ventilaÇÃo nÃo invasiva na exacerbaÇÃo aguda da doenÇa … capelas... · a doença pulmonar...

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FACULDADE DE MEDICINA DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA MESTRADO INTEGRADO EM MEDICINA – TRABALHO FINAL TÂNIA ISABEL ABREU CAPELAS VENTILAÇÃO NÃO INVASIVA NA EXACERBAÇÃO AGUDA DA DOENÇA PULMONAR OBSTRUTIVA CRÓNICA: MORTALIDADE INTRA-HOSPITALAR E FATORES DE FALÊNCIA ARTIGO CIENTÍFICO ORIGINAL ÁREA CIENTÍFICA DE MEDICINA INTENSIVA Trabalho realizado sob a orientação de: PROFESSOR JORGE PIMENTEL DRA. ANA MARQUES FEVEREIRO/2018

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Page 1: VENTILAÇÃO NÃO INVASIVA NA EXACERBAÇÃO AGUDA DA DOENÇA … Capelas... · A Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica (DPOC) define-se como uma doença crónica prevenível e tratável

FACULDADE DE MEDICINA DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA

MESTRADO INTEGRADO EM MEDICINA – TRABALHO FINAL

TÂNIA ISABEL ABREU CAPELAS

VENTILAÇÃO NÃO INVASIVA NA EXACERBAÇÃO AGUDA DA

DOENÇA PULMONAR OBSTRUTIVA CRÓNICA: MORTALIDADE

INTRA-HOSPITALAR E FATORES DE FALÊNCIA

ARTIGO CIENTÍFICO ORIGINAL

ÁREA CIENTÍFICA DE MEDICINA INTENSIVA

Trabalho realizado sob a orientação de:

PROFESSOR JORGE PIMENTEL

DRA. ANA MARQUES

FEVEREIRO/2018

Page 2: VENTILAÇÃO NÃO INVASIVA NA EXACERBAÇÃO AGUDA DA DOENÇA … Capelas... · A Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica (DPOC) define-se como uma doença crónica prevenível e tratável

VENTILAÇÃO NÃO INVASIVA NA EXACERBAÇÃO AGUDA DA DOENÇA

PULMONAR OBSTRUTIVA CRÓNICA: MORTALIDADE INTRA-HOSPITALAR E

FATORES DE FALÊNCIA

Tânia Capelas

Aluna do 6ª ano do Mestrado Integrado de Medicina

Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, Portugal

[email protected]

Orientador: Professor Doutor Jorge Pimentel

Professor Associado Convidado Da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, Portugal

Diretor do Serviço de Medicina Intensiva do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, Portugal

[email protected]

Co-Orientadora: Dra. Ana Marques

Serviço de Medicina Intensiva do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, Portugal

[email protected]

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SUMÁRIO

RESUMO ................................................................................................................................... 3

ABSTRACT ............................................................................................................................... 4

INTRODUÇÃO ......................................................................................................................... 6

MATERIAL E MÉTODOS ....................................................................................................... 8

RESULTADOS .......................................................................................................................... 9

DISCUSSÃO ............................................................................................................................ 13

CONCLUSÃO ......................................................................................................................... 17

AGRADECIMENTOS ............................................................................................................. 18

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................................... 19

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RESUMO

Introdução: Na DPOC ocorrem frequentemente exacerbações agudas. A VMNI deve

ser a forma inicial de ventilação na insuficiência respiratória aguda nestes casos. O objetivo

principal deste estudo foi quantificar a mortalidade intra-hospitalar dos doentes com

exacerbação aguda da DPOC, com insuficiência respiratória hipercápnica e cujo suporte

ventilatório inicial na sala de emergência foi a VMNI. Como objetivo secundário, pretendia-

se identificar fatores preditores de falência da VMNI.

Materiais e Métodos: Foram recolhidos dados de doentes que entraram nas salas de

emergência do CHUC entre outubro de 2016 e fevereiro de 2017. Incluíram-se doentes

adultos (>18 anos), com insuficiência respiratória hipercápnica (PaCO2>45mmH)

desencadeada por uma EADPOC. Foram excluídos do estudo doentes com pneumonia, edema

agudo do pulmão e tromboembolia pulmonar. Foi criada uma base de dados com o SPSS22 e

calculada a taxa de mortalidade e de falência da VMNI. Foram criadas curvas ROC para as

variáveis pH, PaO2, PaCO2, HCO3-, PaO2/FiO2 e SpO2 de forma a poder identificar fatores

preditores da falência da VMNI.

