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UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO FACULDADE DE HUMANIDADES E DIREITO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO FÁBIO PIRES IDENTIDADES E TEOLOGIAS NO PRIMEIRO CÂNTICO DO SERVO DE YHWH: Estudo exegético de Isaías 42,1-9 SÃO BERNARDO DO CAMPO 2014

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UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO

FACULDADE DE HUMANIDADES E DIREITO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO

FÁBIO PIRES

IDENTIDADES E TEOLOGIAS NO PRIMEIRO CÂNTICO

DO SERVO DE YHWH:

Estudo exegético de Isaías 42,1-9

SÃO BERNARDO DO CAMPO

2014

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FÁBIO PIRES

IDENTIDADES E TEOLOGIAS NO PRIMEIRO CÂNTICO

DO SERVO DE YHWH:

Estudo exegético de Isaías 42,1-9

Dissertação apresentada em cumprimento às exigências do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião da Universidade Metodista de São Paulo, para obtenção do grau de Mestre.

Orientador: Prof. Dr: José Ademar Kaefer

SÃO BERNARDO DO CAMPO

2014

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A dissertação de mestrado sob o título "Identidades e Teologias no Primeiro

Cântico do Servo de YHWH: estudo exegético de Isaías 42,1-9", elaborada por

Fábio Pires, foi apresentada em 14 de agosto de 2014, perante a banca

examinanora composta por Prof. Dr. José Ademar Kaefer (Presidente

UMESP), Prof. Dr. Tércio Machado Siqueira (Titular - UMESP) e Prof. Dr. Luiz

José Dietrich (Titular PUC- PR).

______________________________________________________

Professor Dr. José Ademar Kaefer

Orientador e Presidente da Banca Examinadora

______________________________________________________

Professor Dr. Helmut Renders

Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião

Programa: Ciências da Religião Área de Concentração: Linguagens da Religião I Linha de pesquisa: Literatura e Religião no Mundo Bíblico

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DEDICATÓRIA

A minha irmã Sandra Pires

(in memorian) pela sua alegria, dedicação à família e o seu compromisso

pastoral junto a Comunidade Nossa Senhora de Guadalupe no Acaraú.

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AGRADECIMENTOS

Aos professores do Programa de Pós-Graduação em Ciências da

Religião da Universidade Metodista de São Paulo;

Ao Prof. Dr. José Ademar Kaefer pela amizade, incentivo e orientação

nesta pesquisa;

Ao Prof. Dr. Luiz José Dietrich, por suas importantes contribuições e

correções do texto.

Ao Pro. Dr. Tércio Machado Siqueira;

A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior -

CAPES, pelo financiamento da bolsa ao longo do tempo de pesquisa;

Agradeço a minha família pelo apoio e incentivo durante esse tempo de

estudo;

Aos amigos e amigas, que mesmo indiretamente me acompanharam

nesse estudo e pesquisa;

Agradeço a Congregação dos Missionários do Verbo Divino, família

religiosa e missionária da qual faço parte.

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PIRES, Fábio. Identidades e Teologias no Primeiro Cântico do Servo de

YHWH. Estudo Exegético de Isaías 42,1-9. São Bernardo do Campo: Umesp,

2014. Disertação (Mestrado em Ciências da Religião) - Faculdade de

Humanidades e Direito, Universidade Metodista de São Paulo (UMESP).

RESUMO

A identidade do Servo de YHWH sempre foi um grande desafio para a

pesquisa bíblica. Quem seria esse Servo? Não se pretende saber

historicamente quem foi o Servo de YHWH, pois isso é uma tarefa impossível.

Pretende-se levantar algumas pistas a partir do contexto histórico e do próprio

texto do Dêutero-Isaías que permita pensar na possibilidade de que uma

comunidade exilada na Babilônia fosse chamada de Servo e destinada por

YHWH para tal missão. Na perícope de Is 42,1-9, YHWH convoca o Servo

para uma missão bem específica: fazer sair o direito para as nações. Esse

direito que o Servo fará sair às nações é o direito de YHWH que se manifesta

na libertação concreta de todos os encarcerados. O Servo com suas posturas

silenciosas e proféticas, com sua prática solidária aos sofredores e com sua

tenacidade, levará adiante esse projeto de libertação. Por meio dos

procedimentos exegéticos e com referencial teórico de diferentes autores que

já pesquisaram sobre esse tema, pretende-se investigar a possibilidade de que

neste cântico do Servo de YHWH possa nascer uma Teologia do Servo que

está em profunda sintonia com o Ser do próprio YHWH. Desta maneira, YHWH

- Servo carregam um mesmo projeto concreto de libertação que tem como

fundamento o direito e a justiça. Surge, então, no meio do povo sofrido, um

novo modelo de liderança política.

Palavras chave: Servo, YHWH, direito, justiça, aliança, exílio, esperança.

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PIRES, Fábio. Identidades y Teologías en el Primer Canto del Siervo de

YHWH. Análises Exegético de Isaías 42,1-9. São Bernardo do Campo: Umesp,

2014. Maestria em Ciencias de la Religión. Facultad de Humanidades y

Derecho, Universidad Metodista de São Paulo (UMESP).

RESUMEN

La identidad del Siervo de YHWH siempre ha sido un gran desafío para

la investigación bíblica. ¿Quién podría ser dicho Siervo? No se busca

comprobar históricamente quien fue el Siervo de YHWH, lo que sería una tarea

imposible, sino, apuntar algunas direcciones, desde el contexto histórico y

desde el texto mismo del Deutero-Isaías, que lleven a pensar la posibilidad de

que una comunidad exilada en Babilonia fuera llamada como Siervo y

destinada por YHWH para una misión. Presenta la perícopa de Is 42,1-9, en la

que YHWH convoca al Siervo para una misión muy específica: hacer salir

(brotar, surgir) el derecho para las naciones (pueblos). Este derecho que el

Siervo saldrá a las naciones es el derecho de YHWH que se manifiesta en la

liberación concreta de todos los encarcelados. El Siervo, con sus posturas

silenciosas e proféticas, con su práctica solidaria con los que sufren y con su

tenacidad, llevará adelante dicho proyecto de liberación. A través del método

exegético y con referencial teórico de diferentes autores que han investigado

sobre el tema, se pretende averiguar la posibilidad de que en este cántico del

Siervo de YHWH nazca una Teología del Siervo que esté en profunda sintonía

con el Ser del propio YHWH. Así, YHWH y Siervo llevan el mismo proyecto

concreto de liberación que tiene como fundamento el derecho y la justicia.

Surge en el medio del pueblo que sufre un modelo nuevo de liderazgo político.

Palabras claves: Siervo, YHWH, derecho, justicia, alianza, exilio, esperanza.

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PIRES, Fábio. Identities and Theologies in the First Song of the Servant of

YHWH. Exegetical analysis of Isaiah 42,1 to 9. São Bernardo do Campo:

Umesp, 2014. Thesis (Master of Science in Religion) - Faculty of Humanities

and Law, Methodist University of São Paulo (UMESP).

ABSTRACT

The identity of the Servant of YHWH has been always a challenge for

biblical research. Who is this Servant? It is not intended to know who historically

was the Servant of YHWH, as this is an impossible task. It is intended to raise

some clues from the historical context and the actual text of Deutero-Isaiah that

leads to consider the possibility that an exile community in Babylon was called

servant and destined by YHWH for such a mission. In the passage from Isaiah

42.1 to 9, YHWH calls the Servant for a very specific mission. This right that

Servant will come out to the nations is the right to happen for the nations. This

is about the law of the Lord, that manifested in the release of all prisoners. The

Servant with his silent and prophetic postures, with his solidarity practice to the

sufferers and his tenacity will carry forward this project of liberation. Through

exegetical procedures and theoretical framework of different authors who have

already researched on this topic, it intends to investigate the possibility that this

song of the Servant of YHWH arises a Theology of the Servant who is deeply in

tune with the Being of YHWH himself. Thus, YHWH - Servant carries the same

concrete project of liberation that is founded in the justice and right. Awakens

among the suffered people, a new model of political leadership.

Keywords: Servant, YHWH, right, justice, alliance, exile, hope.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ................................................................................................. 14

CAPÍTULO I ..................................................................................................... 19

1. Exegese de Is 42,1-9 ................................................................................ 19

1.1. Texto Massorético de Is 42,1-9 e tradução interlinear ........................ 19

1.2. Crítica textual de Is 42,1-9 .................................................................. 21

1.3. Uma primeira tradução do texto de Is 42,1-9 ...................................... 24

1.4. Delimitação do texto de Is 42,1-9........................................................ 25

1.5. Subdivisão e estrutura de Is 42,1-9 .................................................... 28

1.6. Coesão de Is 42,1-9 ............................................................................ 30

1.7. Estilo literário ...................................................................................... 34

1.8. A divisão do livro do Dêutero-Isaías ................................................... 37

1.8.1 A origem do Livro e autoria ............................................................... 40

1.9. Análise semântica e comentários do texto de Is 42,1-9 ...................... 42

1.9.1. Análise dos termos significativos do primeiro versículo: Is 42,1 ...... 42

1.9.1.1. !hEÜ (eis) .......................................................................................... 43

1.9.1.2. yDIb.[; (meu Servo) ........................................................................ 45

1.9.1.3. Raiz verbal $mt (suster) ............................................................... 51

1.9.1.4. yrIßyxiB. (meu escolhido) ................................................................. 53

1.9.1.5. ht'äc.r" (se agradou) ....................................................................... 54

1.9.1.6. yvi_p.n: (a minha pessoa) ................................................................ 56

1.9.1.7. ‘yxiWr (meu espírito) ...................................................................... 57

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1.9.1.8. jP'Þv.mi (direito) .............................................................................. 58

1.9.1.9. ayci(Ay ~yIïAGl; (para as nações fará sair) ........................................ 60

1.9.2. Análise dos termos significativos do segundo versículo: Is 42,2 ..... 63

1.9.2.1. q[;Þc.yI al{ï (não clamará) .............................................................. 63

1.9.2.2. [:ymiîv.y:-al{)w> aF'_yI al{åw> (e não erguerá e não fará escutar) ........... 65

1.9.2.3. #WxßB; (na rua) ............................................................................. 67

1.9.2.4. Al*Aq (a voz dele) ...................................................................... 68

1.9.3. Análise dos termos significativos do terceiro versículo: Is 42,3 ....... 68

1.9.3.1. ‘#Wcr" hn<Üq' (cana a que é despedaçada) ...................................... 69

1.9.3.2. rABêv.yI al{å (não quebrará) .......................................................... 71

1.9.3.3. hh'Þke hT'îv.piW (e pavio vacilante) ................................................... 72

1.9.3.4. hN"B<+k;y> al{ï (não extinguirá) ......................................................... 73

1.9.3.5. tm,Þa/w, (para verdade) ................................................................... 74

1.9.3.6. jP'(v.mi ayciîAy (fará sair direito) ..................................................... 75

1.9.4. Análise dos termos significativos do quarto versículo: Is 42,4 ......... 76

1.9.4.1. ‘hh,k.yI al{Ü{ (não desanimará) ....................................................... 77

1.9.4.2. #Wrêy" al{åw> (e não despedaçará)................................................... 78

1.9.4.3. jP'_v.mi #r<a'ÞB' ~yfiîy"-d[; (até pôr na terra direito) ......................... 78

1.9.4.4. ~yYIïai Atßr"Atl.W (e na instrução dele, ilhas) .................................... 79

1.9.4.5. Wlyxe(y:y> (esperarão) ....................................................................... 81

1.9.5. Análise dos termos significativos do quinto versículo: Is 42,5.......... 82

1.9.5.1. hw"©hy> Ÿlaeäh') rm;úa'-hKo (assim disse o Deus YHWH) ................... 82

1.9.5.1.1. rm;úa'-hKo (assim disse) ............................................................... 83

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1.9.5.1.2. laeäh' (O Deus) .......................................................................... 86

1.9.5.1.3. hw"ßhy> (YHWH) ............................................................................ 87

1.9.5.2. arEÛAB (o que cria) ......................................................................... 92

1.9.5.3. ~yIm;’V'h; #r<a'Þh' (os céus e a terra) ............................................. 95

1.9.5.4. h'yl,ê[' ~['äl' ‘hm'v'n> !tEÜnO (o que dá alento para o povo sobre ela) .. 96

1.9.5.5 HB'( ~ykiîl.hol; x:Wrßw> (e espírito para os que andam nela) ............... 98

1.9.6. Análise dos termos significativos do sexto versículo: Is 42,6 .......... 98

1.9.6.1. qd<c,Þb. ^)ytiîar"q. hw"±hy. ynIôa] (Eu, YHWH, te chamei em Justiça) .. 99

1.9.6.1.1. )̂ytiîar"q. (te chamei) ................................................................. 99

1.9.6.1.2. qd<c,Þb. (em justiça) ................................................................. 100

1.9.6.2. ^d<+y"B. qzEåx.a;w> (e agarrarei firme a tua mão) ................................ 101

1.9.6.3. ª̂r>C'a,w> (e te guardarei) ................................................................ 102

1.9.6.4. ~yI)AG rAaðl. ~['Þ tyrIïb.li ^±n>T,a,w> (e te colocarei para aliança de

povo, como luz de nações) ...................................................................... 103

1.9.6.4.1. ~['Þ tyrIïb.li (para aliança de povo) ......................................... 104

1.9.6.4.2. ~yI)AG rAaðl. (para luz de nações) ............................................. 106

1.9.7. Análise dos termos significativos do sétimo versículo: Is 42,7 ....... 107

1.9.7.1. tAr+w>[i ~yIn:åy[e x:qoßp.li (para abrir olhos cegos)........................... 107

1.9.7.2. rySiêa; ‘rGEs.M;mi ayciÛAhl . (para fazer sair da prisão encarcerado) . 109

1.9.7.3. %v,xo) ybev.yOð al,K,Þ tyBeîmi (de casa de confinamento os habitantes de

escuridão) ................................................................................................ 110

1.9.8. Análise dos termos significativos do oitavo versículo: Is 42,8 ........ 111

1.9.8.1. ymi_v. aWhå hw"ßhy> ynIïa] (eu YHWH, esse é o meu nome) ............... 111

1.9.8.2. !Teêa,-al{) rxEåa;l. ‘ydIAbk.W (e a minha glória para outro não darei)

................................................................................................................. 112

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1.9.9. Análise dos termos significativos do nono versículo: Is 42,9 ......... 113

1.9.9.1. tAnàvoarI)h' (as primeiras coisas) ............................................... 114

1.9.9.2. Wab'_-hNEhi (adentraram) ............................................................... 115

1.9.9.3. vd'x' (novas)............................................................................... 116

1.9.9.4. dyGIëm; ynIåa] (eu o que relata) ......................................................... 116

1.9.9.5. hn"x.m;Þc.Ti ~r<j,îB. (antes de brotarem) ......................................... 117

1.9.9.6. ~k,(t.a, [ymiîv.a; (farei escutar a vós) ......................................... 117

1.9.9.6.1. ~k,(t.a, (a vós) ......................................................................... 118

1.10. Síntese do estudo da análise semântica e da exegese de Is 42,1-9

................................................................................................................. 119

1.11. Tradução como conclusão do estudo semântico ............................ 125

CAPÍTULO II .................................................................................................. 127

2. Contexto histórico do Dêutero-Isaías ...................................................... 127

2.1. O domínio assírio .............................................................................. 127

2.1.1. A reforma e a rebelião de Ezequias (727-698 a.C.) ....................... 130

2.1.2. A decadência do império assírio a partir de 625 a.C ..................... 132

2.1.3. A reforma de Josias (640-609 a.C.) ............................................... 133

2.2. A dominação egípcia ........................................................................ 134

2.3. A dominação babilônica a partir de 605 a.C ..................................... 135

2.4. Exílios e cativeiros ............................................................................ 137

2.4.1. A situação dos exilados na Babilônia ............................................. 138

2.4.2. O declínio do império babilônico .................................................... 139

2.4.3. O império persa ............................................................................. 141

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CAPÍTULO III ................................................................................................. 143

3. A teologia do Servo de YHWH ............................................................... 143

3.1. Diferentes abordagens da identidade do Servo de YHWH ............... 143

3.1.1. O Servo de YHWH como coletividade ........................................... 143

3.1.2. Ciro (559-530 a.C.) como Servo de YHWH ................................... 145

3.1.3. O Servo de YHWH como indivíduo ................................................ 146

3.1.4 O Servo de YHWH como messias .................................................. 148

3.1.5 O Servo de YHWH como figura anônima ...................................... 149

3.2. Identidade e missão do Servo de YHWH .......................................... 150

3.3. A crise de fé ...................................................................................... 152

3.4. Os deuses babilônicos ...................................................................... 153

3.5. Características próprias de YHWH em Is 42,1-9 .............................. 154

3.5.1 O direito de YHWH ......................................................................... 154

3.5.2. YHWH o que cria ........................................................................... 155

3.5.3. Assim disse YHWH ........................................................................ 156

3.5.4. A exclusividade de YHWH ............................................................. 158

3.5.5. YHWH, o que chama em justiça .................................................... 159

3.5.6. A glória de YHWH .......................................................................... 160

3.5.7. YHWH e as coisas novas .............................................................. 161

3.6. YHWH e o db,[, (Servo) .................................................................... 162

CONCLUSÃO................................................................................................. 164

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................... 167

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INTRODUÇÃO

Nesta pesquisa bíblica exegética partiremos de um texto específico que

se encontra em Isaías 42,1-9. Este texto é classificado como Primeiro Cântico

do Servo de YHWH. Quanto à sua autoria do bloco 40-55, é aplicado a um

profeta anônimo, chamado Dêutero-Isaías, que provavelmente estava entre os

exilados levados à Babilônia na segunda deportação de (587 a.C.)1. O

contexto histórico é do final do exílio babilônico, por volta do ano 538 a.C.,

período em que surge uma grande potência, a Pérsia, sob o comando do rei

Ciro.

Buscaremos neste estudo apresentar algumas hipóteses sobre a

compreensão da identidade do Servo de YHWH. Quem seria o Servo? E

também quem é YHWH na compreensão do Dêutero-Isaías? Sabemos que

historicamente não temos condições de afirmar quem foi o Servo de YHWH, e

não há consenso entre os estudiosos quanto à sua identidade. Porém, nos

interessa para esse estudo, partindo da exegese bíblica, do contexto histórico

do exílio babilônico e de referenciais teóricos, apresentar algumas pistas que

nos levem a uma maior compreensão da identidade do Servo de YHWH e

consequentemente da Teologia que estaria nascendo nesse contexto histórico

específico.

A perícope que iremos estudar está situada na primeira parte do livro do

Dêutero-Isaías, e, entre os temas fundamentais, um que merece destaque é o

da polêmica entre YHWH e os deuses. Quem teria capacidade de influenciar a

vida social, política e religiosa das pessoas exiladas? YHWH ou os deuses

babilônicos? Neste pano de fundo teológico, a exclusividade de YHWH é

fundamental para sustentar uma teologia que desse ânimo para o povo

cansado e abatido que não via perspectivas na compreensão de sua fé e de

sua vida. Então, o nosso estudo sempre voltará a esse tema da correlação

entre YHWH e o Servo, pois é a partir dele que poderemos perceber que as

1 MARQUES, Maria Antônia; NAKANOSE, Shigeyuki. Segundo Isaías Is 40-55. In: Estudos

Bíblicos n. 89, Petrópolis: Vozes, 2006, p. 61.

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identidades estão fluídas: YHWH-Servo. Somente assim coisas novas podem

acontecer e o direito pode sair às nações.

O texto é um canto, um poema. Porém, a nossa análise terá um enfoque

histórico e sociológico. Não iremos analisar o texto somente do ponto de vista

literário. Iremos ao texto e contexto para percebemos o chão da realidade,

onde possivelmente o texto tenha brotado como sinal de esperança e de novas

perspectivas teológicas para um grupo específico, um grupo de judaítas

exilado na Babilônia.

No primeiro capítulo partiremos do Texto Hebraico, também conhecido

como Texto Massorético, Is 42,1-9. Apresentaremos uma tradução interlinear

que nos acompanhará durante toda a pesquisa, pois entendemos que ele é

nosso ponto de partida e nosso ponto de chegada, tanto na compreensão do

texto como um todo quanto da compreensão dos termos fundamentais. A

seguir faremos a crítica textual de Is 42,1-9, verificando as diferentes

traduções, bem como as variantes, para acrescentá-las em nossa pesquisa ou

para mantermos o Texto Massorético como fundamental. Delimitaremos a

nossa perícope, identificando o início e o fim da mesma, e fechando o bloco de

estudo em Is 42,1-9. Analisaremos as subdivisões do texto, em seguida

apresentaremos uma proposta de estrutura e, finalmente, verificaremos se a

perícope que estudamos está coesa.

Do ponto de vista da literatura, verificaremos o estilo literário, a divisão

do livro do Dêutero-Isaías, autoria e origem.

Iniciaremos o estudo semântico do texto de Is 42,1-9 analisando todos

os termos que perpassam a perícope, inclusive para melhorar a tradução

própria do texto hebraico. No final desse estudo, apresentaremos uma síntese

dessa primeira parte da análise semântica e uma segunda tradução do texto.

Daremos destaque aos seguintes termos da perícope: A partícula

demonstrativa "eis", o substantivo "Servo", seguido do sufixo pronominal "meu",

o verbo "suster", o adjetivo "escolhido", seguido do sufixo pronominal "meu", o

substantivo "espírito", seguido do sufixo pronominal "meu", o substantivo

"direito" e a expressão verbal "fazer sair direito". Do ponto de vista das atitudes

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do Servo, daremos destaque ao advérbio de negação "não" que acompanha os

verbos: "clamar, erguer, fazer escutar, quebrar, apagar, desanimar e

despedaçar". A partir do v.5 daremos destaque à expressão: "assim disse o

Deus YHWH", o verbo "criar', os substantivos: "justiça", "aliança" e "luz". Ainda

veremos a expressão: "para abrir olhos cegos", "nome", seguido do sufixo

pronominal "meu" e "coisas novas".

No segundo capítulo da nossa pesquisa daremos enfoque ao contexto

histórico. Para uma melhor compreensão do sentido do texto que estudamos,

iremos aprofundar os grandes impérios que antecederam o período histórico do

Dêutero-Isaías. Então, veremos a força imperial e o domínio da Assíria, do

Egito, da Babilônia e da Pérsia. E, também os reis de Judá, entre eles,

Ezequias e Josias e suas reformas religiosas. Apresentaremos um quadro dos

exílios que marcaram a história do povo de Israel, seguido das deportações e

das consequências para a vida social, política e religiosa daqueles que foram

deportados. Com essa visão panorâmica da história e dos diferentes exílios,

estaremos preparando o chão da realidade, para entrarmos na reflexão

teológica do Servo de YHWH.

No terceiro capítulo destacaremos a figura do Servo de YHWH e as

diferentes abordagens na compreensão da sua identidade.

Numa primeira abordagem, iremos destacar a identidade do Servo como

uma coletividade, pois no conjunto dos textos do Dêutero-Isaías

compreendemos que o povo de Israel é chamado de Servo, ou uma parcela

desse povo. Há quem afirme que o imperador Ciro também seja chamado de

servo, pois no contexto do exílio, Ciro com sua política de "liberdade religiosa"

poderia ter sido visto como um sinal de esperança para o povo para um

possível retorno à terra natal e na reconstrução do templo. Há ainda uma

abordagem individual, que é aplicado ao próprio Dêutero-Isaías, ou seja, que o

autor fosse o Servo de YHWH. Uma interpretação do Servo de YHWH como

messias tem também destaque entre os estudiosos. Há quem afirme que

podemos perceber nos cantos do Servo, e principalmente no primeiro canto,

que se trate de uma escolha real, com projeto de futuro. Isto é, o Servo é

apresentado como uma liderança política, é ungido para o seu ministério,

recebe uma investidura e uma missão específica. Então, poderia também ser

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considerado messias. E, finalmente, o Servo poderia ser também uma figura

anônima. Os que defendem essa teoria se baseiam na prática e nas atitudes

do Servo.

Continuaremos a nossa reflexão apresentado uma relação entre a

identidade do Servo e de sua missão. E nessa parte do estudo damos

destaque à identidade coletiva do Servo como comunidade exilada, sendo a

missão um projeto específico de libertação.

Do ponto de vista da reflexão teológica, daremos destaque à crise de fé

que vivia o povo exilado. Neste item, surgem sérios questionamentos que o

povo exilado na Babilônia levanta sobre o poder, a aliança e a fidelidade de

YHWH. Onde estaria o Deus todo poderoso? Aqui o Dêutero-Isaías, na sua

reflexão teológica, afirma a força e o poder de YHWH em comparação com os

Deuses babilônicos. Somente YHWH é capaz de criar coisas novas e

restabelecer uma nova ordem para as nações e povos.

Outro ponto de nosso estudo será uma breve reflexão sobre os Deuses

babilônicos e sua atuação na vida dos exilados. Nos capítulos 40-48 do

Dêutero-Isaías, fica evidente de um lado o poder e a força de YHWH e de

outro, a força dos Deuses. Por isso, queremos resgatar e apresentar as

influências que estes exerciam na vida do povo de um modo geral e na vida

dos exilados. Este pano de fundo é fundamental na compreensão da profecia

do Dêutero-Isaías e na imagem de Deus que o mesmo procurará mostrar.

Veremos que a mensagem de esperança que irá brotar para o povo exilado

nascerá do direito de YHWH que é um projeto de libertação. E o direito é

inerente à vida do próprio YHWH.

Prosseguindo o estudo, entre as características de YHWH, uma que é

fundamental na profecia do Dêutero-Isaías é o ato de criar: "YHWH o que cria".

YHWH cria o mundo físico e também a vida humana. Portanto, o tema da

criação será aprofundado nessa parte do nosso estudo. Dentro do contexto

político da chegada do império persa e da figura de Ciro, nasce também para o

povo exilado um novo horizonte de esperança. Aí poderemos compreeder o

sentido do termo "criar coisas novas". Essas coisas novas serão anunciadas

ao próprio povo exilado e, YHWH é aquele que anuncia essa novidade. Este

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projeto de liberdade e de vida nova nasce para uma comunidade que

experimentou na pele o sofrimento de estar em uma terra estrangeira, num

contexto político e social diferente e marcado por uma forte crise de fé.

A fórmula do mensageiro: "assim disse o Deus YHWH" também merece

ser destacado. A partir dessa fórmula, iremos aprofundar a identidade de

YHWH, principalmente no que ele diz e na sua atuação na história. Ou seja,

naquilo que ele faz. Portanto, ele é exclusivo. Somente com essa concepção

da exclusividade de YHWH poderemos compreender porque o povo sofrido e

exilado poderia renovar sua fé e manter a esperança.

Ainda iremos aprofundar nesse capítulo o tema da justiça, enquanto

exigência ética e um convite para uma atuação concreta em prol da libertação.

Quando o projeto de vida e liberdade surge a partir de um convite especial de

YHWH a seu Servo, de fazer sair o direito e a prática da justiça, a glória de

YHWH se manifesta no meio do povo.

E, finalmente, na última parte da nossa reflexão iremos retomar o

estudo feito e unir as identidades: YHWH-Servo e apresentar uma reflexão

teológica que nasce a partir dessa relação de intimidade e de serviço concreto

em prol do direito e da justiça.

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CAPÍTULO I

1. Exegese de Is 42,1-9

Pretendemos com essa pesquisa desenvolver uma exegese de Is 42,1-9,

partindo do Texto Massorético, seguido de uma tradução literal. Após a tradução

literal será feito um trabalho da crítica textual e uma primeira tradução harmonizada

do texto de Is 42,1-9. Daremos continuidade à exegese com a delimitação da

perícope, a subdivisão e estrutura da mesma. Faremos, ainda, uma breve

apresentação do livro do Dêutero-Isaías, sua origem e autoria.

Finalizaremos essa primeira parte do estudo verificando a coesão do texto,

o estilo literário, a análise semântica e o comentário.

1.1. Texto Massorético de Is 42,1-92 e tradução interlinear3

Apresentamos o Texto Massorético de Is 42,1-9, seguido de uma tradução

interlinear.

yvi_p.n: ht'äc.r" yrIßyxiB. ABê-%m't.a, yDIb.[; !he 1

minha pessoa se agradou meu escolhido, susterei a ele, meu Servo, Eis

`ayci(Ay ~yIïAGl; jP'Þv.mi wyl'ê[' ‘yxiWr yTit;Ûn"

fará sair. para as nações direito sobre ele meu espírito dei

`Al*Aq #WxßB; [:ymiîv.y:-al{)w> aF'_yI al{åw> q[;Þc.yI al{ï 2 a voz dele. na rua e não fará escutar erguerá e não clamará Não

2 Utilizaremos neste estudo exegético a abreviação (Is) ao citarmos o Dêutero-Isaías, que

compreendem os capítulos 40-55 do Livro do profeta Isaías. 3 Utilizamos para essa tradução:

CERNI, Ricardo. Antiguo Testamento Interlinear Hebreu-Espanõl. Libros Proféticos. Barcelona: Clie, Tomo IV, 2002, pp.133-134. Bible Works for Windows version 8.0.

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hN"B<+k;y> al{å hh'Þke hT'îv.piW rABêv.yI al{å ‘ #Wcr" hn<Üq' 3 extinguirá não vacilante e pavio quebrará não a que é despedaçada Cana

`jP'(v.mi ayciîAy tm,Þa/l,

direito. fará sair para verdade

Atßr"Atl.W jP'_v.mi #r<a'ÞB' ~yfiîy"-d[; #Wrêy" al{åw> ‘hh,k.yI al{Ü 4 e a instrução dele direito; na terra até pôr despedaçará, e não desanimará Não

p `Wlyxe(y:y> ~yYIïai

esperarão. ilhas

hw"©hy> Ÿlaeäh' rm;úa'-hKo) 5 YHWH, o Deus disse Assim

h'ya,_c'a/c,w> #r<a'Þh' [q:ïro ~h,êyjeAnæw> ‘~yIm;’V'h; arEÛAB e os produtos dela, a terra o que estira e o que os estende, os céus o que cria

`HB'( ~ykiîl.hol; x:Wrßw. h'yl,ê[' ~['äl' ‘hm'v'n> !tEÜnO nela. para os que andam e espírito sobre ela para o povo alento o que dá

^d<+y"B. qzEåx.a;w> qd<c,Þb. ^)ytiîar"q. hw"±hy> ynIôa] 6 a tua mão; e agarrarei em justiça te chamei YHWH, Eu,

`~yI)AG rAaðl. ~['Þ tyrIïb.li i ^n>T,a,w> ª̂r>C'a,w.

de nações. como luz de povo como aliança e te colocarei e te guardarei

‘rGEs.M;mi ayciÛAhl. tAr+w>[i ~yIn:åy[e x:qoßp.li7

da prisão para fazer sair cegos olhos Para abrir

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`%v,xo) ybev.yOð al,K,Þ tyBeîmi rySiêa;

escuridão os habitantes de confinamento de casa de encarcerado

!Teêa,-al{) rxEåa;l. ‘ydIAbk.W ymi_v. aWhå hw"ßhy> ynIïa] 8 não darei para outro e minha glória o meu nome esse YHWH Eu

`~yli(ysiP.l; ytiÞL'hit.W

para imagens esculpidas e o meu louvor

‘tAvd"x]w:) Wab'_-hNEhi tAnàvoarI)h' 9

e as novas adentraram As primeiras coisas

p `~k,(t.a, [ymiîv.a; hn"x.m;Þc.Ti ~r<j,îB. dyGIëm; ynIåa]

a vós. farei escutar de brotarem antes o que relata Eu

1.2. Crítica textual de Is 42,1-9

O estudo que se pretende nesta parte da crítica textual é de optar pelas

variantes textuais para chegar ao texto de Isaías 42,1-9 que mais se aproxima do

original ou manter o Texto Massorético como texto fundamental.

A perícope de Isaías 42,1-9, objeto de nosso estudo possui versão grega

(Septuaginta) e algumas variantes em relação ao Texto Massorético (Texto

Hebraico). Podemos identificar algumas variantes em relação ao Texto de Hirbet

Qumran4, chamado de Manuscritos do Mar Morto. Ou seja, manuscrito 1QIsª

(Primeiro livro de Isaías encontrado na gruta 1).

Para esse estudo, teremos como base a Biblia Hebraica Stuttgartensia5.

Para Croatto: "o texto hebraico do Segundo Isaías é um dos melhores do Antigo

4 A denominação Hirbet tem origem na palavra árabe khirbeh que significa "ruína".

5 BÍBLIA. HEBREU. Biblia Hebraica Stuttgartensia. Deutsche Bibelgesellschft. 5ª ed., 1997, p. 739.

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Testamento”6, por isso a perícope que iremos estudar, de modo geral, não apresenta

grandes dificuldades no que se refere à crítica textual.

Em Isaías 42,1, temos a expressão yDIb.[,; (meu Servo)7 e yriyxiB. (meu

escolhido). Na Septuaginta constam as expressões VIakw,b o` pai/j mou (Jacó, meu

Servo) e Israhl o` evklekto,j mou (Israel, o meu escolhido)8. Porém, entendemos

que o texto da Septuaginta é uma tentativa de interpretação de quem seria o Servo,

portanto, "Jacó, meu Servo" e "Israel, meu escolhido", são expressões fundamentais

para estudo de Is 42,1-9 e na compreensão da identidade do Servo de YHWH.

Desta maneira, seguiremos os acréscimos da Septuaginta na nossa pesquisa

exegética.

Em Isaías 42,1 há, ainda, um acréscimo em relação ao vocábulo jP'Þv.mi.

Segundo Alonso Schökel9, este vocábulo é traduzido por: "Causa; julgamento;

direito; norma. Assumiremos a tradução "direito". No manuscrito 1QIsª, consta a

locução AjP'Þv.miW (e o direito dele). As versões da BHS, da Septuaginta e a Vulgata

não consideram este acréscimo "w" (e/dele) no início e no final. Também, aqui,

manteremos o Texto Massorético como fundamental, sem os acréscimmos

encontrados no manuscrito 1QIsª, quer dizer, a traduziremos o termo jP'Þv.mi por

"direito".

Em Isaías 42,3, na BHS, temos a expressão verbal hN"B<+k;y> (extinguirá), no

manuscrito 1QIsª consta a forma verbal hB,k.yi (extinguirá). Mantemos o Texto

Massorético como fundamental, com a expressão verbal: "extinguirá".

6 CROATTO, José Severino. Isaías a palavra profética e sua releitura hermenêutica. Vol II: 40-55 A

libertação é Possível. São Leopoldo, Petrópolis: Sinodal, Vozes, 1988, p.17. 7 Sempre utilizaremos o termo (Servo) com letra maiúscula por ser um substantivo significativo para

esse nosso estudo. 8 BÍBLIA. GREGO. Septuaginta. Deutsche Bibelgesellschaft, Stuttgart, 2006, p. 622.

Todas as citações neste estudo e deste acréscimo da Septuaginta que se encontra em Is 42,1 terão esta nota como referência. 9 ALONSO SCHÖKEL, Luis. Dicionário Bíblico Hebraico-Português. São Paulo: Paulus, 2ª ed., 1994,

p. 410.

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Em Isaías 42,4, na BHS, temos a expressão verbal #Wrêy" (despedaçará), na

Septuaginta temos a forma verbal: qrausqh,setai (será quebrada). A forma verbal é

para ser lida #wOryE (será despedaçada). Assumimos a expressão verbal:

"despedaçará" conforme a BHS.

Em Isaías 42,6ª, na BHS, temos a expressão verbal qzEåx.a;w> (e agarrarei), a

forma verbal é para ser lida como qzEåx.a;w" (e agarrei). Em Isaías 42,6b, na BHS,

aparece a expressão verbal ª̂r>C'a,w> (e te guardarei): a forma verbal é para ser lida

como ^ªr>C'aw",e (e te guardei). Em Isaías 42,6c, na BHS, encontramos a expressão

verbal ±̂n>T,a,w> (e te colocarei): a forma verbal é para ser lida como ^±n>T,a,w" (e te

coloquei). Assumimos as expressões verbais: "e agarrarei", e "te guardarei", e "te

colocarei" como se encontra na BHS.

Em Isaías 42,9, na BHS, temos a expressão verbal [ymiîv.a; (farei escutar):

esta redação consta exatamente dessa maneira no Códice de Leningrado B19a (L),

porém muitos manuscritos hebraicos medievais e em muitas edições impressas da

Biblia Hebraica, consta o sinal vocálico patah sob a letra ayin: [;ymiîv.a; (farei escutar).

Mantemos a expressão verbal como está na BHS e sem o patah sob a letra [ (ayin).

Na BHS: (farei escutar).

Após analisarmos todos os termos e variantes na versão grega

(Septuaginta), no Manuscrito do Mar Morto 1QIsª, na Vulgata e demais versões,

podemos concluir que o Texto Massorético, da Biblia Hebraica Stuttgartensia ( BHS)

é a fonte mais fidedigna e é o que utilizaremos para nosso estudo exegético de Is

42,1-9. Iremos assumir o Texto Massorético para a nossa pesquisa, porém, com o

acréscimo da Septuaginta em Is 42,1: "Jacó, meu Servo", "Israel, meu eleito". E,

como afirma Croatto: "não se trata de escolher a forma mais antiga como sendo a

melhor, mas a melhor pelo seu sentido"10.

10

CROATTO, 1998, p. 19.

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Após verificarmos os termos e as variantes nesse estudo da crítica textual,

apresentamos abaixo uma primeira tradução do texto de Is 42,1-9.

1.3. Uma primeira tradução do texto de Is 42,1-9

V.1 Eis Jacó meu Servo, susterei a ele, Israel, meu escolhido, se agradou minha

pessoa dei meu espírito sobre ele, direito para as nações fará sair.

V.2 Não clamará e não erguerá e não fará escutar na rua a voz dele.

V.3 Cana a que é despedaçada não quebrará e pavio vacilante não extinguirá para

verdade fará sair direito.

V.4 Não desanimará e não despedaçará, até pôr na terra direito; e a instrução dele,

ilhas esperarão.

V.5 Assim disse o Deus YHWH, o que cria os céus e o que os estende; o que estira

a terra e os produtos dela, o que dá alento para o povo sobre ela, e espírito para os

que andam nela.

V.6 Eu, YHWH, te chamei em justiça e agarrarei a tua mão; e te guardarei e te

colocarei como aliança de povo, como luz de nações.

V.7 Para abrir os olhos cegos; para fazer sair da prisão encarcerado, de casa de

confinamento os habitantes de escuridão.

V.8 Eu YHWH, esse o meu nome; e a minha glória para outro não darei e o meu

louvor para as imagens esculpidas.

V.9 As primeiras coisas adentraram; e as novas eu o que relata, antes de brotarem,

farei escutar a vós.

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1.4. Delimitação do texto de Is 42,1-9

Ao delimitarmos a perícope em estudo Is 42,1-9, nos perguntamos pelo

início e o fim da perícope, onde começa e onde termina o texto que iremos estudar.

Porém, acreditamos que mais importante que saber onde começa e onde termina

uma perícope, é identificar os temas fundamentais entre os textos e relacioná-los

entre si. Por isso, pretendemos, antes, identificar os temas dos capítulos 41 e 42

para, assim, podermos fudamentar a perícope de nosso estudo.

No capítulo 41, podemos dizer que o tema fundamental é um desafio

lançado por YHWH. Este desafio é lançado primeiramente às ilhas, Is 41,1: ~yYIëai

‘yl;ae WvyrIÜx]h ; (fazei silêncio diante de mim ilhas)11. Depois, aos que são

considerados adversários, Is 41,11: `^b<)yrI yveîn>a; Wdßb.ayOw> (e perecerão os homens

em disputas contigo), e por fim aos deuses, Is 41,29: sp,a,Þ !w<a"ï ~L'êKu !hEå (eis que

são todos nulidade). Então, percebemos que trata-se de um tema específico lançado

por YHWH no capítulo 41. Ainda, em 41,25, temos um novo tema. Alguém é

chamado. ymi_v.bi ar"äq.yI vm,v,Þ-xr:z>Mimi taY:ëw: ‘!ApC'mi ytiArÜy[ih; (eu despertei do norte e

veio desde o levante do sol, se chama por seu nome). Esse tema (convocar

alguém) já tinha iniciado em Is 41,2 qd<c,Þ xr"êz>Mimi ‘ry[ihe ymiÛ (quem despertou desde

o levante um que faz justiça). Então, o capítulo 41 prepara o cântico do Servo que

tem início no capítulo 42,1 com a apresentação do Servo. Em Is 41,2 YHWH faz

surgir um que faz justiça. Em Is 41,25 do norte YHWH desperta um que veio desde o

levante. Em Is 41,26 dyGI©m;-!yae @a:å (niguém anunciou ele). Isto é, ninguém foi capaz

de anunciar a chegada do Servo, do libertador. O texto parece nos apontar uma

crítica a impotência dos deuses em proclamar coisas futuras. Com isso, queremos

dizer que em Is 41,25 já se menciona a chegada do Servo que será apresentado

em Is 42,1.

11

Todos os textos em hebraico deste estudo exegético serão extraídos do Bible Works for Windows. Version 8.0. Terão uma tradução própria.

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Em Is 41,29, encerra-se o tema da impotência dos Deuses em anunciar a

chegada do mensageiro libertador. YHWH faz surgir esse libertador que será

apresentado em Is 42,1 com o nome de db,[, (Servo).

Agora, abordaremos especificamente o v. 29.

~h,_yfe[]m; sp,a,Þ !w<a"ï ~L'êKu !hEå

são os feitos dele inutilidade são maldade que todos eles Eis

p `~h,(yKes.nI Whtoßw x:Wrï

as imagens fundidas deles. e inexistência vento

Tradução:

Eis que todos eles são maldade, inutilidade são os feitos deles; vento e

inexistência as imagens fundidas deles.

Antes de prosseguirmos com a delimitação da nossa perícope, faremos uma

observação para o substantivo Whto’ (inexistência, informidade), pois em Gn 1,2

temos a seguinte expressão: Whto’ ht'îy>h' #r<a'ªh'w> (e a terra era informidade).

Pensamos, então, que o mesmo termo é aplicado para os deuses neste versículo

29. Estes não têm forma e nem vida, segundo o pensamento do Dêutero-Isaías. E

Segundo Gorgulho, "o personagem aqui são os deuses"12. Isso se pode verificar a

partir do uso do pronome: "eles, deles". E num processo de julgamento, a ação de

YHWH põe os falsos deuses em julgamento, pois estes são incapazes de ação. E

neste processo, o silêncio dos deuses é a decisão final. Segundo Croatto, "esse

processo não é doutrinal13". Tudo indica ser um debate para saber quem tem mais

poder: YHWH, os ídolos ou os deuses. Com isso, percebemos que em Is 41,29 o

tema e o conteúdo deste versículo são de outra natureza. O tema de fundo é um

desafio lançado por YHWH contra os ídolos. Segundo Silva, "o vocabulário que

12

GORGULHO, Maria Laura. O Servo de Iahweh nos escritos do Dêutero-Isaías: uma contribuição à História do tema do Justo sofredor na literatura do Oriente Antigo. Rio de Janeiro: PUC, 1989, (Tese Doutorado em Teologia), p. 32. 13

CROATTO, 1998, p. 60.

