universos paralelos

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A viagem é feita de carro, de metro ou de comboio, mas o importante é que as amigas Bárbara Bernardo, 18 anos, Teresa Ramalho, 15, e Paula Pregliosa, 18, cheguem a tempo, e, sobretudo, vestidas a rigor ao Instituto Português da Juventude, no Parque das Nações, em Lis- boa. O ambiente no recinto é de grande animação e é, mesmo, à animação japonesa que é dedicado o Anipop 1/2 . Não foi a pri- meira vez que estas ami- gas participaram num encontro como este, nem tão-pouco a sua estreia no cosplay ( ver caixa ). Sabem, por isso do que falam quando elogiam a organiza- ção: «O evento está muito bom, as lojas estão maravilho- sas, os cosplayers são fantásticos e as pessoas muito simpá- ticas!», dizem, entusiasmadas. À pergunta óbvia, Aproveitando o conselho deste jovem trio, explorámos um pouco mais o universo que este evento abarcava. Ao som do karaoke, no meio da caça às lojas à procura dos melhores preços de manga ou do artigo de merchandising mais kawai ( ver caixa ), passámos por um concurso de perguntas e respostas, mostras de anime , torneios de video- jogos e cartas, e até espreitámos a sala mais reservada, onde os otakus com mais talento para as artes participavam num workshop de ilustração. Por todo o lado não faltavam cosplayers a dar cor e originalidade ao evento: gueixas, samurais, colegiais de uniforme... Chegámos mesmo a cruzar-nos «porquê o cosplay ?», respondem que é pelo prazer de encarnarem os seus perso- nagens favoritos, pela possibilidade de conhecerem pessoas que partilham os mesmos gostos e, acima de tudo, para se divertirem. Universos paralelos Quando se celebram 150 anos da reaproximação entre Portugal e o Japão, fomos ver como a cultura pop nipónica do anime e manga entusiasma cada vez mais jovens portugueses POR ERICA FRANCO TEXTO E BRUNO SIMÃO FOTOS TENDÊNCIA A R U T L U C ‘Cosplay’ nacional Gueixas, samurais e colegiais de uniforme invadiram, no sábado, 18, um recanto de Lisboa 130 v

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Reportagem realizada em Lisboa, a propósito de um evento dedicado à cultura e animação japonesa, no decorrer do estágio na revista Visão.

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Page 1: Universos paralelos

Aviagem é feita de carro, de metro ou de comboio, mas o importante é que as amigas Bárbara Bernardo, 18 anos,

Teresa Ramalho, 15, e Paula Pregliosa, 18, cheguem a tempo, e, sobretudo, vestidas a rigor ao Instituto Português da Juventude, no Parque das Nações, em Lis-boa. O ambiente no recinto é de grande animação e é, mesmo, à animação japonesa que é dedicado o Anipop 1/2. Não foi a pri-meira vez que estas ami-gas participaram num encontro como este, nem tão-pouco a sua estreia no cosplay (ver caixa). Sabem, por isso do que falam quando elogiam a organiza-ção: «O evento está muito bom, as lojas estão maravilho-sas, os cosplayers são fantásticos e as pessoas muito simpá-ticas!», dizem, entusiasmadas. À pergunta óbvia,

Aproveitando o conselho deste jovem trio, explorámos um pouco mais o universo que este evento abarcava. Ao som do karaoke, no meio da caça às lojas à procura dos melhores preços de manga ou do artigo de merchandising mais kawai ( ver caixa), passámos por um concurso de perguntas e respostas, mostras de anime, torneios de video-jogos e cartas, e até espreitámos a sala mais reservada, onde os otakus com mais talento para as artes participavam num workshop de ilustração. Por todo o

lado não faltavam cosplayers a dar cor e originalidade ao evento: gueixas, samurais, colegiais de uniforme...

Chegámos mesmo a cruzar-nos

«porquê o cosplay?», respondem que é pelo prazer de encarnarem os seus perso-nagens favoritos, pela possibilidade de conhecerem pessoas que partilham os mesmos gostos e, acima de tudo,

para se divertirem.

Universos paralelosQuando se celebram 150 anos da reaproximação

entre Portugal e o Japão, fomos ver como a cultura pop nipónica do anime e manga entusiasma cada vez mais jovens portugueses

POR ERICA FRANCO TEXTO E BRUNO SIMÃO FOTOS

ARUTLUC TENDÊNCIA

ARUTLUC

‘Cosplay’ nacional Gueixas, samurais e colegiais de uniforme invadiram, no sábado, 18, um recanto de Lisboa

130 v

Page 2: Universos paralelos

Glossário ABC do ‘anime’

Segundo o uso dado pelos fãs não japoneses, é qualquer conteúdo de animação feito no Japão. No Japão, a palavra significa simples-mente «animação»

Vestir o traje do seu per-sonagem favorito. Há competições de cosplay em cada vez mais países

O termo tem várias traduções possíveis (como cartoon ou animação), mas é usado mais frequentemente no sentido de «banda desenhada japo-nesa». Não é sinónimo de anime , mas muitas vezes os termos confundem-se (afinal, muitos animes são baseados em mangas) .

Criador de manga , cartoonista.

Refere-se à digitalização dos títulos de manga pelos os fãs, que posteriormente os traduzem e disponibilizam, de forma gratuita, via internet. O fenómeno gera controvérsia: uns defendem que promove a indústria, outros conside-ram-no uma ameaça.

