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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO CLÁUDIA REGINA PARANHOS PIMENTEL A JUSTA CAUSA NA AÇÃO PENAL NITERÓI 2013

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

CLÁUDIA REGINA PARANHOS PIMENTEL

A JUSTA CAUSA NA AÇÃO PENAL

NITERÓI

2013

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CLAUDIA REGINA PARANHOS PIMENTEL

A JUSTA CAUSA NA AÇÃO PENAL

Monografia apresentada ao Curso deGraduação em Direito da UniversidadeFederal Fluminense, como requisitoparcial para obtenção do grau de Bacharelem Direito

Orientador: Prof. MANOEL MARTINS JÚNIOR

NITERÓI

2013

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Universidade Federal FluminenseSuperintendência de Documentação Biblioteca da Faculdade de Direito

P644 Pimentel, Claudia Regina Paranhos. A justa causa na ação penal / Claudia Regina Paranhos Pimentel. – Niterói, 2013. ??? f.

Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Direito) – UniversidadeFederal Fluminense, 2013.

1. Ação penal. 2. Justa causa (processo penal). 3. Habeas corpus. 4.Jurisprudência. I. Universidade Federal Fluminense. Faculdade de Direito II.Título.

CDD 341.5

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CLÁUDIA REGINA PARANHOS PIMENTEL

A JUSTA CAUSA NA AÇÃO PENAL

Monografia apresentada ao Curso deGraduação em Direito da UniversidadeFederal Fluminense, como requisitoparcial para obtenção do grau de Bacharelem Direito

Aprovada em agosto de 2013.

BANCA EXAMINADORA

Prof. MANOEL MARTINS JÚNIOR – Orientador

UFF

Prof. CLAUDIO BRANDÃO

UFF

Prof. ÍNDIO DO BRASIL CARDOSO

UFF

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Dedico este trabalho à memória do meu pai. Ao meu marido Carlos Luiz e minha filha Marcela, pelo incentivo e apoio incondicional.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, sempre presente em todos os momentos da minha vida.

A todos os professores da graduação que foram muito importantes na minha

formação acadêmica.

Ao meu orientador professor Manoel Martins Júnior pela orientação dedicada, no

decorrer da elaboração dessa monografia.

Aos dedicados funcionários da biblioteca da Faculdade de Direito da Universidade

Federal Fluminense e da biblioteca do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, pela presteza no

atendimento e fornecimento do material bibliográfico.

Aos meus amigos, pelo apoio e incentivo, meu sincero agradecimento.

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RESUMO

A presente pesquisa realizou um estudo sobre a justa causa na ação penal. É certo que oEstado, possuidor do monopólio de administrar e distribuir a justiça deve promover umequilíbrio entre o poder punitivo e a preservação do direito de liberdade. Para isso, deverábuscar sempre o justo. A justa causa se insere na ação penal numa tentativa de se buscar essajustiça. Assim, para que seja deflagrada a ação penal, a lei exige que sejam analisados algunsrequisitos ou condições que deverão ser observadas desde o início, ou seja, antes do momentoem que o juiz deverá dizer se o pedido do autor tem fundamento ou não, se ele é a parteinteressada na lide e se o que se pede é juridicamente possível. A justa causa foi introduzidano Código de Processo Penal pela lei 11.719/08, como um desses requisitos ou condições sema qual a denúncia ou queixa será rejeitada. Contudo, não tratou de conceituá-la, ficando acargo da doutrina e jurisprudência. Devido à sua importância como requisito fundamental, asua ausência acarretará o trancamento da ação penal via habeas corpus. Pretende-se, portanto,estabelecer, primeiramente, a noção de justa causa, o seu significado nos diversos ramos dodireito, revisar a ação penal com todas as suas particularidades, como, natureza jurídica,espécies e condições. Relacionar a justa causa como condição essencial da ação penal, com osdiversos posicionamentos doutrinários, estabelecer as hipóteses de rejeição da denúncia ouqueixa, e por fim contextualizar o entendimento dos tribunais de acordo com a jurisprudência.Para realização de tais estudos, utilizou-se, em relação à metodologia, o método qualitativo depesquisa, bem como o hipotético-dedutivo. Tendo sido feita pesquisa em livros,jurisprudências, monografias, dissertações, periódicos e outros artigos científicos da área deDireito Penal e Processual Penal, a fonte utilizada foi a documental.

Palavras- chaves: Ação Penal. Justa Causa. Trancamento. Jurisprudência.

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ABSTRACT

The current research conducted a study on the fair cause in criminal action. It is true that thestate possess the monopoly to manage and distribute justice must promote a balance betweenthe punitive power of law and the preservation of freedom. For this, you must always seek thejustice. The fair cause is included in the criminal action in an attempt to look for that justice.So, to be triggered the criminal action, the law requires that certain requirements andconditions are analyzed, which must be observed from the beginning, in other words, beforethe time when judge must tell the plaintiff's request is justified or not, if he is an interestedparty in the dispute and if what is asked is legally possible. The criminal action wasintroduced in the Code of Criminal Procedure by the Law 11.719/08, as such requirements orconditions on which the denunciation or complaint is rejected. However, did not try to defineit, leaving it to the doctrine and jurisprudence. Due to its importance as a fundamentalrequirement, its absence will result in the locking of the criminal action via habeas corpus. Itis intended, therefore, to establish, first, the notion of fair cause, its meaning in the variousbranches of law, to review the criminal action with all its particularities, as, legal nature,species and conditions. Relate the fair cause as a essential condition of criminal action, withseveral doctrinal positions, establish the hypothesis of rejection of the complaint ordenunciation, and finally contextualize the understanding of the courts in accordance with thejurisprudence. To carry out such studies, it was used in the methodology, the qualitativeresearch method as well as the hypothetical-deductive. Having done research in books,jurisprudence, monographs, dissertations, periodicals and other scientific articles in the areaof Criminal Law and Criminal Procedure Law, the source used was documentary.

Keywords: Criminal Action. Fair cause. Locking. Jurisprudence.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...................................................................................... 8

1 NOÇÃO DE JUSTA CAUSA ................................................................ 91.1 Justa causa no direito civil ....................................................................... 91.21.3

Justa causa no direito do trabalho ............................................................Justa causa no processo civil ...................................................................

1012

1.4 Justa causa no direito penal ..................................................................... 13

2 AÇÃO PENAL ...................................................................................... 142.1 Conceito e natureza jurídica .................................................................... 152.2 Espécies de ação penal ............................................................................ 162.2.1 Ação penal pública condicionada ............................................................ 192.2.2 Ação penal privada .................................................................................. 20

33.13.23.33.43.53.6

JUSTA CAUSA E AS CONDIÇÕES DA AÇÃO PENAL ................Possibilidade jurídica do pedido ..............................................................Legitimidade da parte ou legitimidade ad causam ..................................Interesse de agir .......................................................................................Condições específicas ou de procedibilidade ..........................................Justa causa como quarta condição da ação penal ....................................Ausência de justa causa como hipótese de cabimento de habeas corpus para trancamento da ação penal ..............................................................

242627282930

33

4

4.14.24.34.4

55.15.25.35.45.5

6

REJEIÇÃO DA DENÚNCIA OU QUEIXA: ANÁLISE DO ART.395 DO CPP ..................................................................................Rejeição: inépcia da denúncia ..................................................................Rejeição: ausência de pressuposto processual .........................................Rejeição: ausência de condição para o exercício da ação penal ..............Rejeição: faltar justa causa para o exercício da ação penal .....................

JURISPRUDÊNCIA .............................................................................Justa causa, fato típico e indícios de autoria e materialidade ...................Justa causa e inércia da denúncia .............................................................Justa causa e exame da prova ...................................................................Justa causa e sentença condenatória .........................................................Comentários dos julgados ........................................................................

CONCLUSÃO ........................................................................................

REFERÊNCIAS ....................................................................................

3537383839

394043464953

54

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INTRODUÇÃO

O Processo Penal como o conjunto de normas jurídicas destinadas à regular o poder

punitivo do Estado, através do Poder Judiciário, não deverá estar dissociado da visão

constitucional. Hoje, os direitos e garantias fundamentais se revelam como freios, evitando

os abusos do Estado contra os indivíduos.

Sabe-se que o Processo Penal apesar de estar inserido num contexto de limitação do

poder de punir, sua incidência acaba por gerar efeitos tão devastadores ao ofendido,vindo a

atingir o seu verdadeiro status dignitatis.

E é justamente por isso, que desde o início, será fundamental que o acusador, seja ele

público ou privado, demonstre a justa causa, ou seja, os elementos probatórios mínimos que

comprovem a prática do crime.

Nesse contexto é que será analisada a justa causa. Primeiramente, a noção do termo,

depois sua inserção e significados nos diversos ramos do direito como: Direito Civil, Direito

do Trabalho, Direito processual Civil e no Direito Penal.

No segundo capítulo será abordada a ação penal, apresentar-se-á o conceito, sua

origem, natureza jurídica e espécies.

A justa causa é tratada no terceiro capítulo, juntamente com as condições da ação. O

objetivo será conceituá-la trazendo os diversos entendimentos doutrinários, inclusive se é

considerada como uma quarta condição da ação ou não. Tratar-se-á ainda da sua ausência,

tendo em vista a sua importância para o recebimento e rejeição da denúncia ou queixa.

O quarto capítulo versará sobre a rejeição da denúncia ou queixa, com base na

análise do art. 395 do Código de Processo Penal.

No quinto e último capítulo, a jurisprudência é analisada, buscando-se o

entendimento de como os tribunais têm decidido sobre a justa causa na ação penal.

Para realização de tais estudos, utilizou-se, em relação à metodologia, o método

qualitativo de pesquisa, bem como o hipotético-dedutivo. Tendo sido feita pesquisa em livros,

jurisprudências, monografias, dissertações, periódicos e outros artigos científicos da área de

Direito Penal e Processual Penal, a fonte utilizada foi a documental.

Por fim, a justa causa merece esse estudo, que não pretende esgotar o assunto, mas

lançá-lo a uma reflexão.

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1 NOÇÃO DE JUSTA CAUSA

De acordo com os dicionários e enciclopédias, a justa causa é conceituada como “o

motivo fundamentado em lei, contrato, convenção, regulamento, ordem pública, bons

costumes, princípios gerais do Direito, equidade, justiça”. (SOIBELMAN.1979, p.202). Para

De Plácido e Silva: “o motivo que pode ser alegado, ou porque está amparado em lei, ou

porque procede de fato justo; o justo impedimento, a impossibilidade comprovada, a razão

jurídica, a imposição legal, enfim, tudo o que possa justamente servir de motivo ou dar

origem a um fato”. (1967, p.41).

No sentido doutrinário, nas lições de Maria Thereza Rocha de Assis Moura, justa

causa seria “o fato ou o conjunto de fatos que justificam determinada situação jurídica, ora

para excluir uma responsabilidade, ora para dar-lhe certo efeito jurídico”. (2001, p.100)

Nesse sentido, percebe-se que conceituar a justa causa não é uma tarefa simples

devido ao seu grau de complexidade e subjetividade. De acordo com a doutrinadora, esta

impossibilidade decorre de dois fatores: “causa” possui um significado vago e ambíguo,

enquanto que “justo” constitui um valor. (2001, p.97)

Assim, delineada essa noção de justa causa, será visto adiante seu significado nos

diversos ramos do direito (civil, trabalho, processo civil, penal e processual penal), possui

significados distintos e próprios.

1.1 Justa Causa no Direito Civil

A expressão “justa causa” no direito civil, não foge a regra e possui significado

polêmico.

No direito das obrigações, aparece nos arts. 602 e 603 do Código Civil vigente. No

art. 602, o prestador de serviço contratado por tempo certo, não pode se ausentar ou despedir

sem justa causa, antes de terminar a obra. Nota-se que nesse artigo há uma proibição de

rescisão unilateral pelo prestador de serviço sem justa causa.

O art. 603 refere-se ao prestador de serviço que é demitido sem justa causa. Nesse

Caso, o tomador deverá pagar-lhe a retribuição vencida, mais a metade do a que tocaria de

então ao termo legal do contrato.

Percebe-se que o legislador não considerou o elemento culpa quando tratou a justa

causa, mas sim motivos objetivos, estranhos ao tomador.

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No direito das coisas, ao tratar da posse, o legislador usou a expressão “justo título”

(art.1201, parágrafo único do Código Civil de 2002), ou seja, uma conotação completamente

diferente do exemplo acima. Aqui o legislador está se referindo ao possuidor que tem um

título com a aparência de um título hábil para transferir a posse ou o domínio, mas que

apresenta algum vício que o impossibilita de atingir o seu objetivo. Nesse caso, o possuidor de

um justo título tem a presunção de boa-fé, salvo prova em contrário. A boa-fé nesse caso se

perfaz quando o possuidor está certo de que a coisa lhe pertence, embora ignore que está

prejudicando alguém, por não saber da existência do vício que lhe impede de ter a coisa.

1.2 Juta Causa no Direito do Trabalho

Um dos pilares que regem a relação laboral configura-se na continuidade da relação de

emprego, tendo como seu conteúdo o empregador e o empregado. Logo, sua maior

característica é a proteção do trabalhador.

Nessa crescente preocupação com o trabalhador, a Constituição Federal tratou de

assegurar como direito do trabalhador, entre outros, a relação de emprego protegida contra a

despedida arbitrária ou sem justa causa, que preverá indenização compensatória ao

empregado, dentre outros direitos (art. 7º, inc. 1).

Nota-se que o legislador não assegurou a estabilidade ao empregado, mas uma

indenização pelo ato injustificado do empregador.

Barros (2012, p.702) conceitua que: “A justa causa é uma circunstância peculiar ao

pacto laboral. Ela consiste na prática de ato doloso ou culposamente grave por uma das partes

e pode ser o motivo determinante da resolução do contrato”.

No direito do trabalho a justa causa está relacionada com a extinção do contrato de

trabalho, é um tipo de punição máxima aplicada pelo empregador ao trabalhador. Segundo

Cassar (2009, p.839): “Só deve ser aplicada quando o empregado praticar uma falta muito

grave, descumprir grosseiramente o contrato, ou quando a lei autorizar a extinção por esse

motivo”.

A maioria dos doutrinadores elenca na dispensa por justa causa, três tipos de sistemas

legislativos: o taxativo, o genérico e o misto.

O primeiro é o adotado pelo Brasil e significa dizer, que as hipóteses estão previstas

na lei.

O segundo refere-se a hipóteses que não estão previstas em lei, mas que dão ensejo à

rescisão contratual.

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E o misto, seria uma mistura do taxativo com o genérico.

Na legislação pátria o rol taxativo encontra-se no art. 482 da CLT (Consolidação das

Leis do Trabalho). Dentre elas temos: abandono do emprego; violação de segredo de empresa;

embriaguez habitual ou em serviço; ato de indisciplina ou insubordinação, etc.

Apesar das faltas graves estarem previstas na lei, são necessários alguns requisitos ou

elementos para a aplicação da justa causa.

Com relação ao número de requisitos ou elementos a questão é controvertida na

doutrina e assim sendo, essa discussão ficará para outro momento.

Assim, são requisitos essenciais para a aplicação da justa causa, segundo Paulo e

Alexandrino (2008, p. 353): “a culpa ou o dolo do empregado; a gravidade da conduta; o

imediatismo na aplicação da penalidade; o nexo de causalidade; a singularidade e a

proporcionalidade”.

O elemento subjetivo (dolo ou culpa) é indispensável para a configuração da justa

causa. Portanto, é necessário que o empregado tenha na sua conduta, a intenção de praticar o

ato, ou pelo menos culpa, que embora não tenha tido a intenção, agiu com negligência,

imperícia ou imprudência.

