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  • pesquisa em administraol.Tntrouo;

    2. A genealogia do poder em Michel Foucault;3.Metodologia;4. Concluses.

    Poder e controle na grandeempresa industrial: alternativas

    metodol~casp'ara apesquisa qualitativa

    Fernando Coutinho GarciaDo CMAjFacejUFMG

    Marco Aurlio RodriguesDo CMAjFacejUFMG

    Reynaldo Maia MunizDo CMAjFacejUFMG

    "Para haver lucro preciso haver subpoder. preciso que, ao nivel mesmo da existnciado homem, uma trama de podermicroscpico, capilar, se tenha estabelecido,fixando os homens ao aparelho de produo,fazendo deles agentes de produo,trabalhadores. A ligao do homem aotrabalho sinttica, uma ligao operadapelo poder que descrevi h pouco e no doque chamado tradicionalmente de poderpolico; no se trata de um aparelho deEstado, nem da classe no poder; mas doconjunto de pequenos poderes, de pequenasinstituies situados em um ntvel maisbaixo. "

    (Michel Foucault]

    "De um modo geral, os pensadoresdesconhecem as dificuldades queencontraro para fazer seu sistema 'pegar',eles ignoram que haver sempre formas deescapar s malhas da rede e que asresistncias desempenharo seu papel (... )

    Rev. Adm. Empr.

    o prprio discurso penitencirio sedesenrola como se no houvesse ningumfrente a ele, a no ser uma tbula rasa, ano ser pessoas a reformar e a devolver emseguida ao circuito da produo. Narealidade existe um material - os detentos -que resiste incrivelmente. O mesmo poderiaser dito em relao ao taylorismo. Essesistema uma extraordinria inveno de umengenheiro que quer lutar contra avagabundatem, contra tudo o que diminuio ritmo da produo. Mas'pode-se colocar aquesto: o taylorismo algum dia realmentefuncionou? "

    (Michelle Perrot]

    1. INTRODUO

    Quem detm o poder? Qual estratgia adotar para assu-mir o poder? Qual a fonte do poder? Essas perguntase inmeras outras dessa mesma natureza estamos acostu-mados a ouvir e a ler nos velhos e "novos" manuaismarxistas de teoria das organizaes. Por outro lado,Weber dedicou uma parte substancial de sua obra paraexplicar o funcionamento do poder, a natureza da auto-rdade;' os funcionalistas no inovaram, pelo contrrio,sofisticaram o conceito, utilizando, na maioria das vezes,uma bateria de testesestatrstcos, correlaes, regressesetc.," ignorando a histria e mergulhando naquilo queMills, brilhantemente, adjetivou de empirismo abstrato;"enfim, "de uma maneira geral, os mecanismos de podernunca foram muito estudados na. histria. Estudaram-seas pessoas que detiveram o poder. Era a histria anedti-ca dos reis, dos generais. Ao que se ops a histria dosprocessos, das infra-estruturas econmicas. A estas, porsua vez, se ops uma histria das instituies, ou seja, doque se considera superestrutura em relao economia.Ora, o poder em suas estratgias, ao mesmo tempo geraise sutis, em seus mecanismos, nunca foi estudado" (Fou-cault, 1979, p. 141).

    Eis nossos objetivos: sustentar que o poder est dis-seminado em todo o corpo social; desmitificar o velhoslogan marxista de dominantes sendo eternamente domi-nantes e dominados sendo eternamente dominados (slo-gan esse que virou religio, f etc., pois qualquer investi-gao emprica em organizaes parte desse pressupostocomo algo ex-ante!);4 ter a "vsso do poder, no comosimples aparato e instrumento, subordinado a uma von-tade de classe qualquer, mas, antes de mais nada, comoforma constitutiva da sociedade em suas mnimas articu-laes - e nada mais do que estas" (Montanari, 1980, p.79-80); procurar compreender e estudar a estrutura depoder das organizaes, em particular a organizao in-dustrial brasileira, e procurar entender "o que significaestar por baixo" ou "o que significa estar por cima"; in-vestigar empiricamente, no mbito das organizaes, co-mo "o dominante numa regio do sistema pode ser do-

    Rio de Janeiro, 24 (4): 175-185 out/dez. 1984

  • minado em outra. E o dominado numa rea da socieda-de pode ser dominante noutra" (Da Matta et alii, 1982,p. 20; grifo nosso),

    Enfim, como conlui o prprio autor, "tudo indicaessas fantsticas possibilidades to familiares a todos ns,de ser patro e cliente ao mesmo tempo, desde que seolhe para baixo ou para cima; desde que se esteja em.cosa,na rua ou no local de culto religioso" (Da Mattaet alii, 1982, p. 20). Acrescento: a fbrica - como se ds-tribui o poder entre o supervisor, o contramestre e ooperrio? Quem o dominante e o dominado naquelemomento histrico e naquele departamento especfico?E quando o operrio promovido a contramestre, comoseus colegas vo trat-lo: dominante ou .dominado? Nu-ma situao de greve, num pas democrtico, quem odominante no interior de uma determinada unidade fa-bril? E na ocorrncia da "operao tartaruga" (to co-mum nas nossas indstrias), quem o dominante? Sero operrio ou os tcnicos do departamento de "tempose movimentos"? Resumindo nossos objetivos: estudar a''microfsica do poder"; estudar suas estratgias, lutas emecanismos; desenvolver um quadro terico-metodol-gico para test-lo empiricamente no interior de grandesorganizaes industriais.

    2. A GENEALOGIA 00 PODER EM MICHELFOUCAULT '

    2.1 Sobre o conceito de poder

    Duas observaes iniciais: a eficcia de apreender e des-trinchar os complexos mecanismos de poder que per-meiam a sociedade em geral e as organizaes em parti-cular reside em procurar localizar o discurso e a ao des-ses mecanismos. fora do aparelho de Estado; rias institui-es, a todo momento, estamos presenciando estratgias,combates e lutas. ~ necessrio mape-los, desvendar todaa sutileza que os caracteriza.

    "Desde o momento em que se quer fazer uma hist-ria que tenha um sentido, uma utlzao, uma eficciapoltica, s se pode faz-la corretamente sob a condiode que se esteja ligado, de uma maneira ou de outra, aoscombates que se desenrolam neste domnio ( ... ) Notenho de forma alguma a inteno de diminuir a impor-tncia e a eficcia do poder de Estado .. Creio simples-mente que, de tanto se' insistir em seu papel exclusivo,corre-se o risco de no dar conta de todos os mecanismose efeitos de poder que nao passam diretamente pelo apa-relho de Estado, que muitas vezes o sustentam, o repro-duzem, elevam sua eficcia ao mximo. A sociedade so-vitica um exemplo de aparelho de Estado que mudade mos e que mantm as hierarquias sociais, a vida fami-liar, a sexualidade, o corpo quase como eram em umasociedade do tipo capitalista" (Foucault, 1979, p.156-61).

    ~ necessrio, antes de mais nada, estudar o poderindependentemente de teorias globais e universalizantes,ou seja, privilegiando a genealogia; "Delineou-se assim oque se poderia chamar de genealogia, ou melhor, pesqui-sas genealgicas mltiplas, ao mesmo tempo redescober-ta exata das lutas e memria bruta dos combates. E estagenealogia, como acoplamento do saber erudito e do ~.

    176

    ber das pessoas, s6 foi possvel e s se pode tentar reali-z-la condio de que fosse eliminada a tirania dos dis-cursos englobantes com suas hierarquias e com os privi-lgios da vanguarda terica. Chamamos provisoramentegenealogia o acoplamento do conhecimento com as me-mrias locais, que permite a constituio de um saberhistrico das lutas e a utilizao deste saber nas tticasatuais ( ... ) as genealogias no so portanto retornos po-sitivistas a uma forma de cincia mais atenta ou maisexata, mas anticincias ( ... ) &('0 os efeitos de poderprprios a um discurso considerado cientfico, que agenealogia deve combater" (Foucault, 1979, p. 171).

