vende se uma região

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Número de ISBN: 978-85-61693-03-9 1 VENDE-SE UMA REGIÃO: O MARKETING TERRITORIAL PÚBLICO E PRIVADO DO LITORAL NORTE DA BAHIA Sylvio Bandeira de Mello e Silva 1 Silvana Sá de Carvalho 2 RESUMO: O Litoral Norte do Estado da Bahia tem tido, nas últimas décadas, um forte crescimento do turismo, inclusive associado a residências secundárias. O dinamismo recente tem encontrado no marketing territorial uma poderosa ferramenta, envolvendo os setores público e privado. Assim, o objetivo deste trabalho é o de analisar o marketing territorial da região através de uma pesquisa na internet sobre os terrenos acima de 1 ha postos à venda, entre abril e junho de 2010. Neste período, foram encontrados 87 anúncios de grandes terrenos à venda, a maioria localizada em Camaçari e Mata de São João, onde ocorreu o maior crescimento do turismo e das residências secundárias. Os anúncios são publicados em português, inglês e espanhol e já envolvem 155 milhões de m². Alguns terrenos têm 13, 15 ou até 18 milhões de m² e abrangem uma extensão litorânea de 75 km, ou seja, cerca de 40% de todo o litoral. Alguns terrenos apresentam 8, 12 ou 13 km de extensão litorânea. O trabalho discute a crescente apropriação do território por estrangeiros e a forma de ocupação contínua do litoral, dificultando o acesso às praias, o que contraria a legislação brasileira. Estes problemas são agravados pela ausência de um planejamento territorial no Litoral Norte da Bahia. PALAVRAS-CHAVE: Marketing territorial; Litoral Norte; Bahia. 1 Professor do Mestrado em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Social/UCSAL. Pesquisador/CNPq. E- mail: [email protected] 2 Professora do Mestrado em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Social/UCSAL. E-mail: [email protected]

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Número de ISBN: 978-85-61693-03-9

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VENDE-SE UMA REGIÃO: O MARKETING TERRITORIAL

PÚBLICO E PRIVADO DO LITORAL NORTE DA BAHIA

Sylvio Bandeira de Mello e Silva1

Silvana Sá de Carvalho2

RESUMO:

O Litoral Norte do Estado da Bahia tem tido, nas últimas décadas, um forte

crescimento do turismo, inclusive associado a residências secundárias. O dinamismo recente

tem encontrado no marketing territorial uma poderosa ferramenta, envolvendo os setores

público e privado. Assim, o objetivo deste trabalho é o de analisar o marketing territorial da

região através de uma pesquisa na internet sobre os terrenos acima de 1 ha postos à venda,

entre abril e junho de 2010. Neste período, foram encontrados 87 anúncios de grandes

terrenos à venda, a maioria localizada em Camaçari e Mata de São João, onde ocorreu o maior

crescimento do turismo e das residências secundárias. Os anúncios são publicados em

português, inglês e espanhol e já envolvem 155 milhões de m². Alguns terrenos têm 13, 15 ou

até 18 milhões de m² e abrangem uma extensão litorânea de 75 km, ou seja, cerca de 40% de

todo o litoral. Alguns terrenos apresentam 8, 12 ou 13 km de extensão litorânea. O trabalho

discute a crescente apropriação do território por estrangeiros e a forma de ocupação contínua

do litoral, dificultando o acesso às praias, o que contraria a legislação brasileira. Estes

problemas são agravados pela ausência de um planejamento territorial no Litoral Norte da

Bahia.

PALAVRAS-CHAVE: Marketing territorial; Litoral Norte; Bahia.

1 Professor do Mestrado em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Social/UCSAL. Pesquisador/CNPq. E-

mail: [email protected] 2 Professora do Mestrado em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Social/UCSAL.

E-mail: [email protected]

Número de ISBN: 978-85-61693-03-9

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1. INTRODUÇÃO

O Litoral Norte do Estado da Bahia está passando por muito grandes e rápidas

transformações desde meados dos anos 1970, com a inauguração da chamada Estrada de Coco

(BA-099), prolongada em 1993 até a divisa de Sergipe com o significativo nome de Linha

Verde (Figura 1).

Figura 1 – Litoral Norte da Bahia – Estrada do Côco e Linha Verde

Fonte: DERBA, 2007 e SEI, 2006

Elaboração: Carvalho, S.S.