A gravidade da conduta está relacionada ao ato do trabalhador e deve ser suficiente

para abalar a confiança na relação de emprego.

O imediatismo exprime que a pena deve ser aplicada o mais rápido possível, logo após

a conduta do empregado. Se assim não ocorrer, há presunção de que houve perdão tácito e

não estará configurada a justa causa. O imediatismo deve ser considerado a partir do

conhecimento pelo empregador da falta cometida, e não da conduta do empregado. No caso

concreto, o princípio da razoabilidade informará o tempo limite.

De acordo com Cassar (2009, p.848), “A teoria dos motivos determinantes conclui que

entre a falta e a resolução do contrato por justa causa deve haver uma relação de causa e

efeito, um nexo causal”.

Assim, os atos faltosos cometidos pelo empregado são as causas e a despedida por

justa causa o efeito.

A singularidade proíbe que o empregador aplique uma advertência por uma falta

cometida pelo empregado e mais tarde esse mesmo empregado comete a mesma falta e o

empregador aplique uma punição mais gravosa. Não poderá haver punição diferente.

A proporcionalidade está relacionada entre a conduta do empregado e a punição

aplicada pelo empregador. A legislação possui uma ordem de punição: advertência, suspensão

e dispensa. Não pode o empregador abusar do seu direito de punir.

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Percebe-se que no direito do trabalho a tipicidade da justa causa está bem delineada e

com expressa previsão legal. Porém, caberá ao juiz a difícil tarefa de verificar a sua

incidência. Vale dizer, que a justa causa para o término do contrato tem sido objeto de

inúmeros julgados e questionamentos.

1.3 Justa Causa no Processo Civil

O art. 183 caput e§ 1º e 2º do CPC (Código de Processo Civil), conceituou justa

causa nos seguintes termos: “Reputa-se justa causa o evento imprevisto, alheio à vontade da

parte, e que a impediu de praticar o ato por si ou por mandatário”.

Nesse sentido, para que configure a justa causa é necessário que o evento imprevisto

seja o impedimento para a prática do ato, totalmente alheio à vontade do agente. Assim,

havendo negligência ou culpa do agente na prática da omissão, não haverá justa causa.

Vale salientar, a necessidade de se observar a relação de causalidade, ou seja, se o

evento imprevisto e alheio à vontade do agente foi o que deu causa da omissão. É de vital

importância que a causa tenha impedido a realização do ato.

A justa causa se apresenta no Processo Civil, muito ligada ao caso fortuito e força

maior.

Caso fortuito, de acordo com Acquaviva, é “acontecimento de ordem natural gerador

de efeitos jurídicos”. (2009, p.163). São exemplos de caso fortuito: queda de raios, estiagem,

aluvião, etc.

Dispõe o art. 393 do Código Civil, que “o devedor não responde pelos prejuízos

resultantes de caso fortuito, ou força maior, se expressamente não se houver por eles se

responsabilizado”.

O parágrafo único desse mesmo artigo conceitua o caso fortuito e força maior como

sendo um fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar. Percebe-se que a lei equiparou

esses dois fenômenos.

Houve muita discussão na doutrina sobre a distinção entre caso fortuito e força

maior. Para Venosa (2006, p.322), “Há dois elementos a serem provados, um de índole

objetiva, que é a inevitabilidade do evento, e outro de índole subjetiva, isto é, ausência de

culpa”.

Assim, para a maioria dos doutrinadores, força maior é o fato que decorre da

natureza, independente da vontade do homem. Caso fortuito é o fato que decorre da ação do

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homem, mas alheio à vontade da parte, como por exemplo: uma greve, um incêndio

criminoso, etc.

Assim, são exemplos de casos de justa causa que a doutrina costuma mencionar:

greve nos transportes, anormalidade do expediente forense, enfermidade grave e repentina da

parte, que teria de comparecer pessoalmente para depor, greve nos correios, etc.

Deste modo, como nos demais ramos do direito, a verificação da justa causa, no

Processo Civil, será feita no caso concreto, a critério do magistrado.

1.4 Justa causa no Direito Penal

O Direito Penal é o direito de punir do Estado (ius puniendi). Alguns doutrinadores

denominam esse direito de punir do Estado como direito penal subjetivo, e o conjunto de

normas jurídicas destinadas a combater o crime de direito penal objetivo.

De fato, o Direito Penal visa à proteção da sociedade através do amparo dos bens

jurídicos fundamentais.

O nosso Ordenamento Jurídico elenca todo tipo de bem jurídico tutelado pelo Estado

que merece ser protegido. Dentre eles temos: a vida, a integridade física e mental, a honra, a

liberdade, patrimônio, etc. Porém, não são todos os bens jurídicos que irão merecer a tutela do

Estado, mas sim aqueles em que o legislador considerar antissocial.

No Direito Penal, a justa causa aparece nos arts. 153, 154, 246 e 248 do Código Penal,

como elemento normativo e integrante do tipo.

O art. 153 caput e § 1º-A refere-se à divulgação de segredo:

Art. 153. Divulgar alguém, sem justa causa, conteúdo de documentoparticular ou de correspondência confidencial, de que é destinatário oudetentor, e cuja divulgação possa produzir dano a outrem:

§ 1º A. Divulgar, sem justa causa, informações sigilosas oureservadas, assim definidas em lei, contidas ou não nos sistemas deinformações ou banco de dados da Administração Pública [...].

O art.154 trata da violação do segredo profissional:

Art. 154. Revelar alguém, sem justa causa, segredo, de que tenhaciência em razão de função, ministério, ofício ou profissão, e cujarevelação possa produzir dano a outrem:

Pena: detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa[...].

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O art. 246 fala do abandono intelectual e diz que: “deixar, sem justa causa, de

prover à instrução primária de filho em idade escolar: [...].”

O art. 248 reporta-se aos crimes contra o pátrio poder, tutela ou curatela:

Art. 248. Induzir menor de 18 (dezoito) anos, ou interdito, a fugir dolugar em que se acha por determinação de quem sobre ele exerceautoridade, em virtude de lei ou de ordem judicial; confiar a outrem,sem ordem do pai, do tutor ou do curador, algum menor de 18(dezoito) anos, ou interdito, sem justa causa, de entregá-lo a quemlegitimamente o reclame [...].

Para Hungria e Fragoso, a justa causa é “toda causa, explícita ou implicitamente,

direta ou indiretamente, aprovada pela ordem jurídica”. (1982, v. 6, p. 254).

Diante do exposto, percebe-se que a justa causa abarca várias hipóteses de conteúdo

variável e por não possuir a faculdade de ser prevista previamente em todas as hipóteses,

deverão ser analisadas no caso concreto.

A doutrina elenca ainda como justa causa: o estado de necessidade, o consentimento

do ofendido, o exercício regular de um direito, o dever jurídico de revelar um segredo, entre

outros.

2 AÇÃO PENAL

No Direito Penal atual, quem detém o direito de punir é o Estado. Assim, realizada a

conduta criminosa, surge para Ele, de forma potencial, o direito de punir. Para a concretização

desse direito, o Estado deve promover o processo judicial, ou seja, deve ele exercer o direito

de ação, que será alcançado através da ação penal. O art. 5º, inciso XXXV, da Constituição

Federal, diz que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a

direito”, com isso, tornou o acesso ao Poder Judiciário um direito fundamental, assegurando

assim, a todo indivíduo a possibilidade de recorrer ao juiz, pedindo a prestação jurisdicional

toda vez que se sentir ofendido ou ameaçado. Com essa redação fez-se presente nesse artigo o

princípio da inafastabilidade da jurisdição.

No campo cível bem como na seara penal, Ação, é o direito de invocar a prestação

jurisdicional. O que as diferencia uma da outra é a pretensão.

No Processo Penal, trabalha-se com a pretensão punitiva, que significa a pretensão

condenatória de imposição da sanção penal ao autor do fato tido como crime.

No Processo Civil, o que se busca é a reparação civil.

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2.1 Conceito e natureza jurídica

Como já foi dito, toda pessoa tem o direito de invocar a prestação jurisdicional do

Estado para a resolução dos seus conflitos. Logo, havendo uma pretensão insatisfeita, o

particular tem o direito de pedir a tutela jurisdicional ao Estado.

Portanto, quando a ação se introduz no Processo Penal, “o seu titular exerce um direito

subjetivo processual, sendo que tal direito é autônomo, já que tem vida própria, independente

do direito subjetivo correspondente.” (LIMA, 2012, p.155).

Para Nucci,”É o direito do Estado-acusação ou do ofendido de ingressar em juízo,

solicitando a prestação jurisdicional, representada pela aplicação das normas de direito penal

ao caso concreto.”(2010,p.181 e 182).

Fernando Capez conceitua:

É o direito de pedir ao Estado-Juiz a aplicação do direito penalobjetivo a um caso concreto. É também o direito público subjetivo doEstado-Administração, único titular do poder-dever de punir, depleitear ao Estado-Juiz a aplicação do direito penal objetivo, com aconseqüente satisfação da pretensão punitiva. (2012, p. 155).

Na ótica de Lima:

[...] é um direito subjetivo público, instrumental, regulado por normasde direito processual, autônomo e abstrato, cujo titular é o MinistérioPúblico, e excepcionalmente, nas hipóteses previstas em lei, exclusivaou subsidiariamente, do ofendido, ou quem tenha qualidade pararepresentá-lo, destinada à aplicação do direito penal objetivo. (2012,p. 156).

Na legislação pátria, a ação penal é tratada tanto no Código Penal (art.100), como no

Código de Processo Penal (art.24), razão pela qual se discute sua natureza jurídica. Segundo

Rangel, essa previsão não pode levar ao entendimento de natureza mista. “pois, na medida em

que demonstramos a autonomia e a abstração do direito de agir, inclusive que esse direito

preexiste à prática do delito, claro nos parece que a natureza da norma é exclusivamente

processual.” (2010, p.231).

Tanto na ação penal como na ação civil, o direito de invocá-las, possuem natureza

jurídica semelhantes, mas se diversifica segundo Mirabete:

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Apenas segundo o direito objetivo que o juiz vai aplicar: se a norma éde direito penal, exercita-se a jurisdição penal; se visa à aplicação denormas não-penais, invoca-se a jurisdição civil. Seu pressuposto ésempre o litígio, ou a pretensão insatisfeita surgida com a prática doilícito penal. (2008, p.89).

Assim, sintetizando a natureza jurídica da ação penal, Malcher (2009.p.233) conclui

que “se trata de um direito público (pois nasce da Constituição), abstrato (pois preexiste à

lesão), subjetivo (pois entregue seu exercício a todos) e instrumental (pois visa fazer atuar a

jurisdição, para que solucione o conflito de interesses).

Diante do exposto pode-se atribuir como características da ação penal: ser ela um

direito autônomo, que não se confunde com o direito material; um direito abstrato, que

independe do resultado final do processo; ser também um direito subjetivo, pois o titular pode

exigir do Estado à prestação jurisdicional, e um direito público, pois o que se pretende

provocar é de natureza pública.

2.2 Espécies de ação penal

A ação penal pode ser classificada de diversas formas. Tendo como base a sua

titularidade, pode-se dizer que em regra a ação penal é pública, salvo quando a lei

expressamente a declara privativa do ofendido. (art.100, caput do CP).

A ação pública é promovida pelo Ministério Público e dependendo do que a lei exige,

de representação do ofendido ou de requisição do Ministro da Justiça. (§1º do art.100 do CP).

A Constituição vigente atribuiu ao Ministério Público, com exclusividade, a

titularidade de propor a ação penal, não importando se é incondicionada ou condicionada.

(art.129, inc. I). Porém, previu também que se o Ministério Público não oferecer a denúncia

no prazo legal, o ofendido ou seu representante poderá fazê-lo.

A ação nesse caso será chamada de ação penal subsidiária. Prevista no art. 29 do CPP

(Código de processo Penal), e art.100,§3º do CP.

Por outro lado, a ação será de iniciativa privada, quando promovida mediante queixa

do ofendido ou quem tenha qualidade de representá-lo. (§2º do art.100 do CP).

Dentro da ação penal pública temos duas modalidades: ação penal pública

incondicionada e ação penal condicionada à representação ou à requisição do Ministro da

justiça.

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18

A ação penal pública incondicionada ou condicionada é regida por alguns princípios.

São eles a obrigatoriedade, a indisponibilidade, a oficialidade, a indivisibilidade e

intranscendência.

A obrigatoriedade significa dizer que o Ministério público deve propor a ação penal

pública sempre que houver segundo Rangel, “um fato típico, ilícito e culpável nas mãos,

devidamente comprovado ou com elementos que o autorizem a iniciar a persecução penal.”

(2010, p. 233).

Assim, o Ministério Público representado pelos seus promotores e procuradores de

justiça, é nas lições de Mirabete:

É um órgão uno e indivisível e, assim, seus membros podem sersubstituídos no processo, por razões de serviço, sem que aja soluçãode continuidade. O Ministério Público promove a ação penal públicadesde a peça inicial (denúncia) até os termos finais, em primeira edemais instâncias. Acompanha-a, está presente a todos os atos,fiscaliza a seqüência dos atos processuais; zela e vela pela observânciada lei até a decisão final. (2008, p. 96).

Percebe-se que a obrigatoriedade da ação penal pública conferiu ao MP um poder-

dever de exigir do estado a prestação jurisdicional, com o objetivo de restaurar a ordem

jurídica infringida.

Destarte, alguns autores dizem que o princípio da obrigatoriedade sofreu mitigação,

ou seja, perdeu o seu valor absoluto em razão da criação da transação penal.

A transação penal, introduzida pela lei 9.099/2005 (art.76) e seguindo a previsão

encontrada na própria Constituição Federal, em seu Art. 98, inciso I, possibilitou um acordo

entre o Ministério Público e o autor do fato, nas infrações penais de menor potencial ofensivo.

Assim, nesses casos, o Ministério Público pode dispor da ação penal para evitar o processo.

Conclui-se que esse princípio só comporta nas infrações de médio e maior potencial

ofensivo.

Entretanto, esse não é o pensamento de Afrânio Silva Jardim. Segundo Rangel (2010,

p.237 apud JARDIM, 1996, p.33-34), para o professor Afrânio, a proposta de transação penal

é exercício de ação penal e, portanto, não há mitigação ao princípio da obrigatoriedade.

A indisponibilidade da ação penal está muito ligada ao princípio da obrigatoriedade.

Seria um desdobramento desse princípio porque o Ministério Público ao oferecer a denúncia

não pode desistir dela. Essa proibição está contida no art. 42 do Código de processo Penal e

também atinge a fase recursal, art. 576 do mesmo Código.

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19

Vale salientar que esse princípio não se aplica nas infrações da Lei 9.099/95, que

criou os Juizados Especiais Criminais, pois o legislador permitiu a suspensão condicional do

processo, expressa no seu art. 89.

Conclui-se que o Ministério Público “dispõe da ação penal pública, não por mero

capricho ou deleite pessoal, mas sim para adotar uma via alternativa à pretensão acusatória

[...]. É a lei que diz quando caberá a suspensão condicional do processo.” (RANGEL, 2010,

p.248).

Pela oficialidade entende-se que o Estado deve instituir que os órgãos encarregados

da persecução penal sejam oficiais. No Brasil, temos a Polícia e o Ministério Público. Assim,

como órgãos oficiais encarregados de repressão penal, podem requisitar documentos,

diligências ou quaisquer atos necessários à instrução do inquérito policial ou da ação penal,

salvo às restrições constitucionais.