    A questo no formular' a pergunta - o que opoder? Pois se assim o fizssemos, encontraramos duasrespostas - a da teoria jurdica clssica e a "concepomar.csta geral do poder". A primeira responderia que"o poder considerado um direito de que se seria pos-suidor como de um bem e que se poderia, por conse-guinte, transferir ou alienar, total ou parcialmente, porum ato jurdico ou um ato fundador de direito, que se-ria da ordem da ceSSA0ou do contrato. O poder o po-der concreto que cada indivduo detm e que cederia,total ou parcialmente, para constituir um poder polti-co, uma soberania poltica. Neste conjunto terico aConstituio do poder poltico se faz segundo o modelode uma operao jurdica que seria da ordem de trocacontratual. Por conseguinte, analogia manifesta, que per-corre toda a teoria, entre o poder e os bens, o poder e ariqueza", enquanto a teoria marxista enfoca outra coisa.ou seja, a "funcionalidade econmica do poder". "Fun-cionalidade econmica no sentido em que o poderteria essencialmente como papel manter relaes de pro-duo e reproduzir uma dominao de classe que o de-senvolvimento e uma modalidade prpria da apropria-o das foras produtivas tornaram possvel" (Foucault,1979, p. 174-5); essa viso marxista desgua fatalmentena assertiva de que "o poder essencialmente repressivo.O poder o que reprime a natureza, os indivduos, osinstintos, uma classe" (Foucault, 1979, p. 175).

    Diferentemente dessas duas correntes, Foucault afir-ma que o importante no definir ou conceituar o po-der, pois, desta forma, estaramos equivocados na afir-mativa de que o poder isto ou aquilo. O poder algoabstrato. Existem, isto sim, relaes de poder e, portan-to, devemos centrar nossos esforos para a anlise deseus mecanismos. E esse mecanismo do poder no do"tipo repressivo", mas " guerra, guerra prolongada poroutros meios" (Foucault, 1979, p. 176).

    Em outras palavras, ''fazer sobressair o fato da do-minao no seu ntimo e em sua brutalidade e li partirda mostrar no s como o direito , de modo geral, oinstrumento dessa dominao - o que consenso - mastambm como, .at que ponto e sob que forma o direito(e quando digo direito no penso simplesmente na lei,mas no conjunto de aparelhos, instituies eregulamen-tos que aplicam o direito) pe em prtica, veicula rela-es que no so relaes de soberania e sim de domina-o. Por dominao eu 0('0 entendo o fato de uma domi-nao global de um sobre os outros, ou de um grupo so-bre outro, mas as mltiplas formas de dominao quepodem se exercer na sociedade. Portanto,' no o rei emsua posii'o central, mas os sditos em suas relaes re-

    Revista de Administral/O de Empresas

  • cprocas: no a soberania em seu edifcio nico, mas asmltiplas sujeies que existem e funcionam no interiordo corpo social" (Foucault, 1979, p. 181; grifo nosso).

    e necessrio explicar mais; detalhar, destrinchar oconceito de poder enquanto relao; caminhar no senti-do de desvendar a prtica das relaes de poder no inte-rior das organizaes: mostrar quais essas "mltiplassujeies" que tornam incua, vazia, a retrica oposiodominante/dominado.

    Deve-se compreender "o poder, primeiro, como amultiplicidade de correlaes de fora imanentes ao do-mnio onde se exercem e consttatvas de sua organiza-o ;.0 jogo que, atravs de lutas e afrontamentos inces-santes as transforma, refora, inverte; os apoios que taiscorrelaes de fora encontram umas nas outras, forman-do cadeias ou sistemas ou, ao contrrio, as defasagens econtradies que as isolam entre si; enfim, as estratgiasem que se originam e cujo esboo geral ou crstalzaoinstitucional toma corpo nos aparelhos estatais, na for-mulao da lei, nas hegemonias sociais" (Foucalt, 1977,p.88-9).

    O poder no privilgio de uma classe, grupo ou in-divduo; "o poder est em toda parte; no porque englo-be tudo e sim porque provm de todos os lugares. E opoder, no que tem de permanente, de repetitivo, deinerte, de auto-reprodutor, apenas efeito de conjunto,esboado a partir de todas essas mobilidades, encadea-mento que se apia em cada uma delas e, em troca, pro-cura fx-las. Sem dvida, devemos ser nominalistas: opoder no uma nsttuo nem uma estrutura: o no-me dado situao estratgica complexa numa sociedadedeterminada" (Foucault, 1977, p. 89).

    Alguns esclarecimentos adicionais:

    - "O poder no algo que se adquira, arrebate ou com-partilhe, algo que se guarde ou deixe escapar; o poder seexerce a partir de inmeros pontos e em meio a relaesdesiguais e mveis;

    - que as relaes de poder no se encontram em posi-es de exterioridade com respeito a outros tipos de rela-es, mas lhes so imanentes;

    - que o poder vem de baixo, isto , no h, no princpiodas relaes de poder, e como matriz geral, uma oposi-o binria e global entre os dominadores e os domina-dos, dualidade que repercuta de alto a baixo e sobre gru-pos cada vez mais restritos at as profundezas do corposocial;

    - que as relaes de poder so, ao mesmo tempo, inten-cionais e no subjetivas ( ... ) No hd poder que se exerasem uma srie de miras e objetivos;

    - que l onde hd poder h resistncia e, no entanto (oumelhor, por isso mesmo), esta nunca se encontra em po-so de exterioridade em relao ao poder ( ... ) Elas(as correlaes de poder) no podem existir seno em.funo de uma multiplicidade de pontos de resistnciaque representam, nas relaes de poder, o papel deadversrio, de alvo, de apoio ( ... ) Esses pontos de ress-

    Pesquila qualitativa

    tncia esto presentes em toda a rede de poder. As resis-tncias ( ... ) so o outro termo nas relaes de poder;inscrevem-se nestas relaes como o interlocutor irredu-tvel ( ... ) Da mesma forma que a rede das relaes depoder acaba formando um tecido espesso que atravessaos aparelhos e as insttues, Sem se localizar exatamen-te neles, tambm a pulverizao dos pontos de resistn-cia atravessa as estratfcaes sociais e as unidades indi-viduais" (Foucault, 1977, p. 89-92; grifo nosso).

    2.2 Regras e precaues metodolgicas

    1. Regra de imanncia. Localizar qual ou quais exign-cias do poder - econmicas ou ideolgicas - "fizerampesar mecanismos de probo", de ordem geral, no in-terior das organizaes. Exemplo: as disciplinas enquan-to tecnologias organizacionais.

    2. Regra das variaes conttnuas. "No procurar quemtem o poder" (na grande empresa) "nem quem tem o di-reito de saber, ou mantido fora na ignorncia";exemplo: o poder est nas mos de quem decide e, por-tanto, o poder exercido pela alta admnstrao ;ou, deoutro modo, o operrio est privado do saber legitimadopela hierarquia social e , portanto, ignorante; a alterna-tiva outra: "buscar o esquema das modfcaes que ascorrelaes de fora implicam atravs de seu prprio jo-go. As 'distrbues de poder' e as 'apropriaes de sa-ber' no representam mais do que cortes instantneos emprocessos, seja de inverso da relao, seja de aumentosimultneo dos dois termos. As relaes de poder-saberno &io formas dadas de repartio, so matrizes detransformaes" (Foucault, 1977, p. 94).

    3. Regra do duplo condicionamento. "Nenhum 'fococentrai', nenhum 'esquema de transformao' poderiafuncionar se, atravs de uma srie de encadeamentos suocessivos, no se inserisse, no final das contas, em uma es-tratgia global. E, inversamente, nenhuma estratgia po-deria proporcionar efeitos globais a no ser apoiada emrelaes precisas e tnues que lhe servissem, no de apli-cao e conseqncia, mas de suporte e ponto de fixao( ... ) Deve-se pensar em duplo condicionamento, de umaestratgia, atravs de uma especificidade das tticas possf-veis e, das tticas, pelo invlucro estratgico que as fazfuncionar" (Foucault, 1977, p. 95). Exemplo: a histriado desenvlvmeto das "tecnologias organizacionais" -desde o taylorismo at os modelos participativos de ges-tio - e o contra-ataque do movimento operro."

