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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
KAREN PRATES DE AZEVEDO
O TRABALHO INFANTO-JUVENIL NO FUTEBOL:
Lei x Realidade
Porto Alegre
2011
1
KAREN PRATES DE AZEVEDO
O TRABALHO INFANTO-JUVENIL NO FUTEBOL:
Lei x Realidade
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Departamento de Direito Econômico e do Trabalho da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, como cumprimento de requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito.
Orientadora: Profª. Luciane Cardoso Barzotto.
Porto Alegre
2011
2
KAREN PRATES DE AZEVEDO
O TRABALHO INFANTO-JUVENIL NO FUTEBOL:
LEI X REALIDADE
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Departamento de Direito Econômico e do Trabalho da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, como cumprimento de requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito.
Aprovada em _____ de __________ de 2011.
Conceito atribuído: ____
BANCA EXAMINADORA
______________________________________
Profª. Luciane Cardoso Barzotto
Orientadora
Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS
______________________________________
Prof. Francisco Rossal de Araújo
Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS
______________________________________
Prof. Leandro do Amaral Dorneles de Dorneles
Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS
3
À minha família, por sempre confiar em
mim e por ter dado amor e apoio
incondicionais durante toda minha
caminhada. Em especial ao meu avô, a
quem dedico, além desse trabalho, meu
futuro profissional.
4
AGRADECIMENTOS
Agradeço a minha família: a minha mãe, por ter me ensinado a ter dedicação
e carinho; ao meu pai, por ter me ensinado a ter responsabilidade e persistência, à
minha irmã, por ter me ensinado a ter paciência. E, em especial, aos meus avós, por
terem me ensinado a ter fé e acreditar no meu futuro.
A minha orientadora Profª Luciane Cardoso Barzotto, pela disponibilidade,
dedicação, profissionalismo e por ter me auxiliado na escolha desse tema tão
gratificante.
Agradeço ao João Gabriel Moeller Demeneghi e Luciano Hocsman pelos 2
anos de convívio e aprendizado e a Mariju Maciel, um exemplo de mulher e de
profissional que pretendo ter por perto durante toda minha caminhada. Um
agradecimento especial ao Procurador do Trabalho Ivan Sérgio Camargo dos
Santos, por ter me dado material tão importante para a realização desse trabalho e
pela luta para erradicar os malefícios do trabalho infantil.
Um obrigado especial aos meus amigos, aqueles que me ajudaram a iniciar
essa minha caminhada profissional, aos que estiveram comigo ao longo de todo
caminho, e aos que apareceram ao final dele, mas que me deram o apoio e o
carinho necessário para a realização desse sonho.
E por fim, agradeço a todos que me inspiraram, que me compreenderam, que
me apoiaram, e que me cederam um abraço fraterno, que muitas vezes foi tudo
aquilo de que precisei.
5
“É a herança da capacidade de gastar
gente, de queimar gente como se
queimasse carvão. Essa capacidade de
tratar pessoas como coisas, essas
perversividade intrínseca.”
Darci Ribeiro, 1996.
6
RESUMO
O objetivo do presente trabalho é demonstrar a realidade em que vivem os
menores que possuem o sonho de ser um jogador de futebol. A maioria da
população brasileira idealiza essa profissão, desejando que seus filhos façam parte
dessa vitrine que é o futebol. Entretanto, tal sonho idealizado não traz consigo os
problemas e as dificuldades por quais passam os menores de idade na tentativa de
se tornar um craque. É através desse trabalho que pretendemos demonstrar a
realidade do trabalho infantil no futebol, tentando desmistificar o mito de todas as
crianças que querem se tornar um atleta profissional. Para isso, pretendemos
confrontar os aspectos legais e os aspectos reais, demonstrando de um modo
simples e direto as leis aplicáveis e a realidade vivida pelos menores.
Demonstraremos as leis que regulamentam o trabalho infantil, inclusive as
específicas, como Lei Pelé e o Regulamento sobre Status e a Transferência de
Jogadores da FIFA, entretanto, nossa ênfase se dará na realidade. Através desse
trabalho, poderemos verificar se as leis são devidamente cumpridas e, mais, se elas
são suficientes para preservar os menores de uma exploração até então acobertada
pelo país de futebol.
Palavras-chaves: Trabalho infantil. Futebol. Legislação. Realidade.
7
ABSTRACT
The objective of this work is to demonstrate the reality in which minors who
have the dream of being a football player live. Most of the Brazilian population
idealizes this profession, hoping that their children to be part of this showcase that
football is. However, such idealized dream does not bring the problems and the
dificulties which minors pass through in an attempt to become a star. It is through this
work we intend to demonstrate the reality of child labor in football, trying to
desmystify the myth of all children who want to become a professional athlete. To
this end, we intend to confront the legal and real aspects, demonstrating in a simple
and direct way the applicable rules and the reality experienced by minors. We will
demonstrate the rules that regulate the child labor, including the specific ones, such
as Pele Law and Regulations on the Status and Transfer of Players of FIFA,
however, our emphasis will be given in reality. Through this work, we will be able to
verify if the rules are properly fulfilled and, more than that, if they are sufficient to
protect minors from an exploration hitherto covered up by the country of football.
Keywords: Child labor. Football. Legislation. Reality.
8
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO........................................................................................................ 9
1 A PROTEÇÃO DO TRABALHO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE NO
DIREITO POSITIVO BRASILEIRO E NA REGULAMENTAÇÃO ESPECÍFICA
DO FUTEBOL ......................................................................................................
12
1.1 A Constituição Federal Brasileira de 1988 e EC n.º 20/98............................... 12
1.2 A Consolidação das Leis do Trabalho.............................................................. 19
1.3 O Estatuto da Criança e do Adolescente e a Doutrina da Proteção Integral.... 22
1.4 A OIT e a proteção do menor............................................................................ 27
1.4.1 Convenção n.º 138 e a Recomendação n.º 146 da OIT................................ 29
1.4.2 Convenção n.º 182 e a Recomendação n.º 190 da OIT............................... 31
1.5 Regulamento sobre o Status e a Transferência de Jogadores da FIFA........... 33
1.6 Lei Pelé e alterações........................................................................................ 38
2. A REALIDADE E A CONCREÇÃO DAS NORMAS NO FUTEBOL.................. 43
2.1. A idade mínima e a formalização do contrato.................................................. 43
2.2. Os agentes de futebol ..................................................................................... 47
2.3. O alojamento e a concentração....................................................................... 51
2.4. Educação e Saúde dos atletas........................................................................ 56
2.5. Convivência familiar e comunitária.................................................................. 59
2.6. O Êxodo e a Transferência de menores.......................................................... 63
CONCLUSÕES....................................................................................................... 69
REFERÊNCIAS...................................................................................................... 71
9
INTRODUÇÃO
Tratar do trabalho infanto-juvenil no futebol é uma tarefa muito árdua, mas ao
mesmo tempo prazerosa. Quando citamos “trabalho infantil” a primeira cena que
vem a nossa mente são as crianças trabalhando na roça, em fábricas precárias, em
casas de família, ou seja, trabalhos exercidos por crianças de classe baixa, em
condições precárias e buscando uma maneira para auxiliar sua família
financeiramente.
Na maior parte das vezes, as crianças a que nos referimos anteriormente
trabalham apenas por vontade dos pais. Como diz Cássio Mesquita Barros, no
prefácio da obra de Cláudia Coutinho Stephan: “o trabalhador tantas vezes se
apresenta em busca de trabalho, informando ter oito braços”1. O mais comum é
vermos trabalhadores “vendendo” a força de trabalho de seus filhos, são crianças
sendo exploradas, trabalhando em atividades insalubres, prejudicando seu
desenvolvimento físico e intelectual.
Ao tratar sobre o trabalho infanto-juvenil no futebol nos impõe algumas
questões: será que o “pequeno jogador de futebol” pode ser considerado um
trabalhador infantil nos aspectos mencionados anteriormente? Como é regulado o
trabalho infanto-juvenil no futebol? As leis trabalhistas que incidem para os
trabalhadores menores de idade também são aquelas que regulamentam os “mini-
craques”?
É com o objetivo de dirimir essas dúvidas que resolvemos abordar essas
questões nesse trabalho. A profissão de jogador de futebol é uma profissão
almejada por quase todas as crianças, e, certamente, também faz parte do sonho de
seus pais, não buscam apenas um dinheiro para auxiliar sua família, mas também o
dinheiro para garantir a sua vida por um bom tempo.
Entretanto, essa profissão nem sempre acaba sendo aquela imaginada nos
sonhos infantis. O sonho de “ser rico, famoso, reconhecido pelo Brasil, quiçá do
mundo, e ganhar muito dinheiro” muitas vezes acaba se tornando um pesadelo na
vida desses menores.
