vigilancia esquistossomose mansoni 2014

146
Brasília / DF • 2014 MINISTÉRIO DA SAÚDE 4ª edição VIGILÂNCIA DA ESQUISTOSSOMOSE MANSONI Diretrizes Técnicas

Upload: jose-teofilo-moreira-filho

Post on 03-Oct-2015

185 views

Category:

Documents


57 download

DESCRIPTION

dados sobre esquistossomose

TRANSCRIPT

  • Braslia / DF 2014

    MINISTRIO DA SADE

    VENDA P

    ROIBIDADI

    STRIB

    UIO

    GRATATA UITATAT

    4 edio

    VIGILNCIA DAESQUISTOSSOMOSEMANSONIDiretrizes Tcnicas

  • 4a edio

    VIGILNCIA DAESQUISTOSSOMOSE MANSONI

    Diretrizes tcnicas

    1

  • MINISTRIO DA SADESecretaria de Vigilncia em Sade

    Departamento de Vigilncia das Doenas Transmissveis

    Braslia DF2014

    4a edio

    VIGILNCIA DAESQUISTOSSOMOSE MANSONI

    Diretrizes tcnicas

    2

  • MINISTRIO DA SADESecretaria de Vigilncia em Sade

    Departamento de Vigilncia das Doenas Transmissveis

    Braslia DF2014

    4a edio

    VIGILNCIA DAESQUISTOSSOMOSE MANSONI

    Diretrizes tcnicas

    3

  • 1995 Ministrio da Sade.

    Esta obra disponibilizada nos termos da Licena Creative Commons Atribuio No Comercial Compartilhameto pela mesma licena 4.0 Internacional. permitida a reproduo parcial ou total desta obra, desde que citada a fonte.

    A coleo institucional do Ministrio da Sade pode ser acessada, na ntegra, na Biblioteca Virtual em Sade do Ministrio da Sade: .

    Elaborao, distribuio e informaes:MINISTRIO DA SAUDESecretaria de Vigilncia em SadeDepartamento de Vigilncia das Doenas TransmissveisCoordenao Geral de Doenas em EliminaoSetor Comercial Sul, Quadra 4, Bloco A, Edifcio Principal, 3 andarCEP: 70304-000 Braslia/DFSite: www.saude.gov.br/svsE-mail: [email protected]

    Coordenao:Claudio Maierovitch Pessanha Henriques DEVEP/SVS/MSJarbas Barbosa da Silva Jr SVS/MSRosa Castlia Frana Ribeiro Soares CGHDE/DEVEP/SVS/MS

    Organizao:lvaro Luiz Marinho de Castro CGHDE/DEVEP/SVS/MSJeann Marie da Rocha Marcelino CGHDE/DEVEP/SVS/MS Maria Jos Rodrigues de Menezes CGHDE/DEVEP/SVS/MS

    Colaborao:Aline Vesely Reis Secretaria de Vigilncia em Sade SVS/MSAluzio Rosa Prata Universidade Federal do Tringulo Mineiro In memorianAndr Jean Deberdt Instituto Brasileiro do Meio Ambiente MMACarlos Graeff Teixeira Pontifcia Universidade Catlica/RSCarlos Maurcio de Figueiredo Antunes Universidade Federal de Minas Gerais UFMGCleudson Nery de Castro Universidade de Braslia UnBConstana Simes Barbosa Centro de Pesquisa Aggeu Magalhes/Fiocruz/PEEduardo Hage Carmo Secretaria de Vigilncia em Sade/MSEveraldo Resende Silva Fundao Nacional de Sade/BSBHlio Tadashi Yamada Fundao Nacional de Sade/MG

    Jos Roberto Lambertucci Universidade Federal de Minas Gerais UFMGJos Rodrigues Coura Instituto Oswaldo Cruz/Fiocruz/RJKarina Silva Fiorillo CGHDE/DEVEP/SVS/MSLauda Baptista Barbosa B. de Melo Departamento de Ateno Bsica DAB-SAS/MSNaftale Katz Centro de Pesquisa Ren Rachou/Fiocruz/MGOmar dos Santos Carvalho Centro de Pesquisa Ren Rachou/ Fiocruz/MGOtvio Sarmento Pieri Instituto Oswaldo Cruz/Fiocruz/RJRonaldo Guilherme Carvalho Scholte CGHDE/DEVEP/SVS/MSRonaldo Santos do Amaral Secretaria de Vigilncia em Sade SVS/MSSandra Costa Drummond Secretaria de Estado da Sade SES/MGSilvana Carvalho Thiengo Instituto Oswaldo Cruz/Fiocruz/RJValquria de Lima Soares Secretaria de Estado da Sade SES/ALVirgnia Torres Schall Centro de Pesquisa Ren Rachou/Fiocruz/MG

    Fotos:Acervo da Universidade Federal da BahiaAlan Lane de Melo UFMGConstana Simes Barbosa Fiocruz/PEDelir Corra Gomes IOC/FiocruzFrancisco Ceclio VianaHliton BarrosJos Roberto Lambertucci UFMGJos Roberto Machado e Silva UERJPaulo Marcos Zech Coelho CPqRR/FiocruzRenata Heisler Neves IOC/FiocruzSecretaria de Estado da Sade da Bahia

    Produo editorial:Capa e diagramao: Fred Lobo Nucom/SVSNormalizao: Daniela Ferreira Barros da Silva Editora MS/CGDI

    Ficha Catalogrfica____________________________________________________________________________________________________________Brasil. Ministrio da Sade. Secretaria de Vigilncia em Sade. Departamento de Vigilncia Epidemiolgica.

    Vigilncia da Esquistossomose Mansoni : diretrizes tcnicas / Ministrio da Sade, Secretaria de Vigilncia em Sade, Departamento de Vigilncia das Doenas Transmissveis. 4. ed. Braslia : Ministrio da Sade, 2014.

    144 p. : il.

    Titulo da 3 edio: Vigilncia e Controle da Esquistossomose: diretrizes tcnicasISBN 978-85-334-2152-3

    1. Esquistossomose epidemiologia. 2. Esquistossomose complicaes. 3. Vigilncia em sade. 4. Sade pblica. I. Ttulo.

    CDU 616.993.122____________________________________________________________________________________________________________Catalogao na fonte Coordenao-Geral de Documentao e Informao Editora MS OS 2014/0157

    Ttulos para indexao:Em ingls: Surveillance of Schistosomiasis Mansoni: technical guidelines.Em espanhol: Vigilancia de la Esquistosomiasis Mansoni: directrices tcnicas.

    Impresso no Brasil / Printed in Brazil

    Tiragem: 4 edio 2014 10.000 exemplares

    1 edio 1995 Controle da Esquistossomose: diretrizes tcnicas2 edio 1998 Controle da Esquistossomose: diretrizes tcnicas3 edio 2011 Vigilncia e Controle da Esquistossomose: diretrizes tcnicas

    4

  • Dedicatria

    Esta publicao dedicada ao pesquisador brasileiro Manoel Augusto Piraj da Silva, que descobriu e identificou o Schistosoma mansoni, agente etiolgico da esquistossomose mansoni, em 1908, no estado da Bahia. Em agosto de 2008 comemorou-se o centenrio da publicao do primeiro trabalho produzido por Piraj da Silva sobre esquistossomose.

    Fonte: Acervo da UFBA.

    5

  • 6

  • Sumrio

    APRESENTAO | 11

    1 INTRODUO | 131.1 Importncia da esquistossomose como problema de sade pblica | 15

    1.2 Histrico do Programa de Vigilncia e Controle da Esquistossomose | 16

    2 A INFECO E A DOENA | 192.1 Descrio | 19

    2.2 Epidemiologia | 19

    2.2.1 Magnitude e transcendncia | 21

    2.2.2 Distribuio geogrfica | 24

    2.3 Agente etiolgico e ciclo biolgico | 26

    2.3.1 Hospedeiro definitivo e reservatrios | 30

    2.3.2 Hospedeiros intermedirios | 31

    2.3.3 Perodo de incubao | 39

    2.3.4 Perodo de transmissibilidade | 39

    2.3.5 Mecanismo de transmisso | 39

    2.3.6 Suscetibilidade e resistncia | 41

    3 FASES E FORMAS CLNICAS | 433.1 Classificao da esquistossomose mansoni | 43

    3.1.1 Fase inicial | 44

    3.1.2 Formas agudas | 44

    3.2 Fase tardia | 46

    3.2.1 Formas crnicas | 46

    3.2.2 Forma hepatointestinal | 47

    3.2.3 Forma heptica | 47

    3.2.4 Forma hepatoesplnica | 48

    3.2.5 Forma hepatoesplnica compensada | 49

    3.2.6 Forma hepatoesplnica descompensada | 52

    3.3 Outras formas clnicas e complicaes | 53

    3.3.1 Forma vasculopulmonar | 53

    3.3.2 Hipertenso pulmonar | 53

    3.3.3 Glomerulopatia | 54

    3.3.4 Forma neurolgica | 55

    3.3.5 Outras localizaes | 56

    3.3.6 Pseudoneoplsica | 56

    3.3.7 Doena linfoproliferativa | 57

    7

  • 3.4 Doenas associadas que modificam o curso da esquistossomose mansoni | 57

    3.4.1 Salmonelose prolongada | 57

    3.4.2 Abscesso heptico | 58

    3.4.3 Esquistossomose em imunocomprometidos | 58

    3.4.4 Outras hepatopatias | 58

    3.5 Diagnstico diferencial | 59

    4 DIAGNSTICO | 614.1 Mtodos diretos | 61

    4.1.1 Pesquisa de ovos de S. mansoni nas fezes | 61

    4.1.2 Pesquisa de antgeno circulante do parasita | 62

    4.1.3 Outros mtodos diretos | 62

    4.2 Mtodos indiretos | 63

    4.2.1 Reao de ELISA | 63

    4.2.2 Reao periovular | 63

    4.2.3 Intradermorreao | 64

    4.2.4 Outros recursos diagnsticos em desenvolvimento | 64

    4.3 Diagnstico por Imagem | 64

    4.3.1 Ultrassonografia do abdmen | 64

    4.3.2 Radiografia do trax em PA e perfil | 65

    4.3.3 Endoscopia digestiva alta | 65

    4.3.4 Ressonncia magntica | 66

    4.3.5 Eco-doppler-cardiografia | 66

    5 TRATAMENTO | 675.1 Tratamento medicamentoso das formas crnicas | 67

    5.1.1 Praziquantel | 67

    5.1.2 Oxamniquina | 68

    5.1.3 Contraindicaes do praziquantel e oxamniquina | 68

    5.1.4 Controle de cura | 68

    5.2 Tratamento da esquistossomose aguda | 68

    5.3 Tratamento de outras formas clnicas | 71

    5.4 Tratamento das varizes do esfago (farmacolgico, endoscpico e cirrgico) | 71

    5.5 Tratamento cirrgico | 72

    5.5.1 Tratamento cirrgico na vigncia da hemorragia | 72

    5.5.2 Tratamento cirrgico eletivo aps a interrupo do sangramento | 72

    5.5.3 Tratamento cirrgico preventivo | 73

    5.5.4 Escolha do procedimento cirrgico quando indicado | 73

    5.6 Transplante heptico | 73

    8

  • 6 VIGILNCIA EPIDEMIOLGICA, CONTROLE E INTERRUPO DA TRANSMISSO | 75

    6.1 Definio de caso de esquistossomose | 76

    6.2 Notificao | 77

    6.2.1 Sistema de informao do PCE para as reas endmicas SISPCE | 77

    6.2.2 Fluxo de dados do sistema | 78

    6.3 Investigao | 80

    6.3.1 Conduta frente a um surto | 81

    6.4 Medidas para o enfrentamento| 81

    6.5 Classificao das reas de transmisso | 82

    6.5.1 rea Endmica | 82

    6.5.2 rea de Foco | 83

    6.5.3 rea Indene | 85

    6.5.4 rea Vulnervel | 86

    6.6 Atividades de controle | 87

    6.6.1 Reconhecimento geogrfico | 88

    6.6.2 Inqurito coproscpico | 89

    6.6.3 Informaes a serem prestadas aos portadores tratados | 90

    6.6.4 Informaes a serem prestadas aos portadores no tratados | 90

    6.7 Interrupo na transmisso de esquistossomose | 91

    6.8 A esquistossomose na rede de Ateno Bsica | 92

    6.9 Controle dos hospedeiros intermedirios | 93

    7 MEDIDAS DE SANEAMENTO AMBIENTAL | 95

    8 A EXPANSO DA ESQUISTOSSOMOSE NAS REAS DE DESENVOLVIMENTO ECONMICO | 97

    9 EDUCAO EM SADE E MOBILIZAO COMUNITRIA | 999.1 Estratgias educativas e sugestes para a preveno e controle da esquistossomose | 100