    4. Regra da polivalncia ttica dos discursos. "No se de-ve imaginar um mundo do discurso dividido entre o dis-curso admitido e o discurso excludo, ou entre o discur-so dominante e o discurso dominado; mas, ao contrrio,como uma multiplicidade de elementos discursivos quepodem entrar em estratgias diferentes ( ... ) Os discur-sos, como os silncios, nem so submetidos de uma vezpor todas ao poder, nem opostos a ele. ~ preciso admitirum jogo complexo e instvel em que o discurso pode ser,ao mesmo tempo, instrumento e efeito de poder, e tam-bm obstculo, escora, ponto de resistncia e ponto departida de uma estratgia oposta. O discurso veicula eproduz poder; refora-o mas tambm o mina, expe, de-bilita e permite barr-lo" (Foucault, 1977, p. 95-6).

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  • Exemplo: o discurso do poder mdico psiquitrico e asua reao no movimento da antipsiquiatria; o sindicatocorporativista, criado no Brasil no incio dos anos 40, e asua conseqente reao no "novo sindicalismo" aps1977.6

    Em sntese, essas quatro regras orientam-nos "parauma concepo de poder que substitua o privilgio da leipelo ponto de vista do objetivo, o privilgio da interdi-o pelo ponto de vista da eficcia ttica, o privilgioda soberania pela anlise de um, campo mltiplo e mvelde correlaes de fora, onde se produzem efeitos glo-bais, mas nunca totalmente estveis, de dominao. Omodelo estratgico, ao invs do modelo de direito. Eisso, no por escolha especulativa ou preferncia terica;mas porque efetivamente um dos traos fundamentaisdas sociedades ocidentais o fato de as correlaes de for-a, que por muito tempo tinham encontrado sua princi-pal forma de expresso na guerra, terem-se investido,pouco a pouco, na ordem do poder poltico" (Foucault,1977,p.97).

    As cinco precaues metodolgicas esboadas porFoucault constituem questes importantssimas de refle-xo e, principalmente, de ao terica no curso de umainvestigao emprica.

    Primeira - "No se trata de analisar as formas regula-mentares e legtimas do poder em seu centro, no quepossam ser seus mecanismos gerais e seus efeitos constan-tes. Trata-se, ao contrrio, de captar o poder em suas ex-tremidades, em suas ltimas ramfcaes, l onde ele setorna capilar; captar o poder nas suas formas e institui-es mais regionais e locais, principalmente no ponto emque, ultrapassando as regras de direito que ogranizam edelimitam, ele se prolonga, penetra em nsttuies, cor-porfca-se em tcnicass e se mune de instrumentos de in-terveno material, eventualmente violento ( ... ) Em ou-tras palavras, captar o poder na extremidade cada vezmenos jurdica de seu exerccio" (Foucault, 1979, p,l82;grifo nosso).

    Exemplo: estudar uma determinada organzao,uma fbrica, seus mecasmos de dreo e controle, po-der e manipulao, enfim suas tcnicas de "ntegrao."?

    Segunda - "No formular a pergunta sem resposta:'quem tem o poder e o que pretende, ou o que procuraaquele que tem o poder?' Mas estudar o poder onde suainteno - se que h uma inteno - est completa-mente investida em prticas reais e efetivas; estudar o po-der em sua face externa, onde ele se relaciona direta eimediatamente com aquilo que podemos chamar proviso-riamerite de seu objeto, seu alvo ou campo de aplicao,onde ele se implanta e produz efeitos reais" (Foucault,1979,p.182):

    Exemplo: no privilegiar, nas pesquisas organizacio-nais, a direo e suas estratgias de sobrevivncia no po-der de uma determinada empresa; isto bvio demais;ir alm, descobrir como foi formado um corpo de cola-boradores diretos e assessores totalmente fiis a' essa di-reo; descobrir as tcnicas de eooptao, por parte dadireo, em relao s lideranas operrias.

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    Terceira - "Ter bem presente que o pode] no algoque se possa dividir entre aqueles que o possuem e o de-tm exclusivamente e aqueles que no o possuem e lheso submetidos. O poder deve ser analisado como algoque circula, ou melhor, como algo que s funciona emcadeia. Nunca estlocalzado aqui ou ali, nunca est nasmos de alguns, nunca apropriado como uma riquezaou um bem. O poder funciona e se exerce em rede. Nassuas malhas os indivduos no s circulam mas estosempre em posio de exercer este poder e de sofrer suaao; nunca so o alvo nerte ou consentido do poder,so sempre centro de transmisso. Em outros termos, opoder no se aplica aos indivduos, passa por eles"(Foucault, 1979, p. 183; grifo nosso).

    Exemplo: uma pesquisa emprica em uma organiza-o deve privilegiar todos os estratos hierrquicos repre-sentativos e no, como si acontecer, privilegiar os que"detm o poder" ou os que "no detm o poder"; esseponto bsco."

    Quarta - "O importante no fazer uma espcie de de-duo do poder que, partindo do centro, procuraria verat onde se prolonga para baixo, em que medida se re-produz, at chegar aos elementos moleculares da socie-dade. Deve-se, antes, fazer uma anlise ascendente dopoder: partir dos mecanismos infinitesimais que tm umahistria, um caminho, tcnicas e tticas e depois exami-nar como estes mecanismos de poder foram e ainda SItoinvestidos, colonizados, utilizados, subjugados, transfor-mados, deslocados, desdobrados etc., por mecanismoscada vez mais gerais e por formas de dominao global"(Foucault, 1979, p. 184; grifo nosso).

    Exemplo: investigar os modelos participativos im-plantados em uma determinada organizao; examinar ahistria da nsttuconalzao desse estilo gerencial; am-pliar a amostra para todo um setor; fazer anlises compa-rativas entre pases do centro e da periferia, entre empre-sas transnacionais e empresas nacionais, entre o setorempresarial do Estado e o setor privado; investigar se es-sas estratgias participativas fazem parte de uma estrat-gia global de absoro de conflitos."

    Quinta - " bem possvel que as grandes mquinas depoder tenham sido acompanhdas de produes ideolgi-cas. Houve provavelmente, por exemplo, uma ideologiada educao; uma ideologia do poder monrquco, umaideologia da democracia parlamentar etc.; tudo isso signi-fica que o poder, para exercer-se nestes mecanismos su-tis, obrigado a formar, organizar e pr em circulaoum saber, ou melhor, aparelhos de saber que no soconstrues ideolgicas (. .. ) So instrumentos reais deformao e de acumulao do saber; mtodos de obser-vao, tcnicas de registro, procedinientos de inqurito ede pesquisa, aparelhos de verfcao" (. .. ) Finalmente, "preciso estudar o poder colocando-se fora do modelodo Leviat, fora do campo delimitado pela soberania ju-rdica e pela nstituo estatal, e preciso estud-lo a par-tir das tcnicas e tticas da dominao" (Foucault, 1979,p. 186).

    Exemplo: a importncia das escolas profissionais,preparadoras de mo-de-obra para o setor produtivo: aimportncia, hoje em dia, da formao operria e tcni-ca no interior da indstria; enfim, a escola como instn-cia disciplinadora da fora de trabalho. 10

    Revista de Administrao de Empresas

  • 3. METODOLOGIA

    Nosso objetivo: estudar o processo de trabalho no inte-rior da grande indstria, a partir de um quadro terico-metodolgico centrado na questo do poder e do contro-le e a resposta ou "reao" dos que 810 institudos pelainsttuo-fbrica.'!

    Em primeiro lugar, faz-se necessrio apresentarmos anossa defno de dois conceitos-chave - processo detrabalho e instituio (ou organizao) - e, em seguida,apresentarmos as diretrizes bsicas de nossa metodologiae suas possibilidades de teste emprico.

    importante salientar que "o processo de trabalhosurge como um locus privilegiado de expresso das con-tradies que regem as relaes capitalistas de produo,dada a sua dupla natureza: de ser um processo, simulta-neamente, de fabrcao de mercadorias dotadas de utili-dade social (valor de uso) e de produo de valor exce-dente (processo de valorizao)".