Esse princípio, porém, não é absoluto, pois existe a ação penal privada, promovida

pelo próprio ofendido ou quem possa representá-lo.

A indivisibilidade significa dizer que a ação penal deve abarcar todos os que

cometeram a infração. Esse princípio também é aplicável à ação penal privada, como dita o

art.48 do CPP.

Porém, o Supremo Tribunal Federal (STF) já se manifestou e disse que a

indivisibilidade só se aplica a ação penal de iniciativa privada por força do art. 48 do CPP. Na

justificativa disse que o Ministério Público poderá a qualquer momento aditar a denúncia para

incluir novos réus e que, portanto, não há que se falar em indisponibilidade.

Vale salientar que alguns doutrinadores dizem que o que rege a ação penal pública é

o princípio da divisibilidade, pelos mesmos motivos que já se pronunciou o STF.

Para o professor Paulo Rangel, essa análise do STF está em discordância com o

princípio da indivisibilidade. Para ele, o STF esqueceu-se de trabalhar com a hipótese do

arquivamento implícito ou tácito, pois se este estiver ocorrido, não poderá fazer aditamento

sem novas provas. Assim, segundo Rangel:

A indivisibilidade, não é demais lembrar, não significa que a açãodeva ser proposta em face daquele que não tem prova mínima contrasi no inquérito. Não. Ausente o suporte probatório idôneo é o caso denão-denúncia. O inquérito com relação a este deve ser arquivado.Nesse caso, não há ferida ao princípio da indivisibilidade da açãopenal pública. (2010, p.241).

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20

Conclui-se que a adoção do princípio da divisibilidade é a posição majoritária na

jurisprudência.

Pela intranscendência, entende-se que a ação penal só pode ser proposta a quem

cometeu o injusto penal, ou nas lições de Tourinho Filho (2009.p.347), “a ação penal é

sempre promovida contra as pessoas a quem se imputa a prática de uma infração.”

2.2.1 Ação Penal Pública Condicionada

É aquela que está subordinada a uma condição, pode ser a manifestação da vontade

do ofendido ou seu representante, como também a requisição do Ministro da Justiça.

Nessa ação, a titularidade continua sendo do Ministério Público, mas enquanto não

for satisfeita a condição, ele não atua. “Não se trata de intervenção do particular na atuação

estatal. Não, mas apenas uma providência de ordem pública com o escopo de evitar que um

crime não tão grave seja levado ao judiciário contra a vontade de quem sofreu a ação

criminosa.” (Rangel, 2010, p. 295).

Exemplos de infrações sujeitas à representação, entre outros, temos os crimes contra

a liberdade sexual (arts.213 a 216-A do CP) e os crimes contra vulnerável (arts.217 a 218-B),

conforme o art. 225 do CP, cuja redação, estabelece que nesses crimes procede-se mediante

ação penal pública condicionada à representação.

Excepcionalmente, nos crimes ditos no parágrafo acima, a ação penal será

incondicionada se a vítima for menor de dezoito anos, em situação de vulnerabilidade.

De acordo com a súmula n. 608 do STF, se o estupro for praticado mediante

violência real, a ação penal será pública e incondicional.

Vale ressaltar que o ofendido ou seu representante legal tem o prazo de seis meses

para se manifestar, decorrido esse prazo, não poderá mais exercer o seu direito, pois o prazo

decadencial não se prorroga.

Com relação à representação do ofendido, ela não é obrigatória e poderá haver

retratação do ofendido. Porém, depois de oferecida a denúncia, a representação será

irretratável, de acordo com o art.25 do CPP. No entanto, há uma exceção no que se refere às

infrações de menor potencial ofensivo (Lei 9.099/05). Assim, feita a representação e acatada a

denúncia pelo MP, ainda será possível a transação, conforme o art.79 dessa lei.

No que se refere à ação penal subordinada à requisição do Ministro da Justiça, “é

um ato administrativo, discricionário e irrevogável, que deve conter a manifestação de

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21

vontade para a instauração da ação penal, com menção do fato criminoso, nome e qualidade

da vítima, nome e qualificação do autor do crime, etc.” (MIRABETE, 2008, p.103)

Tourinho Filho diz que “a requisição, na espécie, é um ato político, porque há certos

crimes em que a conveniência da persecução penal está subordinada a essa conveniência

política.” (2009, p.398).

Com relação às hipóteses de incidência dessa requisição ministerial de cunho

político, segundo a doutrina majoritária temos: crime cometido por estrangeiro contra

brasileiro, fora do Brasil (art.7,§3, b do CP); crime cometido contra a honra de Chefe de

governo estrangeiro ou contra o Presidente da República (art.141, inc.1c/c com o parágrafo

único do art. 145, ambos do CP); nos crimes contra a honra cometidos contra Chefe de Estado

ou Governo estrangeiro ou seus representantes diplomáticos, por meio da imprensa (art.23,

inc.1, c/c o art. 40, I, a, da lei de imprensa). Portanto, esses são alguns exemplos dentre

outros.

Com relação ao prazo, o Código de Processo Penal não disse nada a esse respeito e

entende-se que no silêncio da lei, poderá ser a qualquer tempo, desde que não extinta a

punibilidade.

No tocante a retratação há divergências na doutrina. Para Nucci, “se o particular pode

retratar-se da representação já formulada, não há impedimento algum para que o Ministro da

Justiça faça o mesmo.” (2010, p.199). Na corrente contrária, Tourinho Filho sustenta que:

Um ato administrativo, como é a requisição, partindo do governo pormeio do Ministro da Justiça, há de ser, necessariamente, um ato que sereveste de seriedade. Dispondo de larga margem de tempo paraencaminhá-la ao Ministério Público, de certo terá oportunidade parajulgar das suas vantagens ou desvantagens, da sua conveniência ouincoveniência. (2009, p.402).

Conclui-se que a ação penal subordinada à requisição de Ministro da Justiça constitui

uma exceção, pois, vimos que a ação penal é em regra, pública incondicionada. É também um

ato administrativo com juízo de conveniência e oportunidade, ficando a cargo do Ministro da

Justiça a sua requisição.

2.2.2 Ação Penal Privada

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22

A diferença entre a ação penal pública e ação penal privada reside na legitimidade

ativa. Na primeira o Ministério Público atua com exclusividade. Na segunda, o Estado

transfere por razões de política criminal a legitimidade da propositura da ação penal ao

particular (vítima) ou a seu representante legal.

Para alguns doutrinadores, trata-se de verdadeira substituição processual, pois o

ofendido, de acordo com Rangel, “está legitimado para litigar em juízo, em nome próprio,

como autor, na defesa de direito alheio, qual seja: o interesse que tem o Estado de ver a ordem

jurídica que foi violada com a prática da infração penal.” (2010, p. 249).

Em sentido contrário à substituição processual, Lopes Jr. Sustenta que:

Trata-se de um erro imperdoável de quem partiu de uma premissa

equivocada. Nos delitos de ação penal de iniciativa privada, o

particular é titular de uma pretensão acusatória e exerce o seu

direito de ação, sem que exista delegação de poder ou substituição

processual. Em outras palavras, atua um direito próprio (o de acusar)

da mesma forma que faz o Ministério Público nos delitos de ação

penal de iniciativa pública. (2010, p. 392-393).

Assim, percebe-se que para o professor Lopes Jr. a legitimidade do ofendido é

ordinária e não extraordinária, pois o ofendido atua com um direito que lhe é próprio e que foi

dado pelo Estado-juiz.

No tocante a petição inicial, se for intentada pelo Ministério Público denomina-se

denúncia, e se for pelo ofendido queixa.

A ação penal de iniciativa privada rege-se por algumas regras ou princípios.

De fato alguns desses princípios, anteriormente comentados encontram-se também

na ação penal pública, como a disponibilidade, a indivisibilidade e a intranscendência. Os

princípios objeto de análise serão: conveniência e oportunidade; e entre as regras, o perdão e

perempção e renúncia.

Conveniência e oportunidade quer dizer que o ofendido propõe se quiser a

ação penal, caberá a ele estabelecer qual o momento oportuno para fazê-la, desde que respeite

o prazo decadencial de seis meses. O juízo de ponderação será do ofendido, diferentemente da

ação penal pública, regida pela obrigatoriedade.

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23

O perdão segundo Rangel, “é clemência, indulgência, a bondade concedida pelo

querelante (autor da ação) ao querelado (réu).” (2010, p.268). De acordo com o art.105 do CP,

o perdão do ofendido só se dará nos crimes em que se procede mediante queixa, assim, o

perdão cessará o prosseguimento da ação. Portanto, o perdão é exclusivo da ação penal

privada, não há que se falar em perdão na ação penal privada subsidiária da pública, uma vez

que ela é pública, mas movida pelo ofendido em face da inércia do Ministério Público.

Outra particularidade do perdão é a sua bilateralidade. É necessário que o querelante

proponha e que o querelado aceite, pois do contrário, não produzirá efeitos.

O perdão pode ser expresso ou tácito. O expresso pode ser no decorrer do processo

ou fora dele. No primeiro, faz-se através da petição, contendo a assinatura do querelante,

depois se intima o querelado que terá três dias para se manifestar, se ficar em silêncio

importará aceitação. Fora do processo, o querelante fará um termo, desistindo da ação, que

poderá ser feito pessoalmente ou por procurador com poderes especiais.

O perdão tácito ocorre quando o querelante toma atitudes incompatíveis com a

vontade de prosseguir com a ação.

Fato curioso é que em razão da indivisibilidade da ação penal privada, se o

querelante perdoar um dos agressores, abrirá precedentes para que os demais se beneficiem.

Entretanto, em face da bilateralidade, que exige a aceitação do querelado, é possível que um

co-autor aceite e outro não. Assim, para os que não aceitaram, a ação penal segue o seu curso.

A perempção significa destruição, extinção. Assim, nas palavras de Nucci, “dá-se a

extinção da punibilidade do querelado, nos casos de ação penal exclusivamente privada,

quando o querelante, por desídia, demonstra desinteresse pelo prosseguimento da ação.”

(2010, p.207).

Assim, a natureza jurídica da perempção é de uma sanção imposta ao ofendido

desidioso que abandona a ação.

São exemplos de perempção, quando o querelante deixar de promover o andamento

do processo durante trinta dias seguidos, (art.60, inc. I do CPP); falecimento do querelante ou

sobrevindo sua incapacidade, não comparecer em juízo, para prosseguir no processo, dentro

do prazo de sessenta dias, qualquer das pessoas a quem couber fazê-lo (art.60, inc.II do CPP),

enfim todas as hipóteses do art.60 do CPP.

Diante do exposto, podemos dizer que a diferença do perdão para a perempção é que

no perdão ocorre a bilateralidade, ou seja, o aceite e na perempção basta que o querelante

abandone a ação.

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24

A renúncia, junto com o perdão e a perempção são causas de extinção da

punibilidade previstas do art.107 do CP.

Para Nucci, “renunciar significa desistir ou abdicar de algo. No contexto processual

penal, demonstra que a vítima se recusa a tomar providências contra seu agressor, em se

tratando de ação penal privada.” (2010, p. 203).

Neste contexto, existem vários motivos que podem levar o ofendido a renunciar,

como por exemplo: perdoou a atitude do agressor ou porque julga desnecessário seguir

adiante com o processo, ou simplesmente deixar transcorrer o prazo decadencial, que é de seis

meses.

Assim, a renúncia ao direito de queixa é um ato unilateral do ofendido e que não

necessita de aceitação por parte do querelado para produzir seus efeitos. Percebe-se que, por

ser um ato unilateral, renunciando a um, os outros eventuais co-autores também estarão

beneficiados, em face da indivisibilidade da ação penal.

Outra característica da renúncia é que na morte ou ausência do ofendido que não

renunciou, a renúncia de um dos seus sucessores não extingue a punibilidade, podendo

qualquer outro propor o direito de queixa. O fato é que a renúncia só extingue a punibilidade

quando formulada pelo ofendido ou seu representante legal.

Existem dois tipos de renúncia: a expressa (art.50 do CPP), e a tácita. A primeira,

pela leitura do art.50 do CPP, constará de declaração assinada pelo ofendido, por seu

representante legal ou procurador com poderes especiais. Não é necessário ser advogado.

Ocorrerá renúncia tácita ao direito de queixa, quando o ofendido praticar ato

incompatível com a vontade de exercê-lo. Segundo Mirabete, “deve tratar-se de atos

inequívocos, conscientes e livres, que traduzam uma verdadeira reconciliação ou o positivo

propósito de não exercer o direito de queixa.” (2008, p.130). De acordo com o art.104, §

único do CP, o fato do ofendido receber indenização do dano causado pelo crime, não implica

em renúncia.

Vale salientar que nas infrações de menor potencial ofensivo (Lei 9099/05),

O acordo homologado para a composição dos danos civis acarreta a renúncia do direito de

queixa ou de representação (tratando-se de ação penal pública condicionada). Muito comum

em acidentes de trânsito que provocaram lesões culposas. De fato, se antes não acarretava

renúncia, agora com a homologação em juízo ocorrerá.

Por fim, a renúncia será exercida sempre antes do ajuizamento da ação penal,

diferentemente do perdão que é concedido depois.

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25

Com relação às espécies de ação penal privada, para Tourinho filho, e Fernando

Capez, são três: ação penal exclusivamente privada; ação privada personalíssima e ação

privada subsidiária da pública. Para Nucci e Mirabete, são duas: a exclusiva e a subsidiária da

pública, embora mencionem a personalíssima como um desdobramento da exclusiva.

A ação penal exclusiva, pelo próprio nome, compete ao ofendido ou a seu

representante legal. Na hipótese de morte ou ausência declarada judicialmente, o direito de

prosseguir com a ação transmite-se ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão, (art.31 do

CPP).

Na segunda hipótese, a titularidade não passa do ofendido, ficando de fora seu

representante legal e a sucessão por morte ou ausência, por isso se diz personalíssima.

Exemplo dessa ação é o crime de induzimento a erro essencial ou ocultação de impedimento,

(art.236, parágrafo único do CP) crime contra o casamento.

A ação penal privada subsidiária da pública é uma garantia constitucional fornecida

pelo art. 5º, inc. LIX, onde diz que será admitida ação privada nos crimes de ação pública, se

esta não for intentada no prazo legal. Essa possibilidade também está prevista no art.29 do

CPP. Trata-se de um verdadeiro instrumento conferido ao ofendido para evitar a inércia do

Ministério Público.

De acordo com a doutrina majoritária, essa hipótese é raríssima de acontecer, pois, a

vítima dificilmente acompanha o inquérito, deixando a cargo do seu advogado.

Assim, essa ação só vislumbra no caso de inércia do Ministério Público e nunca na

hipótese de arquivamento. O Supremo Tribunal Federal (STF) já pacificou o tema na súmula

nº 524, onde: “arquivado o inquérito policial, por despacho do juiz, a requerimento do

promotor de justiça, não pode a ação penal ser iniciada sem novas provas.”

Diante dessa redação, uma vez arquivado o inquérito, somente novas provas poderão

reabrí-lo, portanto, não será possível que a vítima intente a ação subsidiária com o intuito de

garantir a persecução penal.

De acordo com o art. 38 do CPP, o prazo para exercer o direito de queixa do

ofendido ou seu representante legal é de seis meses a contar do dia em que vier a saber quem

é o autor do crime, ou no caso do art.29 do CPP, do dia em que se esgotar o prazo para o

oferecimento da denúncia.

