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IBSN: 0000.0000.000 Página 1 VIAGEM AO CENTRO DA TERRA COM A TURMA DO ÔNIBUS MÁGICO – UMA PRÁTICA DE GEOGRAFIA FÍSICA NO ENSINO FUNDAMENTAL Viviane Moreira Maciel (a) , Rosália C. Sanábio de Oliveira (b) , Érico Anderson de Oliveira (c) (a) Colégio Cavalieri – MG, [email protected] (b) Departamento de Geografia e História - DGH - CEFET-MG, [email protected] (c) Departamento de Geografia e História – DGH - CEFET -MG, [email protected] Eixo: Metodologias para o ensino da geografia física no ambiente escolar Resumo Servindo-se do livro infantojuvenil “O Ônibus Mágico – no Interior da Terra” de Joanna Cole e Bruce Degem, como primeiro estímulo, planejou-se um projeto para o ensino de Geografia no 6º ano do ensino fundamental II, permitindo aos estudantes empreenderem uma jornada literária-fantástica com os personagens da história – a professora Friz e seus alunos - em uma aventura extraordinária em direção ao interior do planeta Terra. Na verdade, uma excursão escolar inusitada para se alcançar conhecimentos científicos que foram sendo adquiridos durante todo o percurso imaginário. Ao final dessa jornada, os alunos chegaram às suas próprias conclusões, elaboradas por meio dos vínculos e aproximações com os conteúdos da Geografia Física recomendados para a série em questão. As práticas desenvolvidas, formando uma unidade, converteram o aprendizado num processo significante e lúdico. As fundamentações teórico-metodológicas que nortearam a execução das atividades encontram=se nas teorias de David Ausubel, Jean Piaget e Henri Wallon. Palavras-chaves: Ensino de Geografia – Joanna Cole – O Ônibus Mágico - Geografia Física e Literatura infantojuvenil. 1. INTRODUÇÃO A Geografia se coloca como uma disciplina capaz de interagir com outras, não apenas se limitando aos seus tópicos curriculares, ela convida naturalmente para uma conversa entre perspectivas distintas do saber, procurando obter e transformar a compreensão, o aprendizado ou as ações do sujeito. E ao interatuar com esses campos complementares, a aprendizagem torna-se mais rica. Muitos conteúdos geográficos são “fronteiriços”, no sentido de que ensejam outras percepções, margeiam diversos entendimentos, e uma vez unidos, contribuem para a formação de uma visão mais complexa da realidade. Este trabalho é resultante do esforço em

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VIAGEM AO CENTRO DA TERRA COM A TURMA DO ÔNIBUS

MÁGICO – UMA PRÁTICA DE GEOGRAFIA FÍSICA NO ENSINO FUNDAMENTAL

Viviane Moreira Maciel(a), Rosália C. Sanábio de Oliveira(b), Érico Anderson de Oliveira(c)

(a) Colégio Cavalieri – MG, [email protected] (b) Departamento de Geografia e História - DGH - CEFET-MG, [email protected] (c) Departamento de Geografia e História – DGH - CEFET -MG, [email protected]

Eixo: Metodologias para o ensino da geografia física no ambiente escolar

Resumo

Servindo-se do livro infantojuvenil “O Ônibus Mágico – no Interior da Terra” de Joanna Cole e Bruce Degem, como primeiro estímulo, planejou-se um projeto para o ensino de Geografia no 6º ano do ensino fundamental II, permitindo aos estudantes empreenderem uma jornada literária-fantástica com os personagens da história – a professora Friz e seus alunos - em uma aventura extraordinária em direção ao interior do planeta Terra. Na verdade, uma excursão escolar inusitada para se alcançar conhecimentos científicos que foram sendo adquiridos durante todo o percurso imaginário. Ao final dessa jornada, os alunos chegaram às suas próprias conclusões, elaboradas por meio dos vínculos e aproximações com os conteúdos da Geografia Física recomendados para a série em questão. As práticas desenvolvidas, formando uma unidade, converteram o aprendizado num processo significante e lúdico. As fundamentações teórico-metodológicas que nortearam a execução das atividades encontram=se nas teorias de David Ausubel, Jean Piaget e Henri Wallon. Palavras-chaves: Ensino de Geografia – Joanna Cole – O Ônibus Mágico - Geografia Física e Literatura infantojuvenil. 1. INTRODUÇÃO