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Com isso, toda a região, com seus recursos naturais, cênicos e culturais, passou a ser

facilmente acessível à metrópole de Salvador o que possibilitou a intensa transformação da

região, passando de um “deserto” [humano] (SANTOS, 1958, p.155) a um “território de

enclaves” turísticos, recreacionais, de lazer e de residências secundárias (SILVA; SILVA;

CARVALHO, 2008, p.189; SILVA; CARVALHO, 2010). O dinamismo recente e atual tem

encontrado no marketing territorial uma poderosa ferramenta, envolvendo os setores público e

privado, com abrangência multi-escalar (regional, nacional e internacional).

Assim, o objetivo deste trabalho é o de analisar o marketing territorial do Litoral Norte

da Bahia, priorizando o que é executado com os recursos da internet por agências públicas e

privadas.

A análise permitirá avaliar se efetivamente o “litoral do nosso país é um bem público”

e que é “preciso mantê-lo na mão do seu verdadeiro dono: o povo brasileiro”, conforme

veicula um recente anúncio (Figura 2) dos Ministérios do Meio Ambiente e do Planejamento

na imprensa nacional (A Tarde, Salvador, 24.06.2010, p. A9). Neste mesmo comunicado,

consta que

o litoral brasileiro é um verdadeiro patrimônio natural e seu uso pelo cidadão

está assegurado em lei. Por isso, o Governo Federal criou o Projeto Orla, que

tem o objetivo de preservar e organizar nossa faixa litorânea. Caso você se

sinta impedido de utilizar a praia por construções, quiosques ou qualquer

outro tipo de empreendimento que esteja sendo erguido na orla marítima,

entre em contato com a gente. (A Tarde, 24.06.2010, p.A9)

Figura 2 – Informação oficial sobre a apropriação do litoral brasileiro

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Fonte: A TARDE, Salvador, 24.06.2010, p. A9

A pesquisa permitirá avaliar, portanto, se não há uma discrepância entre o discurso

oficial e a prática, em boa parte incentivada por recursos públicos. A questão básica é a de

saber que tipo de região está sendo produzida pelo marketing territorial, apoiada em uma

determinada imagem que deve ser vendida, e quais são os principais impactos esperados,

como resultado das ações públicas e privadas, para os próximos anos.

2. MARKETING E TERRITÓRIO

A área de marketing (palavra inglesa plenamente adotada em língua portuguesa e em

várias outras línguas) é uma área de estudos e de aplicação da Administração. Um de seus

principais autores, Philip Kotler, junto com Kevin Lane Keller, assim definem marketing: “é

um processo social pelo qual indivíduos e grupos obtém o que necessitam e desejam por meio

da criação, da oferta e da livre troca de produtos e serviços de valor com outros” (KOTLER;

KELLER, 2006, p.4). Os mesmos autores citam a definição de marketing pela American

Marketing Association:

o marketing é uma função organizacional e um conjunto de

processos que envolvem a criação, a comunicação e a entrega de valor para

os clientes, bem como a administração do relacionamento com eles, de modo

que beneficie a organização e seu público interessado. (KOTLER; KELLER,

2006, p.4)

É significativo observar que a Economia e a Geografia se preocuparam com a análise

da estrutura dos mercados (onde o marketing se realiza), especialmente no amplo conjunto da

chamada teoria locacional, o que sinaliza um forte potencial de interação com a

Administração.

O marketing viabiliza, desta forma, a troca que se processa entre o agente econômico

que oferece um determinado bem ou serviço e o consumidor que precisa do bem ou do

serviço. Em termos resumidos, a análise do marketing (KOTLER; KELLER, 2006, p.17)

ressalta classicamente quatro ferramentas básicas do vendedor, os chamados quatro Ps:

produto (product), preço (price), praça (place) e promoção (promotion). Kotler e Keller

acrescentam mais quatro Cs do cliente, com base em Robert Lauterborn (1990): cliente

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(client), custo (cost), conveniência (convenience) e comunicação (communication ). Uma das

ferramentas destaca claramente a questão territorial, o lugar (a praça) onde a troca é efetivada,

isto é, o mercado do ponto de vista geográfico-econômico. Já o produto refere-se ao que pode

ser oferecido para ser consumido ou utilizado pelo mercado, envolvendo bens, serviços,

eventos, experiências, pessoas, lugares, propriedades, organizações, informação e idéias.