Resultados: A taxa de mortalidade intra-hospitalar total foi de 18,8%. Houve 15,6% de

falência da VMNI com uma mortalidade de 20% nesse grupo. As curvas ROC no grupo de

falência da VMNI evidenciaram uma maior área sob a curva para ao pH e HCO3-.

Discussão: Os dados deste estudo estão de acordo com a restante literatura Europeia,

onde estudos semelhantes encontraram mortalidades intra-hospitalares entre os 4% e os 25%

dependendo do estudo. Foi também evidenciada uma taxa de falência de VMNI de 15% que

se equipara a encontrada neste estudo. Os fatores preditores de falência demonstrados neste

estudo estão também de acordo com os restantes trabalhos.

Conclusão: A mortalidade intra-hospitalar deste centro é semelhante à registada em

outros centros da Europa. A necessidade de ventilação invasiva na EADPOC foi reduzida,

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sendo que a mortalidade nesse grupo específico de doentes é superior, mas concordante com

os valores de outros Hospitais Europeus. O pH foi o fator mais associado à falência da VMNI.

Palavras-Chave: DPOC, VMNI, Insuficiência Respiratória, Mortalidade.

ABSTRACT

Introduction: In chronic obstructive pulmonary disease, acute exacerbations often

occur. Non-invasive mechanical ventilation should be the initial form of ventilation in acute

respiratory failure in these cases. The main goal of this study was to quantify the in-hospital

mortality of patients with acute exacerbation of COPD with hypercapnic respiratory

insufficiency whose initial ventilatory support in the emergency room was NIMV. As a

secondary goa, it was intended to identify factors predicting NIMV failure.

Materials and Methods: Data from patients entering CHUC emergency rooms

between October 2016 and February 2017 were collected. Adult patients (> 18 years) with

hypercapnic respiratory insufficiency (PaCO2> 45mmH) triggered by an AECOPD were

included. Patients with pneumonia, acute pulmonary edema and pulmonary thromboembolism

were excluded from the study. A database was created with SPSS22 and the mortality and

failure rate of NIMV were calculated. At the end, ROC curves for the pH, PaO2, PaCO2,

HCO3-, PaO2 / FiO2 and SpO2 variables were created to identify predictors of NIVM failure.

Results: The total in-hospital mortality rate was 18.8%. There was a 15.6% NIMV

failure with 20% mortality in this group. The ROC curves related to the NIVM failure group

showed a larger area under the curve for pH and HCO3-.

Discussion: Data from this study is concordant with the rest of the European literature,

where similar studies found in-hospital mortality between 4% and 25% depending on the

study. A NIMV failure rate of 15% was also found in other studies, which is the same as in

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this study. The predictive factors of failure demonstrated in this study are also in agreement

with the remaining works.

Conclusion: In-hospital mortality at this centre is similar to that found in other centres

in Europe. The need for invasive ventilation in AECOPD has been reduced, and mortality in

this specific group of patients is higher, but in line with the values of other European

Hospitals. pH was the factor most associated with NIMV failure.

Keywords: COPD, NIMV, Respiratory Failure, Mortality.

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INTRODUÇÃO

A Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica (DPOC) define-se como uma doença crónica

prevenível e tratável que se caracteriza por sintomas respiratórios persistentes que têm origem

na limitação de fluxo da via aérea e/ou anomalias alveolares. É geralmente causada por

exposição a partículas ou gases nocivos. Os sintomas mais comuns são a dispneia, tosse seca

ou produtiva que nem sempre são valorizados pelos doentes. Existe ainda uma forma de

DPOC associada a um defeito genético que resulta na deficiência da enzima alfa-1-

antitripsina.(1)

Esta patologia representa um importante problema de Saúde Pública e é um grande fator

causador de mortalidade e morbilidade. A DPOC é neste momento a quarta causa de morte no

mundo, mas perspetiva-se que venha a ser a terceira causa de morte até 2020. (1) Segundo a

Organização Mundial de Saúde é a única doença crónica no mundo cuja mortalidade está a

aumentar.(2)

É característico da DPOC a existência de exacerbações que podem ser definidas como

agravamento agudo da função respiratória que necessita de terapêutica adicional. Estas

exacerbações podem ser precipitadas por vários fatores, nomeadamente infeções do trato

respiratório.(1)

