voltar no tempo.- Você conseguiu cumprir sua tarefa, José, ou melhor, Joseph? – Perguntou o meu querido chefe.- Por que o senhor não procura “Titanic” na Google e responde sua própria pergunta? – Eu respondi.Ele digitou a palavra no computador e concluiu:- Ué, eu não encontrei nada sobre esse navio...

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A trágica descoberta Carolina Yoo

Eu estava sem fôlego, não acreditava no que havia visto. O meu estado era de choque interno, pois tinha acabado dedescobrir quem havia matado o meu pai quando eu era menor. Meu longo rosto estava todo vermelho, inchado e encharcadode lágrimas, como se eu tivesse levado um soco na face. Eu vivia um momento de descrença.

Tudo começou no dia 15 de abril de 2020. Fazia 24 anos da morte do meu querido pai. Eu tinha acabado de voltar docemitério com a minha família, e como sempre, nós ficamos em silêncio, relembrando nossas velhas memórias dele. Parafalar a verdade, eu não tinha muitas recordações.

Sentei-me na sala e vi um anúncio no jornal que logo chamou a minha atenção. Peguei-o e comecei a ler. Era umapropaganda, alertando a população de que a viagem do tempo era possível e que a máquina do tempo havia sido inventada.Fiquei toda empolgada, pois eu queria muito voltar ao tempo e vivenciar a vida no passado, com o meu pai. Eu tinha muitasdúvidas sobre a vida dele, e a principal era saber como ele havia morrido. Logo, peguei o endereço e direcionei-me para aagência da tal viagem.

Chegando lá, fiquei deslumbrada com a alta tecnologia. O mundo havia se desenvolvido tanto! O escritório erainfestado por computadores da melhor qualidade; as portas todas eram grossas e automáticas, com senha. As cadeirastinham um controle que permitia com que elas se movessem sozinhas. Tudo era prático. Ao chegar na sala principal,rapidamente percebi um enorme círculo, coberto por um lençol. Logo percebi que aquela era a máquina. A seguir, chegou oatendente e me perguntou se estava interessada na viagem. Falei que sim, e ele atenciosamente começou a me fazerperguntas. Eu praticamente falei tudo sobre o lugar e época para onde queria ir. Depois do questionamento, ele me levou auma sala onde uma jovem moça me orientou sobre o que eu podia e não podia fazer. Ela me alertou de que a máquina nãoautorizava ninguém a falar com as pessoas dos lugares para onde seríamos levados, e também não as deixava nos verem.Isso me deixou um pouco chateada, mas o que eu realmente queria era ver meu pai, então concordei. Assinei alguns papeis edepois me encaminhei até o centro da sala principal. A data de 15 de abril de 1996 já tinha sido determinada na máquina.Estava um pouco nervosa. Entrei na máquina e em um estalo de dedo vi-me em uma sala desconhecida.

Eu estava cheia de energia, feliz por estar ali. Saí do quarto e percebi que estava no meu bairro. Já era tarde, estavaquase anoitecendo, então decidi correr antes que escurecesse. Corri em direção a minha casa e logo vi meu pai comigo,naquela época eu tinha 4 anos. A minha alegria era indescritível. Percebi que meu pai, comigo pequena, estava entrando nocarro, e como não queria perder-nos de vista, acelerei o passo e rapidamente entrei no veículo. Meu pai começou a dirigir;eu olhava para ele, fascinada. Eu queria tanto fala com ele... Depois de um tempo, notei que ele estava indo na direção dohospital perto da minha casa. Por algum motivo, a criança estava chorando, desesperadamente. Eu não estava entendendoaquela situação. Do nada, a “eu criança” começou a bater no meu pai e a empurrá-lo agressivamente. O meu pai já estavacomeçando a ficar irritado, ele virou e me mandou ficar calma. Ele já estava ficando sem paciência. Eu, preocupada, queriafazer algo, só que não podia. A “eu menina” continuava, e meu pai, frustrado, tentou acalmar-me e colocar o cinto desegurança em mim. Só que comecei a puxar seu cabelo, o que o fez virar o volante e entrar na contra- mão. Olhei para afrente e, em um instante, vi um caminhão descontrolado vindo em nossa direção.

Acordei, estava de volta, na sala principal da agência. Estava tonta, em descrença, chorando e chorando. Sentia-meculpada, pois eu tinha matado o meu pai. 18

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RosaFernando Abdon

Isso é 2031 ou estou sonhando? Todas as mulheres estão de calcinha e sutiã? Sim, antes daviagem percebi que cada vez mais os shorts que usavam estavam menores, mas nunca imaginei isso! Queabsurdo bonito! Então, logo tirei minha camisa e minha calça para combinar com a nova moda. Continueiandando, percebi que tinha saído do lado errado da Nave Tempo, mas achei que não faria diferença. E, assim,saí para a rua apenas com a minha cueca rosa, para ver como estava o mundo 20 anos para frente.

Tentando recuperar meu fôlego, olhei em volta; os carros não tinham rodas, eles voavam, tudoparecia eletrônico e digital, mas acima de tudo, todas as pessoas estavam de terno. A avenida inteira paroupara me olhar saindo correndo da estação daquela nave. Fiquei rosa, e num piscar de olhos olhei para trás,para ver onde aquelas mulheres esbeltas estavam. Mas um pequeno televisor indicava: área feminina. Logo,todos os telões de todos os prédios reproduziam a minha imagem com foco nos meus glúteos cobertos poruma fina cueca rosa! Suando de vergonha e de desespero, arranquei com toda força minha calça e camisa damala. Troquei-me em um milésimo de segundo, mas não foi o suficiente. Quando passei em frente a umasimples banca, aquelas porcarias daqueles aparelhos eletrônicos exibiam a minha foto e afirmavam:“brasileiros não se vestem nem mesmo longe das praias!”.

Minha viagem ao futuro para a bela cidade de Las Vegas começou extremamente conturbada.Apesar de todo o estresse e constrangimento, quando cheguei ao hotel, raciocinei que as coisas provavelmentenão piorariam e, então, me acalmei. Assim que me deitei na cama, lembrei que tinha assinado um contratocomo jornalista antes da viagem, para que eu tivesse um ganha-pão. Além da conturbação que foi chegar lá,ainda por cima o taxista achou que eu iria ficar nu no carro dele após minha imagem ser exibida nos painéis deseu carro, ou qualquer que seja o nome dessas coisas voadoras. E então cheguei naquele imenso prédio devidro com o título gigante “INSTANT NEWS” e entrei.

- Que bom que você veio – disse-me a velha que tinha encontrado há 20 anos. Você vai começarescrevendo sobre essa fotografia.

Com foco nos glúteos coberto por uma fina cueca rosa, a foto me ilustrava.

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A viagem e minhas raízesMaria Julia Galeazzi

Ao acordar naquele quarto forrado de ouro, à luz de velas, não acreditava que tinha viajado notempo. Estava no castelo do rei Luis Otávio, em Aracia; era só o que eu sabia. Meu vestidinho “Abercrombie”estava totalmente fora de moda e vulgar, comparado aos das damas de 1915. Abri o armário do quarto ondeestava e lá encontrei diversos vestidos de princesa, bordados a mão. Vesti um deles, que estava jogado nocanto esquerdo, e, por incrível que pareça, ele serviu em mim perfeitamente. A porta do quarto bateu equando eu virei, assustada, dei de cara com a rainha de Aracia.

- Posso...posso ajudar vossa senhoria? Perguntei um pouco confusa, inconformada.- O que uma criadinha como você faz no quarto de minha filha, princesa Aurora?- A limpeza, senhora – disse eu.- Saia imediatamente! Quero conversar com ela, sozinha.Ao sair do quarto, de cabeça baixa, vi a princesa entrar; ela era uma menina bem bonita, mas

não sei por que, tinha a impressão de que já a tinha visto antes.Na manhã seguinte, fui passear com Aurora pelos bosques do castelo e foi lá que conheci

Cassiano. Seus olhos azuis e seu cabelo dourado chamaram a minha atenção. Desde então, ia passear comAurora todos os dias, para poder apreciar a beleza daquele “deus grego”. Quando reparou em mim pelaprimeira vez, estava brincando com Aurora e nos chamou.

- Bom dia, senhoritas! - disse ele.- Bom dia, senhor - respondi, envergonhada.- Nunca a vi no reino antes e, por sinal, seu sorriso me encantou, de longe.- Sou..sou..uma duquesa do sul da França.Menti logo de cara, pois sabia que Cassiano não ia me querer se soubesse que eu era uma criada

da família real. Nos víamos, nos beijávamos e brincávamos com Aurora todas as manhãs ensolaradas deAracia, construindo uma união. Até que um dia, Andressa Luiza, a governanta, me pegou:

- Empregada insolente! - disse ela, me levantando pela orelha e me levando para longe deCassiano e de Aurora para sempre.

Chorei, chorei, chorei trancada naquela cela fria e assombrosa, até cair em um sono profundo.Acordei deitada na minha cama, no meu quarto, em São Paulo. Ao sair, ouvi o choro da minha mãe.

- Mãe, por que você está chorando?- perguntei.- Eu achei as fotos do casamento da bisa, que tinha perdido há um tempo – respondeu,

gaguejando.Quando peguei a foto da mão dela, fiquei em choque: meus bisavós eram Aurora e Cassiano,

príncipe e princesa de Aracia. 20

Page 21: VII Vivas Palavras

Erros irreparáveisJulia Abreu

Eu senti na pele a morte de meu irmão mais novo como uma bomba explodindo sobre meu corpo. Pelo menos cinco anoshaviam passado desde sua partida para o mundo desconhecido da vida pós-morte, porém cada dia a mais no tempo meperturbava de forma indescritível. Meu grau de atenção sobre tudo ao meu redor sempre foi baixo, e eu vivia constrangida, semsaber como foi que o maldito fogão explodira em Marcos. Bem que minha mãe dizia que eu era muito jovem para ser tão desligadado mundo em minha volta. Hoje em dia eu finalmente compreendo suas palavras, que tanto me irritavam.

Era uma manhã chuvosa, havia acabado de comer ovos mexidos, meu café da manhã predileto; apaguei a luz da cozinha efui para a sala. Não sei se foi intuição, ou se simplesmente meu raciocínio vindo a mil por hora, só sei que resolvi ler o jornal paradar uma atualizada em minha vida. Lá, encontrei um anúncio que me deu arrepios de felicidade e curiosidade. Físicos haviamdescoberto a máquina do tempo e estavam convidando cidadãos para fazer o treinamento. Me inscrevi, participei do treinamentoe me preparei para viajar no tempo. Eu, Adriana, estava determinada a voltar para a manhã em que Marcos se fora, parapossivelmente salvá-lo.

Acordei como se nada de tão importante tivesse acontecido, com uma vaga lembrança do buraco de minhoca, que explicavauma dorzinha de cabeça fora do normal. Era dia 2 de janeiro de 2000, a máquina havia funcionado mesmo! Desci vagarosamenteas escadas, como se aquele ambiente não fosse o que sempre estive acostumada. Andei em direção à cozinha e lá estava minhamão, que, como sempre, estava atrasada para o trabalho.

-Adri, preciso ir, por favor desligue o gás do fogão quando terminar de comer. Não esquece, você sabe dos riscos, filha!Eu nem respondi, pois estava muito ocupada, decidindo se seria um ovinho mexido ou um pão mesmo. Me contentei com

uma fatia de pão com requeijão, joguei o prato sujo na pia, apaguei a luz da cozinha e fui para o quarto, como se o gás nãoestivesse ligado. Era um sábado chuvoso e eu não tinha nada melhor para fazer do que assistir TV, como de costume. Peguei ocontrole, quando Marcos gritou, e eu lembrei que ele existia.

-Tô com fome! Faz um sanduíche?-Você já tem dez anos! Se cuida sozinho, moleque. Eu não sou babá!Ele andou cabisbaixo até a cozinha, mas eu não me importei. Sentia um cheiro estranho, mas minha preguiça me dominou

por inteira, até que foi interrompida pelo incessante toque da campainha. Enquanto eu estudava o trajeto mais curto até a porta,escutei o ‘’click’’ das luzes da cozinha e me lembrei do bendito do gás. Corri como um jaguar, mas tropecei no portal da máquinaque me trouxe ao passado e me perdi pelo buraco de minhoca.

Eu estava na sala, era 2 de janeiro de 2006. Avistava a cozinha do canto de meu olho esquerdo e, pela primeira vez, acordeipara a realidade. Eu havia matado Marcos, e fui estúpida o bastante de esquecer o que vinha escrito no manual de treinamento damáquina: Tentativas de mudar os acontecimentos do passado serão interrompidas. Eu revivi aquela manhã miserável sem motivo.Tudo por causa de minha falta de atenção. Como eu fui burra! Desiludida, me dirigi até a cozinha…

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Page 22: VII Vivas Palavras

Mais um não faria diferençaKevin Shimba Bengtsson

10 de setembro de 2001, nove horas da noite:Meu primeiro dia nesse serviço; estou ansioso. Fizeram-me manter um diário com anotações meticulosas. Que droga...

Bem, pelo menos vou poder dormir bem, especialmente por estar diante da maravilha que é a cidade de Nova Iorque.

11 de setembro de 2001, oito e quarenta e seis da manhã:Ouvi um barulho monstruoso. Deve ter sido apenas uma batida de carro; bem provável considerando o tamanho dessa

selva. Vou voltar à cama...

Nove e meia:“O maior ataque terrorista da história dos Estados Unidos aconteceu quarenta e cinco minutos atrás. Desespero

espalha-se pelo país. Os familiares mais próximos das vítimas sentem remorso e medo enquanto esperam notícias sobre os familiares e amigos.” Não posso acreditar. Minha pele está gélida, infestada de calafrios. O medo, o terror que sinto agora é infinitamente pior do que quando vivi este acontecimento anos atrás. Não apenas por presenciar, de novo, essa tristeza, mas por ter falhado. Eu falhei. A única coisa que posso fazer é tentar ajudar, porém minha esperança agora é mínima. Milhares já enfrentaram suas mortes.Nove e quarenta e cinco:

Não sei o que dizer. Sentado aqui no ônibus, sou o único com a tristeza evidente. Os rostos dos que se sentam ao meu redor estão tão imóveis, tão pálidos, parecem fantasmas de luto. Lágrimas fluem pelo meu rosto, não param de escorrer. Para todolado vejo inúmeras pessoas em angústia, todas sentindo a morte como se fosse própria. A cada olhar que dou às ruas vejo uma ambulância ou um caminhão de bombeiro, quantidade suficiente para cada pessoa em Nova Iorque. Não posso conter meu desespero diante dessa atrocidade, perdi minha vontade de viver; cada vez que me aproximo das torres, mais contemplo o suicídio.