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apresenta o Servo, em Isaías 42,1 contrasta com a temática de anunciar os deuses,

ou ídolos, de Isaías 41,29"14.

Outro ponto a ser destacado, está em 41,29 há também uma apresentação

dos ídolos, pois podemos perceber a utilização da partícula de apresentação !hEå

(eis). Mas, em Is 42,1 YHWH apresenta o seu Servo. Logo, trata-se de uma nova

perícope. Desta maneira, a partir do tema, do conteúdo, vocabulário pode-se dizer

que o primeiro cântico do Servo de YHWH tem uma nova unidade em Is 42,1.

Podemos perceber, ainda, um sinal que indica o início de uma nova

perícope. Segundo Faria Francisco:

Os livros da Bíblia Hebraica são divididos em parágrafos, exceto os salmos. Então, antes do início de cada parágrafo, é colocada uma

letra p (pê), para o aberto e s (sâmekh) para o fechado. O parágrafo

fechado deve começar na mesma linha, enquanto o parágrafo aberto, inicia numa nova linha15.

Podemos perceber no final da unidade anterior, em Is 41,29, o sinal deixado

pelos massoretas, sinal este que marca o fim da unidade literária: p. Este é um sinal

indicador de que uma nova perícope começa em Isaías 42,1.

Sendo assim, a partir desses sinais, podemos concluir que a perícope em

estudo tem uma clara delimitação em relação à unidade anterior, iniciando-se em Is

42,1.

Quanto à delimitação em relação à unidade posterior, onde podemos

finalizar a perícope de Isaías 42, há muitas abordagens e diferentes opiniões entre

os exegetas para finalização da perícope.

Seguindo uma lógica estrutural a partir da disputa de YHWH contra os

deuses e ídolos, poderíamos finalizar a perícope em Is 42,8, pois neste versículo

retoma-se o tema que teve início no capítulo 41. Porém, em Is 42,10, temos o início

14

DA SILVA, Valmor. Eis meu Servo, Leitura do Primeiro Canto do Servo do Senhor, segundo Is 42,1-7. In: Estudos Bíblicos n. 89, Petrópolis: Vozes, 2006, p. 53. 15

FRANCISCO, Edson de Faria. Manual da Bíblia Hebraica. São Paulo: Vida Nova, 3ª ed., 2008, p.176.

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de um canto para YHWH. vd"êx' ryviä ‘hw"hyl;( WryviÛ (cantai para YHWH um novo

canto). Sendo assim, finalizamos a nossa perícope em Is 42,9.

tAvd"x]w:) Wab'_-hNEhi tAnàvoarI)h' 9

e novas adentraram As primeiras coisas

p `~k,(t.a, [ymiîv.a; hn"x.m;Þc.Ti ~r<j,îB. dyGIëm ynIåa]

a vós farei escutar de brotarem antes o que relata eu

Tradução:

As primeiras coisas eis que vieram; e novas eu o que relata, antes que

brotem, a vós farei escutar.

Um indicador de finalização da perícope de Isaías 42,9 e o sinal p que,

como vimos, era o sinal que demarcava o início da perícope, e que os massoretas

também o colocaram como delimitação do final da perícope, ou seja, 42,9. Além

disso, em Isaías 42,10, temos a raiz verbal ryv (cantem). Tudo indica que um canto

novo está sendo iniciado a partir do v.10, dando inicio a um novo tema. Sendo

assim, poderemos finalizar a unidade no v.9 do cap. 42 de Isaías.

1.5. Subdivisão e estrutura de Is 42,1-9

Propomos, a seguir, uma subdivisão e estrutura para a perícope de Is 42,1-

9. Iremos subdividí-la em duas partes. Uma primeira parte compreende o capítulo

42,1-4, pois observamos que se trata de um tema específico: "a apresentação do

Servo por parte de YHWH", e que este recebe uma investidura para uma missão

específica que ele (Servo) é chamado a cumprir. Uma segunda parte compreende o

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capítulo 42,5-9. Estes versículos tratam da apresentação e identidade de YWHW e a

retomada da missão do Servo.

Temos assim, a seguinte estrutura:

I - Apresentação do Servo por YHWH vv. 1-4

A- Apresentação do Servo v.1

B- Atitudes do Servo vv. 2-4

II - Assim disse: Palavra de YHWH - Ordem para missão vv. 5-9

A- Palavra de YHWH: v.5

B- Eleição do Servo: v.6

C- Direito de YHWH: v.7

D- O nome de YHWH: v. 8-9

Entendemos que a estrutura do primeiro cântico seja em forma de

apresentação. Neste cântico, o Servo é apresentado por YHWH com suas atitudes e

suas qualidades. “Há uma ação de YHWH que escolhe, chama e apresenta o

Servo”. Isso se pode confirmar em Is 42,1.

Suas atitudes são comprovadas através de sete advérbios de negação al{ï

(não), acompanhado das raízes verbais: (não clamará, não erguerá e não fará

escutar na rua a voz dele; cana a que despedaçada não quebrará e pavio vacilante

não extinguirá; não desanimará, não despedaçará), isto quer indicar as ações do

Servo para "fazer sair" o direito às nações. O termo jP'(v.mi (direito) tem uma função

importante na estrutura dos versículos 1-4.

Em Is 42,5 a Palavra de YHWH vem com a fórmula do mensageiro: hw"©hy>

Ÿlaeäh' rm;úa'-hKo) (assim disse o Deus YHWH) e com suas características (o que cria,

o que estira, o que dá alento). Tudo leva a crer que esse versículo 5 funciona como

uma dobradiça, ligando os versículos 1-4 aos vers. 6-9 que, como diz Gorgulho:

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30

"percebemos nessa perícope elementos da vocação: o ser do Servo, no v.1, cuja

fonte da vocação é o próprio Deus e cuja motivação é YHWH indicado no v.5 "16.

O v.6 trata especificamente da eleição do Servo. Ele é conduzido por YHWH

como aliança e luz de nações.

O v.7 trata do direito de YHWH que se realiza na libertação do encarcerado

e cuja missão é destinada ao Servo.

O v.8-9 trata ainda do tema do nome de YWHW e da promessa na

realização das coisas novas.

Tudo nos leva a crer que o cântico do Servo de YHWH esteja estruturado

em forma de apresentação. Trata-se de um "oráculo de apresentação". Essa

apresentação é feita por YHWH e pela sua Palavra. Ele apresenta o Servo, o

ampara, o sustém, dá o seu espírito a ele para uma missão: fazer sair o direito. E

depois, ele mesmo YHWH se apresenta: Eu YHWH, te chamei em justiça, e

agarrarei tua mão, te guardarei e te colocarei como aliança de povos e luz de

nações.

1.6. Coesão de Is 42,1-9

Ao analisarmos a coesão do texto de Is 42,1-9, faremos isso primeiramente

a partir dos versículos. Ou seja, a partir das raízes verbais, substantivos, advérbios e

outros elementos textuais, pois isso nos ajudará a verificar se a perícope está coesa.

O primeiro elemento de coesão no v.1 é a partícula demonstrativa !hEÜ (eis).

Com essa partícula alguém é apresentado e dele se falará. Esse alguém é o Servo

que será apresentado por YHWH.

16

GORGULHO, 1989, p. 88.

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31

Em Isaías 42,1, percebemos que os sufixos pronominais encontram-se na

primeira pessoa do singular. yDIb.[; (meu Servo); yrIßyxiB. (meu escolhido); yvi_p.n: (a

minha pessoa); yTit;Ûn" ( eu dei) e yxiWr ( meu espírito). Esses sufixos pronominais que

se encontram na primeira pessoa do singular são indicadores de coesão no primeiro

versículo.

As raízes verbais $mt (suster) e hcr (se agradar) são outros indicadores

de coesão no v.1. Temos, ainda, um elemento de coesão no v.1 que é a preposição

wyl'ê[' (sobre ele). A preposição, juntamente com sufixo pronominal na terceira

pessoa do singular, quer indicar que se fala especificamente do Servo. Desta

maneira, há uma coesão interna no primeiro versículo do cântico.

Em Is 42,2 o advérbio de negação al{ï (não), aparece três vezes. Desta

forma é um indicador de coesão. Os verbos encontram-se no imperfeito da terceira

pessoa do singular: q[;Þc.yI (clamará); aF'_yI (erguerá); [:ymiîv.y: (fará escutar). Os

verbos indicam coesão no versículo. Outro elemento que dá coesão ao versículo é o

substantivo e o pronome Al*Aq (a voz dele). Assim, o substantivo "voz" está em

sintonia com os verbos que estão no qal masculino imperfeito, o qual torna o

versículo coeso.

Do mesmo modo em Is 42,3 temos o advérbio de negação al{å (não), que

aparece duas vezes. Isto mostra coesão no versículo. Os verbos encontram-se no

qal imperfeito da terceira pessoa do singular: rABêv.yI (quebrará); hN"B<+k;y> (extinguirá)

e ayciîAy (fará sair). Isso mostra também que o versículo esta coeso. Os substantivos

hn<Üq' (cana), hT'îv.piW (pavio), jP'(v.mi (direito) dão sentido ao versículo, ligando os

advérbios e verbos, por isso, o terceiro versículo está coeso.

Em Isaías 42,4 o advérbio de negação al{Ü (não), aparece duas vezes. Isto

indica coesão. Verificando os seguintes verbos: hh,k.yI (desanimará); #Wrêy"

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(despedaçará); ~yfiîy"-d[; ( até pôr); Wlyxe(y:y> (esperarão), temos uma sequência de

três verbos no imperfeito da terceira pessoa do singular e um verbo no qal imperfeito

da terceira pessoa do plural, isto denota coesão interna no quarto versículo do

cântico. Quatro substantivos estão relacionados por sentido no versículo. #r<a'ÞB' (na

terra) e ~yYIïai (ilhas). jP'_v.mi (direito) Atßr"Atl.W (instrução dele). Estes substantivos

dão coesão ao versículo 4.

O db,[, (Servo) é o substantivo que une os versículos e um forte elemento

de coesão. Do v.1 ao v.4 é dele que se fala. O sujeito oculto que apresenta o Servo,

ou seja, YHWH, o faz como se estivesse indicando a pessoa do Servo para uma

plateia reunida.

YHWH é subentendido no v.1 como aquele que apresenta o Servo. Desta

maneira é um indicador de coesão nos versículos 1-4.

Em Isaías 42,5, os indicadores de coesão no versículo são os seguintes: Há

uma sequência de cinco verbos particípios, todos relacionados com a ação de

YHWH. Verbos que tornam o versículo bem coeso. arEÛAB (o que cria); ~h,êyjeAnæw> (e o

que os estende); [q:ïro (o que estira); !tEÜnO (o que dá); ~ykiîl.hol; (para os que andam

nela). Essas expressões verbais são elementos de coesão no v.5.

Os Substantivos, a seguir, estão dentro do mesmo campo semântico e são

elementos de coesão no versículo 5. ~yIm;’V'h; (os céus); #r<a'Þh" (a terra); hm'v'n>

(alento); x:Wrßw> (e espírito).

Como já havíamos comentado, ao falarmos da proposta de estrutura para a

perícope que estudamos, o versículo cinco funciona como dobradiça, pois este liga

os versículos um, dois, três e quatro aos versículos seis, sete, oito e nove. Sendo

assim, o versículo cinco está coeso a partir dos verbos e substantivos.

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33

Em Isaías 42,6, os indicadores de coesão no versículo são: uso do pronome,

na segunda pessoa, masculino, singular que se repete três vezes nos verbos:

^ytiîar"q. (te chamei); ª̂r>C'a,w> (e agarrarei); ±̂n>T,a,w> (e colocarei). São elementos de

coesão os substantivos: ~['Þ (povo); ~yI)AG (nações).

Já em Isaías 42,7, os elementos de coesão no versículo são os seguintes

verbos: x:qoßp.li (para abrir); ayciÛAhl. (para fazer sair). Os dois verbos são precedidos

da preposição "para". Ainda são indicadores de coesão no versículo 7, os

substantivos: ~yIn:åy[e (olhos); %v,xo) ( escuridão) e o adjetivo: tAr+w>[i (cegos) como

qualidade dos olhos. "Olhos cegos". O v.7 está coeso.

Quanto ao Isaías 42,8, os indicadores de coesão no versículo são os

substantivos seguidos dos pronomes possessivos: ymi_v. (o meu nome); iiydIAbk.W ( e a

minha glória); ytiÞL'hit.W (e o meu louvor).

Em Isaías 42,9, os indicadores de coesão no versículo são os adjetivos:

tAnàvoarI)h' (as primeiras); tAvd"x]w:) ( e novas) e o advérbio ~r<j,îB. (antes). Da

mesma maneira, a raiz verbal hn"x.m;Þc.Ti (brotarem), que está relacionado com os

dois substantivos: primeira e novas. Desta maneira, o versículo 9 está coeso.

Após verificarmos a coesão a partir dos versículos, veremos a seguir como

os versículos estão coesos na totalidade do texto.

Os versículos um, dois, três e quatro estão coesos a partir dos seguintes

indicadores: A utilização da interjeição "Eis", marca o inicio do texto e apresenta o

Servo. O sufixo pronominal na primeira pessoa do singular "meu" é fundamental

nesses versículos. O segundo versículo ainda se refere ao servo e suas atitudes;

isso se pode comprovar a partir dos verbos no imperfeito e na terceira pessoa do

singular. O terceiro versículo continua referindo-se ao Servo e suas atitudes. Nota-se

a utilização do advérbio de negação "não" que aparece sete vezes nesses versículos

e, é um forte indicador de coesão. O substantivo "direito" é um elemento de coesão

nos versículos 1-4. Sendo assim, esses versículos estão coesos. Na apresentação

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do Servo, a partir do uso da partícula de apresentação "eis", seguido dos pronomes

possessivos e do pronome "ele" (Servo) e da primeira pessoa "minha pessoa"

(YHWH). Seguido pelos verbos no imperfeito, dos advérbios de negação, do termo

direito que aparece três vezes, tudo indica unidade e coesão nesses versículos.

O quinto versículo funciona como uma dobradiça entre os quatro primeiros

versículos e os seguintes: seis, sete, oito e nove. Os verbos no particípio indicam

coesão neste versículo 5 e trata das atitudes de YHWH.

Os versículos 6-9 formam um novo bloco e estão coesos entre si. Os

indicadores de coesão são os seguintes: o v.6 tem inicio com a apresentação de

YHWH. hw"±hy> ynIôa] (eu YHWH), seguido de atitudes para com o Servo. O versículo

sete tem inicio com uma preposição x:qoßp.li (para abrir), seguido de atitudes que o

Servo desenvolverá. O v.6 e v.7 estão unidos a partir dessa preposição.

O v.8-9 retoma hw"ßhy> ynIïa ] (eu YHWH) como elemento de coesão nesses

versículos. No v.9 dyGIëm; ynIåa ] (eu o que relata). O pronome pessoal (eu) é um

indicador de coesão nesses versículos.

Desta maneira, podemos afirmar que o texto de Isaías 42,1-9 está bem

coeso. Afirmamos isso, a partir de indicadores bem precisos que permeiam o texto e

garantem essa coesão interna.

1.7. Estilo literário

O Dêutero-Isaías tem uma maneira própria de escrever. Por isso, queremos

aprofundar o texto de Is 42,1-9 do ponto de vista da literatura. "Trata-se de um canto

ou poema que é construído sobre a técnica do paralelismo, que consiste em repetir

as ideias com palavras diferentes. É, na verdade rima do pensamento"17. Vejamos

como se dá essa técnica a partir do texto.

17

DA SILVA, 2006, p. 55.

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35

V.1 "Eis meu Servo, Jacó susterei a ele/ Israel meu escolhido se agradou

minha pessoa. Dei meu espírito sobre ele/ direito para as nações fará sair".

A repetição do segundo verso amplia o primeiro. Meu Servo - meu escolhido

- minha pessoa. Repetição e paralelismo.

V. 2 "Não clamará e não erguerá/ e não fará escutar na rua a voz dele".

“Repete-se: clamar - fará escutar - voz dele. Aqui a repetição se dá em

forma de sinônimo"18.

V3. "Cana a que é despedaçada não quebrará/ e pavio vacilante não

extinguirá".

Neste versículo 3, percebemos um paralelismo na repetição dos termos,

que permite destacar as relações entre a primeira e a segunda ideia.

Ainda no v.3 e v.4:

"Para verdade fará sair direito/ Não desanimará e não despedaçará/ Até pôr

na terra direito/ e na instrução dele ilhas esperarão".

A repetição de: fazer sair direito - pôr na terra direito. Não desanimará e não

despedaçará.

Segundo Da Silva:

A divisão em duas estrofes é bastante evidente. As diferenças entre uma e outra são marcantes. Uma é a apresentação do Servo, na qual Deus fala a respeito do personagem. Outra, a apresentação de Deus, na qual fala para o servo19.

No centro, amarrando o poema, encontramos o seguinte:

18

DA SILVA, 2006, p. 55. 19

Ibidem, p. 55.

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V. 5. Assim disse o Deus YHWH.

Nesta fórmula do mensageiro, Da Silva chama atenção mostrando aí que

"tudo se apresenta como palavra proferida por Deus”20.

V. 5. "Que cria os céus e que os estende/ que estira a terra e os produtos

dela/ o que dá alento para o povo sobre ela/ e espírito para os que andam nela".

Segundo Da Silva:

O paralelismo é bem acentuado. Os vocábulos são idênticos: dar espírito sobre ele (Servo) e dar espírito ao povo. Ainda merece atenção o termo "direito". Três repetições. Direito às nações, direito na verdade, direito para a terra inteira21.

V. 6-7 "Eu YHWH te chamei em justiça/ e agarrarei a tua mão e te guardarei

e te colocarei como aliança de povo luz de nações/ para abrir olhos cegos para fazer

sair da prisão encarcerado/ de casa de confinamento os habitantes de escuridão".

Nesses versos percebemos algumas repetições no vocabulário: Luz-

escuridão. Eu-Tu. E a preposição: para.

V.8-9 "Eu YHWH esse o meu nome/ e minha glória / para outro não darei/ e

o meu louvor para as imagens esculpidas".

A comparação e a repetição são evidentes nesta conclusão do poema.

"Minha Pessoa" de 42,1 e "meu nome" e "minha glória" de 42,8. "Dei meu espírito

sobre ele" do 42,1 e "não darei para outro" do 42,8.

"As primeiras coisas adentraram/ e as novas / eu o que relata antes de

brotarem /farei escutar a vós".

Repetição em forma de sinônimos: "primeiras coisas, coisas novas e antes

de brotarem". E os verbos: "fará sair o direito", "fazer sair da prisão", "fazer escutar a

vós". Repetição do termo nações. "Direito às nações e luz das nações".

20

Ibidem, p. 55. 21

DA SILVA, 2006, p. 55.

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37

O gênero literário é um canto ou poema que está estruturado de forma

paralela. Ou seja, temos quatro frases com sentido completo. As primeiras frases

repetem-se com ideias diferentes nas frases seguintes, porém, não perde o sentido,

mas as completam. Os verbos sempre estão no início dos versos para reforçar as

atitudes do Servo. YHWH percorre todo texto como sujeito principal. Nos primeiros

versos de forma oculta. No v. 5 na sua palavra. E como sujeito principal nos versos

6,7,8 e 9. O Servo não fala. Ele é passivo no texto, porém sustentado por YHWH.

Considerando o primeiro canto do Servo de YHWH sobre o qual discutimos,

enquanto oráculo, segundo o que nos apresenta Gorgulho, "esse gênero é

entendido como Oráculo de Apresentação"22.

1.8. A divisão do livro do Dêutero-Isaías

Vejamos as propostas de alguns autores para a divisão do livro do Dêutero-

Isaías. Bem sabemos que o livro de Isaías contém 66 capítulos, então foi a crítica da

pesquisa bíblica que dividiu o livro de Isaías em três partes. Conforme Zenger:

As dimensões extraordinariamente grandes do livro, a diversidade de seus temas e a riqueza de formas lingüisticas com que eles foram elaborados, mas, sobretudo as importantes divergências de conteúdo e forma que se manifestam nele, levaram a pesquisa crítica a subdividir o livro canônico de Isaías em três grandes partes: Is 1-39 (designação usual: Proto-Isaías); Is 40-55 (designação usual: Dêutero-Isaías) e Is 56-66 (designação usual: Trito-Isaías)23.

Quanto à divisão do livro do Dêutero-Isaías, Zenger apresenta a seguinte

proposta:

No âmbito do grande bloco textual a delimitação dos caps. 40-55 se propõe pelo fato de que uma parte introdutória (40,1-11: "prólogo") está em correlação com uma parte conclusiva (55,8-11: "epílogo"): o tema "a Palavra de Deus", introduzido no começo (40,8), é retomado no final (55,11). (...) o texto delimitado pelo prólogo e epílogo dos caps. 40-55 fala da disposição de Deus para perdoar. Deus quer que seu povo seja consolado (40,1). Ele próprio consola o seu povo (49,13; 52,9; 51,12). A salvação de seu povo (45, 8.17; 46,13; 49,6.8,etc.) constitui sua mais genuina ação, tanto que ele se chama

22

GORGULHO, 1989, p. 32. 23

ZENGER, Erich et alii. Introdução ao Antigo Testamento. São Paulo: Loyola, 2003, p. 381.

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38

simplesmente "salvador" (cf. 43,3.11s; 49,26s). Parece importante para a estrutura do bloco todo o reinício formulado em 48,20. Depois que se impôs com sucesso o caráter único do Deus Criador Javé contra todas as reinvindicações de outros entes divinos (40,12-48,19), pode se convocar para a retirada da Babilônia (48,20-5513). (...) o verbo sair, posicionado de forma planejada em 48,20; 52,11 e 55,12 desempenha uma função importante, sob o aspecto formal e objetivo. (...) as peças hínicas 42,10-13; 44,23; 45,8; 49,13; 52,9-10 formam outros cortes no encadeamento do texto. Elas se encontram sempre no final de uma seção24.

Römer apresenta a seguinte divisão para o Livro do Dêutero-Isaías:

Prólogo: Yhwh consola seu povo (40,1-11; os v.1-5 respondem ao discurso inicial em 1,2-20). I. O Criador consola Israel pelo envio de Ciro (40,12-48,22) e II. Yhwh consola Sião (49,1-55,8). Epílogo: a eficácia da palavra de Deus (55,9-13, em eco a 40,6-8)25.

Bonnard apresenta a divisão do livro em duas partes. A primeira fase dos

capítulos 40-48 e a segunda dos capítulos 49-5526. Na primeira fase, diz Bonnard:

O profeta se aplica não somente em dar coragem, mas também a convencer e tirar as dúvidas, quebrar resistências das atitudes para com YHWH e de querer voltar-se aos ídolos. Então, essa primeira (40-48) do livro se ocupa das contestações entre YHWH e Israel e dos processos entre YHWH e os deuses (...) o Dêutero-Isaías procurou responder aos problemas dos exilados. Foi um excelente redator que desejou apresentar uma mensagem coerente e de estruturar no conjunto da obra os conteúdos e as diferentes intervenções (...) na segunda parte (49-55) há um destaque para os exilados na Babilônia, em especial ao Servo de YHWH27.

Vermeylen apresenta a divisão do livro tendo início um prólogo: 40,1-11;

seguido da primeira parte: 40,12-48,22; a segunda parte: 49,1-55,8 e, finalmente, um

epílogo: 55,9-1328.

24

ZENGER, 2003, p. 389. 25

RÖMER, Thomas et alii. Antigo Testamento História Escritura e Teologia. São Paulo: Loyola, 2010,

p. 404. 26

BONNARD, P. E. Le Second Isaïe, son disciple et leurs éditeurs. Isaïe 40-66. Paris: Gabalda, 1972, p. 17. 27

BONNARD, 1972, p. 25 28

RÖMER, Thomas; MACCHI, Jean Daniel; NIHAN, Christophe. Antigo Testamento História, escritura e teologia. São Paulo: Loyola, 2010, p. 404.

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39

Para Marques e Nakanose, estes apresentam a divisão do livro do Dêutero-

Isaías da seguinte maneira: "A mensagem profética do Dêutero-Isaías pode ser

dividida em duas partes (40 a 48 e 49 a 55,5), com uma apresentação e um resumo

final” 29.

Apresentam o seguinte esquema:

40, 1-11: Apresentação. Introduz os temas do novo êxodo e da Palavra de

Deus.

40,12-48,22: Primeira parte. A libertação e o retorno a Jerusalém, tendo

como modelo o êxodo.

49,1-55,5: Segunda parte. O projeto de reconstruir Jerusalém.

55,6-13: Resumo final.

Sobre o mesmo assunto Alonso Schökel e Luiz Sicre apresentam a seguinte

divisão para o livro. Dizem eles:

É de comum acordo entre os estudiosos que a obra acha-se emoldurada por um prólogo (40,1-11) e por um epílogo (55,6-13). O corpo intermediário é dividido em dois grandes blocos: 40-48 e 49-55. A primeira parte foca sua atenção na libertação e retorno. Ciro cumpre uma missão importante como libertador; e as polêmicas contra os deuses, para demonstrar que YHWH é o Deus da história30. A segunda parte tem seu ponto central na restauração e glorificação de Jerusalém31.

Desta maneira, podemos afirmar que o livro do Dêutero-Isaías apresenta um

prólogo e um epílogo. E que contém dois grandes blocos: 40-48 e 49-55. O texto

que estudamos Is 42,1-9 encontra-se na primeira parte e entre os temas

fundamentais está o da centralidade de YHWH. Segundo Römer: "as nações e

deuses não podem resistir a Yhwh"32. Desta maneira, está emoldurado o livro do

Dêutero-Isaías.

29

MARQUES, Maria Antônia; NAKANOSE, Shigeyuki. Segundo e Terceiro Isaías (40-66): Roteiros e orientações para encontros. CBV, São Paulo: Paulus, 2004, p. 16. 30

ALONSO SCHÖKEL, Luis; SICRE DIAZ, J.L. Profetas I. São Paulo: Paulus, 2ª ed., 2004, p. 280. 31

ALONSO SCHÖKEL; SICRE DIAZ, 204, p. 280. 32

RÖMER et alii, 2010, p. 404.

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40

1.8.1 A origem do Livro e autoria

Westermann situa a atividade do Dêutero-Isaías por volta de 550 a.C., logo

no início da campanha vitoriosa de Ciro33, portanto, do ano 550 a.C. ao ano 540,

podemos dizer que se deu a atividade do Dêutero-Isaías e, no ano 539 a.C., data da

rendição da Babilônia34. Com relação ao autor do livro, nada se sabe, alé, dele ser

um poeta e teólogo.35 Alonso Schökel e Luiz Sicre, citando Johann C. Döderlein, ao

resenhar o comentário de Hensler de Isaías, fala pela primeira vez de "um profeta

que, nos tempos do exílio acrescentou seus sentimentos e profecias às coleções de

Isaías"36. Schökel e Sicre citam que no ano de 1789 a partir do capítulo 40, o livro de

Isaías foi composto por um poeta anônimo ou homônimo por volta do final do

exílio37. Ainda dizem que há muitas biografias do profeta, porém, nenhuma é segura.

Uns dizem que ele nasceu na Babilônia, outros pensam que viveu em Jerusalém,

falam da Fenícia ou Egito. Tudo isso não passa de conjetura, dizem os autores. E

nem mesmo temos certeza do seu nome, embora alguns pensem que ele se

chamava Isaías38.

Ainda, ao falar da autoria, segundo Bohn Gass “o Dêutero-Isaías”, está em

continuidade aos cantores do templo que haviam sido deportados. A linguagem de Is

40-55 está próxima dos salmos, da linguagem hínica39. Para Schwantes:

O Dêutero-Isaías estaria situado entre os cantores do templo. A tradição hínica é o pano de fundo de sua profecia. E por seu jeito de cantoria, tudo indica que os seus textos terão sidos pronunciados nas reuniões comunitárias entre os exilados40.

33

WESTERMANN, Claus. Isaiah 40-66. A comentary. Philadelphia: The Westminster Press, 1977, p. 3. 34

ALONSO SCHÖKEL; SICRE DIAZ, 2004, p. 270. 35

Ibidem, p. 269. 36

Ibidem, p. 269. 37

Ibidem, p. 269. 38

Ibidem, p. 269. 39

GASS, Ildo Bohn. Uma Introdução à Bíblia Exílio Babilônico e Dominação Persa. São Paulo: CEBI, 3ª ed. 2004, p. 51. 40

SCHWANTES, Milton. Sofrimento e Esperança no exílio História e Teologia do povo de Deus no século VI a.C. São Leopoldo/São Paulo: Sinodal/Paulinas, 1987, p. 89.

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41

O contexto onde surge o texto do Dêutero-Isaías é o exílio na Babilônia,

entre os anos 586-538 a.C.

Segundo Marques e Nakanose:

A situação do exílio foi muito difícil. O povo passou por uma crise profunda. As esperanças caíram por terra. O que sobrou: destruição e sofrimento. E mais: YHWH, o todo-poderoso, não o livrou do jugo do império opressor; ao contrário, a principal divindade da Babilônia, Marduc, representado pelo sol, havia garantido aos exércitos babilônicos a vitória. Essa realidade gerou uma crise aguda de fé e de identidade41.

Nesse contexto de crise e dificuldade nascem esses oráculos e também as

imagens de Deus. Segundo Marques e Nakanose:

Esses oráculos tinham como objetivo levantar o ânimo e a autoestima das pessoas exiladas. O motor que impulsionou e alimentou a esperança do povo foi a experiência de Deus vivida no passado de Israel, e a certeza de que ele continuava presente na sua história atual42.

Mas quem era essa voz profética que chamamos de Dêutero-Isaías?

Segundo Marques e Nakanose:

Provavelmente do grupo de cantores do templo, sacerdotes levitas, exilados na segunda deportação (587 a.C.). Os levitas atuavam no templo desde o período de Josias (640-609 a.C.), que os trouxe à força para Jerusalém (2Rs 23,8-9). No templo, os levitas passaram a exercer funções secundárias. Na segunda deportação, muitos deles foram levados como escravos para a Babilônia e experimentaram a dura realidade de sofrimento e opressão, bem diferente da elite que foi levada na primeira deportação (597 a.C.). É desse grupo que surgiu o livro do Segundo Isaías43.

Para Marques e Nakanose, muitos levitas são levados para a Babilônia,

outros ficam nos arredores da cidade de Jerusalém e no interior de Judá. No exílio,

esse grupo dá origem ao Segundo Isaías.44Eles lembram que esses levitas atuavam

no interior, procurando preservar a tradição tribal.

41

MARQUES, Maria Antônia; NAKANOSE, Shigeyuki. Segundo Isaías Is 40-55. In: Estudos Bíblicos 89, Petrópolis: Vozes, 2006, p. 61. 42

MARQUES; NAKANOSE, 2006, p. 61. 43

Ibidem, p. 61. 44

MARQUES; NAKANOSE, 2004, p. 18.

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42

Desta maneira, podemos dizer que a profecia do Dêutero-Isaías surgiu no

final do exílio da Babilônia, por volta de 540 a.C. Este livro pode ter nascido entre os

cantores do templo, formado por sacerdotes levitas, que provavelmente foram

exilados na segunda deportação (587 a.C.)45.

Entre os textos do Dêutero-Isaías, temos o texto de Is 42,1-9 que se chama:

Primeiro Cântico do Servo de YHWH. Foram esses cantores e sofredores da

segunda deportação para a Babilônia que apresentam a figura do Servo como porta-

voz da esperança para as nações.

A seguir analisaremos os termos que consideramos fundamentais, através

do estudo semântico.

1.9. Análise semântica e comentários do texto de Is 42,1-9

O nosso objetivo nessa parte do estudo é verificar e analisar os termos

chaves que aparecem na perícope de Is 42,1-9, para termos uma compreensão do

conteúdo e do sentido do texto. Elencaremos as passagens nas quais ocorre a

palavra analisada e citaremos as expressões a partir do texto em hebraico com uma

tradução própria, com a finalidade de estabelecer em que contextos ocorrem tais

expressões.

1.9.1. Análise dos termos significativos do primeiro versículo Is 42,1

Os termos fundamentais neste versículo são: a partícula demonstrativa "eis",

o substantivo acompanhado do sufixo pronominal "meu Servo", o verbo "suster", o

adjetivo acompanhado do sufixo pronominal "meu escolhido", o verbo "se agradar", o

substantivo acompanhado do sufixo pronominal "minha pessoa", o verbo "dar", o

substantivo acompanhado do sufixo pronominal "meu espírito", a preposição "sobre

ele", o substantivo "direito", o substantivo acompanhado da preposição "para as

nações" e o verbo "fazer sair".

45

MARQUES; NAKANOSE, 2004, p. 12.

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43

1.9.1.1. !hEÜ46 (eis)

A palavra que inicia o texto de Is 42,1-9 é uma partícula demonstrativa: !hEÜ

(eis). Segundo Harris, "é uma interjeição que demanda atenção de quem ouve:

"veja, olhe bem"47. Conforme Alonso Schökel: "chama atenção sobre alguma

pessoa, objeto, fato: olha, repara, presta atenção, vê e nota bem"48. Segundo Da

Silva, "é uma fórmula de apresentação para chamar a atenção sobre a pessoa do

servo"49. Isto é, para enfatizar uma informação importante, às vezes, recai sobre

uma pessoa, no texto que estudamos recai sobre o db,[, (Servo) que é apresentado

por YHWH. Ao colocar a partícula demonstrativa (eis) no início do canto, o autor quis

marcar bem e chamar atenção sobre a pessoa do Servo.

Em todo Primeiro Testamento, a partícula demonstrativa (eis) ocorre

aproximadamente 111 vezes. Em Isaías, ela ocorre 27 vezes. E, particularmente no

Dêutero-Isaías, ocorre 19 vezes. Isso significa que a partícula é fundamental nos

textos do Dêutero-Isaías e, consequentemente, no texto que estudamos Is 42,1-9.

Para comprovar o uso frequênte da partícula, vejamos algumas citações que

aparecem no texto do Dêutero-Isaías na sequência dos capítulos50.

Em Is 40,15 Wbv'_x.n< ~yIn:ßz>amo qx;v;îk.W yliêD>mi !hEÜrm:åK. ‘~yIAG !hEÜ (eis as nações

são consideradas gotas de balde e poeira de balança). Ainda em Is 40,15 lAJ)yI qD:îK;

~yYIßai !hEï (eis as ilhas como pó ). Nestes versículos, a partícula demonstrativa é

utilizada para apresentar essas realidades (nações e ilhas) que na visão de Dêutero-

Isaías, estes não querem conhecer a realidade superior de YHWH. Diz Ridderbos

46 Partícula demonstrativa. 47

HARRIS, R. Laird et alii, Dicionário Internacional de Teologia do Antigo Testamento, São Paulo: Vida Nova, 1998, p. 362. 48

ALONSO SCHÖKEL,1997, p. 182. 49

DA SILVA, 2006, p. 46. 50 Queremos sublinhar que as citações dos textos bíblicos em Hebraico e as traduções desta análise

semântica tem o objetivo de verificar as vezes que tais termos aparecem na obra do Dêutero-Isaías. Segue também comentários dos termos em hebraico que julgamos fundamentais para a exegêse.

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44

"mais uma vez a grandeza do Senhor é ressaltada"51. Ainda verificando o uso da

partícula demonstrativa em Is 41,11, %B"+ ~yrIåx/N<h; lKoß Wmêl.K'äyIw> ‘Wvbo’yE !hEÜ (eis que se

envergonharão e serão confundidos todos que se inflamaram contra ti). A partícula

demonstrativa é utilizada para apresentar uma mudança de realidade, aqueles que

agora maltratam o povo serão humilhados. Segundo Ridderbos: "o Senhor faz com

que Israel triunfe sobre eles, de forma que eles estão envergonhados"52. Importante

frisar que num clima de incertezas e de crise de fé que que se encontra a

comunidade exilada na Babilônia, é fundamental reforçar o poder de YHWH. Isto fica

evidente no pensamento do Dêutero-Isaías.

Em Is 41,24 ao se referir aos ídolos: [p;a'_me ~k,Þl.['p'W !yIa;ême ~T,äa;-!he (eis que

sois menos que nada e vossas obras inutilidade ). A partícula demonstrativa é

utilizada para apresentar a fraqueza dos ídolos diante do poder de YHWH.

Ridderbos afirma: "eles não têm nem vida e nem existência de qualquer sorte.

Portanto, a pessoa que escolhe uma "não entidade" dessas como seu deus é uma

abonimação aos olhos de Deus"53. Nesses textos citados, podemos perceber que o

uso da particula demonstrativa reforça a mensagem, chamando a atenção sobre os

ídolos, os deuses, as ilhas e as nações.

Em Is 42,1 a partícula demonstrativa é utilizada para apresentar o Servo.

yDIb.[; !hEÜ (eis meu Servo). Em Is 49,16 %yti_Qox; ~yIP:ßK;-l[; !hEï (eis que nas palmas

das minhas mãos eu te gravei). A partícula reforça uma profunda intimidade entre o

Servo e YHWH.

Is 55,4 wyTi_t;n> ~yMiÞWal. d[eî !hE± (eis, que fiz de você uma testemunha para

povos). Em Is 55,5 ar"êq.Ti ‘[d:te-al{) yAGÝ !hEå (eis, uma nação que não conheces, tu a

chamarás). A partícula demonstrativa apresenta o Servo como testemunha para as

nações. Assim, como ele é chamado por YHWH também é convidado a chamar

povos e nações ao projeto de libertação de YHWH.

51

RIDDERBOS, J. Isaías Introdução e comentário. São Paulo: Vida Nova, 2006, p. 321. 52

RIDDERBOS, 2006, p. 329. 53

Ibidem, p. 333.

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45

Desta maneira, podemos observar que a partícula demonstrativa "eis"

percorre todo o texto do Dêutero-Isaías. Em alguns textos tem a função de

apresentar alguém, ou alguma situação. Logo, a partícula demonstrativa "eis" tem

uma função importante na apresentação do Servo no texto de Is 42,1-9.

Após o uso da partícula de apresentação, temos o primeiro substantivo no

texto, acompanhado do sufixo pronominal na primeira pessoa do singurlar, vejamos:

1.9.1.2 yDIb.[;54 (meu Servo)

Em Isaías 42,1 o primeiro substantivo é yDIb.[; (meu Servo) que neste caso

aparece com sufixo pronominal na primeira pessoa do singular. Ou seja, "meu

Servo". Alonso Schökel traduz o substantivo por "escravo, servo, criado,

empregado"55. Optamos pela tradução: Servo, com o sufixo pronominal: meu Servo,

sem o artigo "o". Há, também, estudos que preferem a tradução do termo db,[, por

(escravo). "Trata-se de um termo ambíguo (escravo) porque sugere a ideia de que

YHWH necessite de escravos ou que seja um Deus "escravizador"56. É viável pensar

nesse termo como situação de dependência que os exilados na Babilônia estavam

vivendo, seja em relação ao império babilônio, seja em relação a YHWH57. Porém,

evitamos nesse estudo a tradução "escravo", damos preferência à tradução do

substantivo: db,[, (Servo).

É importante notar que este termo tem a mesma raiz do verbo: db[ que

significa: "trabalhar, pôr-se a serviço, servir". Também encontramos a mesma raiz

no substantivo: hd'bo[} que significa: "obra, ação, trabalho". Aparece também no

termo: hD'bu[} que significa "servidão" e, finalmente, tWdb.[; que significa:

54

Substantivo + sufixo pronominal na primeira pessoa do singular. 55

ALONSO SCHÖKEL, Luís. Dicionário Bíblico Hebraico-Português, São Paulo: Paulus, 1997, p. 474. 56

PROVIN, Genildo. Libertação nas trilhas da Justiça, Estudo Histórico e Hermenêutico de Is 42,1-4. Dissertação (Mestrado em Ciências da Religião) Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, 2008, p. 77. 57

ZABATIERO, Júlio Paulo Tavares. Servo do Império - Uma análise da Servidão no Dêutero-Isaías. In: Estudos Bíblicos n. 18, Petrópolis: Vozes, 1988, p. 40.

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"escravidão". Desta maneira, os termos: servo, trabalhar, servir, trabalho, ação,

servidão e escravidão têm em comum a mesma raiz hebraica: db[. Ao verificarmos

que os termos são semelhantes, pois ambos têm em comum a mesma raiz hebraica

db[, o "Servo" de YHWH pode ser entendido como alguém ou grupo que é

chamado a um serviço (trabalho) específico e quem convida é o próprio YHWH. Por

isso, queremos reforçar a ideia de que ser "Servo" é estar em profunda sintonia com

o projeto de YHWH.

Segundo Jenni e Westermann, "No Dêutero-Isaías este termo db,[, aparece

21 vezes e 20 vezes está relacionado com Deus"58. Daí, que temos preferência pelo

termo "Servo" por indicar alguém ou grupo que recebe de YHWH um tratamento

especial. Ao longo do estudo, mostraremos que o ser de YHWH e a missão do

Servo estão em sintonia, principalmente na prática do direito e da justiça. Seguindo

a reflexão de Jenni e Westermann:

É incomum a ideia de que um israelita seja considerado servo de outro israelita. Ou, que um irmão seja servo de outro irmão. Há indícios de que numa relação de proteção e perigo, pode mesmo ter um aspecto positivo o sentido de ser servo. Ou seja, a superioridade de um irmão sobre o outro lhe garante proteção e obrigação59.

Passando da realidade familiar de ser Servo para o relacionamento com

Deus, veremos que o db,[, "Servo" está à serviço de Deus. Ou mesmo, no serviço do

culto no Santuário. Ser servo de Deus ou servidor de Deus no AT é algo natural,

tendo a concepção de Deus como Senhor. Israel compartilha essa ideia com as

demais religiões semíticas60. Ser Servo no relacionamento com Deus não é pura

submissão num aspecto negativo, mas de pertencer ao Senhor. No relacionamento

com Deus é sempre positivo ser considerado Servo. Nunca pode ser considerado

escravidão no sentido negativo61.

58

JENNI, Ernest; WESTERMANN, Claus. Dicionário Teologico Manual Del Antiguo Testamento II, Madrid: Cristiandad, 1985, p.240. 59

JENNI; WESTERMANN, 1985, p. 244. 60

Ibidem, p. 252. 61

Ibidem, p. 252.

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Quanto à identidade do Servo (quem é ele?), é o assunto mais polêmico nos

textos do Dêutero-Isaías. Segundo Da Silva, "outras pessoas que recebem o nome

de Servos de YHWH são: Abraão (Gn 26,24), os patriarcas em (Dt 9,27), Moisés em

(Nm 12,7), Davi em (2Sm 3,18), Amós (3,7) Zorobabel em (Ag 2,23) e

Nabucodonosor em (Jr 27,6)" 62.