3 JUSTA CAUSA E AS CONDIÇÕES DA AÇÃO PENAL

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26

Como já foi dito anteriormente, o particular é titular do direito de ação, que figura

como um instrumento para que sua pretensão seja atendida em juízo. Pois bem, posta a ação

em juízo, será feito uma análise antes de o juiz dizer se o autor tem ou não razão, se o seu

pedido é ou não procedente e se o autor tem interesse na lide. O que se pretende na verdade, é

saber “se estão presentes os requisitos mínimos indispensáveis para a formação da relação

processual que irá, após a colheita da prova, redundar na sentença, aplicando a lei penal ao

caso concreto.” (Nucci,2010,p.187).

Portanto, constatado a falta dos requisitos essenciais da ação, o autor será julgado,

naquele caso concreto, e seu direito estará carente da ação, impossibilitando que o magistrado

investigue se o seu pedido tem procedência ou não, se era fundado ou infundado.

A conseqüência da carência da ação, é que o juiz não apreciará o mérito, ou seja, o seu

pedido.

De acordo com Grinover, Cintra e Dinamarco:

É dever do juiz a verificação da presença das condições da ação omais cedo possível no procedimento, e de ofício, para evitar que oprocesso caminhe inutilmente, com dispêndio de tempo e recursos,quando já se pode antever a inadmissibilidade do julgamento domérito. (2006, p.277).

Entende-se por mérito na ação penal condenatória, segundo o professor Pacelli :

A existência de um fato (materialidade), ser esse fato imputável ao

acusado (autoria), constituir esse fato uma ação típica, ilícita e

culpável (a materialidade normativa, ou, em uma palavra o crime, na

sua definição dogmática [conceito analítico]), e não se encontrar

extinta a punibilidade. Assim, para que seja possível o exame de tais

questões, é preciso, antes, a superação de outras, de natureza

processual. (2012, p.101-102).

Conclui-se que diante dos posicionamentos acima citados, as condições para o

exercício da ação penal, são de fato muito importantes a fim de se evitar que a máquina

estatal, representada pelo poder jurisdicional perca tempo com uma pretensão que não ia se

efetivar.

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Vários autores, dentre eles, Nucci, Rangel, Capez e Malcher costumam chamar de

genéricas as condições válidas para toda e qualquer ação penal. Dentre elas temos: a

possibilidade jurídica do pedido, o interesse de agir e legitimidade da parte. Rangel inclui

ainda nessa categoria a justa causa.

As condições específicas da ação penal também são chamadas de condições de

procedibilidade, pois são aplicadas apenas em alguns crimes. Exemplos: representação do

ofendido ou requisição de Ministro da Justiça (ação pública condicionada), ingresso de

estrangeiro em território nacional, no caso de extraterritorialidade condicionada, novas provas

no caso do art. 409 do CPP, entre outros.

No que diz respeito à Lei 9.099/05 dos juizados especiais criminais, apesar de tratar de

crimes de menor potencial ofensivo, como já foi dito, não dispensa a demonstração e análise

das condições da ação. De acordo com Lopes Júnior:

Ainda que se trate de crime de menor potencial ofensivo, deve-severificar se há relevância jurídico-penal na conduta. Em se tratando deconduta insignificante sob o ponto de vista jurídico-penal, deve adenúncia ou queixa ser rejeitada. Da mesma forma se não vierinstruída com um mínimo de elementos probatórios da tipicidade,ilicitude e culpabilidade. (2010, p.369).

Por fim, analisar-se-á em tópicos separados todas as condições da ação penal.

3.1 Possibilidade jurídica do peddido

No processo civil, diferentemente do que ocorre no processo penal, o conceito de

possibilidade jurídica segundo Capez, “é negativo, isto é, ele será juridicamente admissível

desde que, analisado em tese, o ordenamento não o vede, no processo penal, seu conceito é

aferido positivamente: a providência pedida ao Poder Judiciário só será viável se o

ordenamento [...], a admitir.” (2012, p.157).

Assim, a possibilidade jurídica do pedido implica dizer que a pretensão que se busca

refere-se a um fato considerado como crime. Desse modo, o pedido do autor deverá estar

previsto no Ordenamento Jurídico, porque caso contrário, seu pedido será impossível de ser

acolhido, restando ao magistrado rejeitar a denúncia.

Para Tourinho Filho, “hoje, no processo penal, a possibilidade jurídica do pedido

perdeu o caráter de condição para o exercício da ação penal, por se tratar de questão de

mérito, ensejando a absolvição sumária do réu, nos termos do art.397 do CPP.” (2009, p.527).

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3.2 Legitimidade da parte ou legitimidade ad causam

Pela legitimidade, entende-se que somente o titular interessado na lide é quem pode

promovê-la. Assim, como o Estado é o titular do direito de punir, a ação penal deve ser

intentada por ele.

Segundo Tucci, “por legitimação para causa, deve entender-se a situação

correspondente à titularidade ativa ou passiva da relação jurídica cuja definição ou realização

constitui objeto do processo.” (2002, p.95).

No Ordenamento pátrio, é o Ministério público o órgão legitimado para promover a

ação penal (condicionada ou incondicionada). Assim, ocorrendo à infração penal, figura,

dentro do conflito de interesses, uma relação entre o Estado e o infrator. Entretanto, por

questões de política criminal, a lei confere ao particular o direito de exercer a ação penal.

Assim, nos casos de ação privada, só o ofendido pode promovê-la.

Grande parte da doutrina (Mirabete, Capez, Tourinho Filho, Pacheco, entre outros),

diz que nesses casos ocorre a legitimidade extraordinária para o ofendido, enquanto que para

o Estado figura a verdadeira legitimidade ad causam. Ambos mencionam também, que ocorre

“o fenômeno conhecido por substituição processual, e tal substituição existe quando alguém

puder, em nome próprio, defender interesse alheio.” (Tourinho Filho, 2009, p.532).

Nas lições de Capez:

No processo penal, os interesses em conflito são: o direito de punir,conteúdo da pretensão punitiva e o direito de liberdade. O titular doprimeiro é o Estado, que é, por isso, o verdadeiro legitimado,exercendo-o por intermédio do Ministério Público. Não é por outromotivo que se diz que o ofendido, na titularidade da ação privada, ésenão um substituto processual (legitimação extraordinária), visto quesó possui o direito de acusar (ius accusationis), exercendo em nomepróprio, mas no interesse alheio, isto é, o Estado. (2012, p.159).

Segundo Pacheco:

No processo penal, temos como exemplos de legitimidadeextraordinária ou substituição processual, os casos de ação penalprivada. Num crime de injúria, apesar de o “direito” (material) depunir ser do Estado, este entrega o direito de ação (o ius persequendiin iudicio) ao particular (querelante). O querelante, portanto, é umsubstituto processual. A regra é o Ministério Público propor a açãopenal (art.129, I, CR). Para que o ofendido possa propô-la, deve haver

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previsão legal expressa, e, então teremos ação penal privada. (2008,p.211).

Porém, como já foi dito no item 3.2.2, existem posicionamentos contrários com

relação à substituição processual.

Com relação à atuação do representante legal nos crimes de ação privada, Tourinho

Filho diz que “o representante legal não é [substituto processual], e não o é porque o

representante legal age em nome do representado, ao passo que, na substituição, o [substituto]

age em nome próprio.” (2009, p.532).

Conclui-se que para que se configure a relação processual:

Não basta a circunstância de alguém ter legitimatio ad causamextraordinária, isto é, de ser parte legítima ad causam para poderpromover a ação penal. É preciso, também, seja parte legítima adprocessum, isto é, tenha capacidade para estar em juízo. E, mesmosatisfeitas essas exigências, é preciso que se tenha capacidadepostulatória para que se possa promover a ação e praticar ulterioresatos do processo. (TOURINHO FILHO, 2009, p.533).

Por fim, antes da Constituição de 1988, havia o entendimento que só poderia figurar no pólo

passivo da relação jurídico-processual, a pessoa física. Mas, de acordo com o art.5º, XXI da

CF, e art. 37 do CPP, pessoas jurídicas podem figurar no pólo ativo da ação penal.

3.3 Interesse de agir

O interesse de agir segundo Nucci, se enquadra no binômio adequação e utilidade.

Adequação, porque para promover a ação penal, é necessário que se obedeça aos

procedimentos do Código de Processo Penal. Uma vez desrespeitados esses ditames, mesmo

que o fato narrado na denúncia ou queixa serem possíveis juridicamente, não se concretizará o

direito de agir, pois foi desrespeitado o interesse-adequação.

No quesito utilidade, significa que a ação penal precisa alcançar a pretensão punitiva

do Estado, ou seja, satisfazer o interesse do autor. Se o fato imputado não for considerado

mais crime, não há interesse do Estado em punir o infrator.

Fernando Capez, também comunga desse mesmo pensamento e acrescenta a

necessidade, “como sendo inerente ao processo penal, Tendo em vista a impossibilidade de se

impor pena sem o devido processo legal.” (2012, p.158).

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30

Para o professor Eugênio Pacelli, o interesse-adequação não tem razão de ser, pois

segundo o autor:

Percebe-se, porém, que, ao menos no processo penal condenatório, aaventada adequação não ostenta qualquer utilidade, dado que, aindaque o pedido de imposição de determinada sanção não correspondaefetivamente àquela prevista na cominação legal pertinente ao fatoimputado ao agente, nada impede o recebimento da denúncia ouqueixa e o regular processamento do feito, consoante com o art.383 doCPP. (2012, p.103).

Portanto, por força do art. 383 do CPP, o juiz, sem modificar a descrição do fato

contido na denúncia ou queixa, poderá atribuir-lhe definição jurídica diferente e se assim for,

poderá aplicar pena mais grave. De fato, para que aja o interesse-adequação, é necessário que

se formule uma pretensão adequada para provocar o órgão jurisdicional. O que Pacelli quis

dizer é não basta que a sanção seja adequada ou não, ela será recebida porque o juiz, no caso

concreto poderá modificá-la. Assim, seria desnecessário esse interesse-adequação.

De acordo com o professor Afrânio Silva Jardim, nas ações penais condenatórias,

onde se manifesta uma pretensão punitiva, há sempre o interesse de agir, em face do princípio

nulla poena sine judicium (não há pena sem processo).

Conclui-se que o interesse de agir nas lições de Tucci, “consiste, enfim,

fundamentalmente, no interesse à atuação do órgão jurisdicional, em sua obra máxima de

realização da justiça.” (2002, p.94)

3.4 Condições específicas ou condições de procedibilidade

As condições específicas ou de procedibilidade ocorrem porque a lei exige certas

condições para o exercício da ação penal. Assim, segundo Tourinho filho:

Uma vez exigida pela Lei, sua ausência torna inadmissível o jusactionis.Portanto, quando se inicia uma ação penal, o juiz, além de observar seestão satisfeitas as condições genéricas (legitimidade para agir e justacausa), deverá também examinar se naquela hipótese a lei sujeita oexercício da ação penal a alguma outra condição. (2009, p.539).

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De acordo com o pensamento acima, Mirabete ainda esclarece que as condições de

procedibilidade “podem atuar sobre o mérito, sobre a ação ou sobre o processo, tudo

dependendo dos efeitos que a lei lhes der.” (2008, p.93).

Na contra mão dessa nomenclatura das chamadas condições específicas, Tucci diz

“que todas elas são, na realidade, condições para a propositura da ação penal.” (2002, p.97).

Para o autor essa divisão entre condições genéricas e específicas não tem razão de ser porque

todas “são condições para o exercício do direito à jurisdição penal.” (2002, p.98).

Desse modo, configuram como exemplos nos casos de ação penal pública

condicionada: a representação do ofendido e à requisição do Ministro da Justiça.

Grande parte da doutrina enumera ainda outras hipóteses: o trânsito em julgado da

sentença anulatória do casamento no crime do art. 236, parágrafo único do CP; a entrada do

agente no território nacional, nos casos de extraterritorialidade da lei penal, para atender à

exigência contida no art.7º do CP; poderes especiais na procuração que outorga poderes para

ajuizar queixa-crime, nos termos do art. 44 do CPP, entre outros.

Vale dizer, que em qualquer dessas hipóteses, a denúncia ou queixa deverá ser

rejeitada por faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal (art.

395, II do CPP). Porém, se o processo foi instaurado sem que tivesse sido percebida a falta de

uma das condições da ação, deve-se pedir o trancamento do processo via habeas corpus, ou

extinto pelo juiz através de decisão terminativa. Quanto aos efeitos da decisão, esta não será

julgada o mérito, podendo a ação ser novamente proposta desde que satisfeita essa condição,

enquanto não ocorrer a decadência ou a prescrição.

Tourinho Filho, diz que além das condições genéricas e específicas (ou de

procedibilidade), há ainda, as de prosseguibilidade e exemplifica a hipótese do art. 520 do

CPP.1 (2009, p.545).

3.5 Justa causa como quarta condição da ação penal

Muito antes da lei nº 11.719/2008 revogar o art. 43 do CPP, e incluir expressamente

a justa causa como condição preliminar, como se vê no art. 395, III do CPP,2 o professor

1 Art. 520- antes de receber a queixa, o juiz oferecerá às partes oportunidade para se reconciliarem, fazendo-as comparecer em juízo e ouvindo-as, separadamente, sem a presença dos seus advogados, não se lavrando termo.2 Art. 395- A denúncia ou queixa será rejeitada quando:III- faltar justa causa para o exercício da ação penal.

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Afrânio Silva Jardim, erigiu a justa causa como quarta condição para o exercício da ação

penal.

Segundo Jardim, a justa causa seria o “suporte probatório mínimo que deve lastrear

toda e qualquer acusação penal,” ou seja, “ um lastro mínimo de prova que deve fornecer

arrimo à acusação.” (1998, p.36). De acordo com o doutrinador, deve resultar do inquérito

policial ou das peças de informação, que devem acompanhar a acusação penal. No que diz

respeito à análise da prova:

Ressalta-se, entretanto, que uma coisa é constatar a existência daprova no inquérito ou peças de informação e outra coisa é valorá-la,cotejá-la. É preciso deixar claro que a justa causa pressupõe ummínimo de lastro probatório, mas não prova cabal. É necessário queaja alguma prova, ainda que leve. Agora se esta prova é boa ou ruim,isto já é questão pertinente ao exame do mérito da pretensão do autor,até porque as investigações policiais não se destinam a convencer ojuiz, tendo em vista o sistema acusatório e a garantia constitucional docontraditório, mas apenas viabilizar ação penal. (1998, p.43).

O autor quis demonstrar, é que a simples instauração do processo penal já atinge a

dignidade do acusado, causando-lhe graves repercussões na esfera moral, e que diante disso a

justa causa torna-se necessária como a quarta condição a ser exigida para evitar que a

acusação não seja temerária ou leviana. Conclui que, “somente diante desse conjunto

probatório é que, a nosso ver, se coloca o princípio da obrigatoriedade da ação penal pública.”

(JARDIM, 1998, p.42).

No mesmo pensamento, Pacelli Oliveira admite a justa causa como condição da

ação, “seja como quarta condição (da ação), inserida no contexto de demonstração do

interesse (utilidade) de agir, seja enquanto lastro mínimo de prova, a demonstrar a viabilidade

da pretensão deduzida.” (2012, p.112)

O nobre professor ainda aprecia o lastro mínimo de prova como direito à ampla

defesa. Nas suas palavras:

A questão de se exigir lastro mínimo de prova pode ser apreciadatambém sob a perspectiva do direito a ampla defesa. Com efeito,exigir do estado, por meio do órgão da acusação, ou do particular, naação privada, que a imputação feita na inicial demonstre, de plano, apertinência do pedido, aferível pela correspondência e adequação entreos fatos narrados e a respectiva justificativa indiciária (prova mínima,colhida ou declinada), nada mais é do que ampliar, na exata medida dopreceito constitucional do art.5º, LV, da CF, campo em que irá se

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desenvolver a defesa do acusado, já ciente, então, do caminhopercorrido na formação da opinio delicti. (2012, p.112).