Nove e cinquenta:Sento aqui em frente ao prédio de Lúcifer. Minhas mãos nem tremem mais, não sou mais humano. Vou tentar salvar os

presos dentro dos prédios em chamas infernais. Vou tirá-los de minha criação monstruosa.

Dez e meia:Fiz tudo que pude. Salvei a vida de trinta e três indivíduos azarados. Não, não são sortudos. Quase lhes causei a morte.

Eu sou o culpado pelo falecimento de três mil pessoas, e o sangue se amontoa em minhas mãos a cada vida que se vai. Essa operação que custou milhões (não que preço faça importância) para impedir esse ato de terror foi fracassada. Por mim. Criaram, após décadas, uma máquina do tempo para resolver problemas do passado e eu seria o primeiro a usá-lo. Eles me mandaram para esse ano de extrema tristeza e marcado pelo mal para fazer o bem, mas vão perceber, em dez anos, que me contratar foi uma decisão desastrosa, prejudicial à operação. Agora, só me resta sentar aqui e esperar o fim. Três mil morreram; mais um não faria diferença.

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Page 23: VII Vivas Palavras

E não me digas que não viste as floresLuiza Gundim

Se eu pudesse viajar para qualquer ponto no universo ou para alguma era desconhecida, com certeza não seria aItália renascentista. Nunca me interessei por pintores, escultores e construtores de igreja que passavam fome mas nãoparavam de pintar, esculpir, construir – tudo em nome da arte. O meu negócio é História.

Com o capacete na mão, eu aguardava aquele momento tão esperado. Estava desconfortavelmente sentada naantessala do laboratório, espremida entre dois membros da equipe. Do lado de dentro, os cientistas faziam os últimos ajustesantes da partida. Do lado de fora, um silêncio constrangedor prevalecia. Eu aguardava ansiosamente, porém com um pouco dereceio, o pico da minha carreira como historiadora. O resto do time, todos do sexo masculino, não parecia tão amedrontado.

Abriram-se as portas e uma fumaça malcheirosa invadiu o ambiente. Mandaram-nos entrar. Lá dentro, tudoparecia meio embaçado, como se alguém acabasse de sair do banho. Ordenaram que entrássemos na imensa, porém não tãoluxuosa, máquina do tempo. Assim que entrei, não pude deixar de reparar que conforto não fora a prioridade. Mais uma vezesmagada, eu esperava até que as portas fossem fechadas. Naquele momento, pensei: “Agora não há como desistir”.

Uma luz cegante e um barulho de motor foi tudo que percebi quando um movimento brusco tirou a máquina dolugar. Pelo que pude lembrar do breve treinamento, estávamos passando pelo buraco de minhoca que nos levaria ao Egitodurante o reinado de Ptolomeu IV. A nossa missão era recolher o máximo de informação possível sobre aquela era tãomagnífica. Eu mal podia esperar para conhecer o mundo que estava estudando desde que me formei na faculdade.

De repente, tudo parou: as luzes se apagaram e a nave freou bruscamente, atirando-me contra a minúscula janelade escape. De acordo com o treinamento, aquilo não era certo; alguma coisa tinha acontecido! Com o coração acelerado,procurei o Manual Prático da Viagem no Tempo, a bíblia dos viajantes.

Mas a nave retomou o curso, tão rápido quanto parara. A próxima coisa que percebi foi o meu despencar de umaaltura enorme. Caí em um lindo campo de flores. Ao longe, grandes montanhas pareciam alcançar o céu. Em frente, umasimpática casinha de pedra descansava sob o sol escaldante. Assim que recuperei o equilíbrio, perguntei-me se aquele seriamesmo o Egito que eu tanto aguardara. “Não pode ser,” comentou um dos homens da equipe.

Mas não estar no lugar certo era o menor de nossos problemas. “A máquina quebrou. Não há conserto,” lamentouo experiente mecânico que nos acompanhara. Estávamos presos em uma vila totalmente desconhecida. E ninguém sabia porquanto tempo.

Logo percebemos que acabamos por aterrissar na Itália, em um vilarejo pequenino, a 30 quilômetros deFlorença. Não poderia ser assim tão mau. Após o que me pareceu ser uma semana, conseguimos vender a máquina do tempopara um excêntrico chamado Leonardo. Sim, aquele Leonardo. Com o dinheiro da nave compramos a fazenda ondeaterrissamos. Passaríamos lá o resto dos dias aguardando o resgate.

Era melhor do que eu imaginava. Eu poderia viver para sempre naquele campo florido. Ah! As flores! Lindas eperfumadas flores, que tanto me encantam. Têm cheiro de terra e de mar, alegria e paixão. E lá vivemos por muito, muitotempo. Eu e as flores. 23

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Faraó de concretoMendel Schwarz

Em meio ao meu desespero e meu enorme desgaste físico, gritos de ansiedade levavam minha cabeça, agora ensanguentada, a pulsar,forçando uma dor que paralisava meu corpo. Até que tudo se silenciou. Uma mulher linda, de pele morena e olhos esmeraldas, assumiu o trono douradodesignado a ela, e todos se ajoelharam. Um dos dois eunucos que seguravam os meus braços se pronunciou, revelando uma voz estridentemente fina emmeio a tantos músculos.- Achamos esse homem praticando magia negra no meio do Cairo, rainha. Nós o capturamos e o trouxemos diante de sua presença para seu veredito.

– Quem é você, forasteiro?- Cleópatra pronunciou, com sua voz sensual.- Sou um menino qualquer, juro! Cientistas me treinaram para ser a cobaia de uma máquina do tempo, e por isso estou aqui! Não tem nada

de magia negra, não! – Respondi, trêmulo.- Além do mais, é louco!- Berrou uma egípcia seminua que esperava para assistir a minha possível execução.- Muita calma. Prendam-no. Amanhã o jogaremos aos leões. Isso há de me dar tempo- Retrucou a rainha.Me arrastaram até uma jaula; um pequeno rastro de sangue me seguia por onde eu passava. Finalmente, me encontrava na jaula onde o

cheiro de fezes dos meus vizinhos, os leões, impregnava o ar e a palha que coloria o chão da estrutura gélida do alçapão do palácio. Séculos pareciam terpassado, quando na porta da cela apareceu aquela mesma linda mulher que havia ordenado meu aprisionamento.

- Vem rápido.Ela enfiou a chave na porta e a abriu bruscamente, tomando minha mão junto da dela. A rainha me conduziu até sua câmara, onde me

atirou na cama.- Você não é mago. Você é só um menino. Sei sobre sua aparição. Conte-me tudo amanhã cedo. – ela deitou-se ao meu lado.O sol não apareceu na porta da sua janela aquela manhã, porém o desaparecimento da noite indicava a chegada de um novo dia.- Cleópatra, che- - Uma voz máscula enchia nossos dois pares de ouvidos dormentes. Julio Cesar projetou sua sombra grandiosa na cama a

qual dividíamos. Tal como a sombra, o Imperador projetava seu olhar intenso e raivoso sobre nossos corpos nus. E sem virar a cara ou sequer mexer osolhos, ele pronunciou lentamente, em tom elevado:

- Execute-o , dela cuidamos depois.Novamente, eunucos rapidamente escalaram a escadaria até o quarto no qual eu havia passado a noite e, como na primeira vez, me

arrastaram até a mesma jaula infestada pelo terrível odor, que dessa vez mais do que nunca cheirava a morte. Assim que a porta se fechou e os eunucosdesapareceram da minha vista, um homem de cabelos brancos desalinhados apareceu em minha frente e me encarou, com o auxílio de dois óculosredondos porcamente encaixados em suas orelhas. Por conta de suas vestimentas e linguagem quase moderna, presumia-se que este homem também tinhasofrido os efeitos da máquina do tempo.

- Meu nome é Albert, por favor, me acompanhe. Rápido. – Ele murmurou escandalosamente em quanto tentava achar em meio a sua sopade chaves, a adequada para a situação.

Achou. O senhor abriu a porta e, com incrível força, me ergueu em seu colo e me jogou para dentro de uma caixa estranha, muito diferenteda qual havia me transportado para aquela época. A caixa, ao meu ver, parecia uma versão mais velha da que eu havia adentrado posteriormente a todaessa confusão. A caixa balançou, tudo começou a girar e...

Acordei em minha cama. Olhei para o despertador, era o dia 25 de dezembro de 2011. O cheiro da morte ainda infestava minha roupa....Mas o suave aroma de um perfume delicioso ainda estendia seu odor por minha pele.

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CasamentosNicole Vladimirschi

Quem era essa pessoa estranha que olhava de volta para Juliana? Seu rosto era emoldurado por bordas de prata.Juliana mal reconhecia seu reflexo, as linhas profundas em sua testa, a tristeza dentro de seus olhos; o cabelo, que antes tinhavida e brilho, agora era descuidado em sua cabeça, branco e morto.

Juliana cobriu o espelho e acariciou um dos trinta e nove gatos que tinha. Amava seus gatos, eram a única coisaque lhe restava. Juliana começou a comprar um gato a cada ano desde quando era moça, quando tinha 23 anos, logo após ocasamento de Irineu e Rosa. Não aguentava mais aquela vida, não aguentava mais viver com seu erro; decidiu e foi ao InstitutoCientífico Brasileiro.

Dr. Charles estava lá, como tinha prometido dois dias antes, quando ofereceu a solução à Juliana. Ela entrou namáquina e sentiu uma corrente passar por seu corpo, como um choque de 300 volts. Porém, isso durou apenas um segundo,pois quando Juliana abriu os olhos, estava no Jardins. Perguntou a data a um homem que andava na calçada.

-Dia 8 de abril de 2011.Tinha funcionado! A máquina realmente levou Juliana de volta no tempo. Ela não tinha tempo para celebrar, pois

de acordo com sinos batendo em cima da igreja, já eram 11 horas da manhã e Juliana ainda não tinha cumprido o que tinha quefazer. Se direcionou à igreja Nossa Senhora do Brasil, estranhando a falta de carros voadores na rua. Abriu as grandes portas demadeira, mas não conseguiu se mexer quando viu todos os rostos direcionados à intrusa que acabara de chegar; ela. Como umímã, os olhos de Juliana acharam os de Irineu, que estava olhando de volta para Juliana.

-Não sou o tipo de mulher que estaria estragando uma ocasião dessas tão rudemente. Mas você, Irineu, não é otipo de homem que deveria casar com a mulher errada.

A igreja ficou completamente silenciosa, mas Juliana não ligava mais, ela estava finalmente fazendo o que deviater dito muito tempo antes.

-Não diga sim! Vamos embora juntos, podemos viajar pelo mundo como sempre planejamos, e realizar juntostodas as outras coisas que sempre sonhamos fazer! Irineu, eu sei que vamos ser felizes juntos, fomos feitos um para o outro.

Irineu olhou para as duas mulheres, sua esposa e a mulher que amara sua vida inteira.-Sim. Disse Irineu, com um brilho de esperança em seus olhos.

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2043Caroline Cassinelli

“Vamos lá!”, Ricardo disse. Eu estava olhando no espelho, depois de horas me aprontando – finalmente estavapronta. Eu desci as escadas devagar, pois não sabia como ele iria reagir. Eu estava vestida diferente do normal – de vestido, umacoisa que eu recusava vestir – normalmente, vestia uma calça jeans e uma camiseta qualquer. Mas aquele dia era importante.Ricardo finalmente havia sugerido que nós saíssemos para jantar e assistir a um filme depois. Eu sabia que eu deveria ter dito não– tinha que acabar a missão que me trouxera lá em primeiro lugar, mas era apenas uma noite, que diferença faria? E ele era muitolindo. Então aceitei, e lá estávamos, passeando pelas ruas de Londres. Nós nos conhecemos em um cafezinho em Picadilly Circus,no dia em que eu havia chegado no futuro. Ainda estava me acostumando e me acomodando nesta cidade estrangeira para mim.

“Aqui estamos.” O restaurante era simples, luzinhas ao redor inteiro do local. Mas antes de entrarmos, eu os vi.Gigantes homens vestidos de ternos e calças sociais pretas estavam correndo em nossa direção. Eu tinha que fazer alguma coisa,tinha que falar algo para proteger Ricardo, então tentei dizer :“Ricardo, eu te ...”. Mas antes de acabar, os dois homens já haviamnos capturado e a última coisa que eu ouvi foi meu nome. “Danielle! Danielle! Danielle...”

Quando eu abri os meus olhos, já estava de volta ao laboratório e eu conseguia ver a máquina. Levantei da cadeira,pois sabia que agora teria que voltar para 2011, de onde eu vim para cumpri a missão. Nesse segundo, reparei que não estavamais de vestido. Estava de calça, casaco e bota de couro. Putz, mas que originalidade. Eu ia entrar na máquina do tempo em5...4...3...2... “Danielle?”, Ricardo disse. “Eu não sei o que aconteceu. Onde estamos? O que você está usando?” Perguntou. “Ricardo,me desculpe. Por tudo. Nunca quis te machucar.” Ainda sentia a eletricidade passar pelos nossos dedos enquanto estávamossegurando as mãos. Naquele momento, o cientista, Gabriel, me disse que tinha que ir. “Ricardo, por favor saiba que eu te...” E piseino buraco de minhoca.

Acordei, lembrando em detalhe o meu sonho. Provavelmente porque eu estava tendo o mesmo sonho todas asnoites após o incidente. Já fazia um tempo em que eu havia voltado do futuro, mas eu não conseguia parar de pensar no queacontecera lá.

***Já era 2043 de novo. Bom, de novo para mim. Estava em Londres a trabalho, pedindo um chocolate quente em um

café, que me parecia familiar. Virei e, de repente , estava cara a cara com o Ricardo. Eu sorri e disse “Eu te amo”, pois sabia que euteria muito tempo para explicar.