    "No primeiro sentido, todas as sociedades produzematravs de processos de trabalho, mas a caracterstica es-pecfica do processo de produo capitalista que nele asegunda natureza domina a primeira, isto , o processode fabricao de mercadorias apenas um meio para oprocesso de valorizao ou de criao de valor exceden-te. A contradio fundamental entre capital e trabalhoque permeia as relaes sociais numa sociedade capitalis-ta expressa -se em vrios planos dessas relaes: na estru-tura econmica, na estrutura poltica e no nvel das ideo-logias. Pode-se aflrmar, porm, que a base material de l-tima instncia em que se baseia tal contradio funda-mental est na dupla dominao que o capital procuramanter sob o trabalho: na forma da propriedade dosmeios de produo e na forma do controle real sobre oprocesso de produo (Pereira, 1979, p. 20; grifo nosso).

    Nesse sentido, iremos analisar o processo de traba-lho sob a tica do processo de acumulao (produo dosobretrabalho) que envolve, necessariamente, o estudodas estratgias gerenciais de um controle real e efetivosobre o processo de produo, visando, obviamente, amaximzao da produo do valor excedente.P

    Em outras palavras, isso quer dizer que "no en-tendemos por processo de trabalho apenas as condiesmateriais ou tecnolgicas em que se realiza a fabrica-o de mercadorias, mas consideramos elemento essen-cial a esse processo a forma social de organizao do tra-balho em que a produo se realiza" (Pereira, 1979,p. 21 ;grifo nosso); e, evidentemente, trazer toma a res-posta (reao) dos trabalhadores, no interior das unida-des produtivas, a tal tipo de estratgias patronais. 13

    O nosso conceito de instituio (ou organizao)parte do pressuposto de que ela ''um conjunto articu-lado de saberes (ideologias) e prticas (formas de inter-veno normaHzadora na vida dos diferentes grupos eclasses sociais). Estes conjuntos (nsttues) permeabi-lizam grande parte das atividades humanas dentro da so-ciedade, em cada bloco histrico. Esta rede de institui-es viabiliza a hegemonia e, portanto, a manuteno detoda a imensa infra-estrutura que sobre ela repousa, pa-ra retormar, invertida, a imagem clssica. Neste sentido,trata-se de ver as nsttuies como conjunto articulado,como ligao vital de saberes e prticas com efeitos fun-damentalmente polticos, envolvendo uma estratgia de

    Pesquiso qUIlHtlltiJlIl

    luta - no necessariamente aberta - entre grupos e clas-ses sociais constitutivos destas instituies e inseridos emum bloco histrico" (Luz, 1979, p. 31).

    O conceito de organizao - fbrica - envolve, co-mo diz Foucault, lucro e subpoder, ou melhor, sobrelu-cro e subpoder, os micropoderes que permeiam toda ainstituio e "a resistncia e a contra-hegemonia comoreverso necessrio" (Luz, 1979, p. 31).

    Para se entender a natureza da organizao tem-seque ir alm do .~dito", do normalizado, enfim do sistemaburocrtico explcito, para fugirmos s armadilhas fun-cionalistas do tipo "disfunes da burocracia"; necess-rio enxergar mais longe e ver as nsttues como "n-cleos especficos de poder" que tm por fnaldades bsi-cas a funo de "formar, controlar e reprimir".

    A funo de controle e punio tem por objetivosprincipais tomar os corpos dceis, produtivos e discipli-nados (Garcia, 1982), enquanto em funo de formar "ainstituio - escola, hospital, caserna, escritrio (e em-presas em geral) - no reprime, molda. No est interes-sada em punir, em excluir, mas em integrar. Apenas olhacom desconfiana o aluno irlsubmisso, o paciente ind-cil, o soldado indisciplinado, o funcionrio indolente.Cada um tem potencialmente os quatro defeitos. Essasnegatividades podem dar nascimento quebra da disci-plina, da ordem e da hierarquia. Apontam j para odes-viante. Indcil pode ser o paciente que pergunta, o 'cria-dor de caso'. Insubmisso o aluno questionador. Indisci-plinado o aluno que no respeita horrios, lugares, re-gras concernindo o tempo e o espao da escola. Tudo is-to pode ser aplicado ora a um, ora a outro agente da ins-tituio" (Luz, 1979, p. 38) mas, por outro lado, confor-me falvamos anteriormente, o institudo (operrio, fun-cionrio, aluno etc.), vislumbra formas de contra-hege-monia, de resistncia, enfim de subpoderes.

    Do ponto de vista metodolgico, como no poderiadeixar de ser, o nosso trabalho distancia-se bastante dasanlises funcionalistas e estruturalista (tanto do pontode vista weberiano como do marxista), haja vista que,enquanto, na primeira, os estudos de organizaes tm-se"reduzido descrio de sistemas e meios, a conjuntosde normas especializadas que remeteriam, finalmente, aFins Ideais (Valores Sociais) cuja encarnao se faria noEstado", ou, em outras palavras, na "Ordem Social", oque resultaria, obviamente, em uma percepo da visfodominante e do discurso da Ordem e do Poder, na segun-da "acaba-se vendo o aspecto estrutura como reflexo dadominao", ou seja, a nica alternativa de mudanaacabaria sendo a "desinstituciona1izafo radical da socie-dade" (Luz, 1972, p. 25-6) - o que, diga-se de passagem,est no plano das utopias! !14

    sendo assim, a nossa metodologia (ou mtodo), nafalta de um nome mais apropriado, poderia ser caracteri-zada como histrico-discursiva, pois, ao mesmo tempoem que trabalhamos com o CQnjunto dos dados histri-cos relativos a uma determinada organizao (e sua art-cutafo com a histria poltica das instituies), ela ori-enta nossa investigao emprica para "as fissuras inter-nas" das prticas organizacionais; para as "respostas dosque 510 irlstitudos por essas prticas. Tais respotas in-cluem todas as formas de resistncias e podem variar dobloqueio l sabotagem, de oposio rejeio aberta das

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  • normas e dos discursos dominantes", ou seja, ela busca"exprimir as contradiGes institucionais tanto a nveldiscurso/prtica e a nvel interno do discurso, como a il-vel das respostas daqueles que a instituifo social tentaenquadrar" (Luz, 1979. p. 26).

    Em um trabalho recente, realizado numa grande em-presa multinacional europia (pa~s et alli, 1979), ou au-tores, de certa forma, utilizam essa mesma metodologia,apresentando-a, porm, com o nome de "um mtododialtico de anlise de contedo", em que os pressupos-tos metodolgicos bsicos so:

    - carter dialtico do objetivo de discurso e de anlise;- discurso 'objetivo' ou 'subjetivo';- discurso individual, discurso coletivo;- estatuto do tema, unidades de discurso e tratamentodas conexes;- os grficos de Interpretaes" (Pags et al, 1979 p.208).

    Esses pressupostos metodolgicos ro priVilegiar umsistema de 11 variveis, a saber: a) a instncia do econ-mico; b) o sistema tcnico e cientfico ; c) o processo de-cisrio; d) a ideologia; e) a poltica de pessoal; 1) o pro-cesso de trabalho propriamente dito; g) o plano decarreira; h) os conflitos e rivalidades intergrupos; i) aidentidade; j) a palavra e o espao organizacional; 1) aempresa versus a sociedade global (Pags et alii, 1979) -ou seja, essas variveis que iro' operacionalizar o m-todo hist6rico-discursivo por ns apresentado anterior-mente, bem como a forma de trat-los ser a contra-induo!5 ou, na linguagem -de Pags e colaboradores,"a dialtica deduo-induo".. A ttulo de ilustrao e para mostrarmos as reais

    possibilidades de um teste emprico do nosso quadroterico-metodolgico, comentaremos alguns dos resul-tados encontrados nessa grande empresa multinaconaleuropia, localizada na Frana, bem como os resulta-dos encontrados em uma pesquisa realizada em duasgrandes empresas atuomobilsticas no Brasil (84'0 Ber-'nardo do Campo, SP), utilizando, tambm, a estratgiametodolgica histrico-discursiva (Humphrey, 1981).