Uma hipótese para pensarmos na identidade do Servo, ao lermos o primeiro

cântico (Is 42,1-9) no seu contexto, diz Steinmann, é "de que Ciro (rei persa)

também possa ser considerado como Servo de YHWH"63. Segue Steinmann:

"Diferentemente dos dois seguintes cânticos, este, Is 42,1-9, está escrito na terceira

pessoa, o que exclui ser o Segundo Isaías o seu autor, ou seja, que o profeta fale de

si"64. Mesmo quanto à identificação do Servo com Israel, não deixa de apresentar

problemas, afirma Klein:

O cântico apresenta certa personificação, o que confere traços individuais, mas o segundo poema atribui ao servo uma missão para Israel (Is 49,6). Embora, tudo indica que não se pode descartar a possibilidade de que o servo seja Israel, adotando essa interpretação com reservas65.

Voltaremos a analisar com maior profundidade a identidade do Servo no

terceiro capítulo.

Vejamos as ocorrências do termo "Servo" no Antigo Testamento. Segundo

Jenni e Westermann, o substantivo "Servo" ocorre 800 vezes no Antigo

Testamento66. Em Gn (88 vezes), Ex (43 vezes), Lv (9 vezes), Nm (11 vezes), Dt

(29 vezes), Js (27 vezes), Jz (6 vezes), 1Sm (62 vezes), 2Sm (106 vezes), 1Rs (76

vezes), 2Rs (58 vezes). Notamos que entre os profetas o termo aparece com maior

frequência em Isaías (40 vezes), Jr (32 vezes). Em Dêutero-Isaías o termo aparece

(21 vezes). E com menor frequência em outros profetas: Ez (8 vezes), Jl (1 vez), Am

(1 vez), Mq (1 vez), Ag (1 vez), Zc (3 vezes), Ml (2 vezes). Nos livros sapienciais

62

DA SILVA, 2006, p. 47 63 STEINMANN, J. O livro da Consolação de Israel e os profetas da volta do exílio. São Paulo:

Paulinas, 1976, p. 124. 64

STEINMANN, J. 1976, p.124. 65

KLEIN, W. Ralph. Israel no Exílio, uma interpretação Teológica. São Paulo: Paulinas, 1990, p. 137. 66

JENNI; WESTERMANN, 1985, p. 241.

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aparece: Sl (57 vezes), Jó (12 vezes), Pr (10 vezes), Ecl (4 vezes). Em Lm (1 vez),

Est (7 vezes), Dn (7 vezes), Esd (5 vezes), Ne ( 22 vezes), 1 Cr (27 vezes) e 2 Cr

(44 vezes). Incluindo o Dêutero-Isaías na contagem, o substantivo "Servo" ocorre

821 vezes no Primeiro Testamento.

Poderemos dizer que o termo "Servo" é mais utilizado pelos profetas

Jeremias e Dêutero-Isaías, ambos situados no tempo do Exílio da Babilônia, o que

nos leva a crer que a figura do Servo tem nesse período um destaque especial.

Interessa-nos, nessa análise semântica verificar nos textos do Dêutero-

Isaías o substantivo "Servo" quando este vem acompanhado do sufixo pronominal

na primeira pessoa, ou seja, "meu Servo". E assim, nas diferentes citações a seguir,

Israel e Jacó são apresentados como o Servo e o escolhido, confirmando assim o

acréscimo da Septuaginta: VIakw,b o` pai/j mou (Jacó, meu Servo) e Israhl o`

evklekto,j mou (Israel, o meu eleito). Desta maneira, segundo a nossa interpretação

Jacó e Israel são sinônimos para a comunidade exilada, assim denominada de

Servo de YHWH.

No Dêutero-Isaías, o substantivo Servo aparece pela primeira vez em Is 41,8

^yTi_r>x;B. rv<åa] bqoß[]y: yDIêb.[; laeär"f.yI ‘hT'a;w> (e tu Israel meu Servo, Jacó que eu te

escolhi). Neste versículo, o substantivo "Servo" vem acompanhado do sufixo

pronominal (meu), da mesma maneira encontra-se no texto que estudamos Is 42,1

yDIb.[; (meu Servo). Quem fala aqui é YHWH, que chama e escolhe o seu Servo. Há

um forte indício, ao verficarmos este versículo que a comunidade que se encontra

exilada na Babilônia seja denominada "Servo de YHWH". Ou mesmo uma parte

dela, pois Israel se chama Servo.

Vejamos outras citações no texto do Dêutero-Isaías onde percebemos o

substantivo Servo acompanhado do sufixo pronominal (meu) que reforça uma

relação de intimidade entre YHWH e o Servo. Ou entre YHWH e Israel.

Em Is 41,9 ^yTiÞr>x;B. hT'a;ê-yDIb.[; ‘^l. rm;aoÜw" (e disse para ti meu Servo tu, te

elegi). A escolha do Servo é feita por YHWH. Notamos que essa citação está em

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conformidade com Is 42,1. O substantivo está acompanhado do pronome pessoal

(meu). Isso denota um carinho especial na escolha e uma relação de profundo

respeito e intimidade.

Em Is 43,10 yTir>x"+B' rv<åa] yDIÞb.[;w> hw"ëhy>-~aun> ‘yd:[e ~T,Ûa; (Vós sois as minhas

testemunhas e meu servo, a quem eu escolhi). Neste oráculo, podemos perceber

que o pronome pessoal encontra-se no plural "vós", o que indica que o autor fala do

"Servo" enquanto uma comunidade chamada a ser testemunha.

Em Is 44,1 `Ab* yTir>x:ïB' laeÞr"f.yIw> yDI_b.[; bqoå[]y: [m;Þv. hT'î[;w> (mas agora,

escuta, Jacó, meu Servo... não tenhas medo meu Servo Jacó). Aqui também

percebemos o sufixo pronominal reforçando a intimidade entre YHWH e o Servo.

Em Is 44,21`ynIvE)N"ti al{ï laeÞr"f.yI hT'a ‘yli-db,[,( ^yTiÛr>c;y> hT'a'_-yDIb.[; yKiä

laeÞr"f.yIw> bqoê[]y: hL,aeä-rk'z> (Relembre isso Jacó e Israel pois Servo meu és tu criado

para mim, tu és Servo meu Israel não esqueça). Há uma insistência da parte de

YHWH na escolha feita, mais uma vez o sufixo pronominal (meu) reforçando a

relação de intimidade e o aspecto coletivo: Israel.

Is 44,26 ADêb.[; rb:åD> ‘~yqime ( faço acontecer a palavra do meu Servo). Is 45,4

ynIT")[.d:y> al{ïw> ^ßN>k;a] ^m,êv.Bi ‘^l. ar"Ûq.a,w" yrI+yxiB. laeÞr"f.yIw> bqoê[]y: yDIäb.[; ‘![;m;’l . (para que

meu Servo Jacó e Israel meu escolhido, para chamar pelo teu nome te dar título sem

me conheceres). Em Is 49,3 lae§r"f.yI hT'a'_-yDIb.[; yliÞ rm,aYOðw: (ele me disse: meu

Servo és tu, Israel). Nessas três citações acima, percebemos que o substantivo

Servo vem acompanhado do sufixo pronominal na primeira pessoa do singular, isto

denota que há sem dúvida uma relação de intimidade e proximidade entre YHWH e

o Servo. Ele não é escolhido por acaso, ele é apresentado e chamado para uma

missão específica. O chamado é feito à uma comunidade específica: Israel. Isso

comprova a identidade do Servo com Israel, ou seja, a comunidade dos exilados na

Babilônia, servindo também como referência para os demais textos e, principalmente

com o texto que estudamos Is 42,1-9. Sendo assim, não descartamos a

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possibilidade de que neste primeiro cântico, o Servo de YHWH seja identificado com

a comunidade dos exilados na Babilônia.

A citação seguinte reforça bem o que estamos querendo comprovar de que

o Servo representa a comunidade exilada na Babilônia.

Em Is 43,1 lae_r"f.yI ^ßr>c,yOw> bqoê[]y: ^åa]r:Bo ‘hw"hy> rm:Üa'-hKo) hT'ú[;w> (e agora

assim disse YHWH o que te criou Jacó e o que te formou Israel). Na fala de YHWH,

Jacó e Israel podem indicar um sinônimo para o Servo. Conforme o texto da

Septuaginta VIakw,b o` pai/j mou (meu Servo Jacó) e Israhl o` evklekto,j mou (Israel

meu eleito). Aqui, também, podemos destacar uma identidade coletiva para o Servo,

como a comunidade dos exilados na Babilônia.

Segundo Croatto, "as ações do servo aplicam-se melhor a figura de um rei,

isso significaria que elas são usadas metaforicamente em relação a Israel"67. Croatto

sugere a hipótese de que o Israel exilado na Babilônia seja porta voz dos judeus

espalhados e dispersos por todo império babilônio. O profeta pensa que seja

possível a sua recuperação e que o instrumento para isso é a comunidade exilada a

quem se dirige, ao menos uma parte dela68.

Uma citação que merece destaque para a nossa hipótese de que a

comunidade exilada na Babilônia seja considerada o "Servo" de YHWH é a seguinte:

Is 42,22 `bv;(h' rmEïao-!yaew> hS'Þvim. lyCiêm; !yaeäw> ‘zb;l' WyÝh' WaB'_x.h' ~yaiÞl'k.

yTeîb'b.W ~L'êKu ‘~yrIWxB;( x;peÛh' èyWsv'w> zWzæB'-~[; éaWhw> (e este povo saqueado e expoliado

preso em buracos todos eles e em casas de confinamento escondidos, foram para

despojo e não há quem os liberte e quem o diga traga de volta). Este texto reforça a

situação dos exilados na Babilônia. E o grito pela liberdade deve despertar alguém

ou um grupo que seja capaz de realizar esse sonho, mesmo com toda a limitação e

crise de fé, YHWH aposta nesse projeto de fazer sair o direito.

67

CROATTO, 1998, p. 68. 68

Ibidem, p. 69.

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1.9.1.3. $mt69 (suster)

A primeira raiz verbal da perícope Is 42,1 é $mt (suster, amparar). Na

perícope que estudamos aparece da seguinte forma: ABê-%m't.a, 70 (susterei a ele). O

significado da raiz verbal é de "segurar, suster, amparar".

Segundo Aurélio, o verbo significa: "suster, 'segurar para que não caia';

sustentar"71.

Segundo Lisowsky72 o verbo ocorre 19 vezes no Primeiro Testamento. Em

Gn 48,17; Ex 17,12; Is 33,15; 41,10; 42,1; Am 1,5.8, Sl 16,5; 17,5; 41,13; 63,9; Jó

36,17; Pr 3,18; 4,4; 5,5; 5,22; 11,16 (2x); 28,17; 29,23; 31,19.

Este verbo é utilizado para designar a ação com que YHWH ordena os

acontecimentos da história73. O verbo tem o sentido de força física, sendo ontológico

e teológico74.

Em Isaías, a primeira ocorrência do verbo está em Is 33,15 dx;VoêB; %moæT.mi

‘wyP'K; r[EÜnO tAQªv;[]m; [c;b,äB. saeúmo ~yrI+v'yme( rbEßdow> tAqêd"c. %lEåho (aquele que caminha

em justiças e fala coisas retas, aquele que rejeita de ganância e extorsões que

sacode suas mãos de pegar suborno). O verbo encontra-se no infinitivo com o

sentido de pegar, tomar. Logo, neste caso difere do sentido do texto que estudamos,

porém remarcamos a primeira vez que aparece em Isaías.

Na citação seguinte, Is 41,10 yqI)d>ci !ymiîyBi ^yTiÞk.m;T.-@a; (te sustenho com

minha mão direita que faz justiça). Aqui o verbo encontra-se no qal perfeito que está

traduzido no presente, com o pronome na segunda pessoa do singular, quer indicar

69

Verbo qal imperfeito. 70

Verbo qal imperfeito + preposição + sufixo na terceira pessoa do singular. 71

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário da Língua Portuguesa, 2ª ed., Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986, pp. 1635-1636. 72 LISOWSKY, 1959, p. 1522. 73

PROVIN, 2008, p. 81. 74

Ibidem, p. 81.

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ser apoiado, sustentado, amparado por YHWH. A ideia é a de ser amparado para

que a pessoa não venha a cair. Aqui tem o mesmo sentido do texto que estudamos

em 42,1.

Com grande ênfase, o verbo suster está presente no ritual litúrgico da

tradição real. Segundo Steinmann:

A adoção do Servo foi feita pelo rito de tomar a mão. Isso se compreendia facilmente em Babilônia, onde o rei, todos os anos, tomava a mão de Marduc, para conduzí-lo em procissão, pela via sagrada75.

Com esse gesto de tomar pela mão, o rei pedia a proteção para

desempenhar sua função de governar. A partir desse ritual, podemos também dizer

que o Dêutero-Isaías empresta essa ideia e a aplica ao Servo. Ele é amparado pela

mão direita de YHWH.

Vejamos também o sentido do verbo suster em outros textos bíblicos.

No Salmo 41,13 T'k.m;äT' yMituB.â ynI©a]w: (eu na minha integridade sustive você).

No Sl 63,9 `^n<)ymiy> hk'îm.T' yBi÷ª ^yr<_x]a; yviäp.n: hq"åb.D" (agarra meu espírito a ti, me

sustém tua mão direita). No Sl 16,5 `yli(r"AG %ymiîAT hT'ªa;÷ ysi_Akw> yqIïl.x,-tn"m. hw"©hy>)

(YHWH minha herança e minha taça, sustém meu destino).

Nesses três versículos dos salmos, percebemos que se trata do mesmo

verbo (suster, amparar). Sendo assim, vemos uma proximidade entre o cântico do

Servo de YHWH e alguns salmos, sempre quer enfatizar que alguém ou grupo pode

confiar na presença de YHWH.

A raiz verbal $mt (suster), primeira expressão verbal do texto que

estudamos, é a primeira ação da parte de YHWH, quer dizer, suster o Servo na sua

missão. Suster com muito cuidado e carinho para que não tropece e venha a cair.

Um belo exemplo: a criança que precisa do cuidado e do amparo da mãe e do pai

75

STEINMANN, 1976, p. 128.

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para não tropeçar e cair. "Eis meu Servo susterei a ele", uma presença confiante de

YHWH na vida e na missão do Servo para que este leve adiante o mesmo projeto

que nasce no espírito de YWHW, o direito e a justiça às nações.

1.9.1.4. yrIßyxiB.76 (meu escolhido)

Segundo Lisowsky77 esse adjetivo ryxib' (escolhido, eleito) significa

auserwählt78,chosem, elect79, electus80. Então, damos preferência e traduzimos esse

adjetivo por: escolhido.

Este adjetivo tem as seguintes ocorrências no Primeiro Testamento: 2Sm

21,6. Is 42,1; 43,20; 45,4; 65,9; 65,15; 65,22. Sl 89,4; 105,6; 105,43; 106,5; 106,23.

1Cr 16,13.

O adjetivo yrIßyxiB. (meu escolhido) vem seguido do sufixo pronominal na

primeira pessoa do singular: "meu". Isso denota uma preferência especial de YHWH

para com o Servo. Podemos, assim, dizer que o tema da escolha ou eleição é

fundamental na compreensão da Teologia do Primeiro Testamento e do povo de

Israel. Segundo Westermann:

Desde muitos anos, "eleição" ocupa lugar central na Teologia do Antigo Testamento [...] o lugar clássico da eleição está em Dt 7,6-8 “Foi a ti que YHWH teu Deus escolheu para que pertenças a ele como seu povo próprio, dentre todos os povos que existem sobre a face da terra”. Não por ser o mais numeroso de todos os povos(...) a

eleição é post factum, ou seja, ela se dá após a libertação do Egito. Seria um mal-entendido, se quiséssemos deduzir do fato da eleição qualquer tipo de privilégios. Tudo indica ser uma iniciativa de YHWH81.

76

Adjetivo masculino singular + sufixo na primeira pessoa do singular. 77

LISOWSKY, 1958, p. 207. 78

Tradução nossa: selecionar. 79

Tradução nossa: escolhido, eleito. 80

Tradução nossa: escolhido. 81

WESTERMANN, Claus. Fundamentos da Teologia do Antigo Testamento. Santo André: Academia Cristã, 2011, pp. 53-54.

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Desta maneira, podemos compreender que a escolha do Servo por YHWH

denota também um caráter coletivo.

Veremos algumas citações bíblicas que tratam do tema da escolha de Israel.

Por exemplo:

Em Is 41,8 ^yTi_r>x;B. rv<åa] bqoß[]y: yDIêb.[; laeär"f.yI ‘hT'a;w (e tu Israel meu servo,

Jacó que eu escolhi). Em Is 41,9 ^yTiÞr>x;B. hT'a;ê-yDIb.[; ‘^l. rm;aoÜw" (e disse tu és meu

servo que escolhi). Essa citação confirma também a nossa escolha pelo texto da

Septuaginta em Is 42,1: Ιακωβ ὁ παῖς μου (Jacó, Servo meu).

Estes versículos indicam uma escolha com iniciativa de YHWH. Nos

versículos seguintes, percebemos uma identificação do Servo de YHWH com o

povo. Uma primeira identificação poderemos perceber em Is 43,20 `yrI)yxib. yMiî[;

tAqßv.h;l. (para dar de beber ao meu povo, meu eleito, escolhido). Como já

dissemos, temos aqui uma evidência de que o Servo poderá ser compreendido

como sendo o povo de Israel, o eleito, o escolhido. E Is 43,21 repete a mesma

expressão "povo": ytiÞL'hiT. yliê yTir>c:åy" ‘Wz-~[; (povo este que criei para me dar glória).

Em Is 45,4 ^m,êv.Bi ‘^l. ar"Ûq.a,w" yrI+yxiB. laeÞr"f.yIw> (Israel o meu escolhido que chamei

pelo teu nome). Nesses versículos acima, fica evidente que no pensamento do

Dêutero-Isaías um povo ou uma comunidade é escolhida por YHWH. O uso do

pronome pessoal "meu", reforça a ideia de pertencer a ele.

1.9.1.5. ht'äc.r" 82 (se agradou)

Esta expressão verbal, segundo Lisowsky83 significa: gefallen haben84, to be

pleased85, delectari86. A expressão verbal encontra-se no qal perfeito e traduzimos

82

Verbo qal perfeito + sufixo terceira pessoa feminino singular. 83

LISOWSKY, 1958, p. 1354. 84

Tradução nossa: caíram. 85

Tradução nossa: estar satisfeito.

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por: "se agradou (de)". A mesma expressão verbal também tem outro significado:

bezahlen87, to pay off88, solvere89 (debitum), e está relacionado com "algo que já foi

pago, expiado".

Segundo Lisowsky90, a expressão verbal ocorre 57 vezes no Primeiro

Testamento, aparece somente duas vezes no Dêutero-Isaías. Em Is 40,2 e Is 42,1.

Em Is 42,1 YHWH agradou-se do Servo. Em Is 40,2 a expressão verbal signica que

o pecado do povo já foi "pago". Segundo Alonso Schökel, "trata-se de expiar culpa,

de alguma coisa estar paga"91. Em Is 40,2 com a seguinte expressão: Hn"+wO[] hc'Þr>nI

yKi (que foi pago iniquidade dela). São palavras dirigidas à Jerusalém e que também

é aplicado ao povo que já recebeu em dobro a paga de suas faltas.

Desta maneira, hcr "se agradar com alguém" e expiar seus pecados tem a

mesma raiz verbal. A partir daí, poderemos intuir que a o povo de Israel ou a

comunidade dos exilados são estimados por YHWH e ao mesmo tempo seus

pecados estão perdoados. O mesmo sentido aplica-se em Is 40,1 a partir da

citação: ~k,(yhel{a/ rm:ßayO yMi_[; Wmßx]n: Wmïx]n: ( consolai, consolai, meu povo diz vosso

Deus). Não temos aqui a raiz verbal hcr (expiar) que fundamenta a ação de

YWHW. Porém, o significado é semelhante, ele já expiou os pecados do povo. O

consolo vem através da misericórdia de YHWH. Sendo assim, poderemos afirmar

que essa raiz verbal hcr (que significa "se agradar e pagar, expiar") são

fundamentais na compreensão do Dêutero-Isaías. O povo que recebe de YHWH o

perdão de suas faltas é o povo exilado. O Servo que é estimado por YHWH também

representa a comunidade dos exilados. Com isso, poderemos dizer que, ao sentir-se

amado por YHWH, o povo de Israel ou a comunidade dos exilados sente também o

seu perdão, por isso é capaz de ser agente de libertação, pois já experimentou de

YHWH esse dom do perdão e da misericórdia.

86

Tradução nossa: prazer. 87

Tradução nossa: pagar. 88

Tradução nossa: para pagar. 89

Tradução nossa: pagar. 90

LISOWSKY, 1958, p. 1354. 91

ALONSO SCHÖKEL, 1997, p. 630.

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1.9.1.6. yvi_p.n:92 (a minha pessoa)

Este substantivo merece uma atenção especial. Segundo Da Silva93,

originalmente significa garganta ou respiro, sopro vital. O termo tem o sufixo

pronominal na primeira pessoa do singular, "eu mesmo", "minha vida". O substantivo

tem uma grande ocorrência no Primeiro Testamento, aproximadamente 500 vezes.

Em Isaías aparece 24 vezes e no Dêutero-Isaías 7 vezes.

No Dêutero Isaías, ele aparece pela primeira vez em Is 43,4 `^v<)p.n: (da tua

pessoa/Vida) e, aqui, faz referência a Jacó e Israel. Estes são preferidos aos olhos

de YHWH: ^yTi_b.h;a] (que amo você). Esta expressão tem forte relação com o Servo,

com o povo de Israel. Outra citação em Is 49,7 vp,n<÷-hzOb.li (o menosprezado de

vida). Esta expressão se aproxima da figura do Servo sofredor, aquele, cuja vida é

desprezada e que todos o abominam. Este sofredor é resgatado pelo santo de

Israel: lae’GO (o resgatador).

Em Is 53,11-12, temos duas expressões: ‘Avp.n: lm;Û[]me (depois de ter pago

com a vida-pessoa). Avêp.n: ‘tw<M'’l; (com a morte deu a vida-pessoa). E faz menção

ao Servo: yDIÞb.[; (meu Servo). Tudo indica que nesses versículos o substantivo mais

apropriado é pessoa. Esta pessoa concreta é o Servo de YHWH e na pessoa de

YHWH temos aquillo que é próprio de Deus: o seu próprio ser que, também,

podemos traduzir por vida ou "vida dele".

Desta maneira, após verificarmos as ocorrências do substantivo yvi_p.n: (a

minha pessoa) nos textos do Dêutero-Isaías, podemos dizer que trata-se de uma

relação de intimidade entre YHWH e o Servo. Ao traduzirmos o substantivo por

"pessoa", estamos nos aproximando de alguém muito próximo, numa relação de

92

Substantivo + sufixo na primeira pessoa do singular. 93

DA SILVA, 2006, p. 47.

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amor e de carinho. É a própria vida ou a pessoa de YHWH que se alegra com o seu

Servo.

1.9.1.7. ‘yxiWr94 (meu espírito)

Este substantivo, seguido da expressão verbal yTit;Ûn'95 (eu dei) é uma

palavra chave para todo o poema e o mesmo termo repete-se no v.5. Segundo Silva,

"na obra Isaiana o espírito de Deus repousa sobre o messias vindouro para

conceder-lhes dons ( Is 11,2)" 96.

Este termo ocorre aproximadamente 360 vezes no Primeiro Testamento. Em

Gn 1,2, temos a expressão: `~yIM")h; ynEïP.-l[; tp,x,Þr:m. ~yhiêl{a/ x:Wråw> (e o espírito de

Deus pairava sobre a superfície das águas). Em Gn 6,3: ~l'ê[ol. ‘~d"a'b'( yxiÛWr (meu

espírito não tem longa duração sobre o homem). Aqui, o contexto é a fragilidade

humana e que seus dias são contados. Mas, da mesma maneira que no Cântico do

Servo, o substantivo vem acompanhado do sufixo na primeira pessoa do singular:

meu. Isso denota uma entrega gratuita de YHWH, doando ao Servo o seu próprio

ser, o seu próprio espírito.

No livro de Isaías, o termo ocorre aproximadamente 47 vezes. No Dêutero-

Isaías, 10 vezes. Este termo aparece pela primeira vez em Is 40,13 hw"+hy> x:Wrß-ta,

!KEïti-ymi((( (quem mediu o espírito de YHWH). Isso significa dizer que somente YHWH

tem o poder de criar e de doar seu espírito. Neste caso, ele coloca sobre o seu

Servo o espírito dele. Em Is 44,3, temos a seguinte expressão: ^[,êr>z:-;l[ ‘yxiWr qCoÜa,

(derramarei meu espírito sobre tua descendência). Aqui, faz referência ao Servo

Jacó e ao povo Israel, isto significa dizer que tem o mesmo significado em Is 42,1:

"eu dei meu espírito: wyl'ê['97 (sobre ele)". Importante frisar o uso da preposição l[;

(sobre). A preposição indica que o Servo está sendo investido de uma missão que é

94

Substantivo + sufixo na primeira pessoa do singular. 95

Verbo qal perfeito + sufixo na primeira pessoa singular. 96

DA SILVA, 2006, p. 47. 97

Preposição + sufixo 3 pessoa do singular.

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própria de YHWH. Portanto, repousa sobre o Servo a vida de YHWH, o seu próprio

espírito. Sendo assim, ele estará cumprindo a missão que é a vida do próprio

YHWH.

1.9.1.8. jP'Þv.mi98 (direito)

No Primeiro Testamento, este termo ocorre aproximadamente 412 vezes,

com maior frequência em Números e Deuteronômio. Nos profetas, destacamos

Isaías e Ezequiel. Nos livros sapienciais, destacamos os salmos, principalmente o

salmo 119.

No livro de Isaías o termo jP'Þv.mi (direito) ocorre aproximadamente 21

vezes. No Dêutero-Isaías, 15 vezes. Com isso, o "direito" é um conceito fundamental

na obra de Dêutero-Isaías.

No cântico do Servo o substantivo repete-se em Is 42,1.3-4. Neste sentido, é

um termo chave nesta perícope e mais adiante aprofundaremos estas citações e o

conceito direito.

Uma citação que merece destaque é: Is 51,4: `[:yGI)r>a; ~yMiÞ[; rAaðl. yjiêP'v.miW

aceête yTiäaime ‘hr"At yKiÛ (pois uma lei de mim farei sair e o meu direito para luz aos

povos). Tudo indica que a lei e o direito vem do próprio YHWH, nasce de sua

identidade enquanto divindade, na qual o Servo é revestido do espírito de YHWH.

E, assim, ele também faz sair o direito para as nações. No inicio do versículo 4,

temos a seguinte expressão: yMiê[; ‘yl;ae WbyviÛq.h; (dai atenção a mim, meu povo).

Tudo indica que o povo exilado é convocado para essa missão de fazer sair o direito

às nações. E o Dêutero-Isaías quer enfatizar que o Servo que também pode ser

considerado como povo ou a comunidade dos exilados tem essa missão específica.

98

Substantivo masculino singular.

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Segundo Westermann, "a tarefa do servo é fazer sair o direito"99. Para ele, há uma

relação de fazer sair o direito com às nações. Uma citação que confirma essa ideia

está em Is 49,6 ~yIëAG rAaæl; (para luz das nações). Para Westermann, o sentido de

"direito" esta relacionado com a ideia de quem é o verdadeiro Deus. E somente

YHWH é Deus100.

A tarefa do Servo, neste primeiro cântico, é fazer sair o direito, ou seja,

revelar esta verdade para as nações.

Croatto traduz o termo "direito" como "libertação" e justifica pelo poder de

decisão de quem aciona o direito para uma intervenção salvadora. Para ele, o termo

conota um projeto, uma ação histórica e a volta a uma ordem prévia, mas que foi

perdida101.

Para Brueggemann: "A noção característica de justiça, enraizada na tradição

mosaica e explicada na tradição profética, é a reorganização da vida social e do

poder social, de tal modo que o fraco (viúva e órfãos) possa viver uma vida de

dignidade, segurança e bem estar" 102.

Pelo exposto acima, podemos afirmar que, o "direito" é a essência do próprio

YHWH. E o Servo tem como missão fazer sair para as nações essa verdade que

está no próprio YHWH, e que está ligado a um projeto de libertação.

99

WESTERMANN, Claus. Isaiah 40-66. A comentary. Philadelphia:The Westminster Press, 1977, p. 95. 100

WESTERMANN, 1977, p. 95. 101

CROATTO, 1998, p. 70. 102

BRUEGGEMANN, Walter. Isaiah 40-66. Louisville, Kentucky: Westminster John Knox Press, 1998, p. 42.

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1.9.1.9. ayci(Ay103 ~yIïAGl;104 (para as nações fará sair)

A expressão "para as nações" ocorre 11 vezes no Dêutero-Isaías.

Percebemo-a pela primeira vez em Is 42,1. Antes desse termo, temos o substantivo

jP'Þv.mi (direito) e a seguir temos o verbo no hifil imperfeito ayci(Ay (fará sair). O

sujeito que realiza essa ação de fazer o direito sair é o Servo. Então, o direito é

levado para as nações através da missão dada ao Servo por YHWH. Importa

destacar aqui a preposição l; (para) que indica direção, ou propriedade.

No texto que estudamos Is 42,1-9, esse termo repete-se no v.6 ~yI)AG rAaðl.

~['Þ tyrIïb.li (para aliança de povo e para luz de nações). O Servo tem a missão de

ser aliança do povo e de ser luz das nações. E a realização desse serviço de ser

aliança e luz dar-se-á ao fazer sair o direito para as nações. Ainda, em Is 45,20,

encontramos ~yI+AGh; yjeäyliP. (sobreviventes das nações). Tudo indica que os

mencionados neste versículo são os que estão na diáspora que são os

sobreviventes de Israel enviados às nações105. Para estes, o Servo tem a missão de

reuní-los como mandato de YHWH. Ainda com o mesmo sentido, em Is 49,6, repete-

se o termo ~yIëAG rAaæl. (para luz das nações). Neste v.6 fica evidente que o Servo é

chamado a reagrupar os dispersos e, principalmente, para que a ytiÞ['Wvy> (minha

salvação) diz YHWH esteja presente nas extremidades da terra. Damos destaque ao

termo povo, como aparece em Is 49,8 ~['ê tyrIåb.li (para aliança do povo). Aqui a

palavra "povo" designa um grupo cujos membros são parentes: seja um povo

qualquer, seja o povo de Israel, seja a população da terra".106 Com o mesmo

sentido, encontramos em Is 49,13 AMê[; ‘hw"hy> ~x;ÛnI-yKi( (pois teve compaixão YHWH

do seu povo). Tudo indica que a missão do Servo identifica-se com a missão e o ser

de YHWH. Assim, "a reunião dos dispersos, reerguer a terra, dizer aos que estão

103

Verbo hifil imperfeito + sufixo na terceira pessoa masculino plural. 104

Preposição + artigo + substantivo masculino singular. 105

BIBLIA. PORTUGUÊS. Tradução Ecumênica. São Paulo: Loyola, 1994. Cf. Nota (a), p.677. 106

Ibidem, cf. nota (z), p. 666.

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nas trevas vinde a luz, ser confortados, atitudes de compaixão são atitudes do

próprio YHWH e consequentemente, do Servo.

Ainda retomando o tema das nações, temos em Is 49, 22-23, hwI©hy> yn"ådoa]

rm;úa'-hKo) (assim fala o Senhor YHWH). O v.22 começa com a fala do senhor e com

sua ação para as nações. Em seguida, percebemos como será o desfecho em prol

de Israel, ou da comunidade dos exilados. ydIêy" ‘~yIAG-la, aF'Ûa, (levantarei para as

nações minha mão). ySi_nI ~yrIåa' ~yMiÞ[;-la,w> (e para os povos levantarei meu

estandarte). !c,xoêB. ‘%yIn:’b' WaybiÛhew> (eles carregarão teus filhos no seio). %l'ê Wwx]T;äv.yI

#r<a,… ~yIP;ªa; (rosto em terra, ficarão prostrados diante de ti). Segundo Ridderbos, "a

intenção é dizer que as nações mostrarão diligência e cuidado em realizar a volta

dos israelitas107. Na confirmação desse chamado às nações, percebemos em Is 55,5

^yl,äae ^W[ßd"y>-al{) yAgðw> ar"êq.Ti ‘[d:te-al{) yAGÝ !hEå (eis uma nação não conheces

chamas para ti e uma nação que não te conheces virá para ti). Tudo indica que as

nações acorrerão à YHWH através do Servo e da sua missão.

Sendo assim, o direito que é o projeto de liberdade que é inerente ao próprio

ser de YHWH é levado às nações e povos pela missão do Servo. Por isso, um verbo

fundamantal é ayci(Ay (fará sair) que se encontra no hifil imperfeito. Ocorre 234

vezes no Primeiro Testamento e com maior frequência em Gênesis, Êxodo e

Deuteronômio, e, nos profetas, tem maior ocorrência em Ezequiel, seguido de

Jeremias e Isaías. No hifil somente tem ocorrência no Dêutero-Isaías oito vezes e

duas vezes no Terceiro Isaías.

Este verbo (fará sair) encontra-se em Is 42,1.3.7. Em Is 42,1.3, encontra-se

no hifil imperfeito. Segundo Kelley, "o imperfeito hifil tem a função de causativo do

imperfeito qal e descreve uma ação simples no futuro, é usado para expressar ações

repetidas, habituais ou costumeiras"108. Neste caso, está sendo usado para

expressar uma vontade de YHWH e um serviço específico do Servo, fazer sair o

107

RIDDERBOS, 1995, p. 403. 108

KELLEY, Page H. Hebraico Bíblico. São Leopoldo: Sinodal, 6ª ed., 1998, p. 177.

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"direito". No v.7 fazer sair refere-se a "fazer sair da prisão encarcerado". Aqui, o

verbo apresenta-se no hifil infinitivo. Trata-se de um serviço bem concreto a partir de

um mandato de YHWH e de uma resposta do Servo. A Primeira vez que a raiz

verbal aparece no hifil é em Is 40,26 ~a'_b'c. rP"ßs.mib. ayciîAMh; (aquele que faz sair

numeroso exército). Neste versículo, indica a força de YHWH em mobilizar um

exército para uma batalha. Da mesma maneira, o Servo é convocado para um

serviço bem concreto em prol do direito. Isso se comprova em Is 43,8 na seguinte

expressão e encontra-se no hifil imperativo. Podemos dizer que o Servo tem uma

missão específica. Ele é chamado por YHWH para um serviço de libertação. Neste

mesmo sentido, em Is 43,17, temos a seguinte expressão: `Wb)k' hT'îv.PiK; Wkß[]D"

WmWqêy"-lB; ‘WbK.v.yI wD"Ûx.y: zWZ=[iw> lyIx:å sWsßw"-bk,r<( ayciîAMh; (aquele que faz sair carro e

cavalo com poder e rebaixados todos juntos para não se levantar ficando como

pavio apagado). Aqui faz memória da força de YHWH, do seu poder e da libertação

do Egito. Carro e cavalo lembra a força do poder da escravidão e do processo de

libertação do povo escravo. Parece indicar que um novo êxodo está iniciando-se e o

Servo tem a missão de continuá-lo.

Pelo exposto inferimos que a raiz verbal acy (sair) que no texto que

estudamos está no hifil causativo (fazer sair) tem uma função importante no

pensamento do Dêutero-Isaías, ou seja, trata-se de uma convocação para um

serviço específico. O sujeito da ação, no caso o Servo, é convocado não somente

para levar, mas para fazer sair, quer dizer, tirar, libertar aquele que se encontra

escravo, encarcerado, na casa da escuridão, fazer sair o direito para as nações. O

serviço do Servo é feito na atenção e na solidariedade com o fraco e abatido. Isso

fica evidente em Is 42,3 "cana a que é despedaçada não quebrará e pavio vacilante

não extinguirá".

As nações, na compreensão do Dêutero-Isaías são em primeiro lugar os

judeus da diáspora que serão reagrupados e que o Servo tem essa missão de fazer

o direito sair até eles. Esse direito vem do próprio YHWH como mandato. Depois tem

um caráter universal, pois todos podem beber na fonte do direito. E começa pela

comunidade exilada que começa a experimentar a libertação.

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Veremos, a seguir, as atitudes do Servo de YHWH. A partir de sete

advérbios de negação, expressos no texto, Dêutero-Isaías aponta aquilo que o servo

não fará para poder implantar o direito.

1.9.2. Análise dos termos significativos do segundo versículo Is 42,2

Os termos fundamentais neste versículo são: O verbo "clamar" seguido do

advérbio de negação "não", o verbo "erguer e fazer escutar" também seguidos do

advérbio de negação "não", os substantivos "rua e voz".

1.9.2.1. q[;Þc.yI al{ï109 (não clamará)

Este verbo clamar ocorre aproximadamente 46 vezes no Primeiro

Testamento, com maior frequência em Êxodo e no 2º Reis. Nos profetas,

percebemos em Isaías e Jeremias, algumas vezes nos salmos.

O verbo aparece cinco vezes em Isaías. No Dêutero-Isaías duas vezes: em

Is 42,2 e Is 46,7. Analisaremos o emprego deste verbo nas duas citações. Em Is

42,2 vem acompanhado do advérbio de negação (não). Esta é a primeira vez que a

raiz verbal q[c (clamar) aparece no Dêutero-Isaías. Em Is 46,7 temos a seguinte

expressão: hn<ë[]y: al{åw> ‘wyl'ae q[;Ûc.yI-@a; (se alguém gritar para ele, e não responde).

Neste capítulo 46 e neste versículo, trata-se de uma crítica aos "deuses" que nada

podem fazer e não respondem aos gritos daqueles que pedem seu socorro. Ao

contrário, YWHW é aquele que escuta o grito e vem em socorro do aflito. Veremos,

agora, duas citações do livro do Êxodo que comprovam essa afirmação. Em Ex

22,21-22 temos a seguinte expressão: !WN*[;t. al{ï ~Atßy"w> hn"ïm'l.a;-lK' (toda viúva e

órfão não humilhes). E: At*q'[]c; [m;Þv.a, [:moïv' yl;êae ‘q[;c.yI q[oÜc'-~ai yKiä At+ao hN<ß[;t.

109

Advérbio de negação + verbo qal imperfeito terceira pessoa masculino singular.

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hNEï[;-~ai (Sê os humilharem e eles clamarem a mim eu escutarei os seus gritos). Em

Ex 22,26 temos: ynIa") !WNðx;-yKi( yTiÞ[.m;v'w> yl;êae q[;äc.yI-yKi( ‘hy"h'w> bK'êv.yI hM,äB; Ar+[ol.

Atßl'm.fi awhiî HD"êb;l. ΑAtWsk.Ð ¿ht'Wsk.À awhiÛ yKiä`ynIa") !WNðx;-yKi( (pois a cobertura dele é

o que protege a sua pele...onde ficaria? Quando clamasse à mim, ouviria, pois sou

compassivo). Podemos perceber que a raiz verbal (clamar), nesses versículos

analisados, está relacionada com a atitude de YHWH, ou seja, ele é aquele que não

fica indiferente ao clamor dos sofredores ou de quem grita seu nome. No contexto

de escravidão, YHWH vem em proteção aos fracos e abatidos. Importante notar em

Dt 26,7 Wnleêqo-ta, ‘hw"hy> [m;Ûv.YIw: Wnyte_boa] yheäl{a/ hw"ßhy>-la, q[;§c.NIw: (gritamos para

YHWH o Deus de nosso pais e ouviu YHWH a nosso grito). Também YHWH é quem

dá atenção ao grito do suplicante.

Em Is 19,20 ynEåP.mi ‘hw"hy >-la, WqÜ[]c.yI-yKi( ~yIr"+c.mi #r<a,äB. tAaßb'c. hw"ïhyl;( d[e²l.W

tAaïl. hy"“h'w> (Serás um sinal e uma testemunha para YHWH dos exércitos na terra

do Egito, pois gritarão diante da face de YHWH) `~l'(yCihiw> br"Þw" [:yviîAm ~h,²l' xl;îv.yIw>

~yciêx]l{) (para oprimirem e enviará para eles um salvador para os salvar e libertar).

Podemos perceber que também o chamado do Servo identifica-se com o de

salvador e de libertador. O Servo numa atitude silenciosa "não clamará" mas fará o

direito acontecer. Não será com palavras, mas com a prática da justiça.

No profeta Jeremias, temos a seguinte expressão: Jr 22,20 ~yrIêb'[]me( ‘yqi[]c;(w>

%lE+Aq ynIåT. !v"ßB'b;W yqi['êc.W* ‘!Anb'L.h; yliÛ[] (sobe ao Líbano e clama e em toda região

eleva a tua voz e clama nos Abarim110). Percebemos que diferentemente do

Dêutero-Isaías, em Jeremias o convite é para gritar e clamar em todo lugar. Em Is

42,2 a atitude do Servo é não gritar. O que isso pode significar? Qual o sentido do

silêncio do Servo neste versículo? Segundo Da Silva:

Trata-se de uma proposta de não violência (...) o grito expressa o lamento ou pedido de socorro, pode referir-se à escravidão do Egito

110

BÍBLIA. PORTUGUÊS. Tradução Ecumênica. São Paulo: Loyola, 1994. Cf. nota "s" p. 249. "é a cadeia que domina o leste do Jordão e o mar Morto. O contexto indica claramente que estes montes estão fora da terra de Israel".

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(Ex 2,23; 3,7.9), na perspectiva de quem se solidariza com o sofrimento de outras pessoas para estabelecer o direito111.

Sendo assim, pelo silêncio do Servo, Dêutero-Isaías apresenta uma

novidade na prática da profecia. O profeta é aquele que grita. O Servo guarda o

silêncio e a atitude da não violência. Toma para si outra atitude: a solidariedade e o

serviço que vêm da não violência. Não é o discurso, mas uma prática em favor do

fraco e abatido. Não é ser uma voz, mas ter uma atitude concreta e solidária a favor

do necessitado.

1.9.2.2. [:ymiîv.y:-al{)w> aF'_yI al{åw>112 (e não erguerá e não fará escutar)

A raiz verbal afn (erguer, levantar) ocorre aproximadamente 634 vezes no

Primeiro Testamento. Citaremos algumas ocorrências no livro de Gênesis e depois

veremos algumas citações no livro de Isaías.

Em Isaías, a raiz verbal aparece 44 vezes. No Dêutero-Isaías três vezes.

Em Gn 21,16 temos: &.b.Te(w: Hl'Þqo-ta, aF'îTiw: dg<N<ëmi bv,Teäw: (sentada a parte,

ela ergueu a voz e chorou). Este versículo relembra o lamento de Hagar. Aqui ela

ergue a voz num grito de desespero pelo seu filho. Importante notar que o Servo

pelo contrário não erguerá a sua voz. Tudo indica que sua postura é de silêncio, mas

não de passividade. Em Gn 27,38 temos: `&.b.YE)w: Alàqo wf'²[e aF'îYIw: (e Esaú levantou

sua voz e chorou). Contexto da benção de Isaac à Jacó. Neste versículo,

percebemos que a raiz verbal afn (erguer, levantar) é empregada num momento de

desespero. Já o Servo mantém a postura de não desespero e de confiança. Ele não

erguerá a voz. Ou seja, não chorará e nem gritará.

