ventilação mecânica

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www.pneumoatual.com.br ISSN 1519-521X Ventilação Mecânica Autores Bruno do Valle Pinheiro 1 Marcelo Alcantara Holanda 2 Publicação: Jun-2000 Revisão: Nov-2004 1 - Quais os objetivos da ventilação mecânica? Os principais objetivos clínicos da ventilação mecânica são: reverter a hipoxemia; reverter a hipercapnia e a acidose respiratória; reverter ou prevenir atelectasias em pacientes com respirações superficiais (ex: pós- operatório, doenças neuromusculares); permitir sedação e/ou curarização para realização de cirurgias ou outros procedimentos; reduzir o consumo de oxigênio em condições graves de baixa perfusão. Nas formas graves de choque circulatório, mesmo na ausência de indicação gasométrica, a ventilação mecânica, diminuindo o consumo de oxigênio pelos músculos respiratórios, pode favorecer a perfusão de outros órgãos (sobretudo coração, sistema nervoso central e território esplâncnico); estabilização torácica em pacientes com múltiplas fraturas de arcos costais. 2 - Quais os critérios de indicação do início da ventilação mecânica na insuficiência respiratória aguda? A indicação da intubação traqueal para ventilação mecânica deve ser baseada em critérios clínicos, embora alguns parâmetros gasométricos auxiliem nesta decisão. Os critérios gasométricos mais amplamente difundidos como indicadores de intubação traqueal são: PaO 2 <60 mmHg (ou SaO 2 <90%), mesmo após oferta de oxigênio sob máscara; PaCO 2 >55 mmHg (exceto em pacientes cronicamente retentores de gás carbônico), sobretudo quando determina acidose respiratória (pH menor que 7,30 a 7,25). Os critérios gasométricos devem ser encarados apenas como diretrizes gerais. Muitas vezes, pacientes com valores ainda aceitáveis de gases arteriais, mas clinicamente desconfortáveis e, principalmente, sem perspectiva de melhora no curto prazo, devem ser prontamente intubados. Deve-se lembrar que a intubação traqueal pode ser um procedimento de difícil execução e sua realização ainda com um certo grau de reserva funcional do paciente é desejada. O contrário também pode ocorrer, ou seja, um paciente já com indicação gasométrica para intubação, mas com perspectivas de melhora da condição que está causando a insuficiência respiratória aguda (IRpA) em um curto espaço de tempo, pode ter o procedimento protelado, desde que sob rigorosa vigilância clínica e da saturação da hemoglobina pelo oxigênio. Entre as condições clínicas que indicam intubação em paciente com IRpA, independentemente dos achados da gasometria arterial, destacam-se: nível de consciência rebaixado, impedindo o controle adequado do paciente sobre a patência de suas vias aéreas superiores; falência cárdio-circulatória concomitante: choque circulatório, sinais de isquemia miocárdica, arritmias graves; paciente com grande trabalho respiratório, com taquipnéia persistente e utilização da musculatura acessória da respiração, para manter valores limítrofes na gasometria arterial. 1 Médico da Unidade de Terapia Intensiva do Hospital Universitário da Universidade Federal de Juiz de Fora; Doutor em Pneumologia pela UNIFESP - Escola Paulista de Medicina. 2 Professor de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará.

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www.pneumoatual.com.br ISSN 1519-521X

Ventilação Mecânica

Autores Bruno do Valle Pinheiro1

Marcelo Alcantara Holanda2 Publicação: Jun-2000

Revisão: Nov-2004 1 - Quais os objetivos da ventilação mecânica? Os principais objetivos clínicos da ventilação mecânica são:

• reverter a hipoxemia; • reverter a hipercapnia e a acidose respiratória; • reverter ou prevenir atelectasias em pacientes com respirações superficiais (ex: pós-

operatório, doenças neuromusculares); • permitir sedação e/ou curarização para realização de cirurgias ou outros

procedimentos; • reduzir o consumo de oxigênio em condições graves de baixa perfusão. Nas formas

graves de choque circulatório, mesmo na ausência de indicação gasométrica, a ventilação mecânica, diminuindo o consumo de oxigênio pelos músculos respiratórios, pode favorecer a perfusão de outros órgãos (sobretudo coração, sistema nervoso central e território esplâncnico);

• estabilização torácica em pacientes com múltiplas fraturas de arcos costais. 2 - Quais os critérios de indicação do início da ventilação mecânica na insuficiência respiratória aguda? A indicação da intubação traqueal para ventilação mecânica deve ser baseada em critérios clínicos, embora alguns parâmetros gasométricos auxiliem nesta decisão. Os critérios gasométricos mais amplamente difundidos como indicadores de intubação traqueal são:

• PaO2<60 mmHg (ou SaO2<90%), mesmo após oferta de oxigênio sob máscara; • PaCO2>55 mmHg (exceto em pacientes cronicamente retentores de gás carbônico),

sobretudo quando determina acidose respiratória (pH menor que 7,30 a 7,25). Os critérios gasométricos devem ser encarados apenas como diretrizes gerais. Muitas vezes, pacientes com valores ainda aceitáveis de gases arteriais, mas clinicamente desconfortáveis e, principalmente, sem perspectiva de melhora no curto prazo, devem ser prontamente intubados. Deve-se lembrar que a intubação traqueal pode ser um procedimento de difícil execução e sua realização ainda com um certo grau de reserva funcional do paciente é desejada. O contrário também pode ocorrer, ou seja, um paciente já com indicação gasométrica para intubação, mas com perspectivas de melhora da condição que está causando a insuficiência respiratória aguda (IRpA) em um curto espaço de tempo, pode ter o procedimento protelado, desde que sob rigorosa vigilância clínica e da saturação da hemoglobina pelo oxigênio. Entre as condições clínicas que indicam intubação em paciente com IRpA, independentemente dos achados da gasometria arterial, destacam-se:

• nível de consciência rebaixado, impedindo o controle adequado do paciente sobre a patência de suas vias aéreas superiores;

• falência cárdio-circulatória concomitante: choque circulatório, sinais de isquemia miocárdica, arritmias graves;

• paciente com grande trabalho respiratório, com taquipnéia persistente e utilização da musculatura acessória da respiração, para manter valores limítrofes na gasometria arterial.

1 Médico da Unidade de Terapia Intensiva do Hospital Universitário da Universidade Federal de Juiz de Fora; Doutor em Pneumologia pela UNIFESP - Escola Paulista de Medicina. 2 Professor de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará.

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Deve-se considerar ainda que o suporte ventilatório não-invasivo pode substituir a ventilação mecânica em muitas de suas indicações. Assim, atualmente, muitas vezes a intubação traqueal ocorre após falha da ventilação não-invasiva ou por contra-indicação de seu uso. 3 - Como ocorre a ventilação mecânica com pressão positiva? Na ventilação mecânica com pressão positiva, o ar é bombeado para o sistema respiratório pelo ventilador, pelo fluxo que é por ele gerado e que progride em direção ao parênquima pulmonar vencendo a impedância do sistema respiratório, ou seja, sua resistência e sua complacência. Nesse contexto, há elevação das pressões alveolar e pleural para valores acima da pressão atmosférica (pressão positiva), com estiramento do parênquima pulmonar rico em fibras elásticas. A expiração se faz de modo passivo, como na respiração espontânea normal. Para tanto o ventilador apenas interrompe o fluxo de ar, findando a inspiração, e possibilita sua saída abrindo a válvula de exalação. A pressão positiva alveolar (supra-atmosférica) e a retração elástica dos pulmões insuflados empurram o ar para o ambiente externo. 4 - Como pode ser dividido, didaticamente, o ciclo respiratório na ventilação mecânica? Didaticamente há quatro fases distintas do ciclo respiratório:

• Fase 1 • o início da inspiração, denominado "disparo" do ventilador; • o disparo pode ser feito pelo próprio ventilador, a partir da freqüência

respiratória ajustada, ou pelo paciente, quando se ajusta uma sensibilidade no ventilador e ela é deflagrada pelo esforço do paciente.

• Fase 2 • a inspiração; • é a fase de fornecimento de fluxo inspiratório pelo ventilador; • ao final do fornecimento do fluxo inspiratório, mas antes do início da expiração,

algumas modalidades permitem o ajuste de pausa inspiratória, durante a qual o ar permanece aprisionado dentro do sistema respiratório (pulmões, vias aéreas, cânula traqueal e circuitos).