    Quanto primeira pesquisa (Pags et alii, 1979), osautores, pesquisando (atravs da aplicafo de entrevistasabertas e no-estruturadas aos diversos estratos hierr-quicos da empresa) o sistema de poder na organizaf'o,depararam com respostas do tipo "eu amo e eu detestoTLTX" ,16 "Eu sou explorado de uma maneira agrad-vel" e, ao mesmo tempo, com respostas do tipo "TLTX uma sociedade humana onde se consideram os indiv-duos", o que vem conflrmara adoo do pressupostometodolgiCo de se analisarem as caractersticas dialti-cas do objeto de discurso e de anlise, ou seja, temos queestar bastante atentos s caractertsticas contraditrudo entrevistado vis--vis s contradies da sociedade eno, como falvamos na introduo deste trabalho, fi-carmos apegados a conceitos desgastados e estticos co-mo a "dominao em geral" e seu corolrio dominante/dominado.

    l! necessrio ir ~ alm e detectar que, no caso daTLTX, polticas semelhantes da empresa provocaramreaes positivas e negativas; a poltica de pessoa, por

    180

    exemplo, promoveu vantagens para um segmento ougrupo e desvantagens para outro, a ideologia, os grandesprincpios foram criticados por uns e aprovados por ou-tros etc. (Pags et alii, 1979).

    A pesquisa realizada no setor automobilsticobrasi-leiro confirma essas "contradies", dadas; prncpal-mente, as diferenas signifiCativas no interior das inds-trias pesquisadas entre o operrio qualificado por um la-do e, por outro, o operrio semiqualificado e no-qual-ficado. Em linhas gerais, quanto s polticas de pessoaldas empresas pesquisadas, o autor conclui que: "a)quan-to mais o trabalho a ser executado for suscetvel de espe-cfcao, menos incentivos tero que ser oferecidos aostrabalhadores; b) quanto maior for a qualfcao reque-rida, maior ser a necessidade de incentivos e menor sera necessidade de controle direto do ritmo de trabalho.Isso bastante visvel na ferramentaria, onde as tarefas810 flexveis e os ritmos de trabalho no controladosestritamente; c) quanto maior for a responsabilidade dostrabalhadores, mais cuidado deve tomar a administrao,de modo a assegurar a realizao adequada das tarefas.Por exemplo, em certos setores da indstria qumica, s!opagos altos salrio e despendidos grandes esforos paradar aos trabalhadores a conscnca de sua responsabili-dade, em virtude da importncia da superviso constantede processos contnuos, perigosos e caros; d) quantomaior for a escassez de mo-de-obra, maior ser a neces-sidade de utilizar incentivos, em lugar de controle dire-to dos trabalhadores. Isso fica bem claro no caso dosoperrios qualificados no Brasil. Os administradores ad-mitem que eles 810 mais difceis de controlar que ossemiqualificados ou no-qualflcados; e) quanto maiorfor a fora das organizaes dos trabalhadores e maior aliberdade poltica de tais organzaes, maior ser a ne-cessidade de incentivos, porque o poder de controle dire-to por parte da admnstrao ser reduzido" (Humphrey,1981, p. 45; grifo nosso). Esses indicadores, de per sijdefmem quo heterogneas slfo as polticas da grandeindstria no Brasil, independentemente das tecnologiasadotadas, pois, pelas razes aqui esboadas, pode-se con-cluir que existem "grandes diferenas, mesmo no interiordo chamado 'setor moderno' da indstria e no h deter-mnao das polticas de emprego pelo tipo de tecnolo-gia empregado'! (Humphrey, 1981,"p. 45).

    Em relao nossa pesquisa propriamente dita, pro-pomos, enquanto estratgia metodolgica para nossa in-vestigafo, as seguintes variveis:

    a) sistema disciplinar da empresa;b) processo de trabalho;c) poltica de pessoal..d) plano de carreira (cargos e salrios);e) tcnicas de integra!o (cooptao);1) conflitos (interpessoal e intergrupal);g) breve histria da organizaA'o e evoluo do movimen-to sindical.

    Por se tratar de uma pesquisa em que as anlises se-ro, fundamentalmente, de natureza qualitativa, opta-mos pelo mtodo do estudo de caso nas seguintes nds-trls: Usiminas, Belgo-Mineira,. Mannesman e Acesita -basicamente pelo porte e a dmenso que elas represen-tam no subsetor siderrgico da metalurgia mineira.

    Revista de Administrao de Empresas

  • A operaconazeo das variveis far-se- atravs detrs instrumentos metodolgicos, a saber:

    1. Uso de fontes secundrias para:

    a) levantamento e reconstruo hstrca da evoluotcnica e organizacional das indstrias a serem pesquisa-das;b) levantamento e reconstruo histrica do movimentosindical relacionado com os casos estudados.

    2. Observao direta no-participante da organizao dotrabalho e da tcnica adotada nas unidades de produo.Os aspectos relevantes nesta observao sero:

    a) observao da localizao espacial das empresas e doconjunto habitacional dos operrios;b) observao da organizao do processo produtivo glo-bal - etapas do processo;c) observao dos postos de trabalho - trabalho indivi-dual e/ou em grupo, uso de mquinas e/ou ferramentas;d) situao dos operrios em relao ao ambiente coleti-vo de trabalho densidade de trabalhadores, temperatura,rudo, vibrao, atmosfera e periculosidade;e) situao dos operrios em relao carga fsica do tra-balho - postura e esforo fsico;f) situao dos operrios em relao carga mental dotrabalho - atividade sensorial dominante (destreza, ten-so visual ou auditiva);g) situao dos operrios em relao ao tempo de traba-lho - ritmo, durao das pausas, tempo no-produtvoe cadncia (dependente da mquina ou do indivduo).

    3. Entrevistas abertas e parcialmente gravadas com:

    a) dirigentes;b) operrios - de acordo com a classfcao hierrquicaestabelecida internamente pela empresa;c) dirigentes sindicais.

    Em linhas gerais, portanto, acreditamos que a meto-dologia histrico-discursiva, ao privilegiar, principalmen-te, o discurso individual e coletivo, o discurso objetivo esubjetivo, as caractersticas "dialticas" do objeto do dis-curso e do objeto de anlise e centrando o seu inquritoem entrevistas no-estruturadas e informais, num mo-mento com os funcionrios do capital (elites organizacio-nais) e, num outro momento, junto aos trabalhadores di-retamente ligados produo - operrios, contramestrese supervisores - estaremos mostrando os subpoderes, osmicropoderes que atuam e do significado, quer ao "pro-cesso de valorizao" e ao "processo de acumulao" decapital, quer aos movimentos de resistncia, de combate,de luta, de uma estratgia de contra-hegemonia levado acabo pelos trabalhadores.!?

    4. CONCLUSOES

    Em primeiro lugar: entender as organizaes como locusde resposta s contradies, onde as estratgias gerenciaisbuscam o efeito e o alcance da integrafo; entendercomo um sistema dinmico onde, ao mesmo tempo, se"ama" e se "odeia", se realiza e (ou) se 6 excludo, onde'

    Perqui14 qualitativa

    se tem "prazer" e "angstia"; enfim, compreender asorganizaes, no como ''um conjunto de dados, objeti-vos, capital, dificuldades, mo-de-obra, procedimentosetc., onde se limita a constatar a existncia de uma pers-pectiva possitivista, bem como em estudar as articula-es sistmcas ( ... ) A organizao , isto sim, um con-junto dinmico de respostas s contradies ( ... ) Niose pode compreender como nasce e se transforma umaorganizao .sem fazer referncia ao seu fundo negativo,mo numa perspectiva positivista, mas dialtica. A orga-nzao , nada mais nada menos, do que uma vasta 'zo-na intermediria' que se interpe s contradies de elas-se, evita ou atenua os conflitos, os absorve e os integradentro de um sistema Social unificado, mas constante-mente sustentada e produzida por eles" (Pags et ali,J979, p. 30-1;grifo nosso).

    Em segundo lugar: entender o poder na sua formamicro, no atrelado ao poder de Estado e seus aparelhos,mas como uma multiplicidade de correlaes de fora,como luta e combate, como um circuito em rede, deuma forma ascendente; enfim, como algo que permeiatodo o tecido social, no como algo repressivo, mas, pelocontrrio, localizando seus efeitos, suas estratgias etc.

    Finalmente, em terceiro lugar: abandonar a dicoto-mia tradicional/moderno em relao ao setor industrial,pois no acreditamos, juntamente com Humphrey(1981), no determinismo da tecnologia, ou seja, mudan-as nos padres tecnolgicos no promovero mudanassignificativas lias relaes de trabalho.