Na ótica de Polastri Lima:

Se é verdade que a justa causa em sentido amplo [...], serve paradesignar a existência das condições da ação, [...] por outro lado, emsentido estrito, é erigida em verdadeira condição autônoma da ação, enão pode ser confundida com as demais condições da ação. (1998,p.118)

Para o Mestre, concordando com o pensamento de Jardim, a justa causa é uma

condição autônoma da ação penal, devendo ser fundada no suporte probatório mínimo para a

imputação.

Em posição contrária Maria Thereza Rocha de Assis Moura não concorda que a justa

causa seja condição da ação penal. Nas suas palavras:

Reafirmamos nós que a justa causa não constitui condição da ação,mas a falta de qualquer uma das apontadas condições implica falta dejusta causa: se o fato narrado na acusação não se enquadrar no tipolegal; se a acusação não tiver sido formulada por quem tenhalegitimidade para fazê-lo e em face de quem deva o pedido ser feito; efinalmente, se inexistir o interesse de agir, faltará justa causa para aação penal.(2001, p. 221)

A doutrinadora reconhece que a acusação não pode ser leviana ou temerária e por

isso deve vir lastreada nos elementos colhidos na fase investigatória. Porém, isso não elege a

justa causa como condição da ação. Assim, a análise da justa causa para a autora, não se faz

de maneira abstrata, mas na demonstração dos elementos que demonstrem a existência de

fundamento de fato e de direito, a partir do caso concreto. Seria uma síntese das condições da

ação, na falta de uma delas, não haveria justa causa para a ação penal.

Souza, no mesmo pensamento diz a justa causa não é uma condição autônoma, nem

quarta condição. “Com efeito, denúncia ou queixa que não descrever fato criminoso em tese

se mostra inepta, não podendo a aptidão de uma inicial ser erigida em condição da ação.”

(1995, p. 263).

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Percebe-se, por fim, que a análise da justa causa é de vital importância para a

persecução penal. Diante na nova redação do art.395 do CPP, trazido pela Lei 11.719/08,

ficou claro que a justa causa é uma condição da ação.

Se de um lado a doutrina e a jurisprudência já vinham admitindo a justa causa como

condição da ação, o art.648, I, do CPP,3 sempre admitiu o Habeas corpus para trancamento da

ação penal, tendo como fundamento a ausência de justa causa, tanto para questões processuais

(falta de prova mínima para lastrear a acusação, inépcia da inicial, etc.), quanto em matéria de

mérito da ação penal (causa extintiva de punibilidade, etc.).

3.6 Ausência de justa causa como hipótese de cabimento de habeas corpus para trancamento

da ação penal.

Antes de adentrar-se na análise do tema, faz-se necessário uma abordagem sobre o

instituto do Habeas corpus.

No Brasil o habeas corpus teve previsão no Código Criminal em 1832, onde o art.

340 dispunha que: “todo cidadão que entender que ele ou outrem sofre uma prisão ou

constrangimento em sua liberdade, tem o direito de pedir uma ordem de habeas corpus em

seu favor.” Os artigos seguintes cuidavam dos requisitos da petição, das hipóteses em que a

prisão era considerada ilegal, etc.

Com o advento da Constituição Republicana de 1891, o habeas corpus adquiriu

status constitucional, previsto pelo art. 72,§22 com a seguinte redação: “Dar-se-á o habeas

corpus sempre que o indivíduo sofrer ou se achar em iminente perigo de sofrer violência, ou

coação, por ilegalidade, ou abuso de poder.”

De acordo com Grinover,Gomes Filho e Fernandes, essa “ fórmula ampla do texto

constitucional propiciou o surgimento, na doutrina e jurisprudência, de forte corrente no

sentido da admissibilidade do writ para remediar toda e qualquer lesão de direitos.”(2009,

p.268).

Com o tempo fora mantido nas Constituições seguintes e hoje se encontra no art.5º,

LXVIII da Constituição Federal, não mais com a redação inicial que alargava e muito seu

significado, mas com a seguinte redação: “Conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém

sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção,

por ilegalidade ou abuso de poder.”

3 Art.648- A coação considerar-se á ilegal:I – quando não houver justa causa.

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De fato, o habeas corpus é uma ação com fundamento constitucional, destinada a

coibir qualquer ilegalidade ou abuso de poder contra a liberdade de locomoção.

Capez conceitua como: “Remédio judicial que tem por finalidade evitar ou fazer

cessar a violência ou a coação à liberdade de locomoção decorrente de ilegalidade ou abuso

de poder.” (2012, p.828)

Segundo Mirabete, “a expressão habeas corpus indica a essência do instituto, pois,

literalmente, significa [tome o corpo], isto é, tome a pessoa presa e a apresente ao juiz, para

julgamento do caso.” (2008, p.739). Hoje em dia não mais se apresenta o preso ao juiz, mas

ele continua analisando a legalidade do ato de prisão.

A natureza jurídica do Habeas corpus é muita discutida, pois o Código de Processo

Penal o coloca no capítulo dos recursos em geral, dando uma idéia que se trata de recurso.

Porém, grande parte da doutrina não reconhece como sendo recurso. Nas lições de Rangel:

Se investigarmos a essência do habeas corpus, veremos que derecurso não se trata. A uma porque o recurso pressupõe decisão nãotransitada em julgado e o habeas corpus pode ser impetrado de decisãoque já transitou em julgado, nos termos que autoriza o art.648, VI,VII,do CPP, pois se o juiz era absolutamente incompetente e a sentençatransitou em julgado, poderá ser impetrado habeas corpus paradesconstituí-la; [...]. A duas, porque o recurso é interposto sempre dedecisão judicial e o habeas corpus pode ser impetrado contra ato deautoridade administrativa ou, [...] de ato particular; A três, porque orecurso é interposto dentro da mesma relação jurídico-processual e ohabeas corpus instaura uma nova relação jurídica, independentementedaquela que deu origem á sua instauração. Ou, até mesmo, sem quehaja uma relação jurídica instaurada. (2010, p.1004).

Assim, para o professor Rangel, o habeas corpus não é recurso, mas uma ação

autônoma de impugnação cuja pretensão é a de liberdade. No mesmo sentido, Capez (2012, p.

828), Nucci (2010, p.934), Mirabete (2008, p. 739).

O professor Noronha, em posicionamento contrário diz que “o habeas corpus possui

um caráter misto, tanto um recurso como uma ação.” (1992, p. 403).

Com relação às espécies de habeas corpus, temos dois tipos: liberatório ou

repressivo e o preventivo. O primeiro destina-se a afastar constrangimento ilegal já efetivado

à liberdade de locomoção. O preventivo é como um salvo-conduto, que visa afastar uma

ameaça a liberdade de locomoção. (art. 660,§4º do CPP).4

4 Art.660, §4º: “se a ordem de habeas corpus for concedida para evitar ameaça de violência ou coação ilegal,

dar-se-á ao paciente um salvo-conduto assinado pelo juiz.”

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De acordo com o art.654 (caput) do CPP, o habeas corpus poderá ser impetrado por

qualquer pessoa, em seu favor ou de outrem, bem como pelo Ministério Público. Assim,

denomina-se impetrante aquele que ajuíza a ação de habeas corpus e paciente, a pessoa em

favor de quem a ordem é solicitada, mas nada impede que seja a mesma pessoa.

Nas lições de Mirabete, “qualquer do povo, independentemente de habilitação legal

ou de representação por advogado, de capacidade política, civil ou processual, de idade, sexo,

profissão, nacionalidade, pode fazer uso do remédio heróico, em benefício próprio ou alheio.”

(2008, p.740). Com isso configurou-se a legitimidade ativa.

Segundo Nucci, a legitimidade passiva na ação de habeas corpus está “a pessoa-

autoridade ou não- apontada como coatora, que deve defender a legalidade do seu ato, quando

prestar informações.Pode, ainda, ser o corpo estatal, como ocorre com Tribunais, Comissões

Parlamentares de Inquérito e outros colegiados.”(2010. P. 948). Assim, podemos dizer que o

legitimado passivo é a pessoa responsável pela ameaça ao direito de liberdade de locomoção,

cuja ilegalidade é apontada pelo impetrante.

Depois dessa breve análise sobre o tema habeas corpus, adentra-se agora na hipótese

desse remédio ser utilizado como ação de impugnação para o trancamento da ação penal por

falta de justa causa.

4. REJEIÇÃO DA DENÚNCIA OU QUEIXA: ANÁLISE DO ART. 395 DO CPP.

Da decisão que recebe a denúncia ou queixa, a maioria dos doutrinadores admite

que, via de regra, não cabe qualquer recurso. Para o professor Lopez Jr.:

Trata-se de grave lacuna (ou melhor, de uma opção autoritária de umCódigo de 1941) que desconsidera a lesividade e o gravame geradopelo recebimento de uma acusação, que trará, inegavelmente, umimenso rol de penas processuais (estigmatização social e jurídica,angústia e sofrimento psíquico, constrangimento inerente à submissãoao exercício do poder estatal etc.). (2010, p. 409)

Assim, na falta de um recurso específico, o imputado poderá se valer do

Habeas corpus, que já foi dito, não é recurso, mas sim ação de impugnação, para o

trancamento do processo, desde que falte justa causa ou qualquer das condições da ação, de

acordo com o art. 648 do CPP.5

5 Art. 648. A coação considerar-se-á ilegal:I – quando não houver justa causa;II – quando alguém estiver preso por mais tempo do que determina a lei;

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Vale ressaltar que o habeas corpus para trancamento da ação penal é medida

excepcional, de cognição sumária e não admite dilação probatória.

Segundo Assis Moura, “[...] não é verdade que no procedimento do Habeas Corpus,

seja vedado o exame da prova. O que se exige é que esta venha pré-constituida. [...] o que não

se deve admitir é dilação probatória, no âmbito do writ. (2001, p. 247)

De fato, conforme recente jurisprudência é cabível o writ, nos casos em que se

demonstrar a atipicidade da conduta, a extinção da punibilidade, ou outras situações que

comprovem de plano, suficientes para o encerramento da persecução penal. O tema será mais

detalhado no item jurisprudência.

Da decisão que rejeita a denúncia ou queixa, antes da lei nº 11.719/08, o art. 43 do

CPP, dizia que a denúncia ou queixa poderia ser rejeitada em três situações: “I – fato narrado

evidentemente não constitui crime; II – quando já estiver extinta a punibilidade pela

prescrição ou outra causa; III – quando for manifesta a ilegitimidade da parte ou faltar

pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal.

Com o advento da lei 11.719/08 que revogou o art 43 do CPP, vários procedimentos

foram alterados de forma substancial, criando uma nova roupagem para a rejeição da

acusação e inserindo uma decisão de absolvição sumária de acordo com o art. 397 do CPP.6

O art. 395 do CPP foi alterado por essa mesma lei e ficou com a seguinte redação: A

denúncia ou queixa será rejeitada quando: I – for manifestamente inepta; II – faltar

pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal; e III – faltar justa causa

para o exercício da ação penal.

Assim, de acordo com Lopes Jr.:

Estando presentes qualquer das situações previstas no art.395, deveráo juiz rejeitar liminarmente a denúncia ou queixa, impedindo onascimento do processo. Da decisão de rejeição, por falta de justacausa, entendemos que caberá recurso em sentido estrito, art.581, I.7

III – quando quem ordenar a coação não tiver competência para fazê-lo;IV – quando houver cessado o motivo que autorizou a coação;V – quando não for alguém admitido a prestar fiança, nos casos em que a lei autoriza;VI – quando o processo for manifestamente nulo;VII – quando extinta a punibilidade. 6 Art.397. Após o cumprimento do disposto no art.396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar:I – a existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato;II – a existência manifesta de causa de excludente da culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade;III – que o fato narrado evidentemente não constitui crime;IV – extinta a punibilidade do agente.7 Art.581. Caberá recurso, no sentido estrito, da decisão, despacho ou sentença:I – que não receber a denúncia ou a queixa.

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Quando a rejeição por falta de justa causa tiver por fundamento aausência de provas suficientes de autoria e materialidade, pensamosque essa decisão produzirá apenas coisa julgada formal. Havendonovos elementos, nada impede que a acusação seja novamenteformulada. (2010, p.415).

Diante do exposto percebe-se que o art. 395 deixa claro quando o juiz deverá rejeitar

a denúncia. Antes da Lei 11.729/08 muitos entendiam que a falta dos requisitos do art. 41 do

CPP,8 levava ao não recebimento da denúncia, cabendo recurso em sentido estrito (art.581, I)

ou o novo ajuizamento, desde que satisfeitos os requisitos. Outros não faziam distinção

nenhuma em relação à rejeição, prevista no art. 43 do CPP9 (hoje já revogado). Hoje, esse

pensamento não mais se coaduna, e da decisão que rejeita cabe recurso em sentido estrito

(art.581, I, do CPP).

4.1 Rejeição: inépcia da denúncia ou queixa.

O que caracteriza a inépcia da denúncia é a falta dos requisitos presentes no art. 41

do CPP.

De fato, não pode ser recebida a denúncia ou queixa em que não tenha a qualificação

do acusado ou a exposição do fato criminoso. Assim, o juiz deverá ater-se ao aspecto formal

para rejeitá-la.

Nas lições de Rangel, “não pode o Ministério Público ou o querelante, em vez de

narrar o fato, limitar-se a dizer que ele está devidamente descrito e caracterizado no inquérito.

Tal peça acusatória é inepta, por não ter sido feito exposição.” (2009, p.548).

Com relação ao último requisito, se o autor da denúncia não indicar suas

testemunhas, nada obsta que seja recebida, pois pela própria redação do art.41, ela é

dispensável.

4.2 Rejeição: ausência de pressupostos processuais.

8 Art. 41. A denúncia ou queixa terá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quandonecessário o rol das testemunhas.9 Art. 43 A denúncia ou queixa será rejeitada quando:

I- O fato narrado evidentemente não constituir crime;II-Já estiver extinta a punibilidade, pela prescrição ou outra causa;

III-For manifesta ilegitimidade da parte ou faltar condição exigida pela lei para o exercício da ação penal.Parágrafo único: nos casos do nºIII, a rejeição da denúncia ou queixa não obstará ao exercício da ação penal, desde que promovida por parte legítima ou satisfeita condição.

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A denúncia ou queixa será rejeitada quando não estiver revestida de pressupostos

processuais. Segundo a doutrina os pressupostos processuais seriam os requisitos

indispensáveis ou essenciais para o desenvolvimento regular do processo.

Assim, surgem os pressupostos de existência do processo: as partes (autor e réu), o

juiz (jurisdição) e o pedido (ou demanda). Contudo, só isso não basta, é necessário que

também estejam presentes os pressupostos de validade. O art. 395 do CPP representa os

pressupostos de validade para que o processo exista.

Nesse sentido, para Tourinho filho: “Não pode haver processo se a denúncia ou

queixa for dirigida a uma pessoa desvestida de jurisdição. Não pode haver processo penal sem

que haja uma denúncia ou queixa, sem que haja um acusador e um acusado. (2009, p.550).

Aqui o autor está se referindo aos pressupostos de existência. Quanto aos de validade ele

considera: “ a não-litispendência, a não coisa julgada, a não ilegitimidade da parte (seja ad

causam, seja ad processum), a falta de exame de corpo de delito, direito ou indireto, nos

crimes que deixam vestígios.” (2009, p.550).