• Fase 3 • transição da inspiração para a expiração, denominada "ciclagem" do ventilador; • diferentes comandos podem determinar a ciclagem do ventilador,

caracterizando diferentes modalidades. Os principais comandos de ciclagem são: volume corrente, pressão inspiratória, tempo inspiratório e fluxo inspiratório.

• Fase 4 • a expiração, caracterizada pela abertura da válvula de exalação, permitindo a

saída de ar passivamente. Os diferentes tipos de interação entre o paciente e o ventilador nas fases do ciclo respiratório é que caracterizam os diferentes modos ventilatórios. 5 - Quais são os critérios para se classificar um ciclo ventilatório? Os ciclos ventilatórios podem ser classificados a partir de dois critérios:

• o tipo de ciclo respiratório ofertado pelo ventilador; • o tipo de controle do ventilador sobre os ciclos.

6 - Como são classificados os ciclos ventilatórios ofertados pelo ventilador? São três os diferentes tipos de ciclos ofertados pelo respirador: Controlado Ciclo em que a inspiração é iniciada, controlada e finalizada pelo ventilador. Assim, para um ciclo ser controlado, o momento do disparo e a oferta do fluxo de ar na inspiração são determinados por ajustes no ventilador. Assistido Ciclo em que a inspiração é iniciada, isto é, disparada pelo paciente. A partir do disparo, o ventilador então prossegue com a inspiração e mantém o controle da fase inspiratória até seu final. Por exemplo, o ventilador mantém o fluxo e o volume corrente programados na ventilação ciclada a volume. A diferença essencial do ciclo assistido em relação ao controlado está no

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disparo. Para tanto é necessário que haja esforço muscular respiratório capaz de despressurizar a via aérea e um mecanismo do ventilador pronto a reconhecer este esforço. O ajuste do ventilador que detecta a "queda" de pressão na via aérea correspondente ao esforço do paciente é a sensibilidade. Espontâneo Ciclo em que o paciente respira normalmente acoplado ao circuito do ventilador, com o controle de toda fase inspiratória e não só do disparo. No ciclo espontâneo o paciente determina o disparo, o fluxo, o volume e a duração do tempo inspiratório. Na maior parte das vezes o ventilador mantém apenas uma pressão de via aérea positiva na inspiração e na expiração. 7 - Com base nos ciclos permitidos, quais são as modalidades ventilatórias básicas? São quatro os modos ventilatórios básicos, definidos a partir do(s) tipo(s) de ciclo(s) que eles permitem ao paciente:

• modo controlado – somente ciclos controlados são possíveis; • modo assistido-controlado – tanto ciclos assistidos como controlados são

disponibilizados ao paciente; • ventilação mandatória intermitente sincronizada (SIMV) – podem ocorrer os três tipos

de ciclos: controlados, assistidos e espontâneos; • pressão positiva contínua nas vias aéreas (CPAP) – somente ciclos espontâneos

ocorrem. Cada modo, além de suas características de funcionamento, tem suas indicações, vantagens e desvantagens. 8 - Quais são as características do modo ventilatório controlado? O modo controlado, em sua forma "pura", pressupõe que o ventilador permite apenas ciclos controlados, ou seja, não há ajuste de sensibilidade ligado. A freqüência respiratória (FR) é necessariamente determinada pelos ajustes do ventilador, sendo, portanto, fixa. O disparo ocorre de acordo com a FR programada, chamado disparo a tempo. Por exemplo, se programarmos o ventilador para mandar ciclos controlados com FR respiratória de 10 irpm, a cada seis segundos será ofertado um ciclo controlado; se a FR for ajustada em 15, a cada quatro segundos haverá um novo ciclo. Isso ocorre de forma independente de possíveis esforços inspiratórios ou expiratórios do paciente, o que acarreta, em geral, desconforto e assincronia paciente-ventilador quando eles estão presentes. 9 - Quais as indicações para a ventilação mecânica controlada? O modo controlado está indicado na rara situação em que se pretende manter o volume minuto fixo, com os tempos inspiratório e expiratório constantes. Ocorre, na prática, quando o paciente é curarizado ou mantido em um nível muito profundo de sedação, impossibilitado de disparar os ciclos respiratórios, em pacientes com paralisia muscular respiratória completa ou sem comando neural respiratório ("drive"). Atualmente é raramente utilizado. 10 - Quais são as características do modo ventilatório assistido-controlado? Neste modo o ventilador está programado para permitir que o paciente dispare, ou seja, inicie ciclos respiratórios pelo ajuste da sensibilidade. Ao mesmo tempo, ajusta-se um valor mínimo de freqüência respiratória (FR), que será fornecida ao paciente caso ele não dispare o ventilador. Assim, tomemos como exemplo os seguintes ajustes: FR de 10 irpm e sensibilidade de 1 cmH2O. Sempre que o paciente reduzir a pressão na via aérea em 1 cmH2O abaixo da pressão basal (geralmente a PEEP), é deflagrado um novo ciclo respiratório. Logo a FR não é totalmente fixa, o paciente pode receber mais de dez ciclos respiratórios por minuto. O que ele não pode é receber menos de dez, porque mesmo que faça um longo período de apnéia o ventilador está programado para enviar um ciclo após seis segundos do último, garantindo a FR mínima programada. 11 - Quando usar a ventilação mecânica assistido-controlada? A modalidade assistido-controlada é a mais utilizada. Ela é a preferida para iniciar a ventilação mecânica e pode ser mantida durante todo o suporte ventilatório. Mesmo em situações nas quais não se espera disparo do ventilador pelo paciente, a modalidade assistido-controlada

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pode ser usada. Nesses casos, estabelece-se uma freqüência respiratória (FR) suficiente para a demanda ventilatória do paciente e mantém-se a sensibilidade ajustada. Caso o paciente venha a apresentar, eventualmente, algum esforço, ele poderá disparar o aparelho, evitando assim o desconforto da ventilação controlada. Com o ajuste de uma FR adequada às necessidades do paciente, a ventilação assistido-controlada mantém a mesma garantia em relação à oferta do volume minuto que a ventilação controlada, com a vantagem de permitir maior sincronia entre o paciente e o ventilador. Essa característica praticamente decretou o fim da utilização do modo controlado "puro". Problemas de interação entre o paciente e o ventilador podem ocorrer na modalidade assistido-controlada quando o controle da fase inspiratória não está adequado à demanda ventilatória do paciente. Por exemplo, fluxos e volumes pequenos podem ser insuficientes para pacientes com "drive" respiratório aumentado. Além disso, ela pode induzir alcalose respiratória facilmente em pacientes com "drive" aumentado, pois haverá taquipnéia, com aumento do volume minuto e, conseqüentemente, da ventilação alveolar. 12 - Como se distribuem os tempos inspiratório e expiratório nas modalidades controlada e assistido-controlada? Para a compreensão da ventilação mecânica é sempre importante entender o comportamento dos tempos inspiratório (Ti) e expiratório (Te) e da relação entre eles, relação inspiração-expiração (RIE). O Ti é decorrente apenas dos ajustes do volume corrente, com o qual tem relação direta, e do fluxo inspiratório, com o qual tem relação inversa. Assim, quanto maior o volume corrente, maior o Ti e quanto maior o fluxo inspiratório, menor o Ti. Ele é, portanto, definido pelo operador tanto na ventilação controlada quanto na assistido-controlada. O tempo total (Ttot) de um ciclo respiratório (Ti + Te) é resultado da FR (ex: quando a FR é de 10 irpm, o Ttot é de 6 s, quando a FR é de 15 irpm, ele é de 4 s). Como Ti é fixo, o Te passa a depender diretamente do Ttot, ou seja, da FR. Assim, o Te é constante na ventilação controlada e variável na assistido-controlada, na qual o paciente pode aumentar a FR, reduzindo o Te. A tabela 1 resume esses comportamentos.

