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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ ANA PAULA MARTIN BENITEZ ABORTO: UMA QUESTÃO DE SAÚDE PÚBLICA CURITIBA 2015

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

ANA PAULA MARTIN BENITEZ

ABORTO: UMA QUESTÃO DE SAÚDE PÚBLICA

CURITIBA

2015

ANA PAULA MARTIN BENITEZ

ABORTO: UMA QUESTÃO DE SAÚDE PÚBLICA

Trabalho de Conclusão de Curso Apresentado

ao Curso de Direito da Faculdade de Ciências

Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná,

como requisito parcial para a obtenção do grau

de Bacharel em Direito.

Orientadora: Profª Helena de Souza Rocha.

CURITIBA

2015

TERMO DE APROVAÇÃO

Ana Paula Martin Benitez

ABORTO: UMA QUESTÃO DE SAÚDE PÚBLICA.

Esta monografia foi julgada e aprovada para a obtenção do título de Bacharel em

Direito no curso de Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas da Universidade

Tuiuti do Paraná.

Curitiba, __ de _____ de 2015.

__________________________________

Prof. Dr. Eduardo de Oliveira Leite

Coordenador do Núcleo de Monografia

Orientadora: ______________________________

Profª Helena de Souza Rocha.

Examinador 1: _____________________________

Prof(a). Dr(a).

Examinador 2: _____________________________

Prof(a). Dr(a).

Dedico o presente trabalho a todos

os que contribuíram pacientemente

para que o mesmo fosse realizado.

AGRADECIMENTOS

À minha orientadora pela confiança em mim depositada.

Ao meu querido e amado noivo por sempre me apoiar.

À minha mãe, minha inspiração, meu amor maior.

RESUMO

A questão do aborto tem sido discutida sobre várias perspectivas, uma

destas perspectivas é o tratamento do aborto enquanto tema de saúde pública,

tendo em vista que mulheres morrem diariamente em decorrência da realização

de abortos inseguros e clandestinos, situação esta não regulamentada pelo

Estado, mas sim criminalizada.

Este trabalho, através de uma inter-relação entre os aspectos médicos,

éticos e do Direito, irá abordar o aborto a partir desta perspectiva, analisando os

princípios constitucionais, pertinentes ao tema. Para tanto serão analisados dados

e pesquisas sobre a temática numa tentativa de enfrentar a realidade da

problemática dos principais argumentos para o seu tratamento de forma

diferenciada àquela que tem sido preponderante no sistema de justiça.

Seria o aborto um problema social, uma questão de saúde pública ou de

justiça criminal ?

Na compreensão de que a questão muitas vezes é tratada como tema

pacificado o presente trabalho tem como objetivo debater e analisá-lo sob o maior

número de perspectivas possíveis.

PALAVRA-CHAVE: aborto, aborto inseguro, aborto clandestino, saúde pública,

criminalização, regulamentação, legalização.

LISTA DE FIGURAS

FIGURA I - PRINCIPAIS CIRCUNSTÂNCIAS EM QUE O ABORTO É

PERMITIDO ........................................................................................18

FIGURA II – DISTRIBUIÇÃO PERCENTUAL DAS MULHERES

SEGUNDO EXPERIÊNCIA DE ABORTO, POR REGIÃO DO BRASIL

.............................................................................................................21

FIGURA III – DISTRIBUIÇÃO PERCENTUAL DAS MULHERES

SEGUNDO EXPERIÊNCIA DE ABORTO, POR VARIÁVEIS SÓCIO-

DEMOGRÁFICAS ...............................................................................23

FIGURA IV - NÚMERO DE CURETAGENS PÓS-ABORTO NO

BRASIL EM 1995 .............................................................................. 35

FIGURA V – NÚMERO DE CURETAGENS PÓS-ABORTO NO

BRASIL EM 2000 .............................................................................. 36

FIGURA VI – MAPA DO ABORTO NO MUNDO .............................. 40

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÂO.............................................................................................09

2. ABORTO .....................................................................................................09

2.1 DEFINIÇÃO E CONCEITO....................................................................09

2.2 CLASSIFICAÇÃO .................................................................................11

2.3 DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO .................................................... 12

2.4 O ABORTO NO MUNDO ......................................................................16

3. O ABORTO NO BRASIL.........................................................................19

3.1 DADOS E ESTATÍSTICAS ...................................................................20

3.2 O ABORTO E O DIREITO BRASILEIRO .............................................26

3.2.1 DA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA .......................................................26

3.2.2 PROJETOS DE LEI ...........................................................................31

4. O ABORTO COMO UMA QUESTÃO DE SAÚDE PÚBLICA ....................32

4.1 UMA QUESTÃO DE SÁUDE PÚBLICA ...............................................32

4.1.2 DOS DIREITOS SEXUAIS E REPRODUTIVOS ................................37

4.1.3 DA LEI DO PLANEJAMENTO FAMILIAR ........................................38

4.1.4 ABORTO, UMA VISÃO INTERNACIONAL SOBRE O TEMA ..........38

4.1.5 PRINCÍPIO DA AUTONOMIA ............................................................42

4.2 PRINCÍPIOS E DIREITOS CONSTITUCIONAIS...................................42

4.2.1 PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA ......................42

4.3 DESCRIMINALIZAÇÃO x LEGALIZAÇÃO DO ABORTO .................. 43

5. CONCLUSÃO..............................................................................................46

6. REFERÊNCIAS............................................................................................50

9

1. INTRODUÇÃO

O aborto é uma técnica conhecida e realizada milenarmente que nem

sempre foi interpretada como clandestina ou que foi socialmente reprovada.

Já foi utilizado como método de controle de natalidade e até encarado como

um direito paterno, sendo inclusive em alguns países considerado como um direito

materno.

Com o passar dos anos e, especialmente, a partir do surgimento do

cristianismo o aborto passou a ser reprimido passando a ser considerado crime

em alguns países, inclusive se mantendo assim até os dias atuais no Brasil.

Muito se discute e se debate sobre o assunto e suas consequências, os

questionamentos são muitos e circulam quase sempre em torno da questão dos

direitos de dignidade e autonomia da mulher e do direito à vida do embrião ou feto.

No presente trabalho serão analisados alguns dos principais argumentos

relacionados à defesa da descriminalização do aborto por razões de saúde pública

entre eles as consequências da criminalização das mulheres pela prática.

Também serão abordados os custos da criminalização do aborto para a

saúde pública, criminalização esta que apesar de existir não coíbe as mulheres a

se socorrerem nos momentos de desespero e angústia a clínicas clandestinas,

virando reféns dos profissionais que lá trabalham, os quais tem interesse somente

na questão financeira e não no bem-estar físico e mental da paciente.

Para tanto, serão analisados no trabalho os conceitos básicos relacionados

ao tema, o princípio bioético, da autonomia da vontade humana, os princípios

constitucionais relativos ao tema, os direitos sexuais e reprodutivos e dados

estatísticos e históricos.

2. O ABORTO

2.1 DEFINIÇÃO E CONCEITO

10

Segundo o Dicionário do Aurélio aborto é:

1. Expulsão de um feto ou embrião antes do tempo e

sem condições de vitalidade fora do útero materno. 2.

Produto dessa expulsão. 3. Coisa ou resultado

desfavorável ou imperfeito. 4. Fenômeno estranho ou

raro. 5. Pessoa ou coisa considerada disforme.

E abortar é:

1. Interromper o sucesso ou a continuação de algo. 2.

Expulsar, espontânea ou voluntariamente, um feto ou

embrião, antes do tempo e sem condições de

vitalidade”

Conceitua ainda Mammana (1969, p.85):

É um acidente patológico, isto é, verifica-se em

consequência de moléstias dos genitores ou de lesão

patológicas do produto da concepção.

Maria Tereza Verardo (1996, p.23) afirma que:

Alguns obstetras delimitam o tempo de gestação para

definir o aborto: até a 22ª semana da gravidez; a

interrupção após este período é considerada parto

prematuro e se houver óbito do feto, este é considerado

natimorto. Ou seja, até os cinco meses e meio de

gravidez a expulsão do feto é considerada aborto pela

medicina, dos cinco meses e meio em diante, parto

prematuro.

11

Assim, o aborto se caracteriza pela expulsão do embrião ou feto, que pode

ser espontânea ou provocada.

2.2. CLASSIFICAÇÃO

Maria Tereza Verardo em sua obra “Aborto um direito ou um crime” define

os vários tipos de aborto: o aborto espontâneo é aquele quando o aborto ocorre

por vários fatores de ordem natural, sendo este realizado pelo próprio corpo da

mulher, sem influência externa (1996, p.23).

O aborto provocado, que para o presente trabalho, é o que tem maior

relevância, é aquele quando ocorre a interrupção intencional da gestação havendo

interferência mecânica ou química (1996, p.24).

Na definição médica, o aborto induzido é o nascimento induzido antes de 20

semanas. Este tipo de aborto refere-se à expulsão de um embrião ou de um feto

que ocorre intencionalmente pelo uso de medicamentos ou de meios mecânicos

(Moore, 2008, p.23).

Para o Direito Penal considera-se o aborto provocado a interrupção do

processo de gestação ocorrida entre a concepção e o parto, decorrente de uma

conduta humana dolosa, que irá provocar a morte do nascituro.

Diferente do conceito médico o conceito jurídico não prevê qualquer

requisito temporal ou mesmo biológico. Interessa somente a conduta humana que

de forma dolosa voltada a fim de interromper a gestação provocando a morte do

embrião ou feto. Exclui-se a modalidade culposa, sendo conduta atípica a conduta

da gestante ou de terceiro que por negligência, imprudência ou imperícia acabe

dando causa ao aborto (disponível em: JusBrasil, http://emanue

lmotta.jusbrasil.com.br/artigos/139263291/o-crime-de-aborto-e-o-tratamento-penal

O aborto provocado pode ainda ser classificado como aborto terapêutico e

eugênico.