4.3 Rejeição: ausência de condição para o exercício da ação penal.

As condições para o exercício da ação penal já foram explicadas anteriormente. De

fato, não havendo possibilidade jurídica do pedido, a denúncia ou queixa deverá ser rejeitada.

Tem-se como exemplo, o fato que não constitui crime, ou seja, um fato atípico. Nesse caso

falta uma condição da ação, restando ao juiz rejeitá-la.

A denúncia será rejeitada quando faltar o interesse de agir. Assim, não interessa mais

ao autor recorrer de um direito que já pereceu. Entretanto, se já estiver extinta a punibilidade

pela prescrição ou por outra causa rejeitada estará à denúncia ou queixa.

O Ministério Público é o órgão estatal encarregado da persecução penal, o legitimado

ordinário a oferecer a ação penal, e o ofendido é o legitimado extraordinário para propor a

ação penal privada. Assim, não pode o Ministério Público oferecer queixa, em ação privada.

Faltar-lhe-á a legitimidade para agir.

4.4 Rejeição: faltar justa causa para o exercício da ação penal.

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A ação penal deverá ser recebida com um suporte probatório mínimo que demonstre

a idoneidade da acusação. Sem o indício de existência mínimo que seja de crime, a denúncia

deverá ser rejeitada por falta de justa causa.

5 JURISPRUDÊNCIA

Antes de proceder-se à análise da justa causa na jurisprudência, faz-se necessário um

breve histórico da expressão “justa causa” no processo penal.

Vimos que a expressão justa causa possui diferentes significados nos diversos ramos

do direito, como o civil, processual civil, penal e trabalho. Por muito tempo, a expressão justa

causa, na doutrina e no direito processual penal, estava ligada apenas à privação da liberdade

física.

O Código Criminal de 1832 tratava a falta de justa causa com relação à prisão, e

silenciava a respeito da ação penal. Os Códigos Estaduais, que representaram o fruto da

consagração do princípio da descentralização processual inserto na Constituição de 1981, e

que perduraram até 1941, reproduziram, no tocante a justa causa, a regra de que a prisão, ou o

constrangimento, ou ainda, a coação seriam considerados ilegais quando não houvesse justa

causa.

Com o advento do Código de Processo Penal de 1941, mais precisamente no seu art.

648, I, que a coação considerar-se-á ilegal quando faltar justa causa. Assim, relacionou a justa

causa à coação ilegal, e não mais à prisão ilegal.

Estabeleceu o art. 647 do mesmo diploma legal que, “Dar-se-á habeas corpus sempre

que alguém sofrer ou se achar na iminência de sofrer violência ou coação ilegal na sua

liberdade de ir e vir, salvo nos casos de punição disciplinar.”

Se antes era aplicado o habeas corpus a questões relacionadas à prisão, agora

aparece como remédio contra indevida coação processual.

Nesse sentido, Souza comenta que o habeas corpus não se restringiu apenas à prisão.

Nas suas palavras:

Na prática do habeas corpus, entretanto, freqüentes se tornaram oscasos de pedido e concessão da ordem para o trancamento deprocessos em que a denúncia ou queixa seria rejeitada diante daexpressa determinação do art.43, I, do Código. Recebida, porém,evidente era a ilegalidade do processo, constituindo por isso mesmo

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uma coação ilegal, a refletir na liberdade do acusado. O habeas corpusse mostrava, por isso mesmo, de uso idôneo, tanto mais quanto,aludindo a casos específicos de seu cabimento, todos eles relacionadoscom o processo penal, o Código inclui, sem as correlacionar com aprisão ou ameaça dela, a “falta de justa causa” e a “nulidade manifestado processo”. Começava a aparecer, assim, a aplicação do habeascorpus como remédio, que também é contra a indevida coaçãoprocessual. (1995, p.254).

Hoje, na lei processual vigente, o art. 43 não prospera, pois foi revogado pela Lei

11.719/08 que deu nova redação ao art. 395, III do CPP: “a denúncia ou queixa será rejeitada

quando faltar justa causa para a o exercício da ação penal.”

Assim, passa-se então a análise jurisprudencial da justa causa na ação penal. Foram

consultados os Tribunais superiores STJ e STF.

5.1 Justa causa, fato típico e indícios de autoria e materialidade.

Nas decisões sobre o fato típico e indícios de autoria e materialidade só é permitido o

trancamento da ação penal se o fato evidentemente não constituir crime ou não houver

qualquer indício de autoria e materialidade. Assim, se a denúncia ou queixa estiverem de

acordo com o art.41 do CPP, não há que se falar em trancamento da ação penal.

HC 80516 / PE - PERNAMBUCO HABEAS CORPUSRelator (a): Min. NELSON JOBIMJulgamento: 06/02/2001 Órgão Julgador: Segunda TurmaPublicação

DJ 14-11-2002

Ementa

EMENTA: HABEAS CORPUS. PROCESSO PENAL. AÇÃO PENAL. FALTADE JUSTA CAUSA. EXAME DE PROVA. INVIABILIDADE. Não se tranca ação penal por falta de justa causa, salvo se o fato for evidentemente atípico ou não houver qualquer indício de autoria. Precedentes. No caso, a denúncia descreve fato típico, homicídio qualificado. Narra às circunstâncias em que o mesmoocorreu, com a descrição de data, local e meio de execução. Aponta a autoria na pessoa do Paciente e dos co-réus. Inviável o trancamento da ação penal. Ademais, o HABEAS não é meio idôneo para verificar a existência ou não de justa causa, quando implicar em profundo exame do conjunto probatório. HABEAS indeferido.

RHC 82328/PE

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RECURSO EM HABEAS CORPUSRelator: Min. CARLOS VELOZOJulgamento: 08/10/02Partes:Recte: Emanuel Santiago AlencarAdvdos: Ernesto Gonçalo Cavalcanti e OutroRecdo: Ministério Público FederalEmenta EMENTA: PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. ALEGAÇÃO DE FALTA DE JUSTA CAUSA: INOCORRÊNCIA. REEXAME DO CONJUNTO PROBATÓRIO: IMPOSSIBILIDADE. I. - Denúncia que atende aos requisitos do art. 41 do CPP. II. - A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de que não se tranca a ação penal quando a conduta descrita na denúncia configura, em tese, crime. III. - A alegação de falta de justa causa para a ação penalimplica o exame do conjunto probatório, o que não se admite em sede de habeas corpus. IV. - Recurso desprovido.

HC 81612 / SP - SÃO PAULO HABEAS CORPUSRelator(a): Min. NELSON JOBIMJulgamento: 18/06/2002 Órgão Julgador: Segunda TurmaPublicaçãoDJ 22-11-2002 PP-00083 EMENT VOL-02092-02 PP-00374Parte(s)PACTE: FABIO SANTOS BUENOIMPTE: GEDEÃO NUNES DE MELOCOATOR:SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇAEmenta

EMENTA: HABEAS CORPUS. PROCESSO PENAL. AÇÃO PENAL. FALTADE JUSTA CAUSA. Não se tranca ação penal por falta de justa causa, salvo se o fato for evidentemente atípico. Precedentes. No caso, a denúncia descreve fato típico, em tese, de forma circunstanciada. Aponta a autoria na pessoa do Paciente e dos dois co-réus. O reconhecimento e a confissão do crime não são requisitos exigidos para sua formulação. Inviável o trancamento da ação penal. HABEAS indeferido.

RHC 90524 / SC - SANTA CATARINA RECURSO EM HABEAS CORPUSRelator(a): Min. JOAQUIM BARBOSAJulgamento: 08/04/2008 Órgão Julgador: Segunda TurmaPublicaçãoDJe-083 DIVULG 08-05-2008 PUBLIC 09-05-2008EMENT VOL-02318-02 PP-00219LEXSTF v. 30, n. 358, 2008, p. 380-389Parte(s)RECTE.(S): ARNILDO CORRÊAADV.(A/S): ALINE SCHÁRECDO.(A/S): MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALEmenta

EMENTA: CRIMINAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. HOMICÍDIOS QUALIFICADOS TENTADO E CONSUMADO. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. INÉPCIA DA DENÚNCIA. INOCORRÊNCIA. ALEGAÇÃO DE EXISTÊNCIA DE LEGÍTIMA DEFESA. MATÉRIA QUE NÃO PODE SER EXAMINADA EM

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HABEAS CORPUS. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO. 1. A denúnciadescreve os fatos imputados ao paciente e aponta o fato típico criminal, atendendo ao disposto no art. 41 do Código de Processo Penal. 2. Conduta suficientemente delineada e apta a proporcionar o exercício da defesa. 3. Saber se a denúncia tomou por base exclusivamente os depoimentos das vítimas sobreviventes é análise de prova que não deve ser realizada na via eleita, reservada que está, com exclusividade, às instâncias ordinárias. 4. A alegação de que as vítimas teriam iniciado a agressão contra co-réu, a qual, em princípio, seria apta a configurar a excludente de legítima defesa, bem como o pedido visando à declaração da atipicidade da conduta, são matérias insuscetíveis de exame na via do habeas corpus,por demandarem análise de prova. 5. Negado provimento ao recurso.

Trancamento concedido

HC 98631 / BA - BAHIA HABEAS CORPUSRelator(a): Min. CARLOS BRITTOJulgamento: 02/06/2009 Órgão Julgador: Primeira TurmaPublicaçãoDJe-121 DIVULG 30-06-2009 PUBLIC 01-07-2009EMENT VOL-02367-04 PP-00712LEXSTF v. 31, n. 367, 2009, p. 471-486Parte(s)PACTE.(S): ULYSSES GONÇALVES DA SILVA NETO OU ULYSSES GONÇALVES NEVES SOBRINHOIMPTE.(S): ULYSSES GONÇALVES DA SILVA NETOADV.(A/S): JOSÉ SARAIVACOATOR(A/S)(ES): SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇAEmenta

EMENTA: PROCESSO PENAL. AÇÃO PENAL. CRIME CONTRA A HONRA DE MAGISTRADO. SUPOSTAS OFENSAS PROFERIDAS POR ADVOGADO NO BOJO DE MANDADO DE SEGURANÇA. DELITO DE CALÚNIA. INVIOLABILIDADE DO ADVOGADO. LIMITAÇÃO. INÉPCIA DA DENÚNCIA. FALTA DE JUSTA CAUSA PARA A AÇÃO PENAL. ORDEM DEFERIDA PARA TRANCAR A AÇÃO PENAL. 1. É firme a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal quanto à excepcionalidade do trancamento de ação penal pela via processualmente acanhada do habeas corpus. Jurisprudência, essa, lastreada na idéia-força de que o trancamento da ação penal é medida restrita a situações que se reportem a conduta não-constitutiva de crime em tese, ou quando já estiver extinta a punibilidade, ou, ainda, se inocorrentes indícios mínimos da autoria (HCs 87.310, 91.005 e RHC 88.139, de minha relatoria; HC 85.740, da relatoria do ministro Ricardo Lewandowski; e HC 85.134, da relatoria doministro Marco Aurélio). 2. A prerrogativa estampada no art. 133 da Constituição Federal se põe como uma condição mesma de exercício altivo e desembaraçado comindependência funcional e desassombro pessoal, portanto. Razão de ser da estruturação da atividade advocatícia em lei necessariamente especial ou orgânica (Lei nº 8.906/94). Todavia, a inviolabilidade constitucionalmente assegurada ao advogado não se estende ao delito de calúnia 3. Na concreta situação dos autos, o processamento da denúncia ajuizada contra o paciente encontra óbice no que dispõe o inciso III do art. 395 do Código de Processo Penal. É que a denúncia não descreve fatos integralizadores dos elementos objetivos e subjetivos do tipo penal de calúnia. Situação a autorizar o excepcional trancamento da ação penalna via processualmente contida do habeas corpus. 4. Ordem concedida.

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5.2 Justa causa e inépcia da denúncia.

Na busca pelo trancamento da ação penal, além da alegação da falta de justa causa, também é pedida a inépcia da denúncia. O Supremo Tribunal Federal tem alguns entendimentos para declará-la: 1.considera que dois parâmetros devem ser analisados: o art.41e o art. 395 do CPP; 2. Basta que preencha os requisitos do art. 41 do CPP; 3. Se a denúncia descrever de forma sucinta e individualizada a conduta, estabelecendo o nexo de causalidade com os fatos, não é inepta.

HC 104420 / BA - BAHIA HABEAS CORPUSRelator(a): Min. AYRES BRITTOJulgamento: 10/04/2012 Órgão Julgador: Segunda TurmaPublicaçãoACÓRDÃO ELETRÔNICODJe-084 DIVULG 30-04-2012 PUBLIC 02-05-2012Parte(s)RELATOR: MIN. AYRES BRITTOPACTE.(S): ROSINETE MACEDO OLIVEIRA OU ROSINETE OLIVEIRA DOS HUMILDES OU ROSINETE MACÊDO RAMOSIMPTE.(S): JOSÉ LEONI MACHADO BOA SORTE E OUTRO(A/S)COATOR(A/S)(ES): SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇAEmenta

Ementa: HABEAS CORPUS. CRIMES DE HOMICÍDIO QUALIFICADO E FORMAÇÃO DE QUADRILHA. PEDIDO DE TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. INÉPCIA DA DENÚNCIA. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE FLAGRANTE OU ABUSO DE PODER. DENÚNCIA QUE DESCREVE SUFICIENTEMENTE OS FATOS ILÍCITOS. ORDEM DENEGADA. 1. A Constituição Federal de 1988, ao cuidar do habeas corpus, no inciso LXVIII do art. 5º, autoriza o respectivo manejo “sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção”. Mas a Constituição não pára por aí e arremata o seu discurso normativo: “por ilegalidade ou abuso de poder”. De outro modo, aliás, não podia ser, pois ilegalidade e abuso de poder não se presumem; ao contrário, a presunção é exatamente inversa. Em suma, o 1indeferimento do habeas corpus não é uma exceção; exceção é o trancamento da ação penal à luz desses elementos interpretativos diretamente hauridos da Carta Magna de 1988. 2. Quando se trata de apreciar a alegação de inépcia da denúncia ou de sua esqualidez por qualquer outro motivo, dois são os parâmetros objetivos que orientam tal exame: os arts. 41 e 395 do Código de Processo penal. O art. 41 indica um necessário conteúdo positivo para a denúncia, pois ela, denúncia, deve conter a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelosquais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas. Isso para que a garantia constitucional do contraditório se estabeleça nos devidos termos. Já o art. 395, este impõe à peça de acusação um conteúdo negativo. Se no primeiro (art. 41) há uma obrigação de fazer por parte do Ministério Público, no segundo (art. 395) há uma obrigação de não fazer; ou seja, a denúncia não pode incorrer nas impropriedades indicadas no

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mencionado art. 395 do CPP. 3. No caso, ausente qualquer pressuposto para o encerramento prematuro da ação penal. É que a inicial acusatória descreve, suficientemente, os fatos supostamente ilícitos. Mais: a denúncia foi oferecida, e oportunamente aditada, de modo a permitir o exercício da ampla defesa. Pelo que não é fruto de um descuidado ou de um arbitrário exercício do poder-dever de promover a ação penal pública. 4. Ordem denegada.