A Geografia se coloca como uma disciplina capaz de interagir com outras, não apenas

se limitando aos seus tópicos curriculares, ela convida naturalmente para uma conversa entre

perspectivas distintas do saber, procurando obter e transformar a compreensão, o aprendizado

ou as ações do sujeito. E ao interatuar com esses campos complementares, a aprendizagem

torna-se mais rica.

Muitos conteúdos geográficos são “fronteiriços”, no sentido de que ensejam outras

percepções, margeiam diversos entendimentos, e uma vez unidos, contribuem para a

formação de uma visão mais complexa da realidade. Este trabalho é resultante do esforço em

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auxiliar no ensino de assuntos próprios da Geografia, de maneira transdisciplinar no ambiente

escolar.

A finalidade deste projeto é, também, ponderar sobre estratégias de ensino e como as

temáticas ligadas à Geografia Física se conectam adequadamente ao ensino fundamental. Elas

possuem assuntos inspiradores que quando somados à curiosidade e criatividade dos alunos,

levam à criação de um território alegre e propício ao saber.

1.1. O Ensino da Geografia Física no Ensino Fundamental

Diversos autores têm aclarado sobre às possibilidades de elaboração de procedimentos

pedagógicos voltados para a introdução dos conteúdos da Geografia Física, pesquisando a

incorporação dos mesmos em práticas que levem à análise do espaço como um todo e sejam

ambientalmente adequadas.

Cavalcanti (1998), Pontuschka (2009) e Passini (2015), entre outros, evidenciam a

necessidade de um maior cuidado com o aprendizado da Geografia, ressaltando o valor de

uma didática aprimorada, que uma vez sendo colocada em ação, contribua para um

ordenamento preciso da Geografia na escola.

Através de Cavalcanti, entendemos a preocupação em transpor o conhecimento

científico para o conhecimento geográfico escolar de forma harmoniosa, quando ela enfatiza:

A relação entre uma ciência e a matéria de ensino é complexa; ambas formam uma unidade, mas não são idênticas. A ciência geográfica constitui-se de teorias, conceitos e métodos referentes à problemática de seu objeto de investigação. A matéria de ensino Geografia corresponde ao conjunto de saberes dessa ciência, e de outras que não têm lugar no ensino fundamental e médio, como astronomia, economia, geologia, convertidos em conteúdos escolares a partir de uma seleção e de uma organização daqueles conhecimentos e procedimentos tidos como necessários à educação geral [...]. (CAVALCANTI, 1998, p. 9)

Passini, também corrobora para realçar essa discussão:

A escolha do conteúdo para ensinar Geografia deve ser feita pensando na responsabilidade da formação do cidadão que precisa entender o mundo. A forma, a transposição didática utilizada, o conhecimento constituído e as ferramentas da inteligência de que o aluno dispõe para que ele avance do conhecimento menor para

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um conhecimento maior. Não é simples como ler uma bula de remédio e aplicar a dosagem por faixa etária. Precisamos entender os mecanismos de construção de conhecimento para o tema a ser tratado: quais conceitos e habilidades serão estruturantes para que o aluno consiga passar do conhecimento empírico para o conhecimento científico. (PASSINI, 2015, p. 38)

Tais autores reforçam o valor do saber prévio do aluno, bem como a importância de

seu dia a dia, entre vários outros aspectos, no sentido de aprimorar sua competência

perceptiva em diferentes níveis de análise do espaço.

Ao referendarmos tais idéias, estamos acentuando a pertinência do ensino da

Geografia, e ao distinguirmos a instrução anterior dos alunos e suas predileções em relação à

Geografia e às dinâmicas naturais do planeta, estaremos contribuindo para que eles possam

absorver a essência desses processos, partes de uma natureza constantemente modificada por

suas atividades intrínsecas e também pela ação humana.