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A CURA

O vento seco atormenta sua garganta, e em minha frente vê quilômetros e quilômetros de apenas o que resta da cidadede São Paulo. Prédios e casas parecem casas de terror, e para complementar, pessoas se arrastam pela cidade como zumbisansiando por sangue. O sol, agora mais perto da terra, parece queimar sua pele, e sua luz forte quase a cega. Inteirinha cobertapara se proteger do sol, pingos e mais pingos escorrem a cada segundo em seu corpo inteirinho. Está com calor, muito calor ecomeço a se senti-la abafada e eufórica. Seu estômago se embrulha e acaba por vomitar aquele almoço que se arrependera de tercomido. Isa olha pra Andrea e diz:

-Andrea, nós não podemos continuar desse jeito. Precisamos de água, comida e abrigo para repousarmos um pouco.-Não podemos! Você não entende?! Para sairmos deste inferno, nós precisamos continuar andando. Temos apenas três

horas, e se...”. Andrea foi felizmente interrompida.-Amor, acalme-se! Nem completamos nossa missão ainda! Sem aquela cura nós não podemos voltar. Devemos isso ao

nosso país, portanto não podemos desistir! - conjecturou André, namorado de Andrea.André, apesar de estar extremamente cansado, gentilmente pegou Andrea em seu colo. Assim, os três partiram para o

local onde encontrariam a resposta, onde encontrariam a cura do câncer.Chegaram ao local onde foram instruídos a ir. Andrea lentamente saiu do colo de André, que a havia carregado até

chegarem. Desesperada, Andrea olhou para o seu relógio. Tinham 40 minutos para partir. De cara a cara com a enorme eempoeirada porta de metal, Isa digitou o código que abriria a porta. Os três começaram a correr. Sem fôlego e com o batimentodo coração acelerado, chegaram ao fim do corredor e ficaram em frente a uma sala redonda. No centro da sala, apenas umapequena caixa, que mesmo pequena, brilhava e transmitia um senso de glória.

Coisas imagináveis começaram a correr no pensamentos dos três cientistas. Queriam respostas, conclusões e um pontofinal nessa missão suicida. Encararam-se, e após, lentamente encaram a caixinha. André remove a chave que estava penduradaem seu pescoço e perfeitamente a encaixa na fechadura. Os segundos perceptivamente passam mais devagar e, então, após girara chave até o fim, ele levanta a pequena tampa da caixinha. Em choque, Isa grita ao ver que a caixa estava vazia, que ela nãocontinha nada. A porta da sala redonda rapidamente se fecha. Tinham caído em uma armadilha.

E lá estavam os corajosos cientistas, presos no ano de 2070.

JULIA RIBEIRO

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A Inveja MataLaura Fiuza

É incrível como os tempos mudam tanto, não é? Minutos atrás eu estava no meu presente, no meu canto, no meuconforto de vida, quando de repente vim parar aqui. São Paulo não mudou quase nada desde a época em que os meus pais seconheceram. Mas ainda tem aquele ar esquisito ao qual não estou acostumada. Eu vim parar num café que eu conheço muitobem. O cheiro de café forte, igualzinho, o Senhor Ernesto ocupado no caixa. A diferença é que ele está 28 anos mais novo, maismagro, e sem nenhum sinal de me reconhecer. Um casal estava rindo alto, sentado num sofá, como se estivessem lá há horas. Amulher era bonita, alta e morena, enquanto o homem tinha olhos azuis, que combinavam perfeitamente com seus cabelos loiros.Claramente, era o casal mais bonito do café do Ernesto, e logo percebi que eles eram os meus pais.

Por que o meu pai teve que engordar tanto? A risada da minha mãe ainda dura mais do que o normal. Vi por que elesgostavam tanto daquele lugar. Devia ser onde tiveram o primeiro encontro! Olhei para o meu relógio, feito por um colega meu dafaculdade de Ciências. Mudei a data e apertei o botão do meio, fazendo com que eu pudesse ver os meus pais jovens e felizes comessa nova e secreta tecnologia. Mas esse não é bem o meu objetivo. Meu propósito nessa viagem do tempo era ir para o dia emque os meus pais foram assassinados, e fazer com que isso não acontecesse.

De repente, tudo começou a girar. Nesse momento, eu mentalmente agradeci o meu colega por ter descoberto essainvenção. Então, eu apareci no banheiro da festa de 15 anos de casamento dos meus pais. Uma música clássica do Rick Astleyestava tocando e todos os adultos estavam dançando, felizes. Dessa vez, ao invés de estar na pista de dança, acompanhando osconvidados, decidi já ir me adiantando para o estacionamento onde os meus pais chegariam.

Abri a porta de saída da festa e me deparei com a minha madrinha. Ela era uma das melhores amigas da família econhecia meus pais há anos. Ela me cumprimentou docemente, e estava a caminho do estacionamento também, e rapidamentedecidi fingir que estava indo para a outra direção. Por que a minha madrinha iria ao estacionamento? Eu me lembrei de algunsboatos de que ela e o meu pai já haviam namorado na adolescência, antes dele conhecer minha mãe. Eu logo ouvi três tiros e eratarde demais. O relógio do tempo só funcionava 3 vezes, e eu já tinha usado as outras duas. Tinha que usar o última para voltarpara o presente.

Voltei para 2011, no dormitório da universidade, onde deixei tudo. Porém, dessa vez, ouvi uma batida na porta. Estranho,eu não estava esperando ninguém. Quando abri, lá estava ela. Minha madrinha, pronta para me matar também.

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De novo?Pablo Arenas

1, 2, 3, AAAAAAAH!***

“O que foi isso?”- pensei, ao sair da minha cama, para ir ao café que tinha no hotel em que eu estava. Ainda bem que já haviamcomeçado as férias. Eu já estava muito cansado do trabalho cotidiano, que é tão desgastante. Naquelas ferias eu queria fazer alguma coisaextrema, nova, e perigosa.

”Perfeito!”- eu disse, quando vi um anúncio que dizia:

"Estamos procurando pessoas que querem ir ao espaço. Não é preciso nenhum tipo de sabedoria sobre o tema. Teremos aulas bem aqui,no Hotel Extremidades, onde todos os seus sonhos serão realizados.“

“Nossa! Eu quero muito fazer isso!”- falei, ao me aproximar da recepção para perguntar por mais informação. A recepcionista falou queera só ir para as aulas que iam começar dali a duas horas, que os professores iam ensinar para mim como ir ao espaço...e sobreviver.

Quando cheguei na aula, o professor falou como ia ser difícil o treinamento, tanto fisicamente como também mentalmente, porque eledisse que nós teríamos que nos preparar para qualquer coisa.***

“Putz... Já passei por tanta coisa nesse treinamento, eu acho que estou pronto, professor”, eu disse. Fiquei feliz quando o instrutor medisse que de todas as pessoas que haviam feito o curso, eu era o mais preparado para ir ao espaço. Logo depois, ele me falou que nós íamos sairno dia seguinte. Nessas 24 horas, eu aproveitei e liguei para toda a minha família e para os meus amigos, para me despedir.***

Já haviam passado 5 horas desde a saída da Terra. Estávamos a 500,000 km do planeta. Daí, de repente, apareceu o buraco negro,esplêndido. Mas não tínhamos tempo para apreciar a beleza do buraco. O instrutor começou a contar: 30, 29, 28... Já estava na hora de apertar obotão que me ia levar ao futuro, passado, quem sabe. Comecei a rezar, estava com medo...

3, 2, 1, AAAAAAAAAH!***

“O que foi isso?”- pensei, ao sair da minha cama, para ir ao café de manhã que tinha no hotel em que eu estava.

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ALERTA! ALERTAIsa Ribeiro

“ALERTA! ALERTA!” Repetia a máquina. Já não sabia o que fazer e entrei em pânico. Eu estava em uma máquina do tempo, mas semsaber em que tempo eu estava, prestes a cair. E de repente, boom! Acordei com meu braço inchado, talvez eu o tivesse quebrado,não sei direito. Eu olhei ao meu redor e vi, vi o que eu não acreditava ser humano. Escravos por toda a parte, em agonia e medo.

Senhores do engenho vinham me olhar de perto, como se eu e minha máquina fossemos uma aberração da natureza.Vieram guardas de toda a parte, já apontando suas armas para mim.

“Espere! Não atirem! Eu não pretendo machucá-los, eu vim em paz!” Gritei, desesperadamente.“Diga-nos teu nome!” Um guarda gordo e baixo falou, dirigindo-se a mim.“Meu nome é Lucas, e eu sou da força aérea, grupo alfa”. Eu o respondi.“Bom, venha conosco, nosso senhor gostaria de ter uma palavrinha contigo”, o mesmo guarda falou, com um ar de

superioridade.Então, lá fui eu, sendo praticamente arrastado pelas enormes plantações de cana, onde os escravos trabalhavam no

sol o dia inteiro e sendo torturados pelos guardas. Que coisa absurda, fazer isso com um ser humano é tão errado quanto tirar a vidade alguém inocente. Deparei-me com uma casa enorme, tão grande que era por intimidar.

“Só fale quando o Sr. Manuel falar contigo, e se ele pedir, responde, está entendido?” Um outro guarda forte e altofalou para mim, apertando mais ainda meu braço. Eu fique calado e balancei a cabeça que sim. A porta vermelha e grande se abriu,senti que não era muito bem-vindo.

“Ah! Olha quem finalmente chegou!” - disse Sr. Manuel, tentando ser amigável.“O que você quer? Eu não fiz nada de errado! Não era para eu estar aqui, eu nasci em 2011, e estava no ano de 2051”

- eu lhe respondi, tentando sair dos braços dos guardas.“Rá! Como és engraçado, nós estamos no ano de 1646. Pare de falar bobagem, eu não gosto muito de brincadeiras”.“Mas isso não é impossível, sabia? Se você tiver uma máquina forte o suficiente, você consegue entrar no buraco de

minhoca e pronto, não estou mentindo” - eu respondi, tentando ser o mais claro possível.“Sabe o que és? Um pecador, um traidor da confiança de Deus, e por isso, terás de compensar Deus com teu esforço

a mim, e só estarás livre de todos os pecados em tua morte. Não te preocupes, na certeza de que ele terá te perdoado até lá” - eledisse, tentando não rir da minha cara. O que eu poderia fazer? Não tinha consulado, não tinha governo brasileiro, não tinha exército.Eu estaria preso lá para o resto da minha vida. A não ser que eu conseguisse correr até minha máquina sem ser visto, isso mesmo,eu consigo!

Ao anoitecer, consegui arrombar a porta de onde eles estavam me prendendo. Corri rapidamente até minhamáquina. De repente, ouvi assobios e gritos, pedindo ajuda porque um escravo estava fugindo. Entrei na minha máquina e fui, fuiembora daquele lugar malévolo.

“ALERTA! ALERTA!” Repetia a máquina. Não acredito, de novo não. Não é possível. Eu só quero ir para casa.

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Rosas dos VentosAdriana Kim

- Olha mamãe, que flor linda! –

exclamava uma menina ao correr na direção de

sua mãe, carregando consigo uma linda rosa

vermelha.

Sentada no banco, fixava meu olhar

nas mãos da menina; via pétalas grossas e

felpudas, cobertas por uma camada vermelho-

sangue. Duas gotas de lágrimas escorriam pelo

meu rosto, inexpressivo. Em meus pensamentos,

a palavra rosa ecoava... Não sabia o porquê,

mas sentia remorso por não estar com minha

mãe no momento. Um segundo se passou e

sentia uma intuição perturbadora por não ter

domínio de minhas memórias. Me perguntava se

era um sentimento ou apenas um pensamento. A

cena de despedida anos antes de viajar para o

futuro brotou em minha cabeça. Coloquei a mão

no bolso e tirei um patuá, um sachê de pétalas

rosas com um perfume familiar, que carreguei

durante toda minha viagem, sem ter me dado

conta.

Anos antes da viagem, tivera somente

três paixões: Física, minha mãe e uma estranha

afeição por rosas. Vivia cuidando do meu

canteiro, imaginando a felicidade de minha mãe

em receber as belas rosas de presente, sua

segunda paixão em sua vida, depois de mim, é

claro. Ao crescer, passei anos estudando nas

melhores universidades, era fascinada pelas

teorias do inglês Stephen Hawking em relação à

máquina do tempo. Quando finalmente

anunciaram um programa experimental de

viagens no tempo, não consegui pensar em mais

nada, tive que me inscrever, pois, afinal, era uma

oportunidade única!

Recebi anos de treinamento e,

segundo o cientista Rogério, estava preparada

para ajudar a revolucionar o mundo da Física!

Me senti horrivelmente egoísta ao me despedir

de minha mãe, por privá-la de minha companhia

por tanto tempo, um tempo ainda indeterminado.

Assim que a vi chorar, pensei se deveria mesmo

continuar. Não queria que ela se sentisse

abandonada novamente. Mamãe nunca mais

fora a mesma desde que papai morrera, mas eu

não podia deixar aquela oportunidade escapar!

Me lembro perfeitamente de quando ela se

aproximou de mim e me deu um beijo no rosto ao

me entregar uma rosa. Chorei. A saudade era

tanta que mal conseguia conter meu pranto. Dei

um forte abraço de despedida e sussurrei em

seus ouvido antes de partir:

-Até logo, mamãe.

Estaria mentindo se falasse que não

havia gostado da viagem ao futuro, pois ela foi

simplesmente incrível! Mal conseguia acreditar

em meus olhos, não sabia mais distinguir a

realidade da ficção! O impossível havia se

tornado possível. Passei anos pesquisando os

avanços da tecnologia e estudando fatos que

antes seriam considerados inexplicáveis. Fiz

descobertas magníficas e, quando havia

chegado meu prazo final, admito que se não

fosse a saudade de ver minha querida mãe, não

teria voltado nem que me obrigassem a isso.

Não reconhecia o laboratório obsoleto

quando cheguei. Chegava a me questionar se

estava mesmo no presente. Rogério, o físico que

havia criado a máquina, logo me reconheceu.

Falei rapidamente a ele das minhas descobertas,

pois queria era mesmo me encontrar com minha

mãe, não perder meu tempo. Disse a ele que

precisava urgentemente vê-la.

– Eu a levo até ela, mas em vez de

passarmos na sua casa, vamos ao hospital –

respondeu Rogério, seriamente, para o meu

desespero.

– Hospital? Mas eu quero ver minha

mãe! – exclamava desconfortada ao segui-lo até

o carro, que me ignorou durante o percurso todo.

Na sala de espera, ansiosa por tentar me lembrar

de uma vida que já vivera e de que não me

lembrava mais, escutei meu nome sendo

anunciado, enquanto uma enfermeira me

autorizava a entrar. Diante de meus olhos,

incrédula, minha mãe repousava em uma cama,

que ao lado um buquê de rosas descansava. Me

aproximei sem saber o que estava acontecendo.

Inconscientemente, peguei uma rosa e a

posicionei no rosto de minha mãe, como se fosse

acariciar sua face rósea com suas pétalas,

esperando seu despertar. Logo percebi do que

tudo aquilo se tratava. Espantosamente, minha

mãe abriu seus olhos como se despertasse de

um sonho lindo, voltou à vida ao sentir o aroma

do perfume de rosa e subitamente a esmagou

até que todas as suas pétalas estivessem

amassadas e espalhadas pelo chão.

– Ela faz isso todos os dias... É como

se a rosa a despertasse de seus sonhos – Dizia

a enfermeira, ao olhar para o chão.