Tabela 1. Comportamento dos tempos inspiratório e expiratório nas modalidades controlada e assistido-controlada

Controlada Assistido-controlada T. inspiratório fixo fixo T. expiratório fixo variável Relação insp./exp. fixa variável 13 - Quais são as características da ventilação mandatória intermitente sincronizada (SIMV)? Na SIMV o ventilador controla somente os ciclos programados e permite que qualquer ciclo adicional disparado pelo paciente seja espontâneo. Assim, se programarmos uma freqüência respiratória de 6 irpm neste modo, estaremos obrigando o ventilador a enviar exatamente um ciclo a cada dez segundos. Para que os ciclos sejam sincronizados com o esforço do paciente, o ventilador divide um minuto em seis intervalos de dez segundos. Em cada um desses intervalos o ventilador mandará um ciclo, que pode ser assistido ou controlado. Esse ciclo será assistido se o paciente realizar qualquer esforço inspiratório capaz de atingir a sensibilidade, ou controlado se ao final dos dez segundos o paciente não realizar esforço inspiratório. Qualquer esforço extra do paciente que ocorra dentro do intervalo de 10 segundos resultará em ciclo espontâneo, isto é, com fluxo e volume corrente livres. Assim, no modo SIMV podem coexistir ciclos controlados, assistidos e espontâneos. 14 - Quando usar a ventilação mandatória intermitente sincronizada (SIMV)? O modo SIMV é comumente usado para melhorar a interação paciente-ventilador, em uma fase na evolução da insuficiência respiratória em que o paciente já pode receber assistência ventilatória parcial. Quanto menor a freqüência respiratória programada, maior a quantidade de ciclos espontâneos; quanto maior, mais ele se assemelha ao modo assistido-controlado. É importante ressaltar que, nos ciclos assistidos ou controlados, persistem os mesmos problemas citados nas modalidades assistido-controlada e controlada.

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A SIMV é geralmente utilizada na preparação para o desmame ou na sua realização propriamente dita. Tem a vantagem de possibilitar a aplicação da pressão de suporte (PS) nos ciclos espontâneos, sendo, neste caso, a denominação mais adequada do modo ventilatório SIMV+PS. Hoje em dia, é raro o uso isolado da SIMV, sem pressão de suporte, pois o trabalho respiratório a ser executado pelo paciente nos ciclos espontâneos seria muito elevado, sob o risco de ocorrência de desconforto ou, em casos extremos, fadiga respiratória. Nos ciclos espontâneos da SIMV, mesmo com a associação da pressão de suporte, não há garantia do volume corrente, caracterizando um suporte ventilatório parcial. Por isso, a SIMV+PS deve ser aplicada em pacientes estáveis ou em fase de melhora da mecânica respiratória e da condição clínica. O volume corrente e a freqüência respiratória devem ser obrigatoriamente monitorados. 15 - Quais são as características da ventilação com pressão positiva contínua das vias aéreas (CPAP)? Na ventilação com CPAP o respirador está programado para somente permitir ciclos espontâneos, mantendo a pressão de vias aéreas positiva. Todos os ciclos terão redução da pressão de via aérea na inspiração e aumento na expiração, à semelhança da respiração normal, com a diferença apenas em relação ao nível de pressão, mantida acima da atmosférica, e quanto ao fato do paciente respirar acoplado ao ventilador e aos seus circuitos e válvulas. Assim, se ventilamos um paciente no modo CPAP com pressão programada de 10 cmH2O, sabemos que não haverá ciclos assistidos ou controlados, a freqüência respiratória programada será "zero". A pressão de via aérea oscilará em valores abaixo de 10 cmH2O na inspiração e pouco acima disso na expiração. O volume corrente, o fluxo inspiratório e os tempos inspiratório e expiratório serão controlados pelo paciente. 16 - Quando utilizar a ventilação com pressão positiva contínua das vias aéreas (CPAP)? A ventilação com CPAP é quase sempre utilizada como forma de facilitar o desmame. Ela permite, como na SIMV, o uso da pressão de suporte para auxiliar a inspiração, caracterizando a ventilação em CPAP+PS. Constitui o modo de ventilação que mais autonomia confere ao paciente, devendo ser usada apenas naqueles com "drive" respiratório preservado, de preferência sem sedação, despertos. A ventilação no modo CPAP requer monitoração do volume corrente e da freqüência respiratória, requer que os alarmes de apnéia e a ventilação de "back up", a ser usada em casos de apnéia, estejam bem ajustados. 17 - Quais são as formas de ciclagem mais comuns em ventilação mecânica? A ciclagem da ventilação mecânica pode ser determinada pelos seguintes fatores:

• volume corrente: na ventilação ciclada a volume ou volume-controlada; • tempo inspiratório: na ventilação pressão-controlada, que é ciclada a tempo; • fluxo inspiratório: na ventilação com pressão de suporte.

Observa-se que a ciclagem do ventilador confere uma característica específica da ventilação, nem sempre relacionada à modalidade básica. Por exemplo, os modos ventilatórios controlado e assistido-controlado podem ser ciclados a volume (volume-controlados) ou a tempo (pressão-controlada). Já a pressão de suporte, habitualmente, é ciclada a fluxo. Na modalidade SIMV, os ciclos assistidos e, quando presentes, os controlados, também podem ser ciclados a volume ou a tempo. Vale comentar que alguns ventiladores disponibilizam outros modos de controle além dos citados acima. O ventilador Bird Mark 7 , modelo mais antigo, apresenta um modo de controle ciclado a pressão, diferente da pressão-controlada que é ciclada a tempo. O fluxo é constante e pré-determinado, mas o tempo inspiratório e o volume corrente podem variar conforme seja alcançado mais rápida ou lentamente o pico de pressão ajustado para a ciclagem. Ventiladores mais modernos possibilitam a combinação de diferentes modos de controle. Suas características são mais complexas e suas vantagens clínicas não totalmente estabelecidas. 18 - Quais os ajustes iniciais da ventilação mecânica assistido-controlada ciclada a volume? Na grande maioria das vezes, a modalidade inicial da ventilação mecânica é a assistido-controlada ciclada a volume. É claro que os ajustes da ventilação mecânica dependem

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fundamentalmente de suas indicações e das condições clínicas do paciente. Entretanto, imediatamente após a intubação traqueal, o paciente deverá ser conectado ao ventilador e, até que se tenham dados clínicos e gasométricos que orientarão os parâmetros ventilatórios, sugerimos os seguintes ajustes em um indivíduo adulto:

• fração inspirada de oxigênio: 100% • freqüência respiratória: 12-16 respirações por minuto • volume corrente: 8-10 ml/kg • fluxo inspiratório: 50-60 L/min • PEEP: 5 cmH2O • sensibilidade: 1 cmH2O

Após esses ajustes iniciais, deve-se observar o paciente por dados clínicos, gasométricos e de monitoração da mecânica respiratória. Com isso, novos ajustes podem ser necessários para a otimização da ventilação mecânica. 19 - Como ajustar a fração inspirada de oxigênio (FIO2) no decorrer da ventilação assistido-controlada? A FIO2 é a proporção de oxigênio no ar fornecido ao paciente pelo respirador. Após iniciada a ventilação com FIO2 de 100%, ela deve ser reduzida progressivamente enquanto o paciente mantiver sua saturação da hemoglobina pelo oxigênio (SaO2) ao redor de 95%. Ao contrário, aumento na FIO2, exceto em situações de grande shunt pulmonar, melhora a oxigenação, sendo este o ajuste a ser feito para reversão imediata da hipoxemia. Há indícios de que grandes FIO2 podem ser lesivas para os pulmões, devendo, pois, serem evitadas quando desnecessárias, ou quando outras alternativas para melhorar a oxigenação, como elevação da PEEP, são possíveis. 20 - Como ajustar a freqüência respiratória (FR) no decorrer da ventilação assistido-controlada? A FR ajustada no ventilador será a mínima oferecida ao paciente. Ciclos adicionais ocorrerão caso o paciente dispare o aparelho. Em geral, ajustam-se valores ao redor de 12 respirações por minuto, permitindo-se ciclos extras desde que o paciente mantenha-se confortável, com a freqüência total podendo atingir valores em torno de 30 respirações por minuto. Portanto, não se tem controle completo sobre a FR, devendo o operador estar atento à FR total e não à ajustada. A FR total determina a duração dos ciclos respiratórios, os quais serão menores quanto maior a FR. Como a duração do tempo inspiratório é fixa, estabelecida em função dos ajustes do fluxo e do volume corrente, toda vez que o paciente aumenta a FR ele está reduzindo o tempo expiratório, o que pode ser prejudicial quando há obstrução brônquica, com dificuldade de esvaziamento do volume pulmonar. Conclui-se, então, que o controle da FR nas doenças obstrutivas deve ser rigoroso e ela deve ser mantida em valores, em geral, inferiores a 12 respirações por minuto, sob pena de haver hiperinsuflação pulmonar, que é responsável por complicações importantes na ventilação mecânica desses pacientes. 21 - Como ajustar o volume corrente (VT) no decorrer da ventilação assistido-controlada? Em pacientes que não apresentam obstrução das vias aéreas ou doença parenquimatosa extensa (ex: pacientes em pós-operatório, doenças neurológicas ou neuromusculares), o volume corrente pode ser ajustado pelo nível de gás carbônico na gasometria arterial, pelo conforto do paciente e por sua demanda metabólica. Nesses casos, volumes em torno de 10 ml/kg geralmente são adequados. Entretanto, em doentes com obstrução brônquica, esses volumes podem determinar hiperinsuflação pulmonar e suas complicações, devendo ser evitados. Volumes menores (entre 6 e 8 ml/kg) são preferidos. Em pacientes com extenso envolvimento do parênquima pulmonar (lesão pulmonar aguda e síndrome do desconforto respiratório agudo - SDRA), esses volumes podem ser distribuídos para uma pequena porção do pulmão não doente, levando a hiperdistensão e lesão dessas áreas. Aqui também volumes menores são utilizados, iniciando-se com 6 a 8 ml/kg, reduzindo progressivamente, se necessário, para manter a pressão de platô abaixo de 35 cmH2O (alguns