Atualmente, novas linguagens estão sendo positivamente adaptadas ao ensino:

filmes, documentários, fotografias, músicas, poesias, jornais, charges, obras de arte, animes,

literatura, etc, e por meio delas, trabalham-se pontos vinculados à Geografia e especialmente

ao planeta Terra.

As possibilidades que agora se fazem presentes na didática exibem apenas a

constatação de que , no caso da Geografia, ela e múltipla e é passível de ser experienciada por

meio de vários viezes, matizes e tempos. Agora, é preciso que os alunos elaborem seus

próprios conceitos, entendam sistemas e possam tecer generalizações.

Reforçando esse questionamento, nos Parâmetros Curriculares Nacionais de Geografia

no Ensino Fundamental (1998) – na caracterização da Área de Geografia, afirma-se o desejo:

Uma Geografia que não seja apenas centrada na descrição empírica das paisagens, tampouco pautada exclusivamente na interpretação política e econômica do mundo; que trabalhe tanto as relações socioculturais da paisagem como os elementos físicos e biológicos que dela fazem parte, investigando as múltiplas interações entre eles estabelecidas na constituição de um espaço: o espaço geográfico. (PCN, 1998, p.72)

Portanto, o ensino atraente é aquele que promove nos alunos a motivação e o prazer

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em descobrir a Geografia e ao fazê-lo, por meio de suas indagações consiga adquirir um

entendimento do mundo além do banco escolar, para a vida, e dessa forma, se reconhecer

como parte dele.

Propondo uma prática pedagógica, com as características citadas, utilizamos um livro

infantojuvenil de forte apelo para a faixa etária (11-12 anos), para chegarmos numa

aprendizagem significativa. O livro em questão: O Ônibus Mágico – no Interior da Terra

(1999), de Joanna Cole e Bruce Degem, figuras 1 e 2.

Uma prática pedagógica precisa ser instigante e ter uma metodologia previamente

planejada pelo professor, e permitir aos alunos reflexões críticas ao associarem o que

aprenderam na prática com uma posterior observação da realidade. Entretanto, os alunos

chegam com suas competências que devem ser consideradas no processo de ensino-

aprendizagem. Para tal, nos fundamentamos em David Ausubel, Jean Piaget e Henri Wallon.

Figuras 1 e 2: Capa e detalhe interior do livro. Fonte: COLE, 1999.

1.2. Fundamentação Teórica

Muitas teorias tratam de uma aprendizagem significativa, uma dessas formulações é

sustentada por David Ausubel. O pensamento fundamental na obra de Ausubel é o que ele

estabelece como aprendizagem significativa, (1978, p. 159): “O aprendizado significativo

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acontece quando uma informação nova é adquirida mediante um esforço deliberado por parte

do aprendiz em ligar a informação nova com conceitos ou proposições relevantes

preexistentes em sua estrutura cognitiva.”

Assim, temos por princípio, que considerar o grau de evolução cognitiva dos alunos,

pois o andamento das atividades didático-pedagógicas estará subordinado à qualidade do

progresso dos mesmos. Podemos ter esse desenvolvimento medido por avaliações

diagnósticas que sondariam quais estudos estariam presentes e se haveria a necessidade de

complementação. Ao explorarmos os conhecimentos precedentes dos alunos, veríamos com

facilidade o que já dominam ou trazem em seus arranjos cognitivos. A somatória de sua

eficiência cognitiva e de suas aptidões pregressas mostraria o grau de desenvolvimento

alcançado.

Ato contínuo, devemos ter a noção de que a elaboração das aprendizagens

significativas necessita da amarração entre o que o aluno já sabe com os saberes recentes. E

para que a aprendizagem seja viável deve-se proporcionar a auto-elaboração significativa, que

poderá acontecer caso os alunos efetuem as suas próprias aprendizagens significativas.

Esse modelo requer planejamento didático, liberdade no processo educacional, numa

relação dialética; pode-se afirmar que mesmos os alunos não estão acostumados a esse

processo que é o de aprender a aprender, e ousamos dizer que nem todos os professores, do

mesmo modo.