Termo usado genericamente para designar os fãs de anime/manga . O conceito japonês de otaku, implica uma conotação mais negativa, referin-do-se concretamente a fãs radicais e alienados

Expressão japonesa, de uso corrente no anime/manga , que, em por-tuguês, significa algo como amoroso, bonito, «que fofinho!», «que giro!»

com toda a pandilha da Akatusuki (organização criminosa do anime/manga Naruto), com os seus fatos elaborados que levam horas a compor, e tivemos o prazer de conhecer a personificação da cantora virtual japonesa Miku Hatsu-ne: Maria Inês, de 20 anos, vencedora

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Page 3: Universos paralelos

Agenda Sentir o OrienteSemana do Japão em Portugal Até 30 de setembro, no Teatro Sá da Bandeira, Santarém. Mais uma comemoração dos 150 anos do Tratado de Amizade Portugal-Japão, ofere-cendo uma série de atividades ligadas ao cinema (incluindo o anime ), exposições e música japonesa

Japan Weekend23 e 24 de outubro, Sala Tejo do Pavilhão Atlântico, Lisboa.Um dos eventos de entretenimento de inspiração nipónica mais importantes em Espanha, pretende, agora, assumir-se em Portugal como a mais completa convenção sobre a cultura pop nipónica. Promete um cartaz variado e convidados internacionais

Aniversário da revista digital ‘Waribashi ’De 29 a 31 de outubro, FNAC Chiado, LisboaA Waribashi , publicação digital dedicada inteiramente à animação e cultura japonesas, assinala o seu aniversário, com o lançamento em formato de papel, durante um evento semanal que contará com exibição de filmes e outras atividades culturais relacionadas com o Japão

do prémio revelação do evento Anipop do ano passado, já não é novata nestas andanças.

Um ‘anime’ para cada umNão é de todo descabido refletir um pouco sobre os laços que unem Portugal e o Japão, precisamente no ano em que se celebram os 150 anos da assinatura do Tratado de Paz, Amizade e Comér-cio entre Portugal e o Japão, símbolo da abertura do Japão ao exterior, no século XIX. Afinal, estão aí as origens da forte marca que a cultura pop japonesa tem deixado nos países ocidentais nas duas últimas décadas. Há alguns anos que Portugal não é exceção. Estes ecos contemporâneos de uma cultura mile-nar chegam-nos, sobretudo, através da animação, e nomes como Dragon Ball, Pokémon, Doraemon ou Hello Kitty afirmam-se como um verdadeiro fenó-meno de popularidade mundial. Cativado pelos traços característicos deste tipo de animação, um grupo infor-mal de jovens, empenhados em promo-ver e realizar atividades relacionadas com a cultura e animação japonesas, viu os seus esforços concretizados com a fundação da Anipop – AJACJ (Asso-ciação Juvenil de Animação e Cultura Japonesa), em 2003. Inês Torrão, 23 anos, presidente da Associação, diz-nos que uma das diferenças que nota entre os primeiros eventos (informal-mente organizados em 1999) e os atuais é que «hoje as pessoas vão mais pelo convívio». Isso deve-se, em grande par-te, ao contributo da internet e das redes

sociais, que fomentam o contacto entre os membros da comunidade: «Hoje em dia, há pessoas que se conhecem só porque gostam de anime; eu, quando comecei, não conhecia ninguém...», conta Inês. Está habituada a encontrar pessoas que, «ao princípio, podem achar tudo isto um bocadinho extravagante». Há ainda uma tendência, diz-nos, para olhar a animação japonesa essencial-mente de três formas: «como uma coisa violenta, infantil ou ligada ao sexo»,

mas, na sua opinião, «deveria ser vista como... tudo». Um dos principais traços distintivos entre a animação japonesa e a animação ocidental tem a ver, preci-samente, com o facto de os japoneses encararem «seriamente» a animação, usando-a para explorar uma diversidade de temas muito vasta (do amor à morte, da guerra à paz, do passado histórico ao futuro distante), apelativa para todos os grupos etários. «Há um anime para cada pessoa», diz Inês, sem hesitar.

No caso do manga, as coisas são ligeiramente mais complicadas, quer pelas especificidades destas publicações (quase sempre a preto e branco, e a obri-garem a folhear os livros ao contrário), quer pela falta de variedade, preços ainda elevados e escassez de traduções (a maioria dos mangas estão disponíveis em francês ou inglês). Paulo Costa e Gonçalo Freitas, da loja lisboeta BD Mania, no negócio da banda desenha-da há 15 anos, apercebem-se do poder que o manga tem vindo a conquistar, sobretudo com o aparecimento do anime, na televisão portuguesa. Mas preferem não arriscar, ainda, em eventos como o Anipop 1/2: «Não se vende o suficiente, sequer para pagar os custos», dizem.

Para já, esta comunidade crescente, mas ainda de nicho, em Portugal, pode contar com a realização de mais alguns eventos até ao final deste ano (ver caixa). No ar, fica a promessa deixada por Inês Torrão, de que há a possibilidade de, no próximo ano, poderem vir a ocorrer eventos Anipop fora de Lisboa. A saga continua, e ganha novos territórios.

As redes sociais fomentam o contacto entre a comunidade. ‘Há pessoas que se conhecem só porque gostam de anime ’

Lisboa, 18/9/2010 Um estilo pop e japonês que se espalha pelas grandes cidades do mundo

132 v 23 DE SETEMBRO DE 2010

TENDÊNCIAARUTLUC

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