1 STEPHAN, Cláudia Coutinho. Trabalhador adolescente: em face das alterações da Emenda
Constitucional n.20/98. São Paulo: LTr, 2002.pg. 09.
10
E é nesse pesadelo que o trabalho infantil no futebol se equipara ao trabalho
infantil na roça, por exemplo. Em alguns clubes, as categorias de base são precárias
e submetem os atletas a uma rotina diária intensa, fortes atividades físicas,
inaceitáveis para atletas menores de idade. A maioria desses atletas fica longe de
suas famílias, impedida do convívio social, permanecendo concentrada a maior
parte do tempo, vivendo do futebol e para o futebol, nada mais.
Será que esse tipo de trabalho não deveria ser melhor regulamentado? O fato
de o futebol ser o esporte nacional, e o sonho profissional de quase todas as
crianças, exime os clubes de futebol de tratarem crianças como crianças? Muitas
vezes acabamos vendo jogadores menores com responsabilidades incompatíveis
com a idade, ao invés de brincar, de se desenvolver, estão em um clube de futebol,
trabalhando, sustentando a família, lidando com lesões e com críticas.
É com o objetivo de desmistificar a profissão do jogador de futebol para os
menores de idade que propomos esse trabalho. Entretanto, para adentrar no mundo
futebolístico são necessários alguns esclarecimentos em relação ao trabalho infantil.
Para isso dividimos nosso trabalho em duas partes:
Na primeira parte relataremos as normas jurídicas pertinentes ao trabalho
infantil, tratando de todas as normas que regulam essa relação. Trataremos da
legislação geral sobre o trabalho do menor, abarcando no plano internacional as
Convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT) ratificadas pelo Brasil,
que atualmente são duas, e suas respectivas recomendações, bem como a
legislação brasileira, expondo a Constituição Federal e as legislações
infraconstitucionais que regulam o assunto objeto desse estudo, quais sejam, a
Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) e o Estatuto da Criança e do Adolescente
(ECA). Adentraremos também na área específica do futebol, embora ainda carente
de uma regulação especial, focaremos na Lei Pelé e o projeto recentemente
aprovado que alterou artigos importantes na referida lei. Ainda em relação ao
futebol, faremos uma breve análise da legislação internacional, mais
especificadamente o Regulamento FIFA sobre status e transferência de jogadores,
principalmente no tocante a transferência de menores.
Já na segunda parte, focaremos na concreção das normas e a realidade dos
menores no futebol. Abordaremos então a prática do trabalho infantil no futebol,
11
suas teorias, a (des) obediência às legislações, fazendo uma análise de como ocorre
o trabalho infanto-juvenil no futebol, verificaremos se as questões garantidas pela
legislação estão sendo respeitadas.
Enfim, nosso objetivo principal no presente trabalho é adentrar no trabalho
infantil no esporte. Abordar essa espécie de trabalho tão sonhado por tantas
crianças é uma tarefa, como dizemos anteriormente, muito árdua, pois leva em
consideração o “mito do jogador de futebol” que se encontra presente na infância
atual. Tentaremos abordar essas questões de forma simples e objetiva, relacionando
os aspectos pertinentes, tentando chegar a uma conclusão a respeito do trabalho
infanto-juvenil no futebol.
Será que no futebol, o trabalho infanto-juvenil é devidamente regulado? Como
se da a relação entre clubes e jogadores? Será que o tratamento a que se
submetem essas crianças acaba realizando o sonho infantil? São essas algumas
das questões que tentaremos responder ao final desse trabalho.
12
1. A PROTEÇÃO DO TRABALHO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE NO
DIREITO POSITIVO BRASILEIRO
1.1. A Constituição Federal Brasileira de 1988 e EC n.º 20/98
O Brasil foi o primeiro país na América Latina a expedir normas de proteção
ao trabalho infantil. Entretanto, esse assunto nem sempre foi de conteúdo
constitucional.
As Constituições de 1824 e 1891 eram omissas em relação ao trabalho do
menor, embora em 1891 tenha sido legislado o Decreto nº 1313. Esta foi a primeira
lei a tratar da proteção ao trabalhador menor, fixando a idade de 12 anos para o
trabalho, limitando a jornada de trabalho e autorizando a contratação de menores a
partir de 8 (oito) anos para aprendizado, entre outras proteções.
A partir desse decreto, começaram a surgir várias legislações com o objetivo
de coibir essa exploração e proteger os menores que estivessem inseridos no
mercado de trabalho.
Em 1927 foi criado o Código de Menores, regulamentando o trabalho da
criança e do adolescente, tendo o mesmo sido revogado em 1979. Entretanto,
muitos autores não consideram tal código como proteção do menor, visto que
considerava as crianças e os adolescentes como objetos de medidas judiciais
quando evidenciada situação irregular. Como assevera Liberati:
O código revogado não passava de um Código Penal do “Menor” disfarçado em sistema tutelar; suas medidas não passavam de verdadeiras sanções, ou seja, penas disfarçadas em medidas de proteção. Não relacionava nenhum direito, a não ser aquele sobre a assistência religiosa; não trazia nenhuma medida de apoio à família; tratava da situação irregular da criança e do jovem, que, na realidade, eram seres privados de seus direitos.2
Dessa forma, a proteção constitucional contra o trabalho infantil só surgiu na
Constituição de 1934. Foi a primeira Constituição a mencionar a proteção do
trabalho do menor, que dentre as principais proteções pode-se citar a vedação do
2 LIBERATI, Wilson Donizeti. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente. 7ª Ed. São
Paulo. Malheiros, pg.15.
13
trabalho dos menores de quatorze anos, bem como trabalho noturno aos menores
de 16 anos3, proibia ainda a diferença de salário por motivo de idade. A partir de
então, a proteção ao trabalho infantil não foi mais retirado do texto constitucional.
Tanto a Constituição de 1937, quanto a que a sucedeu, em 1946, mantiveram
a tutela de proteção proibindo trabalho aos menores de 14 anos. Na Constituição de
1967 não houve praticamente nenhuma alteração, primando pela proteção dos
menores da mesma maneira que os textos constitucionais anteriores. Entretanto,
uma mudança significativa ocorreu em relação à idade mínima para o trabalho, que
passou a ser de 12 anos.
Em 1988 com a promulgação da nova Constituição Federal foram inseridas
inúmeras proteções. Nossa Carta Magna contempla o amparo aos cidadãos,
incluindo-se, então, as crianças e adolescentes em diversos artigos.
A Constituição Federal não surgiu espontaneamente, mas surgiu após um
longo processo de consolidação da democracia. Teve como um de seus mais
importantes frutos a inclusão na lei maior de direitos trabalhistas, bem como diversos
outros direitos até então inexistentes, ou mesmo relegados pela legislação brasileira.
A presente Constituição teve como linha básica adotada, entre outras,
segundo Amauri Mascaro Nascimento:
a inclusão de novos direitos trabalhistas, assim considerados aqueles até agora não previstos na ordem jurídica, como também aqueles que o eram apenas em nível de legislação ordinária, passando, com a Constituição, a nível maior4.
Dessa forma, diversas legislações que antes eram consideradas
infraconstitucionais, passaram a possuir caráter constitucional, tendo em vista sua
importância e relevância para o desenvolvimento da democracia brasileira.
Além da inclusão de diversos outros direitos, o primordial foi a inclusão dos
direitos das crianças e dos adolescentes em nossa Carta Magna. Uma vez que
crianças e adolescentes devem ser colocados num patamar máximo de proteção, no
3 Art.121, §1º,d da Constituição Federal de 1934.
4 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao direito do trabalho. 27ª Ed. São Paulo, LTr, 2001,
pg.53
14
que se refere à tutela dos direitos e garantias fundamentais, em vista da profunda
carga ideológica que deu margem à elaboração da constituição. 5
Um dos artigos mais importantes relacionados ao trabalho infantil, e base
para todo o restante, é o art.227 de nossa Carta Magna, que prevê em seu caput:
Art.227 - É dever da família, da sociedade e do estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, alem de colocá-los a salvo de toda forma de negligencia, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
Portanto, a partir da promulgação da referida Constituição passou a ser dever
da sociedade proteger e preservar as condições de vida das crianças e
adolescentes.
Dar emprego a uma criança não coaduna devidamente com o artigo
supracitado. O trabalho delegado às crianças muitas vezes não asseguram os
direitos protegidos pela carta magna.
Para Marta Toledo, o
direito a convivência familiar é direito essencial de crianças e adolescentes, portanto, um dos direitos da personalidade infanto-juvenil, própria dela porque tem pertinência somente com ela, não com a personalidade dos adultos.6
A citada autora faz uma análise sobre a institucionalização das crianças e a
política de recolhimento de crianças em abrigos, sob a justificativa de que estariam
mais bem assistidas nas casas de recolhimento do que nas suas famílias pobres.
