urbanizado e não urbanizado

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1 UNIVERSIDADE POLITÉCNICA A POLITECNICA Mestrado em Desenvolvimento e Ordenamento do Território URBANIZADO E NÃO URBANIZADO TRABALHO DE PESQUISA Mestrando: RUI FONSECA 1

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UNIVERSIDADE POLITÉCNICAA POLITECNICA

Mestrado em Desenvolvimento e Ordenamento do Território

URBANIZADO E NÃO URBANIZADO TRABALHO DE PESQUISA

Mestrando: RUI FONSECA

Maputo, aos 12 de Abril de 2011

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URBANIZADO E NÃO URBANIZADO

1. INTRODUÇÃO

Os fenómenos de crescimento urbano espontâneo e acentuado têm marcado nas

últimas décadas, os processos de urbanização em Moçambique. “A rápida urbanização e

concentração excessiva da população é fruto do crescimento demográfico, das migrações

voluntárias e involuntárias, das oportunidades de emprego reais e aparentes, das expectativas

culturais, das mudanças nos hábitos de consumo produção, dos desequilíbrios e das

disparidades entre as diversas regiões” (Agenda 2025). A Urbanização é uma tendência

irreversível no País. A Lei de Terras e seu Regulamento do Solo Urbano, a Lei do

Ordenamento do Território, o Pacote Autárquico e legislação complementar, estabelecem os

instrumentos de gestão e regulação dos processos de urbanização no País. Para a sua

aplicação prática, torna-se necessário interpretar correctamente a abrangência do processo de

urbanização, diferenciar correctamente o que é urbano do não urbano, distinguir as zonas de

urbanização consolidada, das zonas em processo de urbanização, as zonas de ocupação

espontânea das novas áreas de expansão planificada das cidades e ainda saber identificar

aqueles assentamentos humanos que, apesar de constituírem importantes aglomerados

habitacionais, não possuam contudo as características de áreas urbanizadas.

Este ensaio identifica alguns eixos para a correcta categorização de cada uma destas

manifestações de desenvolvimento dos assentamentos humanos urbanos que permitam

entender melhor as tendências do actual processo de urbanização espontânea em

Moçambique, planificar estratégias de intervenção para um melhor ordenamento do espaço

urbanizável e urbanizado, e ainda aplicar adequadamente os instrumentos de planificação e

gestão do solo urbano.

2. OBJECTIVOS

Constitui objectivo geral deste ensaio, identificar critérios de definição de áreas

urbanizadas e não urbanizadas, sua génese e desenvolvimento, e as condições de

transformação de espaços não urbanizados em zonas urbanizadas. São objectivos específicos

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do trabalho: a) Estudar a evolução histórica do conceito de urbanização; b) Identificar os

vários níveis de urbanização de um território e estabelecer as diferenças entre zonas

urbanizadas e não urbanizadas; c) Considerar critérios de abordagem da transformação de

espaços não urbanizados em zonas urbanizadas consolidadas.

3. HIPÓTESE

Os conceitos de urbanização e cidade têm evoluído ao longo da história recente do

Urbanismo, deslocando-se gradualmente de uma interpretação estruturalista e quantitativa de

cidade, para uma abordagem qualitativa e mais consequente com a capacidade de os

assentamentos humanos consolidados, proverem os seus habitantes de serviços e

infraestruturas urbanas necessários à melhoria constante da sua qualidade de vida e ao

desenvolvimento equilibrado e sustentável desses assentamentos.

4. URBANIZADO E NÃO URBANIZADO

4.1 O Conceito de Urbanizado

Numa abordagem primária, a Urbanização, pode ser vista como um processo de

afastamento das características rurais de um assentamento humano ou região, para

características urbanas. Em geral, este processo está associado ao desenvolvimento da

civilização, da produção industrial e da tecnologia. Em termos demográficos, o conceito

refere-se à redistribuição e fluxo das populações das zonas rurais para assentamentos

urbanos.

O termo também pode designar a acção de dotar uma área com infra-estruturas e

equipamentos urbanos. O Dicionário Aurélio - Século XXI define Urbanização como o

"conjunto dos trabalhos necessários para dotar uma área de infra-estrutura (por exemplo,

água, esgotos, electricidade) e/ou de serviços urbanos (por exemplo, de transporte, de

educação, de saúde)".