111

DA SILVA, 2006, pp. 48-49. 112

Conjunção + advérbio de negação + verbo qal imperfeito terceira pessoa masculino singular + Conjunção + advérbio de negação + verbo hifil imperfeito terceira pessoa masculino singular.

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Em Gn 29,11 `&.b.YE)w: Alàqo-ta, aF'îYIw: lxe_r"l. bqoß[]y: qV;îYIw: (e beijou Jacó a

Raquel e levantou sua voz e chorou). Aqui temos a mesma raiz verbal "erguer e

levantar" a voz que vem acompanhado do pranto ou choro. Em Is 24,14 temos: hw"ëhy>

!Aaåg>Bi WNro+y" ~l'ÞAq Waïf.yI hM'he (eles levantam vozes chorando em alta voz a

majestade de YHWH). Levantar vozes e chorar em alta voz. Nesse contexto, trata-se

de uma aclamação universal a YHWH pelas façanhas que realizou pelo seu poder.

Aqueles que levantam vozes, provavelmente, são os judeus salvos113. Em Is

37,23b: aF'îTiw: lAQ+ ht'AmåyrIh] ymiÞ-l[;w> (a quem levantaste a voz e ergueste.).

Contexto de reprovação de Isaías ao rei da Assíria Senaquerib. Este levantou a voz

contra o Santo de Israel, segundo este contexto. Nota-se que levantar a voz tem

duas dimensões: uma de lamento, choro. Mas se levanta a voz como zombaria.

Percebemos, assim, que o Servo permanece em um clima de silêncio: nem ergue a

voz como choro e lamento e não ergue a voz como zombaria. Ele tem uma atitude

de firmeza e atenção.

Em Is 52,8a, temos wD"äx.y: lAqß Waf.n"ï %yIp:±co lAqï (voz dos que te vigiam

elevam a voz juntos). No retorno a cidade de Jerusalém os vigias soltam

aclamações em alta voz. O Servo não eleva a voz nem mesmo como aclamações de

júbilo. Tudo indica que o fundamental na atitude do Servo é uma prática concreta

que faça o direito sair. Ele é chamado para uma ação e para um serviço e não o fará

com grito e com aclamações. Segundo Westermann:

Como o servo promulga julgamento, ele não está a seguir o costume de exclamar em público. Aqui podemos recordar que, em direito oriental, quando um novo rei sucede ao trono, ele re-decreta as leis e às proclama publicamente. A maneira em que o Servo era para trazer justiça e estabelecê-la, é para ser o oposto, (o contrário do sistema dos reis orientais)114.

Estas duas expressões verbais "não levantar e não fazer escutar a voz" são

atitudes do Servo na sua prática libertadora. Quer dizer, em meio a tanto ruído e

barulho, o Servo não necessita elevar sua voz. A sua atitude silenciosa em si é um

gesto libertador.

113

BÍBLIA. PORTUGUÊS. Tradução Ecumênica. São Paulo: Loyola, 1994. Cf. nota (e), p. 642. 114

WESTERMANN, 1977, p. 96.

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1.9.2.3. #WxßB;115 (na rua)

Esse termo ocorre 166 vezes no Primeiro Testamento e com maior

frequência em Gênesis, Êxodo, Levítico e Números. Nos profetas, destacamos em

Ezequiel ( 17 vezes) e Jeremias ( 16 vezes). Em Isaías, podemos perceber oito

vezes, no Dêutero-Isaías três vezes e em Lamentações, aparece sete vezes.

Em Gn 15, 5 temos a seguinte expressão hc'Wxªh; Atøao ace’AYw : (o fez sair para

fora). Neste versículo, Abraão é convidado a sair para contemplar o céu e contar as

estrelas. Neste mesmo sentido que deve ser entendido o termo "na rua”, no texto de

Is 42,2, " para fora, na rua". Ou seja, a atitude do Servo é a de não gritar "fora, na

rua". Ele guardará atitude silenciosa.

Ainda um texto que indica um acontecimento que se dá fora, é encontrado

em Ex 12,46, temos nesta citação uma recomendação no ritual da ceia pascal para

não comer fora de casa, usando o mesmo termo: hc'Wx+ rf"ßB'h;-!mi tyIB:±h;-!mi aycióAt-

al{ (não fará sair da casa a carne para fora). Aqui, retrata a ceia pascal, onde esta

devia ser feita dentro de casa. O mesmo dá-se numa citação em Lv, o termo faz

referência a algo que devia acontecer fora do acampamento. Lv 4,21 hn<ëx]M;l;( ‘#Wxmi-

la, (para fora do acampamento).

Em Is 5,16, temos a seguinte expressão: tAc+Wx br<q<åB. hx'ÞWSK; ~t'²l'b.nI

(cadáveres são como miudezas no meio das ruas). No profeta Jeremias o termo é

empregado com referência à Jerusalém ~Øil'_v'Wr)y> tAcßxub.W (nas ruas de Jerusalém).

Nestas duas citações, percebemos que o termo sempre indica algo que acontece do

lado de fora. Desta maneira, o termo é empregado no texto de Is 42,2, fazendo

referência ao que está do lado de fora, na rua. O Servo não clamará, não erguerá a

voz na rua, em um espaço público.

115

Preposição + artigo + substantivo masculino singular.

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Segundo Harris, o termo significa basicamente "fora"116. Trata-se de uma

área externa, ou área externa da casa. E também fora das muralhas da cidade.

1.9.2.4. Al*Aq (voz dele)

Basicamente o termo l*Aq (voz) tem o sentido de som produzido pelas

cordas vocais (reais ou figuradas)117. No Antigo testamento, a palavra ocorre 506

vezes118, em Isaías o termo aparece 17 vezes, no Dêutero-Isaías quatro vezes.

Em Is 40,3 hw"+hy> %r<D<ä WNàP; rB'§d>MiB; arEêAq lAqå (uma voz do que clama no

deserto, limpai o caminho de YHWH). Aqui, parece indicar um pedido à alguém:

"clamar". Em Is 40,9 ~Øil'_v'Wry> tr<F,Þb;m. %leêAq ‘x:Ko’b; ymiyrIÜh' (levanta com poder tua

voz mensageira Jerusalém). Nestas duas citações, o substantivo é empregado para

fazer um anúncio e levantar a voz.

No entanto, a atitude do Servo é não levantar a voz e não gritar. Não se

ouvirá a voz dele na rua, fora.

1.9.3. Análise dos termos significativos do terceiro versículo Is 42,3

Os termos que serão analisados neste versículo são: a expressão: "cana a

que é despedaçada", o verbo "quebrar" seguido do advébio de negação "não", o

substantivo "pavio" seguido do adjetivo "vacilante", o verbo "apagar" seguido do

advérbio de negação "não", o substantivo "na verdade", a expressão verbal "fazer

sair" seguido do substantivo "direito".

116

HARRIS et alii, 1998, p. 442. 117

Ibidem, p.1330. 118

Ibidem, p.1330.

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1.9.3.1. ‘#Wcr" hn<Üq'119 (cana a que é despedaçada)

O termo hn<Üq' (cana) aparece 45 vezes no Primeiro Testamento. Aparece

com mais frequência no livro do êxodo com a ideia de enfeite de ramos ao

candelabro. Segundo Harris, "o substantivo aparentemente denota o junco da Pérsia

conhecido como Arundo donax... aquilo que tem forma de junco, uma haste"120.

Nos profetas, o termo ocorre com mais frequência em Ezequiel e Isaías. Em

todo livro de Isaías aparece seis vezes e no Dêutero-Isaías, três vezes.

O termo ocorre pela primeira vez em Is 19,6: Wlme(q' @Wsßw" hn<ïq' rAc=m' yrEäaoy>

Wbßr>x'w> Wlïl]D" tArêh'n> WxynIåz>a,h,w> (serão rejeitados, rios baixarão e secarão no Nilo,

cana e juncos murcharão). Trata-se de uma profecia contra o Egito. Neste mesmo

contexto do Egito, vemos em Ez 29,6 lemos: lae(r"f.yI tybeîl. hn<ßq' tn<[<ïv.mi ~t'²Ayh/ ![;y:ô

hw"+hy> ynIåa] yKiÞ ~yIr:êc.mi ybeäv.yO-lK' ‘W[d>y")w> (e saibam todos os habitantes do Egito que

eu sou YHWH porque foram apoio de cana para a casa de Israel). Aqui faz

referência a cana quebrada que perfura a mão. Fazendo uma crítica ao Egito como

parceiro que faz uma aliança militar. O contexto do Exílio na Babilônia também

indica uma falsa segurança para a casa de Israel, na intenção de se apoiar naqueles

que não darão segurança e esperança.

Outro texto que amplia o sentido da cana e relaciona com a escravidão do

Egito, encontramos em Is 36,6 com a seguinte expressão: ~yIr:êc.mi-l[; ‘hZ<h; #WcÜr"h'

hn<“Q'h; •tn<[,v.mi-l[; T'x.j;‡b' hNEåhi (eis que confiastes no apoio, a cana quebrada do

Egito). Tudo indica que a cana quebrada perfura a mão daquele que se apoia nela.

Assim, acontece aos que depositam confiança no Faraó, rei do Egito. Pode indicar

que o Servo preserva o valor de uma "cana despedaçada" que não serve para mais

nada e não pode servir de apoio. Essa "cana despedaçada" não será abandonada

pela prática do Servo. Ele não despreza e abandona quem está sendo condenado a

morte.

119

Substantivo + verbo qal particípio masculino singular. 120

HARRIS et alii, 1998, p. 1353.

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A mesma citação encontramos em 2Rs 18,21 ~yIr:êc.mi-l[; ‘hZ<h; #WcÜr"h' hn<“Q'h ;

•tn<[,v.mi-l[; ^‡L. T'x.j;äb' hNEåhi hT'‡[; (agora, eis que confiastes no apoio a cana a que

despedaçada do Egito). "O Egito é chamado de cana esmagada"121. Segundo

Harris,"o servo do Senhor firmará a justiça até mesmo para uma cana esmagada

ou, o pobre da sociedade"122.

Em Is 43,24: ynIt"+ywIr>hi al{å ^yx,Þb'z> bl,xeîw> hn<ëq' ‘@s,K,’b; yLiÛ t'ynI“q'-al{ (não

comprastes a mim com dinheiro a cana e gorduras). Cana faz referência a um

aroma extraído da mesma123.

Em Is 46,6: Wlqo+v.yI hn<åQ'B; @s,k,Þw> syKiêmi ‘bh'z" ~yliÛZ"h; (os que desperdiçam

ouro de sua bolsa e prata na cana pesam). Tudo indica que a cana faz referência ao

travessão da balança de pesar124. Neste sentido, pode estar de acordo com a

valorização do Servo para aquilo que não serve para mais nada. Um travessão de

uma balança que perdeu a sua função. Assim, o que não serve mais, o desprezado

é valorizado pelo Servo e sua íntima união com os que sofrem.

Após verificarmos essas citações bíblicas que fazem referência à cana,

poderemos dizer que a expressão: "cana a que é despedaçada não quebrará", tem

um sentido figurado. Trata-se de uma metáfora. Segundo Da Silva "cana quebrada e

pavio vacilante são símbolos de fraqueza"125. No contexto de exílio, são duas

imagens para dizer que o Servo vai recuperar a esperança, a "última que morre",

para refazer os elos entre o povo judeu, quer exilado na Babilônia, quer disperso

entre os povos. A ação do Servo é de solidariedade para com o fraco a fim de

estabelecer o direito.

121

HARRIS et alii, p. 1353. 122

Ibidem, p. 1353. 123

BÍBLIA. PORTUGUÊS. Tradução Ecumênica. São Paulo: Loyola, 1994. Cf nota (m), p. 673. 124

BÍBLIA. PORTUGUÊS. Bíblia de Jerusalém. São Paulo: Paulus, 2000. Cf. nota (q), p. 1437. 125

DA SILVA, 2006, p. 49.

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1.9.3.2. rABêv.yI al{å126 (não quebrará)

A raiz verbal rbv (quebrar) ocorre 144 vezes no Primeiro Testamento.

Segundo Harris "no grau qal, há 53 ocorrências e na maioria das vezes, Deus é o

sujeito do verbo (33 vezes), e aí se emprega o verbo para descrever a atividade de

julgar e castigar"127.

Vejamos algumas citações onde aparece este verbo. Em Lv 26,13 ~k,êL.[u

tjoåmo ‘rBov.a,w" (e quebrei a canga de vosso jugo). No contexto de escravidão no

Egito, YHWH é quem quebra o jugo. Quebrar com sentido de libertar.

Ainda outras citações lembrando o poder de YHWH no processo de

libertação: Em Is 14,5 ~y[i_v'r> hJeäm; hw"ßhy> rb:ïv' (quebrou YHWH o bastão dos

malvados). Em Jr 28,5 temos a seguinte afirmação: lb,(B' %l,m,î l[oß-ta, yTir>b;úv'

rmo=ale laeÞr"f.yI yheîl{a/ tAa±b'c. hw"ôhy> rm;úa'-hKo) (Assim diz YHWH dos exércitos, o Deus

Israel, para dizer: eu quebro o jugo do rei da Babilônia).

Em Ez 30,21 yTir>b"+v' ~yIr:ßc.mi-%l,m,( h[oïr>P; [;Ar±z>-ta, ~d"§a'-!B, (filho do homem

o braço do Faraó, rei do Egito, eu quebro). A raiz verbal rbv (quebrar) está

sempre relacionada com a força de YHWH e seu poder diante das forças humanas.

Como dissemos acima, a raiz verbal é mais utilizada sem o advérbio de

negação. Na maioria dos textos faz referência ao poder de YHWH.

No v.3a a raiz verbal vem acompanhada do advérbio de negação al{ï128 {å

(não). Encontramos o uso do advérbio de negação em dois versículos. Em Ex 12,46

temos a seguinte expressão: Ab*-WrB.v.ti al{ï ~c,[,Þw > (o osso não quebrarás). Aqui o

verbo qal imperfeito vem acompanhado do advérbio de negação. O contexto é do

126

Advérbio de negação + Verbo qal imperfeito terceira pessoa masculino singular. 127

HARRIS et alii, 1998, p. 1519. 128

Advérbio de negação.

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ritual da Páscoa. Tudo indica uma ordem a ser cumprida dentro do ritual da Ceia da

Páscoa. Podemos fazer um paralelo com a tarefa do Servo que obedece uma

ordem: não quebrar a cana a que é despedaçada. Segundo Westermann: "O Servo

não vai destruir o que já está a ponto de extinção"129. No contexto de exílio é

compreensível sua postura, tarefa e a sua missão. Encontramos em Is 42,3a rABêv.yI

al{å (não quebrará). Embora em contextos diferentes, esses dois versículos utilizam

a forma negativa para a raiz verbal "quebrar".

Em Is 61,1 bleê-yrEB.v.nIl. vboåx]l; (medicar coração quebrado). Expressão que

vai ao encontro de solidariedade e socorro ao coração quebrado dos que sofrem.

Vemos aqui a tarefa do Servo. Enfim, não quebrar significa valorizar a vida do

indefeso e fraco.

1.9.3.3. hh'Þke hT'îv.piW130 (e pavio vacilante)

O termo hT'îv.piW (e pavio) tem pouca ocorrência nos textos do Primeiro

Testamento. A primeira ocorrência do substantivo é no texto que estudamos Is 42,3.

O termo repete-se em Is 43,17 com a seguinte expressão: `Wb)k' hT'îv.PiK; Wkß[]D"

WmWqêy"-lB; ‘WbK.v.yI wD"Ûx.y: zWZ=[iw> lyIx:å sWsßw"-bk,r<( ayciîAMh; (aquele que faz sair carro e

cavalo com poder e rebaixados todos juntos para não se levantar ficando como

pavio apagado). Neste contexto, tudo indica que a força do carro e cavalo não

podem gerar a libertação. Estes serão apagados. Já o Servo resgata o pavio que

ainda fumega. O pequeno, o fraco e indefeso são valorizados pela atitude do Servo.

As duas metáforas no v.3 estão relacionadas. "haste e pavio aplicam-se com

maior propriedade às vítimas da Babilônia pelo fato de em todos os lugares

designarem um povo desprovido de força"131. Segundo Westermann:

129

WESTERMANN, 1977, p. 93. 130

Conjunção + substantivo + adjetivo feminino singular. 131

BÍBLIA. PORTUGUÊS. Tradução Ecumênica. São Paulo: Loyola, 1994. Cf nota (j), p. 670.

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Para os interessados, trazendo a justiça divina não é para significar a morte para aqueles que já estão sob a sentença de morte. O Servo faz a justiça de Deus prevalecer de tal forma que sua ação contradiz a dura lei do mundo, que diz que o que está quebrado e queima vagamente, inevitavelmente perece. Há a palavra do profeta de conforto que trouxe vida a Israel quando ele estava definhando. O trabalho do Servo tem um efeito semelhante sobre o resto do mundo132.

Pavio vacilante é uma expressão e uma metáfora para o que humanamente

está a ponto de se extinguir. No contexto de exílio, essa expressão ganha muita

força, pois o serviço do Servo é resgatar e valorizar o que está a ponto de morrer,

quer dizer, o próprio povo escravizado.

Uma citação que lembra ainda a perseverança, encontramos no seguinte

versículo: Ex 27,20: tl{ï[]h;l. rAa=M'l; tytiÞK' %z"± tyIz:ï !m,v,ä ^yl,øae Wx’q.yIw> laeªr"f.yI ynEåB.-ta,

ŸhW<åc;T. hT'úa;w> (e tu ordenarás aos filhos de Israel e providenciarão sempre óleo de

oliva puro para a luminária para que fique sempre acesa). Manter o pavio sempre

aceso. O servo não apagará o pavio vacilante. Isso denota a esperança no que está

para se apagar. Não deixará morrer o que está extinguindo-se.

1.9.3.4. hN"B<+k;y>133 al{ï (não extinguirá)

Esta raiz verbal hbk (apagar) ocorre 24 vezes no Primeiro Testamento.

Ocorre pela primeira vez em Lv 6,5 na seguinte expressão: hB,êk.ti al{å ‘AB-dq;WT)

x;BeÛz>Mih;-l[; vae’h'w> (e o fogo sobre o altar será aceso nele e não se apagará).

Em Is 42,3 o verbo hN"B<+k;y> (apagará) vem acompanhado do advérbio de

negação al{å (não). "Ou seja, sua brandura será tal que ele nem mesmo apagará o

pavio fumegante, isto é, não extinguirá os fracos e pobres"134.

132

WESTERMANN, 1977, p. 96. 133

Advérbio de negação + verbo piel perfeito terceira pessoa masculino singular. 134

HARRIS et alii, 1998, p. 699.

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A postura do servo e sua prática estão relacionadas com as suas atitudes.

Ele não quebra a cana despedaçada. Preserva a vida do fraco e indefeso. Ele não

apaga o pavio vacilante. Preserva aquela luz que aos poucos vai diminuindo,

preserva a vida e não dá uma sentença final. Ele acredita que o pequeno e fraco

merecem viver e serem respeitados na sua dignidade.

1.9.3.5. tm,Þa/w,135 (para verdade)

Em Is 39,8, temos a seguinte expressão: ym'(y"B. tm,Þa/w< ~Alïv' hy<±h.yI yKiî (pois

haverá paz e verdade, em meus dias).

Esse termo é aplicado à tarefa do Servo. "Cana a que é despedaçada não

quebrará e pavio vacilante não extinguirá". O termo que liga a atitude do Servo com

o direito que ele fará sair é esta preposição tm,Þa/w< (na verdade). "Esta palavra tem

sentido enfático de certeza e confiança, encontramo-na em várias categorias de

contextos, dos quais todos estão relacionados direta ou indiretamente com Deus136.

Por exemplo: Ex 34,6 `tm,(a/w< ds,x,î-br:w> ~yIP:ßa; %r<a,î !WN=x;w> ~Wxßr: laeî hw"ëhy> (YHWH o

Deus misericordioso e bondoso, também cheio de lealdade e verdade).

Um termo que é aplicado a Deus, é tomado pelo Servo neste v.3, que fará

sair o direito em veracidade. Ainda, podemos conferir que se trata de um termo

aplicado às palavras de Deus. Como exemplo, podemos citar o Sl 119.142 `tm,(a/

^ït.r"Atw>) ~l'_A[l. qd<c,ä ^åt.q'd>ci (tua justiça é jutiça para sempre e tua lei verdade).

Na prática da solidariedade com o fraco, simbolizado na cana despedaçada

e no pavio vacilante, o Servo fará sair o direito. Dêutero-Isaías utiliza esse termo

tm,Þ.a/l, (para verdade) entre as duas atitudes do Servo, como já foi mencionado, um

termo que é aplicado direta ou indiretamente a Deus. Isso nos leva a pensar que as

135

Conjunção + substantivo feminino singular. 136

HARRIS et alii, 1998, p. 87.

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atitudes do Servo são "na verdade" as mesmas atitudes de Deus-YHWH, pois já

mencionamos na apresentação do Servo que este está pleno do espírito de YHWH.

Esse termo (para verdade) é o resultado da ação do Servo, pois com suas

atitudes e também com sua solidariedade aos fracos e abatidos, ele faz o direito sair

às nações.

1.9.3.6. jP'(v.mi ayciîAy137 (fará sair direito)

Verifiquemos essa expressão verbal que está no hifil imperfeito 3ª pessoa do

singular. Este verbo já foi analisado no v.1, queremos acrescentar que no v.3 ela

encerra o versículo, antes da preposição tm,Þa/l, (na verdade). Tudo leva a crer que o

serviço e a tarefa do Servo é fazer sair o direito (jP'(v.mi). Segundo Westermann,"o

significado básico da palavra é "justiça" ou "juízo no sentido de julgamento ou

discernimento138. Levando em consideração o discurso de julgamento que é muito

frequente no Dêutero–Isaías uma vez que só o Senhor é Deus. "Isso pode muito

bem ser o significado de direito em 42,1-4"139. "E a probabilidade é aumentada, diz

Westermann, tomando o discurso do julgamento final (45,20-25). Nela, os

sobreviventes das nações "são convidados a participar na salvação do YHWH (cf.

49,6 )140. Sendo assim, diz Westermann:

A tarefa do Servo, de acordo com 42.1-4, seria trazer este discernimento aos gentios. Sobre sua maneira de fazer isso, vv. 2-4 dá apenas uma dica velada. E este é certamente apenas um aspecto da sua tarefa: o mais abrangente deve ser indicado nas canções do servo, que se seguem. Devemos antecipar aqui e dizer que estes não emprestam apoio à ideia de que o servo era para ir como missionário rumo aos gentios. (O principal representante dessa visão é Volz, e ele fez um forte argumento para isso). Em vez disso, há outra possibilidade, que por causa de sua via dolorosa entre sua própria nação, o servo era para trazer a mispat (direito) de Deus para os gentios de forma indireta , tornando-se a luz deles (Gentios)141.

137

Verbo hifil imperfeito terceira pessoa masculino singular + substantivo masculino singular. 138

WESTERMANN, 1977, p. 95. 139

Ibidem, p. 95. 140

Ibidem, p. 95. 141

Ibidem, p. 95.

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Segundo Da Silva, é importante notar que a palavra gentios foi usada de

forma pejorativa. "O termo pode ser entendido como 'nações'. Isto é, todos os povos

estrangeiros, em sentido universal. E cita Croatto, que propõe que 'nações', assim

como 'ilhas', ou 'extremo da terra' refere-se aos povos judeus dispersos no império

neobabilônico"142.

Assim, tudo indica que a tarefa do Servo de fazer sair o direito, trata-se em

primeiro lugar do direito de YHWH.

Em Is 51,4 ~yMiÞ[; rAaðl. yjiêP'v.miW aceête yTiäaime ‘hr"At yKi (pois uma lei de

mim farei sair e o meu direito para luz aos povos), este versículo é fundamental na

compreensão da lei e do direito, pois o direito sairá do próprio YHWH. E segundo

Westermann:

Onde a mesma coisa é dita não do Servo, mas de Deus: o ensino sairá de mim, e minha verdade de uma luz para os gentios. Também 51.5b, os climas mais distantes espere por mim, e por meu braço esperam. Os gentios já estão esperando e olhando para a justiça divina, que o Servo levara adiante. Isso não envolve a nossa ideia de "buscar aquele Deus, e ansear por ele" (Volz). O verbo implica a expectativa de intenção de libertação ou ajuda. O sentido é, portanto, que entre os gentios o evangelho do Servo encontra uma expectativa semelhante ao que completou a mensagem de Deutero-Isaías para Isreael, no exílio143.

O direito é entendido como um projeto de libertação que o Servo faz sair em

direção aos povos e nações. Esse direito vem do próprio YHWH como já

mencionamos em Is 51,4. Trata-se, assim, de um convite universal feito pelo próprio

YHWH e quem tem o Servo como seu intermediário.

1.9.4. Análise dos termos significativos do quarto versículo Is 42,4

Os termos significativos que analisaremos neste versículo são: o verbo

"desanimar" seguido do advérbio de negação "não", o verbo "despedaçar" seguindo

142

DA SILVA, 2006, p. 48. 143

WESTERMANN, 1977, p. 96.

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do advérbio de negação "não", o verbo "pôr", os substantivos "direito", "instrução" e

"ilhas" e o verbo "esperar".

1.9.4.1. ‘hh,k.yI al{Ü144 { (não desanimará)

Este verbo ocorre nove vezes no Primeiro Testamento. No Dêutero-Isaías

aparece somente em Is 42,4a. E diz respeito a uma postura do Servo que diante da

realidade de sofrimento não desanimará.

A raiz verbal hhk (ser ou estar sombrio, escurecido, reprimido)145. Antes da

raiz verbal no v.4, temos o advérbio de negação al{ï (não). Isto é, o Servo continuará

firme na sua tarefa e na sua missão. Não desanimará diante da sua missão.

A primeira ocorrência da raiz verbal hhk (estar apagado) ocorre em Gn

wyn"ßy[e !'yh,îk.Tiw: qx'êc.yI !qEåz"-yKi( (pois enfraquecera Isaac e seus olhos apagavam-se).

Outra citação encontramos em Dt 34,7 fazendo referência a Moisés, utiliza-se

também o advérbio de negação para justificar que sua vista e sua vitalidade não os

tinha abandonado. Vejamos: `hxo)le sn"ï-al{w> Anày[e ht'îh]k'-al{) At+moB. hn"ßv' ~yrI±f.[,w>

ha'óme-!B, hv,ªmoW (e Moisés tinha cento e vinte anos quando morreu. Não

enfraquecera sua vista. E não tinha abandonado sua vitalidade). Nestas duas

citações, a raiz verbal é utilizada dando ênfase a perda da visão pela idade.

A raiz verbal hhk (apagar) no versículo que analisamos, vem seguido do

advérbio de negação (não), e está relacionado a uma atitude do Servo. Este não se

apagará, não desanimará.

Em Zc 11,17 há uma crítica ao pastor que abandona o seu rebanho e

também podemos perceber a raiz verbal hhk (estar apagado) : !aCoêh; ybiäz>[o ‘lylia/h'¥

y[iÛro yAhå (ai daquele que pastoreia insuficientemente e abandona o rebanho... hh,(k.ti 144

Advérbio de negação + verbo qal imperfeito terceira pessoa masculino singular. 145

HARRIS et alii, 1998, p. 703.

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hhoïK' Anàymiy> !y[eîw> (e seu olho direito apague, sim apague). Percebemos aí uma crítica

e uma sentença do profeta àquele que não cuida do seu povo e o abandona. Ao

contrário, o Servo é aquele que pastoreia e cuida do rebanho. Mesmo na fraqueza,

não se tornará inexpressivo.

1.9.4.2. #Wrêy" al{åw>146 (e não despedaçará)

Esta raiz verbal #cr (despedaçar) ocorre 20 vezes no Primeiro Testamento.

Neste v.4 em particular, a raiz verbal parece indicar que se trata de um modo de agir

do Servo para o serviço do direito. E parece não indicar uma característica própria

do Servo, ou seja, ele não se despedaçará a si próprio, conforme indica as

traduções da TEB147 e Bíblia de Jerusalém148. Tudo indica que a raiz verbal neste

v.4 está em sintonia com o v.3, onde o Servo não despedaçará aqueles que estão a

ponto de serem mortos. Sendo assim, parece indicar mais uma atitude do que uma

força interna que vem dele mesmo. É na solidariedade com os fracos que ele não os

despedaçará.

1.9.4.3. jP'_v.mi #r<a'ÞB' ~yfiîy"-d[;149 (até pôr na terra direito)

A raiz verbal ~yf (pôr) tem muitas ocorrências no Primeiro Testamento. No

livro de Isaías ocorre 54 vezes. E no Dêutero-Isaías 27 vezes.

A raiz verbal (pôr) vem acompanhada de um advérbio de negação em Is

47,6c daom. %LEß[u T.d>B;îk.hi !qe§z"-l[; ~ymiêx]r: ‘~h,l' T.m.f;Û-al{ (não pusestes para eles

terna compaixão, para o velho colocaste pesado jugo com excesso). Tudo indica

que o verbo conclui uma ação. O Servo não descansará até pôr na terra o direito. Na

146

Conjunção + advérbio de negação + verbo qal imperfeito terceira pessoa masculino singular. 147

Não se vergará. 148

Nem desacorçoará. 149

Conjunção + preposição + verbo qal imperfeito terceira pessoa masculino singular + preposição + substantivo masculino singular + substantivo masculino plural

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esperança e na perseverança, ele levará adiante a sua missão. Em Is 47,6c a raiz

verbal (pôr) indica também uma atitude contrária e uma advertência à Babilônia que

não teve compaixão para com o povo. Em Is 51,16 a raiz verbal ~yf (pôr) está no

início do v.16 e vem conjugado na primeira pessoa no singular (YHWH). ^ypiêB.

‘yr:b'D> ~yfiÛa'w" (eu pus as minhas palavras na tua boca). Isso denota que a palavra

de YHWH será anunciada para toda terra através de seu Servo. Segundo

Westermann: "a tarefa do Servo conforme estabelecido no vv.2-4 aponta talvez para

alguém que faz a mediação de boca em boca (isto vem à tona claramente mais

tarde, em 50.4f.)150(...) trabalho do Servo tem um efeito semelhante sobre o resto do

mundo"151.

O anúncio da Palavra de YHWH vem pela seguinte citação ~ydIêWMli !Avål.

‘yli !t;n"Ü hAIªhy> yn"ådoa ] (o senhor YHWH me deu língua de discípulos). E como já

analisamos, o direito vem de YHWH conforme Is 51,4 yjiêP'v.miW aceête yTiäaime ‘hr"At yKiÛ

(pois lei de mim sairá e meu direito). Sendo assim, o serviço incansável do Servo é

fazer sair o direito (de YHWH) às nações e povos.

1.9.4.4. ~yYIïai Atßr"Atl.W152 (e na instrução dele, ilhas)

Este termo hr'AT (lei, instrução) ocorre aproximadamente 215 vezes no

Primeiro Testamento. É Importante notar que o termo não ocorre muitas vezes nos

profetas. E no Dêutero-Isaías ocorre cinco vezes. O termo parece indicar instruções,

ou seja, relacionado com Palavra de Deus. Parece indicar também que a

preocupação não era tanto com a lei num sentido legal. Isto pode ser verificado em

Is 1,10 ~do+s. ynEåyciq. hw"ßhy>-rb;d> W[ïm.vi (ouçam a Palavra de YHWH chefes de

Sodoma). `hr"(mo[] ~[;î WnyheÞl{a/ tr:îAT WnyzI±a]h; (Ouçam a instrução de nosso Deus

povo de Gomorra). Em Is 30,9 `hw")hy> tr:îAT [;Amßv. Wbïa'-al{) ~ynI¨B' ~yvi_x'K, ~ynIßB' aWhê

150

WESTERMANN, 1977, p. 97. 151

Ibidem, p. 96. 152

Substantivo singular feminino + sufixo na terceira pessoa singular masculino + substantivo plural.

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‘yrIm. ~[;Û yKi (pois povo revoltado, filhos enganosos e não dispostos a ouvirem a

instrução de YHWH). A partir dessas citações acima, poderemos dizer que trata-se

de instrução como norma que está ligada ao que vem de Deus, de sua palavra

como orientação.

Em Is 42,21 `ryDI(a.y:w> hr"ÞAT lyDIîg>y: Aq+d>ci ![;m;äl. #peÞx' hw"ïhy> (YHWH se agrada

para que a justiça dele, engradece lei e a faz gloriosa). Com isso, tudo indica que a

justiça vem do ser de YHWH e sua lei ou instrução é gloriosa.

Com esses exemplos, há indícios de que a Palavra de YHWH é a fonte da

instrução e que isso vem da própria justiça que é inerente a ele, tudo indica que

YHWH é justiça e direito. Assim, poderemos conceber a sua identidade da essência

de YHWH vem o direito. E o direito é promover a vida em todas as suas dimensões.

O Servo está também imbuído desse mesmo valor e verdade.

Podemos dizer que o termo é enigmático, afinal, trata-se da instrução que

vem de YHWH ou a instrução do Servo que as ilhas esperão? Aqui parece indicar

que a instrução é de YHWH e o portador dessa instrução é o Servo.

As ilhas esperarão as instruções de YHWH ou do Servo que fala pela boca

divina153. Segundo Da Silva: "Na eleição do servo está claro a opção divina pelo

mais fraco, no qual encontra prazer e sobre o qual coloca seu espírito" 154.

Já, o termo “ilhas” aparece pela primeira vez em Is 11,11 ~Y")h; yYEßaimeW (ilhas

do mar): "as regiões costeiras e as ilhas do Mediterrâneo, onde muitos judeus foram

vendidos como escravos, cf. Joel 4,6"155. "Aqui, menciona que os filhos e habitantes

de Judá e Jerusalém foram vendidos aos filhos de Lavan156. "Originariamente era a

Jônia; por extensão veio a designar a Grécia". Então, com essa informação tudo

indica que havia escravos judeus nessas regiões. E que o Servo é chamado a ser

um porta-voz de YHWH também para outras regiões. Não se trata da região

153

DA SILVA, 2006, p. 56. 154

Ibidem, p. 56. 155

BÍBLIA. PORTUGUÊS. Tradução Ecumênica. São Paulo: Loyola, 1994. Cf nota (r), p. 624. 156

Ibidem, cf. nota (A), p. 902.

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geográfica que espera pela instrução, mas daqueles que são oprimidos nessas ilhas

e que aguardarão pela chegada do direito.

1.9.4.5. Wlyxe(y:y>157 (esperarão)

Esta raiz verbal lxy (esperar) tem maior ocorrência nos salmos,

principalmente no salmo 119. Em Isaías, temos duas vezes: Is 42,4 e Is 51,5. Não

aparece no Pentatêuco. De modo geral, tem pouca ocorrência nos profetas. E, no

total, 28 vezes no Primeiro Testamento.

A raiz verbal tem a ideia de confiar, esperar com confiança158. Esperança,

segundo Harris159, está relacionada com a fé. O sentido de expectativa pode ser

positivo, ou seja, de aguardar que o futuro seja bom.

Em Is 51,5 `!Wl)xey:y> y[iÞroz>-la,w> WWëq;y> ~yYIåai ‘yl;ae WjPo+v.yI ~yMiä[; (povos julgarão

para mim e todas as ilhas nos meus braços esperarão). É a espera confiante em

YHWH. O mesmo verbo é utilizado em Is 42,4. Portanto, para o Dêutero-Isaías, a

esperança é um tema fundamental, pois nela encontra-se toda a expectativa de um

futuro melhor. Ainda em Ez 13, 6 `rb")D" ~YEïq;l. Wlßx]yI)w> (E esperarão que ele confirme

a palavra). O verbo é a mesmo utilizado em Is 42,4. Trata-se de uma esperança

confiante na realização de algo bom. Assim, as ilhas (habitantes das ilhas)

aguardarão o direito que o Servo fará sair. O direito que é a essência do próprio

YHWH.

No Sl 31,25 `hw")hyl; ~yliªx]y:m.h;÷-lK' ~k,_b.b;l. #meäa]y:w> Wqz>xiâ (sejam fortes vos

todos que esperais em YHWH). Temos neste versículo, o sentido de esperar em

YHWH. Da mesma maneira, há um convite às nações de confiar e esperar na prática

solidária do Servo. E o Sl 71,14 reforça essa mesma ideia de confiança lxe_y:a] dymiäT'

157

Verbo piel imperfeito terceira pessoa masculino singular. 158

HARRIS et alii, 1998, p. 610. 159

Ibidem, p. 610.

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ynIa]w: (eu hei de sempre esperar). Tudo indica que através dessa espera confiante o

servo desempenhe o papel de messias.

O Sl 119,49 `ynIT")l.x;yI) rv<åa] l[;÷ª ^D<+b.[;l. rb"ïD"-rkoz> (lembra da palavra do

vosso Servo sobre quem me fizeste esperar). Parece indicar o mesmo contexto de Is

42,4. Uma espera confiante na prática do Servo.

Dessa maneira, a raiz verbal "esperar" quer indicar uma esperança na

instrução dele, do Servo. Algo de novo irá acontecer para o bem das nações.

1.9.5. Análise dos termos significativos do quinto versículo Is 42,5

Os termos que merecem análise e são fundamentais neste versículo, a

expressão: "assim disse o Deus YHWH", o verbo "o que cria", os substantivos: "os

céus e a terra", a expressão: "o que dá alento para o povo sobre ela e espírito para

os que andam nela".

1.9.5.1. hw"©hy> Ÿlaeäh') rm;úa'-hKo (assim disse o Deus YHWH)

Segundo Westermann:

Há um consenso geral hoje de que Is 42,5-9 forma uma unidade. Mas os críticos ainda estão extremamente divididos quanto ao significado da passagem, é uma das perícopes do livro que até agora ninguém realmente tem conseguido explicar. O que constitui a dificuldade é o fato de que as ligações não são claras . Só uma coisa é clara - o orador é o Senhor/YHWH160.

Sendo assim, temos uma nova unidade que tem início no v.5 com a fala de

YHWH.

160

WESTERMANN, 1977, p. 98.

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O v.5 abre com a fórmula do mensageiro "assim disse o Deus YHWH". E

prossegue com a apresentação do Deus, através de quatro verbos, originalmente

em particípio masculino singular. Os dois primeiros se referem à criação do mundo,

céus e terra; os dois seguintes às criaturas humanas que caminham sobre a terra161.

Segundo Steinmann:

No v.5 YHWH anuncia sua onipotência criadora. Quando um príncipe promulgava um edito ou uma lei, ele começava por se nomear e por enumerar seus títulos, a fim de justificar seu direito de assumir a decisão. YHWH é todo poderoso. Pode, então, designar quem ele quer162.

1.9.5.1.1. rm;úa'-hKo163 (assim disse)

Queremos destacar que o v.5 tem início com o Verbo (dizer), isso reforça a

atividade de YHWH como criador.

A raiz verbal rma (dizer) ocorre 160 vezes no livro de Isaías. No Dêutero-

Isaías ocorre 64 vezes. Vejamos algumas citações. Em Is 43,1 bqoê[]y: ^åa]r:Bo ‘hw"hy>

rm:Üa'-hKo) hT'ú[;w> (e agora assim disse YHWH o que criou tu Jacó). lae_r"f.yI ^ßr>c,yOw> (e

o que deu forma a tu Israel). Percebemos neste versículo que o verbo está no qal

perfeito terceira pessoa masculina singular "disse". Isto revela uma palavra dita. O

verbo está da mesma maneira em Is 42,5, YHWH disse. Em seguida, temos dois

verbos no particípio. O primeiro verbo aparece no qal particípio "o que cria",

exatamente da mesma forma que em Is 42,5 arEÛAB (o que cria). O sufixo que

poderemos perceber é que neste versículo refere-se a Jacó, segunda pessoa do

singular. E, em Is 42,5 refere-se aos céus. Da mesma maneira, a segunda

expressão verbal "o que dá forma" também está no qal particípio. Isso revela uma

ação contínua e o agente dessa criação é YHWH. O emprego do qal particípio

reforça a ação do sujeito na frase. Somente ele é capaz de tal ação.

161

DA SILVA, 2006, p. 57. 162

STEINMANN, 1976, p. 128. 163

Advérbio + verbo qal perfeito 3ª pessoa masc. singular.

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No Dêutero-Isaías, capítulo 40,1 a raiz verbal "dizer" aparece pela primeira

vez. Vejamos. Is 40,1 temos os três primeiros verbos na seguinte expressão:

~k,(yhel{a/ rm:ßayO yMi_[; Wmßx]n: Wmïx]n : (confortem, confortem meu povo dirá nosso Deus).

O versículo começa com dois verbos que se repetem com intensidade num

imperativo do piel. Um verbo na forma piel segundo Mendes, apresenta uma ação

intensificada, enérgica, repetida164. Em seguida, temos o verbo na forma do qal

imperfeito "dizer". Nota-se que o verbo está no imperfeito "dirá". Os demais verbos

estão conjugados na forma do perfeito, como uma ação definida, no passado. Por

exemplo: "ele disse".

Um grupo é convidado por Deus para um serviço, e isso é feito com muita

insistência. Isso está evidente na repetição do verbo (duas vezes) no plural, no piel e

no imperativo. Trata-se de uma ordem. Quem diz o que deseja é o próprio Deus, é a

sua palavra que pede esse serviço. Como o verbo está conjugado no plural

"confortem", tudo indica ser um convite para um grupo, ou comunidade. O povo de

Deus deve ser confortado. Então, uma comunidade é chamada a confortar outra

comunidade, um povo é chamado a confortar outro povo. Com isso, parece indicar

que a comunidade dos exilados tem uma missão de confortar todos os que estão

desanimados. Trata-se, portanto da fala de Deus. Ele pede esse serviço.

"Confortem, confortem meu povo dirá nosso Deus".

Em Is 40,6 ar"_q.a, hm'ä rm:ßa'w> ar"êq. rmEåao lAq (voz que diz: proclama. E

disse: o que proclamarei). O primeiro verbo está no particípio "aquele que diz". E a

segundo verbo está no perfeito "e disse". Temos aqui quatro verbos relacionadados

com a atitude de proclamar, falar, dizer. Tomaremos agora alguns verbos os quais

analiseremos. O primeiro verbo no qal particípio "que diz" faz referência à voz de

alguém que pede algo. Esse alguém está presente no v.1 "dirá vosso Deus". E, em

seguida, temos o verbo no imperativo "proclama". Trata-se de um pedido, de uma

ordem, de um mandato que vem de Deus. E surge a pergunta daquele que ainda

desconhece a sua missão: "o que proclamarei?". Este verbo aparece no qal

imperfeito e com uma projeção de futuro.

164

MENDES, Paulo. Noções do Hebraico Bíblico. São Paulo: Vida Nova, 1981, p. 155.