O aborto terapêutico ou necessário ocorre quando há risco de vida para a

mãe ou nos casos em que a indicação é de caráter psiquiátrico (graves psicoses e

12

debilidade mental). (Verardo. 1996, p.24-25).

O aborto eugênico é quando suspeita-se que o feto contraiu graves

anomalias ou doenças transmitidas por um de seus genitores, apesar de muitas

vezes se verificar a necessidade do aborto, este, no Brasil, ainda é ilegal

(Verardo.1996, p.25).

Tem-se ainda um terceiro tipo de aborto, o aborto sentimental, que é aquele

realizado em mulheres que engravidaram após terem sido estupradas, este tipo de

aborto se enquadra no aborto eugênico e no aborto terapêutico, sendo classificado

na categoria de aborto terapêutico, uma vez que , como decorrência de forte abalo

psíquico produzido pelo estupro, a gestante tem sua saúde mental abalada.

Enquadrando-se também na categoria de aborto eugênico porque não se conhece

também a saúde mental e física do estuprador, que tem possibilidade de ser

portador de fatores hereditários patógenos ou doenças adquiridas, que podem ser

transmitidas à criança (Verardo.1996, p.25).

O aborto “a pedido” é aquele realizado a pedido da gestante, é ilegal e

considerado crime no Brasil, conforme legislação vigente.

A sua proibição fere diretamente o princípio da autonomia reprodutiva, que

tem fundamento constitucional nos direitos à liberdade e privacidade e o princípio

da dignidade da pessoa humana, pois pressupõe-se que toda mulher deveria ter o

poder de tomar as decisões fundamentais sobre suas próprias vidas, sem

interferência do Estado ou terceiros. A idéia principal aplicada neste caso é de que

toda pessoa humana é agente moral, dotado de razão, capaz de decidir o que é

bom ou ruim para si, de traçar planos, fazer escolhas e que deve ter a liberdade

de guiar-se de acordo com a sua vontade (Sarmento, 2005, p.43).

2.3. DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO

A prática do aborto é tão antiga quanto o homem; as mulheres nunca

deixaram de realizá-lo apesar das sanções, controles, legislações e intimidações

surgidos através da história da humanidade. Sabe-se que a raça humana, em

qualquer época ou lugar geográfico, manifestou sempre o desejo de regular sua

13

própria fecundidade, o que torna o aborto uma prática atávica, espontânea, pois

corresponde a um desejo natural de não querer ou não poder levar a termo a

gravidez. Na América Latina encontra-se essa prática não só em meio a grupos

que enfrentam dificuldades econômicas e sociais para assumir mais uma criança,

em centros urbanos favelados e marginais, mas também nas comunidades

indígenas. Nestas últimas apesar de não estarem submetidas às mesmas

pressões que aquelas, também abortam (Prado, 1985 p.42)

Relata Danda Prado que os primeiros dados que se dispõe sobre o aborto

datam de 1700 antes de Cristo no código de Hammurabi, nele considera-se o

aborto como um crime acidental contra os interesses do pai e do marido, e

também uma lesão contra a mulher. Deixava-se no entando bem claro que o

marido era o prejudicado e ofendido economicamente. (Prado 1985,p42)

Sócrates era partidário de facilitar o aborto quando a mulher assim o

desejasse, e seu discípulo Platão propunha em seu escrito A República que as

mulheres de mais de 40 anos deveriam abortar obrigatoriamente, e aconselhava o

aborto para regulamentar o excessivo aumento de população (Prado,1985,p 44).

Aristóteles chamava a atenção dos políticos da época, opinando que, a seu

ver, em casos de excesso de população, deveria ser autorizado o aborto antes da

“animação” do feto, (60 dias após sua concepção) para mulheres que tivessem

engravidado fora das exigências da legislação (Prado 1985, p44).

Esparta proibia o aborto juridicamente, pois tinha como preocupação atingir

o maior número de guerreiros e atletas. No entanto, reservava ao Estado a

decisão sobre a vida ou a morte dos recém-nascidos, eliminando os malformados.

Em Roma, o início, o aborto voluntário não foi considerado delito, pois os

juristas e filósofos não viam o feto como um ser vivo. No direito Romano não se

encontravam disposições sobre o aborto, para as mulheres que praticavam o

aborto contra a vontade do marido, tinham como o castigo o desterro, ou então o

marido unia sua autoridade à do Tribunal Doméstico (instituto legal que

regulamentava os comportamentos intrafamiliares) a fim de impor o castigo devido

à culpada (Prado, 1985 p45).

Com o passar dos anos e com a necessidade de aumentar sua população,

14

durante os governos de Sétimo Severo e Caracala, que o Império Romano

assumiu uma atitude deliberadamente repressiva, promulgando e fazendo cumprir

as leis que castigavam o aborto (Prado, 1985 p46).

Fato marcante na consideração do aborto foi o surgimento do cristianismo,

relata Maria Tereza Verardo que a posição da Igreja Católica muito variou com o

passar dos séculos. As doutrinas que se baseiam em São Basílio e sua teoria da

animação imediata, século IV, acreditando que é no momento da fecundação que

a alma se instaura no embrião, proibiam o aborto a qualquer tempo.

O código de Justiniano, século VI, autorizava o aborto, desde que fosse

realizado nos 40 primeiros dias de gestação.

Entre revogações e autorizações a posição da Igreja Católica se alterou

algumas vezes ainda, até que em 1869 a proibição foi restituída pelo Papa Pio IX,

se mantendo assim até os dias atuais.

Em 1917 a Igreja vem a declarar que a mulher e todos os envolvidos no

aborto deveriam ser excomungados.

Na encíclica Matrimônio Cristão de Pio XI em 1930 fica estipulado que a

mãe e o feto tem o mesmo direito a vida.

Em 1976 o papa Paulo VI afirma que o pleno direito à vida do feto ocorre

desde a concepção.

A exceção fica por conta da gravidez ectópica (quando óvulo é fecundado

na trompa de falópio), que é o único caso, desde 1947, em que a Igreja não se

opõe a retirada do embrião.

O século XX traz contribuição para o assunto ao considerar o surgimento

dos movimentos feministas, no Brasil, a Organização Bem Estar Familiar no Brasil

(BEMFAM) já retratava no início dos anos 70 o aborto ilegal como uma epidemia a

ser tratada pelo planejamento familiar, mas foi a partir de 1980 que se configura a

atuação dos movimentos para a atuação mais específica ligada ao trabalho, ao

direito a saúde e a igualdade entre os sexos. Os movimentos feministas passam a

buscar influenciar as políticas públicas por meio dos canais institucionais tanto

pelo trabalho conjunto com Organizações não governamentais (ONGs) quanto na

entrada de ativistas no Estado. Na década de 1980, desenvolveu-se também a

15

pesquisa acadêmica sobre a mulher. Pesquisa e ativismo político passam a ter

uma atuação conjunta e de influência recíproca em uma série de temas, inclusive

da saúde da mulher CAMARGO, Thais Medina Coeli de, O Discurso do

Movimento Feminista Sobre o Aborto. Disponível em:

http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/11433/ThaisMCRCam

argo.pdf?sequence=1&isAllowed=y).

Em consonância com as preocupações das feministas brasileiras dos anos

1980, as feministas dos anos 1990 passaram a considerar a alta incidência de

abortos clandestinos no País como um problema de saúde pública pela alta

mortalidade que lhe estava associada, qualificando-o de aborto inseguro

(http://www.scielo.br/pdf/ref/v16n2/23.pdf)

Em 1984, em Amsterdã, foi realizado o 4º Encontro Internacional de Saúde

da Mulher e nesse encontro, que contou com a presença de ativistas da África,

Ásia, Europa e América Latina que é formulada a noção de direitos reprodutivos.

Os direitos reprodutivos incluem:

• O direito de decidir sobre a reprodução sem discrimação, coerção,

violência ou restrição ao número de filhos e intervalo entre seus

nascimentos.

• O direito de ter acesso a informação e aos meios para o exercício

saudável e seguro da reprodução e sexualidade.

• O direito a ter controle sobre o próprio corpo.

• O direito de exercer a orientação sexual sem sofrer discriminações

ou violência (Ventura, 2002 p15).

A partir do encontro em Amsterdã a noção de direitos reprodutivos

propagou-se no feminismo brasileiro e as demandas dos movimentos feministas,

incluindo a descriminalização do aborto, passaram a se basear na linguagem dos

direitos reprodutivos como direitos humanos (http://www.scielo.br/pdf/ref/v

16n2/23.pdf).

Foi nos anos 90 que, a favor da descriminalização do aborto, uniram-se

aos movimentos feministas profissionais da saúde, juristas e parlamentares. Foi

um período onde muito se debateu sobre o assunto e vários projetos de lei foram

16

apresentados no Congresso o que evidencia o crescimento democrático do debate.

(http://www.scielo.br/pdf/ref/v16n2/23.pdf).

Atualmente, são poucos os países que proíbem veementemente as práticas

abortivas. As legislações passam a se adequar mais e mais aos anseios sociais.

2.4. O ABORTO NO MUNDO

Tem –se relatos da existência do aborto na maioria das sociedades

conhecidas no mundo e isto demonstra a necessidade e o desejo das mulheres

terem a autonomia sobre seus corpos e sobre a sua liberdade reprodutiva (Oliveira,

1997, p 117)

Estima-se que sejam feitos anualmente entre 46 e 55 milhões de abortos no

mundo, aproximadamente 126 mil por dia e que 78% destes abortos ocorram em

paises em desenvolvimento e os outros 22% ocorram em paises desenvolvidos

(Planeta Sustentável. Disponível em: http://planetasustentavel.abril.com.br/pops/

mapa_aborto_claudia_pop.shtml, acesso em 02.05.2015).