Em Moçambique, de acordo com o Decreto 60/2006 de 26 de Dezembro que

regulamenta a Lei de Terras nas áreas urbanas, o Solo Urbano é definido como: “toda a área

compreendida dentro do perímetro dos municípios, vilas e das povoações legalmente

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instituídas”. Daqui se infere uma definição de área urbanizada, na legalidade e administração

moçambicanas, como sendo, toda a área incluída nos perímetros daquelas divisões

administrativas, legalmente constituídas, definição esta que toma em consideração apenas o

critério geográfico/territorial, não considerando a capacidade de dotação dessas áreas de um

nível de infraestruturas e equipamentos urbanos susceptíveis de proporcionarem aos cidadãos

padrões mínimos de qualidade de vida e sustentabilidade social.

A urbanização vem sendo estudada por diversas ciências, como a sociologia, a

geografia e a antropologia, cada uma delas propondo abordagens diferentes ao problema do

crescimento das cidades, seu desenvolvimento e sua sustentabilidade. As disciplinas que

intervêm na cidade e procuram entender, regular, desenhar e planear os processos de

urbanização e crescimento das cidades são, o urbanismo, o planeamento urbano, o

planeamento da paisagem, o desenho urbano, entre outras. Urbanização e cidade são

conceitos interligados e que evoluíram paralelamente ao longo da história e com a ciência.

Não existe cidade sem urbanização, e o processo de urbanização conduz à formação e

desenvolvimento das cidades.

4.2 O Urbanizado na História

Apesar da necessidade de uma investigação mais profunda sobre a natureza das

primeiras cidades, há evidências que testemunham a preocupação do homem com a

organização hierarquizada de assentamentos humanos desde o 4º milénio antes de Cristo. Ao

longo dos grandes rios – Nilo, no Egipto, Tigre e Eufrates, na Mesopotâmia, Indo, na Índia, e

Huang- Ho, na China - se encontraram vestígios de aglomerados que representaram, mais que

pelo seu tamanho, a cidade como resultado de "uma enorme mobilização de vitalidade, de

poder e riqueza", (Lewis Mumford). Nessas primeiras manifestações urbanas, são já visíveis

definições de espaços construídos e de espaços de circulação, malhas ordenadas, com

rectículas de vias ortogonais, espaços centrais definindo as entidades mais representativas da

cidade, normalmente o palácio ou o templo. Na Índia, foram encontrados princípios de

planeamento da cidade, descritos na literatura mais antiga da região. No continente europeu,

os casos mais característicos e documentados datam do período grego e, posteriormente, do

período romano. Estas civilizações erigiram imponentes estruturas citadinas - particularmente

a civilização grega, onde a cidade-estado constituía uma unidade política independente.

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O processo de urbanização intensificou-se com a industrialização no século XIX que

induziu a criação de novos centros urbanos em áreas anteriormente rurais, o crescimento da

população urbana e o êxodo da população rural para as cidades industriais. Com o progresso

da motorização e dos transportes, as cidades tornaram-se cada vez menos dependentes das

suas áreas rurais adjacentes, uma vez que os alimentos poderiam ser transportados de

distâncias maiores. Ao mesmo tempo, isso exigiu cada vez mais trabalhadores nas indústrias

da motorização. A urbanização era, assim, tanto o resultado como a causa da Revolução

Industrial. Engels, citado por Benévolo (1997:565-566), faz uma descrição da realidade da

época, nomeadamente das recém urbanizadas cidades como, Manchester e Londres, onde se

constatavam consideráveis problemas sociais e ambientas como a pobreza, a falta de

habitação, equipamentos sociais insuficientes, falta de espaços de lazer, inexistência de

recolha de lixo, deficiências do saneamento básico, congestionamento do tráfego, ruas

estreitas dificultando a circulação do ar e dos raios solares, poluição e consequente má

qualidade do ar, falta de espaços verdes, degradação do ambiente urbano e dos “recursos

naturais”. Mausbach (1981:24) considerava que:

“A finalidade e o problema principal do urbanismo nessa época, caracterizada por

um rápido crescimento industrial resultante dos meios da nova técnica, consistiu em

criar o maior número possível de habitações dentro de um espaço mínimo, com o fim

de alojar o grande número dos que se deslocavam do campo para a cidade para

trabalharem na indústria”.