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autores chegam a sugerir 30cmH2O). Maiores detalhes sobre essa abordagem ventilatória encontram-se no tema sobre SDRA. 22 - Como ajustar o volume corrente (VT) no decorrer da ventilação assistido-controlada conforme o valor da PaCO2 na gasometria? Os parâmetros correlacionados com a ventilação alveolar são a freqüência respiratória (FR) e o volume corrente (VT). A ventilação adequada é caracterizada pelos valores normais de PaCO2, entre 35 e 45 mmHg. A PaCO2 acima de 45 mmHg indica hipoventilação e pode ser corrigida por aumentos na freqüência respiratória ou no volume corrente. Os ajustes podem ser tentados a partir de uma fórmula simples, conforme ilustrado no exemplo a seguir.

Ex: parâmetros atuais PaCO2 = 55 mmHg FR = 15 irpm VT = 350 ml PaCO2 desejada = 40 mmHg Pela fórmula, o ajuste pode ser feito na FR e/ou no VT. Considerando-se que a FR de 15 é adequada e deve ser mantida, o VT necessário será obtido pela fórmula.

VT necessário = 480 ml A mesma fórmula pode ser usada quando se tem hiperventilação, evidenciada pela PaCO2 baixa. Entretanto, se a causa da hiperventilação for a taquipnéia por ciclos desencadeados pelo paciente, reduções na FR ou no VT não serão efetivas. Nesse caso, caberá ao operador detectar o motivo pelo qual o paciente está taquipneico e corrigi-lo. 23 - Como conduzir a hipoventilação quando reduções no volume corrente são necessárias? Nos pacientes com doença obstrutiva e naqueles com SDRA, os níveis baixos de volume corrente podem induzir à retenção de gás carbônico, que pode ser tolerada sem efeitos deletérios significativos (hipercapnia permissiva). Nesses casos, embora não haja consenso, quando o pH cai para níveis inferiores a 7,20, repomos bicarbonato de sódio (infusão de 1mEq/kg de bicarbonato, ou seja 1ml/kg de bicarbonato de sódio a 8,4%, em uma hora), repetindo a gasometria para verificar se níveis acima de 7,20 foram alcançados; caso contrário, repete-se a infusão de bicarbonato. A hipoventilação e, como conseqüência, a hipercapnia e a acidose respiratória, determinam desconforto ao paciente, havendo necessidade de sedação e, mais raramente, de curarização. À medida que o paciente melhora sua condição, seja de resistência das vias aéreas nas doenças obstrutivas, seja de complacência pulmonar na SDRA, volumes progressivamente maiores podem ser empregados, permitindo o retorno de uma ventilação mais "fisiológica" e confortável ao paciente. 24 - Como ajustar o fluxo inspiratório no decorrer da ventilação assistido-controlada? O fluxo inspiratório é, talvez, o parâmetro mais difícil de ser ajustado. Sua escolha, além de ser baseada em alguns parâmetros subjetivos, muitas vezes dependerá basicamente de tentativas e observações de erros e acertos. Os seguintes fatores devem ser considerados para o ajuste do fluxo inspiratório:

• o tempo inspiratório desejado para determinada condição de freqüência respiratória e volume corrente;

• o pico de pressão nas vias aéreas; • a demanda metabólica e o conforto do paciente.

Sendo assim, para uma dada condição de freqüência respiratória e volume corrente, quanto maior o fluxo, menor será o tempo inspiratório e maior o expiratório. Esse ajuste é importante na vigência de obstrução das vias aéreas, como na asma e na DPOC, nas quais um tempo expiratório prolongado é necessário para evitar hiperinsuflação pulmonar. Entretanto, quanto maior o fluxo, maior a pressão gerada nas vias aéreas, sobretudo em condições de grandes volumes correntes ou de obstrução, o que pode limitar a utilização de altos fluxos nos pacientes obstrutivos.

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Durante os ciclos assistidos, fluxos inspiratórios maiores podem ser necessários para alcançar a demanda metabólica dos pacientes (fluxos entre 60 e 80 L/min). Devemos suspeitar dessa necessidade em pacientes "brigando" com o respirador, observando se há melhora na interação entre eles após o aumento do fluxo. 25 - Como escolher o padrão do fluxo inspiratório (forma da onda de fluxo) no decorrer da ventilação assistido-controlada? Além do valor do fluxo inspiratório, na ventilação assistido-controlada ciclada a volume, o operador pode escolher a forma da onda de fluxo. Embora várias opções existam, na verdade dois tipos são mais comumente usados e merecem ser descritos: o fluxo quadrado e o fluxo desacelerado. No quadrado, o valor de fluxo escolhido é mantido durante toda a inspiração, enquanto no desacelerado o fluxo inicia-se em seu valor maior (pico de fluxo) e vai diminuindo progressivamente enquanto o volume corrente é ofertado. Discute-se se há vantagens do fluxo desacelerado sobre o quadrado, talvez com uma melhor distribuição da ventilação e com a geração de menores pressões nas vias aéreas. A relevância clínica dessas possíveis vantagens é incerta. Deve-se ter em mente que quando se muda o fluxo quadrado para desacelerado, mantendo-se o mesmo valor de pico de fluxo, o tempo inspiratório será prolongado. Ao se fazer a mudança, para se manter o mesmo tempo inspiratório com o mesmo volume corrente, será necessário aumentar o pico de fluxo. Alguns ventiladores já fazem automaticamente essa elevação, mas outros não. 26 - Como ajustar a sensibilidade no decorrer da ventilação assistido-controlada? A sensibilidade é o parâmetro que permite o paciente disparar o respirador, gerando os ciclos assistidos. Na maior parte dos respiradores ela é ajustada sob a forma de pressão, ou seja, estabelece-se uma pressão negativa que o paciente precisa gerar no circuito, através de seu esforço inspiratório, para deflagrar o ciclo. Uma segunda forma de sensibilidade que vem sendo disponibilizada em alguns respiradores é a por fluxo. Nesse caso estabelece-se um valor de fluxo que, se gerado no circuito pelo esforço do paciente, deflagra o aparelho. Alguns autores acreditam que a sensibilidade por fluxo é mais facilmente deflagrada, exigindo um menor trabalho respiratório por parte do paciente. O significado clínico dessas diferenças ainda não foi comprovado de modo convincente. O valor da sensibilidade deve ser sempre ajustado em níveis baixos, ou seja, deve-se tornar fácil o disparo do respirador pelo paciente (veja quadro abaixo).

Modo de disparo Ajuste Pressão -1 a -1,5 cmH2O

Fluxo 1 a 3 L/min No ajuste da sensibilidade, dois cuidados importantes devem ser observados:

• valores baixos de sensibilidade podem gerar autociclagem, ou seja, disparo do aparelho sem o esforço do paciente, por movimentos no circuito.

• Quando o paciente estiver "brigando" com o respirador, gerando altas freqüências respiratórias, o valor da sensibilidade não deve ser elevado para evitar os disparos. Fazendo isso, o paciente continuará "brigando" com o respirador, só que agora sem conseguir dispará-lo.