    A estratgia no local, regional ou nacional; a es-tratgia universal, independentemente de tecnologiasmais ou menos sofisticadas. O processo de trabalho no diferente na indstria automobilstica de Detroit, Milloou So Paulo. Como diz Foucault, onde houver lucro,haver, necessariamente, subpoderes. Essa a estratgiaglobal.

    Anexo 1

    Roteiro orientador das entrevistas com os dirigentes dasempresas a serem pesquisadas: gerentes - administrati-vo, recursos humanos e deproduo,

    1.Dados gerais - GA1.1 Capital social1.2Data da fundao1.3 Estrutura de propriedade: capital nacional - estatal

    privadocapital internacional

    2. Estrutura organizacional - GA2.1 Organograma2.2 Existe uma poltica de estilos gerenciais?2.3 Breve hstria da organizao: principais transforma-Oes.

    3. Controle da produo e da qualidade - GP3.1 Formas e mtodos de controle: ECG, GSA, CCQ,taylorismo-fordismo3.2 sistema de prmios

    181

  • 4. Poltica de cargos e salrios - GRH4.1 Classificao de pessoal4.2 Estrutura de salrios: hora, mensal (percentagem daFT empregada)4.3 Subcontratao de mo-de-obra4.4 Evoluo do mercado de trabalho

    5. Poltica de recursos humanos - GRH5.1 Recrutamento e seleo5.2 Treinamento5.3 Indices de absentesmo e tum-over (detectar as prin-cipais causas - por exemplo: doena)5.4 Poltica de bem-estar social5.5 Sistema de promoo interna

    6. Outros problemas na gerncia de mo-de-obra - GRH6.1 A aplicao de penas disciplinares muito freqen-te? Se sim, quais os principais motivos?6.2 Greves6.3 Relacionamento com os sindicatos6.4 Indces de segurana no trabalho6.5 Poltica da empresa em relao insalubridade e aoambiente fsico do trabalho

    Anexo 2

    Roteiro das entrevistas com os operrios

    1.Dados gerais1.1 Idade1.2 Sexo1.3 Estado civil1.4 Local de habitao (nome do bairro- operrio oumio)

    2. Caractersticas do posto de trabalho (saber o eixoestratgico)2.1 Nome do posto2.2 Qualificao profissional2.3 Salrio2.4 Formas de aprendizado das tarefas2.5 Causas de acidentes de trabalho2.6 Qual o principal problema de seu trabalho?2.7 Em que momento do trabalho voc recorre ao mes-tre ou contramestre?2.8 Vnculo empregatcio: contratao u subcontra-tao

    3. Cadncia de trabalho (explorar o mximo possvel to-dos os comportamentos que indicam formas de resis-tncia)3.1 Vore trabalha sempre no mesmo ritmo?3.2 Existem trabalhadores que trabalham mais rpidoque os outros? Por qu?3.3 Quem decide quanto voc vai produzir por dia?3.4 Existem instrues de segurana? Voc as respeita ouno? Por qu?3.5 O tempo que voc. tem para realizar sua tarefa esta-belecido pela chefia?

    4. Qualidade do trabalho (ver percentagem de erros, cau-sas, tipos etc.)4.1 Como controlada a qualidade de seu trabalho?

    182

    4.2 O que o supervisor ou mestre faz quando a qualidadeno obedece aos padres?

    5. Horrio de trabalho5.1 Como estabelecida a jornada de trabalho? (turno:fixo ou varivel)5.2 A empresa adota o sistema de horas extras?

    6. Estabilidade no emprego6.1 H quanto tempo voc est na empresa?6.2 E na anterior?6.3 Foi demitido ou pediu demisso da empresa ante-rior?6.4 ~ fcil trocar de emprego dentro da sua especiali-dade?

    7. Sindicalizao7.1 Para que serve um sindicato?7.2 O que voc acha do seu sindicato?7.3 Voc participou das ltimas greves? Por qu?

    8. Percepo do operrio sobre as novas formas de orga-nizao do trabalho8.1 Qual a sua reao frente aos GSA ou CCQ?8.2 Existe rotatividade de funes?8.3 A hierarquia muito rgida? (ir ao banheiro)8.4 O que voc acha do sistema de promoo?8.5 O que voc acha do sistema de controle?8.6 Voc participa de alguma deciso? (operacional)8.7 O que voc acha dos benefcios indiretos que a em-presa oferece? Todos os operrios podem usufruir dessesbenefcios?8.8 Quais as formas espontneas de resistncia s metasfixadas pela chefia?8.8.1 Operao zelo8.8.2 Operao soluo8.8.3 Operao acidente8.8.4 Ludismo8.8.5 Operao gato selvagem8.8.6 Operao mosquitinho8.8.7 Operao espionagem8.8.8 Comunicao horizontal8.8.9 Existem outras de que voc j participou?

    9. Voc teria alguma coisa a mais a dizer sobre o seu diade trabalho?

    Anexo 3

    Roteiro orientador para a entrevista com os dirigentessindicais

    1.Dados gerais1.1 Nome do sindicato1.2 Data da fundao1.3 Nmero de sindicalizados

    2. Estrutura organizacional2.1 Nmero de funcionrios2.2 Estrutura propriamente dita - departamento, divi-ses etc.2.3 Pessoal especializado - mdico, dentista, advogadoetc.2.4 Pessoal administrativo

    Revista de Administrao de EmpTf!lIJf

  • 2.5 A diretoria j fez cursos? Se sim, quais? No Brasil?No exterior?2.6 H quantos mandatos o(s) diretor(es) esto exer-cendo o cargo?

    3. Reconsttuo histrica do movimento sindical

    4. Atua'o do sindicato4.1 Em relao s polticas govemamentais4.2 Em relao s empresas4.2.1 Qual a percepo do sindicato em relao ao estilogerencial?4.2.2 Qual a estratgia do sindicato em relao a essasnovas formas de gesto?

    1 A questo do poder, na obra de Marx, est superficialmenteanalisada em apenas dois textos, que tratam da Comuna de Parise do Bonapartismo, mas que do bem a dimenso do poder en-tendido como poder de Estado e seus aparelhos. Consultar Marx,K. LeI tuttes de classe en France. Paris, Sociales, 1974; e O 18Brumrio de Lus Bonaparte. In: OI pensadores. So Paulo,Abril, 1974. A problemtica de uma teoria poltica em Marx pos-sui um amplo espectro, bem como uma extensa bibliografia que,por motivos bvios, no cabe aqui comentar; mas uma sntesede toda a discusso, de uma forma brilhante, pode ser encontra-da em: Bobbio, N. et ali. Marxismo e Estado. Rio de Janeiro,Graal,1979.

    Sobre o conceito de poder, sob a tica golpista do leninis-mo-stalinismo, bem como uma extensa crtica a essa abordagem,consultar: Garcia, Fernando C. Pantos polfticos e teoria da or-ganizao. So Paulo, Cortez e Moraes, 1979.

    Para uma anlise mais recente dos desdobramentos do mar-xismo-leninismo-stalinismo, na Unio Sovitica, uma crtica radi-cal se encontra em: Levy, B.H. La barbarie viSllge humilin. Pa-ris, Grasset, 1977; Benoist, J .M.Marx e,t morto Paris, Gallimard,1979; e, principalmente, em: Glucksman, A. La cusnre et lemangeur d'hommes; essal sur L~tat, le marxisme, les camps deconcentration, Paris, Seuil, 1975.

    Para uma compreenso da anlise do poder e autoridade naviso weberiana, consultar; Weber, Max Economia y Sociedad.Mexico, Fondo de Cultura Econmica, 1969. Ver, em especial,captulos 8 e 9, p. 661-1.046.

    Um resumo enrquecedor da obra de Weber, sob a perspec-tiva do poder e da autoridade, est em: Martin, Roderick. Socio-logia do poder. Rio de Janeiro, Zahar, 1978.

    2 Zald, Mayer N., ed. Power in organizations. Nashville, Vander-bilt University Press, 1970; Blau, P. & Schoenherr, A.R. Thestrueture of organization. New York, Basic, 1971; Weick, K.E.The social psychology of organizing. Massachusetts, AddisonWesley, 1969.