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Em Is 40, 8 temos a seguinte expressão: `~l'(A[l. ~Wqïy" WnyheÞl{a/-rb;d>W (e a

palavra do nosso Deus permanecerá para sempre). A palavra de Deus

"permanecerá". Este verbo está no qal imperfeito. Já havíamos mencionado o verbo

proclamar que também se encontrara no qal imperfeito. "O que proclamarei?".

Proclamar a Palavra, eis a missão do Servo de YHWH. Isto é uma ordem, um

pedido. Essa Palavra permanecerá para sempre. Então, o dizer de Deus e a sua

Palavra estão intimamente relacionados.

A fórmula do mensageiro ‘hw"hy> rm:Üa'-hKo) hT'ú[;w > (e agora assim disse

YHWH), é encontrada também em Is 43,1. Temos ainda a mesma forma de

expressão nas seguintes passagens: Is 43,6 !ApC'l; rm:Üao (direi ao norte), Is 43,14

~k,Þl.a;GO hw"±hy> rm:ôa'-hKo) (assim disse YHWH o que resgata vocês), Is 43,16 %r<D"_

~Y"ßB; !tEïANh; hw"ëhy> rm:åa' hKo…( assim disse YHWH o que dá ao mar um caminho), Is

44,2 ^f<±[o hw"ïhy> rm;’a'-hKo (assim disse YHWH o que forma vocês), Is 44, 6 Alàa]gOw>

lae²r"f.yI-%l,m,( hw"ôhy> rm;’a'-hKo) (assim disse YHWH, o rei de Israel, e o que o resgata),

Is 44,24 ^l,êa]GO ‘hw"hy> rm:Üa'-hKo) (assim disse YHWH, o que resgata você), Is 45,1

vr<kål. éAxyvim.li éhw"hy> rm:åa'-hKo (assim disse YHWH ao seu ungido, Ciro).

Veremos, a seguir, mais uma sequência de citações usando a mesma

fórmula do mensageiro, como em Is 45, 18 ~yIm;øV'h; arE’AB hw"hy>û-rm;a'( hkoå yKiä

(agora assim disse YHWH o que cria os céus), Is 49,5 Alê db,[,äl. ‘!j,B,’mi yrIÜc.yO hw"©hy>

rm:åa' ŸhT'ä[;w> (e agora disse YHWH o que cria você desde o útero para Servo seu), Is

51,22 AMê[; byrIåy" ‘%yIh;’l{awE hw"©hy> %yIn:ådoa] rm;úa'-hKo) (assim disse vosso Deus YHWH

lutará a favor do seu povo), Is 52,3 ~T,_r>K;m.nI ~N"ßxi hw"ëhy> rm:åa' ‘hko-yKi ( (agora assim

disse YHWH fostes vendidos). `Wlae(G"Ti @s,k,Þb. al{ïw> (e sem dinheiro sereis

resgatados), Is 54,10 `hw")hy> %mEßx]r:m. rm:ïa' (disse o que ama você, YHWH).

Podemos perceber que nos versículos acima, a fórmula de mensageiro vem

seguido de um verbo no particípio, isto reforça o sujeito da ação que é o próprio

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YHWH e sua capacidade. "Aquele que", ou "o que". Repetidas vezes, temos a

expressão verbal no particípio LaeGO (o que resgata). Desta maneira, aquele que diz é

também aquele que realiza a ação. Palavra e ação estão em profunda união.

A expressão rm;úa'-hKo (assim disse) é fundamental nos textos de Dêutero-

Isaías. Trata-se de uma fórmula do mensageiro. E, como percebemos, está

intimamente ligado com a Palavra de YHWH, que é um Deus que se comunica e

expressa a sua vontade.

1.9.5.1.2. laeäh'165 (O Deus)

Este termo ocorre 233 vezes no Primeiro Testamento. No livro de Isaías

aparece 23 vezes. E no Dêutero-Isaías, 15 vezes.

Em Is 9,5 aparece pela primeira vez o termo lae (Deus). rABêGI lae (Deus

forte)166. No Dêutero-Isaías o termo aparece pela primeira vez no texto que

estudamos Is 42,5.

Em Is 45,15 temos `[:yvi(Am laeÞr"f.yI yheîl{a/ rTE+T;s.mi laeä hT'Þa; !ke§a' (Com

certeza tu és Deus que se faz esconder. Deus de Israel aquele que salva). A raiz

verbal rts (esconder) está no hithpael particípio. Deus se faz esconder, porém está

presente. E a segunda raiz verbal está no hifil particípio "o que salva". Ele é o Deus

salvador.

Em Is 45,20 [:yvi(Ay al{ï , laeÞ-la, (deus não salva). Aqui faz referência aos

deuses utilizando duas vezes o termo laeÞ-la, para reforçar a identidade desses

deuses.

165

Artigo + substantivo comum masculino singular. 166

BÍBLIA. PORTUGUÊS. Tradução Ecumênica. São Paulo: Loyola, 1994. Cf. nota (d): este termo "Deus forte" é frequentemente dado ao próprio Deus. Também o termo é aplicado ao rei.

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Em Is 45,22 `dA[) !yaeîw> laeÞ-ynIa] yKiî #r<a'_-ysep.a;-lK' W[ßv.W"hiw> yl;îae-WnP. (Voltem

para mim toda a terra e sereis salvos, pois eu Deus e nenhum outro ao lado de

mim). Esta expressão "Eu-Deus" tem por objetivo reforçar a unicidade de Deus. Is

46,9 ~yhiÞl{a/ dA[ê !yaeäw> ‘lae ykiînOa' yKiä (pois eu Deus e não outro Deus). O termo

reforça a unicidade de Deus.

Em seguida, temos o termo laeh' (o Deus). Esse termo aparece pela

primeira vez em Is 5,16 vAdêQ'h; ‘laeh'w> jP'_v.MiB; tAaßb'c. hw"ïhy> hB;²g>YIw : (e se elevará

YHWH de todo poder em direito e o Deus santo) hq")d"c.Bi vD"Þq.nI (e o que se revelará

em justiça). Importante notar que o termo vem acompanhado do artigo "o". Segundo

Bonnard: "El, indica princípio e poder... a Bíblia emprega El para os seres

superiores, e, sobretudo para o Deus único"167. Então, lae (Deus) é uma designação

ao verdadeiro Deus. Em Is 42,5, segundo Bonnard, utilizando o artigo "o" refere-se

a uma definição para Deus: "Ele é o Deus YHWH". E, assim, ele está situado na sua

singularidade absoluta. Importante notar que o verdadeiro Deus vem acompanhado

de três substantivos tAaßb'c. (dos exércitos) jP'_v.MiB; (em direito) hq")d"c.Bi (em

justiça). Portanto, podemos afirmar que a essência do Deus Verdadeiro é o direito e

a justiça.

1.9.5.1.3. hw"ßhy>168 (YHWH)

Esse termo, ou seja, o nome de Deus ocorre 6.828 vezes169 em todo

Primeiro Testamento. No livro de Isaías temos 450 ocorrências e no Dêutero Isaías

126 ocorrências. Segundo Jenni e Westermann o nome de Deus aparece na forma

completa do tetragrama YHWH nos textos extrabíblicos anteriores ao exílio (numa

inscrição de Mesa, Kai N. 181, linha 18 "e tomei dali objetos (?) de YHWH e os levei

ante Camos", do sec. IX)170. E, ainda, os autores afirmam não se poder estabelecer

167

BONNARD, 1972, p. 499. 168

Substantivo próprio. 169

JENNI; WESTERMANN, 1978, p. 971. 170

Ibidem, p. 967.

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uma etimologia segura do nome divino. Até mesmo pode-se perguntar se existiu, e

em que medida algum significado do nome que haja sido conhecido pelos javistas,

seja o significado original, numa época pré-israelita, seja um significado secundário,

fruto de adaptação ao culto javista171. Por isso, tem um valor muito limitado as

conclusões sobre o ser "originário" de YHWH tiradas do significado da palavra.

Unicamente a passagem de Ex 3,14 hy<+h.a,( rv<åa] hy<ßh.a ,(( (eu sou aquele que sou) e

dentro de uma interpretação teológica relativamente complicada, dá-se o significado

do nome YHWH, etimologicamente é correto, porém não somente para um grupo

determinado de israelita172. O modo qal do verbo hy"h' ser, "Ele é", segundo Jenni e

Westermann indica uma explicação etimológica mais aceitável do nome de YHWH.

E também se aproxima muito do texto de Ex 3,14173. Ainda assim, deve-se descartar

o modo passivo do verbo e pensar em um modo de ser dinâmico, segundo os

autores174.

A origem do nome de Deus está ligada à origem histórica da fé javista que

tem ligações com o Sinai, com Moisés e com os madianitas. E tudo indica, segundo

os autores, que os israelitas tenham recebido dos madianitas e dos quenitas a fé

javista175. Segundo Von Rad "em Javista e Eloista a fusão dessas duas épocas da

história da salvação, a dos pais e a da plena revelação de Javé176, é bem mais

completa"177. Continuando o seu pensamento Von Rad diz que "Ex 3 quer comunicar

a novidade da revelação de Javé, a proclamação do seu nome divino e, por outro

lado, mostrar como essa revelação de Javé prende-se estreitamente à história dos

pais"178. Segundo Von Rad:

Que não há nada tão alheio à etimologia do nome de Javé quanto a uma pretensa definição da essência dele, no sentido de uma afirmação filosófica sobre seu ser, de uma alusão à sua qualidade absoluta, ou qualquer fórmula desse gênero179.

171

JENNI; WESTERMANN, 1978, p. 969 172

Ibidem, p. 969. 173

Ibidem, p. 969. 174

Ibidem, p. 970. 175

Ibidem, p. 972. 176

Foi traduzido para o português o nome de Deus por "Javé" na Obra de Von Rad. 177

VON RAD, Gerhard. Teologia do Antigo Testamento I. São Paulo: Aste, 1973, p. 186. 178

VON RAD, 1973, p. 186. 179

Ibidem, pp. 186-187.

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Esse tipo de preocupação, diz ele, é alheio ao Antigo Testamento. O

contexto narrativo mostra logo que Javé tem uma comunicação a fazer, não a

respeito do que ele é, mas de seu propósito para com Israel180.

Na mentalidade antiga, o nome não era um simples som, um sopro, mas

havia entre ele e seu portador uma íntima relação substancial181.

Para os antigos, era certo que a vida dos homens estava rodeada e determinada pelos poderes divinos obscuros e esta certeza só se tornava reconfortante a partir do momento em que o homem passava, a saber, qual era a divindade que o rodeava182.

Então, era importante conhecer o nome da divindade para poder invocá-lo e

pedir intercessão. Esse nome Javé participa diretamente da santidade do próprio

Javé183. Pertence ao domínio do culto e pode até ser considerado como o coração

do culto do antigo Israel184.

A entrega de Israel a uma divindade tão santa colocou-o diante de uma enorme tarefa que consistia principalmente em resistir às tentações que ela provocava. E ainda todo juramento verdadeiro era feito mediante a invocação do nome de Javé185.

Houve épocas na história do povo de Israel em que este teve que viver em

diferentes realidades culturais é que mais ameaçaram a unicidade de YHWH. Por

isso, no tempo do exílio, o Dêutero-Isaías insiste na unicidade de YHWH. Também o

Deuteronômio suscitou um intenso programa de concentração sobre a pura fé em

YHWH. Segundo Von Rad:

Este nome nunca se tornou para Israel um mistério a que só tinham acesso alguns iniciados. Pelo contrário, todos em Israel usavam-no livremente e, desde que houve uma ideia mais clara do que tinha de particular a adoração a Javé, não foi preciso mais esconder este nome às nações, mas até Israel se sentiu responsável em torná-lo conhecido186.

180

VON RAD, 1973, p. 187. 181

Ibidem, p. 188. 182

Ibidem, p. 188. 183

Ibidem, p. 188. 184

Ibidem, p. 188. 185

Ibidem, p. 188. 186

Ibidem, p. 190.

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Enquanto Marduk tinha cinquenta nomes, os quais eram celebrados nos

hinos e pela vitória de Tiamat187, Javé só possui um nome que é conhecido de todo

povo. A maior glória é atribuída ao nome de Javé188.

No texto do Dêutero-Isaías, a expressão hw"hy> ynIÜa] (eu YHWH) aparece em

muitos versículos e sempre vem acompanhado de um verbo no particípio para

indicar uma ação que ele realiza. Da mesma forma, a expressão hAIªhy> yn"ådoa]

(Senhor YHWH). E também a expressão: hw")hy>-~aun> (oráculo de YHWH).

No Dêutero-Isaías, YHWH aparece pela primeira vez em Is 40 `h'yt,(aJox;-

lk'B. ~yIl:ßp.Ki hw"ëhy> dY:åmi hx'q.l' yKiÛ (pois recebeu da mão de YHWH o dobro por

suas faltas). Neste sentido, YHWH é quem perdoa as faltas do seu povo. Is 40, 3

hw"+hy> %r<D< (caminho para YHWH). No sentido de limpar uma passagem para YHWH.

Em Is 40,7 hw"ßhy> x:Wrï yKi (pois o espírito de YHWH). Com muita frequência nos

textos do Dêutero-Isaías encontramos esta expressão, o que quer indicar o ser do

próprio YHWH. Em Is 40, 10 aAbêy" qz"åx'B. ‘hwIhy> yn"Üdoa] hNE“hi (eis o Senhor Deus com

poder ele vem). h[,roK. (como aquele que pastoreia), Is 40,11 Aræd>[, ‘h[,roK . (o que

cuida). O verbo qal no particípio indica uma ação do próprio YHWH. Em muitas

citações, no Dêutero-Isaías, temos o verbo no particípio que é entendido como

aquele que cuida do seu povo.

Em Is 40,28 #r<a'êh' tAcåq. ‘arEAB ‘hw"hy> Ÿ~l'ÛA[ yhe’l{a/ (Deus de sempre

YHWH aquele que cria as extremidades da terra). Aqui temos o advérbio indicando a

eternidade de YHWH e o verbo no qal particípio "aquele que cria". É a primeira vez

que aparece esse verbo no Dêutero-Isaías.

Nos seguintes versículos: Is 40, 31 hw"hy> yEÜAqw > (os que esperam em YHWH).

O verbo no qal particípio plural indica uma espera confiante em YHWH. E também,

187

VON RAD, 1973, p. 191. 188

Ibidem, p. 191.

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Is 41,4 !AvêarI ‘hw"hy> ynIÜa ] (eu YHWH primeiro). Aqui indica pela primeira vez a

unicidade de Deus, muito frequente no Dêutero-Isaías.

Is 41,13 ^n<+ymiy> qyzIåx]m; ^yh,Þl{a/ hw"ïhy> ynI±a] yKiª (pois eu YHWH vosso Deus o

que segura vossa mão direita). O verbo no particípio hifil reforça a identidade de

YHWH, e Is 41,20 Ha'(r"B. laeÞr"f.yI vAdïq.W taZO= ht'f.['ä hw"ßhy>-dy: yKi î(pois a mão

direita de YHWH fez isto e santo de Israel criou). Aqui parece indicar que a

expressão reflete o poder criador de YHWH.

No texto que estudamos, Is 42,5 ~yIm;’V'h; arEÛAB hw"©hy> (YHWH o que cria os

céus), temos o verbo qal particípio que indica uma ação de YHWH. Ele é o que cria.

Quanto ao Is 42,6 )̂ytiîar"q. hw"±hy> ynIôa] (eu YHWH te chamei em justiça), pela

primeira vez aparece o preceito da justiça no Dêutero-Isaías que indica um serviço e

um chamado especificamente ao Servo.

Ainda em Is 42,8 ymi_v. aWhå hw"ßhy> ynIïa ] (eu YHWH este meu nome). Temos,

também, a identificação do nome de Deus. YHWH é o seu nome. Em Is 42,13 rABæGIK;

‘hw"hy > (YHWH forte). O adjetivo indica o poder e a força de YHWH.

Ao mencionar o termo justiça em Is 42,21 Aq+d>ci' hw"ïhy> (YHWH sua justiça),

neste caso, o termo é aplicado à identidade de YHWH, algo inerente a ele.

Em Is 43,11 `[:yvi(Am yd:Þ['l.B;mi !yaeîw> hw"+hy> ykiÞnOa' ykiînOa' (eu eu YHWH e não há

outro que possa salvar). Percebemos a repetição do pronome que reforça a

identidade de YHWH e o seu poder de salvar. Também em Is 43,11 hw"ëhy> rm:åa' hKo

(assim disse YHWH). Esta fórmula do mensageiro aparece com muita frequência no

texto do Dêutero-Isaías. Em Is 47,4 hw"ïhy> Wnle§a]GO (YHWH o que nos resgata). Verbo

qal particípio que indica uma ação de YHWH em função do povo que é sua

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característica fundamental como aquele que resgata. Em Is 48,20 bqo)[]y: ADðb.[; hw"ßhy>

la;îG" Wr§m.ai (digam: resgatou YHWH seu servo Jacó).

Em Is 51,3 !AY©ci hw"÷hy> ~x;’nI-yKi( (pois conforta YHWH Sião). Aqui menciona a

cidade que recebe a misericórdia de YHWH. Em Is 54,10 hw")hy> %mEßx]r:m. rm:ïa' (diz o

que tem compaixão de você, YHWH). Com o verbo no particípio piel quer indicar

uma ação intensiva de YHWH e mostra um relacionamento de muita intimidade e

compaixão pelo seu povo.

Em Is 54,13 hw"+hy> ydEäWMli %yIn:ßB'-lk'w> (e todos os seus filhos serão discípulos

de YHWH). Neste versículo, pela primeira vez aparece o termo "discípulos de

YHWH". Em Is 54,17 `hw")hy>-~aun> yTiÞaime ~t'²q'd>ciw> hw"ôhy> ydE’b.[; •tl;x]n: tazO³ (isto será

a posse dos servos de YHWH e a justiça deles que vem de mim. Oráculo de

YHWH). Neste oráculo aparece pela primeira vez o termo "servo" no plural. Isto pode

indicar que trata-se de um grupo que receberá uma recompensa no serviço da

justiça.

Em Is 55,8 aparece pela última vez o termo YHWH no Dêutero-Isaías. O

contexto é que os pensamentos de YHWH não são como os pensamentos humanos

e o caminho dele é diferente. E finaliza com a expressão: hw")hy> ~auÞn> (oráculo de

YHWH).

1.9.5.2. arEÛAB189 (o que cria)

Segundo Lisowsky190, a raiz verbal arb (criar), significa: schaf191, to

create192, creare193. Então, traduzimos o verbo por: "criar". Segundo Lisowsky194

189

Verbo qal particípio masc. singular. 190

LISOWSKY, 1958, p. 280. 191

Tradução nossa: criar 192

Tradução nossa: para criar 193

Tradução nossa: criar 194

LISOWSKY, 1958, p. 280.

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aparece 48 vezes no Primeiro Testamento, 20 vezes no livro de Isaías e, no

Dêutero-Isaías, 15 vezes. No qal particípio ocorre em Is 40,28; 42,5; 45,7 (duas

vezes) e 45,8.

Segundo Lisowsky195 no livro de Gênesis ocorre nove vezes. Em Gn 1,1

~yhi_l{a/ ar"äB' tyviÞarEB . (no começo cria Deus). O verbo encontra-se no qal perfeito

terceira pessoa do singular, o que significa uma ação terminada. Em Gn 2,3 ~yhiÞl{a/

ar"îB'-rv,a] (quando criou Deus). Em Gn 5,1 ~d"êa' ‘~yhil{a/ aroÜB. ~Ay©B . (no dia criar

Deus homem). Aqui, o verbo está no qal infinitivo. Em suma, no livro de Gênesis a

criação é uma ação de Deus. Segundo Harris: "a palavra é usada no qal somente

com referência à atividade de Deus, sendo, portanto, termo puramente teológico"196.

No Dêutero-Isaías, arb (criar) é um verbo que tem um destaque

fundamental em toda obra. A primeira ocorrência do verbo está em Is 40,26 ayciîAMh;

hL,aeê ar"äb'-ymi (quem criou, o que faz sair). O segundo verbo do versículo também

merece destaque. Ele está no hifil particípio masculino "o que faz sair". Em Is 42,1

temos a mesma raiz verbal aplicada ao Servo. Ele é convocado por YHWH para

fazer sair o direito às nações. Em Is 40, 26 quem criou é o mesmo que mobiliza

todos os seres.

Em Is 40,28 #r<a'êh' tAcåq. ‘arEAB ‘hw"hy> Ÿ~l'ÛA[ yhe’l{a/ (Deus de sempre

YHWH o que cria as extremidades da terra). Aqui, menciona-se pela primeira vez

YHWH como aquele que cria. O verbo no qal particípio reforça a atividade de Deus.

Em Is 42,5, o verbo é conjugado da mesma forma. YHWH é aquele que cria.

Em Is 41,20 `Ha'(r"B. laeÞr"f.yI vAdïq.W taZO= ht'f.['ä hw"ßhy>-dy: yKi î(que a mão de

YHWH fez tudo, o santo de Israel criou). Aqui temos dois verbos: "fez" e "criou" tudo

o que existe.

Em Is 43,1, temos a primeira referência a Jacó bqoê[]y: ^åa]r:Bo ‘hw"hy> rm:Üa'-hKo)

hT'ú[;w> (e agora, assim disse YHWH o que te cria Jacó).

195

LISOWSKY, 1958, p. 280. 196

HARRIS et alii,1998, p. 212.

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Em Is 43,7, temos uma sequência de verbos "chamar, criar, formar e fazer"

wyTiÞr>c;y> wyti_ar"B. ydIÞAbk.liw> ymiêv.bi ar"äq.NIh; lK o(todo o que chamei por meu nome e

para minha glória, criei e formei e também fiz). Neste versículo, fica evidente o poder

criador de Deus na obra do Dêutero-Isaías. Diante da crise de identidade do povo e

diante de todo sofrimento provocado pelo exílio, Dêutero-Isaías quer reforçar o

poder de YHWH como aquele que chama, cria, forma e faz acontecer.

Em Is 45,7, temos uma sequência de verbos no particípio que reforçam a

atividade criadora de YHWH `hL,ae(-lk' hf,î[ hw"ßhy> ynIïa] [r"_ arEAbåW ~Alßv' hf,î[o %v,xoê

arEäAbW ‘rAa rcEïAy (o que forma a luz e o que cria treva o que dá a paz o que cria o

mau, eu YHWH o que faz todas essas coisas). Em Is 45,12 `ytiyWE)ci ~a'Þb'c.-lk'w> ~yIm;êv'

Wjån" ‘yd:y" ynI©a] ytiar"_b' h'yl,ä[' ~d"Þa'w> #r<a,ê ytiyfiä[' ‘ykinOa'( (eu fiz terra e homem sobre

ela criei,minha mão estendeu os céus e todo seus exércitos, eu comando). Na

primeira pessoa do singular, Deus é o criador soberano.

Em Is 45,18, ~yIm;øV'h; arE’AB hw"hy>û-rm;a'( hkoå yKi (pois assim disse YHWH o

que cria os céus). Verbo qal particípio reforçando o sujeito e a sua ação.

Em Is 54,16 vr"êx' ytiar"äB' ‘ykinOa' (( (eu criei o artesão). No mesmo versículo,

aparece `lBe(x;l. tyxiÞv.m; ytiar"îB' yki²nOa'w > (e eu criei o que destroi para destruir). Até

mesmo o que destroi é criatura de Deus. Dêutero-Isaías, a partir desta raiz verbal

arb (criar), quer enfatizar o poder de criação de Deus. Ele é o senhor absoluto da

criação. A maioria dos verbos aparecem no qal particípio, reforçando a atividade

criadora de Deus.

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1.9.5.3. ~yIm;’V'h;197 #r<a'Þh'198 (os céus, a terra)

Este termo ~yIm;’V'h; (os céus) aparece aproximadamente 242 vezes em todo

Primeiro Testamento. Uma maior ocorrência no Gênesis, 33 vezes. Nos profetas, em

Jeremias, 24 vezes. Em Isaías, o termo ocorre 11 vezes e no Dêutero-Isaías, três

vezes.

Além do texto que estudamos 42,5, temos ocorrência em Is 45,18 ~yIm;øV'h;

arE’AB hw"hy > (YHWH o que cria os céus). #r<a'Ûh' rce’yO ~yhiªl{a/h' (o Deus que forma a

terra). Na Babilônia, Marduk é considerado a divindade principal por ter vencido

tiamat, a divindade do abismo e do caos e do seu corpo ter criado o céu e a terra199.

Dêutero-Isaías aplica à YHWH esse poder de criar.

A cosmovisão do Antigo Oriente está muito presente nos relatos da

criação200. Segundo Marques e Nakanose:

Naquela época as pessoas acreditavam que a terra tinha a forma de um disco plano e estava rodeada por águas superiores e inferiores (...) a terra estava apoiada por colunas, entre as quais estava localizado o xeol (...) sobre a terra se estendia o firmamento, como uma tigela emborcada, na qual estavam pendurados o sol, a lua e as estrelas. E, acima do firmamento, ficavam as águas superiores, que saíam através de pequenas aberturas, e, mais acima, ficava a morada dos deuses201.

A partir dessa compreensão do universo e dessa linguagem, é que podemos

compreender céus e terra no texto que estudamos. Segundo Harris:

O termo (terra) aparece aproximadamente 2.400 vezes no Antigo Testamento. É o quarto substantivo mais usado no Antigo Testamento. Tem um primeiro sentido cosmológico (terra) e no sentido de uma designação específica (terra de Israel)202.

197

Nome comum masc. plural. 198

Nome comum fem. singular. 199

MARQUES, Maria Antônia; NAKANOSE Shigeyuki. Sonhar de Novo Segundo e Terceiro Isaías (40-66): Roteiros e Orientações para encontros. São Paulo: Paulus, 2004, pp. 19-20. 200

MARQUES, Maria Antônia; NAKANOSE Shigeyuki. Deus viu que tudo era muito bom Entendendo o livro de Gênesis 1-11. São Paulo: Paulus, 2007, p. 13. 201

MARQUES; NAKANOSE, 2007, p. 15. 202

HARRIS et alii, 1998, p. 124.

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No livro de Isaías o termo ocorre 63 vezes. No Dêutero-Isaías, 17 vezes. Em

Is 40,21 `#r<a'(h' tAdßs.Am ~t,ênOybiäh] ‘aAlh ] (se não estendestes as fundações da

terra?). Enfatiza aqui o poder de YHWH como criador. Em Is 40,28 #r<a'êh' tAcåq.

‘arEAB ‘hw"hy > (YHWH o que cria a extremidade da terra). Em Is 41,5 Wdr"_x/y< #r<a'Þh'

tAcïq (. (extremidades da terra tremem). Diante de YHWH a terra treme. Dêutero-

Isaías reforça o poder de YHWH num sentido universal, onde todos estão

submetidos ao poder dele. Em Is 41,9 #r<a'êh' tAcåq.mi ‘^yTi’q.z:x/h, rv< Üa] (quem te fez

firme desde as extremidades da terra). Neste versículo, temos como sujeito YHWH

que convoca e que faz firme e convoca o Servo desde as extremidades da terra.

Em Is 42,10 #r<a'_h' hceäq.mi AtßL'hiT. vd"êx' ryviä ‘hw"hyl;( WryviÛ . (cantai para

YHWH um canto novo, um canto de louvor desde as extremidades da terra). Em

toda parte um canto novo deve ser entoado para YHWH. Um convite universal de

louvor a YHWH.

Em Is 43,6 `#r<a'(h' hceîq.mi yt;ÞAnb.W qAxêr"me ‘yn:b' yaiybiÛh (' (faz sair meus filhos

que estão distantes e minhas filhas da extremidades da terra). Um convite é feito por

YHWH a todos que se encontram na diáspora e longe. Em Is 44,24 #r<a'Þh' [q:ïro (o

que estende a terra). Em Is 49,6 `#r<a'(h' hceîq.-d[; ytiÞ['Wvy> tAyðh.li( (para ser minha

salvação até a extremidade da terra). É comum na linguagem do Dêutero-Isaías o

uso da palavra hceîq.( (final, extremidade) quando se refere a terra. Isso quer indicar

uma missão universal, não somente para o povo exilado na Babilônia, mas para toda

a terra habitada.

1.9.5.4. h'yl,ê['203 ~['äl'204 ‘hm'v'n>205 !tEÜnO206 (o que dá alento para o povo sobre ela)

203

Preposição + sufixo na 3ª pessoa femen. singular. 204

Preposição + nome comum masc. singular. 205

Nome comum feminino singular. 206

Verbo qal particípio masc. singular.

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O termo hm'v'n> (alento) aparece 24 vezes em todo Primeiro Testamento.

Em Isaías, encontramo-lo em 2,22; 30,33; 42,5 e 57,16. O termo tem sempre o

sentido de alento, respiração, sopro.

YHWH é quem dá alento, respiração, sopro de vida para os que habitam

sobre a terra. Estar com o alento, sopro no nariz: é estar vivo.

Em Is 40,29 x:Ko+ @[EßY"l; !tEïnO (o que dá ao fraco energia). O verbo encontra-

se no qal particípio "o que dá" reforçando a ação de YHWH como aquele que dá

energia ao fraco. Em Is 42,24 ~yzIßz>bol. laeîr"f.yIw> bqo±[]y: ÎhS'óvim.liÐ ¿hs,Avm.liÀ !t;’n"-ymi (

(quem deu para pilhagem Jacó e Israel para os que saqueiam). O sujeito da ação é

YHWH.

Em Is 50,4 @[Eßy"-ta, tW[ïl' t[;d:²l' ~ydIêWMli !Avål. ‘yli !t;n"Ü hAIªhy> yn"ådoa ] (o

Senhor YHWH deu para mim língua de discípulo para saber socorrer fraco).

Podemos verificar que YHWH é aquele que socorre o fraco e abatido. Os

verbos no qal particípio indicam e reforçam a ação de YHWH.

Em Is 2,22 temos pela primeira vez a palavra hm'v'n> (alento) `aWh) bv'Þx.n<

hM,îb;-yKi( AP+a;B. hm'Þv'n> rv<ïa] ~d"êa'h'ä-!mi ‘~k,l' WlÜd>xi (deixai eles, o homem que são

alento do nariz e o que pensa ele?). Com o mesmo sentido, encontramos, o termo

em Gn 7,22 lKo±mi wyP'ªa;B. ~yYI÷x; x:Wr’-tm;v.nI •rv,a] lKo ‡ (todo que tem alento do espírito

vivo na narina). O sentido do termo aqui faz referência ao fato de estar vivo,

respirando.

Em Is 30,33 ‘hw"hy> tm;Ûv.nI (alento, sopro, respiração de YHWH). Então, o

termo "alento" é sempre um dom de YHWH. É a força de vida que como a

respiração não pode faltar. E o povo que caminha sobre a terra tem essa força vital

dada gratuitamente por YHWH.

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1.9.5.5 HB'(207 ~ykiîl.hol;208 x:Wrßw>209 (e espírito para os que andam nela)

Esta expressão "e espírito" aparece 39 vezes em todo Primeiro Testamento.

O termo ocorre pela primeira vez em Gn 1,2 `~yIM")h; ynEïP.-l[; tp,x,Þr:m. ~yhiêl{a/ (e

espírito de Deus o que pairava sobre a face das águas). E também no salmo Sl 51,

13 yNIM<)mi xQ:ïTi-la; ^ªv.d>q'÷ x:Wrïw > (e vosso espírito santo não tomes de mim).

Em Dêutero-Isaías, o substantivo nesta forma x:Wråw > (e espírito) aparece

somente no versículo 5.

Em Is 44,3 ^[,êr>z:-l[; ‘yxiWr qCoÜa ,(( (colocarei meu espírito sobre tua

descendência). Trata-se do espírito de YHWH. Reforçamos desde os primeiros

versículos do canto do Servo de YHWH a função que desempenha ao longo do texto

o uso do sufixo pronominal na primeira pessoa do singular (meu). Aqui é aquilo que

vem do próprio ser de YHWH que ele doa gratuitamente. Também, percebemos em

Is 48, 16 `Ax)Wrw> ynIx:ßl'v. hwI±hy> yn"ôdoa ] (senhor YHWH me enviou com seu espírito).

O espírito de YHWH é o seu sopro de vida que uma vez doada ao Servo,

agora é aplicado aos que caminham sobre a terra.

1.9.6. Análise dos termos significativos do sexto versículo Is 42,6

Os termos fundamentais que analisaremos neste versículo são: o verbo

"chamar", o substantivo " justiça", a expressão verbal: "agarrarei", o substantivo

"mão"; o verbo "guardarei e colocarei"; a expressão: "aliança de povo e luz de

nações".

207

Preposição + sufixo 3ª pessoa feminino singular. 208

Preposição + verbo qal particípio masc. plural. 209

Conjunção + subst. comum masc. singular.

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1.9.6.1. qd<c,Þb.210 ^)ytiîar"q.211 hw"±hy.212 ynIôa]213 (Eu, YHWH, te chamei em Justiça)

Neste canto, é a primeira vez que diretamente aparece o pronome pessoal

(Eu), seguido do nome de Deus: YHWH. Então, tudo o que se falava dele desde o

início do canto, agora de forma direta ele se identifica e, em seguida faz o convite ao

Servo.

1.9.6.1.1. ^)ytiîar"q.214 (te chamei)

Segundo Jenni e Westermann215, a raiz verbal arq (chamar) ocorre 730

vezes no Primeiro Testamento. No livro de Isaías, segundo Lisowsky216, há 75

ocorrências. Já no Dêutero-Isaías, 24 vezes. Porém, nessa forma verbal (te chamei)

aparece apenas em: Is 41,9; 42,6 e 51,19. Trata-se de um chamado feito a uma

pessoa em particular, feito por YHWH.

Segundo Jenni e Westermann, "o significado básico parece ser: atrair a si

por meio do som da voz a atenção de alguém para pôr-se em contato com ele"217.

Daí, que o resultado do chamado vem seguido da resposta. No caso do Servo, o

chamado é feito para um serviço específico, chamado para a justiça.

Em Is 41,9, temos a seguinte expressão hT'a;ê-yDIb.[; ‘^l. rm;aoÜw" ^yti_ar"q. (te

chamei e disse para você, tu és meu Servo). O Servo é chamado desde a

extremidadade da terra e num diálogo de intimidade, YWHW o sustenta com toda

confiança.

210

Preposição + substantivo masc. singular. 211

Verbo qal perfeito + 1ª pessoa singular + sufixo 2ª pessoa masc. singular. 212

Substantivo próprio 213

Pronome primeira pessoa singular. 214

Verbo qal perfeito + sufixo 2ª pessoa masc. singular. 215

JENNI; WESTERMANN, 1985, p. 840. 216

LISOWSKY, 1958, pp. 1269-1275. 217

JENNI; WESTERMANN, 1985, p. 841.

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1.9.6.1.2. qd<c,Þb.218 (em justiça)

O termo "justiça" juntamente com a preposição "em" ocorre 14 vezes no

Primeiro Testamento.

No livro de Isaías ocorre 4 vezes. Em Is 11,4 ~yLiêD: ‘qd<c,’B. jp;Ûv'w > (e julgará

em justiça o pobre). Em Is 45,13 qd<c,êb. Wh)tiäroy[ih; ‘ykinOa' (eu te despertei em

justiça). Aqui se trata do contexto do chamado de Ciro como instrumento de YHWH.

Em Is 59,4 qd<c,êb. arEäqo-!yae (nenhum proclamador em justiça).

Nos salmos Sl 9,9 qd<c,_B. lbeîTe-jPo)v.yI aWhªw > (e ele julga o mundo em justiça),

Sl 72,2 `jP'(v.mib. ^yY<ïnI[]w: qd<c,_b. ^åM.[; !ydIäy " (julgará teu povo em justiça e teus pobres

em direito) e o Sl 96,13 `At*n"Wma/B, ~yMiª[;w>÷ qd<c,_B. lbeîTe-jPo)v.yI #r<a'îh'ñ jPoáv.li éab' yKiî

ab'ª yKiì Ÿhw"“hy> ynEÜp.li (Diante da face de YHWH, pois aquele que vem, pois aquele

que vem para julgar a terra, julgará o mundo justiça e os povos para sua fidelidade).

O conceito de Justiça marca as relações vitais da vida humana. Segundo Von Rad:

Dentre os conceitos que designam as relações vitais do homem, o conceito de justiça é o mais importante e o mais central de todo Antigo Testamento. Constitui o critério das relações entre o homem e Deus, dos homens entre si, até nas disputas mais insignificantes, do homem com os animais e do homem com o meio ambiente natural em que se move. A justiça pode, simplesmente, ser apontada como o valor supremo da vida e o fundamento em que repousa toda existência ordenada219.

Com referência a justiça de YHWH, Von Rad diz "a justiça de YHWH não é

uma norma, mas são atos, demonstrações de salvação"220.

Assim, podemos perceber que ser chamado para justiça por YHWH, é ser

chamado para uma missão específica. Neste sentido, o Servo de YHWH é

convocado para estabelecer um novo relacionamento entre os povos. Mas, não em

valores ideais, mas ao acontecimento, proviniente de YHWH. Trata-se de um

218

Preposição + substantivo comum singular. 219

VON RAD, 1973, p. 353. 220

Ibidem, p. 355.

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acontecimento em favor de Israel e este sempre teve consciência que toda sua vida

social era conservada pela justiça de YHWH e constantemente renovada. Conf. Sl

50,6 Aq+d>ci ~yIm:åv' WdyGIåY:w: (proclamam os céus a sua justiça). Segundo Von Rad,

"designa seus mandamentos, cuja revelação se celebrava regularmente numa festa,

no templo de Jerusalém"221.

A partir dessa reflexão de que o conceito de justiça está em conformidade

com valores fundamentais para um relacionamento fraterno entre as pessoas e

povos e são valores supremos da vida, percebemos que é no cotidiano que a justiça

se estabelece. Sendo assim, o Servo sendo chamado em justiça, carrega toda uma

postura e atitudes para que esses valores supremos da vida sejam estabelecidos

entre os exilados, nações e povos, numa perspectiva universal.

1.9.6.2. ^d<+y"B.222 qzEåx.a;w >223 (e agarrarei firme a tua mão)

Segundo Lisowsky224, este verbo (segurar firme), significa: stark sein225,

grow strong226, fortem esse227. Enfim, no qal o verbo está relacionado com "algo que

se toma com firmeza, com força". E no hifil o verbo significa "tomar posse", "tomar

com força" "pegar". No caso, YHWH segura com firmeza a mão do seu Servo.

Este verbo ocorre aproximadamente 268 vezes no Primeiro Testamento. No

livro de Isaías 20 vezes. E no Dêutero-Isaías: 41,7; 41,9; 41,13; 42,6; 45,1; 51,18 e

54,2. Vejamos algumas citações para compreendermos melhor o sentido da raiz

verbal (segurar com firmeza).

Em Is 41,7 temos a seguinte expressão: ~[;P'_ ~l,Ahå-ta, vyJiÞP; qyliîx]m;

@rEêco-ta, ‘vr"x' qZEÜx;y>w: ( Com força o artífice, aquele que define para tornar suave com

o martelo uma batida). Queremos sinalizar nessa citação o uso da raiz verbal qzx

(segurar firme). No contexto desse versículo, Dêutero-Isaías faz uma comparação

221

VON RAD, 1973, p. 357. 222

Preposição + substantivo feminino singular + sufixo 2ª pessoa masc. singular. 223

Conjunção + verbo hifil imperfeito 1ª pessoa comum singular. 224

LISOWSKY, 1958, p. 473. 225

Tradução nossa: ser forte. 226

Tradução nossa: crescer forte. 227

Tradução nossa: forte.

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entre o artífice que trabalha o metal para lhe dar forma, assim também YHWH é

quem convoca e forma Israel para a sua missão. O uso do verbo no piel reforça a

ação de YHWH que é feita com segurança e com firmeza. O verbo é empregado no

hifil na citação seguinte, Is 41,9 #r<a'êh' tAcåq.mi ‘^yTi’q.z:x/h, rv<Üa ] (tu, a quem eu tomei

com firmeza da extremidade da terra). Logo percebemos que a raiz verbal é sempre

utilizada de forma intensiva. Ou seja, YHWH toma com segurança a mão do Servo e,

desta maneira, o mesmo sente-se protegido. Em Is 41,13, temos uma expressão

que resume bem o sentido da raiz verbal qzx (segurar com firmeza). `^yTi(r>z:[] ynIïa]

ar"ÞyTi-la; ^±l. rmEïaoh' ^n<+ymiy> qyzIåx]m; ^yh,Þl{a/ hw"ïhy> ynI±a] yKiª (pois eu YHWH teu Deus, o

que te segura com firmeza tua mão direita, o que diz para você não temas eu te

ajudo). A raiz verbal vem acompanhada do verbo no particípio, ou seja, reforçando a

ação de YHWH. Ele é quem segura com firmeza a mão direita do Servo e ainda o

que diz não tenha medo, eu te ajudo.

O rito de tomar pela mão é muito significativo no texto do Dêutero-Isaías. Na

Babilônia esse rito era comum, onde o rei, todos os anos, tomava a mão de Marduc,

para conduzi-lo em procissão, pela via sagrada228. Trata-se então de uma relação

entre YHWH e o Servo na perspectiva de um serviço de liderança. Porém, já

refletimos que a liderança do Servo não tem característica monárquica. Porém, a

atitude de segurar firme a mão faz lembrar uma investidura real.

1.9.6.3. ^ªr>C'a,w>229 (e te guardarei)

Segundo Lisowsky230, a raiz verbal rcn (proteger) tem 62 ocorrências no

Primeiro Testamento. E significa: bewachen, hüten231, to watch, to guard232,

observare, conservare233. O signficado da raiz verbal é: "proteger".

228

STEINMANN, 1976, p. 128. 229

Verbo qal imperfeito 1ª pessoa comum singular + sufixo 2ª pessoa masc. singular. 230

LISOWSKY, 1958, p. 952. 231

Tradução nossa: guarda. 232

Tradução nossa: para se proteger. 233

Tradução nossa: preservar.

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Segundo Jenni e Westermann: "no âmbito religioso emprega-se com

preferência o verbo, ao igual cuidado de Deus por seu povo (Dt 32,10: como a pupila

de seus olhos)"234. Com isso, fica evidente que o sentido do verbo é de um cuidado

especial de YHWH para com o Servo.

No livro de Isaías, encontramos essa raiz verbal oito vezes e, no Dêutero-

Isaías, Is 42,6; 48,6; 49,6 e 49,8.

Em Is 49,8 `tAm)mevo tAlïx'n> lyxiÞn>h;l. #r<a,ê ~yqIåh'l. ~['ê tyrIåb.li ‘^n>T,a,w>

^ªr>C'a,w> ^yTi_r>z:[] h['ÞWvy> ~Ayðb.W ^ytiêynI[] ‘!Acr" t[eÛB. hw"©hy> rm:åa' ŸhKoå (assim diz

YHWH no tempo favorável, eu te respondi, e no dia salvação eu te ajudei, e te

guardarei e te colocarei para aliança de povo, para reerguer a terra, para fazê-los

tomar posse em herança que estão desoladas). Este versículo tem muita

semelhança com Is 42,6. Trata-se de um convite especial feito por YHWH ao Servo.