HC 109942 / SP - SÃO PAULO HABEAS CORPUSRelator(a): Min. CÁRMEN LÚCIAJulgamento: 28/02/2012 Órgão Julgador: Primeira TurmaPublicaçãoPROCESSO ELETRÔNICODJe-150 DIVULG 31-07-2012 PUBLIC 01-08-2012Parte(s)RELATORA: MIN. CÁRMEN LÚCIAPACTE.(S): PAULO ROMIIMPTE.(S): MAITÊ CAZETO LOPES RODRIGUES E OUTRO(A/S)COATOR(A/S)(ES): SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇAEmenta

EMENTA: HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL PENAL. CRIME DE HOMICÍDIO CULPOSO. TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL. INÉPCIA DA DENÚNCIA. ALEGAÇÃO DE FALTA DEJUSTA CAUSA PARA AÇÃO PENAL. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. HABEAS CORPUS DENEGADO NO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA EM CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ORDEM DENEGADA. 1. Não é inepta a denúncia que bem individualiza as condutas, expondo de forma pormenorizada o fato criminoso, preenchendo, assim, os requisitos do art. 41 do CPP. 2. Não se admite na via acanhada do habeas corpus, a análise aprofundada de fatos e provas, a fim de se verificar a inocência do Paciente. 3. O trancamento da ação penal, em habeas corpus, apresenta-se como medida excepcional, que só deve ser aplicada quando evidente a ausência de justa causa, o que não ocorre quando a denúncia descreve conduta que configura crime em tese. 4. Habeas corpus denegado.

HC 101851 / MT - MATO GROSSO HABEAS CORPUSRelator(a): Min. DIAS TOFFOLIJulgamento: 03/08/2010 Órgão Julgador: Primeira TurmaPublicaçãoDJe-200 DIVULG 21-10-2010 PUBLIC 22-10-2010EMENT VOL-02420-03 PP-00481Parte(s)PACTE.(S): MARIA HELENA BRAILE TURQUINOIMPTE.(S):MARCOS DANIEL VELTRINI TICIANELLICOATOR(A/S)(ES):SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇAEmenta

EMENTA HABEAS CORPUS. PENAL E PROCESSUAL PENAL. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL POR AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. EXCEPCIONALIDADE. INÉPCIA DA

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DENÚNCIA. INOCORRÊNCIA. CRIMES AMBIENTAIS. RESPONSABILIDADE DOS DIRIGENTES DA PESSOA JURÍDICA. REEXAME DE PROVAS. INVIABILIDADE. 1. O trancamento da ação penal por ausência de justa causa é medida excepcional, justificando-se quando despontar, fora de dúvida, atipicidade da conduta, causa extintiva da punibilidade ou ausência de indícios de autoria. 2. A denúnciaque descreve as condutas de corréu de forma sucinta, porém individualizada, estabelecendo nexo de causalidade com os fatos, não é inepta. 3. A responsabilidade por crimes ambientais é, por expressa previsão legal, atribuível aos dirigentes da pessoa jurídica. Precedentes. 4. O habeas corpus não é a via processual adequada à análise aprofundada de matéria fático-probatória. 5. Ordem denegada.

HABEAS CORPUSRelator(a): Min. AYRES BRITTOJulgamento: 06/03/2012 Órgão Julgador: Segunda TurmaPublicaçãoPROCESSO ELETRÔNICODJe-065 DIVULG 29-03-2012 PUBLIC 30-03-2012RB v. 24, n. 582, 2012, p. 54-58RT v. 101, n. 921, 2012, p. 649-656Parte(s)PACTE.(S): NORIMAR RÉGIA DE CASTRO DOS SANTOS OU NORIMAR RÉGIA DE CASTROIMPTE.(S): ROBERTO PODVAL E OUTRO(A/S)COATOR(A/S)(ES): SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇAEmenta

EMENTA: HABEAS CORPUS. CRIME DE EMISSÃO DE DUPLICATA SIMULADA (ART. 172 DO CÓDIGO PENAL). DELITO SOCIETÁRIO. ALEGADA INÉPCIA DA DENÚNCIA. FALTA DE INDIVIDUALIZAÇÃO DA CONDUTA. ORDEM CONCEDIDA. 1. É pacífica a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal em considerar excepcional o trancamento da ação penal, pela via processualmente acanhada do habeas corpus. Via de verdadeiro atalho que somente autoriza o encerramento prematuro do processo-crime quando de logo avulta ilegalidade ou abuso de poder (HCs 86.362 e 86.786, da minha relatoria; e 84.841 e 84.738, da relatoria do ministro Marco Aurélio). 2. A denúncia discutida neste processo não descreveu, suficientemente, os fatos ilícitos, alegadamente protagonizados pela paciente. Paciente denunciada pelo crime de emissão de duplicata simulada (art. 172 do Código Penal) tão-somentepor figurar no contrato social da empresa sob investigação. Inicial acusatória que incorreu na impropriedade descrita no inciso I do art. 395 do Código de Processo Penal, a transformar a ampla defesa em curta defesa. 3. Ordem concedida para reconhecer a inépcia da denúncia.

5.3 Justa causa e exame da prova.

No Supremo Tribunal Federal, o trancamento da ação penal por falta de justa causa em sede de habeas corpus é medida excepcional, cabível somente quando a conduta for atípica; jáestiver extinta a punibilidade ou quando não houver indícios de autoria e materialidade.

Assim, o Habeas corpus não comporta exame aprofundado de provas, em razão até mesmo do seu caráter sumaríssimo.

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HC 112465 / RS - RIO GRANDE DO SUL HABEAS CORPUSRelator(a): Min. LUIZ FUXJulgamento: 18/12/2012 Órgão Julgador: Primeira TurmaPublicaçãoPROCESSO ELETRÔNICODJe-031 DIVULG 15-02-2013 PUBLIC 18-02-2013Parte(s)RELATOR: MIN. LUIZ FUXPACTE.(S : RICARDO FERREIRA MARTINSPACTE.(S): ARMANDO DOMINGOS SELIGIMPTE.(S) : CRISTIANO DE SOUZA SELIGCOATOR(A/S)(E):RELATORA DO HC Nº 128.397 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇAEmenta

Ementa: Processual penal. Habeas corpus. Falsidade ideológica – art. 299 do Código Penal. Trancamento da ação penal. Excepcionalidade. Pleito julgado prejudicado no Tribunal a quo em face da superveniente prolação da sentença condenatória. Precedentes desta Corte. Denúncia em conformidade com o art. 41 do CPP. Dolo específico – especial fim de agir. Reexame de provas. Inviabilidade em habeas corpus. 1. O trancamento da Ação Penal por meio de habeas corpus é medida excepcional somente admissível quando transparecer dos autos, de forma inequívoca, a inocência do acusado, a atipicidade da conduta ou a extinção da punibilidade (HC 101754/PE, rel. Min. Ellen Gracie, 2ª Turma, DJ de 24/6/2010; HC 92959/SP, rel. Min. Carlos Britto, 1ª Turma, DJ de 11/2/2010, e HC 97.725, 1ª Turma, Rel. Ministra CÁRMEN LÚCIA, DJe de 26/03/201). 2. In casu, o paciente, Delegado de Polícia, inseriu informações falsas em auto de prisão em flagrante, consistente em que o custodiado fora entrevistado com determinado advogado, corréu na ação penal, sendo posteriormente descoberto que tal advogado, apesar de ciente do fato, sequer estava presente na ocasião, por isso foram processados pelo crime de falsidade ideológica –art. 299 do Código Penal. 3. O ato impugnado, que julgou prejudicado o writ em face da superveniente prolação de sentença condenatória, ajusta-se à jurisprudência desta Corte (HC 88.292, Rel. Ministro Eros Grau, DJ 4.8.2006 e HC 97.725, 1ª Turma, Rel. Ministra CÁRMEN LÚCIA, DJe de 26/03/2010). 4. A alegação de ausência do elemento subjetivo do tipo não é passível de exame em habeas corpus, visto demandar acurado reexame de fatos e provas. 5. Habeas corpus não conhecido.

HC 104382 / RJ - RIO DE JANEIRO HABEAS CORPUSRelator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKIJulgamento: 17/08/2010 Órgão Julgador: Primeira TurmaPublicaçãoDJe-214 DIVULG 08-11-2010 PUBLIC 09-11-2010EMENT VOL-02427-01 PP-00054Parte(s)PACTE.(S) : NELSON ROBERTO NOGUEIRA MUCURY GRACIOIMPTE.(S) : RICARDO CERQUEIRA E OUTRO(A/S)COATOR(A/S)(ES): SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇAEmenta

EMENTA: HABEAS CORPUS. PENAL E PROCESSUAL PENAL. TRÁFICOILÍCITO DE DROGAS. PRESCRIÇÃO DE SUBSTÂNCIAS ELENCADAS NA LISTA ‘C1’ DA PORTARIA 344/1998 DASECRETARIA DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA DO MINISTÉRIO DA SAÚDE (SVS/MS), QUE

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TRATADAS SUBSTÂNCIAS SUJEITAS A CONTROLE ESPECIAL. TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL. ALEGAÇÃO DE ATIPICIDADE DA CONDUTA. MEDIDA EXCEPCIONAL CUJA PERTINÊNCIA NÃO RESTOU DEMONSTRADA. IMPOSSIBILIDADE DE SUBSTITUIÇÃO DO PROCESSO DE CONHECIMENTO PELA VIA ESTREITA DO HABEAS CORPUS. NÃO OCORRÊNCIA DE ABSORÇÃO DO CRIME DE TRÁFICO PELO DE EXERCÍCIO ILEGAL DA MEDICINA.PRECEDENTES. ORDEM DENEGADA. I – Não há falar em falta de justa causa para a persecução penal, uma vez que a mera prescrição de substâncias sujeitas ao controle do Ministério da Saúde, como se deu na espécie, permite o oferecimento de denúncia pela prática, em tese, do crime de tráfico de drogas. II – Opotencial lesivo da droga ministrada pelo paciente já foi previamente aferido no momento da sua inclusão na referida portaria do Ministério da Saúde, dispensando, para fins penais, qualquer exame pericial com esse objetivo. III – O trancamento da ação penal, em habeas corpus, constitui medida excepcional que só deve ser aplicada quando evidente a ausência de justa causa, o que não ocorre quando a denúncia descreve conduta que configura crime em tese. Precedentes. IV –As alegações de que as substâncias prescritas não são capazes de gerar dependência e de que o paciente não agiu com a intenção (dolo) de praticar o crime de tráfico ilícito de drogas extrapola os limites da via estreita do habeas corpus, que não admite discussão aprofundada de fatos e provas, como tem consignado esta Corte por meio de remansosa jurisprudência. Precedentes. V – A jurisprudência do STF firmou o entendimento de que não se pode substituir o processo de conhecimento pela via excepcional do habeas corpus, o qual se presta, precipuamente, para afastar a manifesta violência ou coação ilegal ao direito de locomoção. Precedentes. VI – Não se exige, para a configuração do exercício ilegal da medicina, a prescrição de substância tida como droga para os fins da Lei 11.343/2006, o que afasta a alegação de absorção do crime de tráfico pelo primeiro delito citado. VII – Ordem denegada.

HC 100637 / BA - BAHIA HABEAS CORPUSRelator(a): Min. ELLEN GRACIEJulgamento: 08/06/2010 Órgão Julgador: Segunda TurmaPublicaçãoDJe-116 DIVULG 24-06-2010 PUBLIC 25-06-2010EMENT VOL-02407-03 PP-00590LEXSTF v. 32, n. 379, 2010, p. 379-384Parte(s)PACTE.(S): EDUARDO JOSÉ DE SANTANAPACTE.(S): ANA LÚCIA ALENCAR SANTANAIMPTE.(S): CRISTIANO PINTO SEPULVEDACOATOR(A/S)(ES): SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇAEmenta

HABEAS CORPUS. DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. INEXISTÊNCIA DE FATO TÍPICO.EXAME APROFUNDADO DE PROVA. IMPOSSIBILIDADE NA VIA ELEITA. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. EXCEPCIONALIDADE. DENÚNCIA.CUMPRIMENTO AO ART. 41 DO CPP. PRESCRIÇÃO ANTECIPADA. INADMISSIBILIDADE. WRIT PARCIALMENTE CONHECIDO E DENEGADO. 1. Esta Corte possui orientação pacífica no sentido da incompatibilidade do habeas corpus quando houver necessidade de apurado reexame de fatos e provas, não podendo o remédio constitucional servir como espécie de recurso que devolva completamente toda a matéria decidida pelas instâncias ordinárias ao Supremo Tribunal Federal. Precedentes. 2. A questão da inexistência de fato típico merece análise mais detida na oportunidade dojulgamento do processo, com amparo nas provas produzidas durante a instrução processual, sob o crivo do contraditório, o que impede o conhecimento do presente

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writ quanto a esse ponto. 3. O trancamento da ação penal, em habeas corpus, constitui medida excepcional que só deve ser aplicada quando indiscutível a ausência de justa causa ou quando há flagrante ilegalidade demonstrada em inequívoca prova pré-constituída. Precedentes. 4. As condutas dos pacientes foram suficientemente individualizadas, ao menos para o fim de se concluir pelo juízo positivo de admissibilidade da imputação feita na denúncia. 5. É inadmissível a extinção da punibilidade em virtude de prescrição da pretensão punitiva com base em previsão da pena que hipoteticamente seria aplicada, independentemente da existência ou sorte do processo criminal. Precedentes. 6. Habeas corpus parcialmente conhecido e denegado.

HC 94272 / SP - SÃO PAULO HABEAS CORPUSRelator(a): Min. MENEZES DIREITOJulgamento: 17/02/2009 Órgão Julgador: Primeira TurmaPublicaçãoDJe-059 DIVULG 26-03-2009 PUBLIC 27-03-2009EMENT VOL-02354-03 PP-00547RTJ VOL-00210-02 PP-00302Parte(s)PACTE.(S): NATALÍCIO FERREIRA ALVESIMPTE.(S): THEODOMIRO DIAS NETO E OUTRO(A/S)COATOR(A/S)(ES): SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇAEmenta

EMENTA Habeas corpus. Penal e Processual penal. Homicídio duplamente qualificado. Ausência de justa causa para o prosseguimento da ação penal não configurada. Materialidade comprovada e indícios de autoria. Reexame de provas. Inviabilidade. Precedentes. 1. A denúncia que contém condição efetiva que autorize o denunciado a proferir adequadamente a defesa não configura indicação genérica capaz de manchá-la com a inépcia. No caso, a denúncia demonstrou claramente o crime na sua totalidade e especificou a conduta ilícita supostamente praticada pelo paciente. 2. O trancamento de ação penal em habeas corpus impetrado com fundamento na ausência de justa causa é medida excepcional que, em princípio, não tem cabimento quando a denúncia ofertada narra suficientemente fatos que constituem o crime. 3. A via estreita do habeas corpus nãocomporta dilação probatória, exame aprofundado de matéria fática ou nova valoração dos elementos de prova, sendo estes reservados a via ordinária da ação penal. 4. Habeas corpus denegado.

RHC 113508 / DF - DISTRITO FEDERAL RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUSRelator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKIJulgamento: 02/04/2013 Órgão Julgador: Segunda TurmaPublicaçãoPROCESSO ELETRÔNICODJe-070 DIVULG 16-04-2013 PUBLIC 17-04-2013Parte(s)RELATOR: MIN. RICARDO LEWANDOWSKIRECTE.(S): DOUGLAS BAPTISTAADV.(A/S): JOÃO CARLOS PEREIRA FILHORECDO.(A/S : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALPROC.(A/S)(ES): PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICAEmenta

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Ementa: HABEAS CORPUS. PACIENTE PRONUNCIADO PELO CRIME DE HOMICÍDIO TRIPLAMENTE QUALIFICADO. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. ALEGAÇÃO DE FALTA DE JUSTA CAUSA. IMPROCEDÊNCIA. EXISTÊNCIA DE INDÍCIOS DE AUTORIA E MATERIALIDADE. EXAME DE CORPO DE DELITO. PRESCINDIBILIDADE. DESAPARECIMENTO DOS VESTÍGIOS. PROVA TESTEMUNHAL. SUPRIMENTO. RECURSO IMPROVIDO. I – O art. 167 doCódigo de Processo Penal dispõe que, desaparecendo os vestígios do crime, a falta do exame de corpo de delito poderá ser suprida pela prova testemunhal, como ocorreu no caso dos autos. Improcedente, dessa forma, a alegação de falta de justa causa para a ação penal por ausência de prova da materialidade do crime. II – O exame das questões relativas à materialidade do crime, suscitadas pela defesa, deverá ter lugar no juízo competente para a causa, no caso, o Tribunal do Júri. III – Para se chegar a conclusão diversa da adotada pelas instâncias anteriores, no sentido da inexistência de prova da materialidade do crime, necessário seria o reexame do conjunto fático-probatório da causa, providência sabidamente inviável em habeas corpus. IV – Recurso ordinário em habeas corpus improvido.