A exacerbação aguda da DPOC (EADPOC) piora a qualidade de vida, aumenta o

número de hospitalizações e a mortalidade.(3)

O tratamento da EADPOC inclui a utilização de broncodilatadores, corticoides

sistémicos, oxigenoterapia e antibióticos quando necessário.(1) (4)

No passado, quando o tratamento médico falhava, a ventilação invasiva constituía a

última linha de tratamento. A aplicação da Ventilação Mecânica Não Invasiva (VMNI) nestes

casos permitiu diminuir significativamente a taxa de intubação destes doentes e por

conseguinte diminuir a mortalidade.(4)

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O controlo da exacerbação tem como objetivo minimizar as consequências da mesma

e prevenir episódios semelhantes no futuro. A VMNI deve ser a forma inicial de ventilação na

insuficiência respiratória aguda nos doentes com DPOC que não possuam contraindicações

absolutas para a mesma.(1)(5) A VMNI melhora as trocas gasosas, diminui a necessidade de

intubação, diminui a duração do internamento hospitalar e melhora a sobrevivência. (1) (5) (6)

(7)

Segundo a Global Initiave for Chronic Obstructive Pulmonary Disease (GOLD) se

uma das condições abaixo estiver presente, há indicação para iniciar VMNI: (1)

Tabela 1 – Indicações para iniciar VMNI(1)(3)(5)(6)

Iniciar VMNI se uma ou mais destas condições estiver presente:

Acidose Respiratória (pH≤7.35 ou PaCO2 ≥45mmHg).

Dispneia grave com utilização dos músculos acessórios, respiração paradoxal ou tiragem

intercostal.

Hipoxemia persistente apesar da administração suplementar de oxigénio.

Apesar da utilização da VMNI em situações de agudização com insuficiência

respiratória hipercápnica ser hoje o gold-standard na abordagem destes doentes em situações

de emergência ou na sala de emergência e a sua eficácia estar comprovada, pouco se sabe

relativamente ao prognóstico e evolução destes indivíduos.(3)

Alguns doentes devido à gravidade da insuficiência respiratória podem necessitar de

uma abordagem mais agressiva com necessidade de internamento em unidade de cuidados

intensivos (UCI) e ventilação invasiva. Deve-se ponderar essa possibilidade quando há

dispneia grave que não responde adequadamente ao tratamento inicial; agravamento da

hipoxemia (< 40mmHg) ou da acidose (pH < 7.25) apesar da otimização do suporte

ventilatório não invasivo e da oxigenoterapia; instabilidade hemodinâmica; alteração do

estado de consciência (letargia ou coma).(1)

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Assim sendo, foi identificada uma necessidade de conhecer e perceber a evolução

destes doentes para melhor otimizar o seu tratamento. Nesse sentido este estudo tem como

objetivo principal quantificar a mortalidade intra-hospitalar dos doentes com EADPOC, com

insuficiência respiratória hipercápnica e cujo suporte ventilatório inicial na sala de emergência

foi a VMNI. Como objetivo secundário, pretende-se identificar fatores de falência da VMNI.

MATERIAL E MÉTODOS

Foram recolhidos os dados dos doentes com EADPOC que deram entrada nos serviços

de urgência do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra com insuficiência respiratória

hipercápnica e com necessidade de VMNI no período de outubro de 2016 a fevereiro de 2017.

O levantamento dos dados dos doentes foi feito através do programa de gestão dos episódios

de urgência Alert® e também pela consulta dos Processos clínicos únicos dos doentes.

Foram incluídos doentes adultos (>18 anos), com insuficiência respiratória

hipercápnica (PaCO2>45mmH) desencadeada por uma EADPOC. Foram excluídos doentes

com pneumonia, edema agudo do pulmão e tromboembolia pulmonar. As readmissões no

período de estudo também não foram analisadas pelo que cada doente integra o estudo apenas

uma vez.

Foi criada uma base de dados usando o SPSS 22®

, onde foram registados os dados de

caracterização dos doentes (idade, sexo, comorbilidades, se realizavam ou não oxigenoterapia

e VMNI no domicílio) e da gasometria à entrada no serviço de urgência. Através deste

programa calculou-se a taxa de mortalidade intra-hospitalar e a percentagem de falência da

VMNI. Foi definida falência de VMNI nos doentes que foram submetidos a esta técnica como

primeira forma de suporte ventilatório, mas em que ocorreu agravamento clínico apesar da

VMNI, havendo necessidade de intubação e ventilação mecânica de forma invasiva.