São 97 os países que permitem o aborto provocado a pedido da gestante

(aproximadamente 66% da população mundial) e são 93 os países que proíbem o

aborto, ou somente o aceitam nos casos em que há risco à vida da mãe, nos

casos de estupro, má formação fetal ou incesto (aproximadamente 34% da

população mundial) (Uma Alma Sedenta. Disponível em: http://www.umaalmas

edenta.com/p/estatistica-do-aborto-no-mundo.html).

Sabe-se que nos países em que as leis são restritivas e portanto, onde o

aborto a pedido da mulher não é regulamentado, as mulheres não se sentem

suficientemente coibidas pela legislação e por conta dos baixos índices de

penalização acabam buscando ajuda em clínicas clandestinas para a realização

do aborto. Esta situação contribui para que os abortos sejam realizados de forma

insegura, o que muitas vezes acaba acarretando em uma cirurgia mal feita, que

trará consequências irreparáveis a mulher, podendo até mesmo levá-la a óbito

(disponível em: http://www.mundojuridico.adv.br)

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) um abortamento

17

inseguro é um procedimento para finalizar uma gravidez não desejada, realizado

por um indivíduo sem as habilidades necessárias e/ou em ambiente abaixo dos

padrões médicos exigidos (Disponível em :http://apps.who.int/iris/bitstream/

10665/70914 /7/9789248548437_por.pdf,).

Um estudo realizado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) verificou

que as mortes decorrentes do aborto realizado de forma insegura são

desproporcionamente muito maiores para as mulheres na África (mulheres que

são predominantemente negras, com baixo nível de escolaridade e situação

financeira prejudicada) do que em outras regiões em desenvolvimento

(Abortamento seguro: orientação técnica e de políticas para sistema de saúde,

p.20,disponível em: http://apps.who.int/iris/bitstream/ 10665/ 70914/7/9

789248548437_por.pdf, acesso em 02.05.2015)

Aqui pode-se fazer um paralelo com os registros no Brasil onde a maioria

das mulheres que são presas por conta de um aborto ou que acabam sendo

internadas no Sistema Único de Saúde (SUS) em decorrência de um aborto mal

sucedido realizado em clínica clandestina são negras e pobres conforme afirma

Rosângela Talib da ONG Católicas pelo Direito de Decidir em entrevista ao DoisP,

(disponível em RBA, Rede Brasil Atual, http://www.redebrasilatual.com.br/

cidadania/2014/12/proibicao-do-aborto-no-brasil-penaliza-mulheres-pobres-e-

negras-diz-ong-catolica-4727.html, acesso em 25 de abril de 2015).

A tabela abaixo foi elaborada pela Organização Mundial da Saúde (OMS),

nela constam as principais circunstâncias em que o aborto é permitido, separados

por região, os dados se encontram em forma de porcentagem. A pesquisa foi

realizada em 2009.

Estima-se que na América Latina e no Caribe, aonde predominam as leis

restritivas, são feitos aproximadamente 4 milhões de abortos clandestinos e que

destes, 21% terminam com a morte materna o que equivale a morte de 6 mil

mulheres por ano.

18

FONTE: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/70914/7/978924854 8437_por.pdf

FIGURA Nº 1

Nos Estados Unidos o aborto é legalizado desde 1973 e por ano realizam –

se 730 mil abortos, nos anos seguintes a legalização a taxa de mulheres que

recorriam ao aborto era de 29,3%, porém, este número vem caindo com o passar

dos anos e após quatro décadas de legalização o número de mulheres que

recorrem ao aborto nos Estados Unidos é de 16,9%. Observa-se com os números

apresentados que o direito ao aborto não implica necessariamente em um

aumento do número de abortos (O estadão, blog Guga Chacra, disponível em:

http://internacional.estadao.com.br/blogs/gustavo-chacra/por-que-ha-mais-abortos-

no-brasil-do-que-nos-eua-onde-e-legalizado/, acesso em 02.05.2015)

Nos países onde o aborto não é tipificado como na Holanda, a Espanha e a

Alemanha, observa-se uma taxa muito baixa de mortalidade e uma queda no

número de interrupções, porque passa a existir uma política de planejamento

reprodutivo efetiva. (Coletivo feminista Classista Ana Montenegro . Disponível em:

19

https://anamontenegrodotorg.files.wordpress.com/2014/10/nota-polc3adtica-sobre-

violc3aancia-obstc3a9trica-no-hospital-materno-de-marc3adlia-ana-

montenegro.pdf, acesso em 01.05.2015).

O Uruguai, que descriminalizou o aborto em outubro de 2012 também tem

experimentado grandes quedas em suas estatísticas, tanto no número de mortes

maternas quanto no número de abortos realizados. Segundo números

apresentados pelo governo, entre dezembro de 2012 e maio de 2013, não foi

registrada nenhuma morte materna por consequência de aborto e o número de

interrupções de gravidez passou de 33 mil por ano para 4 mil. Isso porque, junto

da descriminalização, o governo implementou políticas públicas de educação

sexual e reprodutiva, planejamento familiar e uso de métodos anticoncepcionais,

assim como serviços de atendimento integral de saúde sexual e reprodutiva

(Último segundo, disponível em: http://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/2013-09-

20/clandestinas-retratos-do-brasil-de-1-milhao-de-abortos-clandestinos-por-

ano.html, acesso em: 14.09.2014).

3. O ABORTO NO BRASIL

O Brasil, um país que é predominantemente católico e sofre direta

influência da Igreja em suas leis, assim afirma Rosângela Talib, da ONG Católicas

pelo Direito de Decidir em entrevista ao DoisP, (disponível em RBA, Rede Brasil

Atual, http://www.redebrasilatual.com.br/cidadania/2014/12/proibicao-do-aborto-

no-brasil-penaliza-mulheres-pobres-e-negras-diz-ong-catolica-4727.html) a cultura

brasileira é permeada pelos valores religiosos cristãos e católicos, principalmente,

sendo que desde a descoberta do Brasil a Igreja fez parte do Estado, tendo

influência direta sobre ele, ocorrendo a separação de Estado e Religião somente

na época da República. Até os dias atuais no Brasil a Igreja Católica se coloca

totalmente contra a mera discussão do assunto aborto, o considerando um crime

de homicídio, um assassinato de uma criança, essa opnião reflete-se diretamente

nos parlamentares brasileiros que evitam discutir o tema. Inclusive, tem-se que a

maioria dos parlamentares eleitos se apresentam como religiosos.

20

Deve o Direito curvar-se diante da legislação impondo inclusive aos não

crentes tais determinações?

A Constituição Federal de 1988 garante em seu texto a liberdade de religião

e o princípio da laicidade do Estado, impondo aos poderes públicos neutralidade

em relação as diversas concepções religiosas. No Estado Laico, a fé é questão

privada e o poder político exercido pelo Estado na esfera pública, deve basear-se

em razões igualmente públicas.

As pessoas só são tratadas como iguais pelo Estado quando este

demonstra por elas o mesmo respeito e consideração. Não há respeito e

consideração quando se busca impor determinado comportamento ao cidadão,

não por razões públicas, mas por motivações ligadas a alguma doutrina religiosa

(Sarmento, 2005 p 26).

É necessário que sob o prisma ético e jurídico-cosntitucional que os atos

estatais, como as leis, medidas administrativas e decisões judiciais baseiem-se

em argumentos que possam ser aceitos por todos os que se disponham a um

debate franco e racional (Sarmento, 2005 p.26).

Necessário é a análise do tema sob um aspecto neutro, visando o benefício

dos cidadãos, o menor custo para o Estado e uma sociedade melhor estruturada

para as gerações futuras.

Tratar o aborto como direito social significa questionar as condições

precárias em que ele é realizado no País, ao arriscar a saúde e a vida das

mulheres (http://www.scielo.br/pdf/ref/v16n2/23.pdf).

A lei vigente não se impõe de forma satisfatória, apesar de

buscar-se proteger a vida através da criminalização do aborto no Brasil irá

observar-se através dos dados apresentados no presente trabalho que a

legislação brasileira atual não tem protegido a vida nem do feto ou embrião e nem

a da gestante.

3.1. DADOS E ESTATÍSTICAS

Estima-se serem feitos no Brasil 1,4 milhões de abortos por ano, o

21

equivalente a 35% dos casos latino-americanos (Oliveira 1997 p.119)

Um estudo realizado pela Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia

publicado em 2010 e disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0100-

72032010000300002&script=sci_arttext analisou os abortos no Brasil com um

enfoque demográfico com o objetivo de avaliar a prevalência de abortamentos

espontâneos e induzidos em uma amostra de mulheres brasileiras entrevistadas

na Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde (PNDS) de 1996, abaixo a tabela

com o resultado da pesquisa:

FONTE: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0100-72032010000300002&script=sci_arttext

FIGURA Nº 2

Foram entrevistadas 12.612 mulheres em idade fértil, das quais 14%

afirmaram terem tido um aborto espontâneo e 2,4% afirmaram terem induzido

(provocado) pelo menos um aborto. A maior parte dos abortos espontâneos

ocorreram em mulheres residentes no Nordeste (16%) e a menor por aquelas que

residiam na região sul (11,3%). Com relação ao aborto induzido (provocado) as

regiões com maiores prevalência foram o Rio de Janeiro (6,5%) e o Nordeste

(3,1%) e as menores prevalência foram as regiões do Centro-leste (1,2%), em São

Paulo (1,3%) e na região Centro-Oeste ( 1,3%).