Entretanto, assevera que
a história demonstrou que a personalidade humana não se desenvolve, nas suas potencialidades mínimas e básicas, nas instituições totais, basicamente porque a criança não cresce sadiamente sem a constituição de um vínculo afetivo estreito e verdadeiro com um adulto, o que é impossível de se dar em tais instituições (os trabalhadores de tais internatos, por mais bem-
5 LIBERATI, Wilson Donizeti; Dias, Fábio Muller Dutra. Trabalho Infantil. São Paulo. Malheiros. 2006,
pg.67 6 MACHADO, Martha Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos
humanos. Barueri, SP: Manole, 2003, pg. 161
15
intencionados e corretos que o sejam, mantém uma ligação profissional com as crianças, não afetiva-pessoal).7
Nesta senda, verifica-se que a educação e a convivência familiar são direitos
inerentes às crianças, e fundamental para o seu crescimento.
Ainda em relação ao artigo supracitado, José Afonso da Silva relata:
Essa família, que recebe a proteção estatal, não tem só direitos. Tem o grave dever, juntamente com a sociedade e o Estado, de assegurar, com absoluta prioridade, os direitos fundamentais da criança e do adolescente enumerados no art.227 (...) Colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão é exigência indeclinável do cumprimento daquele dever. 8
Conforme leitura de Godinho:
A Constituição de 1988, porém, foi mais explicita ainda em sua intenção anti-discriminatória, ao estipular que entre a proteção especial normativamente deferida aos menores englobava-se “a garantia de direitos previdenciários e trabalhistas”, além da “garantia de acesso do trabalhador adolescente à escola”. (Art. 227,§3º, II e III da CF/88).9
O §3º do art.227 do diploma constitucional disciplina que o direito à proteção
especial abrangera os seguintes aspectos fundamentais:
a) idade mínima de dezesseis anos para admissão ao trabalho;
b) garantia de direitos previdenciários e trabalhistas;
c) garantia de acesso ao trabalhador adolescente à escola.
Além do referido artigo constitucional, ainda encontramos nesse mesmo
diploma outros mecanismos de valorização e proteção do trabalho do menor.
No art.1º, inciso III, foi dito que nosso Estado é democrático de direito, e tem
como fundamento a dignidade da pessoa humana. Não há duvida de que o trabalho
é fundamental para a dignidade, o trabalho serve como instrumento para a busca de
7 MACHADO, Martha Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos
humanos. Barueri, SP: Manole, 2003, pg. 161 8 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 28ed. rev.e atual. São Paulo.
Malheiro, 2007, pg.850 9 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 8 ed. São Paulo. LTr,2009. Pg. 727
16
realização. Deve-se valorizar o trabalho com a finalidade de propiciar existência
digna e distribuir justiça social por meio da redução das desigualdades sociais.
No que tange ao trabalho infantil, Claudia Coutinho Stephan10 relaciona
algumas das normas específicas constitucionais que estão contidas,
essencialmente, no art. 7º da Carta Magna, nos incisos XXX e XXXIII.
Rege o referido artigo:
São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
(...) XXX – proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil.(g/n)
Esse artigo recepciona o princípio da igualdade previsto no caput do art.5º do
mesmo diploma. Veda-se na constituição qualquer discriminação de salários,
incluindo a discriminação em relação à idade, dessa forma, consoante concluírem
que ao trabalhador menor também é devido o recebimento de salário mínimo. Tal
proibição ocorre pela primeira vez no ordenamento constitucional.
No mesmo artigo encontramos outro inciso que regula o trabalho do menor:
XXXIII – proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre aos menores de dezoito anos e de qualquer trabalho a menores de quatorze anos, salvo na condição de aprendiz. (Redação Original – g/n).
Esse artigo foi alterado pela Emenda Constitucional n.20/98, que aumentou a
idade mínima do trabalho comum para dezesseis anos e do trabalho em regime de
aprendizagem para quatorze anos. Manteve a proibição do trabalho noturno,
perigoso ou insalubre aos menores de dezoito anos.
Conforme explanação de Minharro:
Poder-se-ia imaginar que, ao fazer a mudança atrás apontada, o legislador pátrio quisesse colocar o Brasil entre as nações que respeitam a infância e a adolescência e adequar-se às orientações internacionais que tratam da matéria. 11
10
STEPHAN, Claudia Coutinho. Trabalhador adolescente em face das alterações da Emenda Constitucional n.20/98. Pagina 68-70 11
MINHARRO, Erotilde Ribeiro dos Santos. A criança e o adolescente no direito do trabalho. São Paulo: LTr,2003, pg.56.
17
Entretanto, não foi essa a intenção do legislador, visto que a alteração da
idade mínima para o trabalho foi conseqüência das mudanças no sistema
previdenciário nacional, que extinguiu a aposentadoria por tempo de serviço,
instituindo idades mínimas para a consecução do benefício previdenciário, de
sessenta anos para as mulheres e sessenta e cinco anos para os homens.
Para Claudia Stephan, parece-nos que a intenção do legislador foi retardar o
ingresso dos adolescentes no mercado de trabalho, evitando-se, naturalmente, que
o tempo de contribuição se prolongasse em demasia.12
Para Julpiano Chavez Cortez13, a citada alteração do limite etário para o
exercício do trabalho dá margens ao entendimento que os menores de dezesseis
anos foram prejudicados, desaparecendo o direito social e a garantia constitucional
ao trabalho dos menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir
de 14 anos, ferindo o art.60,§4º. IV da Constituição Vigente. Já Claudia Stephan não
entende pela inconstitucionalidade, pois não se conferiu aos direitos sociais, mesmo
que considerados fundamentais, a rigidez peculiar atribuída aos direitos individuais,
insuscetíveis de abolição14.
Uma questão pertinente, como bem lembra Alice Monteiro Barros15, é em
relação à polêmica que surgiu em relação à eficácia do contrato de trabalho do
menor em face da alteração. Se um menor contratado tivesse entre 14 e 16 anos, e
nesse tempo foi promulgada a referida emenda, deve o contrato permanecer
vigente? Ou então o empregador deveria adequar o contrato a um contrato de
aprendiz? Outra hipótese seria de considerar a nulidade do contrato. Para resolver
esse impasse surgiram algumas correntes.
A primeira corrente, tendo como representante Ricardo Marques da
Fonseca16, afirma que o ato jurídico perfeito e acabado é incólume, tendo o
empregado o direito de permanecer no emprego, justificando que a nova limitação
de idade para o trabalho vale apenas a partir da vigência da nova regra, posto ser a
12
STEPHAN, Claudia Coutinho. Trabalhador adolescente: em face das alterações da Emenda Constitucional n.20/98. São Paulo. LTR, 2002. Pg.72 13
STEPHAN, Claudia Coutinho. Trabalhador adolescente: em face das alterações da Emenda Constitucional n.20/98. São Paulo. LTR, 2002. Pg. 73 14
STEPHAN, Claudia Coutinho. Trabalhador adolescente: em face das alterações da Emenda Constitucional n.20/98. São Paulo. LTR, 2002. Pg. 73 15
Barros, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo. LTR, 2005, pg 518. 16
STEPHAN, Claudia Coutinho. Trabalhador adolescente: em face das alterações da Emenda Constitucional n.20/98. São Paulo. LTR, 2002. Pg. 73
18
Constituição guardiã dos direitos adquiridos e dos atos jurídicos perfeitos. Munir
Cury também é adepto a essa corrente ao afirmar que a modificação não possui
efeito retroativo, permanecendo em vigor os contratos de trabalho firmados sob a
égide da lei anterior “17.
A segunda corrente, que pode ser considerada a corrente majoritária, tem
como adeptas as autoras Alice Monteiro de Barros e Claudia Coutinho Stephan.
Essa corrente sustenta que se trata de norma de ordem pública, fazendo-se
imperiosa sua aplicação imediata, devendo o empregador dispensar todos os
empregados que estejam aquém da idade limite de dezesseis anos, pagando-lhes
as verbas rescisórias previstas em lei, ou então, colocá-los imediatamente em
regime de aprendizagem.
Entendemos que a norma é de ordem pública e deve ser aplicada
imediatamente para impedir que o menor trabalhe. A criança e o adolescente devem
freqüentar a escola, brincar, fortalecer os laços familiares e descansar para crescer,
de forma a tornar-se um adulto saudável.
A contratação de menores de 16 anos, sem ser na condição de aprendiz,
importará na rescisão ante a violação ao limite da ordem legal em vigor. Além de a
nulidade possuir efeitos ex nunc, o empregador responderá por multa administrativa,
entretanto, asseguram-se ao empregado todos os direitos trabalhistas.