    9.2 Estratgias e recomendaes para a escola | 101

    9.3 O papel educativo do profissional de sade | 105

    9.4 Exigncias para a produo de materiais de divulgao na rea da sade | 107

    10 AVALIAO DAS AES DE VIGILNCIA E CONTROLE | 10910.1 Conceitos importantes | 109

    10.2 Tipos de avaliao | 110

    10.2.1 Monitoramento | 111

    10.2.2 Importncia do monitoramento e da avaliao para o PCE | 111

    10.3 A avaliao epidemiolgica | 112

    9

  • 11 INDICADORES EPIDEMIOLGICOS E OPERACIONAIS DO PCE | 11311.1 Indicadores relacionados coproscopia | 113

    11.1.1 Indicadores operacionais | 113

    11.1.2 Indicadores epidemiolgicos | 113

    11.2 Indicadores relacionados morbidade e mortalidade | 115

    11.2.1 Indicadores epidemiolgicos | 115

    11.3 Indicadores relacionados ao tratamento | 115

    11.3.1 Indicadores operacionais | 115

    11.3.2 Indicadores epidemiolgicos | 117

    11.4 Indicadores relacionados aos hospedeiros intermedirios | 117

    11.4.1 Indicadores operacionais | 117

    REFERNCIAS | 119

    BIBLIOGRAFIA CONSULTADA | 121

    GLOSSRIO | 125

    ANEXOS | 127

    ANEXO A Distribuio geogrfica da esquistossomose mansoni no mundo | 129

    ANEXO B Diagnstico laboratorial em campo | 130

    ANEXO C Subsdios para planejamento das atividades de campo | 132

    ANEXO D Ficha de investigao Sinan | 134

    ANEXO E Formulrio PCE-101 Dirio de Coproscopia e Tratamento | 135

    ANEXO F Formulrio PCE-102 Dirio de Malacologia | 136

    ANEXO G Formulrio PCE-102A Cadastro de Colees Hdricas | 137

    ANEXO H Formulrio PCE-103 Potencial de Transmisso | 138

    ANEXO I Formulrio PCE-104 Etiqueta (imprime a numerao de amostras) | 139

    ANEXO J Formulrio PCE-108 Casos Detectados na Rede Bsica em reas Endmicas | 140

    10

  • 11

    Esta publicao destina-se aos profissionais de sade envolvidos com as atividades de vigilncia epidemiolgica da esquistossomose mansoni no Pas. Foi elaborado com o objetivo de subsidiar o planejamento e a operacionalizao das aes do Programa de Vigilncia e Controle da Esquistossomose. Com isso, pretende-se garantir o mnimo de homogeneidade nas aes de vigilncia de modo a permitir anlises e avaliaes comparativas no tempo e no espao; contribuir para a implementao das aes do programa nas diferentes unidades gestoras do programa nas esferas municipal, estadual e federal.

    Considerando a vasta dimenso geogrfica do Brasil, a grande diversidade de situaes ecolgicas, scioeconmicas e culturais que repercutem na epidemiologia e na dinmica da sua transmisso, a esquistossomose est associada s condies ambientais e sanitrias deficitrias, ainda presentes em diversas localidades do Pas. Espera-se que essas diretrizes adaptadas s condies locais possam subsidiar a reduo dos casos da doena e sua eliminao no Pas.

    Este manual, fruto de um trabalho coletivo de tcnicos do programa e especialistas, uma reviso e atualizao profunda da segunda edio, produzida em 1998. Isso se fez necessrio em funo das mudanas epidemiolgicas e da produo de novos conhecimentos sobre a esquistossomose ocorridas ao longo desses 15 anos.

    Secretaria de Vigilncia em SadeMinistrio da Sade

    APRESENTAO

    11

  • 12

  • 13

    As esquistossomoses originaram-se nas bacias dos rios Nilo, na frica, e do Yangtze, na sia. Ovos de Schistosoma foram encontrados em vsceras de mmias egpcias cuja origem remonta a 1.250 a.C., conforme comprovou Ruff er, em 1910. Igualmente, existem relatos de que na cidade de Cehang-lha, na China, foram encontrados ovos de Schistosoma japonicum em cadver de cerca de 2.000 anos.

    Em 1852, no Cairo, Th eodor Bilharz identifi cou em necropsia pela primeira vez, em veias mesentricas, os vermes que fi caram conhecidos como esquistossomos. Da a denominao de bilharziose ou bilharzase como sinonmia para esquistossomose.

    Em 1904, Katsurada descobriu e descreveu pela primeira vez os vermes adultos da espcie conhecida como S. japonicum. Somente em 1907 fi cou evidente (pelos trabalhos de Sambon (1907) e Manson e Piraj da Silva (1908) que os vermes descritos por Bilharz compreendiam, na realidade, duas espcies distintas, tanto em morfologia quanto na sua patogenicidade: o S. haematobium, com ovos de espcula terminal e que afetam preferencialmente o trato urinrio e o S. mansoni (SAMBON, 1907), cujos ovos tm espcula lateral e que se alojam em vasos sanguneos do trato digestivo. Atualmente so conhecidas mais trs espcies que afetam o homem: o S. intercalatum, descrito em 1934, o S. mekongi, em 1978 e o S. malayensis, em 1986.

    Desses pontos de origem, as esquistossomoses mansoni, hematbia e japnica foram dispersadas para outros continentes, medida que os meios de transporte foram se desenvolvendo e permitindo grandes fl uxos migratrios.

    Das seis espcies de Schistosoma que parasitam o homem, somente o S. mansoni existe nas Amricas do Sul e Central. Nesse continente, o comrcio de escravos considerado como o principal fator responsvel pela introduo da doena. As outras espcies no so aqui encontradas devido inexistncia de hospedeiros intermedirios (caramujos) suscetveis infeco e por isso delas no trataremos neste manual.

    A introduo da esquistossomose no Brasil se deu por meio do trfi co de escravos originrios da costa ocidental da frica, que ingressaram no pas principalmente pelos portos de Recife e Salvador para trabalharem nas lavouras de cana-de-acar. Dos portos de entrada, a doena se expandiu inicialmente pelo nordeste brasileiro, formando extensa rea de transmisso entre os estados do Rio Grande do Norte e a Bahia. No sculo XVIII, com o incio do ciclo do ouro e diamante e o declnio da produo aucareira no Nordeste, um fl uxo migratrio intenso introduziu a endemia em

    INTRODUO 1

    13

  • 14

    Secretaria de Vigilncia em Sade/MS

    Minas Gerais (Figura 1). Uma vez introduzida em nosso territrio, encontrou condies favorveis transmisso, constituindo hoje, pela sua magnitude e transcendncia, importante problema de sade pblica, especialmente nas regies Nordeste e Sudeste do Pas.

    Figura 1 Representao da expanso da esquistossomose mansoni no Brasil

    Fonte: (BRASIL, 1998, com adaptaes feitas por Heloisa M. N. Diniz).

    A esquistossomose se expandiu amplamente no Pas, em funo de movimentos migratrios em direo s reas com precrias condies de saneamento bsico. A propagao da doena foi e continua sendo facilitada pela:

    longevidade dos vermes adultos, que embora tenham vida mdia de cinco a oito anos, podem chegar a dcadas;

    grande capacidade de postura das fmeas, com mdia de 300 ovos por dia;

    14

  • 15

    Vigilncia da Esquistossomose Mansoni Diretrizes Tcnicas

    existncia de portadores que, mesmo quando afastados dos focos de transmisso, so capazes de continuar excretando ovos por mais de 20 anos;

    carter crnico e insidioso da doena, que faz com que frequentemente os pacientes no busquem tratamento;

    ampla distribuio dos hospedeiros intermedirios; facilidade de contrair a infeco; precariedade do saneamento nas reas rurais e na periferia das cidades, possibilitando a

    contaminao das colees hdricas, amplamente utilizadas pela populao mais pobre.

    Os recursos hdricos, indispensveis ao desenvolvimento agrcola, contribuem para a propagao da esquistossomose no Pas. Contudo, so os fluxos migratrios, e principalmente os hbitos de vida do homem, que podem propiciar novos e amplos habitat para os moluscos hospedeiros, favorecendo, alm disso, o contato estreito e frequente da populao humana com a gua contaminada.

    1.1 Importncia da esquistossomose como problema de sade pblica

    A esquistossomose endmica em vasta extenso do territrio nacional, considerada ainda um grave problema de sade pblica no Brasil porque acomete milhes de pessoas, provocando um nmero expressivo de formas graves e bitos.

    Ela ocorre nas localidades sem saneamento ou com saneamento bsico inadequado, sendo adquirida atravs da pele e mucosas em consequncia do contato humano com guas contendo formas infectantes do S. mansoni. A transmisso da doena depende da presena do homem infectado, excretando ovos do helminto pelas fezes, e dos caramujos aquticos, que atuam como hospedeiros intermedirios, liberando larvas infectantes do verme nas colees hdricas utilizadas pelos seres humanos.

    Outros fatores, alm do saneamento, atuam como condicionantes e contribuem para a ocorrncia da esquistossomose numa localidade. Entre esses, destacam-se: o nvel socioeconmico, ocupao, lazer, grau de educao e informao da populao exposta ao risco da doena. Esses fatores se relacionam e favorecem a transmisso da doena, em maior ou menor intensidade, de acordo com a realidade local.

    Devido complexidade do mecanismo de transmisso da esquistossomose e diversidade dos fatores condicionantes, o controle da doena depende de vrias aes preventivas: a) diagnstico precoce e tratamento oportuno; b) vigilncia e controle dos hospedeiros intermedirios; c) aes educativas em sade; d) aes de saneamento para modificao das condies domiciliares e ambientais favorveis transmisso.

    15

  • 16

    Secretaria de Vigilncia em Sade/MS

    Tais aes devem ser executadas de forma integrada como parte de um programa regular de controle. O controle duradouro e sustentvel da esquistossomose depende da implementao de polticas pblicas que melhorem as condies de vida das populaes. Para tanto, os gestores municipais do Sistema nico de Sade SUS, responsveis pela execuo das aes de vigilncia e controle da esquistossomose, devem buscar, em articulao com outros setores governamentais, a melhoria de vida das populaes, mediante aes de educao e de interveno no meio ambiente.

    A reduo da morbimortalidade da esquistossomose requer a deteco precoce e pronto tratamento de todos os portadores para evitar que a ao patognica acumulativa dos ovos do S. mansoni provoque alteraes nos rgos afetados, especialmente fgado, resultando na hipertenso portal e outras formas graves da doena. A deteco e tratamento dos portadores objetivam tambm reduzir a expanso geogrfica da esquistossomose.

    Uma das dificuldades para deteco precoce dos portadores do S. mansoni que a infeco pode evoluir de maneira silenciosa at a instalao das formas graves da doena. Cabe aos municpios realizar regularmente busca ativa e tratamento dos portadores, por longo prazo, em mdia em ciclos bienais, para manter a prevalncia baixa e reduzir o aparecimento das formas graves. A busca ativa dos portadores s dever ser reduzida ou interrompida quando as medidas permanentes de controle eliminarem a transmisso.

    Os portadores sintomticos com doena grave, na fase aguda ou crnica, e os casos de formas ectpicas, por exemplo, de esquistossomose medular, chegam por demanda passiva no servio de sade e devem ter acesso aos cuidados mdicos e aos diagnsticos na rede de ateno bsica e servios especializados. Aps o diagnstico, esses casos devem ser notificados e investigados, pois funcionam como marcadores de reas endmicas crticas, que necessitam de ateno prioritria com aes integradas. Essas aes devem ser planejadas e desenvolvidas com a participao de outras reas sociais e governamentais, como saneamento, educao, turismo, meio ambiente e Ministrio Pblico.