Voltei a fixar meu olhos... Olhava,

sem acreditar no que via. Lágrimas escorriam de

minha face, mas era a culpa que eu sentia por

dentro que me atormentava dia e noite. Sentava

naquele chão frio, onde as pétalas rasgadas me

rodeavam. Foi exatamente nesse momento que,

pela primeira vez, presenciei o sentimento de

abandono.

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Uma Vida Nova

André Joaquim

Enquanto fui caminhando para o fundo do laboratório da NASA, estava viajando em minha mente,pensando em como deveria ser o passado. Eu era o próximo a utilizar a nova máquina do tempo, duas semanasdepois da primeira viagem. Não estava nervoso, nem tremendo, nem suando, apenas adivinhando como seriameu mundo uns 600 anos atrás. Eu sabia que, depois de entrar no passado, não haveria mais volta, mas eu estavamuito ocupado para pensar nisso. Ocupado pensando e refletindo o meu futuro, passado da humanidade.

Quando entrei na nave com o acelerador de partículas, perdi total noção do tempo, espaço, temperatura,olfato, visão, e tudo que estava acontecendo. Apenas lembro que em um pequeno instante estava na margem deum rio enorme. “Está mesmo acontecendo”, pensei, enquanto avistava pequenas pessoas atravessando umaponte. “Estou mesmo na Idade Média”! Só sabia que eu estava em alguma metrópole no século XV. Eu entrei nomeio de um típico mercado da época. Vendedores desesperados gritando para fazer propaganda de suasmercadorias, enquanto homens e mulheres se esbarravam, tentando passar depressa. Vi, à distância, a catedral deNotre Dame e as águas claras e limpas do rio Sena, onde pequenos e grandes barcos passavam transportandofranceses medievais para todos os cantos da cidade. Músicos tocavam nas ruas, alegrando todos que passavam. Aspequenas casas feitas de madeira e teto de palha fizeram meus olhos lacrimejarem de tanta emoção e beleza. Eucuriosamente caminhava, admirando as vivazes vistas francesas.

Depois de muito turismo, senti uma mão delicada dar dois toques em meu ombro direito. Era umacigana, falando um francês muito rápido. Ela estava pedindo dinheiro, ou comida, acho. Eu timidamente falei quenão tinha nada e virei para ficar longe dela. Essa cigana não era encantadora como a do “Corcunda de NotreDame”. Mas, de repente, enquanto eu virei para longe dela, muitas ciganas apareceram, me cercando no meio damultidão francesa, que também olhava para mim. Foi quando eu finalmente me dei conta do que estavaacontecendo. Depois de três horas preparando-me para aquele momento e vestindo minhas roupas característicasà época, eu havia me esquecido de tirar o relógio. As ciganas estavam doidas por ele. Eu não poderia dá-lo a elas,era herança do meu pai antes de eu partir para o passado.

Sem saber o que fazer, corri para a direção em que menos havia ciganas rezando para poder despistartodas elas. Finalmente, consegui abrir uma distancia confortável, e foi quando me escondi debaixo de uma pontenas margens do rio Sena. Acho que era lá que ia passar minha primeira noite mesmo. “Ufa! Que dia!”, eu penseipara mim mesmo, enquanto deitei num local limpo e seco. Minha aventura acabara de começar.

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Estava extremamente jubiloso, havia sido altamente treinado, conhecia cada pequenodetalhe da máquina e também do que eu encontraria lá. Meu dia havia chegado, e com ele, o meusonho estava prestes a se materializar. Estava pronto para viajar no tempo, prestes a entrar nomisterioso “buraco de minhoca” que vinha atiçando minha curiosidade havia dez anos. Uma criançana véspera de Natal não poderia ficar mais curioso e ansioso como estava naquele momento. Iriafinalmente descobrir o que havia do outro lado, o que encontraria na outra realidade, na outra vida.

Não queria viajar para o futuro, pois tinha medo dele não ser o que pensava; tinha medoque o futuro fosse pior do que o presente, cheio de sofrimento, bombas e outros aspectosindesejáveis a mim e a toda a população do presente. Então, minha única alternativa seria viajar parao passado; ainda não tinha tanta certeza da data em que voltaria, mas minha incerteza não duroumuito. Como um canhão prestes a bombardear seu inimigo, veio a mim essa ideia, voltaria ao tempodo rock – “Elvis Presley, lá vou eu”. Digitei rapidamente a data, 8 de julho de 1962.

A viagem pode ter sido longa, mas para mim foi como um piscar de olhos. Lá estava,frente a frente com o famoso Rei do Rock, cercado por uma multidão que se vestia estranhamente,mas logo me lembrei de que o estranho lá era eu. Fiz o possível para camuflar-me diante de todos osfãs. Arregacei minha camiseta, tirei meu sapato e atirei meus cabelos para trás. Presenciei asprimeiras três músicas, Jailhouse Rock , It ’s Now or Never e Always on My Mind.

De repente, quando o último toque da bateria veio a encerrar a música e a iniciar os gritoshistéricos dos fãs, eu percebi que uma parte de mim tinha ido embora: estava indo de volta ao meuantigo presente. Senti algo estranho, algo estava muito errado, não estava mais lá e não haviachegado a lugar nenhum. Era como se eu estivesse parado no meio do tempo, flutuando nas nuvensdo presente e do passado. Escutava ecos de todos os lados. De um lado, os gritos histéricos, do outro,o desespero de meus colegas de trabalho. Diziam eles que não voltaria mais, que a máquina haviaq u e b r a d o e n ã o t i n h a r u m o d e v o l t a .

Aqui estou eu, agarrado ao último resquício de memória, aguardando o retorno ou o fim.

Always on My MindBruno Jacob

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Um “errinho de cálculo”Daniel Almeida

Nós confiamos nas mentes mais brilhantes do nosso mundo. Confiamos em suas teorias, em seu

conhecimento vasto sobre o nosso universo. Porém, humanos cometem erros e, no meu caso, esse “errinho” pode

acabar trazendo a minha morte.

Vamos voltar um pouco. Alguns dias atrás, eu fui escolhido para fazer uma viagem- não uma viagem

qualquer, uma viagem no tempo. Eu tinha me inscrito em um programa para fazer um experimento, e depois de três

meses de treinamento, me encontrava na frente do que é chamado de “máquina do tempo.” Tenho que admitir que

eu não me lembro muito de nada depois disso, mas, provavelmente, depois de terem acionado a máquina, eu

acordei deitado no chão, o sol raiando nos meus olhos.

Olhei em volta. Nada, Chequei meu relógio. Paralisado. Para todos os lados, eu só via grama, quilômetros

de grama. Comecei a me lembrar sobre o que eu tinha que fazer. Coletar amostras , tirar fotos e esperar. Eu tinha

24 horas para realizar os meus deveres e aí “voltaria” para o presente. Tirei a câmera do meu bolso. Ela parecia

funcionar. Me levantei e comecei a andar. Foi quando eu ouvi um zumbido. Um zumbido não, um ronco de motores.

Olhei para a minha esquerda e havia seis seres, montados em motos, vindo em minha direção.

Comecei a correr. Alguma coisa sobre eles me dava medo. Talvez fosse o fato de eu não saber o que eles

eram. Talvez fosse a sua velocidade, vindo em minha direção. Talvez fosse o fato deles estarem carregando

machetes Eles estavam se aproximando e eu sabia que isso não era exatamente “bom.” Decidi parar de correr e

me virei em direção a eles. Eles não diminuíram a velocidade; todos meus instintos diziam para eu correr, vendo em

retrospectiva, eu deveria ter feito isso. O ser mais próximo a mim erguia alguma espécie de bastão e, antes de eu

conseguir dizer um simples “oi”, o bastão atingiu minha cabeça e tudo ficou preto.

Quando acordei, estava amarrado, e já era noite em algum tipo de floresta. Foi quando percebi que eu não

estava em 1842, em Londres, mas em um passado recente em algum lugar na África. E esse “errinho” de cálculo

que me trouxe para cá pode acabar com a minha vida.

Os homens que haviam me capturado provavelmente estavam decidindo o que fazer comigo. Eu só tinha

alguns minutos antes deles perceberem que eu estava acordado. Olhei em volta, tinha uma faca a dois metros da

minha direita. Rastejei até ela e comecei a tentar cortar as cordas que prendiam as minhas mãos e pernas. Olhei

para os homens, eles ainda estavam discutindo quando eu me soltei. Levantei do chão, faca em mão, e

cuidadosamente comecei a fugir. Justamente neste instante os homens notaram que eu tinha escapado. Eles

gritaram enquanto começaram a me perseguir.

Aqui é o cadete 58 e se você estiver ouvindo essa mensagem saiba que eu estou fugindo dos homens que

me capturaram.34

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O caminho para o novo mundo Isa Besborodco

Não aguentava mais tanta lição de casa, leitura e trabalhos para fazer em um fim de semana só. Minha vontade era de chorar. Era umsábado de manhã, estava no Guarujá, passando o final de semana com a minha família, mas não estava dando para aproveitar, porque a única coisaque passava pela minha cabeça era a enorme quantidade de coisas que eu precisava fazer. Todos foram para praia, decidi ir junto, e lá me deiteipara tomar sol. Enquanto eu estava deitada com meus olhos fechados, eu imaginava como seria melhor se o tempo avançasse uns vinte anos, se nósfossemos para o futuro. Pensei, “nossa, até lá já não vou mais estar estudando, não vou ter nenhuma preocupação, que delícia!” Então decidi ir daruma caminhada na praia, fui até a beira do mar e comecei a andar. Cheguei em um lugar na praia, maravilhoso, tinha umas pedras que eu escalei etinha uma vista linda para o mar. Sentei-me e fiquei olhando para o horizonte. Já era meio-dia, achei melhor voltar. Eu estava sentada no pontomais alto, olhei para o lado e avistei um buraco bem espaçoso. Do jeito que eu sou, decidi “analisar.”Então entrei.

Naquele momento senti um frio na barriga tão grande que parecia que eu estava caindo do ponto mais alto de uma montanha russa. Emum piscar de olhos, pisei no chão. Era um lugar diferente, um lugar curioso e interessante. Era um lugar tão grande, que parecia que nunca iriaacabar, e cada uma das janelas mostrava a vista de um lugar diferente do mundo. Até que era bonito. Era tudo tão tecnológico que até meassustei. Andei mais um pouco, e a cada passo que eu dava, algo novo me surpreendia. Quando percebi, eu estava em um lugar que parecia umestacionamento, e lá havia umas bicicletas automáticas. Subi em um delas e continuei analisando aquele lugar, aquele lugar misterioso.

“Mãe,”chamei quando percebi minha solidão. Mas nada. “Pai,”e nenhuma resposta. Estava começando a me preocupar, chamei pelos meusavós e pelos meus irmãos, mas a única coisa que eu escutava era o eco da minha voz. Larguei a bicicleta e comecei a correr, corri como nunca haviacorrido em toda minha vida. Até que de repente eu avistei uma multidão. Decidi pedir informação, mas quando eu cheguei perto daquelas pessoas,parei e olhei. Todas elas seguravam um celular e olhavam para ele como se fossem hipnotizadas, e nas mesas no canto das passagens, todosestavam com laptops.”Nossa, que lugar é esse, quem é essa gente obcecada””? Corri para a pessoa mais próxima que eu vi, cutuquei-a e disse “porfav...”. Não consegui completar minha frase, pois fui interrompida. “Não está vendo que eu estou ocupada?,” disse a mulher, e seguiu em frente.Fui para uma das mesas onde tinha um jovem que aparentava ser simpático. “Com licença, você poderia me ajudar?,” perguntei, mas o jovem nemtirou o olho do computador.

Desisti e fui me sentar em um canto. Não sabia o que fazer, eu estava sozinha, em um mundo completamente avançado, com pessoas queeram incapazes de tirar o olho de seus celulares, laptops, e outra coisas que nem eu sabia o que eram. Olhei abismada, e pensei: “Nossa, isso é milvezes pior do que vivem as pessoas da minha época, até mesmo as pessoas ao meu redor. Muitos não param de mexer e tirar o olho de seuscelulares, até eu às vezes tenho essa mania. Mas o que é esse lugar? Uma coisa que eu nunca vi na minha vida”. E só continuei olhando. Olhei parauma parede que parecia uma tela de computador de, sei lá, acho que de mil polegadas. Nela vi a data, o horário e a temperatura. Minha nossa, eradia 5 de maio de 2031. Corri para aquela tela, e minha imagem estava sendo refletida, como se fosse um espelho. Me olhei e falei alto, sabendoque ninguém ia me olhar, “20 anos, passaram-se 20 anos, mas como assim? Agora há pouco eu estava na praia com a minha família. 20 anos e eu nãomudei nada, estou da mesma altura, meu cabelo do mesmo comprimento, meu rosto sem nenhuma diferença”. Aquele segundo, foi o momento emque eu me arrependi de pensar que seria bom ir para o futuro. Me lembrei de tudo, de andar na praia, olhar a vista,e entrar no buraco. Entrei emdesespero.

De repente, uma mulher com mais ou menos uns 30 anos veio falar comigo. “Finalmente”, pensei. “Onde fica um lugar que parece nãoacabar e tem umas janelas com vistas diferentes?” Perguntei a ela, achando que se contasse minha história ela me acharia louca. Tentei seguir ocaminho que ela me explicou, pois não me lembrava de cor. Passei por um monte de lugares, até que finalmente cheguei no primeiro lugar do “novomundo.” Procurei um buraco, aquele no qual eu havia caído. Bati nas paredes com ansiedade e desespero, mas nada. Chorei, chorei demais e medeitei no chão. Até que finalmente, em uma das paredes, encontrei uma alavanca e puxei. No final da parede, tinha um buraco. Fiquei com medo deentrar, mas pensei : “existe lugar pior do que esse em que eu estou agora?” Pulei, e em outro piscar de olhos eu estava nas mesmas pedras em queeu havia estado anteriormente. Corri, corri achando que minha família estava desesperada atrás de mim. Quando a encontrei, eu os dei um abraçoe perguntei que horas eram. Era só meio dia e quinze. “Loucura”, eu pensei, “achei que eu havia estado naquele buraco por algumas horas”. Acheimelhor lhes contar a história depois. Fui para o apartamento e nunca fiquei tão feliz na minha vida de pensar que eu tinha tanta, mais tanta coisapara fazer, pois a única coisa que eu não queria era o futuro.