Portanto, envolve também um território, com destaque para os lugares e propriedades. Ou

seja, o território aqui é um recurso que passa a ser vendido como produto (mercadoria) através

do marketing, gerando a expressão marketing territorial (ou marketing de lugares).

Kotler e Keller falam ainda que “cidades, estados, regiões e países inteiros competem

ativamente para atrair turistas, fábricas, sedes de empresas e novos moradores” (2006, p.6; ver

também KOTLER; REIN; HAIDER, 1993). Antes, a socióloga Carola Scholz havia

produzido um trabalho crítico sobre a relação entre marketing urbano e desenvolvimento

urbano, considerando que foi o marketing que acabou por transformar a cidade de

Frankfurt/Alemanha, a partir de 1977, em um dos mais importantes centros econômicos e

financeiros da Europa e do mundo, com o ponta-a-pé inicial dado pela Prefeitura. Assim, foi

definida uma identidade corporativa para Frankfurt, sendo a mesma tratada como cidade-

empresa (SCHOLZ, 1989). Isto se refletiu na opção pela implantação de uma área central de

negócios com enormes arranha-céus, a única cidade com esse perfil, mais americano que

europeu, em toda a Alemanha.

A crescente integração entre marketing e território se dá, nas duas últimas décadas, no

contexto da expansão das discussões sobre território/territorialização/desterritorialização

(HAESBAERT, 2009) que, por sua vez, podem ser assumidas como um resultado do

crescimento do que se convencionou chamar de globalização (SILVA; SILVA, 2006). Com

efeito, os processos de globalização, ao exacerbar os mecanismos de integração na escala

global causaram grandes transformações, muitas delas negativas para um bom número de

territórios o que provocou, em numerosos casos, importantes reações, visando o

fortalecimento dos mesmos. A competição entre os territórios passou a ser global o que

colocou novos desafios para o marketing, inclusive o marketing territorial, em diferentes

escalas e contextos. Como diz Harvey (2005, p.87):

A competição entre territórios (estados, regiões ou cidades) sobre quem tem

o melhor modelo para o desenvolvimento econômico ou o melhor clima de

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negócios, foi relativamente insignificante nos anos 1950 e 1960. Competição

deste tipo cresceu nos sistemas mais fluidos e abertos das relações

comerciais estabelecidas após 1970. O progresso geral da neoliberalização

tem sido, assim, crescentemente impelida através de mecanismos do desigual

desenvolvimento geográfico.

No Brasil, essa competição serviu para cunhar, nas últimas décadas, a expressão

“guerra dos lugares”, como resultado da busca por melhores incentivos fiscais e outras

vantagens oferecidas para a localização de empresas (SANTOS; SILVEIRA, 2001, p.112-

116).

Basicamente, o território pode ser entendido como um espaço físico, identificado por

determinados elementos, destacadamente pela presença de relações de poder ou um campo de

forças, segundo Raffestin (1993), endógenas e exógenas, responsáveis pela sua estrutura e

funcionamento.

A questão territorial ressalta, portanto, e isto desde a clássica contribuição de Friedrich

Ratzel (1923 [1897]), o componente político, uma das razões que explica o seu crescente uso,

superando recentemente o emprego do termo região.

3. MARKETING TERRITORIAL NO LITORAL NORTE DA BAHIA

Para analisar o marketing territorial do Litoral Norte da Bahia optou-se por uma

pesquisa na internet sobre os grandes terrenos postos à venda em sites de classificados ou

sites de grandes corretoras. As buscas por terrenos, acima de 1 ha, na internet aconteceu entre

abril e junho de 2010. A maioria dos sites é escrita em mais de duas línguas, ou seja, além do

português, o inglês e o espanhol, o que mostra a intenção de encontrar possíveis investidores

no exterior. É importante notar que a busca por esses terrenos não se esgotou neste período,

ou seja, existem ainda, provavelmente, mais terrenos nesse perfil sendo vendidos nesta área,

nesta época.

Nesse período foram encontrados 87 anúncios de terrenos à venda no Litoral Norte da

Bahia, que corresponde aos municípios de Lauro de Freitas, Camaçari, Mata de São João,

Entre Rios, Esplanada, Conde e Jandaíra.