    1.2 Histrico do Programa de Vigilncia e Controle da Esquistossomose

    Desde o primeiro trabalho publicado, em 1908, por Piraj da Silva, dois marcos histricos importantes na luta contra a esquistossomose no Brasil foram a realizao do primeiro inqurito coprolgico de mbito nacional, no perodo de 1947 a 1952, coordenado pelos sanitaristas Pelon e Teixeira, da Diviso de Organizao Sanitria DOS do Ministrio da Educao e Sade, que permitiu o mapeamento da doena no Pas, e a criao, em 1975, na Superintendncia de Campanhas de Sade Pblica Sucam, do Programa Especial de Controle da Esquistossomose Pece. Pela primeira vez, a esquistossomose foi tratada com prioridade correspondente a sua importncia mdico-social.

    16

  • 17

    Vigilncia da Esquistossomose Mansoni Diretrizes Tcnicas

    A descentralizao das aes de vigilncia e controle da esquistossomose comeou em 1993, com o apoio e recursos do Projeto de Controle de Doenas Endmicas no Nordeste PCDEN, ampliando a participao dos municpios e a cobertura do Programa de Vigilncia e Controle da Esquistossomose.

    Antes da criao do SUS, o PCE contava com recursos exclusivos do governo federal para realizar os inquritos coproscpicos e demais aes. Uma vez instalado o SUS, todos os recursos do PCE, inclusive os humanos, que eram gerenciados pela esfera federal, foram redistribudos e esto sob a responsabilidade dos gestores municipais. As aes de vigilncia epidemiolgica e de controle da esquistossomose devem estar inseridas na rotina da Ateno Bsica AB. Mesmo com a mudana do modelo, a insuficincia de recursos permanece, dificultando o cumprimento dos objetivos do programa.

    Desde 1976, a implementao de medidas regulares de controle da esquistossomose no Brasil teve impacto sobre a prevalncia e a intensidade das infeces humanas, diminuindo a frequncia de formas hepatoesplnicas e o nmero de bitos. Aps a queda inicial de positividade, a doena se ajustou a um novo nvel endmico, resistindo s aes convencionais de controle, notadamente ao tratamento. Esse desafio refora a necessidade da intensificao das aes de saneamento, maior flexibilidade do programa, bem como integrao de suas atividades rede de ateno bsica. Alcanar esses objetivos confere sustentabilidade s aes de vigilncia e controle e previne o retrocesso situao anterior.

    No mbito federal, cabe Secretaria de Vigilncia em Sade SVS a normatizao, o fornecimento dos insumos estratgicos, o apoio tcnico e financeiro, com base nos instrumentos de pactuao com estados e municpios, e condicionados apresentao regular dos relatrios estatsticos, anlises e avaliaes das aes desenvolvidas pelo PCE nos estados e Distrito Federal.

    A instituio e manuteno de um programa regular de controle tem contribudo para diminuir os casos da doena por meio do diagnstico precoce e do tratamento oportuno de milhares de portadores de S. mansoni, especialmente os casos de forma grave (hepatosplnica), mas no tem sido suficiente para impedir o aparecimento de novos casos e novas reas endmicas.

    17

  • 18

  • 19

    2.1 Descrio

    A esquistossomose mansoni uma doena infecto parasitria provocada por vermes do gnero Schistosoma, que tm como hospedeiros intermedirios caramujos de gua doce do gnero Bimphalaria, e que pode evoluir desde formas assintomticas at formas clnicas extremamente graves.

    Tambm conhecida como Bilharziose, Xistose, Xistosa, Doena dos Caramujos, Barriga dgua, Doena de Manson-Piraj da Silva e outras designaes menos usuais, decorrente da presena de vermes que se alojam e vivem nos vasos mesentricos durante vrios anos nas suas formas adultas e diferenciadas sexualmente. Uma vez que as formas adultas estejam alojadas, inicia-se a oviposio. Alguns desses ovos so expelidos do organismo juntamente com as fezes, promovendo assim a perpetuao do ciclo vital do parasita, sempre que condies ambientais favorveis estiverem presentes. Os ovos no eliminados produzem minsculos granulomas e ndulos cicatriciais nos rgos em que se depositam, geralmente nas paredes do intestino ou no fgado, podendo originar formas ectpicas em qualquer rgo ou tecido do organismo humano.

    A sintomatologia apresentada depende da localizao, da quantidade do parasita nos diferentes rgos, das reaes do organismo humano e da resposta ao tratamento. Na maioria dos casos de infeco esquistossomtica os efeitos patolgicos mais importantes so observados na fase crnica da doena, quando pode haver comprometimento heptico e consequente hipertenso portal. Entretanto, na forma inicial pode haver consequncias graves como paraplegia ou morte.

    2.2 Epidemiologia

    No perodo de 2003 a 2012, a mdia de portadores de S. mansoni identifi cados por meio de inquritos coproscpicos foi de 101.293. De 2000 a 2003 o percentual de positividade situou-se na mdia de 7,0%. A partir de 2004 esse percentual decresceu gradativamente e alcanou 4,5% em 2012 (Tabela 1). Destaque-se que o indicador de percentual de positividade no refl ete necessariamente a prevalncia, na medida em que no utiliza como denominador a totalidade da populao sob risco ou uma parcela representativa desta; pode ser considerado apenas como uma aproximao da prevalncia, especialmente em populaes menores, como as que esto representadas na maioria das localidades trabalhadas pelo PCE.

    A INFECO E A DOENA 2

    19

  • 20

    Secretaria de Vigilncia em Sade/MS

    As maiores prevalncias da esquistossomose so encontradas nas regies Nordeste e Sudeste do Pas.

    Tabela 1 Populao examinada, portadores de infeco, percentual de positividade e tratamentos

    realizados para esquistossomose Brasil, 1975 a 2012

    Ano Populao examinadaPortadores de S.

    mansoniPercentual de

    positividade (%)Tratamentos realizados

    1975 855.921 46.331 5,4 11.580

    1976 1.018.496 51.718 5,1 8.760

    1977 443.591 103.409 23,3 285.370

    1978 626.697 86.111 13,7 1.098.309

    1979 663.429 59.905 9,0 1.640.191

    1980 1.684.615 164.860 9,8 1.296.703

    1981 1.840.626 172.242 9,4 978.358

    1982 1.732.907 136.882 7,9 777.617

    1983 2.096.268 184.149 8,8 811.112

    1984 2.347.810 198.025 8,4 834.588

    1985 2.697.910 223.609 8,3 700.975

    1986 1.878.728 138.481 7,4 407.354

    1987 1.406.844 90.001 6,4 208.322

    1988 1.363.606 82.962 6,1 145.600

    1989 1.395.202 76.412 5,5 150.821

    1990 1.802.675 150.934 8,4 195.430

    1991 1.900.761 134.103 7,1 164.576

    1992 2.353.970 203.207 8,6 253.666

    1993 2.354.390 274.084 11,6 316.077

    1994 2.559.051 283.369 11,1 321.203

    1995 2.715.259 300.484 11,1 322.666

    1996 2.718.164 245.401 9,0 261.533

    1997 2.791.831 290.031 10,4 287.131

    1998 2.163.354 183.374 8,5 195.402

    1999 2.095.765 177.146 8,5 170.580

    2000 1.364.240 90.580 6,6 92.351

    2001 1.443.906 103.333 7,1 99.249

    2002 2.146.424 156.732 7,3 148.04

    2003 2.179.457 152.982 7,0 145.625

    2004 2.055.144 129.744 6,3 119.782

    2005 2.229.407 137.733 6,1 126.921

    2006 2.371.016 141.017 5,9 129.865

    2007 2.312.661 134.165 5,8 128.185

    2008 1.609.649 98.522 6,1 87.396

    2009 1.511.043 74.721 4,9 67.987

    2010 1.290.372 66.779 5,2 58.215

    2011 1.035.492 50.603 4,9 39.884

    2012 589.906 26.667 4,5 16.047

    Fonte: Sistema de Informao do Programa de Vigilncia e Controle da Esquistossomose SISPCE/SVS/MS.

    20

  • 21

    Vigilncia da Esquistossomose Mansoni Diretrizes Tcnicas

    2.2.1 Magnitude e transcendncia

    Entre as parasitoses que afetam o homem, a esquistossomose uma das mais disseminadas no mundo. De acordo com a Organizao Mundial de Sade OMS, ocupa o segundo lugar depois da malria, pela sua importncia e repercusso socioeconmica.

    uma das doenas de maior prevalncia entre aquelas veiculadas pela gua. Nos pases em desenvolvimento representa um dos principais riscos sade das populaes rurais e das periferias das cidades.

    A OMS estima que as esquistossomoses afetam 200 milhes de pessoas e representam ameaa para mais de 600 milhes de indivduos que vivem em reas de risco. A esquistossomose mansoni ocorre em 54 pases endmicos.

    Em 1990, a OMS estimou uma perda de 4,5 milhes de DALYs (Disability-adjusted life years)1 pela esquistossomose no mundo. Esse indicador mede a morbimortalidade levando em conta os anos de vida perdidos ajustados pela incapacidade ou os anos de vida potencialmente perdidos por morte prematura devido doena.

    O nmero de internao e bitos no Brasil por esquistossomose e suas respectivas taxas esto dispostos nas Tabelas 2 e 3.

    1 Em portugus: Anos de vida perdidos, ajustados por incapacidade

    21

  • 22

    Secretaria de Vigilncia em Sade/MS

    Tabela 2 Taxa de internao hospitalar por esquistossomose, por 100 mil habitantes Brasil, 1984

    a 2012

    Ano Populao Internao poresquistossomose Taxa

    1984 129.025.577 1.483 1,2

    1985 131.639.272 1.279 1,0

    1986 134.228.492 1.587 1,2

    1987 136.780.739 2.706 2,0

    1988 139.280.140 3.497 2,5

    1989 141.714.953 3.107 2,2

    1990 144.090.756 3.080 2,1

    1991 146.825.475 3.293 2,2

    1992 148.684.120 3.329 2,2

    1993 151.556.521 3.322 2,2

    1994 153.726.463 2.926 1,9

    1995 155.822.296 2.105 1,4

    1996 157.070.163 1.656 1,1

    1997 159.636.297 1.522 1,0

    1998 161.790.182 1.314 0,8

    1999 163.947.436 1.344 0,8

    2000 169.799.170 1.322 0,8

    2001 172.385.776 1.267 0,7

    2002 174.632.932 1.105 0,6

    2003 176.876.251 1.017 0,6

    2004 179.108.251 859 0,5

    2005 184.184.074 890 0,5

    2006 186.022.071 757 0,4

    2007 189.335.187 722 0,4

    2008 189.612.814 415 0,2

    2009 191.481.045 366 0,2

    2010 185.712.713 483 0,1

    2011 192.376.496 240 0,1

    2012 193.976.530 218 0,1

    Fonte: Sistema de Informao Hospitalar do Sistema nico de Sade SIH/SUS.

    No Brasil, a extensa distribuio geogrfica da esquistossomose mansoni por si s dimensiona a magnitude desse problema de sade pblica. Alm disso, a ocorrncia de formas graves e bitos fazem da esquistossomose uma das parasitoses de maior transcendncia. A morbidade da esquistossomose representa grande dano sade da populao, sua qualidade de vida e perdas de natureza econmica.