Tanto o relato de aborto espontâneo, como o de provocado, aumentou com

22

a idade das mulheres, com as maiores proporções registradas entre aquelas com

mais de 35 anos de idade (3,9%). O aborto espontâneo predominou entre as

residentes em zona rural (16,1%), enquanto que a referência ao aborto provocado

foi mais frequente entre as entrevistadas na área urbana. Não se obteve diferença

entre os relatos de abortos provocados entre mulheres católicas e evangélicas,

sendo mais elevado entre as mulheres que declararam não ter religião (3,7%) ou

outro credo (4,4%). Tanto o aborto espontâneo quanto o provocado foi mais

frequentemente mencionado entre mulheres não brancas e com mais de um filho

nascido vivo. As entrevistadas casadas ou que viviam junto com o companheiro ,

bem como as mulheres que referiam não ter escolaridade declararam mais

frequentemente eventos provocados e espontâneos. O relato de aborto provocado,

entretanto, foi maior entre as mulheres que consideravam como ideal ter apenas

um filho (3,2%).

23

FONTE: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0100-72032010000300002&s cript= sci_arttext

FIGURA Nº 3

Observa-se através dos dados apresentados que estão mais susceptíveis

ao aborto provocado (induzido) as mulheres que não eram de cor/raça branca,

que residiam na área urbana, com mais de 35 anos, de baixa escolaridade, com

mais de um filho nascido vivo e não adeptas ao catolicismo. A menor escolaridade

e a declaração de cor/raça não branca estiveram indiretamente associadas a

pobreza e, conseqüentemente, com maior risco para o aborto induzido de forma

insegura e maior risco de morte.

Durante muito tempo tem havido consenso sobre o impacto do abortamento

inseguro na saúde pública. Em 1967, a Assembléia Mundial da Saúde identificou o

abortamento inseguro como um problema sério de saúde pública. Há cada vez

mais um consenso sobre o abortamento inseguro ser uma das maiores causas da

24

mortalidade materna, podendo, e devendo, ser prevenido mediante a educação

sexual, medidas de expansão do planejamento reprodutivo, acesso a um

abortamento seguro nos casos previstos em lei e cuidados pós abortamento em

todos os casos de aborto (Disponível em: http://apps.who.int/iris/

bitstream/10665/70914 /7/9789248548437_por.pdf).

As conseqüências sobre a saúde de um abortamento inseguro dependem

dos centros de saúde onde é realizado o abortamento, a capacidade do

profissional que o realiza, o método empregado, a saúde da mulher e a idade

gestacional da gravidez. Os procedimentos do abortamento inseguro podem

implicar na inserção de uma substância ou objeto no útero, a dilatação e a

curetagem feitos de forma incorreta por um profissional não capacitado, a ingestão

de preparados caseiros, nocivos a saúde ou a aplicação de uma força externa.

(Disponível em: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/70914/7/97892485 48437

_por.pdf).

As complicações do abortamento inseguro levam cerca de 20 – 30% das

mulheres para os hospitais por conta de infecções do trato reprodutivo e entre 20 -

40% destas acabam com uma infecção de trato genital superior. Sabe-se ainda

que 1 a 4 mulheres submetidas a um abortamento inseguro provavelmente irá

desenvolver seqüelas temporárias ou permanentes que irão requerer atenção

médica. Dados precisos são de difícil constatação pois muitas das mulheres que

se submetem ao abortamento inseguro não procuram atendimento médico, pela

dificuldade de reconhecer possíveis complicações, por carecer de meios

econômicos necessários ou por temer o abuso, o maltrato e a represália legal

(Disponível em: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/70914/7/9789248548437

_por.pdf, p.20).

O Brasil por ser um país predominantemente católico trata o assunto com

cautela, o aborto é crime só sendo permitido nos casos previstos em lei, como se

verá abaixo, sendo que em qualquer das situações previstas a mulher pode

procurar o Sistema Único de Saúde, que tem 65 unidades aptas a interromper a

gravidez, onde a mulher será acompanhada por uma equipe multidisciplinar, para

a ela garantir uma assistência médica, psicológica e social.

25

Em 2013 foram registrados pelo Sistema Único de Saúde 1523 casos de

aborto realizados de forma legal no Brasil. (EBC Agência Brasil, 11.10.2014

disponível em :http://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2014-10/aborto-um-te

ma -ser-enfrentado-no-brasil, acesso em: 28.03.2015)

No Brasil um caso que teve grande repercussão foi o caso de Jandira

Magdalena dos Santos, de 27 anos, moradora do Rio de Janeiro, que por medo de

perder o emprego decidiu buscar ajuda para realizar um aborto, após a indicação

de uma amiga, entrou em contato com uma clínica de abortos clandestinos,

juntamente com seu companheiro foi até o ponto de encontro e após pagar uma

quantia de R$ 4,5 mil reais se submeteu a um aborto. O procedimento foi

realizado por um falso médico que falsificou os seus documentos e na verdade

estudou somente até o 5º ano de medicina. O aborto terminou com a morte de

Jandira, e para tentar encobrir o crime os integrantes da quadrilha colocaram seu

corpo no porta malas de um carro e o queimaram. Antes disso arrancaram os seus

dentes e apagaram suas digitais para dificultar o reconhecimento do corpo (R7

Notícia. Disponível em: http://noticias.r7.com/rio-de-janeiro/caso-jandira-promotoria

-denuncia-dez-pessoas-por-morte-em-aborto-18112014, acesso em 03.05.2015)

Outro caso recente é o caso da Elizângela Barbosa, 32 anos, moradora do

Rio de Janeiro, casada e mãe de três filhos, foi levada pelo próprio marido para se

encontrar com integrantes da quadrilha que a levariam para uma clínica, onde

seria realizado o aborto. Ocorre que algo saiu errado e Elizângela Barbosa foi

encontrada a beira de uma estrada ainda com vida, porém ao chegar ao hospital

com forte sangramento vaginal não resistiu e veio a óbito (Extra. Disponível em:

http://extra.globo.com/casos-de-policia/mulher-sai-para-fazer-aborto-e-encontrada-

morta-em-niteroi-14009639.html, acesso em 03.05.2015)

Ambos os casos descritos são de mulheres brasileiras, moradoras do Rio

de Janeiro, já com mais de 25 anos e que tinham boa escolaridade. Que por

motivos pessoais não podiam ou não queriam levar adiante uma gestação e

buscaram ajuda em clínicas clandestinas de aborto. Duas mulheres que foram

mortas de forma brutal e sem nenhum respeito à dignidade da pessoa humana,

mortes estas que poderiam ser evitadas caso houvesse uma regulamentação das

26

clínicas e um treinamento para o pessoal que lá trabalhava.

O abortamento inseguro representa 13% das mortes maternas e 20% do

total de casos de mortalidade e deficiências por gravidez e parto. Quase todas as

mortes e a morbidade decorrentes de abortamentos inseguros ocorrem em países

nos quais o abortamento é rigorosamente proibido pela lei e na prática. A cada

ano, morrem em torno de 47 000 mulheres por causa de complicações de

abortamento inseguro e em torno de 5 milhões de mulheres sofrem disfunções

temporárias ou permanentes, incluindo a esterilidade. Nos locais com poucas

restrições ao acesso a abortamento seguro, a taxa de mortes e doenças cai

drasticamente (Disponível em http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/70914/7/978

9248548437_por.pdf, p.87).

3.2. O ABORTO E O DIREITO BRASILEIRO

3.2.1 DA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA

Com relação ao aborto e em como a legislação brasileira o tratou em seus

primórdios diz Maria Tereza Verardo:

“O Código Penal do Império, de 1830, enquadrava o aborto, no capítulo contra a segurança das pessoas e das vidas, mas não o punia quando praticado pela própria gestante. Em 1890, no Código Penal da República, o aborto só era punido quando praticado por terceiros, se, com ou sem a aprovação da gestante, dele resultasse a morte desta. Nos casos de auto-aborto visando ”ocultar desonra própria” concedia-se a redução da pena.” (Verardo, 1996,p.85)

A partir de 1940 o Código Penal, ainda vigente, passou a enquadrar o

aborto no capítulo dos Crimes Contra a Vida, sendo o ato de provocar o aborto é

considerado crime, punido com penas de 1 a 10 anos de reclusão. É o texto do

Decreto- Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940:

27

“Aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento Art. 124. Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lhe provoque: Pena - detenção, de um a três anos. Aborto provocado por terceiro Art. 125. Provocar aborto, sem consentimento da gestante: Pena - reclusão, de três a dez anos. Art. 126. Provocar aborto com o consentimento da gestante: Pena - reclusão, de um a quatro anos. Parágrafo único. Aplica-se a pena do artigo anterior, se a gestante não é maior de quatorze anos, ou é alienada ou debil mental, ou se o consentimento é obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência. Forma qualificada Art. 127. As penas cominadas nos dois artigos anteriores são aumentadas de um terço, se, em consequência do aborto ou dos meios empregados para provocá-lo, a gestante sofre lesão corporal de natureza grave; e são duplicadas, se, por qualquer dessas causas, lhe sobrevem a morte. Art. 128. Não se pune o aborto praticado por médico: Aborto necessário I - se não há outro meio de salvar a vida da gestante; Aborto no caso de gravidez resultante de estupro II - se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.”

Ou seja, há duas situações em que o aborto é autorizado pela legislação penal

brasileira:

1- Para salvar a vida da mãe em casos em que não há outra alternativa se

não a realização do aborto necessário ou terapêutico.