27 - Como ajustar a PEEP (pressão expiratória final positiva, do inglês positive end expiratory pressure)? O paciente deve ser ventilado com uma PEEP mínima (entre 3 e 5 cmH20), visando manter a capacidade residual funcional (volume de ar que permanece dentro dos pulmões após uma expiração normal). Nos pacientes com insuficiência respiratória por doenças que acometem o parênquima pulmonar (ex: pneumonia, edema agudo de pulmão), elevações progressivas da PEEP podem ser necessárias para melhorar a oxigenação e permitir a utilização de menores FIO2. Nesses pacientes, elevamos a PEEP de 2 em 2 cmH2O, com o objetivo de reduzir a FIO2. À medida que elevamos a PEEP, devemos monitorar o débito cardíaco do paciente ou, pelo menos, parâmetros clínicos que o avaliam indiretamente (pressão arterial e débito urinário), pois níveis altos de PEEP podem induzir à queda do débito cardíaco, sobretudo em pacientes hipovolêmicos. Na impossibilidade de manter o paciente hemodinamicamente estável

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(podemos após a reposição volêmica, lançar mão de drogas vasopressoras), reduzimos a PEEP e elevamos a FIO2. A PEEP tem papel fundamental na estratégia ventilatória de pacientes com SDRA. Diferentes estratégias para seu ajuste são descritas. O uso da PEEP na SDRA é discutido no capítulo específico sobre essa síndrome na seção temas em pneumologia. 28 - O que é a pausa inspiratória? Qual o seu papel na ventilação assistido-controlada ciclada a volume? A pausa inspiratória é um intervalo de tempo, ajustado pelo operador, durante o qual não há fluxo, nem inspiratório e nem expiratório, e o volume corrente que foi ofertado ao paciente é mantido no interior dos pulmões. A pausa inspiratória é fundamental na medida da mecânica respiratória, pois é ao final dela que se mede a pressão de platô, usada no cálculo da complacência e da resistência do sistema respiratório. A pausa pode ainda ser usada como medida de prolongamento do tempo inspiratório e, assim, de melhora da oxigenação. Com a utilização de grandes valores de PEEP, esse segundo papel da pausa inspiratória tem sido pouco aplicado. Alguns autores sugerem que durante a pausa inspiratória ocorre uma pequena redistribuição da ventilação entre os alvéolos, ou seja, há uma movimentação de ar dos alvéolos que tornaram-se mais distendidos, alcançando maiores pressões, para os que foram menos distendidos, melhorando a ventilação alveolar final. 29 - Qual a definição e como funciona a ventilação com pressão de suporte (PSV, do inglês pressure support ventilation)? A ventilação com pressão de suporte é uma modalidade ventilatória parcial que auxilia os ciclos espontâneos do paciente por meio de uma pressão positiva pré-determinada e constante durante a inspiração. Essa pressão positiva é gerada por um fluxo inspiratório fornecido pelo ventilador. Para executar essa função, o ventilador, ao ser disparado pelo esforço do paciente, eleva a pressão no circuito do ventilador para um nível pré-determinado pelo operador, fornecendo para isso um fluxo de gás adicional. O nível de pressão é mantido constante durante toda a inspiração por um auto-ajuste contínuo do fluxo, que se desacelera na proporção em que a pressão no parênquima pulmonar insuflado eleva-se progressivamente. O final da inspiração ocorre quando o fluxo inspiratório, ao se reduzir, atinge um valor crítico, pré-determinado para cada ventilador (em geral 25% do pico de fluxo). Nesse momento o fluxo inspiratório é interrompido e a válvula expiratória é aberta, iniciando a expiração (ciclagem a fluxo). 30 - Quais as características do ciclo respiratório na pressão de suporte? O ciclo na pressão de suporte tem as seguintes características: Disparo

• Todos os ciclos são iniciados por esforços do paciente, detectados pelo ventilador através do ajuste de sensibilidade, que pode ser a pressão ou a fluxo, conforme as características do ventilador.

Fase inspiratória • Após disparado pelo paciente, o ventilador fornece um fluxo de ar suficiente para elevar

a pressão no sistema respiratório para o nível de pressão de suporte ajustado. A magnitude deste fluxo depende do nível de pressão de suporte, do esforço do paciente, das condições de resistência e complacência do sistema respiratório, além de características próprias do ventilador. Na medida em que o volume corrente é ofertado, a pressão no interior dos alvéolos eleva-se, fazendo com que o fluxo necessário para se manter a pressão no sistema respiratório no nível ajustado seja menor. Portanto, o fluxo inspiratório é sempre desacelerado na pressão de suporte.

Ciclagem • O fim da fase inspiratória ocorre quando o fluxo inspiratório desacelera-se até um valor

pré-estabelecido pelo ventilador, em geral 25% do pico de fluxo no início da ventilação. Assim, a ciclagem, ou seja, a passagem da fase inspiratória para expiratória, ocorre por fluxo.

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Fase expiratória • Abre-se a válvula de exalação do respirador e, passivamente, o ar é expirado. O fluxo

expiratório ocorre pela maior pressão no interior dos alvéolos do que na atmosfera e pelo recolhimento elástico do parênquima pulmonar.

31 - Como ajustar a pressão de suporte? Durante a ventilação com pressão de suporte os parâmetros ajustados são: modalidade (ajustar uma modalidade que permita ciclos espontâneos, ou seja, SIMV ou CPAP); sensibilidade; fração inspirada de oxigênio e valor da pressão de suporte. Os demais parâmetros são conseqüência da interação dos ajustes com as características do paciente. Sendo assim, o volume corrente, o fluxo inspiratório, o tempo inspiratório e a freqüência respiratória são variáveis. A pressão de suporte deve ser ajustada no nível que determine um volume corrente entre 8 e 10 ml/kg e que mantenha o paciente confortável, com freqüência respiratória menor que 30 respirações por minuto. 32 - Quais as aplicações da ventilação com pressão de suporte (PSV)? Compensar a sobrecarga ventilatória imposta pela conexão do paciente ao ventilador Um dos principais efeitos fisiológicos da PSV é compensar parcial ou totalmente o trabalho respiratório adicional imposto pela prótese respiratória, válvulas de demanda e componentes do circuito do ventilador. Por isso, sempre que se tem ciclos espontâneos, como nos modos CPAP e SIMV, eles devem ser auxiliados por uma pressão de suporte. A maior parte dos autores recomenda valores em torno de 7 cmH2O como a pressão de suporte mínima, tanto que quando o paciente encontra-se confortável com esses níveis de pressão de suporte, desde que outros parâmetros também estejam controlados, a extubação é possível. Alternativa de suporte ventilatório à ventilação assistido-controlada A PSV pode ser usada no lugar da ventilação assistido-controlada. Como todos os ciclos são realizados pelo paciente, é fundamental que ele apresente-se com o comando respiratório íntegro. Além disso, aqui o volume corrente não é fixo, dependendo, além do ajuste da pressão de suporte, das características de resistência e complacência do sistema respiratório. Por isso, ela deve ser reservada para pacientes que estejam estáveis ou melhorando das condições que levaram à necessidade de ventilação mecânica. Esse uso da PSV é defendido como uma forma de melhorar o conforto do paciente. Por ser uma modalidade ventilatória de fluxo parcialmente livre, na qual, dentro dos limites do ventilador, caso o paciente exerça um maior esforço ele recebe um maior fluxo inspiratório, minimiza-se a possibilidade de desconforto do paciente pelo recebimento de um fluxo inspiratório ajustado aquém de suas necessidades. Entretanto, para que isso ocorra, um nível adequado de pressão de suporte deverá ser ajustado. Caso contrário, haverá queda do volume corrente e aumento da freqüência respiratória, ou esforço exagerado do paciente para manter o volume corrente, ambas situações desconfortáveis e de maior trabalho respiratório. Estratégia ventilatória para o desmame da ventilação mecânica O desmame da ventilação mecânica constitui a situação do dia-a-dia em que a pressão de suporte é mais utilizada. Detalhes sobre essa aplicação da PSV serão discutidos mais adiante. 33 - Quais as limitações da ventilação com pressão de suporte (PSV)? A PSV fornece suporte ventilatório parcial, não havendo garantias em relação ao volume corrente e à freqüência respiratória. Por isso, ela deve ser usada em pacientes com "drive" respiratório adequado e que se apresentam clinicamente estáveis ou melhorando. Como a ciclagem da PSV dá-se em função da redução do fluxo inspiratório, ela pode ser dificultada pela presença de vazamentos e em pacientes com doença obstrutiva. Nesse último caso, pode haver prolongamento do tempo inspiratório, com desconforto para o paciente e, eventualmente, geração de hiperinsuflação. O fornecimento de "fluxos extras" durante as nebulizações realizadas no ventilador também pode dificultar a ciclagem. 34 - Quais são as características da ventilação com pressão-controlada (VPC)? A VPC difere da ventilação volume-controlada (VVC) em função dos parâmetros que são ajustados e dos que são conseqüências desses ajustes. Enquanto na VVC o volume corrente e o fluxo inspiratório (tanto o pico de fluxo quanto sua forma) são pré-estabelecidos, variando a

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pressão nas vias aéreas, na VPC é estabelecida a pressão a ser mantida nas vias aéreas durante um determinado tempo inspiratório, variando o volume corrente e o fluxo inspiratório. Nas duas modalidades, os parâmetros não ajustados variam em função das características do sistema respiratório (resistência e complacência) e dos ajustes dos demais parâmetros. Essas diferenças estão resumidas na tabela abaixo.