    22

  • 23

    Vigilncia da Esquistossomose Mansoni Diretrizes Tcnicas

    Tabela 3 Taxa de mortalidade por esquistossomose, por 100 mil habitantes Brasil, 1977

    a 2012

    Ano Populao bito Taxa

    1977 109.984.679 740 0,7

    1978 112.757.285 763 0,7

    1979 114.651.243 818 0,7

    1980 119.011.052 834 0,7

    1981 121.154.159 759 0,6

    1982 123.774.229 696 0,6

    1983 126.403.352 705 0,6

    1984 129.025.577 697 0,5

    1985 131.639.272 673 0,5

    1986 134.228.492 701 0,5

    1987 136.780.739 670 0,5

    1988 139.280.140 724 0,5

    1989 141.714.953 589 0,4

    1990 144.090.756 550 0,4

    1991 146.825.475 553 0,4

    1992 148.684.120 551 0,4

    1993 151.556.521 586 0,4

    1994 153.726.463 588 0,4

    1995 155.822.296 608 0,4

    1996 157.070.163 450 0,3

    1997 159.636.297 505 0,3

    1998 161.790.182 479 0,3

    1999 163.947.436 446 0,3

    2000 169.799.170 484 0,3

    2001 172.385.776 583 0,3

    2002 174.633.932 568 0,3

    2003 176.876.251 464 0,3

    2004 184.184.074 519 0,3

    2005 186.020.071 514 0,3

    2006 189.335.187 556 0,3

    2007 189.335.187 534 0,3

    2008 189.612.814 541 0,3

    2009 191.481.045 498 0,3

    2010 185.712.713 514 0,3

    2011 192.376.496 524 0,3

    2012 193.976.530 426 0,2

    Fonte: Sistema de Informao sobre Mortalidade SIM.

    23

  • 24

    Secretaria de Vigilncia em Sade/MS

    2.2.2 Distribuio geogrfica

    Nas Amricas encontram-se reas endmicas no Brasil, Suriname, Venezuela e Ilhas do Caribe. Destes pases, o Brasil o que possui a maior rea endmica, onde a migrao de pessoas originrias de reas endmicas, entre elas portadores de S. mansoni, para reas at ento indenes, em busca de melhores condies de vida, tem contribudo para a disperso da doena. Estas pessoas foram aos poucos formando pequenos ncleos populacionais, nos quais as condies sanitrias precrias favoreciam o contato de fezes das pessoas parasitadas com os hospedeiros intermedirios suscetveis.

    Atualmente a esquistossomose distribui-se mais intensamente numa faixa de terras contnuas e contguas ao longo de quase toda a costa litornea da regio Nordeste, a partir do Rio Grande do Norte em direo ao Sul, includas as zonas quentes e midas dos estados da Paraba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Bahia, onde se interioriza alcanando Minas Gerais, no Sudeste, seguindo o trajeto de importantes bacias hidrogrficas.

    De forma localizada est presente nos estados do Cear, Piau e Maranho, no Nordeste; Par, na regio Norte; Gois e DistritoFederal, no Centro-Oeste; Esprito Santo, So Paulo e Rio de Janeiro, no Sudeste; Paran, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, na Regio Sul. No total, existem 19 Unidades Federadas com transmisso. O foco mais recente foi detectado, em 1997, no municpio de Esteio, no Rio Grande do Sul (Figura 2).

    24

  • 25

    Vigilncia da Esquistossomose Mansoni Diretrizes Tcnicas

    Figura 2 Distribuio da esquistossomose segundo percentual de positividade em inquritos

    coproscpicos Brasil, 2012

    Fonte: Sistema de Informao do Programa de Vigilncia e Controle da Esquistossomose SISPCE/SVS/MS.

    25

  • 26

    Secretaria de Vigilncia em Sade/MS

    2.3 Agente etiolgico e ciclo biolgico

    Os agentes causadores da esquistossomose so Platelmintos (vermes achatados), da classe dos trematdeos (de forma folicea), famlia Schistosomatidae, que apresenta como caracterstica a existncia de sexos separados, com ntido dimorfismo sexual.

    O S. mansoni um verme de cor esbranquiada ou leitosa, que habitualmente hspede das vnulas tributrias do sistema porta, particularmente das veias mesentricas superiores e inferiores, do plexo hemorroidrio e mesmo da poro intra-heptica da veia porta. No interior desses vasos, encontram-se geralmente o macho e a fmea, acasalados (Figura 3). A fmea aloja-se no canal ginecforo do macho e, por ser mais longa, ultrapassa-o para diante ou para trs e se recurva em uma ou duas flexes. Geralmente esses vermes realizam migraes dentro do mesmo vaso ou de um para outro, atravs de anastomoses.

    Figura 3 Casal de S. mansoni, mostrando a fmea do verme no canal ginecforo do macho

    Fonte: Jos Roberto Machado e Silva UERJ, Renata Heisler Neves e Delir Corra Gomes IOC (2008).

    O macho, isoladamente, mede entre 6,5 mm e 12 mm de comprimento e achatado, porm, devido ao enrolamento ventral de suas bordas corporais para formar o canal ginecforo, adquire um aspecto cilndrico. A fmea, mais fina que o macho, tem um comprimento aproximadamente duas vezes maior (cerca de 15 mm) e perfeitamente cilndrica, com as extremidades afiladas. Uma vez instalada no canal ginecforo do macho, facilmente fecundada e inicia a postura dos ovos no interior das vnulas da submucosa intestinal.

    26

  • 27

    Vigilncia da Esquistossomose Mansoni Diretrizes Tcnicas

    Os ovos (Figura 4) quando maduros medem cerca de 150 micrmetros de comprimento por 60 micrmetros de largura e tm formato oval, apresentando na sua parte mais larga um espculo lateral voltado para trs. Por ocasio da postura, os ovos contm o embrio ainda em formao. Somente depois de decorridos seis a sete dias o miracdio torna-se maduro. O tempo de vida dos ovos maduros nos tecidos de aproximadamente 20 dias, morrendo o miracdio caso a expulso pelas fezes no ocorra.

    A maioria dos ovos encontrados nas fezes contm embries maduros. A sobrevida dos miracdios dentro dos ovos que permanecem nas fezes de apenas quatro a cinco dias. Os ovos necessitam do contato com a gua para continuarem sua evoluo. A exposio direta das fezes ao sol provoca a morte dos miracdios dentro de 48 horas. Se o bolo fecal for conservado mido e ao abrigo da luz solar direta, esses ovos ainda permanecem viveis por alguns dias, podendo ser carreados por algum veculo (a chuva, por exemplo) para alguma coleo hdrica. Depois que a gua penetra por osmose no ovo e rompe sua casca, o miracdio movimenta-se ativamente em busca do caramujo hospedeiro intermedirio.

    Figura 4 Ovos de S. mansoni

    Fonte: Jos Roberto Machado e Silva UERJ, Renata Heisler Neves e Delir Corra Gomes IOC (2008).

    O miracdio (Figura 5), que representa a primeira forma larvria do S. mansoni, sobrevive at 24 horas na gua, se as condies de temperatura forem adequadas. um organismo mvel, graas aos numerosos clios que revestem sua delgada cutcula e ao seu sistema muscular.

    A penetrao do miracdio no interior do molusco hospedeiro intermedirio ocorre devido atividade de substncias histolticas que so secretadas por suas glndulas ceflicas. Aps 48 horas, o miracdio perde a mobilidade e se transforma em esporocisto primrio, cujas clulas germinativas se multiplicam e do origem a esporocistos secundrios. Aps quatro a sete semanas da infeco, o molusco comea a liberar cercrias (Figuras 6a e 6b). Cada miracdio pode gerar at 300.000 cercrias.

    27

  • 28

    Secretaria de Vigilncia em Sade/MS

    Figura 5 Miracdio

    Fonte: Paulo Marcos Zech Coelho CPqRR (2008).

    Figuras 6a e 6b Cercrias de Schistosoma mansoni

    a b

    Fonte: Alan Lane de Melo UFMG (2008).

    28

  • 29

    Vigilncia da Esquistossomose Mansoni Diretrizes Tcnicas

    A liberao das cercrias influenciada pela luz solar e temperatura da gua. Colocando-se um planorbdeo infectado num recipiente com gua temperatura de 25C a 30C e expondo-se este luz solar direta ou artificial, observa-se em poucos minutos as cercrias sendo liberadas na gua e nadando ativamente. Na natureza, essa ecloso ocorre geralmente entre 11 e 15 horas, perodo em que a luminosidade e a temperatura so as mais adequadas para a ocorrncia do fenmeno.

    sob a forma de cercrias (chamadas furcocercrias, por apresentarem a cauda bifurcada) que o S. mansoni infecta o hospedeiro definitivo, seja ele o homem ou qualquer vertebrado suscetvel. Em laboratrio, a longevidade das cercrias de aproximadamente dois dias. Na natureza sua sobrevivncia menor e a infectividade diminui progressivamente durante o tempo em que permanecem livres.

    Ao penetrar ativamente na pele do homem, por meio de ao combinada da secreo ltica das glndulas anteriores e dos movimentos vibratrios, sobretudo da cauda, a cercria produz uma irritao de intensidade varivel de indivduo para indivduo (urticria e exsudato ppulo-eritematoso em alguns casos). O processo de penetrao do corpo da cercria, ou raramente da cercria inteira, dura normalmente de dois a 15 minutos.

    Uma vez nos tecidos do hospedeiro definitivo, as cercrias perdem a cauda e se transformam em esquistossmulos. Estes caem na circulao sangunea e/ou linftica, atingem a circulao venosa, vo ao corao e aos pulmes, onde permanecem algum tempo e podem causar certas alteraes mrbidas. Retornam posteriormente ao corao, de onde so lanados atravs das artrias aos pontos mais diversos do organismo, sendo o fgado o rgo preferencial de localizao do parasita. No fgado, estas formas jovens se diferenciam sexualmente e crescem, alimentando-se de sangue. Ainda imaturos, os parasitas migram para a veia porta, passando da s suas tributrias mesentricas, onde completam sua evoluo.

    A partir de 27 dias da penetrao das cercrias, aps a migrao dos esquistossomos para as veias mesentricas, inicia-se, geralmente, o acasalamento. Os vermes adultos se localizam no fgado e nos ramos terminais das veias mesentricas, da migram para as vnulas da submucosa intestinal, onde se daro as posturas dos ovos, por meio de uma srie de contraes musculares. A migrao dos ovos do vaso para a luz intestinal provoca micro-hemorragias e reas de inflamao responsveis pelo aparecimento de diarreia mucossanguinolenta e de outros distrbios gastrointestinais. Uma fmea de S. mansoni produz cerca de 300 ovos diariamente, dos quais cerca da metade eliminada nas fezes. Os ovos que no conseguem alcanar a luz intestinal por ficarem retidos nos tecidos, preferencialmente fgado e intestinos, so os responsveis pela formao de granulomas que, no fgado, podem ocluir, total ou parcialmente, a passagem do sangue, e juntamente com a fibrose periportal vo ocasionar as manifestaes das formas mais graves da doena. A expectativa de vida do S. mansoni, nas suas diferentes fases do ciclo biolgico, descrita no Quadro 1.

    29

  • 30

    Secretaria de Vigilncia em Sade/MS

    Quadro 1 Expectativa de vida do S. mansoni, nas suas diferentes fases do ciclo biolgico

    Fases Durao e evoluo

    Ovo imaturo At seis dias para maturao.

    Ovo maduro Dentro do hospedeiro, at 20 dias.

    Miracdio

    Dentro do ovo, em fezes slidas, sem exposio direta luz, at cinco dias.

    Depois da ecloso do ovo, no meio aquoso, com temperatura adequada, at 24 horas. Entre 24C e 28C cerca de metade morre nas primeiras oito horas de vida livre e os restantes entre oito e 12 horas.

    Dentro do molusco, 48 horas, at se transformar em esporocisto primrio.

    Esporocisto primrio

    Cerca de duas semanas at se transformar em esporocisto filho, tambm chamado esporocisto secundrio. Resultam, aproximadamente, de cada esporocisto primrio 20 a 40 esporocistos secundrios.

    Esporocisto secundrio

    Trs a quatro semanas at a formao das cercrias. Esporocistos secundrios, depois de produzirem cercrias por um tempo, podem voltar a formar novas geraes de esporocistos capazes de retomar a produo de novas cercrias. E este processo pode levar at mais de oito meses.

    Cercria At dois dias na gua, embora a infectividade caia rapidamente

    aps algumas horas. Leva de dois a 15 minutos para completar a penetrao da pele.