Ausubel (2000), para instigar os alunos, recomenda o uso ou um material

significativo para facilitar a aprendizagem. Esse material deve ser desafiador e cativante aos

olhos dos alunos, sendo que o professor é um mediador no transcurso da prática

São dele, Ausubel (2000), as palavras

A aprendizagem significativa não é sinônimo de aprendizagem de material significativo. Em primeiro lugar, o material de aprendizagem apenas é potencialmente significativo. Em segundo, deve existir um mecanismo de aprendizagem significativa. O material de aprendizagem pode consistir em componentes já significativas (tais como pares de adjectivos), mas cada uma das

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componentes da tarefa da aprendizagem, bem como esta como um todo (apreender uma lista de palavras ligadas arbitrariamente), não são ‘logicamente’ significativas. (AUSUBEL 2000, p.1):

Para encorajar os alunos, Piaget (1975), reitera que é preciso transformar as aptidões

de cada indivíduo, para que ele possa aprender verdadeiramente. E propõe uma possibilidade

de potencializar as estruturas cognitivas dos alunos, provocando-se divergências cognitivas

que predisponham instabilidades. À partir delas, ao conseguirem um equilíbrio, alcançarão

um novo direcionamento. Dessa maneira, podenão refazer os seus conhecimentos. O que

Piaget nomina de “escola ativa”, citado por Munari, (2010), a seguir:

A “escola ativa” baseia-se na no idéia de que as matérias a serem ensinadas à criança não devem ser impostas de fora, mas redescobertas pela criança por meio de uma verdadeira investigação e de uma atividade espontânea. “Atividade” se opõe, assim, à receptividade. [...] Esses procedimentos se inspiram na noção bem conhecida de self-government. Para aprender a física ou a gramática, não há método melhor que descobrir por si, por meio de experiência, ou da análise de textos, as leis da matéria ou as regras da linguagem; do mesmo modo, para adquirir o sentido da disciplina,da solidariedade e da responsabilidade, a escola ativa se esforça em colocar a criança numa situação tal que ela experimente diretamente as realidades espirituais e discuta por si mesma, pouco a pouco, as leis constitutivas. (MUNARI, 2010, ps. 53 e 54),

Nessa conjunção, admite-se a participação ativa do aluno, numa sequência auto-

estruturante, ele então é responsável pela conquista de seu próprio aprendizado. Na psicologia

cognitiva presente em Piaget, o aluno não é um ser apático, ele interage como indivíduo com

o meio, recebendo e reelaborando os incentivos recebidos, continuamente.

Ainda para Piaget (1996) o construtivismo serve para auxiliar os indivíduos a

examinarem seu próprio mundo, sendo que a psique humana é um complexo ativo de suportes

cognitivos que ajudam a dar significação a tudo que se concebe e se observa. Mas, não é

suficiente apenas acolher novas idéias, é vital compreender os anunciados para transformá-

los, o que acontece num cenário comum a todos, a sociedade.

Todavia, a ‘escola ativa, também é do professor, que precisa, então, caminhar

efetivamente e afetivamente rumo ao aluno, acreditando nas suas qualidades e nas promessas

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existentes nele. E incluir o cuidado, o afeto e a alegria em suas metodologias.

De acordo com Assmann (1996, p.18): “A qualidade da educação passa pelo viés

pedagógico (...) o processo pedagógico deve ser localizado nas experiências do prazer de estar

conhecendo, deve ser visto nas experiências de aprendizagem que são vividas como algo que

faz sentido e é humanamente gostoso.”

Diante disso, concordamos com Snyders (1993) quando manifesta-se sobre essa nova

postura do professor:

Assim, a relação do professor com o aluno é também a relação do primeiro com sua própria infância e talvez, se ela for suficientemente depurada ao longo dos anos, a relação com a infância absoluta. Mais do que todos os outros adultos, o professor mantém um diálogo constantemente renovado com a criança que ele era ou está convencido de ter sido. A relação será feliz na medida em que o professor não se envergonhar de ser um adulto que permaneceu um pouco mais criança do que os outros, ou antes, um adulto que, melhor que os outros, reconquistou a sua infância.. (SNYDERS, 1993, p. 86-87)

Sabemos que a interação entre aluno e educador também é favorecida pela emoção e

pela afetividade e conforme Piaget (1975, p.16), o afeto tem uma atribuição capital na

performance do intelecto humano, visto que a: “Vida afetiva e cognitiva são inseparáveis,

embora distintas. E são inseparáveis porque todo intercâmbio com o meio pressupõe ao

mesmo tempo estruturação e valorização”.