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O Único

Leo Sabó

No dia 22 de março de 1990, eu fui o único nomeado. Na hora, não sabia por que havia sido escolhido, mas foiuma honra ser selecionado pelo diretor da NASA. Dias depois de ser apresentado pelo administrador da NASA, me contaramo que eu iria fazer. Eu seria o primeiro ser humano a usar uma máquina de tempo verdadeira. Sempre imaginei, quandocriança, voltar no tempo. Agora sou um homem de 23 anos e, finalmente, meu sonho vai se realizar. Minha condição desaúde estava muito boa; não tinha doenças e meu preparo físico era de alta qualidade.

Finalmente, chegou o dia da minha viagem. O dia que eu mais esperava chegou. Fui me aproximando da máquinae, a cada passo que andava, ficava mais e mais ansioso. Era uma coisa tão espetacular de perto, luzes brilhantes, sonsdiferentes, e aquele cheiro de um carro novo. As portas abriam e meu coração começou a bater sem parar. Entrei namáquina, coloquei uma data e apertei o botão vermelho escrito ‘GO’!

De repente, uma luz forte bateu nos meus olhos e, quando os abri de novo, eu estava em 1950, o ano em quemeus pais se conheceram. Eu fui correndo para a faculdade dos meus pais, para ver como foi que eles haviam se conhecido.Ali os vi, estavam sentados debaixo de uma árvore enorme, conversando sobre a vida. Minha mãe era alta, com cabelosmorenos, brilhantes, enquanto meu pai era um homem mais tímido, e sempre estudava sozinho. Eu fui chegando mais pertopara ver o espetáculo deles, quando de repente Rafaela, minha mãe, olhou para cima e me viu indo na direção deles.Parecia que ela estava me estudando; olhava para cima e para baixo, me observando, e depois de um tempo abriu a bocapara me perguntar o que era o objeto estranho que eu estava carregando. Era meu telefone celular, tinha completamenteesquecido de que não tinha sido inventado ainda naquela época. Comecei a transpirar, o que iria dizer para ela!? Elapercebeu que eu estava nervoso, então parou de questionar, mas continuou falando comigo e não com o José, meu pai.Tudo estava dando errado. Rafaela esqueceu José completamente e saiu comigo. “Ahh tudo bem,” pensei; nada poderiaacontecer.

Passou um dia depois do incidente com Rafaela e, por enquanto, nada parecia ter mudado. Fui tomar um banho e,quando olhei no espelho, vi que eu estava desaparecendo! Meu corpo não estava mais com a minha cor de pele natural,estava virando transparente. Não sabia por que isso estava acontecendo. Iniciei o meu processo de relembrar o que poderiater causado aquilo e, instantaneamente, lembrei que no dia anterior a ‘minha mãe’ se apaixonara por mim, e não por meupai.

Imediatamente fui correndo para José e contei tudo o que acontecera. Ele ficou abalado com essa historinhaminha, mas já tinha formulado um plano para conquistar a Rafaela. José ligou para ela e marcou um encontro. Chegamos aorestaurante e eu estava mais transparente que antes, parecia um fantasma. José trouxe flores e chocolates para a amada eela adorou os presentes. Os dois começaram a conversar. Funcionou! Estava normal de novo! Saí correndo para a máquina,para voltar para 1990 e não estragar o passado.

Cheguei na máquina, pus a data e apertei ‘GO’. A luz me paralisou de novo e, quando abri os olhos, estava tudonormal, estava vivo, estava em 1990. O projeto da NASA fechou por causa de problemas iguais ao meu de se afetar o futuro,e até hoje, dia 10 de dezembro de 2037, sou o único homem que já viajou no tempo.

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Reescrevendo o passadoLiv Wang

Acordei ainda sonolento, com o despertador marcando 6 horas. Fui ao banheiro e, enquantoescovava meus dentes, Carolina me abraçou pelas costas. Como assim? Estava sonhando? Olhei-me noespelho novamente. Vi um rapaz moreno, olhos cheios de energia, corpo atlético: eu, quando tinha 24 anos!Então a máquina do tempo tinha dado certo! Estava novamente nos braços da minha amada, ela sepreparava para ir à faculdade, seu último ano em Economia. Perguntei que dia era e ela simplesmente riu edisse: “- Véspera de meu aniversário. Amanhã estarei mais velhinha, com 22 anos”.

Tão linda... Carolina era magra, com pernas de bailarina, seu cabelo castanho bastante fino, batianos ombros, com uma franja que insistia em cobrir seu delicado rosto. Seus olhos eram cor de mel, medavam arrepios. Como eu sentia saudades daquele olhar repleto de amor! Ela saiu correndo, dizendo queestava atrasada para sua aula, me deu um beijo rápido, sem que eu pudesse dizer o quanto a amava.

Não tinha tempo a perder, liguei para a polícia, em denúncia anônima, para que fosse averiguar acasa da Rua Nicarágua, 200. Era lá que estava o maníaco que no dia seguinte iria explodir a faculdade,matando mais de 20 funcionários, entre eles o amor da minha vida, Carolina. Não era justo uma pessoa tãobondosa, com tanto futuro pela frente, ter sua vida interrompida. Após sua morte, no dia de seu aniversário,nunca mais fui o mesmo. Tornei-me alcoólatra e consumia drogas freneticamente. Era o que eu fazia paratentar amenizar a dor e o vazio que ficaram no meu peito após sua morte.

Dediquei-me intensamente ao trabalho, já trabalhava no mercado de ações e me tornei ummilionário. Com 34 anos, tinha conquistado tudo, todos os bens materiais, mas simplesmente não queriamais viver. Com todo dinheiro acumulado, procurei um cientista que estava desenvolvendo a máquina dotempo para que pudesse evitar a tragédia. No final do dia, com Carolina ao meu lado, estávamos assistindoao Jornal Nacional. Uma chamada mostrava que tinham pego um maníaco, com um arsenal de bombas, cartade suicídio, filmagens, dizendo que iria atacar a Faculdade, para acabar com todos aqueles “filhinhos depapai”. Carolina não percebeu a gravidade do fato, chamando-me para jantar.

No dia seguinte, tudo ocorreu normalmente, ela foi à faculdade e, na sua volta, tinha uma festasurpresa para comemorarmos seu aniversário.

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O herói foragido - Lucas Menezes

Eu me lembro daquela estranha sensação, de certo modo, única, em que meu corpo estava sendo espremido, dentro do que se parecia com um buraco do tamanho de um centavo. Era minúsculo, e o meu corpo chorava por mais espaço. Eu havia sido avisado pelos instrutores da academia TF (Traveling to the Future), nos Estados Unidos, onde eu havia passado os últimos três anos treinando para ser o primeiro homem a viajar no tempo. Era um acontecimento inédito, para um mero paulistano, ter sido o escolhido no sorteio da NASA para dar um “pulinho”no nosso passado. Todos os brasileiros não acreditavam, muito menos eu, que um moleque franzino, com olhos azuis e cabelo castanho, estava a caminho de uma grande aventura através do tempo, e que em suas costas carregava o fardo da bandeira brasileira.

Bom, lá eu estava, girando e me contorcendo através do espaço sideral. Do nada, tudo parou. Minha visão estava clareando, e as cores que há segundos me confundiam, desapareceram, abrindo caminho a um enorme parque, lindo com as suas folhas de outono.Com o meu inglês ainda não aperfeiçoado, fui fazendo perguntas para as pessoas que calmamente andavam na beira do lago. Rapidamente, foi confirmada a minha suspeita inicial de que eu estava no Central Park; portanto, me encontrava no núcleo de New York City. Eu havia entendido todas as regras da viagem no tempo e sabia como seria uma catástrofe de sem querer mudar um evento histórico, e como acabaria mudando o curso da humanidade.

Minha mão segurava o aparelho que no meu bolso ficava, o mesmo aparelho que me mandaria de volta para casa em um piscar de olhos. Havia sido avisado de que se eu cometesse um erro na

viagem, minha sentença seria de até 45 anos de prisão, seguida de morte.

Eu estava atravessando a majestosa 5th Avenue, quando dei de cara com um discurso do então presidente John F. Kennedy. Estava parado, lembrando da história em que este presidente havia sido assassinado. Um cartaz estava colado em um dos prédios do local. A data “22 de novembro de 1963” estava em destaque. Foi neste momento que um leve enjoo me atingiu. Aquele dia era o dia do assassinato do presidente. Havia me lembrando daquela data, em um artigo que lera no jornal! Naquele momento, percebi que, em algum lugar, havia uma bala descansando em um revólver , à espera, e nesta bala estava escrito o nome de John. Eu era o único que poderia detê-la.

Recordei dos detalhes do artigo, e foi a partir desse momento que soube aonde levar os agentes norte-americanos. Estávamos correndo, disparados, eu e os agentes que eu havia avisado, costurando a grande multidão. Uma única coisa havia em nossas mentes: “Temos que parar aquele fuzileiro e seu revólver!”

Até hoje penso se fiz a escolha certa. Além de tudo, eu era um foragido da lei; porém na minha consciência sabia que eu era um herói. Por isso, fiquei vagando no tempo e no espaço, sozinho e sem rumo, consciente e feliz com a decisão tomada.

Page 39: VII Vivas Palavras

O Bem RelativoLucas Zuccolo

― Bleargh! ―Nojento. Eles tinham explicado que poderia causar náusea, mas não falaram nada sobre a cor. Acho que é

melhor assim. Não teria acreditado se tivessem.Consulto meu relógio. Ou não. O relógio não está lá. Levanto a cabeça para ver onde estou. A sala em que

me encontro parece idêntica à sala de teste, onde estava até alguns segundos. Ou seria há alguns anos? Eu entreino túnel há pouco tempo, mas se eu fui uns quinhentos anos para frente, quer dizer que... a ação de eu terentrado no túnel aconteceu faz quinhentos anos, né? Não, não, não... eu só fiquei no túnel alguns segundos. Masserá que o tempo existe lá? Sim...não... Ah, sei lá. Os cientistas que expliquem isso. Eu só preciso me preocuparem voltar. Vamos ver... o painel... sim, estava lá na parede, como haviam dito que iam deixar. É só ligar, botar oano, e entrar. Simples. Vamos lá.

O botão verde... aqui. Liguei. Agora o ano... 2008... 2009... 2010... 2012. Ué? E 2011? 2-0-1-1... Erro.Como assim? Eu acabei de vir de lá!―Erro. Esse tempo já fora utilizado em uma viagem temporal. Reutilização das mesmas coordenadas e/ou

matéria transportada resultará em erro catastrófico. ―“Matéria transportada”? Quer dizer... eu! Mas se eu não posso viajar de novo, como é que vou voltar?

Não, não, deve ter algum erro, eles teriam me avisado sobre algo assim, não teriam me mandado para –― Me mandaram fazer rápido para diminuir o choque. Olhe pelo lado bom: seu sacrifício trará

informações muito úteis. É por um bem maior. ―Viro em direção à voz. É uma pessoa. Parece um pouco desproporcional, com uma cabeça um pouco

grande, mas nada gritante. Está vestido com um traje marinho de corpo inteiro, com um emblema que nãoreconheço no braço. Sua expressão é gentil, simpática até; ele está apontando em minha direção... mas... tem umponto vermelho no seu dedo... o quê...?

Ah.

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Acabou. Todos morreram. Todos que eu já amei morreram. Não naturalmente, não. Nãomorreram de uma doença ou de velhice. Quem dera… Algo como isso é contra a natureza. O mundo é cruel.

O ano é 1943. Não sei que mês, que dia, ou que hora, somente sei que fazia meses que eu estavaem um esconderijo com minha família. Nós somos- eles eram- judeus. Até que os nazistas os acharam. Digo‘os’ pois eu não estava com eles, estava procurando o jantar do dia- mas assisti a tudo. Eles foram levados.Chorei, gritei, sofri. Sabia que não poderiam escapar. Era impossível. E então eu decidi andar. Andar até osmeus pés sangrarem, andar até meus dedos caírem. Não me importava.

E eu deveria me importar? Isto não era somente sobre eles, não. Era maior que isso, bem maior.Era sobre o mundo. A sua crueldade. Cruel, cruel, cruel. Gostaria de voltar à minha inocência de antes,quando eu não sabia o que era a morte, quando eu pensava que as pessoas viviam para sempre. Ou quandoeu pensava que as pessoas só morriam de velhice. Será que o mundo mudará um dia? Tenho esperança deque sim.

Até aquele momento, já devia ter andado alguns quilômetros. Estava com fome. Estava cansado.Achei uma casa que parecia estar abandonada. Olhei para um lado- ninguém. Olhei para o outro- ninguém.Então, entrei. Enquanto eu abria a porta, vi uma luz branca. Nada peculiar. Procurei mais uma vez portranseuntes, mas não havia ninguém. Entrei e fechei a porta. Era uma máquina. Sou uma pessoa curiosa,então fui examiná-la. Apertei alguns botões e alguns números apareceram: 7-4-11. Apertei “OK” e tudo ficouescuro.

Acordei com um raio de sol no meu rosto. Não estava frio e não estava quente. Percebi queestava em um tipo de casa. Achei a saída e fui para fora. Tudo estava diferente. Entrei em um bar e me senteiem um banco. Ninguém estava usando suas estrelas de David. Talvez ninguém fosse judeu. Achei umcalendário em uma parede. Dia 7 de abril de 2011. Isso não era possível. Eu havia viajado para o futuro.Talvez isso fosse a razão pela tranquilidade... o mundo não era mais cruel. Mas nem todos estavam sorrindo.De fato, ninguém estava. Estavam todos olhando para um noticiário que falava sobre um homem queinvadira uma escola no Rio de Janeiro e baleou vários estudantes. O mundo era cruel. O mundo não tinhaesperança.

7-4-11Matt Dias

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Page 41: VII Vivas Palavras

A Aventura

Rafael Rocha

Eu era um dos escolhidos. Ao meu lado, os meus amigos Tiago e Dora, prontos para embarcarmos em umexperimento único na história da humanidade. É difícil explicar como tinha chegado até aquele momento. Não sei se foi umprimo ou amigo de Tiago que conhecia um tal de cientista inglês procurando voluntários para uma viagem no tempo, mas dojeito que eu buscava alguma aventura na minha vida comum e medíocre, sabia que não poderia desperdiçar a oportunidade.

Já estava chegando a hora. As portas da plataforma estavam se fechando e, para dizer a verdade, sentia um poucode medo naquela hora. Medo que eu queria preservar, pois a vida é vivida para esses momentos inesquecíveis. A contagemregressiva começava. 20,19,18... Pensei na minha família e em mim, prometendo que a veria novamente. Talvez eu tivessetomado a decisão errada mesmo. 10,9,8... Não havia jeito de retornar. Falei com o Tiago e ele disse que tudo ia ficar bem.3,2,1... puf!