    Esquistossmulo Em 27 dias, depois da penetrao na pele, pode transformar-se em

    verme adulto; a postura pode comear aps o 30o dia e, a partir do 40o dia, podem ser encontrados ovos nas fezes.

    Verme adulto Vive em mdia cinco anos, embora existam relatos de pacientes eliminando ovos at 30 anos depois de sair da rea endmica.

    Fonte: (REY, 2001; PRATA, 1987, com adaptaes).

    2.3.1 Hospedeiro definitivo e reservatrios

    A infeco natural por Schistosoma mansoni foi observada em alguns animais, tais como roedores (Nectomys squamipes), marsupiais (Didelphis marsupialis) e ruminantes. Entretanto, o homem o hospedeiro definitivo de maior importncia epidemiolgica.

    30

  • 31

    Vigilncia da Esquistossomose Mansoni Diretrizes Tcnicas

    2.3.2 Hospedeiros intermedirios

    Os hospedeiros intermedirios naturais do S. mansoni no Brasil pertencem famlia Planorbidae,gastrpodes pulmonados lmnicos que habitam preferencialmente colees hdricas lnticas. Nesta famlia apenas o gnero Biomphalaria (Figura 9) possui importncia epidemiolgica por incluir as trs espcies encontradas naturalmente infectadas por S. mansoni: Biomphalaria glabrata (Say, 1818); Biomphalaria tenagophila (Dorbigny, 1835); Biomphalaria straminea (Dunker, 1848). Outras trs espcies, Biomphalaria peregrina (Dorbigny, 1835), Biomphalaria amazonica (Paraense, 1966) e Biomphalaria cousini (Paraense, 1966), so consideradas hospedeiras em potencial deste trematdeo, por terem sido infectadas experimentalmente. As outras espcies so: Biomphalaria schrammi (Crosse, 1864); Biomphalaria intermedia (Paraense; Deslandes, 1962); Biomphalaria oligoza (Paraense, 1975); Biomphalaria occidentalis (Paraense, 1981); Biomphalaria kuhniana (Clessin, 1883). E finalmente a Biomphalaria tenagophila guaibensis (Paraense, 1984), que constitui uma subespcie do gnero.

    Conhecidos desde o perodo Jurssico (aproximadamente 140 milhes de anos), esses moluscos sobreviveram a diversas presses ambientais e ocupam atualmente grandes extenses territoriais, entre as latitudes 70N e 40S, desde o nvel do mar at 4.280 m de altitude (Lago Titicaca, Peru). De um modo geral so encontrados em pequenas colees de gua doce com velocidade inferior a 30 cm/s, mas podem tambm ocorrer em crregos, lagoas, pntanos, remansos de rios, margens de reservatrios ou colees artificiais (valas de irrigao e drenagem, pequenos audes, caixas dgua etc.) (Figuras 7a e 7b). A presena de vegetao vertical ou flutuante indispensvel tanto para alimentao e abrigo dos animais quanto para o suporte para as desovas, que so depositadas sempre na parte submersa. Entre os mecanismos de disperso dos moluscos, considerados mais importantes, esto o transporte das desovas ou mesmo de moluscos atravs de aves, peixes e plantas aquticas. A retirada e o transporte de areia das margens de colees hdricas com moluscos e as cheias provocadas pelas chuvas so tambm mecanismos de disperso. Alguns exemplares podem migrar contra a correnteza, ocupando lentamente outros criadouros a montante das colnias originais.

    31

  • 32

    Secretaria de Vigilncia em Sade/MS

    Figuras 7a e 7b Colees hdricas

    a b

    Fonte: (BRASIL, 2008).

    Em resposta s condies desfavorveis do ambiente, como mudanas drsticas de temperatura, inundaes ou dessecao rpida da coleo hdrica, as bionfalrias desenvolveram inmeros mecanismos de sobrevivncia e escape, tais como: anidrobiose, enterramento, diapausa e quiescncia. O primeiro ocorre quando o processo de dessecao acontece de forma lenta, mas progressiva, como comum em grande parte do Nordeste brasileiro, onde os caramujos podem sobreviver por mais de seis meses, embora ocorra sempre uma alta taxa de mortalidade. Enterramento o fenmeno pelo qual o caramujo se enterra no solo de ambientes aquticos temporrios, como poas dgua formadas por fortes chuvas ou inundaes, as quais vo secando lentamente. Esse comportamento parece estar relacionado a hbitos de nutrio ou de proteo, ou mesmo a ambos, podendo ainda coincidir com a aplicao de moluscicida. Diapausa conhecida como uma parada brusca no desenvolvimento, controlada por fatores internos, mesmo quando as condies do meio so favorveis. Quiescncia determinada diretamente por condies desfavorveis do meio, manifestando-se na forma de parada do desenvolvimento, induzida pela elevao (estivao), ou pela reduo da temperatura a um nvel tal que faz cessar todo desenvolvimento (hibernao). Os caramujos em estado de dormncia podem albergar formas imaturas de Schistosoma mansoni, que retomam seu desenvolvimento quando o hospedeiro retorna atividade.

    32

  • 33

    Vigilncia da Esquistossomose Mansoni Diretrizes Tcnicas

    A diapausa relativamente comum em populaes de B. glabrata em reas sujeitas a secas sazonais, ocorrendo principalmente na fase pr-adulta. Modificaes morfolgicas, como o espessamento da concha e a formao de lamelas prximas abertura, so associadas persistncia em sair da gua e dormncia prolongada. Tais caramujos podem se antecipar estao seca, emigrando da gua e permanecendo em estado de dormncia sob condies microclimticas favorveis at o retorno das condies propcias. Como a aplicao de moluscicidas no meio aqutico no atinge os moluscos em diapausa, estes podem repovoar os criadouros ao retornarem atividade.

    O mecanismo reprodutivo das bionfalrias desempenha papel fundamental no xito biolgico alcanado pelo grupo. Apesar de serem hermafroditas, em condies favorveis h predominncia de fecundao cruzada, ou seja, durante a cpula um indivduo atua como fmea e o outro como macho. Em condies adversas, um ou poucos indivduos podem utilizar o mecanismo de autofecundao, dando incio a uma nova populao. Um nico indivduo capaz de gerar, ao final de trs meses, cerca de 10 milhes de descendentes, com possibilidade de promover em pouco tempo, um rpido repovoamento dos criadouros. So ovparos e a postura se realiza geralmente noite, sendo os ovos dispostos em cpsulas transparentes sobre diferentes substratos submersos. O nmero de ovos postos de cada vez, bem como o nmero de posturas, varia dependendo de diversos fatores, tanto biolgicos quanto ambientais. O tempo entre a postura e a ecloso da forma jovem est em torno de 10 dias, enquanto o perodo de ovo a ovo de aproximadamente 60 dias.

    A sobrevida das bionfalrias no meio natural geralmente no ultrapassa um ano. A manuteno das populaes nos criadouros decorre principalmente da eficiente estratgia reprodutiva, a qual est subordinada a diversos fatores ambientais e biolgicos, que influenciam a fecundidade, a postura e a viabilidade dos ovos. Quando infectados pelas formas jovens do S. mansoni (miracdios), os caramujos tm a sua sobrevivncia encurtada, devido espoliao parasitria e s leses causadas nos tecidos pelo desenvolvimento das larvas at a liberao das cercrias. O ovo-teste e a glndula digestiva so as reas mais lesadas pelas larvas e adquirem uma colorao esbranquiada nos indivduos muito infectados, diferindo da colorao esverdeada desses rgos, nos animais sadios.

    A Biomphalaria glabrata a mais importante espcie hospedeira intermediria do S. mansoni nas Amricas, por apresentar altos nveis de infeco e ter sua distribuio, no Brasil, quase sempre associada ocorrncia da esquistossomose. Sua presena foi notificada em 16 estados brasileiros (Alagoas, Bahia, Esprito Santo, Gois, Maranho, Minas Gerais, Par, Paraba, Paran, Pernambuco, Piau, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, So Paulo e Sergipe), alm do Distrito Federal, e em 801 municpios em uma rea delimitada pelos paralelos 00 53S (Quatipuru/PA) e 29 51 S (Esteio/RS) e o 53 44 S (Toledo/PR) e a linha costeira (Figura 8).

    33

  • 34

    Secretaria de Vigilncia em Sade/MS

    Figura 8 Distribuio espacial da Biomphalaria glabrata no Brasil

    Fonte: (CARVALHO; CALDEIRA, 2004).

    Biomphalaria straminea a espcie mais bem-sucedida e adaptada s variaes climticas, sendo encontrada em quase todas as bacias hidrogrficas do Pas. muito menos suscetvel que B. glabrata, entretanto, esta espcie possui a distribuio mais abrangente entre as demais, sendo responsvel pela manuteno de taxas de infeco humana superiores a 50% em algumas localidades do Nordeste brasileiro. A presena de B. straminea foi registrada em 1.280 municpios distribudos por 24 estados brasileiros (Acre, Alagoas, Amazonas, Bahia, Cear, Esprito Santo, Gois, Maranho, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Par, Paraba, Paran, Pernambuco, Piau, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, So Paulo, Sergipe, Tocantins e Roraima) (Figura 9). At o momento no foi notificada, apenas, nos estados do Amap e Rondnia.

    Municpios com Biomphalaria

    B. glabrata (805)

    34

  • 35

    Vigilncia da Esquistossomose Mansoni Diretrizes Tcnicas

    Figura 9 Distribuio espacial da Biomphalaria straminea no Brasil

    Fonte: (CARVALHO; CALDEIRA, 2004).

    Biomphalaria tenagophila tem importncia epidemiolgica na transmisso do S. mansoni nos estados das regies Sul e Sudeste. A espcie responsvel pela maioria dos casos autctones de esquistossomose no estado de So Paulo e pelos focos da doena no estado de Santa Catarina. Foi notificada em 562 municpios de 10 estados brasileiros (Bahia, Esprito Santo, Gois, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paran, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e So Paulo) alm do Distrito Federal, em um quadrante delimitado pelos paralelos 10 12 e 33 41 S, pelo meridiano 57 05 W e a linha litornea (Figura 10). A espcie encontrada numa faixa litornea, de forma quase contnua a partir do sul do estado da Bahia at o estado do Rio Grande do Sul.

    Distribuio B. Straminea

    B. straminea (1295)

    35

  • 36

    Secretaria de Vigilncia em Sade/MS

    Figura 10 Distribuio espacial da Biomphalaria tenagophila no Brasil

    Fonte: (CARVALHO; CALDEIRA, 2004).

    As figuras 11, 12 e 13 mostram as principais caractersticas das conchas das trs espcies. O documento editado pelo Ministrio da Sade: Vigilncia e Controle de Moluscos de importncia epidemiolgica Diretrizes Tcnicas: Programa de Vigilncia e Controle da Esquistossomose, 2008, fornece informao mais detalhada sobre a biologia, comportamento, distribuio geogrfica, tcnicas e controle dos planorbdeos hospedeiros intermedirios da esquistossomose no Pas. Esse manual pode ser acessado em .

    Municpios com Biomphalaria

    B. tenagophila (569)

    36

  • 37

    Vigilncia da Esquistossomose Mansoni Diretrizes Tcnicas

    1. Biomphalaria glabrata caractersticas gerais

    concha grande e lisa; dimetro: aproximadamente 40 mm; giros arredondados, aumentando gradativamente o seu dimetro; cor escura/marrom; lado direito: cncavo, com o giro central profundo; perfil: abertura oval com dimetro de aproximadamente 11 mm; lado esquerdo formando uma concavidade rasa (CARVALHO et al., 2005).

    Figura 11 Morfologia da concha de Biomphalaria glabrata, hospedeiros intermedirios do S. mansoni

    a b c

    Fonte: (BRASIL, 2008).

    2. Biomphalaria stramnea caractersticas gerais

    concha pequena, com os lados umbilicados; dimetro: aproximadamente 16,5 mm; giros arredondados, aumentando rapidamente o seu dimetro; lado direito: cncavo ou aplanado, com o giro central profundo; perfil: abertura oval ou arredondada, com dimetro de aproximadamente 6 mm; lado esquerdo: concavidade geralmente maior que no lado direito.