Com a proteção dele e com o seu espírito, o Servo tem essa missão de levar seu

povo a retomar suas heranças na Judá desolada.

1.9.6.4. ~yI)AG235 rAaðl.236 ~['237 Þ tyrIïb.li238 ^±n>T,a,w>239 (e te colocarei para aliança de

povo, como luz de nações)

Segundo Jenni e Westermann, "com seus mais de dois mil casos

documentados, esta raiz verbal !tn (dar) ocupa o quinto lugar entre os verbos mais

frequentes do Antigo Testamento"240. Há 1919 ocorrências do verbo. Segundo Jenni

e Westermann, "os dicionários distiguem geralmente três significados principais do

verbo. Primeiro significado: dar; segundo: colocar, dispor, pôr e terceiro: fazer"241.

234

JENNI; WESTERMANN, 1985, p. 140. 235

Substantivo comum masc. plural. 236

Preposição + substantivo comum singular. 237

Substantivo comum singular. 238

Preposição + substantivo comum singular. 239

Conjunção + verbo qal imperfeito 1ª pessoa comum singular + sufixo na 2ª pessoa masc. singular. 240

JENNI; WESTERMANN, 1985, p. 160. 241

Ibidem, p. 161.

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Lisowsky apresenta o seguinte significado para o verbo: geben242, to give243,

dare244. Cujo significado: "dar".

Em Isaías, há 48 ocorrências do verbo, no Dêutero-Isaías pode perceber 29

vezes essa raiz verbal, tornando-se um verbo fundamental no pensamento do

Dêutero-Isaías.

Em 1Rs 14,7, temos pela primeira vez essa expressão verbal ^±n>T,a,w > (e te

instituirei). Nessa citação de 1Rs 14,7 é o contexto da escolha do rei Jeroboão. Ele é

instituido como rei. O verbo é empregado para a escolha e para instituir alguém no

trono. `lae(r"f.yI yMiî[; l[;Þ dygIën" ^ån>T,a,w" ~['_h' %ATåmi ^ytiÞmoyrIh] rv<ïa] ![;y:± laeêr"f.yI yheäl{a/

‘hw"hy> rm:Üa'-hKo) (assim disse YHWH Deus de Israel que levantei você do meio do

povo e te colocarei como líder sobre meu povo Israel). Podemos perceber que

instituir alguém é lhe conferir poderes de liderança. Em 1Rs 16,2, temos a mesma

expressão verbal lae_r"f.yI yMiä[; l[;Þ dygIën" ^ån>T,a,w" rp'ê['h,ä-!mi (do meio do pó te

instituirei como líder (chefe) sobre meu povo Israel). O verbo é usado para instituir

alguém para uma liderança. Neste versículo trata-se do rei Iehu.

Então, podemos concluir que esta raiz verbal é utilizada para colocar alguém

para um serviço político. Trata-se de um chamado e um serviço de liderança para o

qual o Servo é instituído.

Damos, assim, preferência à tradução do verbo pôr: "colocar" no sentido de

que o Servo tem sobre si um serviço de liderança.

1.9.6.4.1. ~['Þ245 tyrIïb.li246 (para aliança de povo)

242

Tradução nossa: dar. 243

Tradução nossa: para dar. 244

Tradução nossa: dar. 245

Substantivo comum singular. 246

Preposição + substantivo comum singular.

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O substantivo tyrib. (aliança), segundo Jenni e Westermann: "aparece no AT

287 vezes"247. Em Isaías aparece 20 vezes. No Dêutero-Isaías aparece 4 vezes.

Para Jenni e Westermann:

O termo designa não uma relação, mas que é a determinação, o compromisso que toma o sujeito da aliança, nesse contexto, a aliança pode designar precisamente a promessa. O conteúdo de tal aliança como autocompromisso se deduz do contexto: deixar a outros com vida, defender a vida comunitária248.

Sendo assim, o Servo entra no projeto de YHWH a partir de uma

determinação dele.

O substantivo "aliança" com o uso da preposiçao "para" indica uma ação

posterior. O Servo foi instituído para aliança de povo.

Esta expressão com a preposição "para" ocorre seis vezes no Primeiro

Testamento. Vamos destacar algumas citações bíblicas onde aparece o termo.

Em Is 49,8 ~['ê tyrIåb.li ‘^n>T,a,w> (e te colocarei para aliança de povo). Em Gn

17,7 ytiøyrIB.-ta, yti’moqih]w: (eu estabelecerei minha aliança). ^n<©ybeW ynIåyBe (entre eu

você). ~l'_A[ tyrIåb.li (para aliança eterna). Em Gn 17,13 ~l'(A[ tyrIïb.li ~k,Þr>f;b.Bi

yti²yrIb. (minha aliança em vossa carne será aliança eterna). No Sl 74,20 tyrI+B.l;

jBeîh; (olha para minha aliança).

Tudo indica que colocar alguém para aliança significa dar um serviço que

tem uma forte conotação política.

247

JENNI; WESTERMANN, 1985, p. 493. 248

Ibidem, p. 496.

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1.9.6.4.2. ~yI)AG249 rAaðl.250 (para luz de nações)

Segundo Jenni e Westermann: "na escatologia profética de salvação há um

movimento que parte da escuridão do estado de necessidade até a luz da nova

salvação que chega... E esta salvação virá não somente para Israel, mas também

para os povos"251.

Então, podereremos deduzir que o substantivo "luz" está relacionado com a

salvação divina. Primeiro esta salvação é destinada para Israel e depois ela é

destinada para todos os povos. E o Servo de YHWH é o intermediário dessa missão.

O termo "luz" com a preposição "para" ocorre 19 vezes no Primeiro

Testamento. Em Gn 1,5 ~Ayë ‘rAal' Ÿ~yhiÛl{a/ ar"’q.YIw: (e chamou Deus para luz dia). O

termo ocorre oito vezes em Isaías. E no Dêutero-Isaías, quatro vezes. É um termo

muito usado no livro de Isaías, porém com preposição "para" tem somente essas

ocorrências.

Em Is 5,20 o termo aparece pela primeira vez %v,xoêl. rAaæw> ‘rAal. %v,xoÜ

~ymi’f' (os que fazem trevas para luz e luz para escuridão). Em Is 42,16 rAaªl'

~h,øynEp.li %v'’x.m; •~yfia' (transformarei escuridão diante deles para luz). O signficado

de transformar situações de escravidão e trevas em um movimento salvífico.

Em Is 49,6 `#r<a'(h' hceîq.-d[; ytiÞ['Wvy> tAyðh.li( ~yIëAG rAaæl. ‘^yTi’t;n>W (e te

estabelecerei para luz das nações para ser minha salvação até as extremidades da

terra). Em Is 51,4 ~yMiÞ[; rAaðl. yjiêP'v.miW (e meu direito para luz de povos). Aqui dois

termos se complementam: a salvação e o direito que são os projetos de libertação

que nasce do ser de YHWH.

249

Substantivo comum singular. 250

Preposição + substantivo comum singular. 251

JENNI; WESTERMANN, 1985, p. 156.

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Em Is 59, 9 temos a expressão %v,xoê-hNEhiw> ‘rAal' ) (para luz eis escuridão).

Em Is 60, 19 ~l'êA[ rAaæl. ‘hw"hy> %l"Ü-hy"h'w> (e será para ti YHWH para luz eterna). Em

Is 60,20 ~l'êA[ rAaæl. ‘%L'-hy<h.yI) hw"©hy> yKiä (pois YHWH será para ti para luz eterna).

Sendo assim, esse conceito "luz" é muito importante na compreesão do

pensamento do Dêutero-Isaías, pois nessa luz há uma manifestação e desejo divino

para os povos e para os exilados.

1.9.7. Análise dos termos significativos do sétimo versículo Is 42,7

Aqui serão analisados todos os termos do versículo: "para abrir olhos cegos,

para fazer sair da prisão encarcerado, da casa de confinamento os habitantes de

escuridão".

1.9.7.1. tAr+w>[i252 ~yIn:åy[e253 x:qoßp.li254 (para abrir olhos cegos)

No v.7 temos dois verbos que se encontram no infinitivo. ayciÛAhl. (para

abrir). x:qoßp.li (para fazer sair). Segundo Westermann:

Como muitos editores têm apontado, o tema dos infinitivos no v. 7 poderia igualmente ser Yahweh ou como abordado no v. 6 (o Servo ou Israel). Esta indeterminação é característico do autor do 42,5-9. Aqui, também, os infinitivos relacionam-se com o anúncio da salvação, e há também liberar/soltar da prisão255.

A raiz verbal xqp (abrir) ocorre 18 vezes no Primeiro Testamento. No livro

de Isaías aparece em Is 37,17; 42,7 e 35,5. A raiz verbal acompanhada da

preposição "para" só ocorre em Is 42,7.

252

Adjetivo feminino plural. 253

Substantivo comum dual plural. 254

Preposição + verbo qal infinitivo. 255

WESTERMANN, 1977, p. 100.

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A primeira ocorrência do verbo "abrir" encontramos em Gn 21,19 h'yn<ëy[e-ta,

‘~yhil{a/ xq:Üp.YIw: (abriu Deus os olhos dela). Deus abriu os olhos de Hagar.

O verbo é também utilizado em 2Rs 4,35 wyn")y[e-ta, r[;N:ßh; xq:ïp.YIw : (e abriu o menino

seus olhos). Este texto faz referência a Eliseu e o filho da shumanita.

Em 2Rs 6,17 wyn"ßy[e-ta, an"ï-xq;P. hw"¨hy> rm;êaYOw: ‘[v'ylia/ lLeÛP;t.YIw : (rezou Eliseu

dizendo: YHWH abre agora os olhos dele)... ynEåy[e-ta, ‘hw"hy> xq:Üp.YIw : (abriu YHWH os

olhos dele).

Em 2Rs 19,16 hae_r>W ^yn<ßy[e hw"±hy> xq:ôP. (abre YHWH teus olhos e vê). O

mesmo texto o encontramos em Is 37,17 hae_r>W ^n<ßy[e hw"±hy> xq:ôP . (abre YHWH teus

olhos e vê. Trata-se da ameaça do rei da Assíria contra Jerusalém.

Em Is 35,5 ~yrI+w>[i ynEåy[e hn"x.q:ßP'Ti za'î (então abrirão olhos dos cegos).

No Sl 146,8 ~yrIªw>[i x;qEÜPo« Ÿhw"Ühy> (YHWH o que abre os olhos cegos). Em Is

42,7 tAr+w>[i ~yIn:åy[e x:qoßp.li (para abrir olhos cegos). Há muita semelhança entre a

atitude de YHWH e a atitude do Servo. Ambos realizam a mesma ação de "abrir

olhos cegos". Esta expressão verbal x:qoßp.li (para abrir) ocorre somente no Dêutero-

Isaías.

Segundo da Silva, o v.7 concretiza a missão do Servo em termos de abrir

olhos cegos e libertar prisioneiros encarcerados, com a aplicação da simbologia da

luz256. Segundo Westermann:

Tendo em conta o caráter da passagem, é de se supor que, na descrição da salvação a ser trazida para a humanidade pelo servo (v. 6b), a coisa prevista nos três cláusulas do v.7 é a remoção do sofrimento em geral (como em 61 1ff.), a abertura dos olhos dos cegos e a libertação dos prisioneiros têm a intenção de tipificar o sofrimento humano, o primeiro representando o sofrimento devido ao estado de criatura do homem, o segundo, nas mãos de outros homens. Em todo o caso, a referência não é especificamente para a

256

DA SILVA, 2006, p. 52.

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cegueira de Israel, um assunto tratado por Deutero-Isaías em outro contexto, nem é para o fato do exílio, que as palavras usadas aqui poderia ter significado. O sentido é que Deus designou Israel de ser uma luz para o mundo e para mediar salvação no mundo, Israel é para trazer iluminação e libertação para os outros257.

1.9.7.2. rySiêa;258 ‘rGEs.M;mi259 ayciÛAhl.260 (para fazer sair da prisão encarcerado)

A raiz verbal acy (sair) aparece três vezes no texto que estudamos. Esta

raiz verbal aparece em Is 42,1.3.7. Duas vezes vem acompanhado do termo

"direito". Ou seja, fazer sair o direito. Neste versículo sete a raiz verbal vem

acompanhada da preposição "para" e do termo "encarcerado", quem está preso.

Westermann afirma: "trazer para fora/libertar prisioneiros da masmorra"261. Sendo

assim, a missão do Servo é especificamente libertar, trazer para fora, fazer sair da

casa da escravidão quem se encontra preso. Segundo Silva "o sentido geral desse

versículo sete refere-se à libertação do exílio"262.

Um versículo que merece destaque é o de Ex 6, 26 ~yIr:ßc.mi #r<a,îme lae²r"f.yI

ynEôB.-ta, WayciøAh ~h,êl' ‘hw"hy> rm:Üa' rv,’a] hv,_moW !roàh]a; aWhï (ele Aarão e a Moisés

aos quais disse YHWH para eles: façam sair os filhos de Israel da terra do Egito).

Percebemos que a raiz verbal acy (sair) encontra-se no hifil imperativo plural. Isso

denota uma ordem dada por YHWH a Moisés e Aarão (líderes). Desta mesma

maneira, no texto que estudamos Is 42,1-9, esta raiz verbal acy (sair) aparece três

vezes. E, especificamente no v.7 a raiz verbal aparece no hifil infinitivo e com a

preposição "para" indicando direção. "Para fazer sair". No Egito e na Babilônia o

contexto é de escravidão. E a força da raiz verbal é "fazer sair", tirar, libertar. E, logo

alguém é chamado e convocado para essa missão. Pensamos que um grupo de

exilados chamado de Servo é convocado para uma missão específica.

257

WESTERMANN, 1977, p. 100. 258

Substantivo comum singular. 259

Preposição + substantivo comum singular. 260

Preposição + verbo hifil infinitivo. 261

WESTERMANN, 1977, p. 100. 262

DA SILVA, 2006, p. 53.

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1.9.7.3. %v,xo)263 ybev.yOð264 al,K,Þ265 tyBeîmi266 (de casa de confinamento os habitantes

de escuridão)

Esta expressão "casa de confinamento" ocorre 8 vezes no Primeiro

Testamento.

Em 2Rs 17,4 temos a expressão casa de confinamento. Neste versículo,

trata-se da prisão (casa de confinamento) do rei Oséias pelo rei da Assíria por deixar

de entregar o tributo ao rei. `al,K,( tyBeî WhrEÞs.a;Y:w: rWVêa; %l,m,ä (rei da Assíria prendeu

ele na casa de confinamento). `al,K,( tyBeîmi hd"ÞWhy>-%l,m,( !ykiîy"Ahy> varo±-ta, Akªl.m'

tn:åv.Bi lb,øB' %l,m,’ •%d:rom. lywIåa/ (Evil-Merodak, rei da Babilônia, neste ano de seu

reinado, levantou a cabeça (libertou) de Ioiakin, rei de Judá da casa de confinamento

(prisão). #r<a'_h' ybeäv.yO lKoß (todos os que habitam na terra). Esta expressão ocorre

muitas vezes no Primeiro Testamento. Porém, a expressão `%v,xo) ybev.yOð (os

habitantes de escuridão) ocorre somente em Isaías.

Em Is 9,1 `~h,(yle[] Hg:ïn" rAaà tw<m'êl.c; #r<a,äB. ‘ybev.yO lAd+G" rAaæ Waßr" %v,xoêB;

~ykiäl.hoh; ‘~['h' (o povo, os que caminhavam nas trevas viram luz grande, os

habitantes da terra da escuridão, luz brilhou sobre eles). A raiz verbal bvy (habitar)

é a mesma que encontramos em Is 42,7.

Em Gn 1,2 ~Ah+t. ynEåP.-l[; %v,xoßw> Whboêw" ‘Whto’ ht'îy>h' #r<a'ªh'w> (e a terra era

deserta e vazia e a escuridão sobre a face do abismo).

Para Croatto: "libertar da prisão tem a ver com a simbologia da luz, oposto

às trevas, e com a realidade social e política (a prisão, as cadeias)"267. Croatto

afirma:

263

Substantivo comum singular. 264

Verbo qal particípio masc. plural. 265

Substantivo comum singular. 266

Preposição + substantivo comum singular.

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A imagem da luz como equivalente de libertação é usada em textos mesopotâmicos. Sargão II ( do final do século VIII) declara, por exemplo, sobre o povo de Sippar, Nippur, Babilônia e Borsippa, que, sem culpa própria, havia estado preso: eu destruí sua prisão, fazendo com que viesse à luz. Uma comparação parecida faz o Terceiro Isaías: "para proclamar a libertação aos cativos e aos encarcerados a abertura (dos olhos). Ainda uma oração babilônica reza: fazes ver a luz (libertas) aos que têm sido entregues à prisão. É o mesmo contexto de Isaías 42,7. É bom notar a forma literária concêntrica deste versículo: as duas imagens simbólicas (olhos cegos/habitantes das trevas) encerram a referência dupla à realidade direta da prisão268.

Ainda insiste Croatto: "é possível que a prisão e as cadeias sejam uma

metáfora para a opressão em geral. Mas trata-se de situações históricas concretas e

materias e não de uma condição espiritual"269.

1.9.8. Análise dos termos significativos do oitavo versículo Is 42,8

Os termos que iremos analisar neste versículo são: a expressão "eu YHWH,

esse é o meu nome" e a expressão "e a minha glória para outro não darei".

1.9.8.1. ymi_v.270 aWh271 hw"ßhy>272 ynIïa]273 (Eu YHWH, esse é o meu nome)

Neste versículo, YHWH fala diretamente. Ele fala indiretamente no início do

canto, no v.1 ao apresentar o Servo. No v. 5 alguém fala em nome dele "assim,

disse o Deus YHWH". No v. 6 fala diretamente na primeira pessoa. E no v. 8 trata-se

da identidade dele. Eu YHWH, esse meu nome.

Segundo Westermann:

267

CROATTO, 1998, p. 73. 268

Ibidem, p. 73. 269

Ibidem, p. 73. 270

Substantivo comum 271

Pronome terceira pessoa do singular. 272

Nome próprio. 273

Pronome primeira pessoa do singular.

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Neste trabalho de salvar, Deus prova a si mesmo que ele é verdadeiramente Deus, seu nome carrega o tom que ele é o Senhor e Salvador do mundo. Sua glória e seu louvor, que não dá a nenhum outro, consiste em ele ser reconhecido na sua obra de salvação. O verso oito é claramente uma conclusão e corresponde ao início do oráculo (v.5)274.

Segundo Brueggemann, “no versículo 8-9, é o Senhor que fala e que não

compartilha nada do esplendor divino com qualquer outro. É tudo o Senhor e

somente o Senhor"275.

Para Croatto: "o v. 8 retoma, como já foi observado, a disputa com os

deuses de 41,26-29"276. E não menos enfático, segundo Croatto, é o "eu YHWH"

deste versículo, que destaca que esse é o nome próprio do Deus dos oprimidos.

"Por detrás disso está a "memória histórica do êxodo, com o qual está ligado o

referido nome"277. Em Ex 3,14 hy<+h.a,( rv<åa] hy<ßh.a,( hv,êmo-la, ‘~yhil{a/ rm,aYOÝw: (disse

Deus para Moisés: eu sou o que serei). Segundo Croatto, "aquele que-está-com... os

deuses se distinguem por seus nomes, e o v. 8 rechaça as confusões"278.

1.9.8.2. !Teêa,-al{)279 rxEåa;l.280 ‘ydIAbk.W281 (e a minha glória para outro não darei)

Ao falar da Glória de YHWH, Jenni e Westermann afirmam:

Podemos distinguir três modos principais para o termo dAbK' (peso,

honra, glória). O primeiro é peso no sentido físico. O segundo é honra ou glória no sentido de relacionamentos interpessoais. E o terceiro faz referência a Deus: honra ou glória a Deus. Porém, no relacionamento com Deus nunca significa "peso", no sentido de carga ou opressão...com muita frequência o termo significa honra. Alguém é honrado fazendo referência a sua riqueza ou a sua importância num sentido mais amplo... honrar a Deus significa dar a ele a importância que lhe corresponde, reconhecê-lo em sua divindade"282.

274

WESTERMANN, 1977, p. 101. 275

BRUEGGEMANN, 1998, p. 44. 276

CROATTO, 1998, p. 73. 277

Ibidem, p. 74. 278

Ibidem, p. 74. 279

Advérbio de negação + verbo qal imperfeito 1ª pessoa singular. 280

Preposição + adjetivo masc. singular. 281

Conjunção + substantivo comum singular + sufixo na 1ª pessoa singular. 282

JENNI; WESTERMANN, 1985, p. 1097.

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A glória a YHWH também se entende dentro de um plano de salvação. Há

uma intervenção salvífica de Deus na história para o bem de seu povo. A atividade

de YHWH em favor de seu povo é considerada como a prova de sua glória.

O reconhecimento de Deus está em não ceder para outro sua glória. Ele

continua afirmando a sua identidade como YHWH. Esse é o seu nome. Para

Gonsáles Faus:

A glória de Deus consiste em lutar pela justiça... Já os ídolos não fazem justiça, não implantam direito, nem dão liberdade. O autor entende a justiça como associação do ser humano a obra criadora de Deus. Existe uma continuidade283.

Em Is 26,15 `#r<a'(-ywEc.q;-lK' T'q.x;ÞrI T'd>B'_k.nI (fostes glorificado e enviaste para

toda fronteira da terra). Em Is 43,4 ^yTi_b.h;a] ynIåa]w: T'd>B;Þk.nI yn:±y[eb. T'r>q:ôy" rv,’a]me (de

que sejas precioso aos meus olhos e de teres peso, eu amo você). O substantivo

dAbK' tem também o sentido de "peso". Porém, não de ser pesado a alguém, mas,

de ser importante, alguém de peso.

Em Is 49,5, temos yh;Þl{awE hw"ëhy> ynEåy[eB. ‘dbeK'a,w> (e tenho peso aos olhos de

meu Deus). Em Is 43,23 hx'ên>miB. ‘^yTi’d>b;[/h, al{Ü ynIT"+d>B;ki al{å (não fiquei honrado

com teus sacrifícios).

O termo significa reconhecimento da atividade divina, dar glória a YHWH

porque ele realizou maravilhas na história de seu povo.

1.9.9. Análise dos termos significativos do versículo nono Is 42,9

Os termos fundamentais que iremos analisar neste versículo são: "as

primeiras coisas adentraram", o adjetivo: "novas", o verbo: "eu o que relata", a

expressão: "antes de brotarem, farei escutar a vós".

283

FAUS, José Ignacio Gonzáles. Servir para una Espiritualidad de la Lucha por la justicia. Quito: CBVD, Fé y Vida, Biblioteca del Laico, 2011, p. 6.

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1.9.9.1. tAnàvoarI)h'284 (as primeiras coisas)

Este adjetivo ocorre 174 vezes no Primeiro Testamento. Em Isaías, 19

vezes. E no Dêutero-Isaías, 12 vezes. Is 41,4; 41,22; 41,27; 42,9; 43,9; 43,18; 43,27;

44,6; 46,9; 48,3; 48,12 e 52,4.

Em Is 1,26 temos a primeira ocorrência do adjetivo hn"ëvoarIåb'K. ‘%yIj;’p.vo hb'yviÛa'w>

(trarei de volta o que julga como anteriormente). Em Is 8,23 !Wlbuz> hc'r>a:Ü lq;úhe

!AvªarIh' (nos primeiros tempos tornou vil a terra de Zebulon). No Dêutero-Isaías a

primeira vez que o adjetivo aparece é em Is 41,4 !AvêarI ‘hw"hy> ynIÜa] (eu YHWH, o

primeiro). Em Is 41,22 tAnævoarIh' hn"yr<_q.Ti rv<åa](( (quais vossos primeiros anúncios).

Nestas citações, poderemos perceber o sentido do adjetivo que relembra os

primeiros acontecimentos e também YHWH como o primeiro a anunciar as suas

maravilhas.

Em Is 43,9 Wn[u_ymiv.y: tAnàvoarI)w> tazO (estas primeiras coisas nos faz ouvir).

Em Is 43,18 tAn=voarI) WrßK.z>Ti-la;( (não vos lembreis das primeiras coisas). Em Is

46,9 ~l'_A[me tAnàvoarI Wrïk.zI (lembrai-vos dos primeiras coisas de longa duração). Em

Is 48,3 yTid>G:ëhi za'äme ‘tAnvoarI)h' (as primeiras coisas, há tempo eu anunciei a vós). Em

Is 52,4 hn"ßvoarI)b' yMiî[;-dr;y") ~yIr:±c.mi hwIëhy> yn"ådoa] ‘rm;a' hkoÜ yKiä (pois agora disse o

Senhor YHWH do Egito fiz sair por primeiro meu povo). Em Is 65,17 tAnëvoarIåh'

‘hn"r>k;’Z"ti al{Üw> hv'_d"x] #r<a'äw" ~yviÞd"x] ~yIm:ïv' arE²Ab ynIïn>hi-yKi ( (pois veja o que cria céus

novos e terra nova e não lembrarão as primeiras coisas). Nestas citações ocorre a

promessa de um novo acontecimento para o povo, comum na profecia do Dêutero-

Isaías. Não há necessidade de lembrar as coisas passadas, os sofrimentos do exílio.

284

Artigo + adjetivo feminino plural.

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Para Westermann, "este provérbio sobre as coisas antigas e coisas novas,

dá a impressão de ser um fragmento fora do seu proprio contexto”285. Segundo

Brueggemann:

É plausível que a frase "coisas antigas/passadas" referem-se à obra de juízo que tem dominado os capítulos 1-39 de Isaías, e que a frase "uma coisa nova" refere-se à restauração de Israel após o Exílio, um tema de destaque no Isaías tardio. Se assim for, podemos sugerir que o trabalho do servo, especificado nos versículos 6-7, é o trabalho de "coisas novas" pelo qual Israel é levado para um lugar novo, ou que "as nações" são trazidas para um modo de vida pretendida pelo criador. O povo de Israel agora decisivamente figura a novidade de Deus no mundo286.

As coisas novas lembram e atualizam a libertação. É nesse contexto de

exílio que poderemos compreender a força desse conceito "coisas novas". É uma

nova forma de compreender Deus e uma nova forma de viver a relação com ele a

partir do direito e da justiça.

1.9.9.2. Wab'_-hNEhi287 (adentraram)

Esta raiz verbal awb (vir) tem muitas ocorrências no Primeiro Testamento.

Ele ocorre aproximadamente 1.964 vezes. Com maior destaque em Gn 164 vezes,

1Sm 141 vezes, 2Sm 132 vezes, 1Rs 95 vezes, 2Rs 128 vezes. Nos profetas: Is 102

vezes, Jr 154 vezes, Ez 128 vezes. Nos salmos ocorre 68 vezes.

No Dêutero-Isaías ocorre 20 vezes. Is 40,10; 41,3; 41,22; 41,29; 42,9; 44,7;

45,20; 45,24; 47,5; 47,9, 47,9, 47,11, 47,11; 47,13; 48,3; 49,12; 49,18; 50,2; 51,11;

52,1.

Em Is 40,10 temos aAbêy" qz"åx'B. ‘hwIhy> yn"Üdoa] hNE“hi (eis o Senhor YHWH com

poder virá). Em Is 44,7 `Aml'( WdyGIïy: hn"aboßT' rv<ïa]w: (as que virão que as anunciem).

Esse é o contexto de um desafio lançado aos deuses que não podem anunciar as

coisas futuras. Em Is 48,3 `hn"abo)T'w: ytiyfiÞ[' ~aoït.Pi ~[e_ymiv.a;w> (e fiz ouvirem

285

WESTERMANN, 1977, p. 101. 286

BRUEGGEMANN, 1998, pp. 44-45. 287

Interjeição + verbo qal perfeito 3ª pessoa plural.

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subitamente, eu agi e vieram). Em Is 51,11 !AYci Wab'ÛW !WbªWvy> hw"÷hy> yyE“Wdp.W (e os

resgatados de YHWH retornarão e virão a Sião).

1.9.9.3. vd'x'288 (novo)

Dêutero-Isaías afirma que YHWH é o anunciador das coisas novas.

Segundo Marques e Nakanose, “no passado, Deus libertou o povo da escravidão do

Egito”. O mesmo irá fazer no momento presente, porém de maneira nova289.

1.9.9.4. dyGIëm;290 ynIåa]291 (eu o que relata)

Esta raiz verbal dgn (relatar) no hifil particípio ocorre 10 vezes no Primeiro

Testamento. Aparece pela primeira vez em Gn 41,24 yli( dyGIßm; !yaeîw> ~yMiêjur>x;h;(-la,

‘rm;aow" (e disse isso aos mágicos e ninguém me relatou algo). No Sl 19,2 `[:yqI)r"h'

dyGIïm; wyd"ªy"÷ hfeî[]m;W* (e trabalho de sua mão relata (proclama) a superfície extendida

(firmamento)). No Sl 147,19 bqo+[]y:l. Îwyr"äb'D>Ð ¿Arb'D>À dyGIåm; (o que relata sua palavra

a Jacó). Em Is 41,26 dyGI©m;-!yae @a:å (não ninguém relatara). Em Is 45, 19 `~yrI)v'yme

dyGIßm; qd<c,ê rbEåDo ‘hw"hy> ynIÜa] (eu YHWH o que diz justiça, o que declara direito). Em Is

46,10 ~d<Q<ßmiW tyrIêx]a; ‘ ‘tyviarEme( dyGIÜm; (o que anuncia do começo a parte que virá

depois). Em Jr 4,15 !D"+mi dyGIßm; lAqï yKi ²(uma voz faz-se ouvir de Dan).

A expressão dyGIëm; ynIåa] (eu o que relata) está em sintonia com Is 46,9b

~yhiÞl{a/ dA[ê !yaeäw> ‘lae ykiînOa' yKiä (pois eu Deus e não há outro Deus).

288

Adjetivo 289

MARQUES; NAKANOSE, 2004, p. 69. 290

Verbo hifil particípio masc. singular. 291

Pronome 1ª pessoa singular.

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1.9.9.5. hn"x.m;Þc.Ti292 ~r<j,îB.293 (antes de brotarem)

Esta raiz verbal xmc (brotar) ocorre 32 vezes no Primeiro Testamento. Em

Isaías ocorre 7 vezes. No Dêutero-Isaías ocorre três vezes no qal e uma vez no hifil.

Is 42,9; 43,19; 44,4 e 45,8.

O verbo ocorre pela primeira vez em Gn 2,5 xm'_c.yI ~r<j,ä hd<ÞF'h; bf,[eî-lk'w> (e

toda erva do campo não ainda brotado). Contexto do segundo relato da criação.

Em Is 43,19 xm'êc.ti hT'ä[; ‘hv'd"x] hf,Û[o ynI“n>hi (eis o que faz coisa nova

brotar). O sujeito é YHWH. Ele faz brotar coisa nova. Trata-se da esperança para o

povo exilado de retorno à Jerusalém. Em Is 44,4 ~ybiÞr"[]K; ryci_x' !ybeäB. Wxßm.c'w> (e

germinarão como ervas verdes em pleno deserto). Em Is 45,8 x:ymi’c.t; hq"Üd"c.W (e a

justiça germinará).

O verbo hn"x.m;Þc.Ti (brotarem) aparece nesta forma unicamente em Is 42,9.

Trata-se, então, de um termo singular no texto do Dêutero-Isaías, o que indica que

algo de novo está brotando. Uma esperança para o povo exilado está surgindo.

Deus comunicará, antes mesmo que venha a brotar.

1.9.9.6. ~k,(t.a,294 [ymiîv.a;295 (farei escutar a vós)

A raiz verbal [mv (escutar) ocorre aproximadamente 992 vezes no Primeiro

Testamento. No livro de Isaías 83 vezes. No hifil imperfeito a raiz verbal aparece 13

vezes no Dêutero-Isaías. Is 41,22; 41,26; 42,2; 42,9; 43,9; 44,8; 45,21; 48,3; 48,5;

48,6; 48,20; 52,7, 52,7.

292

Verbo qal imperfeito 3ª pessoa feminino plural. 293

Preposição + advérbio. 294

Partícula que indica objeto direto + sufixo na 2ª pessoa masc. plural. 295

Verbo hifil imperfeito 1ª pessoa singular.

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Em Is 41,22 `Wn[u(ymiv.h; (fazei-nos escutar). Trata-se da polêmica contra os

deuses que nada são. O verbo está no hifil imperativo plural. Em Is 41,26 `~k,(yrEm.ai

[;meÞvo-!yae @a:ï [:ymiêv.m; !yaeä (ninguém havia feito escutar, ninguém havia escutado

tuas palavras). Trata-se também da polêmica com os deuses da Babilônia. Em Is

44,8 ^yTiî[.m;v.hi (fiz escutar). Em Is 45,21 tazO“ •[:ymiv.hi ymiä (quem fez escutar isso).

Em Is 48,3 ~aoït.Pi ~[e_ymiv.a;w> Waßc.y" yPiîmiW (e de minha boca saíram e fiz escutar a

vocês rapidamente). Em Is 48,6 hT'[;ême ‘tAvd"x] ^yTiÛ[.m;v.hi (faço escutar a você

agora novidades). Em Is 48,20 #r<a'_h' hceäq.-d[; h'WaßyciAh tazOë ‘W[ymi’v.h; (fazei

escutar isso, façam sair para fora até a extremidade da terra). Em Is 52,7 ~Al±v'

[:ymióv.m; (faz escutar a paz). h['_Wvy> [:ymiäv.m; (faz escutar a salvação).

Aqui se trata de um anúncio feito por YHWH e o destinatário é a comunidade

exilada que receberá por primeiro essa promessa de salvação.

1.9.9.6.1. ~k,(t.a296 (a vós)

No livro de Isaías esta particula aparece nove vezes. Is 5,5; 28,19; 36,14;

36,15; 36,17; 36,18; 42,9; 50,1; 65,12. Vejamos alguns versículos.

Em Is 5,5 ~k,êt.a, aN"å-h['ydI(Aa ‘hT'[;w> (e agora eu farei declarar a vós). O

sujeito oculto do versículo é YHWH. Em Is 36,14 `~k,(t.a, lyCiîh;l. lk;ÞWy-al{) (não é

capaz de libertar a vós). Trata-se do rei Ezequias diante do rei da Assíria. Em Is

36,15 ~k,Ût.a, xj;’b.y:-la;w> (e não engane a vós). Em Is 36,17 ~k,Þt.a, yTiîx.q;l'w> (e para

eu levar a vós). Em Is 36,18 ~k,Ût.a, tySi’y:-!P, (e não engane a vós). Quem é o

destinatário dessa mensagem? A mensagem tem como destinatário um grupo em

especial. Tudo nos leva a crer que se trata de um grupo que verá coisas novas

acontecerem. A novidade é a esperança de retorno do exílio, onde Deus é o agente

296

Sufixo pronominal segunda pessoa do plural.

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da esperança e da libertação. E também nova compreensão da divindade e da

relação com ela.

1.10. Síntese do estudo da análise semântica e da exegese de Is 42,1-9

O estudo exegético de Is 42,1-9 e a análise semântica dos termos

fundamentais dessa perícope indicam-nos algumas pistas que podem clarear o

nosso conhecimento a respeito da identidade do Servo de YHWH e também da

Teologia do Servo. Nessa parte do nosso estudo, queremos retomar algumas

descobertas que fizemos ao longo dessa análise semântica e exegética dos termos

para uma maior compreensão do sentido do texto.

Neste nosso aprofundamento, vamos dividir a perícope em dois blocos.

Veremos as descobertas que fizemos no bloco de Is 42,1-4. E, a seguir, Is 42, 5-9.

Iremos dar preferência nesse aprofundamento de Is 42,1-9 para o

comentário que fizemos e da análise semântica do capítulo anterior. Portanto, aqui

trabalharemos com um texto corrido sem a preocupação de frisar um termo e

citações em hebraico.

No inicio da perícope e no primeiro versículo, abrindo o cântico temos uma

partícula demonstrativa. Essa partícula é traduzida por: "eis". Trata-se de uma

partícula muito usada nos textos do Dêutero-Isaías. Ela tem a função de apresentar

o Servo. YHWH aparece como sujeito oculto no versículo, porém é ele quem

apresenta o Servo.

Em seguida, vem o primeiro substantivo: "Servo". Demos preferência a essa

tradução, pois acreditamos que melhor traduz o relacionamento entre YHWH e o

Servo. O Servo é alguem muito íntimo de YHWH que podemos compreender a partir

do sufixo pronominal que está na primeira pessoa do singular: "meu". Aqui não se

trata de uma submissão, mas de uma pertença. Esse alguém ou esse grupo está

ligado a YHWH.

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120

A pergunta fundamental de nossa pesquisa diz respeito à identidade do

Servo. Quem é ele? Fomos verificar no contexto histórico do exílio da Babilônia e

deixamos também que o próprio texto e a exegese pudesse nos indicar algumas

pistas para responder a essa pergunta.

A partir da verificação em algumas citações bíblicas do Dêutero-Isaías,

intuimos que o Servo é mais que uma pessoa em particular. Ele pode ser

representado com uma identidade coletiva. Por isso assumimos o texto da

Septuaginta e os acréscimos VIakw,b o` pai/j mou (Jacó, meu Servo) e Israhl o`

evklekto,j mou (Israel, o meu eleito). Is 44,21 cita Jacó e Israel com a expressão: "tu

és servo meu, Israel". Ao fazer referência a Jacó e Israel em diversos textos,

Dêutero-Isaías faz memória do povo de Israel e parece indicar que uma comunidade

específica é assim chamada. Isso nos comprova a identidade do Servo de YHWH

como uma comunidade dos exilados na Babilônia. Sendo assim, Jacó e Israel

podem nos indicar um sinônimo para o Servo não pela raça e religião, mas pela

condição de oprimido.

Este Servo que é fragilizado, que vive em profunda crise de fé em meio a um

povo estrangeiro e que não tem referência política, é amparado por YHWH. Assim,

aparece o primeiro verbo da perícope que traduzimos por "suster". O sentido

primeiro que encontramos para esse verbo é que YHWH segura pela mão o seu

Servo. Então, o rito de tomar pela mão era muito significativo para uma liderança

política. Na função de governar, o rei pedia a proteção da divindade para levar

adiante o seu serviço. Percebemos também muitas ocorrências desse verbo "suster"

nos salmos. Por exemplo, no Sl 41,13 "eu na minha integridade, sustentei/amparei

você". Este verbo quer enfatizar proteção, cuidado e carinho num relacionamento

YHWH e Servo.

Em seguida, o Servo é escolhido, eleito. Esta escolha é uma iniciativa do

próprio YHWH. Notamos também que o termo vem acompanhado do sufixo

pronominal na primeira pessoa do singular: "meu". Aí temos uma preferência

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especial de YHWH pelo Servo, porém, não se trata de privilégios e sim de uma

iniciativa dele nessa escolha especial.

Outra expressão verbal é (se agradar). YHWH se agradou do Servo. É

importante notar que a mesma raiz verbal tem outro significado: expiar, pagar algo.

Tem, então, essa conotação de que uma culpa já foi paga. Daí que podemos dizer

que a comunidade exilada na Babilônia, no pensamento do Dêutero-Isaías já expiou

seus pecados e suas infedelidades. Ou seja, YHWH alegra-se e agrada-se desse

povo sofrido. Já não necessita ficar pensando nas coisas antigas. Temos, então, um

novo relacionamento entre o povo exilado e o próprio YHWH. Esse relacionamento é

marcado por um gesto de amor e de misericórdia.

A pessoa de YHWH, ou seja, o próprio ser de YHWH fica feliz com o Servo.

"se agradou minha pessoa, minha vida". Ainda como uma iniciativa do próprio

YHWH, o verbo "dar" o "espírito" ao Servo. Na expressão: "dei meu espírito sobre

ele". Isso denota mais uma vez uma entrega gratuita de YHWH, doando ao Servo

aquilo que é sua essência. Somente YHWH pode criar e doar seu espírito. O uso da

preposição "sobre ele" quer indicar que o Servo está sendo investido com uma

missão de liderança. Por isso, a missão é: "fazer sair o direito". Pela primeira vez no

cântico aparece esse substantivo: "direito". Este termo repete-se três vezes: Is

42,1.3-4.

Temos uma citação Is 51,4 que merece destaque. Aqui nesta citação diz:

"pois uma lei de mim farei sair e o meu direito para luz aos povos". Então, lei e

direito se complementam. A lei e o direito vêm da essência do próprio YHWH, assim,

também poderemos dizer que vem da sua Palavra. O Servo tem a missão de fazer

sair para as nações esse desejo do próprio YHWH. Já vimos que o direito é um

projeto de libertação e uma ação histórica. É o desejo de YHWH de reconstruir algo

que foi perdido e a comunidade exilada, entendida como Servo tem essa missão.

O direito de YHWH é para as nações. Em Is 45,20, tem uma expressão:

sobreviventes das nações. São os exilados ao longo da história e que se encontram

na diáspora espalhadas pela terra. O direito de YHWH compreende também uma

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reunificação de todos e uma utopia para o povo de Israel que está espalhado entre

as nações.

Fazer sair o direito é uma vontade de YHWH, contando com o serviço do

Servo. Importante remarcar que em Is 42,7 diz: "fazer sair desde a prisão

encarcerada, desde a casa de confinamento os que habitam de escuridão". Logo,

poderemos dizer que se trata de um projeto de libertação.

Depois de identificarmos a apresentação do Servo por YHWH e sua tarefa

específica: "fazer sair o direito" como mandato do próprio YHWH, veremos as

atitudes do Servo para levar adiante essa missão.

Em Is 42,2 "Ele não clamará e não erguerá e não fará escutar sua voz na

rua". Parece contraditório o silêncio do Servo, não seria melhor gritar em alta voz

denunciando a violência e as injustiças? Mas, aqui não se trata de passividade e

indiferença. Ele não quer repetir e não segue o costume imperial de exclamar em

público os decretos imperiais como faziam os reis. A atitude silenciosa não deixa de

ser profética e libertadora.

Outra atitude do Servo e de profunda humanindade, podemos ver a partir de

duas expressões: Is 42,3 "cana a que é despedaçada não quebrará e pavio vacilante

não extinguirá ". São duas metáforas para a situação que viviam os exilados. Aquilo

que é desprezado e que não serve mais é recuperado e valorizado pela atitude do

Servo. Esse povo já quase morto e condenado à morte é valorizado. Na fraqueza do

povo exilado, surge a esperança.

E em Is 42,4 "o Servo não desanimará e não despedaçará, até por na terra

direito e a instrução dele, ilhas esperarão". Diante da realidade de sofrimento e falta

de esperança, o servo guarda uma firmeza para levar adiante a missão que é do

próprio YHWH: fazer sair o direito.