Ao delimitar a idade mínima para o trabalho, considera que nessa tenra
idade, entre a infância e a adolescência, faz-se obrigatória a preservação de certos
fatores básicos, que forjam o adulto de amanha, como o convívio familiar e os
valores fundamentais que aí se transfundem o inter-relacionamento com outras
crianças, que molda o desenvolvimento psíquico, físico e social do menor, a
formatação da base educacional sobre a qual incidirão aprimoramentos posteriores,
etc.
Dessa forma, percebe-se que a intenção do legislador foi colocar sob a
proteção constitucional o menor de idade, preservando a sua vida, sua educação,
lazer e demais direitos assegurados a todos os cidadãos.
17
CURY, Munir. Estatuto da Criança e do adolescente anotado. Cury, Garrido e Maçura. 2ª Edição
rev. e atual. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais. 2000. Pg.66
19
1.2 A Consolidação das Leis do Trabalho
A Consolidação das Leis trabalhistas entrou em vigor em 1943, através da
promulgação do Decreto-Lei nº 5.452. Assinada por Getúlio Vargas, sistematizou
toda a legislação trabalhista até então existente no país.
Além de compilar toda a matéria trabalhista existente, a CLT também criou
leis sobre direito individual do trabalho, direito coletivo do trabalho e direito
processual do trabalho.
As normas especiais de tutela e proteção ao menor encontram-se reguladas
no Capítulo IV, titulado de “Da proteção do trabalho do menor”. Em 39 artigos, do
art.402 ao art.441, procurou o legislador dar maior proteção aos menores, ratificando
o constante na Constituição Federal.
Ao longo de sua vigência, já houve algumas alterações em sua redação,
sendo a mais recente a Lei de Aprendizagem, em 2000.
A necessidade de proteção ao trabalho da criança e adolescente é imperiosa,
visto que, conforme lembra Stephan “o trabalho da criança e do adolescente está
ligado à questão escolar, posto que, normalmente, a criança, tão logo esteja inserida
no mercado de trabalho, abandona os estudos.” 18
Inicialmente, a CLT, em seu artigo 402, com a nova redação dada pela Lei
10.097/00, prevê a menoridade entre 14 (quatorze) e 18 (dezoito) anos de idade,
trazendo uma exceção à aplicabilidade dessa legislação quando o trabalho for
efetuado em oficinas em que trabalhem pessoas exclusivamente da família. Cumpre
referir que o artigo anterior previa o trabalho a partir dos 12 anos de idade.
O artigo 403 igualmente reitera a previsão constitucional, dispondo a proibição
do trabalho a menores de 16 (dezesseis) anos de idade, salvo na condição de
aprendiz a partir dos 14 (quatorze) anos (red. L. 10.097/00).
Os artigos seguintes, do 404 ao 410, regulamentam as normas protecionistas
ao trabalho do menor, garantindo a sua freqüência à escola, a não nocividade das
18
STEPHAN, Claudia Coutinho. Trabalhador Adolescente. Em face das alterações da Emenda Constitucional n. 20/98. São Paulo. LTr, 2002. Pg.78.
20
atividades realizadas, à sua saúde e desenvolvimento, além de afastá-lo do trabalho
noturno, insalubre e perigoso.
Para Liberatti e Dias,
A autoridade incumbida de fiscalizar o cumprimento das condições impostas em lei, para a observância dos direitos concernentes aos adolescentes trabalhadores, tem o dever de obrigar que estes abandonem seu serviço, sempre que verificada a possibilidade de lesões físicas ou morais, em virtude do exercício de determinadas atividades. Sempre que as empresas, observadas essas situações, não tomarem providências, para que o adolescente deixe os serviços que lhe são prejudiciais, o contrato de trabalho será rescindido, cabendo igualmente ao próprio responsável legal pleitear a extinção desse contrato.19
Do artigo 411 ao 414 são previstas as normas referentes à duração da
jornada de trabalho do trabalhador juvenil, aplicando-se, pois as regras gerais
quanto à jornada de trabalho aplicada aos adultos, com as devidas restrições
referentes à proteção que lhes é conferida.
Desta forma, veda-se a realização de horas extraordinárias pelo jovem
trabalhador, com exceção da possibilidade prevista em convenção ou acordo
coletivo, compensando-se o excesso pela diminuição em outro período, desde que
dentro da mesma semana. Além disso, será permitida a prorrogação da jornada de
trabalho do adolescente no caso de motivo de força maior, com acréscimo salarial.
Ao se referir aos artigos 415 ao 423 da CLT, Carrion descreve que:
Os arts. 415 ao 423 já haviam sido revogados tacitamente pela nova redação dos arts. 13 a 56 da CLT (DL. 926/69 e L. 55.686/71), salvo o “caput” do art. 418. Anteriormente havia carteiras distintas para o adulto e o menor, o art. 13 referia-se a maiores de 18 anos, o que não mais faz agora.20
Utilizam-se as regras gerais da CLT concernentes a expedição e anotação na
Carteira de Trabalho e Previdência constantes dos artigos 13 a 56 consolidados.
Antigamente, havia uma carteira de trabalho específica para os menores, mas está
foi unificada na presente legislação.
19
LIBERATI, Wilson Donizeti; DIAS, Fábio Muller Dutra. Trabalho Infantil. São Paulo; Editora Malheiros, 2006. 20
CARRION, Valentin. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho legislação complementar jurisprudência. 26. ed. São Paulo: Saraiva, 2001. Pg.259.
21
A Carteira de Trabalho poderia ser feita apenas com a autorização dos pais, o
que atualmente não ocorre, visto que a carteira pode ser expedida e entregue sem a
autorização dos responsáveis. Entretanto, Liberatti e Dias lembram que
É vedada a possibilidade de pactuar contrato, modificar suas cláusulas e assinar distrato ou quitação final, sem que sejam os trabalhadores menores de 18 anos assistidos por seus representantes legais (art.439), ficando permitido que assinem recibo pelo pagamento dos salários, sem a necessidade da presença de seus representantes. 21
Por conseguinte, nos artigos 424 ao 433 são descritos os deveres dos
responsáveis legais dos menores e dos empregadores, além das regras acerca da
aprendizagem. Tais regras encontram-se em total harmonia com as previsões da
Constituição Federal, O Estatuto da Criança e do Adolescente e a Lei de Diretrizes e
Bases da Educação.
De acordo com Moraes, a CLT transcende, portanto, a temática meramente
trabalhista e interfere no Direito de Família, estabelecendo obrigações para os
responsáveis legais do adolescente.22
Contudo, a Lei n. 10.097, de 19.12.2000, revogou o artigo 437 que previa
multa e perda do pátrio-poder aos responsáveis que não contribuíssem para a
completa alfabetização do adolescente. Com isso, para os responsáveis, ou seja,
pais, mães ou tutores que não cumprirem as assertivas do artigo 424, quais sejam o
dever de afastar os adolescentes de atividades que diminuam seu tempo de estudo,
descanso ou que prejudiquem sua formação moral, em tese ficariam propensos a
multa do artigo 434 também da CLT, com valor a ser aplicado tantas vezes quantos
forem os menores empregados em desacordo com a lei. No entanto, mesmo com a
descrita redação da CLT, essa multa é aplicada pelo Ministério do Trabalho e
Emprego acabando por viabilizar a cobrança só em relação aos empregadores e
não aos pais, em relação aos quais deveria ser efetuada em outra esfera -
administrativa.
21
LIBERATI, Winsol Donizetti; Dias, Fábio Muller Dutra. Trabalho Infantil. São Paulo. 2006. Ed. Malheiros. Pg.76 22
MORAES, Antônio Carlos Flores de. Trabalho do adolescente- Proteção e Profissionalização. 2. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2002. Pg.29
22
Nessa esteira, os artigos 425 e 426 da Consolidação estabelecem deveres
aos empregadores concernentes à observância da moral e dos bons costumes, além
de facilitar a mudança de emprego pelo jovem trabalhador, sob pena da já referida
multa do artigo 434 consolidado.
Destarte, o artigo 427 traz o dever do empregador de velar pela freqüência do
trabalhador mirim à escola, havendo estreita ligação dessa previsão ao horário de
trabalho desempenhado que não deve constituir óbice à ida à escola pelo
adolescente.
1.3 O Estatuto da Criança e do Adolescente e a Doutrina da Proteção Integral
A criação do presente estatuto foi conseqüência de nossa Constituição
Federal de 1988.