Acreditamos que não basta valorizar o que o aluno, a afetividade tem que estar

presente no ensino, Nos remetemos a Restrepo (1998), que expressa a influência da

afetividade na produção do intelecto:

Cada vez estamos mais dispostos a reconhecer que o tipicamente humano, o genuinamente formativo, não é a operação fria da inteligência binária, pois as máquinas sabem dizer melhor que nós que dois mais dois são quatro. O que nos caracteriza e diferencia da inteligência artificial é a capacidade de emocionarmos, de reconstituir o mundo e o conhecimento a partir dos laços afetivos que nos impactam. (RESTREPO, 1998, p.18)

Ao optarmos por um livro lúdico que permite uma viagem fantástica, cremos que essa

escolha contribui para que no universo do ensino da Geografia Física, os alunos possam

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apreciar e se envolverem mais com o conteúdo trabalhado, encantando-se pelas aulas que

fogem das habituais aulas expositivas. Esse caminho pedagógico favorece, de um lado, a

formação social dos alunos por executarem as tarefas coletivamente, e de outro lado, ajudam a

aumentar a afetividade vigente na sala de aula. Em nossas concepções, essa afetividade

poderá migrar, em um certo nível, para a própria disciplina Geografia.

Pontuschka (2009), enaltece a importância do uso da literatura no ensino da Geografia

adiante:

A literatura é fonte de prazer, mas não é só isso. É, igualmente modo de conhecer o mundo.. Nós não teríamos condições de conhecer o mundo, o todo da vida dos homens,, apenas no curto período de tempo de nossas vidas.(...) A literatura dá prazer. A palavra é importante. Como se tem o prazer de sentir a harmonia de um quadro ou de uma música. Há professores que só trabalham essa parte, mas a literatura é muito mais do que isso. Por ela, os alunos podem descobrir também toda a grandeza existente nos homens, para que saibam que essa grandeza existe neles igualmente. A compreensão do texto literário torna-se possível não só pelo auxílio da teoria literária, a ser trabalhada com os alunos a fim de fornecer-lhes um instrumento, como também pela quantidade e pelo aprofundamento de informações sobre o contexto em que se dá a trama vivida pelas personagens. (PONTUSCHKA, 2009, p. 236-237)

Na visão de Almeida (1995), Wallon enfatiza que as particularidades do indivíduo no

tocante ao intelecto não devem ser desagregadas da afetividade. Para ele, acontece uma

ascensão paulatina da afetividade, que em seus primórdios é definida pelas condições

biológicas e com a sucessão natural do tempo é vigorosamente instigada e transformada pela

vida em sociedade. As ocorrências de ordem afetiva não são isoladas do domínio cultural,

mesmo sendo de caráter abstratas são resultantes da qualidade de comunicação entre

semelhantes, uma vez que são ensaios decorrentes do que é continuamente testado.

Desta maneira, para os autores, literatura rima com Geografia, afetividade,

conhecimento, e formação humana. Tendo como esteio as teorias psico-pedagógicas

mencionadas, colocamos em ação o nosso projeto aqui relatado, com o intuito de contribuir

para as discussões sobre as práticas educativas na disciplina Geografia.

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2. MATERIAIS E MÉTODOS

O desenvolvimento das etapas do projeto não foi inflexível, ao contrário, processou-se

com o avanço instintivo do processo de ensino-aprendizagem, sendo apenas sinalizado pelo

professor para que se vencessem alguns tópicos julgados imprescindíveis.