    37

  • 38

    Secretaria de Vigilncia em Sade/MS

    Figura 12 Morfologia da concha de Biomphalaria straminea, hospedeiro intermedirio do S. mansoni

    a

    b c

    Fonte: (BRASIL, 2008).

    3. Biomphalaria tenagophila caractersticas gerais

    concha grande, apresentando uma quilha (carena) em ambos os lados; dimetro: aproximadamente 35 mm; giros carenados: mais acentuadamente esquerda, aumentando lentamente o seu dimetro; lado direito: desde muito cncavo at quase plano, com o giro central profundo; perfi l: abertura oval ou arredondada, com dimetro de aproximadamente 6 mm; lado esquerdo: concavidade geralmente maior que no lado direito.

    Figura 13 Morfologia da concha da Biomphalaria tenagophila, hospedeiro intermedirio do S. mansoni

    a b c

    Fonte: (CARVALHO et al., 2005).

    38

  • 39

    Vigilncia da Esquistossomose Mansoni Diretrizes Tcnicas

    2.3.3 Perodo de incubao

    Sabe-se que o perodo de incubao de duas a seis semanas aps a infeco e compreende des-de a penetrao das cercrias at o aparecimento dos primeiros sintomas. Corresponde fase de penetrao das cercrias, seu desenvolvimento, at a instalao dos vermes adultos no interior do hospedeiro definitivo. Neste perodo, em raras ocasies, h o relato de sintomas tipo astenia, cefaleia, anorexia, mal-estar e nusea.

    2.3.4 Perodo de transmissibilidade

    A transmisso da esquistossomose no ocorre por meio do contato direto, homem doente homem suscetvel. Tambm no ocorre autoinfeco, como na estrongiloidase e em outras verminoses.

    O esquistossoma, para ser transmitido, necessita, obrigatoriamente, sair do hospedeiro definitivo (homem), passar por ciclo complementar no interior de um hospedeiro intermedirio (caramujo), para que ento se torne novamente infectante para o homem.

    Para os fins a que se destina este documento, considera-se aqui o perodo de transmissibilidade a passagem do esquistossoma entre o homem e o ambiente. O homem infectado pode eliminar ovos viveis por seis a 10 anos, podendo chegar at a mais de 20 anos.

    Quanto aos hospedeiros intermedirios, comeam a eliminar cercrias aps quatro a sete semanas da infeco pelos miracdios, e assim se mantm por vrios meses.

    2.3.5 Mecanismo de transmisso

    A esquistossomose doena de veiculao hdrica cuja transmisso ocorre quando o indivduo suscetvel entra em contato com guas onde existem cercrias livres. Em sntese, so os seguintes os elementos envolvidos na cadeia de transmisso:

    agente etiolgico: Schistosoma mansoni (Sambon, 1907); hospedeiro definitivo: homem (mais importante do ponto de vista epidemiolgico); hospedeiros intermedirios: caramujos de gua doce Biomphalaria glabrata (Say, 1818),

    Biomphalaria straminea (Dunker, 1848), e Biomphalaria tenagophila (Orbigny, 1835); fonte de infeco: hospedeiros definitivos, quando eliminando ovos viveis de S. mansoni; via de eliminao: fezes; veculo de contaminao para os hospedeiros intermedirios: gua contaminada com larvas de

    S. mansoni, na fase denominada miracdio;

    39

  • 40

    Secretaria de Vigilncia em Sade/MS

    forma infectante para hospedeiros intermedirios: miracdio; forma infectante para os hospedeiros definitivos: fase larvria do S. mansoni, denominada cercria; veculo de contaminao para os hospedeiros definitivos: gua contendo cercria; porta de entrada: pele e mucosa dos hospedeiros definitivos.

    Figura 14 Ciclo biolgico do S. mansoni

    Fonte: (CARVALHO et al., 2008).

    40

  • 41

    Vigilncia da Esquistossomose Mansoni Diretrizes Tcnicas

    2.3.6 Suscetibilidade e resistncia

    Embora com variaes individuais, a suscetibilidade ao verme geral. Portanto, qualquer pessoa, independentemente da idade, sexo ou grupo tnico, uma vez entrando em contato com as cercrias, pode vir a contrair a infeco.

    Embora ainda no perfeitamente esclarecida quanto ao seu mecanismo, existem evidncias de que certo grau de resistncia esquistossomose se faz presente na maioria dos indivduos que a ela se expe em reas hiperendmicas. Essa resistncia, em grau varivel, faria com que grande parte das pessoas continuadamente expostas no desenvolva infeces com grandes cargas parasitrias, sendo por isso reduzido o nmero de indivduos com manifestaes clnicas severas, em relao ao total de portadores.

    41

  • 42

  • 43

    FASES E FORMAS CLNICAS 3A evoluo clnica da esquistossomose mansoni depende da resposta do hospedeiro invaso, ao desenvolvimento e oviposio do verme. So muitas as possibilidades de classifi cao da doena e cada uma segue critrios que interessam ou convm ao grupo que vai utiliz-la. Para este Manual de Diretrizes Tcnicas do PCE, ser adotada a classifi cao proposta por consenso entre os especialistas, reunidos em Porto Alegre, durante o 44o Congresso da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical, em maro de 2008. Essa classifi cao contempla uma escala crescente de gravidade, de modo a facilitar estudos de morbidade e epidemiolgicos para o estabelecimento das bases referenciais para o controle da doena.

    3.1 Classifi cao da esquistossomose mansoni

    1. Fase Inicial:

    Formas agudas:

    a) assintomtica;b) sintomtica.

    2. Fase Tardia:

    Formas crnicas de acordo com o rgo mais acometido:

    a) hepatointestinal;b) heptica: fi brose periportal sem esplenomegalia;c) hepatoesplnica: fi brose periportal com esplenomegalia;d) formas complicadas:

    i. vasculopulmonar;ii. glomerulopatia;iii. neurolgica;iv. outras localizaes: olho, pele, urogenital etc.;v. pseudoneoplsica;vi. doena linfoproliferativa.

    43

  • 44

    Secretaria de Vigilncia em Sade/MS

    3. Doenas associadas que modificam o curso da esquistossomose:

    a) salmonelose prolongada;b) abscesso heptico;c) em imunossuprimidos (Aids, HTLV, uso de imunossupressores etc.);d) outras hepatopatias: virais, alcolica etc.

    3.1.1 Fase inicial

    A fase inicial comea logo aps o contato com as cercrias. Depois da penetrao, observa-se infiltrado de polimorfonucleares ao redor dos parasitos e nas proximidades dos vasos. Mais tarde, surgem linfcitos e macrfagos. Nessa fase, as manifestaes alrgicas predominam; so mais intensas nos indivduos hipersensveis e nas reinfeces. Alm das alteraes dermatolgicas, ocorrem tambm manifestaes gerais, devido s alteraes em outros tecidos e rgos.

    3.1.2 Formas agudas

    a) Assintomtica

    Em geral, o primeiro contato com os hospedeiros intermedirios da esquistossomose ocorre na infncia. Na maioria dos portadores, a doena assintomtica ou passa despercebida, podendo ser confundida com outras doenas desta fase. Geralmente, diagnosticada nas alteraes encontradas nos exames laboratoriais de rotina (eosinofilia e ovos viveis de S. mansoni nas fezes) em pessoas que procuram assistncia mdica por outro motivo.

    44

  • 45

    Vigilncia da Esquistossomose Mansoni Diretrizes Tcnicas

    b) Sintomtica

    Logo aps o contato infectante, alguns indivduos queixam-se de manifestaes pruriginosas na pele, de durao geralmente transitria, que cedem quase sempre espontaneamente. Esta manifestao clnica, conhecida como dermatite cercariana (Figura 15), decorre da morte de cercrias que penetraram na pele e dura, em geral, 24 a 72 horas (podendo estender-se por at 15 dias). Caracteriza-se por microppulas eritematosas e pruriginosas semelhantes a picadas de inseto e eczema de contato. O diagnstico difcil, pois os sintomas so inespecficos. A histria epidemiolgica e os achados clnicos so muito importantes para o diagnstico.

    Figura 15 Dermatite cercariana

    Foto: Lambertucci, J.R, UFMG, 2006.

    Dependendo do nmero de parasitos e da sensibilidade do paciente, um quadro descrito como forma toxmica ou febre de Katayama pode ser desenvolvido. Os sintomas surgem cerca de trs a quatro semanas aps a contaminao e incluem: linfodenopatia, mal-estar, febre, hiporexia, tosse seca, sudorese, dores musculares, dor na regio do fgado ou do intestino, diarreia, cefaleia e prostrao, entre outros. A intensidade dos sintomas aumenta entre a quinta e a sexta semana, coincidindo com o incio da oviposio. O doente apresenta-se abatido, com hepatomegalia e esplenomegalia dolorosas, taquicardia e hipotenso arterial. O achado laboratorial de eosinofilia elevada bastante sugestivo, quando associado a dados epidemiolgicos (Quadro 2).

    45

  • 46

    Secretaria de Vigilncia em Sade/MS

    Quadro 2 Dados clnicos, epidemiolgicos e de laboratrio em pacientes com esquistossomose

    aguda grave

    Histria de contato com guas de regio endmica nos ltimos 60 dias

    Outras pessoas podem apresentar quadro clnico semelhante, porque o banho em colees hdricas , em geral, um comportamento grupal

    Febre, diarreia mucossanguinolenta, dor abdominal, hepato e/ou esplenomegalia, tosse seca, urticria e edema facial

    Eosinofilia

    Elevao das enzimas hepticas (fosfatase alcalina, GGT, transaminases)

    Ultrassonografia do abdmen: hepatoesplenomegalia e linfonodos portais caractersticos

    Ovos viveis de S. mansoni nas fezes

    Bipsia heptica: granuloma na fase necrtico-exsudativa

    Sorologia sugestiva (ELISA com KLH*, IgA anti-SEA)

    Fonte: Ministrio da Sade.*KLH: keyhole limpet hemocyanin (hemocianina do caramujo Megathura crenulata), SEA: soluble egg antigen (antgeno solvel do ovo).

    O diagnstico clnico s se define a partir de 45 dias do banho infectante, quando se evidenciam ovos viveis do verme nas fezes ou quando a bipsia heptica revela o caracterstico granuloma esquistossomtico na fase necrtico-exsudativa. As provas de funo heptica (fosfatase alcalina, gama glutamil transferase e transaminases) encontram-se elevadas no soro como regra geral. Os sintomas e sinais clnicos podem persistir por mais de 90 dias e a doena enquadrar-se na definio de febre de origem indeterminada. H, geralmente, remisso espontnea do quadro clnico nos casos no tratados.

    A doena raramente mata. A eosinofilia marcada (> 1000 cels/mm) sugere o diagnstico. O ultrassom do abdmen mostra hepatoesplenomegalia inespecfica e a presena de linfonodos periportais sugestivos. H um caso relatado na literatura de ndulos no fgado identificados ao ultrassom e na tomografia computadorizada do fgado; achados semelhantes foram observados durante a laparoscopia. A melhora clnica anunciada pela normalizao da temperatura corporal e o desaparecimento dos sintomas digestivos. O fgado e o bao diminuem de tamanho progressivamente.

    3.2 Fase tardia

    3.2.1 Formas crnicas

    Os indivduos que evoluem das formas agudas para as formas crnicas geralmente apresentam modulao satisfatria do granuloma, isto , o granuloma necrtico-exsudativo da forma aguda transforma-se em um granuloma produtivo com menor nmero de clulas inflamatrias, sem rea de

    46

  • 47

    Vigilncia da Esquistossomose Mansoni Diretrizes Tcnicas

    necrose em torno dos ovos e maior deposio de fibras colgenas (o granuloma pequeno provocaria menor dano aos hepatcitos). Alguns autores acreditam que os indivduos que modulam mal, ou seja, aqueles que mantm granulomas grandes, so os que evoluiro para a forma hepatoesplnica da doena.

    3.2.2 Forma hepatointestinal

    As pessoas que vivem em reas endmicas geralmente apresentam a forma hepatointestinal e algumas dessas formas evoluem para a hepatoesplnica. O ultrassom do abdmen ajuda pouco na definio das formas hepatointestinais, mas a presena de espessamento periportal pode sugerir progresso para a forma hepatoesplnica.