De acordo com Mumford (1963) citado por Ferrari (1986:349), a maior parte das

metrópoles congestionadas necessita de uma densidade menor de população, com mais

parques e espaços vazios, mas a maioria dos seus subúrbios deve replanear as suas áreas e

talvez duplicar as suas actuais densidades de população para poder ter, bem à mão, os

equipamentos sociais, educacionais, recreativos e industriais de que necessita. Isso quer dizer

que tanto a congestão metropolitana como a dispersão suburbana são antiquados.

4.3 A Cidade como Conceito

Não existe actualmente um padrão universal para definição do conceito de cidade.

Esta definição varia conforme as vivência culturais e os processos históricos da génese e

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desenvolvimento dos assentamentos humanos, característicos de cada país e cultura. A ideia

prevalecente até ao início do século XIX era considerar o conceito de cidade baseado em

critérios quantitativos. Na Islândia, por exemplo, eram suficientes 300 habitantes para uma

comunidade urbana ser considerada de cidade. Na Dinamarca, apenas 250 habitantes. Em

França era necessário um mínimo de dois mil habitantes e em Espanha, já dez mil habitantes.

Ainda hoje, organismos internacionais possuem definições de "cidade" baseados em critérios

quantitativos. A Organização das Nações Unidas, considera como cidade somente uma área

urbanizada que possua pelo menos 20 mil habitantes.

Diversos países de língua inglesa possuem duas definições de cidade, city e town,

cujas diferenças variam de país para país. A Nova Carta de Atenas define a cidade como um

"estabelecimento humano com um certo grau de coerência e coesão". Esta definição abarca o

conceito mais lato de "cidade", e engloba tanto os conceitos de línguas que não distinguem as

vilas de cidades (por ex., francês ville), como os conceitos das línguas que distinguem

cidades de aglomerados ainda maiores.

Na Bienal de Arquitectura de Veneza em 2000, foi dada a seguinte definição de

cidade: “A cidade é um habitat humano que permite com que pessoas formem relações umas

com as outras em diferentes níveis de intimidade, enquanto permanecem inteiramente

anónimas”.

Concepções estruturalistas de finais do século XIX consideravam a cidade como uma

estrutura material, com dinâmica e dimensionamento próprios, que organiza as aglomerações

populacionais, conferindo-lhes um sentido, uma função e uma finalidade.

Analisando a génese da cidade com critérios qualitativos mais do que quantitativos,

podemos entendê-la como uma entidade onde interagem as relações da esfera privada com a

esfera pública. É na cidade onde se estabelecem as diferentes relações entre os vários

indivíduos e grupos. Lewis Mumford e Giulio Argan, por esta razão, consideram a cidade

como “uma das mais perfeitas invenções humanas, como o ambiente mais propício para a

criação e desenvolvimento humanos”.

Do ponto de vista funcional, uma cidade consiste no agrupamento de áreas de funções

diversas, entre as quais se pode destacar as residenciais, comerciais, industriais, assim como

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áreas mistas. A maior parte das cidades é ocupada em geral por áreas residenciais. As cidades

contemporâneas são caracterizadas principalmente por predominância de áreas mistas, em

geral de habitação e serviços. As diferentes áreas da cidade são interligadas e servidas por

redes mais ou menos complexas de infraestruturas viárias e outras infraestruturas urbanas.

Do ponto de vista legal e administrativo, o termo "cidade" designa geralmente uma

entidade político-administrativa urbanizada, institucionalmente constituída num território

geograficamente definido. Em muitos casos, porém, a palavra "cidade" é também usada para

descrever uma área de urbanização contígua, como por exemplo as modernas conurbações,

que podem abranger diversas entidades administrativas adjacentes (Londres, Tóquio,

Frankfurt, Cairo, Grande Maputo, etc).