Ventilação volume-controlada versus ventilação pressão controlada em relação aos seus parâmetros pré-estabelecidos e variáveis.

Ventilação volume-controlada Ventilação pressão-controlada

Freqüência respiratória estabelecida (c) variável (ac)

estabelecida (c) variável (ac)

Volume corrente estabelecido variável Fluxo inspiratório pico estabelecido variável onda estabelecido o tipo sempre desacelerado Pressão nas vias aéreas variável estabelecida Tempo inspiratório estabelecido estabelecido Relação i:e Variável variável C: ventilação controlada; AC: ventilação assistido-controlada

A VPC é caracterizada por um alto fluxo inspiratório inicial, que eleva a pressão nas vias aéreas para um platô pré-estabelecido. Essa pressão será mantida durante a inspiração, cujo término é determinado pelo tempo inspiratório, outro parâmetro pré-estabelecido (ventilação mecânica com pressão positiva, limitada a pressão e ciclada a tempo). A manutenção da pressão das vias aéreas no platô pré-estabelecido implica em um fluxo de padrão desacelerado, característica desta modalidade ventilatória, pois na medida em que o pulmão é insuflado, há aumento na pressão alveolar, diminuindo progressivamente o fluxo necessário para que se mantenha a pressão nas vias aéreas no nível estabelecido.

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35 - Quais são os fatores que influenciam o volume corrente na ventilação pressão-controlada (VPC)? O volume corrente varia em função da diferença entre a pressão de vias aéreas (pré-estabelecida) e a pressão expiratória final (PEEP ou auto-PEEP) e da resistência e da complacência do sistema respiratório. Quanto maior a diferença entre a pressão de vias aéreas e a expiratória final, maior será o volume corrente e, para uma determinada diferença de pressão estabelecida, quanto menor a resistência ou maior a complacência do sistema respiratório, maior o volume corrente gerado. Outro fator que pode interferir com volume corrente é o tempo inspiratório. Quando o tempo inspiratório ajustado é insuficiente para o equilíbrio entre a pressão das vias aéreas e a alveolar, o volume corrente será limitado por ele, pois a inspiração será interrompida ainda na presença de fluxo inspiratório. A limitação do volume corrente pelo tempo inspiratório é particularmente importante nas condições de alta resistência ou alta complacência, nas quais o equilíbrio entre as pressões demora a ocorrer (figura a seguir).

O desenvolvimento da auto-PEEP durante a VPC interfere no volume corrente gerado. O aumento da freqüência respiratória pode, portanto, a partir de um determinado momento,

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diminuir o volume corrente, em função da redução do tempo expiratório e geração de auto-PEEP. A partir desse ponto, aumentos na freqüência respiratória não correspondem a aumento do volume minuto, pois geram redução do volume corrente de cada ciclo. Pode ocorrer inclusive redução da ventilação alveolar e retenção de gás carbônico, na medida em que a redução do volume corrente o aproxima do volume do espaço morto. Nesses casos, para se aumentar o volume minuto e a ventilação alveolar, deve-se aumentar a pressão das vias aéreas. Como podemos observar, a garantia da ventilação alveolar adequada durante a VPC exige ajustes mais complexos dos parâmetros do ventilador do que na VVC. Esse dado deve ser considerado ao se optar pelo uso dessa modalidade para que se obtenham suas possíveis vantagens de forma segura. 36 - Quais as principais indicações da ventilação com pressão-controlada (VPC)? A ventilação pressão-controlada (VPC) tem sido utilizada como opção de ventilação na SDRA, associada ou não à inversão da relação inspiração-expiração. Quando comparada à ventilação volume-controlada (VVC) com onda de fluxo quadrada, a VPC, em função de seu fluxo desacelerado, apresenta vantagens: melhor distribuição da ventilação, com menor espaço morto, menor pico de pressão nas vias aéreas, maior pressão média das vias aéreas, maior complacência, redução da PaCO2 e aumento da PaO2. Além disso, com a VPC, ao contrário da VVC, tem-se a segurança de não haver hiperdistensão de alvéolos com menor resistência e maior complacência, fato que teoricamente poderia evitar maior lesão induzida pelo ventilador. Entretanto, os trabalhos clínicos não demonstraram de forma definitiva as vantagens da VPC em relação à evolução final dos pacientes, sobretudo quando comparada com a VVC com fluxo de padrão desacelerado. 37 - Qual a monitoração mínima da mecânica respiratória a ser feita durante o suporte ventilatório? A monitoração da mecânica respiratória deve ser feita com paciente em ventilação volume-controlado, com fluxo quadrado, sem interação com o respirador. Se o paciente estiver interagindo com a ventilação, devemos sedá-lo ou mesmo curarizá-lo por um curto intervalo de tempo. A monitoração deve incluir:

• medidas das pressões: • pressão de pico (ou pressão máxima) das vias aéreas; • pressão de platô (ou de pausa); • auto-PEEP;

• cálculos: • da complacência do sistema respiratório; • da resistência das vias aéreas (inclui a resistência da cânula traqueal).

38 - Como medir as pressões máxima e de platô? A pressão máxima de via aérea, como o próprio nome diz, é a pressão mais elevada alcançada ao final da inspiração na ventilação volume-controlada, quando os pulmões atingem sua insuflação máxima. Na prática pode ser visualizada em todos os ciclos respiratórios. A pressão de platô é aquela medida ao final da pausa inspiratória. Ela reflete a pressão elástica acumulada no sistema respiratório ao final da inspiração e é uma medida indireta bastante próxima da pressão alveolar. A figura abaixo ilustra as medidas das pressões durante a ventilação ciclada a volume.

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39 - Quais os significados clínicos das pressões de pico e de platô? A pressão de pico sofre influência dos componentes elásticos e resistivos do sistema respiratório, portanto, elevações em seus valores podem significar, considerando que os parâmetros ajustados foram mantidos, aumento da resistência, diminuição da complacência ou aumento da auto-PEEP. Embora a elevação da pressão de pico seja de fácil identificação e, por isso, muitas vezes a primeira alteração que chama a atenção de quem está monitorando a ventilação, sua presença não identifica a natureza do problema. A pressão de platô, como é medida ao final da pausa inspiratória, não sofre influência do fluxo, portanto independe do componente resistivo do sistema respiratório. Sua elevação indica piora da complacência do sistema respiratório ou hiperinsuflação pulmonar. A figura abaixo ilustra a interpretação das alterações dessas pressões.

40 - O que é auto-PEEP? É a pressão positiva presente no interior dos alvéolos ao final da expiração em função da não exalação completa do volume corrente. Nessa condição, o pulmão não chega a esvaziar-se até a sua capacidade residual funcional, ou devido a obstrução ao fluxo expiratório ou em função da ventilação com altas freqüências e/ou altos volumes correntes. A auto-PEEP também é denominada de PEEP-oculta ou PEEP-intrínseca. 41 - Como suspeitar da presença de auto-PEEP? Clinicamente, a presença de auto-PEEP deve ser suspeitada em pacientes com obstrução das vias aéreas, principalmente naqueles com freqüência respiratória e/ou volume corrente altos e/ou fluxo inspiratório baixo, naqueles com sibilos até o final da expiração e naqueles com fluxo

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expiratório ainda presente quando do início da próxima inspiração. A presença da auto-PEEP pode ser detectada quando, analisando a curva do fluxo ao longo do tempo, observamos que o fluxo expiratório, antes de retornar a zero, é interrompido por uma nova inspiração (figura abaixo).

42 - Como medir a auto-PEEP? Na grande maioria das vezes a auto-PEEP é uma pressão oculta, que não aparece no manômetro do ventilador. Isso ocorre porque a válvula expiratória está aberta na expiração, fazendo com que a pressão medida no circuito do ventilador retorne rapidamente à pressão ambiente, enquanto a pressão alveolar (Palv) ainda está positiva. Assim, a visualização da auto-PEEP no manômetro do ventilador requer que a pressão medida no circuito seja equilibrada à Palv por uma manobra de oclusão da válvula expiratória ao final da expiração. A forma mais difundida de medir a auto-PEEP consiste em ocluir a válvula expiratória imediatamente antes do início da inspiração e observar a elevação da PEEP. O valor dessa elevação é o valor da auto-PEEP. Os respiradores mais modernos possuem uma tecla que deflagra essa manobra, mostrando o valor da auto-PEEP. O paciente não pode interagir com o respirador durante a manobra, havendo muitas vezes necessidade de sua sedação ou até mesmo curarização (figura abaixo).