Conforme corrobora a jurisprudência:

APELAÇÃO. PEDIDO DE INTERRUPÇÃO DE GESTAÇÃO. FETO ANENCÉFALO E COM MÚLTIPLAS MAL-FORMAÇÕES CONGÊNITAS. INVIABILIDADE DE VIDA EXTRA-UTERINA COMPROVADA POR

28

EXAMES MÉDICOS. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. APLICAÇÃO DO ARTIGO 128, I, DO CÓDIGO PENAL, POR ANALOGIA IN BONAM PARTEM.Comprovadas por variados exames médicos a anencefalia e as múltiplas mal-formações congênitas do feto, de modo a tornar certa a inviabilidade de vida extra-uterina do nascituro, é possível a interrupção da gestação com base no Princípio constitucional da Dignidade da Pessoa Humana e, por analogia in bonam partem, no artigo 128, I, do Código Penal. (...). O aborto eugênico, embora não autorizado expressamente pelo Código Penal, pode ser judicialmente permitido nas hipóteses em que comprovada a inviabilidade da vida extra-uterina, independente de risco de morte da gestante, pois também a sua saúde psíquica é tutelada pelo ordenamento jurídico. A imposição de uma gestação comprovadamente inviável constitui tratamento desumano e cruel à gestante. 3. Parecer favorável do Ministério Público, nas duas instâncias. RECURSO PROVIDO. (TJRGS, Apelação Crime nº 70040663163, 3.ª Câmara Criminal, Relator: Nereu José Giacomolli, j. em 30/12/2010) (Direito Penal. Disponível em: http://penalemresumo.blogspot.com.br /2010/06/art-128-hipoteses-de-aborto-legitimado.html, acesso em 03.05.2015)

2- Nos casos em que a gravidez é decorrente de uma violência sexual contra

a mulher, realiza-se então o aborto por indicação médica ou o aborto

sentimental.

É a jurisprudência:

ABORTO SENTIMENTAL. CONFLITO QUE SE

ESTABELECE ENTRE OS VALORES VIDA

(DO FETO) E DIGNIDADE HUMANA (DA

GESTANTE). ADOLESCENTE COM SEVERAS

DEFICIÊNCIAS MENTAIS QUE SE VIU

SUBMETIDA A RELAÇÕES SEXUAIS COM O

PRÓPRIO TIO E PADRASTO, QUE DETINHA

SUA GUARDA FORMAL, DO QUE RESULTOU

A GRAVIDEZ. REVOGAÇÃO DA GUARDA

QUE CONFERIU AO MINISTÉRIO PÚBLICO,

PELA FALTA DE REPRESENTANTE LEGAL,

29

LEGITIMIDADE PARA ATUAR EM SEU NOME.

O Código Penal declara impunível o aborto

praticado pelo médico com o consentimento da

gestante vítima de estupro. Assim, fazendo o

legislador, no exercício de suas atribuições

constitucionais, a opção pelo interesse da

dignidade humana em detrimento da mantença

da gravidez, ao magistrado compete, acionada

a jurisdição, assumir a responsabilidade que lhe

cabe no processo, fazendo valer a lei. Se a

realidade evidencia que médico algum faria a

intervenção sem a garantia de que nada lhe

ocorreria, não tem como o magistrado cruzar os

braços, sob o argumento de que só após, se

instaurada alguma movimentação penal, lhe

caberia dizer que não houve crime. Omissão

dessa natureza implicaria deixar ao desabrigo a

vítima do crime, jogando-a à própria sorte. Não

há valores absolutos. Nem a vida, que bem

pode ser relativizada, como se observa no

homicídio praticado em legítima defesa, por

exemplo. E nessa relativização ingressa

também o respeito à dignidade da mulher

estuprada. Ainda mais se, adolescente, com

graves problemas mentais, vê agravada sua

situação de infelicidade pelo fato de ser o

próprio tio e padrasto o autor do crime, o que a

colocou também em situação de absoluta falta

de assistência familiar e de representação legal,

exigindo abrigamento e atuação de parte do

Ministério Público. Manifestação do Ministério

Público, autor da medida, indicada também pela

área técnica do serviço do Município

encarregado de dar atendimento a crianças e

adolescentes vítimas de violência. Recurso

provido. (Agravo de Instrumento Nº

70018163246, Câmara Medidas Urgentes

Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator:

30

Marcelo Bandeira Pereira, Julgado em

03/01/2007)(TJ-RS - AI: 70018163246 RS ,

Relator: Marcelo Bandeira Pereira, Data de

Julgamento: 03/01/2007, Câmara Medidas

Urgentes Criminal, Data de Publicação: Diário

da Justiça do dia 08/01/2007)

Assim mesmo, uma decisão recente do Supremo Tribunal Federal, da Argüição

de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) de número 54,

descaracterizou a antecipação de parto de fetos anencéfalos das hipóteses de

aborto previstas na legislação penal.

O médico Thomaz Rafael Gollop em Conferência na 65ª Reunião Anual da

Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) afirmou que:

“A lei não impede o aborto, só coloca em risco a vida da mulher. Recentemente, num caso aqui no Nordeste, um médico algemou na cama uma mulher que chegou ao hospital com complicações após o aborto; será que enfiar mulheres na penitenciária vai resolver alguma coisa?” (Disponível em: http://cienciahoje.uol. com.br/especiais/reuniao-anual-da-sbpc-2013/c onsenso-para-que).

A ineficácia da lei fica visível quando se analisam os números de

curetagens realizados anualmente no Brasil, em entrevista ao Dr. Drauzio

Varella Gollop afirma que “são dados do datasus, 250 mil curetagens são feitas

anualmente, destas nem todas são consequências de um aborto clandestino,

porém a maioria o são (Dr. Drauzio. Disponível em: http://drauziovarella.

com.br/audios-videos/abortos-no-brasil/).

O estado brasileiro com a política de criminalizar o aborto não tem obtido

resultados favoráveis, pois não tem conseguido alcançar seu objetivo

primordial, qual seja a coibição das condutas do abortamento. (A ineficácia

jurídica e econômica da criminalização do aborto. Disponível em:

http://www.conpedi.org.br/manaus/arquivos/anais/bh/francisco_davi_fernandes

31

_peixoto2.pdf, acesso em 02.05.2015).

Os dados da revista exame publicada no dia 22/12/2014 (Exame.com

http://exame.abril.com.br/brasil/noticias/33-mulheres-foram-presas-por-aborto-

em-2014) corroboram com a afirmação acima, no Brasil, em suas 22 unidades

da Federação, 33 mulheres foram presas em 2014 em decorrência de um

aborto ilegal. A maior concentração foi no Sudeste onde 15 mulheres foram

presas no Rio de Janeiro, 12 em São Paulo, 1 em Minas Gerais. As rés tinham

semelhanças em seus perfis: jovens, negras, com pouca escolaridade e baixa

renda.

3.2.2 PROJETOS DE LEI

Atualmente tramitam na Câmara dos Deputados diversos projetos de lei

que tratam sobre o assunto aborto, um dos mais recentes foi protocolado em 24

de março de 2015 pelo deputado federal Jean Wyllys e prevê a descriminalização

do aborto, com atendimento pelos serviços de saúde, o projeto propõe a liberação

do aborto até a 12ª semana de gestação e até a 20ª semana nos casos de

gravidez que seja fruto de violência, o documento foi elaborado por uma comissão

tripartite, integrada por representantes dos poderes executivo, legislativo e da

sociedade civil, com auxilio de profissionais da área médica e jurídica.

No texto do projeto estima-se que sejam feitos por ano 729 mil a 1 milhão

de abortos clandestinos por ano.

A lei prevê ainda que o Ministério da Educação crie tópicos para a

discussão da educação sexual e reprodutiva nas escolas focando na prevenção

de uma gravidez indesejada (O dia Brasil, disponível em:

http://odia.ig.com.br/noticia/brasil/2015-03-24/projeto-de-lei-que-legaliza-aborto-e-

protocolado-na-camara.html, acesso em: 30.03.2015).

A reforma do novo Código Penal (Projeto de Lei do Senado Nº 236/2012),

que ainda está em discução no Senado, ainda mantém a prática do aborto como

criminosa, com a sanção de privação de liberdade, mas o artigo 128 no inciso IV

32

terá nova redação e prevê a possibilidade de interrupção da gravidez por vontade

da gestante, até a 12ª semana, desde que atestada por médico ou psicólogo

(Lemos, disponível em: http://jus.com.br/artigos/27412/a-descriminalizacao-do-

aborto-na-proposta-de-reforma-do-codigo-penal).

Art. 128. Não há crime de aborto:I – se houver risco à vida ou à saúde da gestante;II – se a gravidez resulta de violação da dignidade sexual, ou do emprego nãoconsentido de técnica de reprodução assistida;III – se comprovada a anencefalia ou quando o feto padecer de graves e incuráveis anomalias que inviabilizem a vida extrauterina, em ambos os casos atestado por dois médicos; ou IV – se por vontade da gestante, até a décima segunda semana da gestação, quando o médico ou psicólogo constatar que a mulher não apresenta condições psicológicas de arcar com a maternidade.Parágrafo único. Nos casos dos incisos II e III e da segunda parte do inciso I deste artigo, o aborto deve ser precedido de consentimento da gestante, ou, quando menor, incapaz ou impossibilitada de consentir, de seu representante legal, do cônjuge ou de seu companheiro. (http://jus.com.br/artigos/27412/a-descrimin alizacao-do-aborto-na-proposta-de-reforma-do-codigo-penal).

Trata-se da criação de uma excludente de ilicitude, visto que, segundo a

redação do projeto “não há crime de aborto” quanto ao dispositivo ora analisado.

No atual código, toda forma de aborto é criminosa embora não seja punível nos

casos previstos no art. 128, I e II (Disponível em: http://jus.com.br/artigos/27412/a-

descriminalizacao-do-aborto-na-proposta-de-reforma-do-codigo-penal).