4.4 A Cidade Urbanizada

Estudos mais recentes procuram abordar a Cidade a partir de uma perspectiva

complexa e sistémica. A cidade urbanizada segundo Pelletier, J. e Delfante, C. (1997) é

entendida como um espaço composto por territórios distintos uns dos outros, mas

simultaneamente articulados uns com os outros, nomeadamente a partir do papel

desempenhado pelo centro da cidade, lugar de encontro dos bairros e da manifestação de uma

pertença comum.

A cidade urbanizada é, por essência, centrípeta. Ela estrutura, coordena e organiza os

vários campos de actividade que se encontram no interior de si mesma. A cidade organiza-se

em bairros agrupados em torno do centro, verdadeiro instrumento de comando. Os bairros

correspondem em geral a especializações profissionais ou sociais, mas em cada um deles

coexistem os diferentes intervenientes da actividade ou da profissão em causa (Remy, J. e

Voyé, L., 2004). A cidade urbanizada tem grandes relações com a periferia e com o exterior.

Não são relações de distanciamento como o caso da aldeia não urbanizada, mas sim, relações

de controle e de orientação.

Uma formação urbana ou um assentamento humano, para ser classificado de "cidade",

deveria apresentar um certo número de características, entre as quais (1) uma localização

permanente e uma extensão espacial geograficamente determinada, (2) um certo padrão de

organização da propriedade, (3) um determinado qualitativo populacional formado por

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indivíduos socialmente heterogéneos, (4) um certo padrão de convivência e nível de

relacionamento interpessoal, (5) a identificação de um modo de vida característico dos

citadinos, (6) a presença de ocupações não agrícolas, (7) a presença de um quantitativo

populacional considerável, cujo limiar é redefinido a cada época histórica, (8) a ocorrência de

uma considerável densidade populacional, (9) uma localização de mercado ou área central de

serviços (10), uma ligação consistente com o exterior.

Para Le Corbusier é importante identificar as necessidades do homem urbano pois

estas são bastante idênticas, uma vez que os humanos são basicamente iguais. Ou seja,

importa procurar a escala e a função humanas na cidade. A ideia de cidade como um todo à

volta de um centro, não impede que na sua análise se distingam as várias funções urbanas.

Corbusier classifica quatro delas: habitar, trabalhar, cultivar o corpo e a mente e circular. A

cidade corbusiana organiza-se em torno dos seguintes temas: separação das funções urbanas,

multiplicação dos espaços verdes, criação de protótipos funcionais e racionalização do habitat

colectivo (Benévolo,1997:630).

A cidade urbanizada está dotada de infraestruturas e equipamentos urbanos suficientes

para proporcionarem aos seus cidadãos padrões mínimos de qualidade de vida urbana e

sustentabilidade social. A cidade urbanizada realiza as suas principais funções, segundo a

antiga fórmula da Carta de Atenas que são, “a produção, o habitat, a cultura do corpo e do

espírito”.

4.1 Aldeia não Urbanizada

A aldeia não urbanizada é concebida fundamentalmente como um agregado de casas.

Há uma grande diversidade entre as comunidades rurais em termos de forma e espaço

geográfico. O espaço da comunidade engloba a povoação ou as diversas povoações à volta de

um chefe tribal ou líder comunitário Estes agrupamentos de população são de pequenas

dimensões, pois quanto menos população agrupada houver, e portanto menos edifícios, mais

os lugares de trabalho agrícola estarão próximos e acessíveis. A descontinuidade espacial das

aldeias, conjugada com a sua fraca dimensão, determina uma paisagem em que o construído

surge mais ou menos disperso sobre o pano de fundo da natureza. As comunidades rurais têm

a tendência de rejeitar toda a autoridade exterior à colectividade, como condição para

manterem a sua identidade e condição da sua sobrevivência.

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As principais características da aldeia não urbanizada são, conjuntos de edifícios mais

ou menos dispersos, o trabalho agrícola como actividade dominante, agrupamentos

populacionais de pequena dimensão e terras de cultivo imediatamente próximas da habitação,

por ausência de técnicas modernas de locomoção, ausência de infraestruturas e serviços

comuns. O interconhecimento do grupo, a sua reduzida dimensão e a similitude das

actividades produtivas e sociais são as bases da gestão do grupo e favorecem o seu controle

ecológico comum – todos se conhecem e as regras sociais são simples e claras e familiares a

todos. O interconhecimento e a relativa hostilidade para com o exterior tende a provocar um

escamoteamento dos problemas internos, deixando para si próprios a busca de soluções para

os mesmos.