Como é mostrado na figura 3, o único município que não apresenta terreno à venda no

litoral é Lauro de Freitas, o que pode ser explicado pela forte urbanização que aconteceu nas

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últimas décadas nessa área, integrando, inclusive, a cidade de Lauro de Freitas à Salvador,

atualmente consideradas um continuum urbano. O gráfico mostra também que a maior parte

dos terrenos à venda encontra-se em Mata de São João e Camaçari, municípios que mais

fortemente estão passando pelo processo de metropolização turística com a construção de

enormes resorts associados a condomínios de segunda residência, ambos voltados para o

mercado nacional e internacional.

Figura 3 – Anúncios de grandes terrenos à venda no Litoral Norte da Bahia –

abr./jun. de 2010

Fonte: Pesquisa na Internet. abr./jun. 2010

Dos anúncios de terrenos coletados, foram registrados dados sobre a área, a extensão

litorânea e o valor dos terrenos, sendo que nem todos os anúncios apresentavam preços.

Quanto à área, a totalidade dos anúncios soma 155.226.311 m², sendo que alguns

terrenos apresentaram área com 13, 15 e até 18 milhões de m². A área total oferecida equivale

a quase três vezes a área do município de Lauro de Freitas. A figura 4 mostra o tamanho das

áreas totais dos terrenos postos à venda no período da pesquisa:

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Figura 4 – Áreas de grandes terrenos à venda no Litoral Norte da Bahia –

abr./jun. de 2010

0

10.000.000

20.000.000

30.000.000

40.000.000

50.000.000

60.000.000

70.000.000

Camaçari Mata de São João

Entre Rios Esplanada Conde Jandaíra

Áre

a (m

²)

Municípios do Litoral Norte

Fonte: Pesquisa na Internet. abr./jun. 2010

No mapa abaixo (Figura 5) é indicada a localização mais detalhada destes terrenos e

suas áreas correspondentes, ressaltando melhor a dimensão espacial:

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Figura 5 – Localização e áreas de grandes terrenos à venda no Litoral Norte da Bahia –

abr./jun. de 2010

Fonte: Pesquisa na Internet. abr./jun. 2010

Elaboração: Carvalho, S.S.

O dado apresentado sobre a soma de todas as extensões litorâneas dos anúncios de

terrenos pesquisados equivale a mais de 75 km. Existem grandes áreas sendo vendidas com

extensões litorâneas de 8, 12 e 13 km. É um dado preocupante, considerando que a pesquisa

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não abarcou a totalidade dos terrenos litorâneos atualmente à venda e que essa extensão

equivale a cerca de 40% de todo litoral e não avaliou a área já vendida. A figura 6 mostra a

extensão litorânea total dos terrenos à venda no período da pesquisa juntamente com a

extensão litorânea dos municípios. Percebe-se que, em alguns municípios, a extensão

litorânea de terras à venda é mais da metade ou quase a metade da extensão litorânea do

município. Ou seja, são áreas rurais (a maioria fazendas de côco, com população rarefeita)

que estão prestes a serem ocupadas por grandes empreendimentos que, provavelmente, não

vão garantir o acesso ao cidadão comum, como é de costume nos atuais empreendimentos

desse tipo no Litoral Norte da Bahia.

Figura 6 – Extensão litorânea de grandes terrenos à venda no Litoral Norte da Bahia -

abr./jun. de 2010

0

20.000

40.000

60.000

80.000

100.000

120.000

140.000

160.000

180.000

200.000

Camaçari Mata de São João

Entre Rios Esplanada Conde Jandaíra Extensão total

Me

tro

s

Extensão litorânea dos terrenos Extensão litorânea dos municípios

Fonte: Pesquisa na Internet. abr./jun. 2010

Quanto ao preço, os valores variam muito e são apresentados tanto em reais, como em

dólares e euros, o que confirma mais ainda a que mercado se destinam esses anúncios – o

mercado globalizado. A maior parte dos anúncios, cerca de 63%, apresenta o preço dos

terrenos, o restante informa que o preço será fornecido somente sob consulta. A média de

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preços ficou em R$ 92,07/m², o menor valor encontrado foi R$ 3,00/m² e o maior valor foi R$

600,00/m². Os preços variam de acordo com a localização, com a existência ou não de alguma

infra-estrutura e com a existência de algum licenciamento ambiental prévio.