4. O ABORTO COMO UMA QUESTÃO DE SAÚDE PÚBLICA

4.1 UMA QUESTÃO DE SAÚDE PÚBLICA

Apesar da reconhecida ilegalidade, sabe-se que muitas mulheres recorrem

ao aborto utilizando-se de métodos caseiros, através de medicações proibidas e

33

contrabandeadas ou mesmo por atendimento em clínicas clandestinas. Os abortos

clandestinos constituem um grave problema para a saúde pública, acarretando

uma grande quantidade de mortes maternas, principalmente a de mulheres pobres,

negras e de baixa escolaridade (Disponível em http://apps.who.int/iris/

bitstream/1066 5/70914/7/9789248548437_por.pdf acesso em 30.03.2015).

Quando esses procedimentos não levam a mulher ao óbito (o aborto

inseguro é uma das maiores causas de mortalidade materna), um número

considerável deles acaba trazendo para as mulheres complicações, como

hemorragias, infecções, perfurações abdominais, podendo desencadear inclusive

uma infertilidade (Disponível em http://apps.who.int/iris/bitstream/1066 5/70914/

7/9789248548437_por.pdf acesso em 30.03.2015).

Deve-se esclarecer que um aborto clandestino não necessariamente é um

aborto inseguro, para as mulheres que podem pagar, ou seja, a minoria, existem

clínicas clandestinas com condições muito boas de higiene e com médicos

treinados, porém a realidade brasileira é outra, onde a maioria da população nem

sempre tem dinheiro para investir em uma boa clínica clandestina, aceitando

realizar o procedimento de abortamento em qualquer clínica que aceite o valor que

a mulher tem em mãos (dados reportagem publicada em 20.09.2013, Último

segundo. Disponível em: http://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/2013-09-20/

clandestinas-retratos-do-brasil-de-1-milhao-de-abortos-clandestinos-por-)ano.html,

acesso em: 14.09.2014)

A mulher que opta pelo aborto é moralmente punida e legalmente

penalizada. As especificidades do país e a legislação federal só perpetuam um

ciclo de marginalização feminina e desigualdade social. A lei do aborto é uma lei

ineficaz, afinal, executa mulheres diariamente, sendo quase uma pena de morte

feminina através da legislação. Quem recorre ao aborto, já se encontra em

situação de vulnerabilidade, afinal, ninguém faz aborto porque gosta, sendo

ele a última solução para situações extremas. A Pesquisa Nacional do Aborto

constatou que metade das mulheres que realizaram aborto recorreram ao Sistema

Único de Saúde por complicações no procedimento. Mesmo o ministério da saúde

reforçando que todas devem ser atendidas, independente de qual tipo de aborto,

34

espontâneo ou induzido, muitos profissionais da saúde ainda deixam a moral

interferir na sua conduta e as denunciam à policia. Além disso, existem relatos de

negligência por parte dos servidores, fazendo quem já se está em uma situação

física extremamente debilitada ter que esperar horas para serem atendidas com

procedimentos sem anestesia (Disponível em Revista Vaidapé https://revista

vaidape.wordpress.com/2014/09/27/criminalizacao-do-aborto-a-mulher-marginaliza

da-pelo-sistema/, acesso em 03.05.2015).

Sobre o tema declarou ainda a Organização Mundial de Saúde (OMS):

Nos países onde o aborto induzido legal está sumamente restrito ou não está disponível, na maioria das vezes o aborto seguro se torna um privilégio dos ricos, e as mulheres de baixa renda são as mais suscetíveis a procurar métodos inseguros, que provocam a morte e morbidade, gerando responsabilidade social e financeira para o sistema de saúde público (Disponívelem http://apps.who.int/iris/bitstream/ 10665/70914/7/9789248548437_por.pdf, acesso em 02.05.2015)

Em 1967 a Assembléia Mundial de Saúde identificou o abortamento como

um problema sério de saúde pública em muitos países.

A Organização Mundial de Saúde (OMS) em 2004 declarou:

O abortamento inseguro, uma causa evitável de mortalidade e morbidade maternas, deve ser abordado como parte do Objetivo de Desenvolvimento do Milênio relativo à melhoria da saúde materna e de outros objetivos e metas internacionais de desenvolvimento (Disponível em:http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/704 /7/9789248548437_por.pdf)

Acredita-se que no mundo 22 milhões de mulheres se submetam a um

abortamento inseguro a cada ano, e que 47 mil delas morrem por causa das

complicações dele decorrentes (Abortamento seguro: orientação técnica e de

políticas para sistemas de saúde, disponível em: http://apps.who.int/iris/

bitstream/10665/70914/7/9789248548437_por.pdf, acesso em: 30.03.2015).

35

No Brasil, conforme afirma o médico Thomaz Rafael Gollop, são 250 mil

internações por ano para o tratamento de complicações pós-abortamento,

internações estas que geram um custo de 30 milhões ao Estado (Instituto Ciência

Hoje. Disponível em http://cienciahoje.uol.com.br/especiais/reuniao-anual-da-sbpc-

2013/consenso-para-que acesso em 03.05.2015).

As internações realizadas por conta de um aborto mal sucedido superam

em 41% as internações por câncer de mama ou de colo de útero. A curetagem

(limpeza do útero necessária para evitar infecções graves) é o procedimento

hospitalar mais realizado no País (TN OnLine. Disponível em:

http://tnonline.com.br/noticias/brasil/33,48835,08,10,sus-interna-12-mulheres-por-

hora-por-causa-de-aborto.shtml acesso em 01.05.2015)

Abaixo dois gráficos que demonstram o número de curetagens pós-

abortamento realizadas no Sistema Único de Saúde (SUS) nos 10 estados

brasileiros com maior incidência, nos anos de 1995 e 2000, números estes que

denunciam a elevada ocorrência de abortos clandestinos no país:

FONTE: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/estatisticas_992000.pdf

36

FIGURA Nº 4

FONTE:http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/estatisticas_992000.pdf

FIGURA Nº 5

Nos seis primeiros meses de 2010, foram gastos R$ 12,9 milhões para

internar mulheres com seqüelas resultantes de abortos realizados em péssimas

condições de higiene. No caso das curetagens os valores superam R$ 30 milhões.

Um procedimento simples do ponto de vista médico torna-se oneroso diante das

complicações.

Nos países onde há poucas restrições ao abortamento seguro verifica-se

uma queda nos números de mortes e doenças além da diminuição no número de

abortos realizados.

Segundo Rosângela Talib (Coordenadora da Organização Católica pelo

Direito de Decidir) isso ocorre porque nos países onde há a legalização do aborto,

ao buscar o sistema de saúde as mulheres recebem informações aumentando

assim a probabilidade de elas saírem do serviço de saúde com métodos

37

contraceptivos e também terem um número maior de informação sobre a saúde

reprodutiva. Rosângela Talib ainda avalia que:

“Nem a interdição legal, com a criminalização, nem a interdição religiosa, que coloca como pecado, tem impedido que as mulheres realizem o aborto. A proibição tem sido inócua como possibilidade de diminuir a prática e isso tem levado a uma série de problemas de saúde pública”.

O resultado prático, do ponto de vista da saúde pública, da clandestinidade

e ilegalidade do aborto é: o SUS arca com os custos do atendimento pós-aborto

mal sucedido (mesmo sendo o aborto proibido) e muitas mulheres acabam

pagando com a própria vida pela falta de regulamentação ou legalização.

4.1.2 DOS DIREITOS SEXUAIS E REPRODUTIVOS.

O artigo 226, §7º da Constituição Federal garante à família brasileira o livre

planejamento familiar, cabendo ao Estado não interferir mas garantir a informação,

tecnologia e ciência necessárias para que a família tenha meios para trilhar seu

caminho individual, decidindo por ela mesma entre outras questões, o de quantos

filhos terão e se algum dia o terão ou não.

“Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado: §7º - Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas.”

Com relação às políticas públicas relacionadas à questão do aborto, o

direito à saúde constitui uma decorrência lógica dos direitos reprodutivos

Piovesan destaca que o efetivo exercício dos direitos reprodutivos demanda

políticas públicas que assegurem a saúde sexual e reprodutiva. Nesta perspectiva,

é fundamental o direito ao acesso a informações, meios e recursos seguros,

38

disponíveis e acessíveis. (Piovesan.2002, p.77).

4.1.3 DA LEI DO PLANEJAMENTO FAMILIAR

A lei número 9.263 de 12 de janeiro de 1996 foi elaborada para

regulamentar o § 7º do art. 226 da Constituição Federal, que trata do

planejamento familiar e estabelece penalidades. A principal finalidade da lei é

possibilitar a mulheres e homens o direito de escolher ter ou não filhos, o número

e a época de tê-los.

O planejamento familiar deve ser feito dentro de um atendimento global e

integral à saúde, tendo como princípio básico: a) assistência à concepção (o ter

filhos) e contracepção (o não ter filhos), através de métodos e técnicas

cientificamente aceitos e que não coloquem em risco a vida e a saúde das

pessoas; b) o atendimento pré-natal; c) a assistência durante e depois do parto e

ao recém-nascido; d) o controle das doenças sexualmente transmissíveis

(DST/AIDS); e) o controle e prevenção do câncer de colo de útero, mama e pênis

(CFEMEA, Disponível em: http://www.cfemea.org.br/index.php?option=com

_content&view=article&id=1422:planejamento-familiar&catid=157:saude-e-dsdr&

Itemid=127, acesso em 03.05.2015).

Com relação ao aborto, afirma o médico Thomaz Gollop ser o planejamento

importantíssimo, pois se eficaz, ele irá diminuir consideravelmente o número de

gestações indesejadas e por conseqüência o número de abortos realizados (Dr.

Drauzio Varella. Disponível em: http://drauziovarella.com.br/audios-videos/aborto-

e-planejamento-familiar/, acesso em 03.05.2015).