A plataforma tornou-se completamente escura. Ouvi um zumbido alto e, de repente, a plataforma começou atremer. Quando olhei para fora, vi que tínhamos chegado. A viagem tinha sido rápida mesmo. As portas se abriram. Comotrês astronautas chegando à lua pela primeira vez, descemos os degraus da escada lentamente. A primeira coisa que noteifoi que estávamos em uma floresta tropical, com o som dos insetos e o cheiro das árvores pairando no ar. Dora teve então aideia genial de fazermos um lanche, já que estávamos famintos. A plataforma estava equipada com muita comida, entãopreservá-la para depois era a última das nossas preocupações.

Estava tudo muito bom. Talvez bom demais para falar a verdade. O passado era um tempo tranquiloaparentemente: sem seres humanos, sem o trânsito infernal da cidade, o estresse e as preocupações. Foi aí que nós trêsdecidimos passear e descobrir um pouco mais sobre o ambiente que nos rodeava. Passeando por lá, senti um pequenotremor na terra. Pensei que fosse algum inseto do subterrâneo, mas percebi que estava enganado quando sentia aintensidade do tremido aumentar cada vez mais. Perguntei ao Tiago se podia mesmo ser algum bicho local. Ele nãorespondeu. O tremor aumentava. Já não sabíamos o que fazer, estávamos no meio de uma floresta desconhecida e, piorainda, em um tempo desconhecido.

Foi aí que eu o vi. Era gigante e monstruoso. Um verdadeiro dinossauro se aproximando cada vez mais. Quandoestava ao nosso lado, se inclinou e começou a cheirar a Dora. Tiago falou para mantermos a calma. De repente, o dinossaurofez um ruído estrondoso e foi aí que Tiago, muito familiar com a natureza destes bichos, já que tinha pesquisado sobre elesanteriormente, pediu para todos nós corrermos. Não me lembro muito bem do que aconteceu naqueles momentos, mas sósei que nunca tinha corrido tão rapidamente como naquela vez.

O dinossauro corria atrás de nós e, quando ele estava quase do meu lado, pulei de forma heroica para dentro daplataforma onde Tiago e Dora, mais rápidos, se encontravam. Eles ligaram a máquina e o dinossauro tentava atacar (aindabem que tínhamos parado num lugar bem discreto). Felizmente, a plataforma desapareceu daquele tempo e, quandopercebi, já estávamos no presente.

Saindo da plataforma, notamos que havia centenas, ou melhor, milhares de pessoas aplaudindo. A viagem tinhasido curta mesmo, mas agora eu sabia que teria essas memórias comigo para sempre e viveria o resto da minha vida comoum herói e pioneiro da Ciência.

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Final feliz? Apenas em conto de fadasSofia Renault

Hoje, dia 26 de julho de 2000, estou fazendo seis anos de idade. Meu dia foi divertido, tive um almoço defamília, e eu, sendo a caçula, todos me paparicaram com presentes, como sempre. Agora já está tarde e, como emtodo aniversário meu, mamãe está me contando histórias de conto de fadas. Escolhi o conto em que a Cinderelaencontra a Bela Adormecida e vira sua melhor amiga. E quando mamãe acabou de ler, ela me relembrou sobre mime Carolina. Ela sempre fala que eu sou a Bela Adormecida e que a Carolina é a Cinderela, a morena e a loira, asamigas inseparáveis.

Eu fui crescendo, ficando mais madura e, com o tempo, fui perceber que a vida nem sempre tem um finalfeliz, como em todos os contos de fadas que mamãe me contava. O que eu tenho certeza é de que sempre haverápessoas que vão estar com você. E quem me fez ter essa certeza foi a Carolina. Passamos por momentos diversosjuntas, e muitos difíceis, mas estávamos uma do lado da outra.

No segundo ano da faculdade, eu e a Carol decidimos explorar o paraíso, fazendo uma viagem pelas praias doBrasil. Nosso sonho estava sendo realizado. No meu carro nós fomos, na mesma noite em que as férias começaram.Passamos antes em uma festa, mas logo depois botamos o pé na estrada. Como Carol já estava caindo no sono, eudecidi ir dirigindo pela nossa segurança. Bateu uma tempestade quando eu estava descendo a serra e estava todaescorregadia. Estávamos indo bem, até a hora que chegou uma curva e PÁ! Caímos. Acordei no meio do nada, nãosabia onde eu estava. Eu olhei para o lado, lá estava a Carol. Estava quebrada no chão, e para completar, não estavarespirando. Eu entrei em desespero, pensando que tinha sido eu que causara a morte da minha melhor amiga. Mesentindo péssima, resolvi não contar para ninguém. Fiquei por lá até a noite chegar, quando por algum milagre, vipassando uma estrela cadente. Com um sentimento estranho passando por mim, fiz um desejo. Tudo se apagou.

Acordei me sentindo estranha, não tinha nem ideia de onde eu poderia estar. Levou um tempo, mas percebique estava invisível. Vi com meus próprios olhos, na minha frente, uma mulher morena comemorando o aniversáriode suas filhas gêmeas, uma morena e a outra loira, fazendo seis anos de idade. A mãe estava contando um contopara as duas, sobre duas melhores amigas. A moral desse conto? Mesmo quando tudo parece estar errado, não está.Se não está bem, é porque não chegou ao fim. Espere e faça o seu desejo, de te ver feliz no futuro.

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Presente que retornouStella Park

O cabelo branco dela ficou grosso e preto. A sua ruga desapareceu, mas a cicatriz do trabalho nas suas mãos ficou e rasgou o meu coração. Eu só podia vê-la à distância no mercado movimentado, silenciosamente observando a moça pesarosa vendendo grãos durante a dia inteiro para alimentar a sua família.

Aguentando as lágrimas, eu me aproximei dela lentamente. Ela me acolheu animadamente, embora parecesse cansada e magra de trabalho e fome, e esperou eu pedir alguma coisa para comprar. Olhei fixamente nos olhos puros dela, com a esperança estúpida de que ela perceberia que os nossos rostos eram iguais. Eu conhecia bem o seu sofrimento, mas eu nunca imaginei que fosse tão grande.

Meus punhos apertaram. Era terrível ver o sofrimento dela quando eu tinha um colar de ouro que podia alimentar sua família por um mês, mais ou menos. Eu não tinha viajado para saber o passado triste que ela teve que enfrentar. Eu pensei que não poderia nem dar um pequeno presente para ela, não poderia ser uma luz do sol em sua vida.

Sabia que era por causa do trabalho que ela tivera que desistir da sua beleza e juventude, e isso fez quem eu sou. Quando ela estava ocupada com um outro cliente, eu deixei cair o colar embaixo da sacola de feijão e conversei com ela rapidamente.

Ela falou que o sonho dela — tão simples que até deu pena—era terminar a escola secundária, mas era impossível, porque ela tinha três filhos para cuidar, além do marido. A sua propriedade tinha sido destruída por causa da guerra civil naCoreia e, no norte do país, a sua família permaneceu. Além disso, ela estava usando uma flor roxa como acessório de cabelo e disse que seu filho tinha dado o objeto a ela.

Antes de deixá-la, eu vi uma moça novinha, de uma beleza que eu nunca mais verei na minha vida. Ela me cumprimentou, fazendo um gesto com os olhos, e sorriu brilhantemente para aquele que era um estranho para ela naquele momento. Presumi que ela sentira a conexão inegável entre nós, ligados por uma cadeia inquebrável de sangue.

Quando voltei para 2011, eu fui para o cemitério e coloquei sobre o túmulo a flor que ela amava, com a minha mãe ao meu lado.

Ting!

Caiu um brilhante objeto muito familiar do meu pescoço.

—Nossa! Você ainda tem isso?—a minha mãe exclamou, surpresa. É o colar que a sua vovó lhe deu no seu décimo aniversário, né?

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Page 44: VII Vivas Palavras

O novo nascimentoStephanie Averbach

25 de setembro de 1995. Acabo de nascer, hospital Albert Einstein, quarto 224. Todos aguardavam ansiosamente a minha chegada, e pelas expressões na cara de meus pais, notei uma certa angústia. Não sei como vim parar aqui. Hoje, dia 19 de dezembro de 2011, estou presente no mesmo dia, mesmo horário, mesmo quarto do mesmo hospital em que nasci, 16 anos atrás. Tudo parece estar diferente, comparando-se com o que meus pais me contavam quando era pequena.

Ao entrar no quarto, percebo que ninguém me nota. Estranho. Fiz barulho, nada. Chego perto de minha mãe, que me segura em seus braços, acariciando minha face. Tento encostar na criança, minhas mãos não permitem; minha mão passa diretamente através do bebê. Que estranho. Fico confusa.

O cansaço me vem, cansaço forte. A vontade de deitar e descansar é um sonho só. Saio do quarto, não vejo nada. Nada de corredor, nada de enfermeiras, simplesmente uma luz forte que me atinge a visão. Dá pra ficar pior? Com tanta agitação, me lembro de ter apagado.

Acordo depois com um barulho chato, alto, que me parecia um choro de uma criança. Não ligo. O barulho se aproxima. Logo surge uma criança, que se parecia comigo. Pensei que estava sonhando, mas não. Era mais para um pesadelo. Agora eu estava no mês de janeiro, dia 22, no ano de 1998, dia em que minha irmã nasceu. As mesmas coisas se repetiam, ninguém me notava, não conseguia encostar na criança, e através da porta, havia só a luz. O medo se aproximava. Queria voltar para o presente. Com desespero, grito. Chorei com a maior angústia que já tive. Nervosa, abro a porta e ando diretamente para a luz. De repente, é dia 27 de setembro de 1963. Minha mãe está nascendo. Agora, sim, a coisa estava estranha.

Trinta anos se passaram e continuo no mesmo ciclo. Era setembro de novo, como se o tempo me perseguisse. Eu era uma prisioneira, não tinha para onde ir nem fugir. Meus pais me ensinaram que desistir nunca poderia ser uma decisão na minha vida. Mas Deus não me dá outra opção a não ser render a minha vida a essa estúpida máquina do tempo.

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O ImprevistoThomas Mattar

Estava discutindo com o meu filho sobre as surpresas da vida e os acontecimentosprevistos. Sempre pensei que, se eu tivesse a oportunidade de ver meu futuro, eu escolherianão o ver. Passavam-me pela cabeça os inúmeros momentos em que a vida me fez sorrir,quando me deparei com imprevistos. Depois de refletir sobre isso por toda minha vida, esempre chegar à conclusão de que surpresas são um tempero essencial da vida, por ummomento mudei de ideia.

Estávamos perante uma máquina revolucionária. Eu e meu filho, o inventor doequipamento, fomos os primeiros a termos a oportunidade de viajar no tempo. Pensei nasduas coisas que eu mais amava e ainda tinha comigo. Fernando, meu garoto já emancipadoque me acompanhava, e meu lindo saxofone. Eu decidi que deixaria o futuro de Fernandoinexplorado, mas queria saber se meu objeto de mais valor continuaria refletindo a voz daminha alma.

Entrei cautelosamente na máquina quando vi que Fernando aprovava minha ideia. Aporta se fechou e, após o breu, vi. A imagem da plateia imensa perante meus olhos, comrisadinhas cínicas em cada rosto. Eu e meu instrumento passamos pelo vexame tremendo,que condenaria minha vida e a dele.

Levantei-me da máquina desiludido e, correndo, passei por Fernando e por tudo quevi pela frente, até chegar ao meu sax. Apanhei-o, e com lágrimas nos olhos e na alma,despejei pela janela a voz da minha vida.

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Ciência enfrentando magiaBia Campos

Estava tonta. Ao chegar, fiquei meio avoada e pisei em falso. Levei um leve corte na testa, poishavia pequenas pedras no chão. Feito galinha descabeçada, percorri as ruas da vila, tentando localizarpistas que identificassem onde eu estava. Isso foi a primeira coisa que fui instruída a fazer. As simulaçõesnão haviam me deixado com esse ruído excruciante em meus ouvidos. Não conseguia me concentrar emnada. Via vultos circulando ao meu redor; quando foquei, vi pessoas que se materializavam, vindas detodas as direções, usavam roupas escuras que as cobriam dos pés à cabeça.

Olhando em volta, percebi que minha presença havia interrompido alguma cerimônia ou reuniãoprestes a acontecer, localizada no que parecia ser o centro na vila. Ainda meio zonza, ouvi um gritofino, que parecia perfurar o ar. Vinha de uma garota de uns 12 anos e ela apontava um dedo acusatóriodiretamente a mim. Pessoas entraram em pânico e logo havia um rapaz ao meu lado que brutalmente medirigiu ao lugar onde todos estavam entrando. Desorientada, decidi não resistir. Era uma espécie detribunal improvisado. Havia um juiz e várias garotas sentadas na frente, incluindo a que havia gritadoantes e, ao me aproximar, todas viraram aflitas. Me deu um estranho senso de deja-vu. Onde havia vistoaquilo antes?

Você foi acusada de ser Bruxa. Você confessa? – disse o juiz tenebrosamente narigudo.

Como? – eu respondi, ainda tentado recuperar o fôlego da correria.

Por que mandaste teus fantasmas para agredir essas meninas?

Perfeito, pensei. Aqueles cientistas foram me mandar justamente para a caçada às bruxas emSalem. Como é que eles acham que uma viajante do tempo irá sobreviver às intrigas esta época?

Não houve jeito. Nenhum de meus argumentos dava-me uma explicação satisfatória aos olhos queme estudavam com desprezo e medo. A corda áspera apertava meu pescoço. O vento roçava entre osdedos de minha mão gelada.

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Um futuro distanteFabio Rocco

Um estrondo e, em um piscar de olhos, eu estava flutuando em uma imensidão branca de absolutamente nada. Minhacabeça girava sem parar. Meu corpo parecia desorientado com as bruscas mudanças gravitacionais. O coração batia na perna direita,enquanto o estômago estufava meu ombro esquerdo. Meu intestino queria sair pela boca. Já o cérebro parecia estar esmagado, e umador de cabeça agonizante não me permitia pensar. Tudo aconteceu muito rápido. Tão rápido que logo me vi sentado em um chão deconcreto duro. Duro e imundo, diga-se de passagem.

Lentamente, meu corpo procurava voltar ao normal. Levantei-me e examinei o local. Milhares de carros estavam afuniladosem uma avenida imensa. Não eram exatamente carros, pois não possuíam rodas. Apenas flutuavam suavemente, ficandoconstantemente a poucos centímetros do chão. Na realidade, eram muito diferentes dos carros de 2011. Não possuíam janelas.Também eram todos da mesma cor. Preto fosco. Que falta de personalidade, eu pensei, enquanto reparava na avenida em si.