No final foram criadas curvas ROC para as variáveis pH, PaO2, PaCO2, HCO3-,

PaO2/FiO2 e SpO2 de forma a poder identificar fatores preditores da falência da VMNI.

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RESULTADOS

Durante os 5 meses do estudo foram admitidos no Serviço de Urgência 148 doentes

que tiveram necessidade de VMNI. Desses 148, 32 cumpriam os critérios de inclusão do

estudo. Dos 32 doentes admitidos no estudo, 17 eram mulheres e 15 eram homens com idades

compreendidas entre 49 e 93 anos sendo a média de idades de 78,25 anos (±10,67). A Tabela

2 resume as características da amostra em relação à utilização de VMNI e oxigenoterapia no

domicílio bem como da presença das comorbilidades mais relevantes.

Tabela 2 – Características da Amostra

Nº de

Doentes Percentagem

Sexo Homens 15 46,9%

Mulheres 17 53,1%

VMNI em Casa SIM 8 25%

NÃO 24 75%

Oxigenoterapia

em Casa

SIM 17 53,1%

NÃO 15 46,9%

Comorbilidades

DM2 4 12,5%

HTA 4 12,6%

IC 2 6,3%

DRC 1 3,1%

Neoplasia Pulmonar 2 6,3%

DM2 e HTA 4 12,5%

HTA e IC 4 12,5%

IC e DRC 1 3,1%

Desconhecidas 5 15,6%

Relativamente ao “outcome” do internamento, a Tabela 3 resume o número total de

doentes que receberam alta e os que vieram a falecer durante o internamento.

Tabela 3 – Distribuição dos doentes segundo o outcome de internamento

Nº doentes Percentagem

Alta 26 81,3%

Morte 6 18,8%

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Dos 32 doentes incluídos no estudo, 5 foram identificados como “falência de VMNI”,

o que corresponde a uma percentagem de 15,6%. Dentro desse pequeno grupo observou-se

uma morte, o que equivale a uma mortalidade de 20%.

A identificação de um grupo em que existiu falência da VMNI permitiu analisar as

variáveis relativas à gasometria de entrada no serviço de urgência, que estão listadas na

tabela 4. Através desses valores construi-se um gráfico radar (Figura 1) onde se observa a

relação entre as diferentes variáveis nos 2 grupos.

As curvas ROC obtidas com as médias do grupo de “falência de VMNI” estão

ilustradas na figura 2 e os valores da área sob a curva estão apresentados na tabela 5.

Figura 1 – Gráfico Radar com representação das variáveis gasométricas do grupo de VMNI e de

falência da VMNI

0

50

100

150

200pH

PaO2

PaCO2

HCO3-

PaO2/FiO2

SpO2

Gráfico Radar VMNI vs VI

VMNI VI

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Tabela 4 – variáveis da gasometria à entrada do Serviço de Urgência nos doentes com e

sem necessidade de VI

pH PaO2 PaCO2 HCO3- FiO2/PaO2 SpO2

VMNI VI VMNI VI VMNI VI VMNI VI VMNI VI VMNI VI

Mínimo 6.95 7.06 22 38 53 66 22.9 27 50 133 38 56

Máximo 7.46 7.22 165.8 83 127 94 44.3 33.4 535 319 98 96

Média 7.24 7.15 58.44 56.1 81.93 81.34 34.87 29.9 192.89 186.81 78.52 78.6

Média

aparada

5%

7.25 7.16 55.62 55.61 81.16 81.45 35.01 29.7 184.11 182.45 79.64 78.89

Figura 2 – Curvas ROC para as variáveis pH, HCO3-, PaO2/FiO2 e SpO2 do grupo de

Falência da VMNI

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Figura 3 – Curvas ROC para as variáveis PaO2 e PaCO2 do grupo de Falência da VMNI

Tabela 5 – Área sob a curva

Variáveis de Teste Área Sob a Curva

pH 0,804

PaO2 0,515

PaCO2 0,519

HCO3- 0,744

PaO2/FiO2 0,519

SpO2 0,519

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DISCUSSÃO

Como seria de esperar, a população deste estudo tem uma média de idades avançada

(78,25), visto esta ser uma patologia crónica. A média de idades do nosso Centro Hospitalar

encontra-se dentro do esperado se comparada com outros estudos semelhantes em que média

se encontra entre os 69 e os 74 anos.(3)(5)(9)