    Uma resenha comentada das vrias tendncias funcionalis-tas e empiricistas, ao tratar o eonceito de poder em organizaesformais, encontra-se em: Bacharach, S.P. Morphologie et proces-sus: une critique de la recherche organisationnelle contemporai-ne, Sociologie du Travail, Paris, 20(20):153-73, avr./juin 1978.

    3 Mills, C.W. A imaginao sociolgica. Rio de Janeiro, Zahar,1969. Mi11s~ironizando a obra bsica do funcionalismo - Thesocflll system, de Talcott Parsons - conclui: "Nesses termos,a idia de conflito no pode ser formulada efetivamente. Osantagonismo estruturais, as revoltas em grande escala, as revo-lues - no podem ser imaginados. Na realidade, supe-seque o 'sistema', uma vez estabelecido, mfo s estvel comointrinsecamente harmonioso; nessa linguagem, as perturbaes

    Pesquisa qualitativa

    tm de ser 'introduzidas no sistema'. A idia da ordem norma-tiva assim apresentada nos leva a supor uma espcie de harmo-nia de interesses como caracterstica natural de qualquer socie-dade; tal como surge aqui, essa idia uma ncora metafsica,tal como o foi a idia semelhante entre os filsofos da ordemnatural, no sculo XVIII" (p. 51).

    4 "Mas os problemas realmente comeam quando se deseja sa-ber o que significa 'estar por baixo' no Brasil. Ser que aqui asociedade se divide claramente em dominantes e dominados,tendo o corte conceitual e poltico um correspondente econ-mico, residencial e tcnico, ntido?

    Ser que, entre ns, dpmmantes e dominados se encar-nam em grupos homogneos e visveis material e politicamen-te? Ou ser que as categorias 'dominante e dominado' formamo que Evans-Pritchard chamou de 'oposio segmentar'? Defato, se no caso da sociedade brasileira pode-se pensar a oposi-o dominante/dominado como um par segmentrio, ento te-remos possibilidades bsicas de relativizao, j que a segmen-tao remete a grandes inconsistncias entre os grupos e suasrelaes com os recursos de poder que controlam. No Brasil,ento, a dicotomia 'dominante/dominado' tenderia semprea se repetir no interior de cada termo, sendo sempre relativaa quem o aplica, como est sendo aplicada e para que seaplica (... ) Se estamos interessados no mundo real, querendodescobrir a sua diilmica concreta, ento verificamos logo que'dominante' e 'dominado' so dois termos complexos j queentre OI 'dominantes' existem 'dominados' e 'dominantes', omesmo ocorrendocom os 'dominados' (Da Matta et alli, 1982,p. 18-9;grifo nosso).

    E, mais adiante, continua o brilhante antroplogo: "Poisbem, nesta perspectiva no seria justo dizer que temos 'domi-nantes' e 'dominados' em todas as reas da sociedade? Na fam-lia e na universidade, nos partidos polticos e na fbrica, no sin-dicato e na igreja, entre empresrios, fmancistas e fazendeiros?E at mesmo no interior do prprio grupo que detm o poderpoltico e o monoplio da fora? Ou seja: onde quer que exis-ta uma organzao, essa dicotomia tende a surgir como modo decompensao social, e uma gradao imediatamente estabele-cida entre 'quem est por baixo e quem est por cima (. .. ) As-sim, o procedimento de um subalterno ou inferior idntico aodo superior, s que o ltimo pode usar um sonoro 'voc sabecom quem est falando?', e o primeiro tem que apelar para aviolncia e para a fora bruta. A idia a mesma, mas os meiosso diferentes" (Da Matta et alli, 1982, p. 20-41).

    S "A introduo em grande escala da maquinaria, na primeirametade do sculo XIX, percebida pelos operrios como umataque direto ao qual reagem quebrando as mquinas. .So der-rotados, mas imprimem uma forma de luta nas fbricas: a resis-tncia produo. O capitalismo responde generalizando o sa-lrio por pea e por rendimento. Ambos so novamente contes-tados atravs da constestao das normas. O taylorismo a res-posta capitlista: as normas sero determinadas cientificamentee 'objetivamente'. A resistncia operria consiste em demons-trar dia a dia que essa 'cientificidade' uma piada, pois, entreoutras coisas, possvel impedi-la de funcionar justamente por-que os trabalhadores conhecem as peas e as mquinas, seusproblemas e sua eficcia muito melhor do que os tcnicos 'dosmtodos'. A resposta capitalista nfo se faz esperar: a psicolo-gia e a sociologia industriais, o malsinado DRH, devem 'integrar'os operrios empresa. Os operrios burlam o 'saber' dos cientis-tas sociais. O capitalismo dos pases avanados encontra a respos-ta: superexplorao da mais-valia na 'periferia' e concesso desalrios mais altos, menores jornadas de trabalho e, em alguns ca-sos, co-gesto para os operrios do 'centro' (Chau, 1981, p. 140).

    E, sobre a dignidade do trabalhador, a fllsofa continua suacrtica avassaladora, perguntando "quais os contedos dessa dig-nidade? Inicialmente, ela a dignidade do trabalhador enquantoser.humano (que por isso exige salrios, condies de emprego ede trabalho dignos de uma existncia humana e no para umamera sobrevivncia biolgica). Ela , tambm, a dignidade daque-les que se sabem produtores da riqueza apropriada por -umpunhado de exploradores organizados (e por isso a greve surgecomo demonstrao desse conhecimento). Ela , ainda, a digni-dade daquele que conhece seu ofcio e contra quem o patronatolanou o poder dos 'mtodos' e do DRH (por isso, a exigncia de

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  • participao na produo aparece como correo, a curto prazo,da alienao em que o trabalho se encontra submetido). Mas ela, sobretudo, o reconhecimento do direito de agir e pensar semtutela, seja esta qual for e venha de onde vier, pois os trabalhado-res no so apenas 'mos', porm cabeas pensantes" (Chau,1981, p. 209).

    Sobre a problemtica da democracia participativa no mbi-to das fbricas e sua articulao com a teoria poltica clssica,consultar, para maior aprofundamento: Macpherson, C.B. A de:mocracia liberal; origens e evoluo, Rio de Janeiro, Zahar, 1978.

    6 "No cerne da antipsiquiatria existe a luta com, dentro e contraa instituio" (Foucault, 1979, p. 126). Sobre o movimento daantipsiquiatria consultar, entre outros: Szasz, T.S. A ideologill dadoena mental. Rio de Janeiro, Zahar, 1977; Laing, R.D.A polt-tica da familia. Lisboa, Portuglia, 1973; Cooper, D. Psiquilltriae anttpstqutatrta. So Paulo, Perspectiva, 1978.

    Sobre a questo do "novo sindicalismo" como reao (res-posta) ao sindicato corporativista, consultar: Moiss, J.A. A es-tratgia do novo sindicalismo. Revista de Cultura e Polttic,So Paulo, 2(5/6):59-79, abr.fset. 1981; Frederico, C.A vanguar-da operria. So Paulo, Smbolo, 1980; Tavares, M.H. Tendn-cias recentes da negociao coletiva no Brasil. Dados, Rio deJaneiro, 24(2):161-90, maio/set. 1981 ; Rodrigues, Lencio M.et alii. Trabalho e cultura no Brasil. Braslia, CNPq/ Anpocs,1981; Lamounier, B. & Souza, A. Governo e sindicatos no Brasil:a perspectiva dos anos 80. Dados, Rio de Janeiro, 24(2):139-60,rnaio/set. 1981; Sader, E. & Sandroni, P. Lutas operrias e tticasda Burguesia. Cadernos PUC de Economia, So Paulo, 3(7) :1343,maio 1981.

    Numa passagem das mais interessantes do trabalho de Sader& Sandroni, os autores, dissertando sobre a greve de 1978, re-produzem uma entrevista de um operrio em que ele afirma que"foi uma deciso espontnea do pessoal do turno diurno da se-o de ferramentas. Os trabalhadores do turno da noite estavamsaindo, quando os do turno seguinte entraram, mas no ligaramas mquinas (... ) Entre as 7 e as 8 da manh ficamos de braoscruzados diante das mquinas sem fazer nada. s 8, chegou ogerente-geral. Ele certificou-se de que os cartes estavam marca-dos, de que havia luz, mas de que ningum estava trabalhando.Aquilo lhe pareceu estranho, mas no acreditou que se tratava deuma greve. Creio que ele no entendeu o que estava acontecen-do, pois jamais poderia imaginar que ocorreria 'uma greve. Foiuma surpresa!" (p. 27).