Além de imensa, era horrorosa. Uma mistura de asfalto e concreto esburacados. Alvo de uma chuva de meteoros? Avistei umburaco perto de onde eu estava na calçada. Era extremamente largo, e guardava uma aglomeração de lixo no fundo. Lixo do futurotalvez, pois não enxerguei cascas de frutas ou restos de outros alimentos. Apenas plástico.

Agora já completamente restituído, meu cérebro pôs-se a trabalhar. Olhei para o lado oposto ao da avenida, a fim dedescobrir exatamente onde eu estava. Vi prédios cinzentos, pichados de preto e vermelho. Aparentavam ser modernos. Mesmo assim,estavam completamente abandonados. Ainda perdido, virei-me novamente para a avenida. Mirei um lixão, que se esticava atrás. Erammontanhas e montanhas de lixo. Um verdadeiro rio de plástico. De repente, um carro flutuante parou ao meu lado. As portas abriram-se, e eu pude enxergar os passageiros. Duas mulheres obesas esforçavam-se para sair do veículo. Eram pálidas, o que lhes garantia umaaparência bastante doentia. Usavam máscaras pretas, que cobriam a boca e o nariz. Finalmente saíram do carro, que automaticamentefechou suas portas e saiu andando. Ou melhor, voando.

Na calçada, vi uma placa que me pareceu familiar. Estava escondida atrás de uma montanha de lixo, então procurei chegarmais perto. As letras apareciam conforme eu me aproximava. Primeiro um “M”. Depois um “A”. Então um “R”, quase totalmenteapagado. “Marginal Tietê”. Estou em São Paulo! Alegrei-me por saber que não estava longe de casa. Mas a alegria durou pouco, porquelogo engoli um ar pesado de poluição que vinha da avenida. Vou é fugir dessa sujeira!

Aventurei-me num beco que parecia menos poluído. Lá, uma multidão de pessoas doentes. Pessoas com manchas pretas nacara. Tossiam sem parar, e quase não se mexiam. Eram mais zumbis do que humanos.

Um homem baixo e moreno, sem a perna direita, aproximou-se de mim. Ofereceu-me um jornal. Achei algumas moedas emminha carteira e comprei ,por curiosidade e por pena.

“O Estado de São Paulo, 2020”. Fiquei perplexo. Só nove anos... Olhei para cima, aterrorizado, como se esperasse algumaajuda divina. Tudo que vi foram nuvens pretas de sujeira, e logo perdi toda fé no futuro.

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“Freemason”Felipe Marques

Enquanto eu andava pelos vastos corredores do prédio, eu relia, pela quinta vez, eu acho, o manual de viagensespaço-temporais entregue a mim pela “Freemason”, a companhia que patrocinava quase todos os projetos científicos evisionários de hoje. Após ver que um dos possíveis efeitos colaterais de viagens através de um buraco de minhoca era umaleve sensação de “déjà-vu”, fechei o livro e passei o dedo pelo símbolo da companhia, que parecia o da antiga e extintaorganização conhecida como “Macons”: um compasso, com um olho no topo e um mapa do mundo embaixo. As portasautomáticas de vidro que havia na sala de experimentos, se abriram diante de mim e Parr O’Docks, chefe executivo da“Freemason”, estava lá, com um sorriso radiante, pronto para me jogar num buraco temporal e me mandar para Deus sabe-se onde. Ele e os outros executivos mandados lá me ofereceram um copo d’água, pediram para eu me sentar erecapitularam, mais uma vez, a minha missão e por que eu era tão importante para a Freemason: eu iria para o futuro paraver como a companhia havia mudado as nossas vidas para o melhor. E com uma recomendação gentil de “boa sorte” e“volte logo”, apertei o botão do meu cinto temporal que me mandaria para mil anos no futuro...

O manual estava errado. Não era “déjà-vu” que sentia, mas, sim, náusea. Imagine ir a uma montanha russa depoisde ter comido 3 pizzas. Mas mesmo assim, estava lá, no ano de 3011. E era lindo. O céu parecia ter perdido toda a poluiçãodo milênio anterior, os carros eram sem rodas e não prejudicavam o meio ambiente... E então, apareceu um homem, umjovem, que disse que devia me dirigir para o prédio diante de mim, que finalmente havia chegado. Ele me empurrou para osaguão do prédio imenso, que... tinha o símbolo da “Freemason”! O mesmo de onde eu vim! Só que... estava maior. Melhor.E completamente detonado! Será que teriam jogado uma bomba lá? De repente, ouvi um passo e uma voz recomendandoque eu “não me incomodasse com as obras”. Era uma voz idosa, calma, risonha... a voz de Parr O’Docks, que agora estavadiante de mim, com o mesmo sorriso estampado no rosto. Sorriso esse que desapareceu assim que ele ordenou um exércitoaltamente armado para seguir o jovem que havia me guiado e atravessar o buraco de minhoca na praça central.

-Ouça aqui, meu jovem, nunca fomos aquela companhia que almejava mudar o mundo. Somos- e isso ele dissecom toda a calma do universo- uma organização que almeja dominar o mundo. Como o exército daqui é avançado, nossasguerrilhas, aperfeiçoadas demais para a sua epoca, não teriam chance nenhuma. Por isso, mandamos você aqui para abrirum portal para a sua época, para que pudéssemos mandar nossas tropas para dominar esse estranho velho mundo. Creioque você perdeu o jogo, meu jovem.

...Agora, nesta cela, o olho da “Freemason” me observa, enquanto eles dominam o mundo.

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E de repente fica tudo escuroFernando Otterloo

Era o último dia de treinamento e eu acredito que estava pronto para voltar no tempo. Eu estava esperandoansiosamente aquela sexta-feira chegar. Foram 45 dias de intenso treinamento no Palácio do Planalto, em Brasília. A nossapresidenta Dilma Roussef havia mandado uma carta direcionada a mim, pedindo minha presença em um jantar dedespedida. Eu não sabia para quando ia voltar, então foi no jantar que descobri para que ano voltaria. Fiquei surpresoquando falaram que voltaria para os anos sessenta e que minha missão era combater os militares e não deixar a ditaduraocorrer. Fiquei curioso quando um segurança entrou no jantar com uma maleta; obviamente perguntei o que tinha dentrodela, porém era secreto, e me avisaram que eu só iria poder abri-la quando eu estivesse na cápsula.

Sexta-feira chegou e, finalmente, eu estava indo viajar. Assim que cheguei no Palácio, direcionaram-me para amáquina; entrei nela pela primeira vez, fiquei surpreso com seu tamanho e fui investigar. Abrir aquela porta de aço não foinada fácil, mas, quando entrei, quase caí duro. Avistei uma cama de casal, uma cozinha, uma TV, uma janela e umageladeira. Minha jornada demoraria, então me senti confortável e seguro com tudo que tinha lá dentro.

A viagem começou e parecia que meus pais estavam falando comigo, uma voz em cima da outra; aí; quando medeitei na cama, escutei minhas irmãs gritando comigo por razão alguma. De repente, as luzes se apagaram, a máquinacomeçou a despencar, parecia uma montanha russa. Em desespero, comecei a gritar, gritei tanto, mas tanto, que acabeificando exausto. Do nada, tudo voltou ao normal e parecia que lentamente tudo ia voltando ao normal.

Minha exaustão tomava conta do meu corpo, e eu estava indefeso, então tentei dormir. Capotei na cama; quandoacordei, olhei para fora da minha janela e estava no meio-campo do estádio do Morumbi, era a final da Libertadores. Pareciaos anos 90, pois quem estava ali era Gilmar Rinaldi. Quando dei mais uma olhada, todos os jogadores estavam correndopara a máquina. Policiais correram em direção à máquina com uma grande chave inglesa, pois iriam arrebentar a porta.Deitei-me na cama e comecei a pensar nas coisas, pois tudo esta muito confuso. Pensei: “Era para eu estar nos anos 60,porém, estou nos 90!”. Obviamente, um erro técnico aconteceu. Em seguida, vi os policiais entrando, além de dois agentes edo goleiro Gilmar. A porta foi fechada e pensei que, na pior das hipóteses, todos começariam a fazer perguntas, como, “Daonde o senhor é?”. “Como você veio parar aqui?”. Respondi todas as perguntas pacientemente e, no final das contas, adiretoria do São Paulo acabou me convidando para assistir ao jogo de seu camarote. Como eu era “do futuro”, já sabia oresultado do jogo, mas fiquei quieto e torci para o meu time.

Percebi que não tinha mais volta, então decidi fazer minha vida por aquela época mesmo. Felizmente, virei técnicodo São Paulo e conquistamos uma Libertadores, seguida de um mundial, em 1993.

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O espelho da minha vidaGui Maranho

A viagem ao passado realmente é uma coisa fascinante. Eu tive essa chance de escolher aque ponto do passado eu gostaria de ir. Escolhi voltar aos anos 70. Sempre me interessei por esseperíodo, onde todos andavam nas ruas sem nenhum problema. Cada pessoa tinha seu próprioestilo, e o rock era um dos estilos que afetava muito a população. Quando eu viajei para o passado,eu tive a opção de escolher que tipo de pessoa eu seria. Foi ótimo, escolhi ser um roqueiro quetocava em bares e tinha sua própria gangue, enquanto vivia uma vida simples, tentando comprarum carro. Por que eu escolhi essa vida? Bem, eu queria poder viver exatamente como uma pessoanormal dos anos 70, porém sabendo que eu tinha vindo do futuro, só para experimentar comoseria voltar no tempo. Um tempo em que ninguém tinha medo de expor seus estilos. As ruas,sempre movimentadas, os vários carros equipados com pinturas especiais e outras coisas. Eu melembro de como tudo era muito diferente de hoje.

Hoje, no presente, sou engenheiro eletrônico, porém gosto muito de música. A minhaviagem ao passado reflete um pouco a minha vida, porém com certas dificuldades e diferenças. Naminha viagem ao tempo, eu tive muitas dificuldades em me adaptar por falta de contato com aspessoas que me ajudaram a voltar no tempo.

Quando eu cheguei ao passado, no momento em que eu pisei naquele lugar tão distante,senti uma energia diferente e uma preocupação contínua por estar em um tempo desconhecidopara mim. Eu realmente tive a opção de escolher quem eu queria ser nessa viagem. Mas a vida nãoé tão fácil assim. Viver nos anos 70 não era fácil, eu tive que me adaptar ao tempo, além de ter queachar o meu caminho que já estava construído, mas com um tempo limitado. Não tive tantosproblemas sérios com aquela vida, o mais sério é que eu não queria sair daquele tempo tão bom,com ótimas lembranças.

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Século XLucas Ryan

A nave já estava pronta para decolar. Após cinco anos me preparando e esperando, a hora finalmente chegou.Finalmente íamos embarcar para a lua. A nave estava equipada com muita comida, bebidas e artigos para necessidadesbásicas. Decolamos às cinco horas da tarde, e de acordo com os nossos cálculos, íamos chegar na lua entre 2 e 3 dias depois.Nossa equipe era composta por 7 homens e uma mulher, cada um com uma função na nave. A equipe tinha os engenheiros,Danny e Kyle, os astrofísicos Bob e Randy, os cozinheiros Anderson e Henrique e os médicos Paula, Jimmy e eu, o Simon.Éramos uma equipe há muito tempo, até antes de começarmos a planejar nossa viagem.

Após uma decolagem com sucesso, nos revezamos para dormir enquanto os outros pilotavam a nave. Perto de 12horas depois de sair da terra, nossa nave estava em um lugar em que havia interferência, e não tínhamos sinal de rádio.Éramos como um time de futebol sem técnico, e nós nos encontrávamos em uma situação muito complicada. Aí, do nada, anave começou a se mexer sozinha, e um buraco surgiu em nossa frente e engoliu a nave como se ela fosse um hambúrguer.Ocorreu uma pancada e eu bati minha cabeça no painel de controle, o que me fez desmaiar.

Acordei depois de quase seis horas, com uma dor de cabeça insuportável. Levantei-me para olhar pela janela, e vique estávamos em uma floresta. Pelo visto, eu era o único acordado, porque eu olhei para o meu lado e vi Paula, Randy eBob desacordados. Acordei os três e nós decidimos ver como os outros membros da tripulação estavam. Entramos nacozinha e ficamos em choque, havia sangue na parede e no meio da cozinha estavam o Jimmy e o Anderson virados decostas para cima. Paula e eu fomos correndo direto a eles, já que nós éramos os médicos. Viramos os dois e Paula quasedesmaiou; a cara dos dois estava rasgada, e os peitos também. Não sabíamos o que fazer, saímos logo da cozinha edecidimos procurar os outros. Chegamos na sala dos motores e vimos a mesma situação, mas dessa vez com o Henrique.Estávamos pasmos e decidimos procurar os únicos que sobraram, o Danny e o Kyle, justamente os engenheiros quepoderiam consertar o motor que quebrara depois da batida forte contra a terra. Kyle também estava morto do mesmo jeito,ele estava na porta de um dos quartos. Procuramos o resto da nave para ver se encontrávamos o Danny, mas não tivemossucesso.

Nós decidimos ir para a floresta, procurar pessoas, qualquer sinal de civilização. Andamos quilômetros e sópassamos por árvores. Depois de duas horas caminhando, passamos por uma vista peculiar, a torre Eiffel enferrujada, quasecaindo aos pedaços. Estava ficando escuro, mas saber que havia isso por perto agradava. Quando chegamos na nave denovo, já estava escuro, e nós ouvimos barulhos vindos dela. Quando entramos lá, vimos Danny com os restos do corpo doAnderson em suas mãos, e com uma cara de monstro. Foi naquele instante que nós descobrimos o animal que mataranossos amigos. Era ele. O Danny.

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A triste realidade do futuroMariana Lepecki

Já estava pronta. Tinha treinado um ano para a expedição ao futuro e finalmente tinha chegado a hora. Não meperguntem por que me inscrevi nesta missão perigosa e possivelmente fatal, porque isso nem eu saberei responder. Achoque foi pura curiosidade, uma característica que nós cientistas costumamos ter, especialmente quando o trabalho gira emtorno do espaço e seus mistérios. Não sou como os outros “cientistas loucos” da NASA, que são obcecados por tecnologias esonham todas as noites com seus futuros avanços. Para mim, o mais importante não são os avanços da tecnologia, mas simo avanço do conhecimento. Talvez essa seja a verdadeira razão pela qual me inscrevi nessa viagem, para simplesmenteexpandir o meu conhecimento ao invés de somente descobrir novas tecnologias (que é o objetivo dessa viagem).