Pode verificar-se que apenas uma pequena percentagem de doentes faz VMNI no

domicílio comparativamente à percentagem dos que fazem oxigenoterapia. Este fato pode ser,

em parte, justificável pela evidência disponível relativamente a estas duas modalidades

terapêuticas. A oxigenoterapia, instituída primariamente à noite, tem comprovada eficácia no

prolongamento da esperança média de vida de doentes com insuficiência respiratória crónica

comparativamente à VMNI que não tem um suporte de evidência tão claro relativamente a

esta matéria.(8) Este facto pode dar origem a que menos médicos prescrevam VMNI até uma

fase mais avançada da patologia. Por outro lado, isto também nos pode levar a pensar que os

doentes que usam VMNI no domicílio, eventualmente tolerem mais facilmente períodos de

agudização, aumentando, por exemplo, o número de horas diárias de VMNI, não tendo

necessidade de se deslocar à urgência hospitalar com tanta frequência.

Os doentes com DPOC têm frequentemente comorbilidades associadas que podem

complicar ou acelerar o desenvolvimento da doença bem como serem responsáveis pela morte

dos doentes como é o caso da neoplasia pulmonar. (1) Assim sendo, o fato de existir uma

elevada percentagem de doentes com comorbilidades desconhecidas é preocupante e deve

alertar para a necessidade de um registo e abordagem específica dessas comorbilidades para

que o tratamento da EADPOC possa ser o mais eficaz possível.

Relativamente aos valores da mortalidade intra-hospitalar, um estudo Britânico

semelhante realizado em 2008 revelou uma taxa de mortalidade intra-hospitalar de 25% em

doentes com exacerbações de DPOC tratados com VMNI.(9) Este valor está de acordo com

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um outro estudo Dinamarquês que registou uma mortalidade de 24 a 25% entre os anos de

2005 a 2011. Mais recentemente um estudo Italiano de 2013 registou uma mortalidade intra-

hospitalar de 18%.(10) Num centro universitário Espanhol de Santiago de Compostela, foi

realizado um estudo semelhante a este em 2008, em que o valor de mortalidade se encontrava

nos 4,1% (3) tal como uma outra investigação, fora da Europa, realizada no estado da

califórnia, em 2011, que identificou uma mortalidade de 4,9%.(6)

Assim, podemos enquadrar a taxa de mortalidade do nosso Centro Hospitalar como

sendo concordante com estes estudos, equiparando-se assim a outros centros Europeus.

Foi também registada a taxa de falência da VMNI (15,6%) que está também de acordo

com o que é observado na literatura, sendo que um estudo num centro universitário Francês

registou uma taxa de intubação de 15% e um outro estudo Holandês registou uma taxa de

20%.(11)(12)

Neste estudo, como objetivos secundários também se pretendia identificar fatores que

pudessem explicar a falência da VMNI.

Nesse âmbito, a deficiência na oxigenação é um dos fatores mais bem documentados.

Esta deficiência na oxigenação é traduzida pela hipoxemia e é mais bem expressa pela relação

entre a PaO2 e a FiO2 (PaO2/FiO2). Não obstante a importância da gravidade da hipoxemia, a

falência da VMNI foi correlacionada mais fortemente com a causa subjacente da mesma.

Ainda assim, uma PaO2/FiO2 abaixo de 146 foi considerada como fator preditor de falência da

VMNI em doentes com insuficiência respiratória.(13) A análise da curva ROC dá-nos uma

área sob curva que se aproxima pouco de 1, pelo que este não é um dos fatores mais

associados à falência da VMNI neste estudo.