    Em geral, nesta forma da doena as pessoas no apresentam sintomas e o diagnstico torna-se acidental, quando o mdico se depara com a presena de ovos viveis de S. mansoni no exame de fezes rotineiro. Nas pessoas com queixas clnicas, a sintomatologia varivel e inespecfica: desnimo, indisposio para o trabalho, tonturas, cefaleia e sintomas distnicos. Os sintomas digestivos podem predominar: sensao de plenitude, flatulncia, dor epigstrica e hiporexia. Observam-se surtos diarreicos e, por vezes, disenteriformes, intercalados com constipao intestinal crnica. Esse quadro clnico, exceto pela presena de sangue nas fezes, no difere do encontrado em pessoas sem esquistossomose, mas com a presena de outras parasitoses intestinais.

    No exame fsico, tem sido observado dor palpao dos clons, fgado palpvel entre dois e seis centmetros do rebordo costal direito, de consistncia aumentada e, s vezes, com a superfcie irregular e hipertrofia do lobo esquerdo. O bao, por definio, no palpvel. As provas de funo heptica se mantm dentro de valores normais. A bipsia heptica raramente fornece informaes. O exame retossigmoidoscpico revela mucosa congesta, granulosa, com pequenas ulceraes e, no exame de fragmentos de tecido retirados por bipsia, encontram-se com frequncia ovos viveis de S. mansoni.

    3.2.3 Forma heptica

    Nesta forma clnica, existe fibrose heptica sem hipertenso portal e sem esplenomegalia. A apresentao clnica desses doentes pode ser assintomtica ou com sintomas da forma hepatointestinal. Ao exame fsico, o fgado palpvel e endurecido, semelhana do que acontece na forma hepatoesplnica. Na ultrassonografia, verifica-se a presena de fibrose heptica, moderada ou intensa. Nessa forma clnica, o paciente no apresenta varizes de esfago e sangramento decorrente da ruptura de varizes.

    47

  • 48

    Secretaria de Vigilncia em Sade/MS

    3.2.4 Forma hepatoesplnica

    A esquistossomose hepatoesplnica apresenta-se de vrias formas: compensada, descompensada ou complicada. Dados obtidos em inquritos epidemiolgicos revelam que at 10% dos indivduos podem apresentar essa forma clnica em reas de alta endemicidade. No quadro 3, descrevem-se as variantes clnico-evolutivas da forma hepatoesplnica.

    Quadro 3 Variantes clnico-evolutivas da forma hepatoesplnica

    Forma hepatoesplnica compensada

    Sem hipertenso portal (geralmente em crianas)Com hipertenso portal sem hemorragia digestiva com hemorragia digestivaCom hipoevolutismo

    Forma hepatoesplnica descompensadaCom asciteCom icterciaCom encefalopatia

    Forma hepatoesplnica complicada

    Com outras formas clnicas da doena com formas vasculopulmonares com glomerulopatiaCom outras hepatopatias com hepatite crnica ativa com cirrose com trombose portalCom outras doenas com infeces por enterobactrias

    Fonte: Ministrio da Sade.

    O diagnstico da forma hepatoesplnica em paciente internado em hospital bem aparelhado no difcil. Por outro lado, diagnosticar a forma hepatoesplnica em um indivduo que mora em rea endmica (baseando-se na presena de bao palpvel e ovos do verme nas fezes) representa um problema. Um percentual desses indivduos apresenta aumento do bao decorrente de outras doenas, dificultando o diagnstico diferencial.

    A ultrassonografia permite melhorar a acurcia diagnstica do exame clnico. Em uma rea endmica para esquistossomose, utilizando-se a combinao da palpao abdominal com resultados ultrassonogrficos, quatro grupos de indivduos foram identificados: 1. bao palpvel, espessamento periportal intenso e hipertenso portal ao ultrassom; 2. espessamento periportal intenso e hipertenso portal ao ultrassom, sem bao palpvel (forma heptica); 3. bao palpvel com espessamento periportal leve a moderado; 4. bao palpvel e fgado com aspecto normal ao ultrassom. As implicaes desses achados so de duas ordens: a) a morbidade da esquistossomose em reas endmicas tem sido superestimada (nem todo bao palpvel em rea endmica causado pela esquistossomose);

    48

  • 49

    Vigilncia da Esquistossomose Mansoni Diretrizes Tcnicas

    b) os estudos epidemiolgicos e imunolgicos conduzidos em reas endmicas devem ser reavaliados dentro dessa nova definio da forma hepatoesplnica no campo.

    As doenas mais frequentemente consideradas no diagnstico diferencial da esquistossomose hepatoesplnica so: calazar, esplenomegalia tropical (ou esplenomegalia hiper-reativa da malria), leucemia, linfoma, cirrose de Laennec ou cirrose ps-necrtica e sndromes semelhantes mononucleose.

    3.2.5 Forma hepatoesplnica compensada

    Esta forma representa o modelo da esquistossomose heptica avanada, tendo como substrato anatmico a fibrose de Symmers. No quadro 4, resumem-se as principais caractersticas clnicas, hemodinmicas, bioqumicas/hematolgicas, de imagens e anatomopatolgicas da esquistossomose hepatoesplnica compensada.

    Quadro 4 Caractersticas clnicas, bioqumicas/hematolgicas, hemodinmicas, ultrassonogr-

    ficas, ressonncia magntica e anatomopatolgicas da esquistossomose hepato-

    esplnica compensada

    Caractersticas clnicas

    Prevalncia maior entre 10 e 30 anos de idadeEstado geral regular ou bomPresena de hepatoesplenomegalia (excluir outras causas)Hemorragia digestiva altaAusncia de sinais ou sintomas de insuficincia hepticaHipoevolutismo nos jovens

    Caractersticas bioqumicas e hematolgicas

    Testes de funo heptica normaisHipergamaglobulinemia (aumento da frao IgG)Anemia normoctica ou microctica e hipocrmica, leucopenia, trombocitopenia

    Caractersticas hemodinmicas

    Presso sinusoidal normal ou levemente aumentadaPresses esplnica e portal direta aumentadasAlteraes esplenoportogrficas intra-hepticas peculiaresFluxo heptico normal ou levemente diminudo

    Caractersticas ultrassonogrficas

    Fibrose periportal caractersticaFibrose da parede da vescula biliarAumento do lobo esquerdo do fgadoEsplenomegaliaAumento do calibre das veias esplnicas e portaPresena de colaterais no sistema porta

    Alteraes ressonncia magntica

    Intensidade aumentada do sinal nas reas de fibroseRetardo da excreo do contraste nas reas de fibroseEspessamento ntido da parede da vescula biliarIdentificao dos vasos do sistema porta e de colaterais(Excludas outras doenas hepticas)

    Caractersticas anatomopatolgicas

    Intensa fibrose portal do tipo SymmersModerada atividade inflamatriaBoa preservao das clulas hepticasConservao da estrutura lobular

    Fonte: Ministrio da Sade.

    49

  • 50

    Secretaria de Vigilncia em Sade/MS

    A caracterstica fundamental dessa forma a presena de hipertenso portal, levando esplenomegalia e ao aparecimento de varizes do esfago. Os pacientes costumam apresentar sinais e sintomas gerais inespecficos, como dores abdominais atpicas, alteraes do hbito intestinal e sensao de peso ou desconforto no hipocndrio esquerdo, por causa do crescimento do bao. s vezes, o primeiro sinal de descompensao da doena a hemorragia digestiva com a presena de hematmese e/ou melena.

    Ao exame fsico, o fgado encontra-se aumentado de tamanho, com predomnio do lobo esquerdo, enquanto o bao aumentado mostra-se endurecido e indolor palpao. A forma hepatoesplnica predomina nos adolescentes e adultos jovens (Figura 16a e 16b).

    Figuras 16a e 16b Adolescente e adulto com formas hepatoesplnicas

    Foto: Lambertucci, J.R, UFMG, 2006.

    Na faixa etria dos cinco aos 14 anos, 50% dos pacientes no apresentam hipertenso portal e a esplenomegalia resulta, provavelmente, de hiperplasia linforreticular. Nos adultos, a hipertenso portal constitui a expresso fisiopatolgica dominante e 30% a 40% deles apresentam hemorragia digestiva oriunda de rotura de varizes esofagogstricas ou gastrite erosiva por medicamentos. O fgado apresenta aspecto nodular e, ao exame antomo-patolgico, evidencia-se a tpica fibrose de Symmers (Figuras 17 e 18).

    50

  • 51

    Vigilncia da Esquistossomose Mansoni Diretrizes Tcnicas

    Figuras 17 e 18 Fgado apresentando Fibrose de Symmers

    Foto: Lambertucci, J.R, UFMG (2006).

    O estado funcional do fgado encontra-se preservado, sem evidncias de insuficincia heptica. A anemia, leucopenia e plaquetopenia, em combinaes variveis, secundrias ao hiperesplenismo, quan-do presentes, no devem preocupar o mdico; em geral, no h repercusso clnica. A anemia por perda de sangue (hemorragia digestiva, parasitoses intestinais associadas) deve ser adequadamente tratada.

    As varizes esofgicas, geralmente localizadas no tero mdio e inferior do esfago, merecem ser pesquisadas pela endoscopia digestiva (Figura 19). A endoscopia permite o diagnstico diferencial entre os sangramentos de origem varicosa e os provocados por gastrite erosiva. A esplenoportografia para a avaliao dos vasos portais vem sendo substituda pela ultrassonografia. Quando realizada neste estgio da doena, observam-se a presena de reverso do fluxo sanguneo nos ramos radiculares e a formao precoce de grossas e extensas dilataes varicosas gstricas e esofgicas.

    Figura 19 Varizes do esfago

    Foto: Lambertucci, J.R, UFMG (2006).

    51

  • 52

    Secretaria de Vigilncia em Sade/MS

    3.2.6 Forma hepatoesplnica descompensada

    Esta forma da doena caracteriza-se por diminuio acentuada do estado funcional do fgado. A descompensao relaciona-se ao de vrios fatores, tais como os surtos de hemorragia digestiva e consequente isquemia heptica e fatores associados (hepatite viral, alcoolismo). No Quadro 5, resumem-se as principais caractersticas da forma hepatoesplnica descompensada.

    Quadro 5 Principais caractersticas da forma hepatoesplnica descompensada

    Os pacientes em geral tm mais de 30 anos de idade

    O fgado menor do que o encontrado na forma compensada

    Associao com outros fatores etiolgicos (hepatite viral, alcoolismo)

    Hemorragia digestiva alta comum

    Presena de sinais e sintomas de insuficincia heptica: ascite, ictercia, aranhas vasculares, coma, sintomas neuropsquicos, quando associada a outras hepatopatias

    Estado geral precrio

    Alteraes bioqumicas evidentes: diminuio da albumina srica, aumento das bilirrubinas e da amnia srica

    Presena frequente de trombose portal ao ultrassom

    Fluxo heptico reduzido

    Inflamao crnica ativa com invaso do parnquima heptico

    Fibrose septal, proliferao de ductos biliares

    Cirrose ps-necrtica focal

    Fonte: Ministrio da Sade.

    Figura 20 Paciente com forma hepatoesplnica descompensada

    Foto: Lambertucci, J.R, UFMG (2006).

    52

  • 53

    Vigilncia da Esquistossomose Mansoni Diretrizes Tcnicas

    A ascite inscreve-se entre as manifestaes mais comuns de descompensao no esquistossomtico, com frequncia iniciando-se aps episdio de hemorragia digestiva alta. A ictercia pode ser encontrada em alguns casos; quando presente, deve-se suspeitar de associao com hepatite viral, infeces bacterianas associadas, alcoolismo ou hiperesplenismo com hemlise. Os sintomas e sinais de encefalopatia heptica geralmente surgem aps sangramentos digestivos e, quando presentes, respondem ao tratamento adequado ou evoluem para o coma heptico e a morte.