Fazer o direito sair para as nações e a tarefa do Servo. O direito é

compreendido como o projeto de libertação que é a essência do próprio YHWH. O

servo é amparado, recebe o espírito de YHWH para realizar essa missão. Suas

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atitudes são silenciosas, não violentas. E seu gesto é de solidariedade com o fraco e

abatido. Ele reforça sua atitude e não desanimará até que o projeto de libertação

aconteça.

Assim, em Is 42,1-4. Temos a apresentação do Servo por YHWH. Esse

Servo tem uma preferência especial de YHWH que percebemos através do sufixo

pronominal na primeira pessoa do singular “meu” e da missão “fazer sair o Direito”. E

em seguida, de que maneira ele levará adiante esse serviço? Então, temos suas

atitudes, sua firmeza e seu gesto solidário.

Veremos, agora, a segunda parte do cântico que começa no v.5 com a

fórmula do mensageiro: "assim, disse o Deus YHWH".

O verbo dizer está no qal perfeito e na terceira pessoa do singular: "disse".

Isto revela uma palavra dita. YHWH disse, relembra a atuação de Deus na história

como Palavra sempre atuante. Em seguida, os verbos encontram-se no qal

particípio: "o que cria os céus e o que os estende, o que estira a terra, e os produtos

dela, o que dá alento para o povo que vive sobre ela, e espírito para os que andam

nela". A ação de YHWH é contínua e o agente da criação é YHWH. Ele é capaz de

realizar tal ação no mundo. Por isso, ele é "O" Deus YHWH. O artigo reforça a

singularidade e a identidade dele. Em outras palavras, ele é único e verdadeiro. O

nome YHWH está ligado à origem da fé javista. Em Ex 3,14 com a expressão: "eu

sou aquele que sou" quer comunicar a novidade da revelação de YHWH. Essa

revelação está presente na história da salvação como um Deus atuante na história.

Num contexto de crise de fé e num contexto de escravidão e diante de uma

realidade cultural e religiosa, sendo uma forte ameaça à unicidade de YHWH, o

Dêutero-Isaías insiste no resgate do nome de YHWH na memória histórica e na sua

identidade.

Ao dizer que YHWH é o que cria os céus e a terra e os seus produtos, o

Dêutero-Isaías quer indicar o poder de YHWH diante dos deuses. Ele é capaz de

criar. Em Is 43,7 diz: "todo o que chama por meu nome e para minha glória, criei,

formei e também fiz". Essa é uma característica do próprio YHWH em sua

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capacidade de criar a natureza ou em sua manifestação na história ao criar coisas

novas.

YHWH é aquele que deu alento para o povo que vive sobre a terra e o

espírito para os que andam nela. Em Is 42,1, YHWH deu o seu espírito ao Servo. E

aqui ele dá o seu espírito ao povo. Podemos intuir que o Servo que aparece no v.1 é

o mesmo povo que se encontra nesse versículo. Em Is 40,29 diz que YHWH é o que

dá, ao fraco, energia. Sendo assim, esse povo fraco e abatido recebe esse dom do

alento e da energia para prosseguir sua missão.

Eu YHWH te chamei em justiça. Aqui retoma a identidade dele onde ele

apresenta-se. Chamar alguém é atrair para si. Aqui o povo exilado é chamado em

justiça. O termo justiça são critérios de profunda relação entre o ser humano e Deus

e de relações entre os seres humanos. A justiça é o valor supremo da vida em todas

as suas dimensões. Desde os tempos antigos, o povo de Israel celebrou YHWH

como aquele que comunica a seu povo o dom universal da justiça.

YHWH é aquele que segura firme a mão do Servo. Esse gesto é

compreendido como um gesto político na perpectiva de liderança. O Servo é

protegido por YHWH. Ele é instituído como aliança de povo e luz de nações. Aqui

nasce um novo modelo de liderança política. Aliança é compromisso num novo

modelo de vida comunitária baseada no direito, na justiça e na solidariedade. E luz

das nações é um projeto de salvação divina. É o projeto libertador de YHWH que

está fundamentado no direito e na justiça.

Is 42,7 revela o direito de YHWH e a tarefa primordial do Servo. "Para abrir

olhos cegos; para fazer sair desde a prisão encarcerado, desde a casa de

confinamento os que habitam de escuridão". Neste versículo está presente o direito

e a justiça. Revela o sofrimento do exílio e de todos os exílios ao longo da história.

Revela a ausência da liberdade em todos os sentidos. Cadeia e escuridão são

metáforas da opressão. A preposição "para" indica a missão específica do Servo.

Indica um serviço para entrar nesse projeto de libertação.

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125

Em seguida, YWHW se revela com o seu nome que poderíamos traduzir

como justiça e direito para os sofredores deste mundo e que essa sua identidade ele

não transfere para ninguém e nem para os ídolos. Ele quer ser glorificado como o

Deus da Justiça, do Direito e da liberdade.

E o texto finaliza com a expressão: as primeiras coisas eis que vieram; e as

novas eu o que relata, antes que brotem, farei escutar a vós.

As primeiras coisas revelam os sofrimentos do exílio e são as coisas antigas.

As coisas novas são o novo projeto de vida e liberdade - um novo modo de vida

segundo o direito dos pobres. Eu o que relata revela o Deus que anuncia em

primeira mão. Ele é o primeiro a comunicar a novidade. Antes que brotem, YHWH

aponta para o novo que irá surgir. Trata-se da esperança que ele faz escutar ao

povo exilado.

1.11. Tradução como conclusão do estudo semântico

Após a análise semântica, apresentamos uma nova tradução do texto de Is

42,1-9.

V.1 Eis Jacó meu Servo, susterei a ele, Israel, meu escolhido, se agradou a minha

pessoa; dei o meu espírito sobre ele, direito para as nações fará sair.

V.2 Não clamará e não erguerá; e não fará escutar na rua a voz dele.

V.3 Cana a que despedaçada não quebrará e pavio vacilante não extinguirá; para

verdade fará sair direito.

V.4 Não desanimará e não despedaçará até pôr na terra direito; e a instrução dele

ilhas esperarão.

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V.5 Assim, disse o Deus YHWH, o que cria os céus e o que os estende, o que estira

a terra, e os produtos dela; o que dá alento para o povo sobre ela, e espírito para os

que andam nela.

V.6 Eu, YHWH, te chamei em justiça, e agarrarei firme a tua não; e te guardarei, e te

colocarei como aliança de povo, como luz de nações;

V.7 Para abrir olhos cegos; para fazer sair da prisão encarcerado, de casa de

confinamento os habitantes da escuridão.

V.8 Eu, YHWH, esse é o meu nome; e minha glória para outro não darei e o meu

louvor para imagens esculpidas.

V.9 As primeiras coisas adentraram; e as novas eu o que relata, antes de brotarem,

farei escutar a vós.

Entraremos a seguir, no segundo capítulo do nosso estudo. Neste capítulo,

apresentaremos um panorama histórico dos grandes impérios, os diferentes exílios,

suas consequências e o contexto histórico do Dêutero-Isaías. Vejamos.

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127

CAPÍTULO II

2. Contexto histórico do Dêutero-Isaías

Um texto bíblico tem um chão e uma realidade histórica bem concreta. O

texto do Primeiro Cântico do Servo de YHWH que se encontra em Is 42,1-9 teve um

lugar histórico e uma comunidade e autor que foram agentes desse texto. Por isso,

num primeiro momento e na primeira parte de nosso estudo, entramos no texto

procurando compreedê-lo a partir da análise literária. Neste segundo capítulo,

queremos fazer uma caminhada histórica, revendo momentos significativos na

história do povo de Israel. Por isso, iniciaremos esse estudo a partir do momento em

que a Assíria assume o poder e estabelece o seu domínio. Do ponto de vista dos

que viviam em Judá, merece destaque a figura do rei Ezequias, da sua rebelião e do

seu projeto de reforma. Em seguida, a Assíria entre em decadência e, com isso,

outro rei de Judá, Josias, entra em cena e implanta uma reforma. Surge nesse

cenário político, o Egito e este quer estabelecer o seu domínio, porém a Babilônia

surge com toda força imperial. Para o nosso estudo, esse período histórico é muito

significativo, pois aqui poderemos compreender a atuação do Dêutero-Isaías. Então,

vericaremos, os exílios que aconteceram ao longo da história de Israel, a situação

dos deportados e dos exilados na Babilônia. E finalmente outra potência assume o

poder: a Pérsia. É nesse contexto que o texto do Dêutero-Isaías pode ser

compreendido como uma luz e uma novidade para os exilados. Vejamos, então,

esse panorama histórico.

2.1. O domínio assírio

A partir da segunda metade do século 8 a.C., a Assíria foi a grande potência

internacional. Em 2Rs 15,19.29 diz que Pul, rei da Assíria, invadiu a terra297. Pul,

297

BÍBLIA. PORTUGUÊS. Tradução Ecumênica. São Paulo: Loyola, 1994, p. 566. Conf. Nota "m".

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128

nome adotado por Tiglat-Piléser III (745-727 a.C.), rei da Assíria, quando estendeu

seu reinado à Babilônia. Segundo Bonh Gass:

Seu interesse maior era controlar o acesso terrestre ao Egito. Para que seu objetivo fosse alcançado, teria que dominar as rotas comerciais que passavam pela Fenícia, pela Filistéia, por Israel e por Judá. Por isso, realizou várias incursões na região298.

Teglat-Falasar III era um grande imperador e um hábil militar. Ele

modernizou e equiparou seu exército e, juntamente com seus sucessores, tinham

uma tática militar chamada de "guerra de conquista". De Paula Pedro e Nakanose

dizem:

Segundo essa tática, o império impunha progressivamente seu domínio sobre as nações dependentes através de três etapas de vassalagens: imposição pela força militar e de um tributo anual (...) deposição do rei em exercício e imposição de um novo rei de confiança do império e deportação de parte da população (...) perda da independência, tomada da capital. O estado vassalo se transformava numa província assíria (...) foi o que aconteceu com Israel em 721 a.C. 299.

Foi nos anos 670-650 a.C. que a Assíria chegou ao máximo de sua

expansão e seu domínio chegou ao Egito300. A primeira campanha da Assíria foi

contra Damasco, na Síria em 738 e Israel em 734 a.C.301. Israel e Damasco uniram-

se buscando controlar o poder da Assíria e também pressionaram Judá para entrar

nessa aliança. Porém, em 733 a.C., Judá, pediu a proteção dos assírios buscando

se defender da pressão e do poder militar de Damasco e de Israel302. O preço dessa

ajuda foi incluir Judá entre os países vassalos da Assíria303. Judá entrou nessa

primeira etapa de vassalagem à Assíria, com a obrigação de pagar pesados

impostos (2Rs 16,8-9)304. Enquanto isso, Israel passava para a segunda fase da

298

BONH GASS, Ildo. Uma Introdução à Bíblia. Reino Dividido. São Leopoldo/São Paulo: CEBI/Paulus, vol. 4, 4ª ed., 2003, pp. 77-78. 299

NAKANOSE, Shigeyuki; DE PAULA PEDRO, Enilda. Como Ler o Primeiro Isaías. São Paulo: Paulus, 1999, pp. 18-19. 300

BOHN GASS, 2003, p. 78. 301

Ibidem, p. 78. 302

Ibidem, p. 79. 303

NAKANOSE; DE PAULA PEDRO, 1999, p. 19. 304

Ibidem, p. 19.

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129

vassalagem, perdendo suas terras férteis, cidades estratégicas e tendo um rei

imposto pelo império assírio (2 Rs 15,29-30)305.

Nesse período, Acaz (734-727 a.C.), o rei de Judá, foi atendido por Teglat-

Falassar III, tendo que se submeter às exigências dos assírios. Ele rendeu também

culto aos deuses, dando a eles maior destaque no templo de Jerusalém do que a

YHWH306. Assim, o culto estatal foi instalado no templo de Jerusalém307.

O rei da Assíria arrasou Damasco e conquistou grande parte do Reino do

Norte, deixando apenas a cidade de Samaria e arrredores, as montanhas de

Efraim308. Levou seus habitantes deportados para Assíria (2 Rs 15,29). Esta é a

chamada guerra Siro (Damasco)-Efraimita (Israel), ocorrida entre 735 e 734 a.C.309.

Como ja falamos, fazia parte da estratégia de dominação dos assírios a

deportação de parte dos povos subjulgados, especialmente de suas elites e

lideranças das cidades.

Em 722 a.C.: Dez anos depois, durante a tomada da Samaria por

Salmanassar V e Sargão II (722-705 aC.), houve nova deportação (2 Rs 17,1-6; 18,

9-12). Foi o fim do Reino de Israel310. Os assírios trouxeram habitantes de outras

cinco nações de seu vasto império para assentá-los nas cidades israelitas, dando

origem aos samaritanos (2Rs 17,24)311.

Em 701 a.C.: Desta vez, os assírios deportaram parte da população de Judá,

o Reino do Sul. Nos anais de Senaquerib consta que ele deportou 200.150

habitantes de Judá312.

Fica evidente que no processo de dominação dos grandes impérios e, no

caso aqui da Assíria, o domínio dá-se através da conquista da região pela força

305

NAKANOSE; DE PAULA PEDRO, 1999, p. 19. 306

BOHN GASS, 2003, p. 79. 307

Ibidem, p. 79. 308

Ibidem, p. 79. 309

NAKANOSE; DE PAULA PEDRO, 1999, p. 40. 310

Ibidem, p. 81. 311

BOHN GASS, 2003, p. 81. 312

Ibidem, p. 81.

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130

militar, a imposição de pesados tributos e, também, pela deportação de parte da

população e da liderança política local, colocando no lugar deste alguém escolhido

por aquele que tem o controle político e militar.

2.1.1. A reforma e a rebelião de Ezequias (727-698 a.C.)

Nesse processo de dominação do império assírio, alguns reis procuraram se

defender e promover uma rebelião, foi o caso do rei Ezequias.

Após a destruição do Reino do Norte pelos assírios, sobrou o Reino do Sul.

Ao mesmo tempo em que sua condição era de vassalagem, Judá tornou-se o único

herdeiro das antigas tradições de Israel313. Nesse contexto o rei Ezequias promoveu

uma ampla e importante reforma política e religiosa. Sua intenção era de anexar

novamente as terras que antes pertenciam ao estado de Israel314. Ou seja, anexar

essas terras aos seus domínios.

Sua reforma, do ponto de vista religioso, queria reunir todo o povo em torno

de um só Deus e de um só rei; combater a idolatria; centralização do culto a YHWH

em Jerusalém; cumprimento dos mandamentos. Importante descartar um grupo

influente na corte de Ezequias: são escribas especialistas em sabedoria e leis e

esse grupo mais tarde seria chamado de deuteronomistas315. A reforma de Ezequias

teve êxito porque Sargão II não interveio em Judá, uma vez que estava ocupado

com outras revoltas em seu império316.

Com a morte de Sargão II, todo império assírio sofreu constantes revoltas

internas. A Babilônia conquistou sua indepêndencia. Ezequias aproveitou-se dessa

situação e da disputa pelo trono assírio e deixou de pagar os tributos, que Judá

pagava desde 733 aC. Então, ele liderou esse movimento antiassírio dos pequenos

reinos da região.

313

BOHN GASS, 2003, p. 81. 314

Ibidem, p. 81. 315

Ibidem, p. 82. 316

Ibidem, p. 83.

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131

Ao romper com a Assíria, Ezequias fez aliança com o Egito (2Rs 18,21). E

ainda Ezequias conquistou a Filistéia (2Rs 18,8)317. Ele estava planejando uma forte

batalha contra a Assíria. Ele fortificou a cidade de Jerusalém e com muita

inteligência bélica queria reconquistar o pleno poder político da dinastia de Davi318.

Ezequias reforçou as muralhas da capital e outras fortificações, as armas

foram vistoriadas e aumentadas, o sistema de abastecimento de água foi revisado e

consertado. Porém, todo esse empreendimento foi em vão, e a coalizão antiassíria

foi desastrosa para a reforma de Ezequias. O novo rei da Assíria veio como um rolo

compressor. Senaquerib (704-681 a.C.), segundo documentos assírios tomou 46

cidades de Judá, cercou Jerusalém sem tomá-la, deportando parte considerável da

população do Reino do Sul. A invasão de Judá pelos assírios é descrita em 2Rs

18,13-37 e 19,9-35.

Depois de três anos de cerco, os assírios se retiraram em 701 a.C. Uma das

hipóteses da retirada é a de que Ezequias tenha voltado a pagar tributos, renovando

o contrato de vassalagem (2Rs 18,13-16).

Manassés, filho e sucessor do rei Ezequias, continuou submisso ao rei da

Assíria Senaquerib, pagando-lhe tributos319. Ele foi subserviente aos assírios,

praticando muita violência contra seu próprio povo (2Rs 21,16). Seu governo durou

mais de meio século. E não se entende notícias de resistência do movimento

profético durante seu reinado. Quem ousasse resistir tinha destino certo320. Ao

morrer, seu filho Amon (643-641 a.C.) assumiu o trono, trilhando os mesmos

caminhos do pai321. Foi assassinado no palácio por seus próprios ministros, que

conspiraram contra ele322.

317

BOHN GASS, 2003, p. 83. 318

Ibidem, p. 84. 319

Ibidem, p. 116. 320

Ibidem, p. 117. 321

Ibidem, p. 118. 322

Ibidem, p. 118.

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132

2.1.2. A decadência do império assírio a partir de 625 a.C

Os egípcios e os babilônios reagiram à violência e opressão dos assírios. O

declínio do império assírio acentuou-se depois da morte de Assurbanipal, isto é, a

partir de 625 a.C.323. Nabopolassar, rei da Babilônia (626-605 a.C.), com a ajuda dos

medos, conquistou dos assírios a cidade de Assur (614 a.C.) e arruinou a capital

Nínive em 612 a.C.324 O profeta Naum já anuncia "Oráculo sobre Nínive". Esta

cidade localizava-se na margem do rio Tigre na Mesopotâmia. A história de Nínive é

muito antiga. O rei Senaquerib, reconstruiu e a ampliou. Assurbanipal aumentou

ainda mais a grandeza da cidade. A cidade tornou-se símbolo da opressão325. Diz

Bohn Gass, "a mensagem que Naum quer nos deixar ao falar do fim de Nínive é que

os grandes poderes deste mundo não permanecem para sempre, não são

eternos"326. Foi o início do fim do império assírio, que caiu definitivamente em 605

a.C.

Quando o poder dos grandes impérios começa a ruir e a enfraquecer, uma

esperança aos povos subjugados por dias melhores surge no horizonte. Foi o que

aconteceu aos judaítas, quando o poder dos assírios começou a esfacelar-se.

Nesse novo contexto internacional, surge um movimento de resistência

promovida pelos sacerdotes levitas, nos santuários de YHWH, reagindo contra a

adoção de divindades assírias e à corrupção das lideranças religiosas e políticas,

em Jerusalém.

Por outro lado, o profeta Sofonias também anunciou tempos novos.

Enquanto disputavam o poder, os egípcios e os babilônios, o rei Josias, tal como

fizera o rei Ezequias 80 anos antes, promoveu uma grande reforma interna,

suspendendo também o pagamento a Assíria.

323

BOHN GASS, 2003, p. 123. 324

Ibidem, p. 123. 325

Ibidem, p. 131. 326

Ibidem, p. 133.

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2.1.3. A reforma de Josias (640-609 a.C.)

Enquanto Josias ainda era criança, quem de fato assumiu o poder e definia

a política no Reino do Sul foi o "povo da terra". Esse grupo é mencionado em Sf 1,8-

9 e parece referir-se a ministros, príncipes e os que enchem a casa de seu Senhor

com o produto da violência e da perfídia. E, também, estavam submetidos à política

dos assírios327. Então, os homens livres, proprietários de terra em Judá, assumiram

o poder, enquanto o menino, que tinha apenas oito anos, crescia e era preparado

para ocupar o trono (2Rs 22,1-2)328. Ao entronizar um menino de oito anos, o "povo

da terra" estava na verdade, entronizando-se a si mesmo. Governou de 640 a 632

a.C., quando assumiu Josias aos 16 anos de idade329.

Durante seu reinado, Josias sacudiu o jugo assírio que, a essa altura, já se

encontrava em declínio. Enquanto não se definia o sucessor dos assírios no cenário

internacional, o rei Josias tentou conquistar mais espaço na política e ampliar o seu

reino330.

Ele expandiu seu território para o norte, anexando terras antes pertencentes

a Israel (2Rs 23,15-20). Para isso, reforçou o exército e aumentou a tributação. É

nesse contexto que poderemos entender a reforma que o mesmo empreendeu em

622 a.C. Em 2Rs 22,3-23,27, ele fez de Jerusalém o centro político e religioso de

seu estado. Destruiu os santuários de YHWH que havia nas aldeias do interior,

como exemplo, o de Betel. Além disso, acabou com os cultos cananeus e assírios

que eram realizados no templo de Jerusalém e nos lugares altos do interior331.

O profeta Jeremias não poupou críticas à reforma de Josias. Ele avaliou a

reforma como superficial (Jr 3,10; 8,8). Então, a reforma beneficiou a uns e

prejudicou a outros. O pessoal de Jerusalém, especialmente a casa real, os

327

BOHN GASS, 2003, p. 124. 328

Ibidem, p. 135. 329

Ibidem, p. 135. 330

Ibidem, p. 136. 331

Ibidem, p. 136.

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comerciantes, a classe sacerdotal sadoquita do templo e seus funcionários foram os

maiores beneficiados e o povo da terra332.

Por outro lado, afirma Bohn Gass:

Alguém teve que pagar o preço dessa reforma. As mudanças promovidas por Josias prejudicaram muita gente (...) uma vez que a reforma foi uma decisão da nobreza de Jerusalém (...) por isso, houve resistência, especialmente de três grupos: os sacerdotes levitas do interior; o campesinato; os samaritanos, os antigos israelitas do Norte333.

Josias foi o segundo rei a propor mudanças importantes em Judá. Ezequias

já havia iniciado. Josias teve mais sorte, pois implantou seu projeto durante 13

anos334. Diz Bonh Gass:

Proibindo o culto fora de Jerusalém, controlando o culto de templo e, aproveitando-se do declínio da Assíria, libertou-se do jugo dos assírios e livrou o povo da dupla tributação, conseguindo, até certo ponto, uma maior justiça social. É que antes o povo precisava pagar tributos para os assírios e também para o templo e a corte de Jerusalém. Agora, embora de forma mais centralizada, só pagava para Jerusalém335.

Para deter o avanço dos babilônios, os egípcios foram combatê-los. Josias

não quis permitir a passagem do faraó Necao (609-594 a.C.) em seu território. Por

isso, foi morto pelo faraó em 609 a.C., em Meguido (2Rs 23,28-30)336.

2.2. A dominação egípcia

Há muito tempo o Egito e a Babilônia lutavam para garantir o poder e o

domínio internacional. Uma vez derrotados os assírios, o controle de Judá ficou com

os egípcios de 609-605 a.C.

332

BOHN GASS, 2003, p. 137. 333

Ibidem, p. 137. 334

Ibidem, p. 140. 335

Ibidem, p. 140. 336

Ibidem, p. 148.

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Em 609 a.C., com a morte de Josias, assumiu seu filho Joacaz (2Rs 23,31-

35), que reinou somente 3 meses337. O faraó Necao o depôs, levando-o prisioneiro

para Rebla e depois para o Egito. Em seu lugar, colocou seu irmão Eliacim,

mudando-lhe o nome para Joaquim, para sublinhar sua condição de dependência

(609-598 a.C.)338.

2.3. A dominação da Babilônia a partir de 605 a.C

Em 605 a.C., numa outra batalha, o rei babilônio Nabucodonor (605-562

a.C.) venceu o faraó Necao em Carquemis, junto ao rio Eufrates, e em seguida,

derrotou definitivamente o império assírio339.

A partir de 604 a.C., Nabucodonosor submeteu o rei Joaquim, tornando-o

um de seus vassalos (2Rs 24,1)340.

Segundo as informações de 2Rs 23,37 e Jr 22, o rei Joaquim foi avarento e

cruel. Construiu suntuoso palácio com trabalho forçado. Segundo Jr 22,17 "só tens

olhos e coração para o lucro, para derramar o sangue inocente, para agir com

brutalidade e selvageria". "Joaquim foi favorecido com a centralização do culto em

Jerusalém, feita na reforma de seu pai Josias"341.

Em 600 a.C, Joaquim tentou livrar-se do jugo da Babilônia, suspendendo o

pagamento de Tributos (2Rs 24,1), mas isso custou caro a Judá342.

Havia um forte interesse da Babilônia e do Egito em controlar as terras de

Judá, pela posição estratégica que esta tinha entre esses grandes impérios. Diz

Bonh Gass "certamente essa posição estratégica foi a causa principal da destruição

337

BOHN GASS, 2003, p. 149. 338

Ibidem, p. 149. 339

Ibidem, p. 150. 340

Ibidem, p. 150. 341

Ibidem, p. 150. 342

Ibidem, p. 150.

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136

e deportação"343. "Esse corredor de passagem localizava-se entre os vales férteis

do rio Nilo, na África e dos rios Tigre e Eufrates, na Mesopotâmia"344.

Com a morte de Joaquim, seu filho Joaquin (598 a.C.) o sucedeu no trono.

Ele reinou apenas três meses, pois Nabucodonosor veio com todo seu poderio

militar. E Joaquin entregou-se. Segundo Donner:

As tropas entraram na cidade. O templo de Javé foi saqueado e suas preciosidades foram levadas para Babilônia. O rei Joaquin levado para o exílio, juntamente com os membros da classe alta, da nobreza, dos sacerdotes, artesãos345.

Essa foi a primeira deportação para a Babilônia. No lugar de Joaquin, a

Babilônia colocou Sedecias.

Em 587/588 a.C., Sedecias, também persuadido pelo Egito, decidiu pelo

rompimento com a Babilônia. Segundo Jr 37,5, Sedecias poderia ter recebido apoio

militar do Egito durante o segundo sítio de Jerusalém. E o profeta Jeremias alerta

contra esse empreendimento suicida. Isso podemos perceber em Jr 37-38. Segundo

Donner, "assim, veio o que tinha de vir: Nabucodonosor II decidiu acabar com a

relativa autonomia política do reino de Judá e passá-lo para o 3º estágio de

vassalagem346. O exército babilônio cerca Jerusalém. Sedecias não se rende. A

Babilônia faz um longo cerco, até o povo começar a morrer de fome dentro da

cidade. Lm 1,3 diz: "Judá é deportada em humilhação". Lm 1,11: "seu povo todo

geme: procuram pão, entregam seus encantos por alimento, para se reanimar". Tal

era a situação da população. Então, Nabucodonosor invade a cidade, mata a família

real com o rei, que tentou uma fuga desesperada. É a segundo deportação. No lugar

de Joaquin, Nabucodonosor coloca Godolias.

Segundo Donner, "lamentavelmente não é mais possível descobrir como

Nabucodonosor lidou com o território do Reino de Judá do ponto de vista técnico-

343

BOHN GASS, 2003, p. 150. 344

Ibidem, p. 150. 345

DONNER, Herbert. História de Israel e dos povos vizinho. Vol. 2, Petrópolis/São Paulo: Vozes/Sinodal, 1997, p. 425. 346

Ibidem, p. 429.

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137

administrativo"347. "Nabucodonosor encarregou um judaíta de Jerusalém da delicada

missão de criar, de novo, uma situação ordenada na terra devastada e esvaída em

sangue"348. Essa missão ficou para Godolias. Ele fixou residência, não em

Jerusalém, mas em Masfa, porque Jerusalém estava destruída. Diz Donner

"contudo, não demorou e ele e seus sequazes em parte judaítas, em parte

babilônios foram assassinados por um grupo de fanáticos"349. Estes eram

memmbros da casa de Davi, ou daviditas. Então, deu-se a terceira deportação.

Com relação ao número da população deportada pelos babilônios, a maioria

dos especialistas pensa em torno de 5 a 10% da população total de Jerusalém e

Judá. Isso daria em torno de 4.600 para três deportações350. R. Albertz argumentou

que este número é baixo demais. Ele conjetura que cerca de 25% da população

judaíta foi para o exílio, cerca de 18.000 pessoas mencionadas em 2Rs 24,14.16351.

2.4. Exílios e cativeiros

O Exílio na vida do povo de Deus não foi uma exceção, mas quase uma

regra. Seus dias foram marcados por constantes exílios: dias de peregrinação, dias

de diáspora352. Apresentaremos um quadro dos exílios e cativeiros353, pois o estudo

que realizamos do Dêutero-Isaías situa-se no tempo do exílio na Babilônia.

Exílios e cativeiros

734 Assíria 2Rs 15,29

722 Mesopotâmia 2Rs 17,6.23

701 Assíria 2Rs 18,32-33

669 Babilônia 2Cr 33,11-13

347

DONNER, 1997, p. 431. 348

Ibidem, p. 431. 349

Ibidem, p. 431. 350

RÖMER, Thomas. A chamada história deuteronomista Introdução sociológica, histórica e literária. Petrópolis: Vozes, 2005, p. 111. 351

RÖMER, 2005, p. 111. 352

ROSSI, Luiz Alexandre Solano. Cativeiro da Babilônia: uma crise criativa. In: Estudos Bíblicos n. 43. São Leopoldo/ Petrópolis: Sinodal/Vozes. 1994, p. 39. 353

ROSSI, 1994, p. 39.

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604 Babilônia 2Cr 36,6; Dn 1,2

597 Babilônia 2Rs 24,10-17

589 Moab, Edom, Amon Jr 40,11; 43,5

587 Babilônia 2Rs 25,1-30

586 Egito Jr 43,4-7

582 Babilônia Jr 52,30

? Egito Jr 44,1

De todos os exílios acontecidos, o cativeiro da Babilônia é a referência e

cativeiro padrão. É expressão do que se passou com todo o povo354. Percebe-se,

então, que o exílio da Babilônia é ponto de referência obrigatório, pois se misturam

sentimentos ambíguos: arrependimento, saudade, crise, angústia, dor, incerteza,

esperança, fé, memória e vontade de recomeçar355.

O processo de exílio teve início no séc. VIII, quando renasciam as grandes

potências e atingiu sua crise aguda no século VI, com o cativeiro da Babilônia356.

Os três grandes impérios: Egito, Assíria e Babilônia adotavam políticas

semelhantes aos países conquistados. Para evitar revoltas, o conquistador

desterrava parte da população.

Vejamos a seguir as deportações.

2.4.1. A situação dos exilados na Babilônia

Os escritos atribuídos ao profeta Ezequiel como sacerdote e, assim, como

membro da elite ele é levado ao exílio em 597 a.C. Com relação à situação dos

exilados na Babilônia, temos uma visão limitada da forma de vida dos exilados357.

Eles moravam em colônias fechadas. O próprio Ezequiel menciona Tel Abib (Ez

354

ROSSI, 1994, p. 40. 355

Ibidem, p. 40. 356

Ibidem, p. 40. 357

KESSLER, 2009, p. 162.

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139

3,15). Alguns documentos neobabilônicos registram nomes judaicos na região de

Nipur e em Sipar358. Com relação aos que foram deportados em 597 a.C., do

primeiro grupo. Estes exilados podem promover reuniões nos seus lugares de

moradia. Os anciãos funcionam como seus representantes, sendo designados como

anciãos de Judá (Ez 8,1). A carta de Jeremias mostra também que havia um contato

fluido entre os exilados e os que permaneceram na pátria, pelo menos entre a

primeira e a segunda deportação, portanto entre 597 e 586 a.C. 359.

Não existem conhecimentos sobre as relações dos exilados que viviam em

colônias com o rei Joaquim e seu círculo que vivia na corte na Babilônia360.

Do primeiro grupo de deportados, segundo Donner:

As pessoas têm uma imagem errônea da vida dos exilados na Babilônia. Veem-se os deportados numa situação miserável, realizando duro trabalho escravo sob a opressão de capatazes estalando o relho, como um exército de prisioneiros dignos de compaixão361. Segundo ele, os sofrimentos eram interiores e não se baseavam em suas condições de vida362.

Já do segundo grupo de deportados, Gallazzi afirma:

Não podemos, porém, esquecer que outras pessoas foram levadas à Babilônia, não como reféns do estado, mas como presa e saque dos soldados, e lá foram submetidas à servidão mais dura, sem nenhuma autonomia ou reconhecimento de direitos. Entre elas, sobretudo, estavam as mulheres, sempre as maiores vítimas da violência de guerra. Estas mulheres e seus filhos, frutos de tanta violência, proclamam seu sofrimento e sua esperança através das páginas do Dêutero-Isaías (Is 40-55)363.

2.4.2. O declínio do império babilônico

358

KESSLER, 2009, p. 162. 359

Ibidem, p. 163. 360

Ibidem, p. 163. 361

DONNER, 1997, p. 435. 362

Ibidem, p. 453. 363

GALLAZZI, Sandro. Israel na História seu povo, sua fé, seu Livro. São Leopoldo: CEBI, 2011, p. 113.

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O reino persa é construído pelo aquemênida Ciro II no espaço de duas

décadas com base num pequeno estado até chegar a um grande império, que

domina não somente o altiplano iraniano, mas, também, toda a Ásia Menor até a

costa do Mar Egeu. No ano de 539, Ciro entra sem resistência na Babilônia, torna-se

rei ali e herda as possessões babilônicas, que alcançam até a fronteira do Egito364.

Desta maneira, tornam-se subalternos do rei persa, não somente os judeus no exílio

babilônico, mas, também, as províncias, que desde a época dos assírios e do

neobabilônios encontravam-se na área dos antigos estados de Israel e Judá365.

O império da Babilônia, com o passar do tempo, fica rodeado por inimigos. E

então, havia sucessivas guerras. Na questão interna, havia dificuldades no campo

religioso, no qual o rei Nabônides era um adorador da divindade Sin, simbolizado

pela lua e tenta colocar essa divindade como oficial. Os sacerdotes e os adoradores

de Marduk sentiram-se ofendidos com tal atitude, pois este era a divindade oficial,

representada pelo sol.

As constantes guerras e o conflito religioso enfraqueceram o império.

Segundo Marques e Nakanose:

Na Babilônia, a vida se tornou quase insuportável. A situação econômica era um caos. Os preços de todos os produtos subiram cerca de 50% entre os anos 560 e 550 a.C. E nos anos seguintes, chegaram a 200% de aumento. O campo estava abandonado. A população pobre era a principal vítima da crise. A situação para quem era cidadão ou cidadã da Babilônia ficou ruim, porém muito pior para os povos dominados, que eram forçados a trabalhar como mão-de-obra semiescrava na agricultura e em obras públicas366

Com essa situação política, econômica e religiosa, não durou muito tempo

para o império babilônico ruir e, ao mesmo tempo, o império persa começou a

despontar.

364

KESSLER, 2009, p. 168. 365

Ibidem, p. 168. 366

MARQUES, Maria Antônia; NAKANOSE, Shigeyuki. Segundo Isaías Is 40-55. In: Estudos Bíblicos n. 89. Petrópolis: Vozes, 2006, p. 61.

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2.4.3. O império persa

Com a Pérsia inicia-se uma nova etapa na história do mundo antigo. A

política imperial persa diferencia-se de seus antecessores. "Vale destacar em

primeiro lugar a revogação ainda que parcial da política de deportação, como era

praticada pelos assírios e babilônios”367. Os persas ainda permitiam certa autonomia

cultural e para as questões religiosas. Embora, o pagamento de impostos fosse

recolhido como forma de política aos povos dominados368. Segundo Kessler:

Da história dos eventos da época persa destacam-se dois pontos fortes, por um lado é o tempo inicial com os primeiros grupos de retornantes da deportação, a construção do segundo templo nos anos 520-515 a.C. e a constituição de uma nova forma de vida em Judá369. Por outro lado, há as missões de Neemias e de Esdras370.

Ciro, no ano de 538, edita um Decreto, cujo texto pode estar preservado em

Esd 6,3-5 em língua aramaica. No texto indica a possibilidade de retorno dos

exilados e reconstrução do templo.

Os persas tinham em sua política repatriar os exilados, colocando nas

regiões dominadas, um representante para que as governasse. Davam certa

liberdade religiosa, mas não abriam mão da imposição política e econômica.

E exatemente com essa política de Ciro que os exilados na Babilônia

começam a pensar na possibilidade de retorno para sua terra natal. E entre esses

grupos podemos destacar o grupo do Dêutero-Isaías.

Enfim, nesse capítulo fizemos uma caminhada pela história do povo de

Israel com seus sucessivos exílios e também apresentemos o cenário político da

Assíria, Egito, Babilônia e Pérsia. Nesse contexto, é importante remarcar as atitudes

de alguns reis tais como: Ezequias e Josias que tentaram resistir à pressão desses

grandes impérios. Porém, não conseguiram levar adiante esse projeto. Por fim,

367

KESSLER, 2009, p. 168. 368

Ibidem, p. 168. 369

Ibidem, p. 169. 370

Ibidem, p. 169.

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destacamos a chegada da Pérsia com Ciro e, então, surge uma nova possibilidade

para o povo e para o grupo do Dêutero-Isaías.

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143

CAPÍTULO III

3. A teologia do Servo de YHWH

O nosso objetivo, nesse terceiro capítulo, é retomar e aprofundar a teologia

do Servo de YHWH. Para isso, queremos aprofundar as diferentes abordagens que

ao longo da pesquisa bíblica foram feitas da identidade do Servo. Seria o Servo

entendido como uma coletividade? Ou, Ciro? Ou, seria ele um indivíduo? Ou, o

messias? Ou, uma figura anônima? Em seguida, partindo do contexto histórico do

exílio na Babilônia, veremos a situação concreta dos deportados, a partir da crise de

fé que estes viviam, como se apresentavam os deuses babilônicos e sua influência

na vida dos exilados. A seguir, veremos as diferentes imagens de Deus e as suas

características próprias. E, finalmente, a sintonia e intimidade entre YHWH e o

Servo.

3.1. Diferentes abordagens da identidade do Servo de YHWH

Para um maior aprofundamento da figura do Servo de YHWH, queremos

expor diferentes abordagens para uma comprensão de sua identidade. Muitos

estudiosos da Bíblia já se debruçaram sobre essa tarefa e não há um consenso

entre eles. Expomos aqui algumas pistas.

3.1.1. O Servo de YHWH como coletividade

Para Bonnard, como para muitos estudiosos, a identidade do Servo é uma

incógnita. O Servo será Israel, um indivíduo, um personagem ou uma comunidade?

Para Bonnard todas essas hipóteses são sustentadas. Segundo Bonnard, no

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conjunto dos textos do Dêutero-Isaías, o povo de Israel é chamado de "Servo de

YHWH", massivamente Israel e considerado "Servo" 371.

Para Croatto, é possível também considerar que Israel possa ser chamado

de Servo de YHWH. Segundo ele, "as ações do Servo aplicam-se melhor a figura

de um rei, isso significa que elas são usadas metaforicamente em relação a

Israel"372. Croatto trabalha com a hipótese de que o Israel exilado na Babilônia seja

porta voz dos judeus espalhados e dispersos por todo império e que não

necessariamente foram deportados ou são oprimidos. O profeta pensa que é

possível a sua recuperação e que o instrumento para isso é a comunidade exilada a

que se dirige ou, ao menos, uma parte dela373.

Em meio ao sofrimento, o grupo vive uma nova experiência de Deus. E daí

brota um novo projeto de organização da comunidade. No texto de Isaías, temos a

apresentação do Servo de YHWH: "o meu escolhido". A palavra escolhido só

aparece para falar do relacionamento entre Deus e o seu Servo. Um relacionamento

de carinho. Logo, para os autores, o Servo pode ser um grupo do povo de Israel

(42,1; 43,20; 45,4) 374. Por isso, a nossa pesquisa deu preferência aos acréscimos

da Septuaginta: VIakw,b o` pai/j mou (Jacó, meu Servo) e Israhl o` evklekto,j mou

(Israel, o meu eleito), pois compreendemos que trata-se de uma interpretação para a

identidade coletiva do Servo de YHWH.

Ildo Bohn Gass diz:

Que em muitas das referências ao "Servo" fala-se de Israel/Jacó. Portanto, na versão final dos quatro cânticos, ao referir-se ao Servo, o Dêutero-Isaías está falando do povo de Israel, mais precisamente de uma parcela desse povo. Não é um povo qualquer. O Servo é um povo sofrido e fragilizado. Mas, não é somente um povo perseguido. É também defensor de pessoas enfraquecidas. É pobre e, ao mesmo tempo, defensor e solidário com os pobres. No contexto dos deportados, o Servo é a comunidade sofrida e humilhada por seus verdugos junto aos afluentes do rio Eufrates375.

371

BONNARD, 1972, p. 37. 372

CROATTO, 1998, p. 68. 373

Ibidem, p. 69. 374

MARQUES; NAKANOSE, 2004, p. 67. 375

BOHN GASS, 2004, p. 55.

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145

Segundo Klein:

O Servo é a personificação de Israel. O Servo é explicitamente identificado com Israel no segundo poema (Is 49,3; cf. 49,7), e o vocabulário usado para descrever a eleição do Servo (Is 42,1) denota a eleição de Israel em outras passagens376.

Continua Klein:

A missão do Servo é a missão de Israel; sua palavra era a palavra do Servo Israel. Seu ministério era uma espécie de arquétipo para a missão de Israel. Não se pode separar o Dêutero-Isaías de Israel. Do contrário ele perde sua identidade pessoal no povo eleito377.

Para Croatto, na profecia do Dêutero-Isaías "YHWH é o único capaz de agir

na história. Como o especial de Israel, ele ordena os acontecimentos para libertar

Israel. Israel é o "Servo de YHWH" não do império nem de seus deuses

legitimadores. Israel é ajudado e fortalecido por YHWH"378.

3.1.2. Ciro (559-530 a.C.) como servo de YHWH

Não temos meio de saber quantos aceitam a afirmação do Segundo Isaías

de que Ciro seria aquele que derrubaria o império neobabilônico379. Ainda continua

Klein, Ciro encontra-se num oráculo de escolha real (Is 45,1-7), em que YHWH

designa o rei persa como seu messias, incube-o de derrotar nações, reis e

cidades380. No pensamento do Dêutero-Isaías, a escolha de Ciro está de acordo

com a sua natureza e o plano salvífico de YHWH. Que Ciro é aquele que

reconstruirá Jerusalém e libertará os exilados de YHWH é notícia boa381. Sendo

assim, o motivo para Deus agir assim vem de sua dedicação ao seu servo eleito

Jacó e seu desejo de que o povo em toda parte confesse que YHWH é o único

Deus382. Segundo Ildo Bohn Gass:

376

KLEIN, Ralph W. Israel no Exílio Uma interpretação Teológica. São Paulo: Paulinas, 1990, p. 137. 377

KLEIN, 1990, p. 137. 378

CROATTO, 1998, p. 63. 379

KLEIN, 1990, p. 122. 380

Ibidem, p. 122. 381

Ibidem, p. 122. 382

Ibidem, p. 122.