4.1.4 ABORTO, UMA VISÃO INTERNACIONAL SOBRE O TEMA

Apesar de muito se falar e de se debater sobre o tema aborto, o tratamento

jurídico utilizado no Brasil, compara-se a forma em que 68% das nações mais

pobres do mundo o tratam, ou seja sendo proibida a prática ou permitida em casos

de estupro ou para salvar a vida da mulher (Planeta Sustentável. Disponível em:

39

http://planetasustentavel.abril.com.br/noticia/desenvolvimento/conteudo_283054.s

html?func=2 acesso em 03.05.2015)

No mapa abaixo esses países são os que estão na cor vermelha.

Os países em marrom são onde o aborto é permitido nos casos de estupro

ou para salvar a vida da mulher e para preservar a saúde física da mulher (34

países, 9,4% da população).

Os países em amarelo são onde o aborto é permitido também nos casos

em que a gravidez provoca abalo emocional para a mulher (23 países, 4,1% da

população).

Os países em azul são onde o aborto é permitido também por razões

socioeconômicas, quando a mulher alega falta de recursos financeiros (14 países,

21,3% da população).

Os países em verde são onde o aborto é permitido sem nenhuma restrição

(56 países, 39,3% da população).

40

FONTE: http://planetasustentavel.abril.com.br/pops/ mapa_aborto_claudia_pop.shtml

FIGURA Nº 6

Foi publicado em 28.04.2014 pelo Opera Mundi uma reportagem a qual

descrevia a regulamentação do aborto realizada por alguns países, são os países

descritos (http://operamundi.uol.com.br/conteudo/reportagens/35023/saiba+como+

o+aborto+e+regulamentado+em+sete+paises.shtml acesso 05.03.2015):

EUA: Regulamentado em âmbito estatal desde 1973 sob a diretriz

da Suprema Corte Roe v. Wade, o aborto é legalizado em todo o território norte-

americano. Na maioria dos estados, é permitido realizar o procedimento até o

momento do nascimento, em casos de riscos para a mãe. Entretanto, desde 2010,

em estados com orientação conservadora e com os Republicanos em maioria no

legislativo, aproximadamente 130 leis que restringem o aborto foram aprovadas.

Em outubro de 2013, por exemplo, o estado do Texas aprovou uma legislação que

endureceu a aprovação do procedimento. Como consequência, aponta pesquisa

recente, houve aumento de“autoabortos” no estado, comparado ao restanto dos

EUA.

Uruguai: É permitido, em qualquer circunstância até a 12ª semana de

gestação. Em casos de estupro, são permitidos até a 14ª semana. Quando há

risco para a mãe ou má formação do feto, podem ser feitos em qualquer período

da gestação. A lei está em vigor desde 2012. Após um ano de vigência, 6.676

41

abortos seguros foram realizados e nenhuma morte foi registrada.

Espanha: Em dezembro do último ano, o país aprovou um projeto que

restringe a Lei Orgânica de Proteção aos Direitos Humanos, na qual o aborto era

permitido sob qualquer circunstância, que estava em vigor até então. Atualmente,

o procedimento só é permitido em caso de perigo grave contra a saúde física e

psíquica da mulher, ou estupro, até a 12ª semana. Com a nova legislação, no

caso de má formação do feto, as mulheres precisam provar que o diagnóstico

pode causar danos à saúde psicológica para terem autorização de abortar.

Argentina: A legislação permite a realização de abortos em casos de risco

à vida e à saúde da mãe, estupro e abuso a uma mulher incapacitada. No entanto,

o parágrafo que regulamenta a questão gera diferentes interpretações entre juízes

e médicos, causando polêmicas. Em 2013, um hospital em Buenos Aires se

negou a realizar o aborto, se valendo de uma interpretação da lei, utilizada

frequentemente por grupos conservadores. O Ministério da Saúde da província de

Buenos Aires precisou intervir na ocasião para garantir o direito da mulher ao

aborto.

Cuba: É permitido desde 1965. A mulher pode fazer o procedimento por

qualquer motivo até a 10ª semana de gestação. Após a legalização, pesquisas

indicaram queda acentuada de mortalidade materna, além da diminuição da taxa

de fecundidade no país. Cuba e Paraguai são os únicos países da América Latina

que permitem a realização do procedimento em qualquer circunstância.

França: É permitido por lei na França, por qualquer motivo, até a 12ª

semana de gravidez. A legislação do país também exige o aconselhamento da

mulher durante o processo. Até o início do ano, era permitido quando a mulher

estivesse em “situação de desamparo”. Após a aprovação de uma emenda na

Assembleia Nacional, em janeiro, o procedimento passou a ser permitido nos

casos em que “a mulher não queira dar procedimento com a gravidez”.

Todos os países tiveram bons resultados com a regulamentação do aborto,

diminuindo o número das mortes de mulheres e do número de procedimentos

realizados.

42

4.1.5 PRINCÍPIO DA AUTONOMIA

Deve-se sempre respeitar a vontade das pessoas, a elas é garantido a livre

decisão sobre como irá levar a sua vida e o que irá fazer com o seu corpo.

Sobre esse tema Guilherme de Souza Nucci afirmou:

“Certa intervenção do estado na esfera do particular é sim necessária e útil dentro do que propõe o próprio conceito de estado e de liberdade individual. Ocorre que esta intervenção deve sempre respeitar os direitos da pessoa e sua dignidade aos moldes do que prega um Estado Democrático de Direito”

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������������������������������ ���� ����������������������� ��������

���� ������������� ������ impor a obrigação de levar adiante uma gravidez

não desejada, ou a gravidez de um embrião que tenha sido diagnosticado possuir

anomalias genéticas que acarretarão em poucos dias ou meses de vidas após o

nascimento, não são só os nove meses de gestação, mas sim as consequencias

físicas, psicológicas e financeiras dessa imposição para a vida da mulher (Gomes.

Disponível em: http://www.advogado.adv.br/estudantesdireito/uit/marciapelissari

gomes /oaborto.htm, acesso 05.02.2015).

4.2 PRINCÍPIOS E DIREITOS CONSTITUCIONAIS

4.2.1 PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA.

A dignidade da pessoa humana é um dos fundamentos pilares do estado

democrático de direito garantido pelo artigo 1º, III da Constituição Federal:

43

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: III - a dignidade da pessoa humana;

Ingo Wolfgang Scarlet definiu a dignidade da pessoa humana como:

“A qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão dos demais seres humanos.”

Em confronto com a liberdade da mulher de dispor sobre seu corpo há a

inviolabilidade da vida do feto imposta pelo Estado. Em gestações em que a

mulher descobre ter o feto uma anomalia que poderá influenciar diretamente na

sua chance de vida, a mesma nada pode fazer, a não ser a de levar a gestação

adiante e esperar as consequências.

Os direitos do nascituro devem ser respsitados sem que isto afete

diretamente a dignidade da pessoa humana da mulher.

4.3. DESCRIMINALIZAÇÃO X LEGALIZAÇÃO DO ABORTO

Segundo Rosângela Talib da ONG Católicas pelo Direito de Decidir em

entrevista ao DoisP, (disponível em RBA, Rede Brasil Atual,

http://www.redebrasilatual.com.br/cidadania/2014/12/proibicao-do-aborto-no-brasil-

penaliza-mulheres-pobres-e-negras-diz-ong-catolica-4727.html, acesso em 25 de

abril de 2015) descriminalizar o aborto seria o aborto deixar de ser crime,

retirando-o do código penal brasileiro, deixando portanto de ser crime e um

44

atentado contra a vida, crime este que atualmente é imposto para a mulher que

realizar o aborto ou o técnico que a auxiliar passando estes a serem considerados

como criminosos e sendo passível a eles a imputação da pena determinada em lei.

É importante ressaltar que a atual criminalização do aborto é uma afronta

aos direitos fundamentais femininos, aos direitos reprodutivos e ao princípio da

autonomia.

Ao adotarmos a expressão descriminalização do aborto sugere-se que o

Estado deve apenas deixar de considerar a conduta típica, o que não importa no

compromisso do mesmo em fornecer o procedimento na rede pública de saúde ou

dar qualquer tipo de suporte aos envolvidos. Por outro lado, ao se adotar a

expressão legalização do aborto, diz-se que o Estado deve, além de

descriminalizar a conduta, fornecer o procedimento nos hospitais públicos,

promover campanhas de esclarecimento, acompanhamento psicológico e outras

formas de suporte ocorrendo também à interferência direta do Ministério da Saúde

que então poderá regulamentar e direcionar para onde devem ser encaminhadas,

como será procedimento e quem irá atender essas mulheres.

Para assegurar os direitos reprodutivos e da autonomia das mulheres na

tomada de decisões sobre o seu corpo e por conta da ameaça dos abortos

inseguros deve o Estado se posicionar sobre o assunto e não se calar. Somente

com uma atitude do legislativo brasileiro é que se podera assegurar as mulheres

meios seguros de realizar o procedimento, porém, a não descriminalização e a

não legalização do aborto nos dias atuais tem um alto custo para o Estado, as

clínicas ilegais continuam agindo sem nenhuma supervisão de médicos ou

instruções de como conduzir essa intervenção de forma segura.

As mulheres se sentem desamparadas e perdidas, sem ter aonde buscar

ajuda ou ter com quem conversar sobre o assunto, tomando quase sempre

sozinhas a decisão de recorrer ou não a uma clínica clandestina, ficando a mercê

das pessoas que lá trabalham. O aborto inseguro tem uma forte associação com a

morte de mulheres - são quase 70 mil no mundo todos os anos, destes 70 mil 95%

acontecem em países em desenvolvimento, a maioria com leis restritivas.

Até mesmo entre os governantes o tema já é tratado de forma mais branda

45

em reportagem publicada pela revista veja em junho de 2008 (Revista Veja on-line.