No art.227, caput, de nossa carta magna, foi concebida a idéia de proteção
integral à criança, passando a ser dever da sociedade proteger e preservar as
condições de vida das crianças e adolescentes. Com esse intuito de proteção, de
colocar os menores a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração,
violência, crueldade e opressão, foi sancionado o Estatuto da Criança e do
Adolescente, através da Lei nº 8.069 de 1990, entrando em vigor no dia 12 de
outubro de 1990, Dia das Crianças.
Dessa forma, a partir de 1990, a criança e o adolescente passaram a ser
tutelados por uma legislação específica: o Estatuto da Criança e do Adolescente
(ECA). Em seu capítulo V, Título II, foram inseridas importantes normas para a
proteção no trabalho do menor, inspiradas nos Princípios da declaração universal
dos direitos da criança.
O Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu art.1º, adota o princípio da
doutrina da proteção integral, que tem como fundamento a promoção do pleno
desenvolvimento físico e mental dos menores, conferindo-lhes direitos civis,
políticos, econômicos, sociais e culturais. A partir de então, a criança e o
adolescente, passaram a ser tratados como cidadãos, rejeitando-se as práticas
discricionárias do direito tutelar tradicional.
23
Conforme lição de Cury,
Rompe com a idéia de que sejam simples objetos de intervenção no mundo adulto, colocando-os como titulares de direitos comuns a toda e qualquer pessoa, bem como de direitos especiais decorrentes da condição peculiar de pessoas em processo de desenvolvimento. 23
Para Antonio Chaves, esse princípio da proteção integral
quer dizer amparo completo, não só da criança e do adolescente, sob o ponto de vista material e espiritual, como também a sua salvaguarda desde o momento da concepção, zelando pela assistência à saúde e bem-estar da gestante e da família, natural ou substituta da qual irá fazer parte.24
O art.2º dessa lei disciplina que adolescente é a pessoa entre 12 e 18 anos
de idade, e a criança, aquela menor de 12 anos de idade. Adotou o legislador o
critério cronológico absoluto, ou seja, a proteção integral da criança e do
adolescente é devida em função de sua faixa etária, pouco importando se, por
qualquer motivo, adquiriu a capacidade civil.25
Em relação aos direitos fundamentais, destaca-se a responsabilidade da
família, do estado e da sociedade na realização desses direitos.
No art.3º é legislado expressamente que a criança e o adolescente gozam de
todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana.
Repete ainda em seus dispositivos o artigo de nossa carta magna propulsor
da referida norma, o art.227. O art.4º do ECA refere que
É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.
23
CURY, Munir. Estatuto da Criança e do adolescente anotado. Cury, Garrido e Maçura. 2ª Edição rev. e atual. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais. 2000. pg.19 24
CHAVES, Antonio. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. 2ª Ed. São Paulo: LTr, 1997. pg.51 25
CURY, Munir. Estatuto da Criança e do adolescente anotado. Cury, Garrido e Maçura. 2ª Edição rev. e atual. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais. 2000. pg.20
24
Conforme Antonio Chaves26, o citado artigo conclama a família, a comunidade
e a sociedade em geral para colaborarem com o poder público nessa tarefa de
proteger integralmente o menor, não sendo, portanto, tarefa exclusiva do poder
público.
Roberto João Elias27 realça ainda a importância da participação da
comunidade na ajuda à solução do grave problema do menor em situação irregular,
numa imprescindível conjugação de esforços com o estado.
Após analisar os artigos iniciais do código de proteção ao menor atualmente
em vigor, resta-nos analisar a parte que se refere à proteção ao trabalho do menor,
que se encontra melhor elucidado nos art. 60 a art.69 do referido diploma.
Os fundamentos da proteção ao trabalho do menor estão diretamente
relacionados com a necessidade do Estado em resguardar a integridade física e
psíquica do ser humano que está em fase de desenvolvimento.
Essa proteção do Estado visa os aspectos de28:
a) Ordem fisiológica – proteção ao desenvolvimento físico;
b) Segurança pessoal – proteção a acidentes de trabalho;
c) Salubridade – proteção ao trabalho em condições agressivas à sua saúde;
d) Moralidade – afastar o menor de ambientes prejudiciais a sua formação moral;
e) Culturais – visa à formação educacional do menor.
Entende-se que submeter crianças e adolescentes ao trabalho faz com que
não aproveite a melhor fase da vida, perdendo direito inviolável de brincar e ter
acesso aos diversos canais de conhecimento existentes na sociedade.
No primeiro artigo referente à proteção do menor no trabalho, encontramos o
preceito tradicional encontrado no art.7º, XXXIII, em nossa Constituição, que
estabelece a proibição do trabalho de menores de 14 anos, salvo na condição de
aprendiz. Portanto, o menor, até essa idade mínima, deve manter-se dedicado à
formação familiar e escolar.
26
CHAVES, Antonio. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. 2ª Ed. São Paulo: LTr, 1997. pg.58 27
CHAVES, Antonio. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. 2ª Ed. São Paulo: LTr, 1997. pg.58 28
NASCIMENTO, Nilson de Oliveira. Manual do Trabalho do Menor. São Paulo: LTr, 2003. pg.67
25
A proteção ao trabalho dos adolescentes é regulada por legislação especial,
sem prejuízo do disposto no Estatuto da Criança e do Adolescente, conforme
disciplinado no art.61. Ou seja, a própria legislação infraconstitucional de proteção
ao menor disciplina que o menor também está protegido por legislação especial, ou
seja, pela CLT, devendo obedecer ao estabelecido nessa lei.
O art.63 estabelece que a formação técnico-profissional deve obedecer aos
princípios da garantia de acesso e freqüência obrigatória ao ensino regular, atividade
compatível com o desenvolvimento do adolescente e horário especial para o
exercício das atividades. Ainda, no art.69 verifica-se o direito à profissionalização e à
proteção ao trabalho, observados o respeito à condição peculiar de pessoa em
desenvolvimento e a capacitação profissional adequada ao mercado de trabalho.
Ou seja, os referidos artigos citados protegem o menor da profissionalização
inadequada, assegurando o estudo e o seu desenvolvimento. Ora, o menor está em
fase de crescimento, não possuindo formação de sua estrutura óssea
completamente formada, qualquer desobediência aos referidos preceitos pode trazer
graves conseqüências a formação física, e até mesmo psicológica do menor. Com
uma estrutura óssea e muscular inacabada, o jovem submetido a trabalhos pesados
poderá chegar à adolescência com a coluna dorsal comprometida.29
Aos menores de 14 anos é permitido o trabalho somente na condição de
aprendiz. É o que está regulado no art.60 do ECA, bem como no art.7 XXXIII de
nossa Carta Magna. A esse adolescente aprendiz é assegurada uma bolsa
aprendizagem, bem como todos os direitos trabalhistas e previdenciários, o que
também está regulado no art. 227,§3º, III.
Juridicamente, bolsa é a remuneração percebida pelo menor durante o tempo
em que complementa ou pratica na empresa o que aprende teoricamente na escola.
Quanto ao valor percebido, não há um critério especifico, mas deve ser um
quantum que não signifique muito pouco para a renda familiar ou para os gastos
pessoais do adolescente, nem induza ao abandono da escola e da bolsa.
Em relação aos direitos trabalhistas e previdenciários, o dispositivo apenas
deixa clara a proteção aos adolescentes maiores de 14 anos, entretanto, não se
29
CHAVES, Antonio. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. 2ª Ed. São Paulo: LTr, 1997. pg.281
26
pode deixar à margem de proteção justamente o adolescente aprendiz menor de 14
anos, o mais carente de proteção. Como bem assevera Chaves30., não vislumbra
como o adolescente aprendiz, trabalhador empregado, menor de 14 anos, possa
ficar à margem dos direitos trabalhistas e previdenciários, ao arrepio da norma
constitucional expressa. Portanto, a referida norma aplica-se a qualquer tipo de
trabalhador, seja ele menor aprendiz ou não.
A constituição federal, em seu art.7, inciso XXXIII, tratou de proteger o menor
de 18 anos de trabalho noturno, perigoso ou insalubre. O Estatuto da Criança e do
adolescente procurou frisar as proibições protetivas de natureza laboral do menor,
estabelecendo em seu art.67 que a qualquer adolescente empregado é vedado
trabalho noturno, realizado entre as vinte e duas horas de um dia e às cinco horas
do dia seguinte (conforme disposto na CLT), trabalho perigoso, insalubre ou penoso;
realizado em locais prejudiciais à sua formação e ao seu desenvolvimento físico,
psíquico, moral e social; e o trabalho realizado em horários e locais que não
permitam a freqüência à escola. Portanto, tratou o estatuto de proteção ao menor de
legislar mais profundamente as vedações ao trabalho do menor, com o intuito da
proteção integral do menor, princípio chave do referente diploma legal.