4.2 Cidade não Urbanizada

Tentamos neste capítulo analisar a qualidade de cidade não urbanizada, característica

dos subúrbios da maior parte dos grandes assentamentos humanos em Moçambique. O

conceito de subúrbio, em geral é estranho a cidades de escala reduzida, sendo ao contrário

conotado com formações urbanas mais complexas e territorialmente centrípetas: As

metrópoles e megalópodes (Gottman, 1961).

Os fenômenos de urbanização e o êxodo das populações rurais provocaram o aumento

dos problemas urbanos, problemas esses resultantes da falta de planeamento, particularmente

das áreas suburbanas, não consolidadas. A cidade sem planeamento, como um todo, e não

apenas os seus subúrbios, enfrenta grandes dificuldades que tendem a se agravar com o

tempo e a comprometer a qualidade de vida dos seus habitantes. Mausbach (1981:51), ao

definir os conceitos e exigências actuais do planeamento urbano, considera que a cidade

actual já não pode ser planificada tendo-se unicamente em consideração os seus limites

iniciais. Todos os problemas do planeamento urbano, da habitação, do trabalho, do tráfego,

etc., deverão ser observados a partir do âmbito mais vasto de toda a região. Está aqui

implícita a importância de se ter em consideração a inter-relação entre centro e periferia,

entre cidade urbanizada e subúrbios não urbanizados, na abordagem do planeamento urbano

contemporâneo.

Em Moçambique o problema da expansão urbana não planificada tende a agravar-se.

Segundo o Relatório Final do II Recenseamento Geral da População e Habitação (INE, 1997)

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as cidades moçambicanas estavam a crescer a uma taxa anual na ordem dos 2,3% na segunda

década da independência nacional. Actualmente as projecções apontam para cerca de um

terço da população moçambicana vivendo em centros urbanos, a maior parte em áreas

suburbanas de ocupação espontânea sem o mínimo de planificação e gestão do solo urbano e

das construções. Este intenso êxodo rural, trouxe para o contexto urbano a população rural e

os seus hábitos, as suas culturas e os seus viveres próprios. Ao fixar-se no novo meio, em

geral nas zonas periurbanas de ocupação espontânea, este novo habitante da cidade é

confrontado com o modo de vida urbano e com a necessidade de o assimilar para garantir a

sua própria sobrevivência. A sua cultura, o seu modo de viver e de estar diferentes,

confrontam-se com os parâmetros urbanos, com a nova forma gregária de vida, com a

necessidade de utilização racional dos sistemas de infraestruturas e equipamentos públicos,

entre outros serviços indispensáveis à sua sobrevivência em meio urbano.

Na situação de crescimento horizontal dos bairros periféricos, constitui um enorme

desafio à capacidade das instituições urbanas, oferecer serviços e equipamentos públicos a

custos aceitáveis à grande maioria da população. Segundo o INPF (1986:78), o objectivo da

política de desenvolvimento da cidade é oferecer um talhão a cada família que queira

construir a sua casa. Mas, para Mausbach (1981:24), “a casa unifamiliar isolada constitui um

tipo de habitação que, pela sua adição sistemática para a formação de urbanizações, deixou de

ser aceitável dentro dos novos planos de ordenamento”. Para além da impossibilidade de

distribuir grandes espaços para todos, sobrepõe-se a isso, o grande custo das infraestruturas,

que poderá provocar o alargamento cada vez mais das áreas habitacionais, sem a necessária

preocupação de densificação. Nestas “cidades” moçambicanas não urbanizadas, como em

outras cidades de países em vias de desenvolvimento, não está presente, ou é manifestamente

insuficiente, uma característica essencial da cidade urbanizada que é, a capacidade de ela

dotar os seus habitantes de um conjunto de infraestruturas e equipamentos urbanos, capazes

de lhes proporcionarem padrões mínimos de qualidade de vida urbana e sustentabilidade

social.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A categorização correcta de cada uma das manifestações de desenvolvimento dos

assentamentos humanos permite compreender as tendências do actual processo de 10

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urbanização em Moçambique e as necessidades de um planeamento urbano consistente,

tendente à criação de um padrão aceitável de qualidade de vida dos seus cidadãos,

particularmente nas áreas não urbanizadas das cidades. O reordenamento dos subúrbios das

grandes cidades moçambicanas constitui o desafio principal do planeamento urbano em