• planejamento da prática pelo professor (metodologia, materiais pedagógicos que serão

utilizados, nº de aulas disponíveis, assuntos que devem ser abordados no trabalho,

viabilidade de ser realizado com outra(s) disciplina(s);

• preparação de material complementar sobre a estrutura da Terra pelo professor e depois

disponibilizada aos alunos; avaliação diagnóstica aplicada antes do início das atividades

propostas; definição do livro a ser trabalhado em sala de aula;

• construção pelos alunos de um cartão pop-up de papel sobre vulcanismo/tectonismo para

aguçar a curiosidade dos mesmos, muitos deles foram depois de feitos, modificados pelos

mesmos,(Figura 3); entrega de sugestões de sites, filmes e/ou documentários interessantes

sobre os temas a serem estudados; disponibilização dos livros para a leitura;

• apresentação do power point do livro pelo professor, foi utilizado como suporte durante as

discussões coletivas; início da leitura individual e coletiva do livro “O Ônibus Mágico –

no Interior da Terra” de Joanna Cole e Bruce Degem;

• discussão coletiva sobre o trabalho de acordo com o andamento do projeto, associando o

que foi sendo trazido pelos alunos com a leitura do livro e as ponderações do professor;

• atividade com alimentos sobre os tipos de rochas e a estrutura da Terra, (Figuras 4, 5 e 6);

• elaboração de uma coleção coletiva de rochas; elaboração de um diário de bordo feito por

cada aluno durante o desenrolar do projeto;

• lanche coletivo; avaliação sobre as atividades feitas; avaliação qualitativa ao final.

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3. RESULTADOS E DISCUSSÕES

O tipo de metodologia empregada – a participante - guiou o professor e concorreu para

o aprimoramento de suas práticas uma vez que as mesmas foram direcionados mediante um

seguimento de passos em paralelo com o aprofundamento da interação: etapas de estudo e

elaboração, execução propriamente dita, investigação das partes e do todo do processo

didático-pedagógico e ponderações ao final. Ficando claro que a execução das fases pode ser

efetivada quantas vezes forem necessárias para atingir-se os objetivos propostos.

Figura 3 – Maquete construída por aluno com espuma em spray sobre cartão pop-up de papel.

Figura 4 – Bolo Camadas da Terra..

Fonte: Fotos dos autores

O emprego da literatura infantil, mais particularmente, na Geografia Física, promove

um encontro enriquecedor entre o conhecimento científico, dentro de um caráter coloquial,

com a aprendizagem proativa por descobertas em meio à ludicidade.

Distintas metodologias podem ser criadas através dos livros físicos ou digitais, mas

nessa concepção temos a introdução de uma viagem científica ao interior do planeta Terra,

adaptando-a à faixa etária dos alunos, às suas preferências, fazendo uso do principal

instrumento de cada um deles – a imaginação. Sendo que a idealização dá lugar a níveis de

aprofundamento dos conteúdos da série de uma forma alegre e amena, e esse enraizamento do

que é essencial, é uma passagem didático-pedagógica, em que o livro nada mais é que um

“subterfúgio”, no bom sentido.

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Figuras 5 – Moldando o bolo de palha italiana

Figura 6 – Bolo Vulcão de Palha Italiana

Fonte: Acervo dos autores

O livro - “O Ônibus Mágico – no Interior da Terra” de Joanna Cole e Bruce Degem,

pode ser utilizado no ensino de Geografia Física; ele colaborou para que a assimilação desses

conteúdos fossem mais envolventes e divertidos, e junto com a metodologia aplicada,

incentivou a autonomia e o trabalho em equipe. Porquanto, as correlações científicas entre o

que foi lido, observado, investigado, registrado e compartilhado entre todos, foram realizadas.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

As práticas mostradas nesse artigo pretenderam melhorar a relação do aluno com o

conteúdo científico sugerido para a série (6º ano do Ensino Fundamental II), contrapondo-o

com a realidade em que vivemos. Os alunos lograram êxito, souberam compatibilizar a leitura

do livro com: as pesquisas informais, as análises feitas, a busca pela resolução de enigmas, a

capacidade de organização e comunicação, a definição do que seria registrado... Criaram

estratégias individuais e coletivas para a solução dos obstáculos que foram surgindo durante a

prática e foram adquirindo, o que é relevante, o entendimento dos assuntos já integrados.

Referências Bibliográficas

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