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146

Havia uma esperança em torno de Ciro. Ele é chamado de messias de YHWH. O inusitado é que o rei persa é o "ungido de YHWH" e não um descendente de Davi. Jeremias já havia interpretado Nabucodonosor como "Servo" de YHWH (Jr 25,9). Também o Dêutero-Isaías interpreta a ação de Deus na história de imperadores. O avanço de Ciro criou condições reais para o regresso à terra da promessa383.

Havia no meio profético, interpretações dos sinais dos tempos e, neste

período, Ciro com suas conquistas deixa uma esperança ao povo exilado e, assim,

poderia estar dentro do plano de Deus para trazer libertação aos cativos384. Por

outro lado, Ciro está a serviço do reconhecimento da universalidade do senhorio de

YHWH.

Desta maneira, mesmo com as dúvidas nos exilados da escolha de Ciro para realizar a redenção do povo, o Dêutero-Isaías soube enfrentar essas questões e disputas, que refutou aqueles que achavam que YHWH não tinha poder e desafiou os que estavam indignados com a escolha de Ciro385.

Para Bonnard:

Ciro é chamado de "servo". Ele é chamado por seu nome, YHWH segura sua mão. Nos textos 41,1-5; 41,25-42,9; 44,24-45,13; 46,8-13 e 48,12-15. Em Esd 1 e 6 seguramente fala dele. E segundo Bonnard não dá para excluir a possibilidade que ele seja o "servo" 386.

3.1.3. O Servo de YHWH como indivíduo

Quanto à identidade individual, o profeta Dêutero-Isaías poderia também ser

denominado "servo". Ele também é investido do espírito de YHWH. Segundo

Bonnard, ele fica escondido atrás de sua obra, mas, em certo momento, ele sabe

lembrar-se de sua presença387. Assim, nos cânticos pode-se ver a figura do profeta

como "Servo".

383

BOHN GASS, 2007, p. 52. 384

Ibidem, p. 52. 385

KLEIN, 1990, p. 123. 386

BONNARD, 1972, p. 41. 387

Ibidem, p. 41.

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147

Para Croatto, não há possibilidade de que o profeta seja o "Servo". Segundo

ele, não há nenhuma indicação que se referira a proclamação ao profeta que

escreve. Não se espera tal referência388.

Segundo Klein, se os poemas forem considerados autobiográficos, muitos

estudiosos supõem que o profeta ou foi executado ou que foi encarcerado durante

certo tempo pelos babilônios389. De fato, o Dêutero-Isaías foi homem extremamente

combatido, mas indicações de que ele sofreu violência e traição, constam somente

nos poemas do Servo e até estas são vagas e ambíguas.

O cântico está escrito na terceira pessoa, o que exclui, se o Dêutero-Isaías é

seu autor, que o profeta fale de si. O mesmo não acontecerá no segundo e no

terceiro cântico390.

Segundo Bright, o servo sendo sempre indicado como um indivíduo, ele não

pode ser identificado com nenhuma personalidade histórica do tempo do profeta ou

de época anterior391. Pare ele, o Servo, antes, é uma figura que flutua entre o

indivíduo e o grupo, ideal futuro e vocação presente. Ele é o padrão do Servo ideal

de YHWH392. Para Ridderbos:

Ao fazer referência do Servo a uma personalidade humana histórica comum, de forma alguma podem ser aceito. Entre as interpretações apresentadas nos anos mais recentes, porém, há uma que assume caráter diferente. O profeta começa com essa personalidade histórica, mas depois, enquanto continua falando do que fora experimentado com essa pessoa, ele é a um ponto de vista mais alto, e passa a falar de um futuro em que o reino de Deus virá através do sofrimento e do sacrifício voluntário de um representante justo393.

388

CROATTO, 1998, p. 69. 389

KLEIN, 1990, 137. 390

STEINMANN, 1976, p. 124. 391

BRIGHT, J. História de Israel. São Paulo: Paulinas, 2.ed. 1981, p. 486. 392

Ibidem, p. 486. 393

RIDDERBOS, J. Isaías Introdução e comentário. São Paulo: Vida Nova, 2ª ed. 1995, p. 341.

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148

3.1.4 O Servo de YHWH como messias

Para Ridderbos, esta abordagem do Servo como Messias merece atenção.

Segundo ele, na figura do Servo esconde-se uma grande figura do futuro394. Ele

ressalta que a figura do Messias esteve relacionada ao Rei-Messias. E, também há

evidências de uma escolha real a partir dos cantos do Servo. A figura do Servo

sofredor também tem relação com a do Messias. A ideia de salvador também se

pode verificar na pessoa do Servo395. Em Is 55,2b-5, o significado messiânico desta

passagem parece ser inegável. O messias é retratado como uma figura da Casa de

Davi, mas, por outro lado, como testemunho do povo.

Segundo Marques e Nakanose, em Is 42,1, há indícios e imagens que

lembram a escolha e a tomada de posse de um novo rei (Sl 2,7). Lembram a

apresentação, unção, investidura e missão. O rei é visto como enviado e é investido

de poderes especiais para governar396.

Para Marques e Nakanose, o rei era a figura mais importante. E suas

funções eram a guerra, a lei e o culto. A força do exército ajudava a manter a ordem

e a proteger o Estado dos inimigos externos. Portanto, o rei exercia o papel de

legislador e juiz397.

Na Babilônia, como já observamos, o exercício do poder era mantido pela

força, guerra, violência. "A Babilônia não teve compaixão dele, colocou uma carga

pesada nos ombros dos velhos" (Is 47,6b). E, assim, com sofrimentos, muitas

pessoas perderam seus horizontes e a esperança no futuro. É nessa situação que

poderemos pensar uma liderança diferente. Dêutero-Isaías pensa em um jeito

diferente de organizar o povo398. O rei e a monarquia não respondem mais ao

apelo. Esse modelo trouxe violência e opressão. Em Is 42,3 "cana a que

despedaçada não quebrará, e pavio vacilante não apagará". Estas imagens e

394

RIDDERBOS, 1995, p. 342. 395

Ibidem, p. 342. 396

MARQUES; NAKANOSE, 2004, p. 63. 397

Ibidem, p. 64. 398

Ibidem, p. 66.

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149

metáforas indicam um novo jeito de manter o poder. É uma metáfora da

solidariedade com o fraco e o abatido.

Esta nova liderança, assim chamado de "Servo" tem uma missão específica.

Ele não poderá repetir uma prática centralizadora, já imposta pelos imperadores e

conquistadores. Nesse sentido, um novo modelo de Messias, com novas atitudes e

práticas, está sendo apresentado. Tudo indica que o Dêutero-Isaías tem em mente

essa nova visão de liderança que o Servo de YHWH representa bem. Nesse caso,

poderá ser ele o Messias.

3.1.5 O Servo de YHWH como figura anônima

Compartilham dessa ideia alguns autores que dizem não ser importante

verificar quem é o Servo de YHWH, mas sim a sua prática. Entre eles, podemos citar

Croatto, que insiste que a identidade do Servo é sempre uma interpretação aberta e

sempre haverá releituras.399 Para Croatto:

O texto do Dêutero-Isaías é polissêmico. Por isso, não pode totalizar o sentido, pois a capacidade artística do autor que usa tantos símbolos é não oferecer uma resposta pronta. Ele usa os símbolos para despistar uma só interpretação400.

Segundo Westermann, a identidade do Servo de YHWH merece uma

interpretação aberta. Diz ele:

A forma velada de falar é intencional, e para o nosso conhecimento muito disso era para permanecer escondido até mesmo de seus ouvintes originais. A exegese deve, então, ser consciente do limite assim imposto, e ter o cuidado de dar um basta onde a natureza distinta dos cânticos exigem isso. Uma coisa em particular terá de ser atendido e aqui o presente autor não concorda com a maioria dos inúmeros comentários sobre os cânticos. Em princípio, sua exegese não deve ser controlada com a pergunta, "quem é esse servo de Deus?" Em vez disso, devemos fazer-lhes justiça, reconhecendo que é precisamente isto que eles não dizem e nem têm a intenção de nos dizer. As questões que devem controlar a exegese são: o que os textos fazem saber sobre o que transparece, ou está para acontecer , entre Deus , o servo , e aqueles a quem pertence a sua tarefa401.

399

CROATTO, José Severino. Profetas Apostila ISEDET. 1978, p. 97 400

CROATTO, 1978, p. 97. 401

WESTERMANN, 1977, p. 93.

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3.2. Identidade e missão do Servo de YHWH

Identificamos na figura do Servo de YHWH a comunidade dos exilados na

Babilônia. E Jacó e Israel, acréscimo da Septuaginta confirmam o nosso

pensamento de uma coletividade. É uma comunidade fragilizada. Segundo Mesters,

"Deus toma a iniciativa e escolhe esse povo do cativeiro para ser o seu Servo e

confia-lhe uma importante missão"402. Esse povo chamado a ser Servo e para

realizar a missão de YHWH era um povo sofrido e oprimido, numa crise de fé e sem

esperança. Diz Mesters "era a sobra do mundo, escravizado pelo rei

Nabucodonosor403. E continua Mesters " foi esse povo a quem Deus escolheu para

ser o seu Servo e realizar aquela missão de justiça e libertação404.

A liderança política sempre esteve nas mãos dos reis. Agora, nessa situação

de sofrimento e sem esperança, YHWH confia a missão de liderança a esse povo

que ninguém mais acreditava. Diz Mesters: "por meio desta escolha, Deus mostrou a

sua preferência. Ficou do lado dos oprimidos405".

Deus chama a atenção para os pequenos e oprimidos, seus Servos. Então,

a motivação do chamado e da escolha está no próprio YHWH.

A missão do Servo é fazer sair o direito às nações. O termo jP'Þv.mi (direito)

é o projeto libertador de YHWH que deverá atingir todas as nações. Segundo

Croatto, "o povo de Israel, espalhado por todos os países, aguarda e espera aquela

decisão libertadora que é o direito de YHWH"406.

O meio pelo qual o Servo fará sair o direito é a não violência e a

solidariedade. Segundo Mesters:

402

MESTERS, Carlos. Missão do povo que sofre. Os Cânticos do Servo de Deus no Livro do Profeta Isaías. Petrópolis: Vozes, 1981, p. 25. 403

MESTERS, 1981, p. 27. 404

Ibidem, p. 36. 405

Ibidem, p. 37. 406

CROATTO, 1998, p. 70.

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O Servo, o povo é apresentado como alguém que não quebra a planta machucada, nem apaga o pavio que ainda solta fumaça. Isto é, ele não machuca e nem ofende os mais fracos do que ele. É dito ainda que o povo não grita, nem levanta a voz, nem solta berros pelas ruas. Isto é, ele não faz propaganda nem demagogia.407

Este meio usado pelo Servo revela também o seu valor. Apesar de ser

machucado, ele tem como propósito não machucar; apesar de oprimido, tem como

propósito não oprimir; apesar de injustiçado, não responde com injustiça. Por isso,

essa nova liderança que lhe é entregue não pode se comparar a um modelo

imperialista. E Ciro, rei persa, mesmo sendo mencionado como pastor e guia, não

correspondia a essa expectativa. Um novo ideal de líder e messias estava surgindo

na profecia do Dêutero-Isaías. E diz Mesters "apesar de todo o seu sofrimento, o

povo resistia e não deixava se contaminar pelo jeito de viver de seus opressores"408.

Eu YHWH te chamei qd<c,Þb. (em justiça). Segundo Mesters "é o próprio Deus

que quer cumprir o seu dever de justiça e, por isso, Ele Chama o povo do cativeiro

para ser o seu Servo"409. De acordo com a justiça, quem devia ser chamado era o

povo que sofrera tantas injustiças e Deus quis ser justo. Segundo Mesters, "com

outras palavras, a opção pelos pobres e oprimidos não é facultativa, mas é um dever

de justiça, de justiça divina"410.

YHWH segura firme a mão e continua segurando a mão do povo. Mesters

afirma que "a missão do povo é muito concreta". É missão de libertação411.

Nesta missão, o Servo-Povo não está sozinho. Ele pode contar com a

presença e apoio de YHWH e com a presença do espírito de YHWH. Com esta

presença libertadora de YHWH, expressa no seu nome. Ele pode contar e ter

certeza de que a missão vem do próprio Deus e que também os povos distantes

esperam por seus ensinamentos.

407

MESTERS, 1981, p. 38. 408

Ibidem, p. 38. 409

Ibidem, p. 43. 410

Ibidem, p. 43. 411

Ibidem, p. 44.

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152

3.3. A crise de fé

Um ponto de referência na reflexão teológica que perpassa a obra de

Dêutero-Isaías é a crise de fé em que se encontrava o povo exilado na Babilônia.

Numa situação de humilhação, o povo sente-se abandonado por YHWH e levanta

questionamentos sobre o seu poder, sobre a aliança e a sua fidelidade. O drama e a

situação concreta dos desterrados que perderam importante ponto de referência na

sua vida os põem em profunda crise a respeito de sua identidade como povo eleito.

Não será melhor seguir Marduk, o deus dos babilônios?

Eles encontram-se em terra estrangeira. Onde está a terra da promessa? O

templo está destruído. Onde se encontrar com Deus? Sem o rei. Ele está exilado,

quem representa o povo, quanto à lei? Uma imposição da lei do opressor. Como ser

fiel a lei? A aliança. O que sobrou dela? YHWH será menor que os deuses

babilônicos? Essas são as perguntas fundamentais para o povo exilado. Como

afirma Klein, "apesar de todas as misérias físicas acarretadas pelo exílio, os

problemas mais sérios para os israelitas eram de natureza teológica. Como podiam

crer no Deus que perdera a última guerra?"412. É nesta perspectiva que poderemos

compreender essas questões de fundo e entender uma série de discursos de

julgamento entre YHWH, as nações ou seus deuses. A reflexão teológica é uma

tentativa de negar a força e o poder dos deuses, afirmar e sustentar o poder e a

força de YHWH.

Dêutero-Isaías procurará dar respostas que possam reanimar a esperança

do povo exilado. É nesta perspectiva que analisaremos as imagens de Deus em

Dêutero-Isaías e na perícope que estudamos.

Os deuses babilônicos tinham forte influência na vida religiosa e política.

Vamos verificar essa influência.

412

KLEIN, 1990, p. 117.

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3.4. Os deuses babilônicos

Nos textos do Dêutero-Isaías, principalmente nos capítulos 40-48 percebe-

se que há uma disputa entre a força e o poder de YHWH e os deuses babilônicos.

Por isso, queremos abordar esse tema, pois como citamos acima, isso também era

uma fonte de crise para os exilados.

Is 46,1-7 trata especificamente do tema dos deuses. Nesse trecho,

predomina a contraposição deuses-YHWH. No inicío do texto, fala da queda dos

grandes deuses do império. Segundo Croatto "Bel" (transcrição acádica de Baal,

"senhor") é um título de Marduk, o deus principal da Babilônia e chefe do panteão

divino, desde a época do rei Hamurabi (século XVIII)413. Continua Croatto, "os

atributos de Marduk são o poder, a sabedoria, a eficácia de sua palavra, sua

capacidade de curar. É o símbolo do poder político"414. Outro deus é Nabo, seu filho,

é o deus protetor da cidade vizinha de Borsipa (cerca de 16 Km a sudoeste da

Babilônia). Ele é um deus da sabedoria e da arte de escrever e, por isso, está

relacionado com a "tábua dos destinos", onde estão anotados os princípios para

determinar o futuro415. Importante destacar a presença dos deuses nos dias de festa,

diz Croatto:

Estes deuses são atores principais na festa do ano novo (akitu), a principal celebração político-religiosa da Babilônia. A estátua de Nabu era transportada de Borsipa até Babilônia; a de Marduk, por sua vez, saía de seu próprio templo e ambas eram levadas em procissão pela "via sacra" até a chamada "porta de Istar", onde se encenava a festa e se lia o grande poema da criação (o Enuma elish), cujo protagonista heróico é Marduc. Ali atualizava-se a sua vitória sobre os inimigos, a fundação da Babilônia, a criação do mundo e formação do ser humano para o serviço dos deuses.

É diante desse contexto e desse pano de fundo da presença e atuação dos

deuses babilônicos e de sua influência religiosa e política na sociedade, que

deveremos entender a mensagem do Dêutero-Isaías e a imagem de YHWH e de

seu projeto salvífico para Israel. E, principalmente, nos capítulos 40-48 o tema da

"disputa" entre YHWH e os deuses são evidentes. No primeiro cântico, Is 42,1-9

413

CROATTO, 1998, pp. 155-156. 414

Ibidem, p. 156. 415

Ibidem, p. 156.

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154

YHWH é soberano no chamado do Servo, na sua Palavra e nos seus atributos,

sobretudo do Direito e da Justiça.

Para os exilados, uma mensagem de salvação e de esperança deve

acontecer. A ideia da derrubada dos deuses e de sua incapacidade para salvar é

alvo de fortes ironias do Dêutero-Isaías.

Dêutero-Isaías resgata e aplica a YHWH algumas imagens que eram

aplicadas a Marduk. Por exemplo, a imagem de criador. YHWH é o que cria o ser

humano e também o universo. Somente YHWH é capaz de criar coisas novas com

seu poder. Trata-se de buscar argumentos para convencer as pessoas da

capacidade e força de YHWH diante dos deuses babilônicos.

Vejamos as características que definem a identidade de YHWH.

3.5. Características próprias de YHWH em Is 42,1-9

Logo no início da perícope Is 42,1, o texto não indica diretamente o sujeito.

YHWH é subentendido nesse versículo. Porém, ele apresenta o Servo e indica as

atitudes que este terá para fazer sair o direito às nações. Ele recebe o espírito do

próprio YHWH.

3.5.1 O direito de YHWH

O termo jP'(v.mi (direito) é fundamental na perícope que estudamos. O termo

repete-se nos vv.1,3,4. Em Is 51,4, temos a expressão: `[:yGI)r>a; ~yMiÞ[; rAaðl. yjiêP'v.miW

aceête yTiäaime ‘hr"At yKiÛ (pois uma lei de mim farei sair e o meu direito para luz aos

povos). Isto quer indicar que o direito é algo inerente ao próprio ser de YHWH. O

espírito de YHWH é o direito. Segundo Croatto, "é uma decisão libertadora de

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155

YHWH416. Ao mesmo tempo, é uma norma de vida e de sabedoria (Lei/instrução).

Com o espírito de YHWH o Servo é "forçado" a cumprir uma função diretiva. Sua

missão é produzir/promulgar o direito às nações. Então, o termo conota um projeto.

Como afirma Croatto, "uma ação histórica e a volta a uma ordem prévia, mas

perdida417. Isso é compreensível num contexto histórico de exílio. Também quer

indicar um serviço de liderança, porém com novas atitudes de respeito e de

solidariedade com o fraco.

3.5.2. YHWH o que cria

Uma das características de YHWH podemos perceber através da raiz verbal

arEÛAB (o que cria). A raiz verbal encontra-se no qal particípio. Segundo Croatto, "o

particípio descreve atividade contínua de YHWH"418. A ação de YHWH e sua

atividade se revela na sua palavra criadora. Do "nada e do vazio" ele cria o cosmo.

Os que pretendem dominar a terra terminarão sendo nada e vazio. Croatto, afirma

que num contexto de libertação dos exilados, YHWH começará seu novo ato

criador419. YHWH é definido como criador. Criador do mundo físico (céus e terra) e o

que cria a vida humana. "Criador do cosmo e da vida, YHWH é capaz também de

atuar na história de seu povo e dar-lhe nova vida420. Como já foi citado, na Babilônia,

Marduk é considerado a divindade principal por ter vencido Tiamat (a divindade do

abismo e do caos) e do seu corpo ter criado o céu e a terra. Dêutero-Isaías aplica à

YWHW esse poder criacional. Como afirma Klein:

Em todo Dêutero-Isaías, inclusive nos anúncios das novas ações de Deus, a criação desempenha papel de grande destaque. A crição do mundo é uma base para afirmar a capacidade de YHWH e disposição para salvar (Is 40,12-13)421.

Essas afirmações sobre o poder de YHWH no ato de criar sustentaram as

credencias de YHWH na sua disputa com os deuses. Tudo está sobre o controle de

416

CROATTO, 1998, p. 70. 417

Ibidem, p. 70. 418

Ibidem, p. 162. 419

Ibidem, p. 41. 420

Ibidem, p. 72. 421

KLEIN, 1990, p. 131.

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156

YHWH. Essa era a mensagem central para os desanimados e os que duvidavam do

poder de YHWH.

O Dêutero-Isaías deu aos eventos da história salvífica de Israel nova

dimensão, descrevendo-as como atos criadores422. Por isso, YHWH é identificado no

texto de Is 42,5 como "o que cria". "O papel de YHWH no passado como criador é

apenas um prólogo para o futuro423. Não há um antigo e um novo YHWH. Nesta

afirmação hw"±hy> ynIôa] (eu YHWH), como afirma Croatto, essa fórmula é própria de Is

40-55 e autodefine ele como único. Por isso, é o único salvador e criador. Não é

Marduk e nem outro Deus da Babilônia424.

Eu YHWH, segundo Croatto, destaca que esse é o nome próprio do Deus

dos oprimidos. E atrás desse nome está a memória histórica do êxodo, com o qual

está ligado o referido nome425.

3.5.3. Assim disse YHWH

No Dêutero-Isaías, o tema da Palavra de Deus perpassa a obra. As coisas

novas, o tema da nova criação, um novo céu e nova terra, o perdão das faltas e

infedelidade do povo, o novo êxodo, a disputa com os ídolos e deuses, enfim, esses

temas estão em sintonia com a Palavra de YHWH.

Em Is 40,8 ~l'(A[l. ~Wqïy" WnyheÞl{a/-rb;d>W ( (a palavra de nosso Deus

permanecem para sempre). É a primeira citação no texto do Dêutero-Isaías.

Conforme diz Klein: "existe uma continuidade entre o que o Deus verdadeiro diz e o

que ele faz. Esta continuidade entre palavra e ação é testada com base nos fatos de

YHWH e dos deuses nas "coisas antigas" e nas "coisas novas"426. Esse poder da

palavra de YHWH para realizar coisas novas tem uma referência ao êxodo do Egito.

422

KLEIN, 1990, p. 132. 423

Ibidem, p.133. 424

CROATTO, José Severino, Composicion y Querigma del Libro de Isaias. Petrópolis: Vozes. In: Revista Eclesiástica Brasileira (REB) n. 35-36, 2000, p. 15. 425

CROATTO, 1998, p. 74. 426

KLEIN, 1990, p. 117.

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Isso podemos confirmar em Is 43,16 `hb'(ytin> ~yZIß[; ~yIm:ïb.W %r<D"_ ~Y"ßB; !tEïANh; hw"ëhy>

rm:åa' hKo (assim disse YHWH o que deu no mar um caminho e nas águas

impetuosas uma passagem). Lembrança do poder de YHWH e a libertação da

escravidão. Da mesma forma que YHWH mostrara-se confiável nos eventos antigos

da história, também Israel, podia e devia confiar nas coisas novas. A queda da

Babilônia e a vitória de Ciro são exemplos427.

Havia uma força do império babilônico, cujas práticas estão legitimadas em

um Deus (Marduk), que também, entre outros feitos tem poder pela sua palavra. E

segundo Croatto:

Frente a essa pretensa força, é necessário afirmar o contrário: tudo é passageiro. O que em verdade permanece é a palavra de nosso Deus, o Deus da memória histórica de Israel (nosso se opõe aos Deuses babilônicos)428.

Não podemos esquecer que o tema da Palavra de Deus é também um forte

argumento para reforçar o poder de YHWH diante da palavra de Marduk.

A fórmula do mensageiro hw"©hy> Ÿlaeäh' rm;úa'-hKo) (assim, disse o Deus YHWH)

tem muitas ocorrências no texto do Dêutero-Isaías. No texto que estudamos essa

fórmula está no centro da nossa perícope. O sujeito de toda ação é YHWH e sua

Palavra. Segundo Croatto: "depois de meio século de opressão no contexto

mesopotâmico, os exilados começam a questionar o poder da palavra de YHWH.

Hão de estar mais fascinados pelos grandes deuses dos opressores429. Por isso, o

profeta aponta desde o começo para a diferença, superioridade e incomparabilidade

de YHWH frente àqueles grandes deuses. Daí advém o estilo argumentativo e

polêmico de tantas passagens do Dêutero-Isaías430.

Entre as características de YHWH a sua unicidade é incontestável. Ele é

único. Segundo Croatto, "ninguém o aconselha ou o ajuda formular o seu projeto, a

427

KLEIN, 1990, p. 118. 428

CROATTO, 1998, p. 32. 429

Ibidem, p. 37. 430

Ibidem, p. 37.

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mostrar-lhe seu plano salvífico jP'(v.mi (direito). Ele se basta a si mesmo431. Esse

termo "direito", segundo Croatto, "é a intervenção histórica de YHWH". Então, a

unicidade de YHWH deve ser entendida dentro de um projeto de salvação. Os

deuses do império legitimam uma prática opressora. Daí, a exclusividade do projeto

salvífico de YHWH.

Em Is 42,5 uma única vez aparece laeäh' (o Deus). O uso do artigo reforça a

unicidade de YHWH. Ele é o único capaz de salvar. É uma designação ao

verdadeiro Deus. Ele é o Deus YHWH. Ele está situado na sua singularidade

absoluta. Por isso, há muitas ocorrências no Dêutero-Isaías da expressão hw"±hy> ynIôa]

(eu YHWH) que faz referência a Ex 3,14 " eu sou aquele que sou". Segundo Croatto

"da parte dos deuses há silêncio. Nenhum deles aparece. Daí, a conclusão em Is

41,24 (sois de nada) que corresponde por assonância ao 41,29 (eis que todos eles

são maldade). Será uma abominação optar por eles432. Diz Croatto "essa forma de

falar, de muita força retórica, é usada para causar impacto aos exilados tentados a

seguir os outros deuses"433. Sendo assim, diz Croatto: "a figura de YHWH vai se

definindo em oposição aos outros deuses, em especial de Marduc, cujos atributos o

profeta trata de atribuir para YHWH, para, assim, poder convencer os exilados de

que a libertação é possível"434.

Conforme atesta Gerstenberger "é necessário considerar as condições de

vida do povo derrotado, humilhado e disperso para compreender a exclusividade de

YHWH"435. "A exigência do culto exclusivo a YHWH correspondia à necessidade de

proteger, de modo resoluto, as novas comunidades diante de todas as tendências de

integração no império"436.

3.5.4. A exclusividade de YHWH

431

CROATTO, 1998, p. 38. 432

Ibidem, p. 63. 433

Ibidem, p. 63. 434

Ibidem, p. 64. 435

GERSTENBERGER, Erhard. Teologias no Antigo Testamento, São Leopoldo: Sinodal/CEBI, 2007, p. 259. 436

GERSTENBERGER, 2007, p. 262.

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Diante da catástrofe de 587 a.C, não havia destruído completamente a fé no

Deus que promovia a unidade e assegurava a existência política do povo437. Apesar

de todas as decepções, a fé em YHWH poderia dar sustentação ou constituir a

identidade em tempos turbulentos de mudança438.

Segundo Gerstenberger: "a exigência do povo cultuar exclusivamente a

YHWH foi o meio de manter unido o povo derrotado e disperso, de renovar-lhe a

autoconfiança e a esperança por um futuro"439. Segundo Gonzales Faus:

A presença de YHWH se impõe. Ele é chamado de YHWH 90 vezes. É caracterizado com 23 títulos e atributos, entre eles: Senhor, santo, vivente, primeiro e último, incomparável, pai, rei, pastor etc. Temos 63 palavras que evocam sua atividade divina: criar, dizer, fundamentar, formar, eleger, chamar, ajudar, cuidar. YWHH é o único a dizer: Eu sou ( cf. Is 41,4; 43,10-13.25; 46,4; 48,12; 52,6.440

Na exclusividade de YHWH, na sua grandeza e majestade fica também

evidente o caráter da humilhação e miserabilidade do povo de Israel, e também do

próprio YHWH. Então, há dois polos: grandeza e fraqueza de YHWH.441Este dado é

fundamental, resultante da experiência de sofrimento da primitiva comunidade

judaica: YHWH é impotente e padece junto com seu povo442.

Sendo assim, do ponto de vista dos argumentos, a exclusividade de YHWH

é fundamental. Diante da realidade de sofrimento do povo, YHWH é solidário e se

faz também sofredor.

3.5.5. YHWH, o que chama em justiça

Entre tantas características de YHWH, ele é o que chama em qd,c, (justiça).

Como afirma Von Rad: "o conceito de Justiça é central no Antigo Testamento e

437

GESTENBERGER, 2007, p. 263. 438

Ibidem, p. 263. 439

Ibidem, p. 264-265. 440

FAUS, 2011, p. 03. 441

Ibidem, p. 277. 442

GERSTENBERGER apud CRAUS, Hans-Joachim. Theologie der Psalmen. 3ª.ed. 1979, p. 23-36.

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constitue o critério máximo das relações entre o homem e Deus"443. Para Siqueira:

"a luta pela justiça se equipara à ação divina. Trata-se de uma exigência ética

advinda de YHWH"444.

Essa justiça é íntima, próxima, dinâmica e que excede a todas as decisões que vem do tribunal. Por esta razão, ela vem sempre acompanhada de fidelidade, lealdade, misericórdia, compaixão, vida íntegra, paz, amor (cf. Sl 85, 10-13; 33,4-5)445.

Sendo assim, a prática da justiça que leva a uma atitude concreta e gesto de

solidariedade é uma ordem divina. Por isso, o Servo é convidado por YHWH a

realizar esse pedido. O fato de segurar firme pela mão, que já analisamos, significa

um serviço de liderança político e social, um serviço de libertação. Outrora, esse

serviço destinava-se ao rei. Agora, o Servo é chamado a levar adiante esse projeto

de YHWH.

O serviço da justiça é uma dinâmica que leva a libertação. Por isso, os

termos seguintes revelam essa dinâmica: abrir olhos cegos e fazer sair da prisão os

encarcerados. Para Siqueira: "o significado de justiça leva a um compromisso ou

solidariedade a alguém, como fez YHWH diante da miséria do povo israelita no Egito

(Ex 3,7). É mover-se de compaixão para uma ação de libertação da escravidão"446.

Portanto, num contexto de escravidão, simbolizado pela escuridão e ausência de

luz, YHWH chama em justiça e convida o Servo para tal missão.

3.5.6. A glória de YHWH

Em Is 42,10, um hino fala da glória de YHWH. Segundo Croatto, "trata-se de

um convite para cantar447. Porém, em Is 42,8 temos a seguinte expressão !Teêa,-al{)

rxEåa;l. ‘ydIAbk.W (e minha glória para outro não darei). A gloria de YHWH é o novo

projeto de libertação que deve ser cantado. Diz Croatto "a nova glória de YHWH

443

VON RAD, 1973, p. 353. 444

SIQUEIRA, Tércio Machado. Conhecer a Deus é praticar a Justiça ( Jr 22,13-19). In: Estudos Bíblicos n. 14, Petrópolis: Vozes, 1987, p. 15. 445

Ibidem, p. 15-16. 446

Ibidem, p. 16. 447

CROATTO, 1998, p. 74.

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deve provir dos extremos da terra. A boa notícia de libertação devia alcançar os

exilados entre todas as ilhas e nações"448. Isso muda também a concepção de Deus.

Então, não se pode dar essa glória para outros deuses. E diz Croatto, "o horizonte

do império com seus deuses, porém, ficam de fora dos festejos"449. Portanto, render

glória a YHWH é lembrar sua ação salvífica na história.

Diante de uma situação triste de exílio, a importância de YHWH não era tão

perceptível. Dentro de um processo de libertação e de esperança de um futuro

melhor, YHWH volta a ser reconhecido em todo mundo. Essa mensagem deve ser

celebrada com hinos e cantos. Daí, a glória de YHWH e o seu reconhecimento na

vida e na história do povo.

3.5.7. YHWH e as coisas novas

Essa caracterítica de YHWH em criar tAvd"x]w:) (coisas novas) e de dar

novos rumos à história é fundamental na compreensão de sua exclusividade e de

sua ação salvífica. Já abordamos que Dêutero-Isaías insiste no poder de

intervenção de YHWH na história e, por conseguinte, na vida de seu povo. Por isso,

o futuro de Israel está dentro de um processo de libertação, seja da situação de

exílio, seja de retorno para sua terra.

Ainda dentro do panorama de crise de fé do povo exilado e da propaganda

dos deuses babilônicos, poderemos entender o que significa as coisas novas que

serão anunciadas. Segundo Croatto, "os deuses não têm nada a dizer ou anunciar

bem como YHWH mesmo os faz escutar que eles são incapazes de predizer"450. Era

um risco para Israel querer atribuir aos outros deuses os acontecimentos que iam se

perfilando no cenário de então, diz Croatto451.

448

CROATTO, 1998, p. 75. 449

Ibidem, p. 75. 450

Ibidem, p. 74. 451

Ibidem, p. 74.

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Historicamente, o acontecimento era a possível queda da Babilônia pelas

ações vitoriosas de Ciro, o persa, no norte.

A expressão dyGIëm; ynIåa] (eu o que relata) indica a novidade de YHWH.

Somente ele é capaz de prever o que irá acontecer na vida do povo, mesmo antes

que venham a brotar. Ou seja, YHWH já conhece o futuro. E, nesse processo de

libertação e de retorno, o seu Servo é um agente especial.

3.6. YHWH e o db,[, (Servo)

A nossa pesquisa e o nosso estudo de Is 42,1-9 procurou responder a

pergunta quem é YHWH e quem é o Servo. Seguindo os passos da exegese e do

contexto histórico do exílio da Babilônia, apontamos algumas pistas, identificando

essas identidades e teologias.

Já identificamos o Servo a partir de uma abordagem coletiva. E pensamos

que o Servo tem uma maior identificação com a comunidade dos exilados. Mesmo

com todo sofrimento, este povo é chamado por YHWH para um serviço específico.

Fazer sair o direito às nações a partir de atitudes de solidariedade e respeito,

principalmente aos fracos e abatidos. Os acréscimos da Septuaginta: VIakw,b o` pai/j

mou (Jacó, meu Servo) e Israhl o` evklekto,j mou (Israel, o meu eleito)

confirmararam essa identidade coletiva para o Servo.

Após ter apresentado o seu Servo às nações do mundo, podemos dizer qua

a partir do v.5 YHWH se apresenta. Um indício para isso é a fórmula do mensageiro

hw"©hy> Ÿlaeäh' rm;úa'-hKo) (assim, disse o Deus YHWH). O Dêutero-Isaías faz questão

de apresentar o Deus como o que cria. Ele cria o universo. Segundo Mesters "ele

mostra, assim, a importância da missão que o povo vai receber, e garante que o

povo pode contar sempre com o poder criador de Deus para realizar a sua

missão452.

452

MESTERS, 1981, p. 41.

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Em seguida, o próprio YHWH toma a palavra e apresenta-se ao povo.

hw"±hy> ynIôa] (eu YHWH). Segundo Mesters, "o nome YHWH quer dizer

presença libertadora no meio do povo". Essa presença libertadora lembra o passado

no processo de libertação no Egito (Ex 3,13-15). E, agora, na situação de exílio,

invoca este mesmo nome para expressar o seu compromisso de estar com o povo

no cativeiro e de ajudá-lo na sua missão. Então, a glória de Deus é ver seu povo

livre, fraterno e feliz. Portanto, segundo Mesters "a raiz da liberdade, da fraternidade

e da felicidade é o próprio Deus"453.

Sendo assim, o grande sonho de YHWH é a vida e a liberdade. E ele não vai

permitir que os falsos deuses oprimam o seu povo e os impeça de realizar o grande

sonho de libertação. "Como Senhor da história, Deus garante, desde já, o sucesso

da missão do seu Servo, afirma Mesters"454.

YHWH e db,[, (Servo) estão unidos num mesmo projeto de libertação. O

povo responde e conta com o apoio de YHWH, por isso, podemos falar de

identidades. O ser de YHWH expressa-se na missão do Servo. E com o espírito de

YHWH, este revela ao mundo a sua vontade que é de liberdade e paz. Então, há

uma extensão entre o desejo de YHWH e o desejo do Servo.

No direito e na justiça, com a presença de YHWH, o Servo-Povo apesar de

sua fraqueza é capaz de levar adiante a missão de Deus. E não desanimará até que

a vontade de Deus realize-se no mundo.

453

MESTERS, 1981, p. 45. 454

Ibidem, p. 46.

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CONLUSÃO

A pergunta que nos guiou durante essa reflexão e estudo exegético de Is

42,1-9 tem uma relação com identidades. A identidade do Servo de YHWH e a

identidade do próprio YHWH. Quanto à identidade do Servo, no decorrer do nosso

estudo, fomos percebendo que se trata de uma identidade coletiva. A partir dos

textos e da exegese apontamos que Israel é chamado de Servo. Uma comunidade

exilada é convocada por YHWH para ser sinal de esperança para povos e nações.

No primeiro versículo, esta comunidade é apresentada por YHWH e recebe dele um

chamado especial. Frisamos a importância do sufixo pronominal "meu". "Meu

Servo", "meu escolhido", "meu espírito". A partir desse sufixo pronominal,

entendemos que este povo tem um tratamento especial da parte de YHWH. Então, a

partir de uma partícula de apresentação "eis", esta comunidade é apresentada por

YHWH para ser um sinal de esperança e para fazer o direito sair a outros povos e

nações.

Seguindo o estudo exegético, entendemos também que a comunidade

assume posturas firmes para fazer o direito sair. Ela não gritará e não erguerá a voz.

Sete advérbios de negação marcam as atitudes dessa comunidade serva de YHWH.

Entre, as atitudes o princípio da não violência e das atitudes silenciosas são marcas

fundamentais da postura da comunidade. Ela guarda também o gesto de

solidariedade para com os fracos e abatidos. Mesmo sendo marginalizada e

violentada, não leva adiante esse projeto da violência tão presente nas posturas

políticas dos grandes impérios e das lideranças políticas.

O direito é um conceito chave que marca todo o texto de Is 42,1-9 que é

entendido a partir de um projeto de libertação que vem da essência do próprio

YHWH. Então, ao fazer sair o direito, o Servo também está revestido do espírito de

YHWH, da mesma identidade. Então, o direito une as identidades num mesmo

projeto, YHWH-Servo.

Após apresentar o Servo e ampará-lo em sua missão, YHWH se apresenta

com o título de Eu YHWH, o Deus YHWH, esse é o seu nome. Também a fórmula do

mensageiro "assim disse o Deus YHWH" indica aquilo que ele fala e aquilo que ele

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faz. Ele é único na sua identidade, ele não compartilha com os deuses o que é

próprio da sua identidade. No pensamento do Dêutero-Isaías, a essência de YHWH

é o direito e a justiça. Na atitude de segurar firme a mão da comunidade portadora

do direito e da justiça, YHWH convoca a mesma para uma atitude política para o

bem de povos, de nações e os que estão exilados.

O projeto de libertação fica evidente a partir de uma preposição que indica

uma ação concreta: "para". A comunidade é chamada para "fazer sair desde prisão

os que estão encarcerados". Esta atitude concreta é uma tarefa primordial do Servo

de YHWH.

A glória de YHWH manifesta-se quando o direito e a justiça que são os

valores essenciais para a convivência humana estão sendo implantados na

realidade histórica. Sendo assim, coisas novas poderão brotar e o próprio YHWH é o

agente que anuncia à comunidade exilada essa mensagem de esperança.

O texto que estudamos Is 42,1-9 está contido num primeiro bloco do livro do

Dêutero-Isaías, entre os capítulos 40-48. Um tema fundamental diz respeito à

exclusividade de YHWH que tem como fundamento a prática do direito e da justiça.

Neste ponto, a sua identidade fica em evidência. Portanto, na concepção teológica

do Dêutero-Isaías e, em meio a tantas propagandas imperiais da força de Marduc,

YHWH vai perdendo a sua identidade de Deus criador e capaz de modificar o curso

da história. A partir deste momento é que podemos conceber esse primeiro bloco

como uma "disputa" entre YHWH e os deuses. Para um povo em profunda crise de

fé, a força e o poder de YHWH devem convencer os ouvintes e despertar, na

comunidade exilada, um novo sentido para suas vidas.

No contexto histórico mais amplo e de grandes impérios, entre eles Assíria,

Egito, Babilônia e Pérsia, que antecederam o tempo e a atuação do profeta Dêutero-

Isaías, o exílio babilônico está em destaque como paradigma para os demais exílios.

A chegada do império, as sucessivas deportações e a política imperialista marcaram

profundamente a vida do povo judeu. Este povo viu a terra devastada, o templo

destruído, o rei sendo destituído do poder e a miséria, violência e fome devastando a

sua terra. Entre o ano de 597-538 aC., vivendo em terra estrangeira, o povo judeu

experimentou todo tipo de sofrimento, entre ele uma profunda crise de fé.

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A entrada da Pérsia no cenário político e a figura de Ciro é uma luz e

esperança para o povo exilado. Tudo indica que a Pérsia tinha uma atitude de

tolerância com relação ao culto e a vida cultural dos exilados, porém, dentro do

sistema econômico, seguiu o costume de cobrança de impostos e imposições

políticas.

Os textos do Dêutero-Isaías nascem nesse final do exílio e apresentam a

figura do Servo de YHWH como uma proposta messiânica de liderança e de nova

maneira de governar desde a situação dos mais fracos e sem referências políticas. A

novidade teológica que nasce da Teologia do Servo tem sua fonte inspiradora em

atitudes de solidariedade e de compromisso com os debilitados da história. YHWH é

um Deus solidário e que acredita que, a partir do pequeno e fraco, um projeto

libertador poderá ser implantado na história.

Identidades e Teologias caminham na mesma direção. O Servo é uma

extensão do projeto libertador de YHWH. A comunidade exilada e sofredora, através

do silêncio profético e de atitudes firmes e amparado pelo espírito de YHWH, poderá

ser um sinal e luz para as nações. Pela primeira vez, na história e na singularidade

da profecia do Dêutero-Isaías, o que é desprezado e sem valor é um sinal de

esperança.

A Teologia do Servo é uma teologia do serviço. Ele é chamado, amparado e

destinado pra uma missão específica. O direito nasce em YHWH e na sua Palavra e

a comunidade exilada na Babilônia é convocada, com tenacidade e perseverança, a

ser no mundo uma presença salvífica do próprio YHWH.

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180

FICHA CATALOGRÁFICA

P665i Pires, Fábio

Identidades e Teologias no primeiro Cântico do Servo de YHWH:

estudo exegético de Isaías 42,1-9 / Fábio Pires. -- São Bernardo do

Campo, 2014. 179fls.

Dissertação (Mestrado) – Universidade Metodista de São Paulo, Faculdade de Humanidades e Direito, curso de Pós-Graduação em

Ciências da Religião. São Bernardo do Campo.

Orientação: José Ademar Kaefer

1. Bíblia – A.T. – Isaías – Comentários 2. Direito – Teologia 3. Justiça – Doutrina Bíblia 4. Yameh I. Título

CDD 224.107

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