    7 O melhor estudo que conhecemos, realizado no Brasil, o deHumphrey, J. Controle capitalista e luta operrill na indstrill au-tomobilstica. Petroplis, Vozes, 1982.

    8 "Existe atualmente um grande desconhecido: quem exerce opoder? Onde o exerce? Atualmente se sabe, mais ou menos,quem explora, para onde vai o lucro, por que mos ele passa eonde ele se reinveste, mas o poder (... ) Sabe-se muito bem queno so os governantes que o detm. Mas a noo de 'classe diri-gente' nem muito clara nem muito elaborada. 'Dominar', 'di-rigir', 'governar', 'grupo no poder', 'aparelho de Estado' etc., todo um conjunto de noes que exige anlise. Alm disso, serianecessrio saber at onde 'se exerce o poder, atravs de que reve-zamentos e at que instncias, freqentemente nfimas, de con-trote, de vigilncia, de proibies, de coeres. Onde h poder,ele se exerce. Ningum , propriamente falando, seu titular; e, noentanto, ele sempre se exerce em determinada direo, com unsde um lado e outros de outro; no se sabe ao certo quem o de-tm; mas se sabe quem no o possui" (Foucault, 1979, p. 75).

    9 Nos EUA existem, hoje, mais de 2 mil grandes e mdias empre-sas em que as tcnicas dos CCQ (Crculos de Controle de Quali-dade) foram implantadas; sabemos, tambm, que essa tcnica"participativa" foi desenvolvida no incio dos anos 60.no Japlo,onde existe mais de i mlho de CCQ. Para maiores detalhes,consultar: Ouchi, William. Teorill Z; como as empresas podemenfrentar o desafio japons. So Paulo, Fundo Educativo Brasi-leiro, 1982.

    No Brasil, como era de se esperar, a moda est em plenaascenso, como mostra uma extensa reportagem publicada narevista Exame (de 25 de agosto de 1982); s para se ter uma

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    idia, existem 400 empresas que j implantaram defntvamen-te' os CCQ, dentre elas empresas do porte de Ford, Metal Leve,Rhodia e Souza Cruz.

    10 Sobre a importncia da escola na preparao de uma mo-de-obra dcil e disciplinada, consultar: Bourdieu, P. & Passe-ron, J.C. A reproduo. Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1975;Durand, J.C., org. Educao e hegemonill de classe. Rio deJaneiro, Zahar, 1979; Boudon, R. Efeitos perversos e ordemsoetal. Rio de Janeiro, Zahar, 1979; Rossi, W.G. Capitalismoe educao. So Paulo, Cortez e Moraes, 1978; Tragtemberg,M. Sobre educao, polftica e sindicalismo. So Paulo, Cortez,1982; Arroyo, M.G. Administralo da educao, poder e parti-cipao: Educa4'o e Sociedade, So Paulo, 2(1): 3646,jan./abr.1979.

    I I, Esse trabalho faz parte de uma pesquisa emprica a ser real-zada no setor siderrgico de Minas Gerais, tendo como amostraas quatro principais usinas em operao, sendo duas do setor pri-vado (ambas multinacionais) e as outras duas do setor estatal.

    12 Didaticamente, podemos dizer que o processo de trabalho"pode ser definido como um processo pelo qual matrias-pri-mas, ou outros insumos, so transformados em produtos comvalor de uso. Esse processo uma combinao de trs elementos:atividade humana, ou trabalho; matrias-primas etc.; ferramen-tas ou maquinaria cada vez mais complexa". Para maiores deta-lhes, consultar o trabalho de Palloix, C. O processo de trabalho:do fordismo ao neofordismo. In: Tronti, Mario et al. Processode trabalho e estratgills de classe. Rio de Janeiro, Zahar, 1982.

    Sobre a questo da subsuno formal do trabalho ao capi-tal ("forma geral de todo. processo capitalista de produo") eda subsuno real. do trabalho ao capital (modo especificamentecapitalista de produo; "a subsuno real do trabalho ao capitalse desenvolve em todas as formas que produzem mais-valia rela-tiva, diferentemente da absoluta") consultar: Marx, K. Livro I,Capftulo VI. So Paulo, Cincias Humanas, 1978.

    13 Entre essas estratgias, de maneira resumida, poderamos indi-car o jo~nrichment, os grupos sem-autnomos e os Crculosde Controle de Qualidade, no mbito do processo produtivo e,fazendo parte de uma estratgia mais global, a participao na ge-rncia, como a co-gestio, o delegado sindical e os Comits deEmpresa, sendo que essa ltima forma j est presente em vriasindstrias automobilsticas do Brasil.

    Chamamos a ateno, em relao a essas "novas" opes or-ganizacionais, que um balano e descrio de todas essas formas"participativas" no processo de produo sero objeto de umnosso estudo parte. importante frisar, no entanto, que existeuma "escassez relativa de estudos que tenham como objeto osprocessos conflitivos mais latentl's do que manifestos, mais im-pcitos do que explcitos, e no necessariamente organizados,que se do entre o operariado e os demais setores e classes s0-ciais. tambm, atravs desses conflitos mais 'surdos', que ooperariado tem a oportunidade de realizar seu aprendizadopol-tico e de chegar a constituir-se em urna fora socialmente signifi-cativa" (Pereira, 1979, p. 18).

    14 O "melhor" trabalho que conhecemos sobre organizao, uti-lzandoo mtodo funcionalista, o de Katz, D. & Kahn, R.L.Psicologia social das orgrznizQn.So Paulo, Atlas, 1970.

    Sobre o estruturalismo weberiano, a obra que ainda conti-nua clssica : Etzioni, A. An4IIse comparativa de orgoniza(1escomplexa . Rio de Janeiro, Zahar, 1974.

    Sobre o estruturalismo de corte mais marxista, a refernciaobrigatria. : Clegg, Stewart. The dleory of power an orgoniza-tion. London, Routledge & Kegan Paul,1979.

    Para um maior aprofundamento do tema, consultar, tam-bm, a obra clssica de Zwerrnan, W.New perspective on organi-zational theory; an empirica1 reconsideration of the marxian andthe classical analysis. Connecticut, Greenwood, 1970.

    No que diz resr:ito s utopias da desinstitujonalizao ra-dical da sociedade, e de fundamental importncia a obra de Lou-rau, R. An4Jj1e institucional. Petrpolis, Vozes, 1975, bem co.mo a de BOurdet, I. & Guillerm, A. Autogesto: uma mudilnaradlCIII. Rio de Janeiro, Zahar, 1976.

    Revista de Administrao de Empresas

  • I 5 A melhor cn tica que conhecemos aos mtodos clssicos depesquisa - dedutivo, indutivo e o hist6rico-dedutivo de PopPer- a de Feyrabend, Paul. Contra o mtoda; esboo de uma teo-ria anrquica da teoria: do conhecimento. Rio de Janeiro. Francis-co Alves, 1977.

    O mtodo que o autor defende a contra-indlcQtTo, ou se-Ja, "examinar o princpio em pormenor concreto significa tra1ardas contra-regras que se opem a algumas regras comuns do em-preendimento cientfico (... ) A 'contra-regra' aconselha-nos aintroduzir e elaborar hipteses que nio se ajustam a teoria:s fu-madas ou a fatos bem estabelecidos. Aconselha-nos a procedercontra-indutivamente" (pl 39).

    16 TLTX foi o nome dado pelos autores empresa pesquisada.

    17 "Acreditamos que os depoimentos operrios, ainda que im-budos de representaes e valores caractersticos de todo dis-curso ideolgico, constituem a maneira mais adequada de obter-mos as informa&s desejadas sobre as formas reais e concretasdo processo de trabalho, na medida em que 810 os trabalhado-res os agentes diretos das operaes tcnicas e o controle desuas atividades um objetivo fundamental da organizaio socialda produo" (Pereira, 1979, p. 30).

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