O Estatuto da Criança e do Adolescente não teve o intuito apenas de
assegurar os direitos protegidos em nossa Constituição, mas acabou legitimando o
direito do trabalho do menor e a sua referida proteção, com a finalidade de não
deixar o menor à margem de um trabalho incoerente com suas responsabilidades e
seu desenvolvimento.
Na opinião de Antonio Carlos Gomes da Costa31, a concepção sustentadora
do Estatuto que adota como princípio a doutrina da proteção integral afirma o valor
intrínseco da criança como ser humano; a necessidade de especial respeito à sua
condição de pessoa em desenvolvimento; o valor prospectivo da infância e da
juventude, como portadoras da continuidade do seu povo, da sua família e da
espécie humano e o reconhecimento de sua vulnerabilidade, o que torna as crianças
e os adolescentes merecedores de proteção integral por parte da família, da
30
CHAVES, Antonio. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. 2ª Ed. São Paulo: LTr, 1997. pg.288 31
NASCIMENTO, Nilson de Oliveira. Manual do trabalho do menor. São Paulo: LTr, 2003. pg.68.
27
sociedade e do Estado, o qual deverá atuar por meio de políticas específicas para o
atendimento, a promoção e a defesa de seus direitos.
1.4 A OIT e a proteção do menor
A Organização Internacional do Trabalho, conhecida por OIT, foi criada pelo
Tratado de Versalhes, no ano de 1919, tratado este que encerrou oficialmente a
Primeira Guerra Mundial.
A organização sempre teve como objetivo promover a Justiça Social, por esse
motivo e devido a sua grande importância no cenário internacional, passou a fazer
parte da Organização das Nações Unidas (ONU), através de acordo assinado entre
as duas partes em 30 de maio de 1946.
Desde a sua criação pelo Tratado de Versalhes em 1919, passando pela
Declaração da Filadélfia em 1944, e sua conversão em organismo especializado da
Organização das Nações Unidas (ONU), a OIT exerce um papel importante na
universalização das normas do trabalho, zelando pela observância de um patamar
mínimo e decente na relação entre capital e trabalho. Importante consignar que o
Brasil, por ter ratificado esse pacto de Versalhes pode ser considerado um dos
fundadores da OIT.
A OIT é responsável pela elaboração de convenções e recomendações que
regulam o trabalho em nível internacional. A Convenção é um ato multilateral criado
pela Conferência da OIT, que abre à ratificação dos estados membros, podendo ou
não haver a exclusão de determinada parte. Entretanto, a ratificação não pode ser
efetuada com reservas. Após a ratificação do tratado no país membro, este admite a
sua eficácia no seu ordenamento jurídico, tornando-se obrigatória sua observância.
Já as recomendações não são obrigatórias, pois não tem força de lei. Sua utilidade
reside em propor normas que podem ser adotadas pelo direito nacional, por
qualquer das fontes formais do direito do trabalho.
Com a criação da OIT passou-se a verificar uma generalizada preocupação
com o problema do labor infanto-juvenil. Várias convenções e recomendações foram
editadas com o intuito de amenizar os efeitos maléficos do emprego desse tipo de
28
mão-de-obra. Oris de Oliveira32 identificou sessenta e uma convenções e
recomendações da OIT ligadas ao trabalho infanto-juvenil e agrupou-as por assunto.
No Brasil, as leis de proteção ao trabalhador foram surgindo de forma
esporádica no final do séc. XIX e início do séc. XX. Entretanto a legislação referente
ao trabalho do menor era muito fragmentada, deixando à margem da proteção legal
diversos direitos importantes.
Somente a partir de 1930 é que ocorreu a expansão do direito do trabalho no
Brasil, impulsionando a criação de um amplo sistema legislativo na proteção dos
trabalhadores, e, em particular, do trabalho menor. Sendo assim, a partir desse
momento é que se passou a utilizar de forma mais efetiva as convenções
internacionais, a fim de adequar a sua política interna de proteção ao trabalho menor
às políticas internacionais.
Apesar do grande número de convenções realizadas pela OIT em relação ao
trabalho do menor, trataremos apenas de duas nesse presente trabalho: a
Convenção nº 138, que trata da idade mínima para admissão do menor de idade em
qualquer emprego, não dividido por setor, como era anteriormente, e a Convenção
182 que regula as piores formas de trabalho infantil. São essas duas convenções e
suas respectivas recomendações as ratificadas mais recentemente pelo
ordenamento jurídico brasileiro e o motivo da escolha também se dá pelo fato de
englobarem, como preconiza Erotilde Ribeiro dos Santos, as aspirações esboçadas
nas convenções e recomendações anteriores.33
Objetivando maior proteção do menor, a OIT implementou o Programa
Internacional para a Eliminação do Trabalho Infantil (IPEC), em 1992. Esse
programa visa potencializar os movimentos de defesa dos direitos da criança e do
adolescente. Seu objetivo não é tão somente implementar políticas integradas de
retirada e proteção da criança e do adolescente do trabalho precoce, mas também
fazer um trabalho preventivo junto à sociedade, à família, à escola, evitando assim
futuros problemas relacionados ao trabalho infantil.
Em 2010, aproveitando o ano de Copa do Mundo, a OIT lançou um programa
de combate ao trabalho infantil, intitulado de “Cartão Vermelho para o Trabalho
32
OLIVEIRA, Oris de. O trabalho da criança e do adolescente. São Paulo: LTr Edit., 1994, PP 43-61. 33
MINHARRO, Erotilde Ribeiro dos Santos. A criança e o adolescente no direito do trabalho. São Paulo. LTr. Edit. 2003. PP. 33.
29
Infantil”. Tendo como garoto propaganda o jogador Robinho, a campanha, lançada
em 10 de junho de 2010, procurou chamar atenção para a necessidade urgente de
se eliminar o trabalho infantil. Além da OIT e do IPEC, também apoiaram essa
campanha a FIFA e a UNICEF.
A OIT, juntamente com o Programa de Eliminação do trabalho infantil,
continua cooperando com a sociedade brasileira, afim de, progressivamente, retirar
as 5 milhões de crianças e adolescentes que se encontram trabalhando (das 8,4
milhões existentes, entre 5 e 17 anos no início da década de 90, de acordo com
dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios - PNAD 2001, do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE34).
1.4.1 Convenção n.º 138 e a Recomendação n.º 146 da OIT
As primeiras convenções da OIT a respeito da idade mínima para o ingresso
no mercado de trabalho tinham aplicação restrita a determinados setores de
produção. A Convenção nº 138 teve por objetivo unificar a política internacional
sobre o trabalho infantil, e para isso, englobou as convenções anteriores, ampliando
o campo de aplicação do limite de idade, abrangendo os setores primário,
secundário e terciário da atividade econômica. Portanto, a convenção unifica a idade
mínima, estabelecendo a idade de quinze anos para admissão em qualquer tipo de
emprego, como regra geral, admitindo excepcionalmente aos quatorze anos.
De acordo com a convenção, todos os países signatários devem
comprometer-se a adotar uma política nacional dirigida à erradicação do trabalho
infantil, elevando, paulatinamente, a idade mínima de ingresso no mercado de
trabalho em um nível compatível com o pleno desenvolvimento físico e mental do
adolescente.
Não delimita expressamente a idade mínima, mas permite ao estado
signatante delimitar, por meio de uma declaração, qual será a idade mínima em seu
território, entretanto, essa idade mínima não poderia ser inferior a quinze anos,
34
ORGANIZAÇÃO Internacional do Trabalho. Erradicação do Trabalho Infantil. Disponível em <http://www.oitbrasil.org.br/prgatv/in_focus/ipec/errad_trabin.php.> Acesso em 11 de novembro de 2010.
30
podendo, nos países com a economia prejudicada e com sistemas educacionais
precários, a idade mínima ser fixada em quatorze anos, desde que apresentados
relatórios informativos comprovando os motivos que justifiquem a redução do limite
etário.35
Aduz também essa Convenção que não será inferior a dezoito anos a idade
de admissão em trabalhos prejudiciais à saúde, à segurança e a moral do indivíduo.
O art.8º da convenção internacional em estudo estabelece que poderão ser
concedidas licenças, em casos individuais, para a participação de crianças e
adolescentes com idades inferiores a mencionadas nela em representações
artísticas.
Essa convenção representa um instrumento bastante flexível quando permite
o emprego ou trabalho de crianças em serviços leves, a partir de treze anos de
idade; quando permite idades mínimas mais baixas, sendo quatorze anos, em geral,
e doze anos para trabalho leve, em países subdesenvolvidos ou em
desenvolvimento. Ou ainda quando dispõe que podem ser excluídas da convenção
limitadas categorias de emprego ou trabalho, a respeito das quais surjam problemas
especiais com sua aplicação.