Disponível em :http://veja.abril.com.br/idade/exclusivo/perguntas_respostas/aborto

/#6, acesso em : 20.10.2014) algumas opiniões foram expostas:

“Os ministros José Gomes Temporão (Saúde) e Nilcéa Freire (Políticas para as Mulheres) defendem a discussão e a eventual aprovação no Congresso da legalização do aborto de fetos com até 12 semanas de gestação, quando começa a formação do sistema nervoso central. Segundo Temporão, a aceitação da descriminalização do aborto é um processo de amadurecimento da sociedade".

A Organização Mundial da Saúde (OMS) também trata sobre o assunto em

sua Cartilha Abortamento Seguro: orientação técnica e de políticas para sistemas

de saúde (Abortamento seguro: Orientação técnica e de políticas para sistemas de

saúde, 2ª edição, Disponível em: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/

70914/7/9789248548437_por.pdf, acesso em: 30.03.2015)

“Tribunais e organizações internacionais, regionais e nacionais de direitos humanos recomendam cada vez mais a legalização do aborto, prestando atendimento médico à mulher em situação de abortamento com vistas a proteger sua vida e sua saúde e, em caso de estupro, unicamente com base em boletim de ocorrência lavrado pela mulher, garantindo que as leis, mesmo que restritivas, sejam interpretadas e executadas de forma a promover e proteger a saúde da mulher” (Oliveira. 2013 p.97).

O Brasil começa a dar seus passos na luta para retirar o aborto do Código

Penal e torná-lo um direito da mulher, O Conselho Federal de Medicina (CFM)

manifestou apoio à questão, a entidade defende que o país não deve considerar o

procedimento como crime e apóia a autonomia da mulher em abortar até a décima

segunda semana de gestação. O Conselho Federal de Psicologia já havia se

manifestado a favor da descriminalização do aborto, em junho de 2012.

Conforme afirma Rosângela Talib da ONG Católicas pelo Direito de Decidir

em entrevista ao DoisP, (disponível em RBA, Rede Brasil Atual,

46

http://www.redebrasilatual.com.br/cidadania/2014/12/proibicao-do-aborto-no-brasil-

penaliza-mulheres-pobres-e-negras-diz-ong-catolica-4727.html, acesso em 25 de

abril de 2015) a descriminalização e a legalização levariam a questão aborto para

onde ela já deveria estar, na questão da saúde sexual e reprodutiva da população.

Ao tirar-se o stigma e o preconceito em relação ao tema, tira-se da mulher a carga

social negativa e psicológica de que realizar um aborto seria algo criminoso.

Há necessidade de um respaudo social para essas mulheres que precisam

de compreensão e de ser entendidas e não julgadas ou criminalizadas.

5. CONCLUSÃO

No mundo todo a questão relativa ao tratamento jurídico que deve ser

conferido ao aborto desperta polêmicas intensas, colocando em lados opostos os

defensores do direito à escolha da mulher e os que defendem o direito à vida do

nascituro. As divergências são grandes e envolvem diretamente argumentos

jurídicos, morais e de saúde pública.

A Constituição brasileira de 1988 não tratou expressamente do aborto

voluntário seja para autorizá-lo, seja para proibi-lo, o que não significa que a

interrupção voluntária da gravidez tenha sido tratada com indiferença, pois a

matéria está impregnada na constituição através de seus princípios e valores

consagrados.

A vida humana intra-uterina também é protegida pela Constituição Federal

de 1988, mas com intensidade menor do que a vida de alguém já nascido, esta

proteção intra-uterina não é uniforme, aumentando progressivamente na medida

em que o embrião se desenvolve. O tempo de gestação é fator relevante para se

mensurar o nível de proteção à vida pré-natal, fato este, que deve ser

especialmente observado na definição do regime jurídico do aborto.

A Constituição em seu texto garante o direito a saúde a todos os seus

cidadãos, porém a criminalização do aborto na forma em que se encontra fere o

direito a saúde da mulher de duas formas: primeiramente lesando o direito da

gestante quando as obriga a levar a termo gestações que coloquem em risco sua

47

saúde física ou mental e em segundo levam a uma lesão coletiva ao direito de

saúde das mulheres em idade fértil, não havendo uma norma com eficácia

preventiva, não há uma efetiva prevenção na realização de abortos, o que tem

trazido um elevado indíce de abortos clandestinos realizados e como sua

consequência a realização de um grande número de internações para realização

de curetagens e outros tratamentos pós-abortamento.

O aborto no Brasil apesar de ser considerado crime e de somente ser

permitido perante a lei nos casos de estupro ou risco de vida para a mãe, é uma

realidade diária nos hospitais públicos ou privados, realidade esta corroborada

pelos números e dados estatísticos apresentados neste trabalho. Esses números

são de fácil acesso e amplamente abordados por profissionais das mais variadas

áreas, em palestras, artigos, congressos e debates, números estes que deveriam

ser seriamente analisados pelo Estado e não ignorados, sendo atualmente o tema

tratado como assunto pacificado, uma vez que já o é englobado pela legislação

vigente.

Ainda podemos verificar através dos dados apresentados que a

criminalização do aborto acaba empurrando todos os anos centenas de milhares

de mulheres no Brasil, principalmente as mais humildes, a procedimentos

clandestinos e perigosos, realizados sem as mínimas condições de segurança e

higiene. E as consequências destes procedimentos representam hoje uma das

maiores causas de mortalidade materna no país, vidas estas que poderiam ser

poupadas.

Manter o tema como se encontra significa fechar os olhos para algo comum

e que mata, sobretudo mulheres negras e pobres, pois o que atualmente define

um “aborto bem sucedido” de um “aborto mal sucedido” no Brasil, é a condição

social da mulher e de quanto ela dispunha para pagar pelo procedimento.

A discussão sobre o aborto não tem o intuito de mudar a opinião individual

da população, mas a de alterar a legislação, para evitar que as pessoas que

precisam se submeter ao procedimento não sejam criminalizadas e virem reféns

das clínicas clandestinas.

Deve-se ressaltar que nos países que legalizaram a interrupção voluntária

48

da gravidez, não se constatou aumento significativo nos números de abortos

realizados.

Os efeitos dissuasórios da legislação atualmente vigente, ou seja da

legislação repressiva, são mínimos: quase nenhuma mulher deixa de praticar o

aborto voluntário em razão da proibição legal. E a taxa de condenações criminais

tem números irrisórios.

Pode-se verificar que a legislação atual não salva a vida potencial de fetos

e embriões e não respeita o direito da autonomia reprodutiva da mulher não

protegendo também a sua saúde.

Com relação ao Código Penal e sua solução legislativa dada para o aborto

verifica-se que o mesmo deixou de ponderar os direitos fundamentais à saúde, à

privacidade, à autonomia reprodutiva e à igualdade da mulher, pois, não atribuiu

peso a praticamente nenhum dos referidos direitos fundamentais da gestante.

As várias declarações e resoluções assinadas por diversos países tem

demonstrado haver cada vez mais um consenso de que o abortamento inseguro é

uma importante causa de mortalidade materna, devendo e podendo, o mesmo ser

combatido e prevenido com campanhas sobre a educação sexual, acesso

igualitário aos vários métodos contraceptivos e acesso ao abortamento seguro.

Juntamente com a eliminação do abortamento inseguro essas medidas são

as mais importantes a serem tomadas frente a saúde pública, visando o respeito

ao indivíduo, a proteção e o cumprimento dos direitos humanos, com um fácil

acesso ao melhor padrão de saúde possível, dando aos casais e indivíduos a

liberdade de decidir livre e responsavelmente o número, espaçamento e o

momento de terem filhos, o direito de receberem informação e os meios

necessários para que alcancem a mais elevada qualidade de saúde sexual e

reprodutiva. A mulher o direito de ter controle do seu corpo e de decidir livre e

responsavelmente sobre temas relacionados com sua sexualidade, incluindo a

saúde sexual e reprodutiva, sem coerção, discriminação e nem violência, o direito

de ter acesso à informação sobre a saúde e dos avanços da medicina.

Poderia no Brasil ser implantada uma política de planejamento reprodutivo

que funcionasse, com a informação sendo amplamente divulgada, afinal, se

49

preocupar com a saúde pública é realizar o planejamento familiar e este é mais do

simplesmente controlar a natalidade, é levar a saúde com responsabilidade,

educação e informação.

Há uma grande importância no fato dos governantes brasileiros colocarem

o assunto em pauta para se legalizar o aborto, descriminalizando-o e o

regulamentando, criando programas assistenciais, capacitando profissionais e

estabelecimentos.

Observa-se no Projeto de Lei nº 236/2012, que visa à reforma do Código

Penal e ainda em tramite no Senado, uma tendência à descriminalização do

aborto, ainda que não venha a lograr êxito, ou se for vetada ou alterada,

demonstra um crescimento no anseio social acerca do tema.

Quando se observa o aborto como um problema de saúde publica verifica-

se que, conforme os dado apresentados no presente trabalho, atualmente são

gastos milhões de reais não com a prevenção do aborto, mas sim com as

conseqüências que os abortos vem causando. Mulheres sofrem um preconceito

diário seja nas clínicas clandestinas ou ao chegarem machucadas nos hospitais e

a legislação vigente não consegue impor o que deveria, ou seja, oprimir a busca

pelo aborto ou impedir que estes ocorressem.

A afirmação de que o Sistema Único de Saúde teria um aumento em seus

gastos, caso ocorresse a regulamentação do aborto, é incabida pois, o Governo já

gasta esses milhões para tratar as consequências dos abortos clandestinos

realizados.

Por todas essas razões, verifica-se uma iminente necessidade em reformar-

se a legislação atual visando a proteção ao direito constitucional à saúde da

mulher e a legalização e realização pelo Sistema Único de Saúde dos

procedimentos de interrupção voluntária da gravidez em fase inicial da gestação.

50

6. REFERÊNCIAS

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