A segunda manobra consiste em medir a pressão de platô do paciente, promover uma pausa expiratória longa, de pelo menos 30 segundos, e repetir a medida da pressão de platô. A diferença entre as duas medidas é o valor da auto-PEEP. Aqui também o paciente não pode interagir com a ventilação. Uma terceira manobra, embora mais fidedigna, é menos utilizada por exigir a presença de um balão que, ao medir a pressão esofágica, estima a pressão pleural. A auto-PEEP corresponde ao valor da pressão esofágica gerada até que se inicie o fluxo inspiratório. Essa forma de medida da auto-PEEP deixa evidente o trabalho respiratório que ela impõe ao paciente, ou seja, o paciente deve gerar uma pressão igual à auto-PEEP para depois iniciar seu fluxo inspiratório ou disparar o ventilador.

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43 - Como medir a complacência do sistema respiratório? Qual o seu significado? A complacência, que é o inverso da elastância, pode ser definida como a relação entre o volume inspirado e a variação de pressão resultante da "acomodação" deste volume no parênquima pulmonar, isto é, nos alvéolos. Pode ser calculada, em ml/cmH2O, pela seguinte fórmula:

Em um paciente sem doença respiratória o valor normal de complacência fica em torno de 50 a 80 ml/cmH2O. Uma complacência reduzida ocorre sempre que há aumento da retração elástica dos pulmões ou redução da superfície alveolar disponível para acomodação do volume corrente, como na SDRA, edema agudo de pulmão, pneumonia, ou mesmo por hiperdistensão alveolar iatrogênica, causada por ajustes de volume corrente ou PEEP em excesso. Como a complacência medida é a do sistema respiratório e não a dos pulmões, alterações na parede torácica que dificultem a expansibilidade pulmonar também determinam sua redução. 44 - Como medir a resistência do sistema respiratório? Qual o seu significado? As vias aéreas podem ser analisadas como um sistema de tubos por onde o ar passa. Assim, a resistência pode ser definida como a diferença de pressão necessária para a passagem de um certo fluxo de ar pelos tubos. No sistema respiratório, a resistência das vias aéreas (cânula traqueal + vias aéreas do paciente) pode ser calculada, em cmH2O / l.s-1 , pela fórmula abaixo:

Assim, quanto maior a diferença entre Pmax e Ppausa, maior a pressão resistiva. Normalmente, com um fluxo de 60 L/min (=1 L/s), a diferença entre a Pmax e a Ppausa é de 4 a 6 cmH2O, que é a Rva normalmente encontrada num paciente intubado com cânula de 8 a 9 mm de diâmetro interno. 45 - Como ajustar os principais alarmes do ventilador? Pressão inspiratória máxima Tem como objetivo proteger o paciente ventilado nas modalidades cicladas a volume de barotrauma. Deve ser ajustado entre 40 e 45 cmH2O, valores que seguramente evitarão o barotrauma. Esses alarmes identificarão tanto problemas relacionados com aumento da resistência das vias aéreas (ex: obstrução ou acotovelamentos da cânula ou circuitos, presença de secreção nas vias aéreas, broncoespasmo) ou diminuição da complacência do sistema respiratório (ex: piora do comprometimento pulmonar na lesão pulmonar aguda e na SARA, pneumotórax hipertensivo). Pressão mínima Tem como objetivo identificar situações que diminuem a pressurização do circuito na inspiração, ou seja, desconexões ou vazamentos ao longo do circuito, desinsuflação do balonete da cânula, extubação acidental. Deve ser ajustado em um nível de pressão entre a PEEP e a pressão de platô (uma boa conduta é ajustá-lo 2cmH2O acima da PEEP). Volume minuto máximo Tem como objetivo identificar a hiperventilação realizada pelo paciente em função de ciclos assistidos e/ou espontâneos, denotando uma condição de assincronia entre ele e a ventilação instituída. Deve ser ajustado em um valor 20% acima do volume minuto estabelecido como meta para o paciente. Volume minuto mínimo Deve ser ajustado nos pacientes em que se espera a presença de ciclos assistidos e/ou espontâneos para completar a ventilação. Ele tem como objetivo identificar o paciente que não está completando a ventilação com esses tipos de ciclos. Deve ser ajustado, portanto, no nível de ventilação que se deseja para o paciente. 46 - Qual a definição de desmame? Desmame é a transição abrupta ou gradual da ventilação mecânica para a espontânea. Alguns autores só consideram desmame quando esse processo ocorre após um período mínimo de 24 horas de ventilação mecânica. O desmame é um procedimento freqüente dentro das unidades de tratamento intensivo. Em um dado momento, entre todos os pacientes em ventilação mecânica, 30% encontram-se em

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processo de desmame. Esse processo pode ser simples, em um número significativo de pacientes, com o sucesso obtido após a verificação da capacidade de respiração espontâneo pelo paciente após alguns minutos, como veremos adiante. Entretanto, em outros o desmame pode ser prolongado, chegando a mais de 40% do tempo total de ventilação mecânica, especialmente em pacientes com doença pulmonar obstrutiva crônica, insuficiência cardíaca congestiva, doenças neurológicas ou entre os que permaneceram por tempo prolongado em ventilação mecânica por outras razões. 47 - Quais são os critérios para se iniciar o desmame? As unidades de terapia intensiva devem adotar critérios para identificar sistematicamente e diariamente os pacientes em condições de desmame. A existência desses protocolos está comprovadamente associada à menor duração da ventilação mecânica nos pacientes, diminuindo suas complicações e seus custos. Sugerimos a seguinte rotina a ser seguida, dividindo-a em três etapas relativamente distintas. A) Condições gerais

• resolução ou melhora da causa da falência respiratória; • supressão da sedação e da curarização; • nível de consciência adequado; • estabilidade hemodinâmica (drogas vasoativas em doses mínimas ou ausentes); • ausência de sepse ou hipertermia significativa; • ausência de distúrbios eletrolíticos e metabólicos (potassemia, calcemia, magnesemia,

fosfatemia, equilíbrio acido-base); • ausência de perspectiva de intervenção cirúrgica com anestesia geral próxima.

B) Capacidade de oxigenação: • PaO2 > 60mmHg (SaO2 > 90%) com uma fração inspirada de oxigênio menor ou igual a

0,4 (40%) e PEEP < 5cmH2O. C) Capacidade de ventilação (com o paciente em tubo T):

• volume corrente > 5ml/kg; • freqüência respiratória menor que 30 respirações por minuto; • pressão inspiratória máxima < -25cmH2O; • relação freqüência respiratória / volume corrente em litros < 100 (Índice de Tobin ou

índice de respiração rápida e superficial) – atualmente o índice mais usado para avaliar a capacidade de ventilação, devendo ser medido após um minuto de respiração espontânea em tubo T ou CPAP.

48 - Como iniciar o desmame? O desmame deve ser sempre iniciado com o que é denominado de interrupção abrupta da ventilação mecânica. Nela os pacientes são colocados em respiração espontânea em tubo T, com oferta de oxigênio (+5 L/min) durante duas horas. Os pacientes devem ser monitorados quanto a oximetria de pulso, freqüência respiratória e cardíaca, pressão arterial e nível de consciência. Nesse período, são considerados critérios para suspensão do desmame:

• freqüência respiratória > 35 irpm; • índice de Tobin > 100; • SaO2 < 90%; • freqüência cardíaca > 140 bpm (ou aumento de 20% do basal); • pressão arterial sistólica > 180 mmHg ou < 90mmHg (ou alteração superior a 20% do

basal); • agitação, sudorese, alteração do nível de consciência.