O pH é também um dos fatores críticos associados à falência da VMNI. Cerca de 50% a

60% dos doentes com pH abaixo de 7,25 têm falência da VMNI.(13) Esta poderá ser a

explicação mais plausível no nosso grupo de doentes, uma vez que em todos os doentes que

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foi constatada falha de VMNI o pH se encontrava abaixo de 7,22. Isto é também concordante

com os valores apresentados pela curva ROC sendo que o pH foi o fator que apresentou uma

maior área sob a curva (0,804) e como tal é o fator mais associado à falência da VMNI. Não

obstante, é relativamente comum existir doentes ventilados não invasivamente com pH mais

baixo, dependendo muito do nível de experiência do centro em questão. Num estudo

Britânico de 2008, dos 1077 doentes estudados, 55% tinham pH abaixo de 7,26 e apenas 37%

tinham um pH entre 7,26 e 7,35. (9)

Além do pH, a baixa concentração de HCO3- foi o segundo fator mais associado à

falência da VMNI. Isto pode ser explicado pelo fato de que na insuficiência respiratória

aguda, não decorre tempo suficiente para a compensação renal se instalar, levando a

concentrações mais baixas de bicarbonato que influenciam o pH no sentido de uma acidose

mais grave.

Num estudo Italiano realizado entre 2009 e 2011, a equipa encontrou uma diferença

estatisticamente significativa dos valores de PaCO2 entre o grupo de sucesso e de falência da

NIV. Contudo, o mesmo estudo refere que apesar das diferenças estatísticas encontradas nos

dois grupos, apenas o pH e o score APACHE II foram comprovados como fatores preditores

de falência. Estes resultados corroboram o que foi verificado neste estudo uma vez que a

PaCO2 tem a mesma área sob a curva que outras variáveis como seja a PaO2/FiO2, a SpO2 e a

PaO2.(14)

Neste estudo não foi possível avaliar a influência das comorbilidades como fator de

falência devido ao pequeno volume de doentes do grupo em que VMNI falhou. Não obstante,

este pode ser um fator importante como identificado noutros estudos semelhantes, em que

existiu uma associação estatisticamente significativa entre a presença de maior número de

comorbilidades e a falência da VMNI. (6)(3)

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Vantagens

Um dos pontos fortes deste estudo é ser um trabalho inovador que nunca tinha sido

realizado neste centro hospitalar e que permite identificar e perceber alguns indicadores

importantes em saúde. Este trabalho permitiu, ainda, iniciar um registo dos doentes que

necessitaram de VMNI na sala de emergência que até então não era efetuado. A grande

vantagem da implementação deste registo é fazer com que no futuro seja possível estudar os

casos que necessitam de VMNI e tirar conclusões sobre em que doentes e contextos está a ser

aplicada, visando sempre otimizar ao máximo este tipo de terapêutica com objetivo de

potenciar os seus resultados e o susto-eficiência dos mesmos.

Limitações do Estudo

A principal limitação deste trabalho foi a dificuldade de organização dos registos dos

doentes na emergência que impossibilita uma maior uniformidade na amostra de doentes

analisados. O fato de nem sempre ser possível a caracterização detalhada das comorbilidades

e do estadio da DPOC são também limitações deste trabalho visto que podem influenciar

significativamente a taxa de mortalidade. A pequena amostra de doentes também é um fator

limitante visto que em amostras maiores as conclusões retiradas podem ser mais facilmente

extrapoladas para a população em geral.

Investigação Futura

No futuro propõe-se que seja instituído um formulário de registo da utilização da

VMNI anexado ao processo do doente de forma a facilitar o acesso aos registos. Para estudos

futuros propõem-se uma abordagem multicêntrica que inclua um número mais elevado de

doentes e ainda a exploração de variáveis como a mortalidade a longo prazo.

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CONCLUSÃO

Com este estudo foi possível concluir que o tratamento da EADPOC no Centro

Hospitalar de Coimbra é abordado com base nas guidelines mais recentes da Global Initiave

for Chronic Obstructive Lung Disease. Este fato faz com que a mortalidade intra-hospitalar

deste centro seja semelhante à registada em outros centros da Europa. A necessidade de

ventilação invasiva na EADPOC foi reduzida, sendo que a mortalidade nesse grupo específico

de doentes é superior, mas concordante com os valores de outros Hospitais Europeus.

Das variáveis testadas, o pH foi o fator mais associado à falência da VMNI.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente ao meu orientador Professor Doutor Jorge Pimentel por

desde o início ter incentivado a realização deste projeto. À minha co-orientadora Dra. Ana

Marques por todo o apoio prestado e por ser sempre incansável face às minhas dúvidas.

Aos meus amigos, Gonçalo, Joana, Ana, Rafaela, Chris, e Adriana por todos os

momentos em que desanimei e estiveram lá para não me deixar desistir.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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chronic Obstr lung Dis. 2017;22(4):1–30.

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