No que se refere a sua recomendação n 146, procurou ela tornar concretos
os objetivos estabelecidos na Convenção n.138 ao frisar que para os países-
membros poderem fixar a idade mínima para o ingresso no trabalho nos patamares
pretendidos pela OIT, deveriam dispensar especial atenção, na esfera política, à
questão do pleno emprego; deveriam, também, promover medidas econômico-
sociais para diminuir os efeitos da pobreza (e assim evitar que as famílias
necessitem de trabalho infantil para promover sua subsistência); desenvolver
programas de seguridade social e de bem estar da família com a finalidade de
garantir o sustento da criança; propiciar o acesso da criança ao ensino obrigatório e
à formação profissional e garantir sua efetiva freqüência à escola pelo menos até a
idade mínima especificada para admissão no emprego; permitir o acesso à saúde e
garantir seu bom desenvolvimento físico e mental. Requereu-se especial atenção às
crianças e aos adolescentes sem família ou que vivam com outras famílias e
também às migrantes. Segundo essa recomendação, os países-membros deveriam
35
Art.2º da Convenção n.138 da OIT.
31
ter como meta a elevação gradual da idade mínima para ingresso em qualquer
emprego ou trabalho para dezesseis anos e a erradicação de qualquer trabalho
perigoso para menores de 18 anos. Ademais, deveriam garantir a proteção e a
fiscalização das condições de labor quanto aos trabalhadores menores de 18 anos,
observando sempre a justa remuneração, as condições satisfatórias de segurança e
saúde, a rigorosa limitação de horas de trabalho, a proibição de horas
suplementares, procurando deixar tempo livre para o lazer, para o descanso e para
a educação. Recomendou-se por fim, o fortalecimento da fiscalização do trabalho e
serviços correlatos.
1.4.2. Convenção n.º 182 e a Recomendação n.º 190 da OIT
A Convenção n 182 passou a vigorar no Brasil em 2001, e delibera sobre a
proibição das piores formas de trabalho infantil. Considera-se nessa convenção a
urgência de se tomar medidas no sentido de proibir e eliminar as piores formas do
trabalho infantil, considerando, como criança todo indivíduo menor de dezoito anos
de idade. Adotam-se ainda medidas impeditivas da ocupação das crianças e dos
adolescentes no mercado de trabalho informal, retirando e reabilitando aqueles que
já estão se ocupando dessa forma de trabalho, promovendo, ainda, seu acesso ao
ensino básico gratuito dando-lhes formação profissional.
O texto da convenção destaca a necessidade de os países membros
adotarem medidas para eliminação dessas formas de trabalho, levando em
consideração a importância da educação básica implementada pelos governos, não
só com o intuito de proibir as piores formas de trabalho infantil, como também para
prestar assistência direta e necessária para retirar as crianças desse trabalho,
assegurando-lhes plena habilitação e inserção social.
São os Estados, juntamente com as organizações dos trabalhadores e
empregadores, que devem definir os tipos que designarão de piores formas de
trabalho, revisando-as periodicamente, localizando, ainda, onde ocorre a prática a
ser abolida. Entretanto, no art.3 da Convenção, são estabelecidas algumas das
piores formas de trabalho infantil a serem erradicadas: a) todas as formas de
escravidão ou práticas análogas a escravidão, tais como a venda e o tráfico de
32
crianças, a servidão por dividas e a condição de servo, o trabalho forçado ou
obrigatório; b) a utilização, recrutamento ou a oferta de crianças para a prostituição,
produção, pornografia ou atuações pornográficas; c) a utilização, recrutamento ou
oferta de crianças para a realização de atividades ilícitas, em particular, o tráfico de
entorpecentes e armas de fogo; d) o trabalho que, por sua própria natureza ou pelas
condições em que é realizado, é suscetível de prejudicar a saúde, a segurança ou a
moral das crianças.
Claudia Coutinho Stephan, em sua obra, assevera que a ratificação da
presente Convenção pelo nosso país significa, acima de tudo, um ato político que
objetiva mostrar aos países desenvolvidos que o Brasil também se preocupa com o
problema do trabalho infanto-juvenil e objetiva sua erradicação, entretanto, não há
maiores repercussões no âmbito interno.36Ainda carece de melhor observação o
trabalho infantil no tocante a sua forma de realização. Além da Convenção
mencionada, observa-se em nosso ordenamento jurídico vários dispositivos de
proteção ao trabalho do menor (o que será melhor estudado em capitulo
apropriado), entretanto, não é rara a existência de trabalhos cruéis e desumanos em
nosso território.
Apenas como exemplificação da preocupação da OIT com a exploração do
trabalho infantil, citamos a criação em 1992 do Programa Internacional para
Eliminação do Trabalho infantil.
Acompanhando essa Convenção, a OIT adotou em 1999 uma recomendação
que indicava os programas de ação para a erradicação das piores formas de
trabalho infantil e solicitou às nações que identifiquem, denunciem e impeçam que
crianças se dediquem às piores atividades, recomendando que os países tenham
especial atenção às crianças pequenas, às meninas e ao problema do trabalho
oculto. Como trabalho perigoso, a recomendação aponta – de forma exemplificativa
– aqueles nos quais a criança fica exposta a abusos físicos, psicológicos e sexuais,
atividades realizadas com máquinas e equipamentos e ferramentas perigosas,
trabalhos realizados sob a água ou sob a terra, bem como os executados a grandes
alturas ou em espaços fechados; manipulação ou transporte de cargas pesadas;
trabalhos em condições insalubres, em horários prolongados ou durante o período
36
Stephan, Cláudia Coutinho. Trabalhador adolescente: em face das alterações da Emenda Constitucional n 20/98. São Paulo. LTr, 2002. Pg.42.
33
noturno. Ressalte-se que, mediante autorização, o maior de 16 e menor de 18 anos
que tenha recebido formação profissional adequada pode trabalhar em local
insalubre, desde que fiquem garantidas sua saúde, segurança e moralidade.
Para pôr em prática os programas de erradicação das piores formas de labor
infantil sugere-se a compilação de dados estatísticos atualizados sobre a natureza e
o alcance do trabalho da criança e do adolescente, a criação de um forte sistema de
fiscalização e punição para os envolvidos. Propõe-se, ainda, a melhoria educacional
e a capacitação de professores, a promoção de empregos e a formação profissional
para os pais e adultos da família, bem como a sensibilização dos pais e
responsáveis.
Como se vê, atualmente, busca-se detectar as causas do trabalho infantil,
procurando eliminar os motivos que levam à utilização desse tipo de mão de obra
para, assim, obter-se sucesso a longo prazo na abolição definitiva dessa exploração.
Percebe-se que nesse primeiro momento, mais do que erradicar totalmente o
trabalho infantil, a OIT busca a efetiva limitação da idade de ingresso no mercado de
trabalho e erradicação das piores formas de labor. Atingindo esses objetivos, já se
teria dado um grande passo na melhoria das condições de vida de milhões de
crianças.
1.5. Regulamento sobre o Status e a Transferência de Jogadores da FIFA
No que tange ao futebol, em nível internacional, importante ressaltar o
cuidado da FIFA (órgão máximo internacional no cenário futebolístico) em proteger o
menor de idade.
Sabemos que o futebol é a profissão desejada por muitos jovens atletas, e o
assédio de clubes estrangeiros, mais especificadamente, europeus, acabam
tornando o sonho dessa profissão em pesadelo. Muitos clubes europeus acabariam
levando os menores para cidades estrangeiras, com língua, cultura diferentes, longe
dos pais, da família e dos amigos, sem dar ao menor mínimas condições de
adaptação. Dessa forma, as crianças tornar-se-iam marginalizadas no cenário
europeu. Não acostumados com a língua, com a cultura, longe dos pais e não
34
adaptadas ao futebol europeu, muitas das crianças acabariam sendo relegadas
pelos clubes, deixando-as abandonadas, sem condições de retornar ao país natal,
nem de se restabelecer no futebol estrangeiro.
Para evitar esses transtornos, a FIFA resolveu dar maior atenção a
transferência de menores de idade no Regulamento sobre Transferência de Atletas.
Esse regulamento teve seus dispositivos alterados pela Circular nº 1190 da FIFA,
que teve sua vigência iniciada em 1º de outubro de 2009. Além de alterações que
não influenciam no presente trabalho, a maioria das modificações do conteúdo está
relacionada com a proteção de menores e com o investimento de clubes na
formação e educação de jovens jogadores.
Uma das principais foi a criação de uma subcomissão designada pela
Comissão dos Estatutos dos Jogadores, encarregada de apreciar e aprovar qualquer
transferência internacional de um jogador menor de idade e de qualquer primeiro
registro de um jogador menor que não seja nacional do país onde pretende registrar-
se pela primeira vez. A referida aprovação deverá ser submetida antes de qualquer
pedido de Certificado Internacional por parte de uma Federação e/ou antes de
proceder ao primeiro registro.