A seguir, alguns destaques sobre as características e a imagem do território são

apresentados:

boa parte dos anúncios mostra a proximidade de Salvador e de seu Aeroporto

Internacional, ressaltando a facilidade para quem chega por via aérea e quer se dirigir

diretamente ao equipamento turístico a ser implantado:

Localização: Litoral Norte do Estado da Bahia.

A 45km. do aeroporto internacional de Salvador da Bahia, com tráfico

consolidado de voos charters.

(Disponível em: www.invertirenbrasil.com/po/areadeplaya Acesso em: 17

jun. 2010)

a grande maioria dos anúncios faz um apelo à natureza ainda preservada e sua

diversidade com acesso a vários tipos de ambientes naturais:

Área de 67 hectares localizada no distrito de Abrantes na Fazenda

Caritingui. Situada a 20 km de Salvador e a 15 km do Aeroporto, possui

mananciais de mata atlântica preservada, restinga e dunas, sendo banhada

pelo rio Capivara. Relevo plano com fauna e flora em equilíbrio. (Disponível

em: www.bahia.com.br. Acesso em: 26 mai. 2010)

o Governo do Estado da Bahia apresenta em um site (que aparentemente não é

governamental) informações úteis sobre turismo com guias e roteiros turísticos e uma sessão

para investidores interessados na Bahia.

Informações ao Investidor - Veja como realizar investimentos turísticos na

Bahia. Confira nossas zonas turísticas e faça download do “Guia do

Investidor”.

Oportunidades de investimento. Busque em nossos classificados as áreas ou

empreendimentos disponíveis para venda.

(Disponível em: www.bahia.com.br. Acesso em: 26 mai. 2010)

Esse site tem uma sessão de classificados com uma lista de anúncios, mais

precisamente 89, que se referem à áreas turísticas de todos o Estado da Bahia, inclusive o

Litoral Sul, a Baía de Todos os Santos e o Recôncavo. Dentre estes, um terço se refere a

grandes áreas localizadas no Litoral Norte. No anúncio, apesar de estar localizado em um site

ligado ao governo, aparece o contato do corretor que vende o terreno.

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alguns anúncios mostram que as áreas possuem licenciamento para implantação de

projetos:

Área com 40 ha, sendo já aprovados para projetos turísticos e 20 ha com

lagoas, com 950m de praia, localizado no Sítio do Conde, possuindo 5.000

coqueiros em produção, energia elétrica e benfeitorias. Área destinada à

venda ou parceria para negócios turísticos.

(Disponível em: www.bahia.com.br. Acesso em: 26 mai. 2010)

outros anúncios enfatizam a proximidade dos terrenos à venda de áreas com

construção de grandes empreendimentos imobiliários:

Seja dono de um gigantesco paraíso - entre o céu, o mar e a terra - numa das

mais lindas praias do litoral norte da Bahia. São 9.480.000 m2 de área plana,

repleta de coqueiros, em Curumaí(entre Massarandupió e Subaúma), sendo

que 2,5 km de frente para o mar. Apenas R$ 5,28 o m2. O terreno é ideal

para a construção de grandes complexos hoteleiros e turísticos, condomínios

de alto padrão, resortes de luxo e mansões cinematográficas, num dos

espaços mais belos e cobiçados da Costa dos Coqueiros, às margens da

Linha Verde, primeira rodovia ecológica do Brasil. Agora, nas imediações,

começam a ser construídos dois gigantescos empreendimentos imobiliários,

sendo um em Massarandupió e outro em Baixios, o que transformará a

região no maior pólo turístico da América do Sul e um dos mais belos do

mundo. Oportunidade rara para que empresas da construção civil tornem

realidade projetos que antes pareciam apenas sonhos. (Disponível em:

www.anunciosparatodos.com/anuncio/1246913070/Mega+Terreno+para+Pr

ojeto+Ambicioso+-+Bahia+-+Brasil.+ Acesso em: 10 jun. 2010)

estão sendo anunciados também terrenos para construção comercial ou residencial

de baixo custo, localizados em áreas menos privilegiadas, com o argumento de que com o

desenvolvimento do turismo aumenta a demanda de lugares de comércio e de lugares nos

quais possa ser construída habitação de baixo custo para receber população que vai atrás de

novas oportunidades de trabalho ligadas ao turismo:

Descrição geral: Área de 30 hectares ideal para construção comercial ou

residencial. Possui quase 1,5 km da Linha Verde, principal rodovia do

Litoral Norte do Estado. Localizado na entrada de Praia do Forte. Esta

localização estratégica é ideal tanto para um negócio comercial como um

posto de gasolina e serviços, quanto para condomínio de casas de baixo

custo. Com o desenvolvimento do litoral Norte da Bahia, aumentaram as

oportunidades de trabalho ligados à indústria do turismo. Isso tem

aumentado a demanda por mão de obra e consequentemente a demanda por

habitação de baixo custo. O preço por m2

é muito bom comparado aos

semelhantes na região. Oferece perfeita oportunidade comercial e residencial

ou simplesmente poderá ser desmembrado para venda dos lotes

individualmente.

Número de ISBN: 978-85-61693-03-9

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(Disponível em: imoveisbrasilbahia.com.br/Property/Residential/for-sale/Terreno-na-Linha-Verde/Bahia/PDF1110P. Acesso em: 29 jun. 2010)

Em termos adicionais, é preciso também registrar que o Governo do Estado da Bahia

participa, ao lado do Governo Federal e de outros estados da Federação, das grandes feiras

internacionais de turismo onde a questão do imobiliário turístico tem especial destaque.

Prevalece, portanto, a lógica do mercado.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Concluindo, é preciso voltar à mensagem do anúncio governamental inserido no início

desse trabalho (Figura 2). A comunicação veicula duas idéias. Uma, através da foto, induz o

leitor a pensar que as praias devem propiciar livre circulação, portanto, não deveriam existir

construções nas praias ou muito próximas delas. Outra idéia, que é a central, é a de que o

litoral deveria ser propriedade do povo brasileiro, por conseguinte, neste caso, o encarte

“oportunidade única” deveria ser eliminado, como o é na figura.

O problema do litoral brasileiro, particularmente no Nordeste, começa a se assemelhar

à questão da compra de terras para uso agropecuário por estrangeiros. Também em recente

artigo de jornal, o ex-Ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, discute o polêmico tema da

desnacionalização do território nacional (conceito clássico de território), defendendo a idéia

de que “é correto estabelecer regras claras para compra de terras por estrangeiros, sem proibi-

lo” (RODRIGUES, 3.07.2010, p. B11). No caso das praias, a legislação existente garante o

uso pelo cidadão brasileiro.

Mas, persistiria um grave problema mesmo com as terras do Litoral Norte da Bahia

sendo compradas exclusivamente por brasileiros nos moldes dos anúncios aqui analisados ou

por outros meios de comercialização. É a questão da acessibilidade às praias por dentro do

território e não pelas próprias praias. Com efeito, caso todo esse modelo de ocupação do

território seja concretizado com dezenas de grandes empreendimentos de turismo, recreação e

lazer e com milhares de residências secundárias, tudo isso extendido ao longo do litoral, bem

próximo às praias, o visitante que chegaria pela rodovia encontraria verdadeiras barreiras

físicas que sucessivamente impediriam sua passagem. Assim, se houver uma passagem

(acesso público às praias), o próximo poderá estar a mais de uma dezena, ou até a algumas

Número de ISBN: 978-85-61693-03-9

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dezenas, de quilômetros de distância. Um modelo esquemático (Figura 7) ajuda a entender o

problema.

Figura 7 – Modelo esquemático sobre a ocupação futura do Litoral Norte da Bahia

Elaboração: Carvalho, S.S.

Isto é agravado, portanto, pela grande dimensão dos empreendimentos privados que

estão sendo construídos e projetados e pela ausência de um planejamento territorial inter-

municipal. Pelo contrário, o Governo do Estado da Bahia está, como vimos, estimulando

ativamente a venda dos terrenos pela internet, além de não ter um abrangente plano diretor

para o ordenamento do território. Por outro lado, os municípios e o Consórcio Inter-municipal

da Costa dos Coqueiros (que abrange o Litoral Norte da Bahia) não estão ainda preocupados

com a questão, como ficou demonstrado por Coelho (2010).

Assim, tudo leva a crer que o impacto do marketing territorial será, dentro de poucos

anos, altamente problemático para o Litoral Norte do Estado da Bahia, confirmando a

discrepância entre o discurso oficial e a prática.

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REFERÊNCIAS

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