Se após duas horas, o paciente não apresentar nenhum dos achados acima, ele pode ser extubado. As taxas de necessidade de reintubação são de 15% a 19%. Caso o paciente apresente algum critério de suspensão do desmame, ele deve retornar para a ventilação mecânica nos parâmetros anteriores à tentativa, sendo reavaliado quanto a nova possibilidade de interrupção da ventilação pelo menos uma vez ao dia. Alguns autores já começam a sugerir que um tempo inferior a duas horas (talvez até 30 minutos) já seja suficiente para verificar se o paciente pode ser extubado. Esses dados ainda

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são discutíveis e, de forma conservadora, ainda observamos o período de duas horas de tubo T. 49 - Como realizar o desmame com tubo T? O desmame com tubo T pode ser realizado de duas formas: tentativas isoladas diárias ou desmame com períodos progressivos de tubo T. Nas tentativas isoladas diárias, o processo é idêntico à interrupção abrupta da ventilação mecânica. Quando o paciente consegue respirar espontaneamente por duas horas, sem apresentar os critérios de suspensão do desmame, ele é extubado. Geralmente essas tentativas são realizadas durante o dia, quando é maior a possibilidade de acompanhamento do paciente pela equipe. No desmame com períodos progressivos de tubo T, o paciente é colocado em respiração espontânea por períodos crescentes (15 – 30 –45 – 60 – 90 – 120 minutos), duas a três vezes por dia. Entre esses períodos ele retorna para os parâmetros de ventilação mecânica anterior ao início do desmame. Os mesmos critérios de suspensão de desmame descritos para a interrupção abrupta da ventilação são observados e, quando presentes, o paciente retorna para a ventilação mecânica, com reavaliação no dia seguinte. Quando o paciente consegue manter-se em ventilação espontânea, confortavelmente, por duas horas ele é extubado. O desmame com tubo T tem a vantagem de ser mais simples e não requerer respiradores sofisticados. Entre as desvantagens, não sabemos exatamente a FIO2 que está sendo ofertada, o paciente não está "protegido" pelos alarmes do ventilador e por seus mecanismos de "back-up". Essas limitações tornam necessária uma monitoração mais de perto do paciente por parte da equipe. 50 - Como realizar o desmame com pressão de suporte (PSV)? Quando optamos pelo desmame com PSV devemos escolher uma modalidade em que os ciclos espontâneos correspondam a todos os ciclos (CPAP) ou à maioria deles (SIMV com freqüência do respirador baixa, menor que 5 por minuto). Devemos manter um valor mínimo de PEEP (3 a 5 cmH2O) e iniciar com uma pressão de suporte alta (escolhemos uma pressão de suporte que forneça um volume corrente de 10 ml/kg e que mantenha a freqüência respiratória menor que 30 por minuto). As reduções da PS devem ocorrer a cada 4 ou 6 horas, com valores de 3 cmH2O. Os mesmos critérios que indicam suspensão do desmame em tubo T devem ser avaliados. Quando o indivíduo é capaz de respirar confortavelmente, por duas horas, com PS de 7 cmH2O ele pode ser extubado. Em relação ao tubo T, o desmame com VPS tem as vantagens de manter o indivíduo conectado ao ventilador, com uma FIO2 definida e os mecanismos de alarmes e "back-up" ativados. Por outro lado, ela requer sempre respiradores micro-processados e pode, em função de sua comodidade, prolongar o desmame caso a equipe que assiste o paciente não esteja atenta. 51 - Como realizar o desmame com ventilação mandatória intermitente sincronizada (SIMV)? Quando se opta pelo desmame com SIMV, reduz-se a freqüência do aparelho para a metade do basal, permitindo assim ciclos espontâneos pelo paciente. Reduções de duas a três respirações por minuto são realizadas duas vezes ao dia. Quando se atinge a freqüência de 4 respirações por minuto, extuba-se o paciente. Também aqui são observados os mesmos critérios de suspensão do desmame em relação ao tubo T e pressão de suporte. Atualmente, praticamente não se utiliza mais o SIMV sem a pressão de suporte associada. Entretanto, durante o desmame, a associação dos dois métodos não é benéfica, pois cria dificuldades em se definir a seqüência de reduções na freqüência respiratória e na pressão de suporte. Embora com taxas de sucesso semelhantes aos desmames com tubo T e PSV, o realizado com SIMV tende a ser mais prolongado. 52 - Qual a melhor modalidade de desmame? Essa pergunta ainda não tem uma resposta definida. Entretanto alguns pontos foram solidificados nos últimos anos, sobretudo após trabalhos de Esteban e cols. e Brochard e cols. Esses autores, em dois estudos semelhantes, definiram que o SIMV é o pior método, associando-se a um tempo mais prolongado de desmame, embora com a mesma taxa de sucesso. Ambos também definiram que a interrupção abrupta da ventilação deve ser sempre

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tentada antes de se partir para técnicas de tubo T ou VPS. Com ela, em torno de 75% dos pacientes são desmamados com sucesso, sem necessidade de reduções graduais no suporte ventilatório. Em relação ao tubo T e pressão de suporte, ainda não se tem definido qual o melhor método, podendo ser usados indistintamente, desde que obedecendo uma rotina. 53 - Quais as principais causas de falha do desmame? A falência no desmame relaciona-se ao desequilíbrio entre a demanda ventilatória do indivíduo e sua capacidade de executar o trabalho ventilatório necessário para atendê-la. Diante da falha no desmame, devemos procurar fatores que aumentam a demanda ventilatória e/ou fatores que comprometem a capacidade de ventilar e/ou oxigenar espontaneamente. Fatores que comprometem a capacidade de ventilar e/ou oxigenar

• depressão do centro respiratório (sedativos, alcalose metabólica, lesões do SNC); • desordens musculares (desnutrição, DPOC, miastenia, distúrbios eletrolíticos, bloqueio

neuromuscular prolongado); • alterações da parede torácica; • doenças neurológicas periféricas (lesão do frênico, polineuropatia associada às

doenças agudas graves). Fatores que aumentam a demanda ventilatória

• aumento da ventilação por minuto (dor, ansiedade, febre, sepse, dieta em excesso); • aumento das cargas elásticas (redução da complacência pulmonar ou torácica, auto-

PEEP); • aumento das cargas resistivas (broncoespasmo, secreção nas vias aéreas, obstrução

da cânula). Em alguns pacientes o retorno à respiração espontânea pode não ser mais possível em função da irreversibilidade da condição que mantém a necessidade de ventilação mecânica. Nesses casos, deve-se considerar as possibilidades de ventilação mecânica domiciliar ou de ventilação mecânica não-invasiva. 54 - Leitura recomendada Aslanian P, Brochard LJ. Partial ventilatory support. In: Marini JJ, Slutsky AS. Physiological basis of ventilatory support. New York, Marcel Dekker, 1998. P.817-46. Barbas CSV, Amato MBP, Rodrigues Jr MR. Técnicas de assistência ventilatória. In: Knobel, E. Condutas no paciente grave. 2ª ed São Paulo, Atheneu, 1998. P.321-354. Brochard L, Pluskwa F, Lemaire F. Improved efficacy of spontaneous breathing with inspiratory pressure support. Am. Rev. Respir. Dis. 1987;136:411-5. Brochard L, Isabey D, Piquet J, et al. A. Reversal of acute exacerbations of chronic obstructive lung disease by inspiratory assistance with a face mask. N. Engl. J. Med. 1990;323:1523-1530. Brochard L, Mancebo J, Wysocki M, et al. Noninvasive ventilation for acute exacerbations of chronic obstructive pulmonary disease. N. Engl. J. Med. 1995;333:817-822. Brochard L, Rauss A, Benito S, et al. Comparison of three methods of gradual withdrawal from ventilatory support during weaning from mechanical ventilation. Am. J. Respir. Crit. Care Med. 1994;150:896-903. Esteban A., Frutos F, Tobin MJ, et al. A comparison of four methods of weaning patients from mechanical ventilation. N. Engl. J. Med. 1995;332:345-50. Gladwin MT, Pierson DJ. Mechanical ventilation of the patient with severe chronic obstructive pulmonary disease. Intensive Care Med., 1998;24:898-910. Irwin RS. Mechanical Ventilation. In: Rippe JM, Irwin RS, Alpert JS, Fink MP. Intensive Care Medicine. 2ed. Boston. Little, Brown and Company. 1991. p.562-575. Kramer N, Meyer TJ, Meharg J, Cece RD, Hill NS. Randomized, prospective trial of noninvasive positive pressure ventilation in acute respiratory failure. Am. J. Respir. Crit. Care Med., 1995;151:1799-1806. Leatherman JW. Mechanical ventilation in obstructive lung disease. Clin. Chest Med. 1996;17:577-590. MacIntyre NR. New modes of mechanical ventilation. Clin. Chest Med. 1996;17:411 -21. Marini JJ. Evolving concepts in the ventilatory management of acute respiratory distress syndrome. Clin. Chest Med. 1996;17:555-575. Meduri GU. Noninvasive positive-pressure ventilation in patients with acute respiratory failure. Clin. Chest Med. 1996;17:513-553.

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