5.4 Justa causa e sentença condenatória.

De acordo com o Superior Tribunal de Justiça (STJ), consoante com o entendimento do

Supremo Tribunal Federal (STF), não é possível a análise da falta de justa causa com a

superveniência da sentença condenatória, pois demandaria exame aprofundado da prova o que

não é viável em sede de habeas corpus. Assim, na superveniência da sentença condenatória a

alegação da falta de justa causa ficará prejudicada.

Interessante é o último julgado desse item, o habeas corpus n.148669/SC como

substitutivo de recurso ordinário em que o STJ, consoante com o STF, não mais aceita o writ

em substituição. O STJ reconheceu que a jurisprudência flexibilizou e até ampliou as

hipóteses de cabimento do habeas corpus, porém, esse entendimento não é o mais acertado

uma vez que o recurso cabível segundo a Magna Carta (art. 105, II, alínea “a”) para o

reexame das decisões dos Tribunais Estaduais e Tribunais Regionais Federais, quando

denegatórias de habeas corpus, é o recurso ordinário. Assim, configura-se um novo

entendimento jurisprudencial. Com relação à superveniência da sentença condenatória, o

entendimento continua o mesmo, ou seja, o writ continua prejudicado e perde o seu objeto: o

trancamento da ação penal por falta de justa causa.

STJAgRg no RHC19262/PRRel. Min. ASSUETE MAGALHÃES. 6ª turma.Julg. 02/04/2013PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EM HABEAS CORPUS. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL, POR AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. ALEGAÇÃO DE NÃO DEMONSTRAÇÃO DO ENVOLVIMENTO DO PACIENTE NO DELITO

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IMPUTADO NA DENÚNCIA. SUPERVENIÊNCIA DA SENTENÇA CONDENATÓRIA. APELAÇÃO JÁ JULGADA, PELO TRIBUNAL A QUO. WRIT PREJUDICADO. JURISPRUDÊNCIA DO STJ. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.I. A superveniência de sentença condenatória - em que foramexaminadas, em ampla cognição, a autoria e a materialidade do delito- torna sem objeto o Habeas corpus em que se busca o trancamento daAção Penal, em face da ausência de justa causa.II. No posterior julgamento da apelação, perante o Tribunal de 2ºGrau, também foi verificada a aptidão da peça acusatória, em facedas provas, a existência de provas da materialidade do delito e desua autoria, inclusive em relação ao paciente, o que reforça aprejudicialidade e a perda do objeto do presente Habeas corpus, noqual se postula o trancamento da Ação Penal, em decorrência dealegada falta de justa causa. Precedentes do STJ (AgRg no RHC33.119/GO, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA,DJe de 04/12/2012; HC 148.669/SC, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTATURMA, DJe de 25/10/2012; HC 84.644/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZADE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, DJe de 01/07/2010).III. Agravo Regimental desprovido.

STJHC190095/ACRel. Min. Laurita Vaz. 5ª Turma.Julg.11/06/2013HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. DESCABIMENTO. COMPETÊNCIA DAS CORTES SUPERIORES. MATÉRIA DE DIREITO ESTRITO. MODIFICAÇÃO DE ENTENDIMENTODESTE TRIBUNAL, EM CONSONÂNCIA COM A SUPREMA CORTE. QUADRILHA. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. INÉPCIA DA DENÚNCIA E FALTA DE JUSTA CAUSA. ANÁLISE SOBRE A MATERIALIDADE DO DELITO QUE NÃO PODE SER FEITA NA VIA ELEITA, SOBRETUDO APÓS A SUPERVENIÊNCIA DE SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. RESPOSTA DO ACUSADO. TESE DE NULIDADE DA DECISÃO QUE REJEITA AS TESES DEFENSIVAS APRESENTADAS NA FORMA DO ART. 396-A DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE FLAGRANTE QUE, EVENTUALMENTE, PUDESSE ENSEJAR A CONCESSÃO DA ORDEMDE OFÍCIO. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO.1. O Excelso Supremo Tribunal Federal, em recentes pronunciamentos,aponta para uma retomada do curso regular do processo penal, aoinadmitir o habeas corpus substitutivo do recurso ordinário.Precedentes: HC 109.956/PR, 1.ª Turma, Rel. Min. Marco Aurélio, DJede 11/09/2012; HC 104.045/RJ, 1.ª Turma, Rel. Min. Rosa Weber, DJede 06/09/2012; HC 108.181/RS, 1.ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, DJe de06/09/2012. Decisões monocráticas dos ministros Luiz Fux e DiasTóffoli, respectivamente, nos autos do HC 114.550/AC (DJe de27/08/2012) e HC 114.924/RJ (DJe de 27/08/2012).2. Sem embargo, mostra-se precisa a ponderação lançada pelo MinistroMarco Aurélio, no sentido de que, "no tocante a habeas jáformalizado sob a óptica da substituição do recurso constitucional,não ocorrerá prejuízo para o paciente, ante a possibilidade devir-se a conceder, se for o caso, a ordem de ofício."3. Com a superveniência de sentença condenatória fica preclusa aalegação de inépcia da denúncia. Precedentes do Supremo TribunalFederal e desta Corte Superior.

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4. O reconhecimento da ausência de justa causa na persecuçãocriminal, diante da inexistência de quaisquer elementos indiciáriosconcretos e objetivos para incriminar a acusada pelo delitotipificado na denúncia, demandaria, necessariamente, um exameacurado da prova, incabível na via estreita do habeas corpus,sobretudo após a sentença condenatória de primeiro grau que,apreciando detalhadamente os fatos ocorridos, vislumbrou aresponsabilidade criminal da ré.5. A tese de nulidade do decisum que analisou a resposta à acusaçãooferecida pela Paciente não foi arguida e, tampouco, analisada peloTribunal a quo. Por essa razão, não pode ser originariamenteexaminada por esta Corte Superior de Justiça, sob pena de indevidasupressão de instância.6. De todo modo, esta Corte já se pronunciou no sentido de que, nãosendo a hipótese de absolvição sumária do acusado, a manifestação doJuízo processante não há de ser exaustiva, sob pena de antecipaçãoprematura de um juízo meritório que deve ser naturalmente realizadoao término da instrução criminal, em estrita observância aosprincípios da ampla defesa e do contraditório. Precedente.7. Ausência de ilegalidade flagrante que, eventualmente, ensejasse aconcessão da ordem de ofício.8. Habeas corpus não conhecido.

STJAgRg no HC87084Rel. Min. ASSUETE MAGALHÃES. 6ª Turma.Julg. 07/02/3013PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL, POR AUSÊNCIA DE JUSTACAUSA. ALEGAÇÃO DE ATIPICIDADE DA CONDUTA. SUPERVENIÊNCIA DA SENTENÇA CONDENATÓRIA. WRIT PREJUDICADO. URISPRUDÊNCIA DO STJ. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.I. A superveniência de sentença condenatória - em que as provasforam consideradas suficientes para a condenação - torna sem objetoo habeas corpus, em que se busca o trancamento da Ação Penal, emface da ausência de justa causa, por atipicidade da condutaatribuída ao paciente.II. No julgamento da apelação, perante o Tribunal de 2º Grau, em quea cognição é ampla, poderá ser verificada a existência dematerialidade do delito e a sua autoria, bem como a tipicidade daconduta. Precedentes do STJ (STJ, AgRg no RHC 33.119/GO, Rel.Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, DJe de04/12/2012; HC 148.669/SC, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA,DJe de 25/10/2012).III. Agravo Regimental desprovido.

STJHC 148669/SCRel. Min. OG FERNANDES. 6ª Turma.Julg. 16/10/2012HABEAS CORPUS COMO SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO CONSTITUCIONAL. IMPOSSIBILIDADE. NÃO CONHECIMENTO. PREVISÃO CONSTITUCIONAL EXPRESSA DO RECURSO ORDINÁRIO COMO INSTRUMENTO PROCESSUAL ADEQUADO AO REEXAMEDAS DECISÕES DE TRIBUNAIS DENEGATÓRIAS DO WRIT. TRANCAMENTO DA AÇÃO. SUPERVENIÊNCIA DE SENTENÇA

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CONDENATÓRIA. PEDIDO PREJUDICADO. INÉPCIA DA INICIAL. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO VERIFICADO.1. A Constituição Federal define o rol de competências do SuperiorTribunal de Justiça para o exercício da jurisdição em âmbitonacional e, no que se refere ao reexame das decisões dos TribunaisEstaduais ou Regionais Federais, quando denegatórias de habeascorpus, estabelece taxativamente o instrumento processual adequadoao exercício de tal competência, a saber, o recurso ordinário (ex viart. 105, II, alínea "a", da CF).2. Esta Corte não deve continuar a admitir a impetração de habeascorpus (originário) como substitutivo de recurso, dada a clareza dotexto constitucional, que prevê expressamente a via recursal própriaao enfrentamento de insurgências voltadas contra acórdãos que nãoatendam às pretensões veiculadas por meio do writ nas instânciasordinárias.3. Embora se reconheça que a nossa jurisprudência, há muito, tenhaflexibilizado, e até mesmo ampliado, as hipóteses de cabimento dohabeas corpus, mostra-se importante, agora, em sintonia com os maisrecentes julgados do Supremo Tribunal Federal (Habeas Corpus nº109.956/PR, Informativo nº 674), a revisão jurisprudencial(overruling).4. A modificação desse entendimento representa o revigoramento, najurisprudência, do recurso ordinário, cuja fonte se encontra naprópria Carta Política e, por isso mesmo, andará em pleno compassocom os princípios da máxima efetividade e da força normativa daConstituição, que consubstanciam verdadeiro norte no processo deinterpretação e concretização do texto constitucional.5. É preciso que se opere uma releitura do habeas corpus, cujoobjetivo é a tutela da liberdade de locomoção, de salvaguarda contraarbitrarieddes porventura ainda ocorrentes no Estado Democrático.6. É nesse contexto que esta Corte e o Supremo Tribunal Federal têmrefinado o cabimento do habeas corpus, restabelecendo o seu alcanceaos casos em que demonstrada a necessidade de tutela imediata àliberdade de locomoção, de forma a não ficar malferida oudesvirtuada a lógica do sistema recursal vigente.7. Verificada a hipótese de dedução de habeas corpus em lugar dorecurso ordinário constitucional, impõe-se o seu não conhecimento,nada impedindo, contudo, que se corrija de ofício eventualilegalidade flagrante como forma de coarctar o constrangimentoilegal, situação inocorrente na espécie.8. Com o advento da sentença condenatória, consoante tem proclamadoesta Corte, perde objeto o habeas corpus por meio do qual sesustenta a ausência de justa causa, dado que, no julgamento daapelação, recurso de cognição mais ampla, poderá ser verificada amaterialidade do delito e a sua autoria, bem como a perfeitaadequação típica.9. Por outro lado, não se vislumbra manifesta ilegalidade na peçaacusatória, visto que a acusação, primo icto oculi, atende aosrequisitos legais do art. 41 do Código de Processo Penal, de formasuficiente para a deflagração da ação penal e o pleno exercício dedefesa.10. Habeas corpus não conhecido.

5.5 Comentários dos julgados

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Da análise desses diversos julgados, percebe-se que o trancamento da ação penal via

habeas corpus com fundamento na ausência de justa causa é medida excepcional, e só é

admissível quando emerge dos autos, de forma inequívoca, a inocência do acusado, a

atipicidade da conduta ou a extinção da punibilidade. Esse é o entendimento consolidado pelo

Supremo Tribunal Federal.

O habeas corpus também não comporta exame aprofundado de provas, ou seja,

dilação probatória, devido ao seu rito sumaríssimo. Assim, para que a prova seja analisada

nessa via estreita, deverá ser pré-constituída e demonstrar flagrante ilegalidade.

Percebe-se que, tanto no STJ como no STF, o habeas corpus substituto de recurso

ordinário não vem sendo mais aceito, o que configura mudança no entendimento da

jurisprudência, numa tentativa de restaurar o recurso ordinário, que é o recurso cabível do

reexame das decisões dos Tribunais Estaduais e Tribunais Regionais Federais, quando

negarem o writ.

Por fim, com a superveniência da sentença condenatória o habeas corpus perde o seu

objeto e não será possível o trancamento da ação penal por ausência de justa causa.

6 CONCLUSÃO

Quando ocorre a prática da infração penal, o Estado, detentor do monopólio da

jurisdição e possuidor do direito de punir, chama para si a pretensão punitiva.

O direito de ação, consagrado constitucionalmente é assegurado a todos os

indivíduos, mas encontra-se limitado a algumas condições e pressupostos processuais.

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Dentre as condições para a propositura da ação penal, temos a justa causa. No início

ligada à prisão ilegal, depois à coação ilegal e por fim sua inclusão no art.395, III do CPP,

onde a denúncia ou queixa será rejeitada quando faltá-la. Porém, muito antes dessa inclusão

alguns doutrinadores já consideravam a justa causa como quarta condição da ação, devido a

sua importância. Assim, esta deveria vir lastreada com um suporte probatório mínimo que

desse amparo a acusação.

Por outro lado, outros doutrinadores não consideram a justa causa como condição da

ação, mas sim a falta de qualquer uma das condições, qual seja, a possibilidade jurídica do

pedido, a legitimidade da parte e o interesse de agir.

Destarte, o que se evidencia é que a justa causa constitui o fundamento da acusação

em conformidade com a ordem jurídica e certo grau de prova. O que se busca é que a

acusação não seja leviana e nem temerária, mas que venha revestida de um mínimo de

evidência. O promotor de justiça bem como o particular não devem buscar a condenação a

todo custo, mas algum indício de autoria e um mínimo de culpabilidade. Assim, na falta

desses elementos não deveria ser possível submeter alguém ao processo criminal, porque nem

sequer haveria probabilidade de condenação.

De certo, que a falta de justa causa implica em rejeição da denúncia, e caso o juiz não

a rejeite é possível se valer do habeas corpus para o trancamento da ação penal.

A jurisprudência tem entendido que esse trancamento por via do writ é medida

excepcional, não comportando exame aprofundado de prova, ou seja, dilação probatória.

De fato, o remédio constitucional continua sendo largamente utilizado numa tentativa

de dilatar ou ampliar a sua incidência com relação ao exame da prova. Todavia, o

posicionamento dos Tribunais é no sentido de não acatar o pedido. Assim, percebe-se que

pela via estreita do writ, esse reexame aprofundado da prova não encontra amparo.

Desse modo, a prova já deverá vir pré-constituída para que seja analisada pelos

Tribunais.

Diante das considerações apresentadas, o que se busca com a necessidade da

existência de justa causa para a acusação, é que ela sirva como mecanismo para impedir a

ocorrência de um processo criminal, que nem deveria ter começado por faltar o indício

mínimo, ou razão suficiente para a instauração da ação penal.

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