    3.3 Outras formas clnicas e complicaes

    3.3.1 Forma vasculopulmonar

    As duas formas clnicas mais importantes so a forma hipertensiva e a ciantica. A primeira, mais frequentemente associada forma hepatoesplnica da esquistossomose, pode ser encontrada, raramente, na forma hepatointestinal. Cerca de 10% dos pacientes com hipertenso portal apresentam tambm hipertenso pulmonar; nesses casos, as cirurgias que se baseiam no desvio de sangue do sistema portal esto contraindicadas, pois podem agravar a hipertenso pulmonar pelo aumento do fluxo sanguneo para a veia cava inferior.

    3.3.2 Hipertenso pulmonar

    H hipertenso pulmonar por obstruo vascular, provocada por ovos, vermes mortos e/ou vasculite pulmonar por imunocomplexos. Os sintomas e sinais clnicos caracterizam a sndrome do cor pulmonale. Observam-se sncope de esforo, hiperfonese de P2, impulso na regio mesogstrica e sinais de insuficincia cardaca. O eletrocardiograma e o eco-doppler-cardiograma confirmam a sobrecarga direita e mostram a presso pulmonar acima de 20 mm de Hg. O aspecto da radiografia do trax (Figura 21) pode ser normal ou evidenciar abaulamento do arco mdio (s vezes, aneurismtico), hilos densos e, menos frequentemente, micronodulao pulmonar (a tomografia computadorizada, s vezes, revela alteraes no identificadas aos raios x de trax padro).

    A forma ciantica, de pior prognstico, encontra-se associada forma hepatoesplnica (as derivaes porta-pulmonares parecem explicar o achado). Em raros casos, observou-se cianose, com baqueteamento digital, em pacientes com hipertenso portal e sem hipertenso pulmonar.

    53

  • 54

    Secretaria de Vigilncia em Sade/MS

    Figura 21 Hipertenso pulmonar raios x de trax

    Foto: Lambertucci, J.R, UFMG (2006).

    3.3.3 Glomerulopatia

    O acometimento do rim ocorre em 10% a 15% dos pacientes com a forma hepatoesplnica da doena. A sndrome nefrtica a apresentao clnica mais comum. Trata-se de uma complicao causada por imunocomplexos. Estudos mais recentes tm demonstrado leses glomerulares em indivduos com esquistossomose hepatointestinal.

    Quando definitivamente instalada a leso renal, o quadro histolgico predominante a clssica glomerulonefrite membranoproliferativa (mesangiocapilar), com acentuao lobular. O segundo tipo histolgico mais encontrado a esclerose glomerular focal. O curso evolutivo da leso renal causada pela esquistossomose no se modifica com os esquemas teraputicos propostos (esquistossomicidas isoladamente ou associados a imunossupressores). O dano renal mostra-se progressivo e a doena evolui para a insuficincia renal.

    O tratamento da esquistossomose no parece agravar a glomerulonefrite, justificando-se o emprego de esquistossomicidas na tentativa de eliminar a constante produo de antgenos parasitrios.

    A doena renal encontrada na salmonelose prolongada difere, sob vrios aspectos, da observada na esquistossomose hepatoesplnica. Na salmonelose de curso prolongado, a apresentao clnica mais comum a sndrome nefrtica; as leses renais so a glomerulopatia proliferativa focal, mesangioproliferativa e proliferativa difusa (endocapilar). Essas leses, ao contrrio

    54

  • 55

    Vigilncia da Esquistossomose Mansoni Diretrizes Tcnicas

    das observadas na esquistossomose hepatoesplnica, so reversveis aps o tratamento com antibiticos e esquistossomicidas e decorrem da deposio glomerular de imunocomplexos formados com antgenos bacterianos.

    3.3.4 Forma neurolgica

    As leses do sistema nervoso central decorrem da presena de ovos e de granulomas esquistossomticos nesse sistema. Ao que parece, os vermes migram para os vasos que nutrem as clulas do sistema nervoso e a depositam os ovos. A leso mais frequente na esquistossomose mansnica a mielite transversa.

    A mielite transversa inexplicavelmente rara na forma hepatoesplnica e comum na forma intestinal e na fase aguda. O diagnstico correto depende de manter alto nvel de suspeio clnica para esquistossomose em qualquer paciente com sintomas ou sinais de compresso da medula espinhal. A pesquisa de anticorpos no liquor possui importncia no diagnstico. A ressonncia magntica tem facilitado o diagnstico dessa forma clnica da esquistossomose (captao heterognea do contraste em extenses variadas da medula, s vezes, com envolvimento das razes nervosas) (Figura 22). O tratamento precoce com corticoesteroides e esquistossomicidas mostra-se eficaz na maioria dos casos. O tratamento com corticoesteroides deve ser mantido por vrios meses aps a melhora clnica.

    Figura 22 Alargamento do cone medular em paciente com mieloradiculopatia esquistossomtica

    Foto: Lambertucci, J.R, UFMG (2006).

    55

  • 56

    Secretaria de Vigilncia em Sade/MS

    Figura 23 Paciente com forma neurolgica

    Foto: Lambertucci, J.R, UFMG (2006).

    Os patologistas, em estudos de necrpsias, encontram ovos de S. mansoni no crebro com grande frequncia. As manifestaes clnicas nos pacientes so pobres, mas casos de epilepsia, acidente vascular cerebral e tumores cerebrais j foram descritos na literatura. O diagnstico e o tratamento, nesses casos, so geralmente cirrgicos.

    A forma neurolgica, pela sua importncia clnica e epidemiolgica, foi objeto de uma publicao especfica do Ministrio da Sade denominada Guia de vigilncia epidemiolgica e controle da mielorradiculopatia esquistossomtica, a qual pode ser acessada, na ntegra, na Biblioteca Virtual do Ministrio da Sade: .

    3.3.5 Outras localizaes

    So formas que aparecem com menos frequncia. As mais importantes localizaes encontram-se nos rgos genitais femininos, testculos, pele, retina, tireoide e corao, podendo aparecer em qualquer rgo ou tecido do corpo humano.

    3.3.6 Pseudoneoplsica

    A esquistossomose pode provocar tumores que parecem neoplasias. As formaes tumorais so ocasionadas pela reao tecidual exacerbada em torno de ovos ou vermes adultos. Localizam-se no intestino grosso, com predominncia no clon descendente, no sigmoide e, com menor frequncia, no

    56

  • 57

    Vigilncia da Esquistossomose Mansoni Diretrizes Tcnicas

    leo terminal e no intestino delgado. Esses tumores podem ser muito grandes e envolver outros rgos ou situarem-se nos mesos e epplons. Os localizados no intestino, quando diagnosticados, devem ser submetidos a tratamento clnico, todavia, em alguns casos, dever ser indicada a remoo cirrgica. Podem ser encontrados tambm em outros rgos, dificultando ainda mais o diagnstico e o tratamento.

    Nos indivduos com polipose intestinal esquistossomtica, a sintomatologia intestinal mostra-se exuberante, com diarreia, enterorragia, sndrome de enteropatia perdedora de protenas, edema, hipoalbuminemia, emagrecimento e anemia. O diagnstico diferencial com neoplasias dos clons se impe. Essa apresentao incomum no Brasil, mas tem sido descrita com maior frequncia no Egito.

    3.3.7 Doena linfoproliferativa

    Os linfomas esplnicos foram vistos complicando a esquistossomose hepatoesplnica. Foram observados em oito portadores de esquistossomose avanada, o que corresponde a um ndice de 0,9%, num grupo de 863 esplenectomias pesquisadas. Todos os casos, exceto um, ocorreram em mulheres, a maioria com mais de 40 anos de idade. Os linfomas foram de tipo nodular, no Hodgkin, mas necessitam ser reclassificados de acordo com critrios mais precisos e com tecnologia atual.

    Outras sries de casos semelhantes, inclusive com a predominncia do sexo feminino, foram publicadas por Paes & Marigo em 1981. Sabe-se que a possibilidade de um linfoma surgir em outras condies de esplenomegalia parasitria crnica foi comprovada em casos de malria crnica ocorridos na frica.

    3.4 Doenas associadas que modificam o curso da esquistossomose mansoni

    3.4.1 Salmonelose prolongada

    H associao da esquistossomose com bactrias Gram negativas, em especial as do gnero Salmonella. As salmonelas tm sido encontradas associadas esquistossomose mansnica e produzindo doena febril prolongada peculiar e conspcua. Acomete, preferencialmente, jovens entre 10 e 30 anos. Os pacientes queixam-se de fadiga, perda de peso e febre. A presena de hepatoesplenomegalia evidenciada na maioria dos casos. Entretanto, a doena j foi descrita em indivduos com a forma hepatointestinal. Edema e a presena de petquias em membros inferiores so frequentes. Prostrao e delrio no ocorrem. A doena se assemelha mais ao calazar do que febre tifoide.

    57

  • 58

    Secretaria de Vigilncia em Sade/MS

    As salmonelas so facilmente identificadas quando o sangue semeado em meio de cultura. Em 25% dos casos, elas tambm podem ser recuperadas nas coproculturas e uroculturas.

    A salmonelose septicmica prolongada deve ser tratada com antibiticos de reconhecida ao antissalmonela, como a associao sulfametoxazol-trimetoprima, a ciprofloxacina e o cloranfenicol. Em uma etapa subsequente, o tratamento da esquistossomose poder ser feito com praziquantel ou oxamniquina. Nos casos de menor gravidade, o uso do esquistossomicida suficiente para a cura de ambas as infeces com eficcia em torno de 90%.

    3.4.2 Abscesso heptico

    Abscesso piognico do fgado causado pelo Staphylococcus aureus, na esquistossomose aguda, foi encontrado no Brasil. A bipsia heptica cirrgica em duas crianas com abscesso piognico revelou a presena de granulomas hipergicos caractersticos da fase aguda da esquistossomose. Aps o tratamento, que incluiu drenagem cirrgica, antibiticos e oxamniquina, as crianas ficaram curadas.

    3.4.3 Esquistossomose em imunocomprometidos

    Cresce a cada dia o nmero de indivduos imunossuprimidos por medicamentos (quimioterapia antiblstica, outros frmacos imunossupressores, como a ciclosporina e os corticoesteroides, transplantados, entre outros) e doenas que causam imunodepresso (aids, neoplasias, insuficincia renal). No hospedeiro imunocomprometido, h alteraes na apresentao clnica, nos vrios aspectos patolgicos e na abordagem teraputica das doenas infecciosas associadas.

    Nesse cenrio, novos aspectos merecem ateno: possibilidade de hepatite txica na ausncia de granuloma, reduo da eliminao de ovos nas fezes por diminuio da resposta inflamatria, disseminao de ovos por vrios tecidos, diminuio da eficcia teraputica dos esquistossomicidas.

    3.4.4 Outras hepatopatias

    O agravamento da esquistossomose por associao com as hepatites virais B e C controverso. Para alguns autores, a evoluo das hepatites segue seu prprio curso natural, independente da esquistossomose, enquanto que, para outros, a associao das hepatites virais B e C pode agravar a esquistossomose, causando mais precocemente insuficincia heptica, ascite, ictercia, hipertenso portal e varizes do esfago com sangramento.

    58

  • 59

    Vigilncia da Esquistossomose Mansoni Diretrizes Tcnicas

    3.5 Diagnstico diferencial

    A esquistossomose pode ser confundida com diversas doenas, em funo das manifestaes diferentes que ocorrem durante sua evoluo.

    1. Dermatite cercariana: o quadro clnico da dermatite cercariana pode ser confundido com manifestaes exantemticas, como dermatite por larvas de helmintos (Ancylostoma duodenale, Necator americanus, Strongyloides stercoralis, Ancilostoma brasiliensis) ou por produtos qumicos lanados nos rios ou, ainda, por cercrias de parasitas de aves.

    2. Esquistossomose aguda: o diagnstico diferencial deve ser feito com outras doenas infecciosas agudas, tais como febre tifoide, malria, hepatites virais (A e B, nas formas anictricas), estrongiloidase, amebase, mononucleose, tuberculose miliar e ancilostomose aguda, brucelose e doena de Chagas aguda.

    3. Esquistossomose crnica: nessa fase, a doena pode ser con