Moçambique. A aldeia não urbanizada, com as suas características rurais próprias, possui

ainda assim um maior grau de sustentabilidade que os subúrbios não urbanizados das grandes

cidades moçambicanas. O contínuo crescimento horizontal dos subúrbios das cidades

moçambicanas constitui um enorme desafio à capacidade das instituições urbanas de oferecer

serviços e equipamentos públicos a custos aceitáveis à grande maioria da população.

O reordenamento das áreas suburbanas não urbanizadas deve garantir a dotação de

infraestruturas e equipamento urbano essencial ao desenvolvimento das actividades e funções

urbanas, nomeadamente, a habitação condigna e ecologicamente sustentável das populações,

o desenvolvimento de actividades produtivas próprias do meio urbano e a prestação de

serviços administrativos, sociais e culturais, e ainda serviços de apoio às várias actividades

económicas empresariais e particulares dos moradores. As estratégias a seguir para esta

urbanização do não-urbanizado, podem ser diversificadas, de acordo com as potencialidades

de cada comunidade e oportunidades do ambiente externo em cada local. Elas podem variar

desde intervenções sistemáticas de melhoria e consolidação gradual das infraestruturas, sem

deslocação das populações, até projectos pontuais de reassentamento em áreas de expansão

para urbanização intensiva das áreas informais. Elas vão depender dos consensos a encontrar

e da salvaguarda dos direitos adquiridos e dos interesses de todas as partes. Dependem ainda

da capacidade dos órgãos de gestão em gerar recursos ou estabelecer parcerias para o

financiamento das operações. No entanto, nenhuma estratégia poderá triunfar sem uma forte

capacitação institucional dos órgãos de gestão urbana e sem a participação efectiva de todos

os actores na sua própria definição, desenvolvimento e implementação. É essencial repensar-

se as formas e tipo de participação dos actores, e em especial os moradores e os agentes

económicos locais, neste processo de planificação A mudança do paradigma no que respeita à

participação dos beneficiários, levando a uma real inclusão no processo de planeamento

poderá provocar um incremento significativo no aproveitamento das oportunidades de uso do

solo urbano e induzir uma melhoria significativa na qualidade de vida proporcionada pelos

processos de planificação e reordenamento urbano.

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6. REFERÊNCIAS

GOITIA, F. C. Breve História do Urbanismo. 1a ed. Lisboa: Ed. Presença. 1982

MAUSBACH, H. Urbanismo Contemporâneo.. 3a ed. Lisboa: Ed. Presença. 1981

INSTITUTO NACIOANAL DE PLANEAMENTO FÍSICO. Guião Metodológico para a elaboração dos planos gerais e parciais de urbanização. Maputo.

ARIMAH, B. C. et al. Planning Sustainable Cities - Global Report on Human Settlements.. London: Earthscan. 2009

REMY, JEAN e VOYÉ, LILIANE . A Cidade: Rumo a uma Nova Definição? Lisboa: Ed. Afrontamento. 1997

LE CORBUSIER. Maneiras de Pensar o Urbanismo. Mira-Sintra: Publicações Europa-América. 1977

DELLA DONNE, M. Teorias sobre a Cidade. Rio de Janeiro: Edições 70. 1990

HAUGHTON, G. e HUNTER, C. Sustainable Cities. Londres: J. Kingsley Publishers 1996

MAUSBACH, H. Urbanismo Contemporâneo. Lisboa: Ed. Presença. 1981

Boletim da República 554 - 1a Série (26/12/2006). Maputo: Imprensa Nacional. 2006

CASTELLS, M. A questão urbana. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.

COMITÉ DE CONSELHEIROS. Agenda 2025. Maputo: PNUD, 2003

http://pt.wikipedia.org/wiki/Cidade

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