-Todos prontos?- perguntou o comandante da máquina. Eu estava tão nervosa que qualquer palavra que saísse daboca dele parecia grego naquele instante. Nem acreditava que dentro de algumas horas seria uma das primeiras pessoas (emulher) a viajar no tempo. Meu coração sambava, minhas mãos tremiam e o suor rastejava pela minha face. Foi nestemomento que me lembrei do astronauta Luis Armstrong, que disse: “One small step for man, one giant leap for mankind”, eentrei na máquina do tempo.

A viagem foi longa. Talvez porque estivesse muito ansiosa para explorar o futuro, ou porque já não aguentava maisouvir falar nas maravilhas das máquinas e tecnologias. Os “cientistas loucos” estavam tão obcecados pela viagem, que tiveque ir para um outro local da máquina do tempo, só para fugir daquela mesma conversa “alienada”.

- Onde é que fui parar? - pensei- Eu entre um bando de cientistas loucos! Ai ai...De repente, a máquina parou, as portas se abriram e dei os meus primeiros passos rumo ao futuro. Carros

voadores, robôs para todos os lados, casas e prédios que flutuavam. Era difícil acreditar que aquilo tudo era realmenteverdade, porque parecia até que era outro planeta. Tenho que admitir que, como os outros cientistas, fiquei maravilhadacom aquele show de tecnologia. Olhei para os lados e vi todos eles admirando aquele novo tipo de viver: seus olhosbrilhavam como os de crianças no Natal e eles nem pareciam mais intelectuais da Ciência.

Enquanto eles se maravilhavam, eu decidi caminhar um pouco pelas ruas para explorar o “novo universo”. Queriamuito conhecer as pessoas e novas culturas do futuro. Caminhei por um bom tempo, mas não encontrava ninguém nas ruas,somente máquinas e robôs. Percorri vários bairros, mas mesmo assim a cidade continuava sem a presença humana.

- Meu Deus! - foi nesse momento que compreendi o que havia acontecido. O futuro não era mais dos homens, masdas suas criações. A tecnologia predominava e o mundo ficou sem graça, sem individualidade, sem sentimentos. Era umuniverso artificial.

Depois de algum tempo refletindo sobre aquela desgraça, voltei completamente chocada para a nossa máquina dotempo. Enquanto estava me aproximando, avistei uma cena completamente diferente daquela que eu tinha deixado. Aoinvés de olhos brilhando, eu via olhos que refletiam os meus sentimentos. Tinha certeza de que eles tinham descoberto amesma coisa que eu. Os cientistas ficaram inconformados, pareciam estar com nojo do que tinha acontecido com o nossoplaneta. Tinham vindo para descobrir novas tecnologias, porém descobriram as suas consequências.

- Não, esse não pode ser o nosso futuro... Não pode! - disse o comandante, que deu as costas para aquela cidademiserável e entrou na máquina do tempo. O resto do grupo o seguiu, e foi assim que a nossa viagem ao futuro terminou. Navolta, os cientistas, que antes não paravam de falar sobre as maravilhas da tecnologia, ficaram quietos. Ninguém acreditavaque essa era a realidade do “grande futuro tecnológico”.

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Futuro ou Passado?Neta Magal

Sábado de manhã, com minha xícara de café com leite na mão, ouvi a campainha tocar. Encaminhei-me até aporta, abri-a, ninguém. Meus olhos foram rápida e instantaneamente chamados para a edição especial de “The FutureMagazine”, jogada no canto esquerdo do chão, um pouco depois do elevador.

Não pensei duas vezes antes de pegar a revista na mão e sair correndo me sentar na copa, para terminar o meucafé da manhã com o meu novo entretenimento. Na capa, podia-se ler pouco, não me dava tanta informação; a únicamanchete que meus olhos enxergavam dizia claramente: “Meus Parabéns! Você é o nosso 1000 assinante e hoje faz 1000dias que assinou a “The Future Magazine- A revista que fará o seu futuro”. Com minhas sobrancelhas altamente levantadas,li, também, que estavam me pedindo para abrir na página 10 para ver o fabuloso prêmio que havia ganhado.

Mentiria se dissesse que não estranhei. Presentes, até onde eu sei, são um pouco mais grossos que um pedaço depapel... tirando dinheiro, é claro, mas dinheiro com certeza que não ia ser. Seria algum tipo de vírus? Ou até mesmo umapegadinha? Mas, como filósofos dizem, curiosidade não mata ninguém, então... Fui devagarzinho, evitando qualquer jato deágua espontâneo. Contando as páginas, cheguei até a 10. Dizia que tinha acabado de ganhar uma viagem experimental notempo e que, se quisesse aceitar essa curiosa proposta, bastava ligar para o número 8786467388827534. Um tantoestranho.

Refletia e refletia, realmente não sabia que decisão tomar. Arriscar, talvez, a minha reputação, sofrer a chance deser humilhado ou acreditar em uma coisa de que nunca ouvira falar sem ser nas histórias em quadrinhos? Arrisquei.

O telefone tocava, tocava, tocava e NADA! Como assim? Pelo menos uma gravação relembrando a minha estupideztinha que ter! Apertei o botão de desligar e me veio uma tontura imediata e um vento arrastador que levou as pontas domeu cabelo escuro para longe.

Não estava mais em casa. Que lugar estranho! Lembrava-me de casa, e ao mesmo tempo me fazia não desejarestar no meu lugar favorito. Bateu um desespero. CALMA! Talvez eu esteja no meu lar, com alguns robôs passeando e aminha televisão se comunicando comigo. O que acontece? ME TIRA DAQUI, foi a primeira coisa que me subiu à cabeça.Diziam: “Bem-Vindo a 3010”.

EU QUERO SAIR DAQUI! Mas como? Não quero estar preso para sempre. Por que comigo?Não achava nenhum ser humano pela janela. Estava perdido, sem ajuda e sem companhia, queria que tudo fosse

um sonho e alguém me jogasse um balde de água congelando, indo diretamente abrir a porta, olhar para o chão e ver nadamais que uma revista em sua edição normal.

Infelizmente estou aqui, trancado, até hoje. Preso nesse inferno inacabável, planejo minha vida para os futurosanos da minha vida. AAAAH FUTURO. Só me resta encostar a cabeça e refletir sobre meu arrependimento de ter assinadoaquela revista do futuro... ou melhor, aquela revista do passado.

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Colapso temporário fatalPaulo Flecha

Desde quando eu era criança, sempre tive o sonho de que eu iria poder viajar no tempo. Porém, nunca imagineique fosse realmente possível, até eu me inscrever no programa “Time & Space”, que estava somente começando com suasviagens experimentais. Recebi o treinamento específico, me preparei física e mentalmente, porque sabia que não seria umaexperiência fácil. Deixaram muito explícito para mim que, se eu mudasse o passado que eu visitasse, não teria efeito algumno meu presente de quando eu voltasse, desde que eu voltasse sozinho. Pelo menos isso me deixou tranquilo, ou melhor,diminuiu um pouco a minha grande tensão.

Pois então, chegou o grande dia. Peguei os meus documentos, tomei o meu café e fui ao meu ponto de partida.Essa era uma viagem “solo”, em que só iria eu. O processo de preparo, os medicamentos e os procedimentos para a viagemainda são confidenciais, de certa maneira, então não posso descrevê-los em detalhe. O que posso falar é que entrei namáquina e a última coisa de que eu me lembro era de receber o meu papel com informações da minha volta ao presente, 10de maio de 1911. Eu teria por volta de três dias no passado para concluir o experimento.

Apareci no meio de uma terra estranha. Imaginei que fosse o mesmo lugar do laboratório, porém 100 anos atrás.Eu consegui ver a cidade de São Paulo, mas sem os prédios e sem o trânsito era quase irreconhecível. Comecei a andar emdireção aos barulhos; eu estava sozinho. Fui passando por lugares que mal reconhecia, enquanto via meu arredor, queestava cheio de árvores. Avistei de longe uma mulher, muita bonita por sinal. Ela veio em minha direção, e ela parecia estarsegura do que estava fazendo, com se até tivesse um propósito o caminhar rápido dela em minha direção. Eu estavadesatento, somente prestando atenção na beleza daquela mulher, e em um piscar de olhos, senti um impacto muito forteatrás da minha cabeça. As árvores pareceram girar e tudo ficou preto. O que tinha sido aquilo?

Abri meus olhos e virei a minha cabeça. Doía. Eu estava numa cama, em uma casa humilde. Não tinha ideia do quehavia acontecido. Do meu lado, havia uma cadeira com todos os meus pertences. Fiz questão de ver se estava tudo emordem. Estava. Tudo... menos o meu papel de instruções para volta. O meu relógio de pulso marcava dia 12 de maio de1911. Senti uma descarga de adrenalina correr pelo meu corpo, me acordando instantaneamente. Com uma sensação dehorror, me toquei que o dia de volta para o presente havia passado, eu ficara apagado aquele tempo todo! Li um bilhete quevi grudado na porta quando levantei: “Querido, obrigada pela passagem! Beijos, Luisa”. A mulher tinha voltado em meulugar. E agora?

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Buraco SH

Pedro Quirino

Deus criou o mundo e nele pôs humanos. Humanos criaram pecados e acreditaram que o mundo nunca iria acabar.Eu, Zeca Quiroga, sou o único brasileiro a trabalhar com cientistas do mundo inteiro na construção da primeira nave espacialque nos levará através de um buraco de minhoca. Nele, desejamos viajar para o futuro e ver como será o mundo emtrezentos anos.

***Hoje é dia 8 de fevereiro de 2011, a nave irá partir dentro de cinco minutos. Enquanto eu e o resto da tripulação

aguardamos ansiosamente, os engenheiros fazem os últimos ajustes.Finalmente, a nave partiu em direção ao buraco de minhoca, chamado Buraco SH. A cada hora que passava, mais

perto estava o buraco e mais ansiosos ficávamos. Passando este buraco, haveria duas possibilidades: ou morreríamos ouviajaríamos no tempo.

Nesse momento escutei o capitão avisar que faltava pouco, era só acelerar o motor e passar. Avistamos o buraco eficou tudo preto.

***Acordei com o barulho de gente gritando. Achei estranho, porque eu estava no espaço, mas, assim que abri os ,vi

muita gente correndo. Me levantei e não avistei ninguém que estava antes na nave. Consegui segurar alguém e perguntei:-Que dia é hoje?-Hoje...dia 21 de dezembro de 2012! – gritou o homem, tentando se soltar de mim.-Mas por que tá todo mundo correndo? – perguntei.-Porque o mundo vai acabar, o planeta Terra vai entrar no buraco de minhoca e a gente vai morrer! A última vez

que humanos entraram em um buraco foi no Buraco SH. Eles nunca voltaram, o que faz a gente imaginar que elesmorreram! – Ele se soltou e continuou correndo.

Foi quando eu olhei para trás e o céu estava ficando preto. Imaginei, então, que era um buraco de minhoca. Tenteiacalmar a multidão, explicando que eu já havia atravessado um buraco e não tinha morrido. Ninguém acreditou em mim. Eucalmamente fui me sentar em um banco para esperar e viajar no tempo de novo. O buraco estava próximo.

***Deus criou o mundo e nele pôs humanos. Humanos criaram os pecados e, assim, acreditaram que o mundo nunca

iria acabar.

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DestinoRenata Sayão

Sr. Magnésio, o físico, me olhava com uma cara de desconfiado. Eu havia lhe dito que estaria disposto a viajar notempo para testar sua revolucionária máquina, mas ele realmente achava que estava faltando uma peça ou regulagem e queainda não estava pronto para testá-la. Então, tive uma ideia tão boa que até arregalei meus olhos! Era arriscadíssima, mascomo eu era assistente do físico, havia acompanhado todo o processo de criação da máquina e sabia como mexer nela, nãodevia ter problema. E eu seria a primeira pessoa a viajar no tempo, que máximo!

Já havia decidido usar a tal máquina, difícil foi decidir para qual época ir. Fiquei por muito tempo pensando nisso.Com todo esse poder na palma das mãos, poderia ir para muitos lugares, em diferentes tempos da história. Nos diasseguintes, minha ansiedade só cresceu. Sr. Magnésio, pobre velhinho, não desconfiava de nada.

Entrei com minha chave de assistente no laboratório, onde se encontrava a máquina, no dia 23 de maio de 2035.Estava tudo escuro, a única coisa visível era a luz azul do botão da máquina. Mas imagino que o brilho dos meus olhosganhava do brilho do botão. Cada passo que eu dava era com o máximo cuidado, pois seriam passos históricos. Quandoapertei o botão, um barulho invadiu instantaneamente meus pequenos ouvidos, uma espiral começou a se formar no ar, efoi crescendo, crescendo, até que pude adentrar. Passei primeiro minha perna direita, para dar boa sorte. Meu corpo entãofoi sugado brutalmente; o vento roçava furiosamente minha pele, até que não pude mais senti-la. Foram os trinta segundosmais assustadores da minha vida.

Caí numa superfície dura, mas só depois que rolei e levei uma queda enorme é que fui compreender que haviacaído num telhado. A rua na qual eu me encontrava era asfaltada e completamente deserta. Olhei para os dois lados, nãoencontrei nenhum sinal de vida. O ar da cidade não era de tranquilidade.

Me dei conta de que havia esquecido de configurar a máquina com a data desejada, o que me deixou enfurecido.Soquei o chão de raiva e lágrimas se formaram nos meus olhos.

Para acrescentar ao meu mau-humor, eu estava um pouco dolorido das duas quedas que havia levado, e nãoconseguia me levantar. Gritei por socorro, mas só ouvi ecos. Como não havia o que fazer, me contentei em ficar sentado,esperando.

Pouco depois, um grupo de homens, que assumi serem militares, correram em minha direção. Me examinaram,tocando meus cabelos escuros e aproximando seus rostos para analisar melhor o meu, com os olhos arregalados,murmurando coisas uns para os outros. Finalmente, chegaram a uma conclusão.

Me pegaram pelos braços e eu fui arrastado para uma caminhonete. Reconheci um símbolo nazi em um dosuniformes, mas logo me trancaram no escuro e a caminhonete começou a andar. Eu, moreno de olhos escuros, meencontrei no auge da Segunda Guerra Mundial, e não pensei em como voltaria ao presente. Meu destino seria um campo deconcentração e não havia escapatória. Meu destino, agora, era sofrimento e morte.

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Equipe técnicaAdriana SilveiraCecília ZanforlinCibele BortolatoCris BarrosCris MatheusEmerson ZoppeiGuillermo LoyolaKauê SantosLaureana PiragineMaggie MoraesMauro DunderMilly PannunzioSandra LimaValéria Aranha

Direção Estudos BrasileirosGila Fregonesi

Coordenação Estudos BrasileirosEloisa Galesso

OrganizaçãoValéria Aranha

ApoioSilvio BonilhaVera GoisFernanda Gomes