Essa Circular foi aprovada após um estudo sobre a contratação ilegal de
menores. A FIFA estudou casos como de atletas franceses que foram adquiridos de
forma ilícita por clubes ingleses.37 Devido a esse incidente, o clube inglês foi punido
pela entidade máxima do futebol38
Analisando a nova redação do Regulamente de transferência de atletas,
encontramos no ponto 1 do artigo 9 o estabelecimento da idade mínima para
transferências internacionais: 18 anos. Ou seja, é proibida a transferência
internacional de menores de idade. Entretanto, sabemos que essa regra não é total,
pois não é raro lermos no noticiário esportivo a transferência de pequenos craques
37
GLOBOESPORTE.COM. Depois de Chelsea e Manchester United, City é investigado pela FIFA. Londres. Disponível em <http://globoesporte.globo.com/Esportes/Noticias/Futebol/0,,MUL1295845-9842,00.html> Acesso em 10 de abril de 2011. 38
GLOBOESPORTE.COM. Fifa proíbe Chelsea de contratar novos jogadores nas duas próximas janelas. Londres. Disponível em <http://globoesporte.globo.com/Esportes/Noticias/Futebol/ingles/0,,MUL1291144-9847,00-FIFA+PROIBE+CHELSEA+DE+CONTRATAR+NOVOS+JOGADORES+NAS+DUAS+PROXIMAS+JANELAS.html> Acesso em 10 de abril de 2011.
35
para o futebol europeu. Regularmente temos notícias pela mídia de assédio de
clubes europeus a jogadores das categorias de base dos clubes. Esse assédio
encontra amparo nas exceções previstas no regulamento da FIFA.
São três as exceções admitidas pelo regulamento:
a) se os pais do jogador menor se mudarem para outro país por razões de trabalho não relacionadas com o futebol; b) se a transferência se efetua dentro do território da União Européia e o jogador tem entre 16 e 18 anos de idade. Nesse caso, o novo clube deve cumprir as seguintes obrigações:
I. Proporcionar ao jogador uma formação escolar ou capacitação futebolística adequada, que corresponda aos melhores padrões nacionais;
II. Além de fornecer uma capacitação futebolística, deve garantir uma formação acadêmica ou escolar, ou uma formação ou educação e capacitação conforme sua vocação, que lhe permita iniciar uma carreira que não seja no futebol no caso de interrupção de sua carreira de jogador; II. Tomar todas as providências necessárias para assegurar uma boa assistência ao jogador menor (condições de vida em uma família ou em um alojamento do clube, sob cuidados de um responsável no clube); III. Para a inscrição do jogador, deverá aportar o clube a prova do cumprimento das obrigações mencionadas. c) se o atleta viver a não mais que cinqüenta quilômetros da fronteira de outro país e o clube a que o atleta pretenda se transferir também estiver a cinqüenta quilômetros da fronteira. Em casos como este, as duas associações (a do clube em que o jogador reside e a do novo clube do menor) deverão apresentar consentimento, por escrito, dos fatos e da possibilidade da transferência, sob pena de serem punidas pela própria FIFA em caso de ocultarem informações.
As exigências apontadas são igualmente aplicáveis a qualquer
jogador que não tenha sido previamente registrado e não seja natural no país
que o inscrever pela primeira vez.
Toda transferência internacional está sujeita a aprovação da Subcomissão
designada pela Comissão do Estatuto do Jogador. A solicitação de aprovação
deverá ser apresentada pelo clube que deseja inscrever o jogador. Toda associação
que solicitar a expedição do Certificado Internacional de Transferência ou realizar a
primeira inscrição do jogador deverá solicitar primeiramente essa aprovação.
A comissão disciplinar da FIFA poderá impor sanções conforme o Código
Disciplinar da FIFA no caso de violação desses dispositivos. Da mesma forma, as
36
sanções não são destinadas apenas ao clube que inscreveu ou que solicitou a
transferência, mas também ao clube que concordou com a transferência do menor
sem a prévia aprovação da comissão.
A preocupação da FIFA em estipular essa proibição, e suas exceções, é fazer
com que pequenos jovens não cheguem a países estranhos a sua cultura
despreparados intelectualmente e socialmente pela tenra idade. Por esta norma, a
FIFA pretende fortalecer a categoria de base dos clubes, investir em crianças, não
tornar ela uma fábrica de jogadores.
Alerta ainda aos benefícios de manter os jovens em seus países de origem
até atingirem a maioridade. Em entrevista ao site GLOBOESPORTE, Fabiano
Ventura, agente FIFA, salienta:
O problema da maioria destes jovens é que eles muita vezes vão para fazer testes, o que não oferece garantia a eles, tornando o sonho de jogar num clube europeu um grande pesadelo, diferentemente do jovem que sai de seu país contratado, com contrato de trabalho e amparado por um agente FIFA 39.
Por esta nova regulamentação, pretende a FIFA que o trabalho dos menores
no futebol seja valorizado dentro de seu país, para, somente após a maioridade,
alcançar o exterior.
A partir de 1º de outubro de 2010, a FIFA passou a utilizar o sistema
denominado “Transfer Matching System‟ (TMS). Esse sistema tornou-se obrigatório
no caso de transferências internacionais. Trata-se de um sistema on-line que torna
as transferências mais rápidas, ágeis e transparentes. Foi implantado inicialmente
como uma fase de teste em apenas alguns clubes, entretanto, atualmente deve ser
utilizado por todos os países afiliados à FIFA e por um total de 3.633 clubes.40
Inicialmente criado como uma forma de agilizar as transferências
internacionais, também se tornou um forte aliado no combate a transferência de
menores de idade, uma vez que o TMS é um sistema online, devendo ser atualizado
39
FELIPE, Marcos. Preocupada com „trabalho infantil‟, FIFA homologa lei para proteger jovens. Rio de Janeiro. 09 de setembro de 2009. Disponível em <http://globoesporte.globo.com/Esportes/Noticias/Futebol/0,,MUL1296294-9842,00-PREOCUPADA+COM+TRABALHO+INFANTIL+FIFA+HOMOLOGA+LEI+PARA+PROTEGER+JOVENS.html.> Acesso em 10 de abril de 2011. 40
FIFA.COM. Revolução no futebol: o TMS obrigatório. 29 de setembro de 2010. Disponível em <http://pt.fifa.com/aboutfifa/federation/administration/releases/newsid=1309845.html.> Acesso em 10 de abril de 2011.
37
todos os dados do jogador a ser transferido. Conforme já mencionado anteriormente,
para a transferência do atleta menor, deverá haver a aprovação de um subcomitê do
Comitê de Jogadores da FIFA, dessa forma, o TMS gerencia tanto essa solicitação
inicial do clube quanto o processo da tomada de decisão, evitando assim, fraudes
envolvendo transferência de menores de idade.
Para corroborar essa proteção de menores, a FIFA institui a necessidade de
os clubes que possuem escolinhas ou academias informarem a entidade a presença
de jogadores menores de idade.
Ou seja, a FIFA passou a não apenas regulamentar o futebol profissional e a
transferência de atletas, mas também objetivou a proteção dos menores que estão
em fase de formação nas escolinhas.
Através dessa norma, os clubes que exerçam poderes sobre uma escolinha,
com a qual mantenham uma relação de direito, de fato ou financeira, são obrigados
a comunicar à federação, em cujo território a escolinha desenvolva a sua atividade,
a identificação dos jogadores menores que a freqüentem.
Não são apenas os clubes que possuem obrigações, mas também as
escolinhas de futebol que não tenham nenhuma relação com as associações.
Nesses casos, a Federação deverá garantir que essas escolinhas possam participar
de campeonatos nacionais, sendo comunicado à Federação os jogadores
registrados e os menores em formação que freqüentam a escolinha.
Deve ser mantido na Federação um registro contendo os nomes e as datas
de nascimento dos jogadores menores registrados pelos clubes e pelas escolinhas.
Percebe-se que a FIFA possui as melhores intenções a fim de obter a
proteção dos menores de idade, delimitando exigência e requisitos para que se
permita a transferência para outro país. Entretanto, a realidade muitas vezes não
condiz com o regulamento. Para o momento, suficiente saber a regulamentação da
transferência do menor, iremos desmembrar a prática da transferência em capítulo
apropriado.
38
1.6. Lei Pelé
A Lei Pelé, Lei nº 9615/98, foi editada em 24 de março de 1998 e publicada
em 25 de março de 1998 através do decreto 2.574/98. Possui o nome do grande
ícone do futebol brasileiro e que na época ocupava cargo de secretário de
desenvolvimento esporte e cultura, sendo um dos precursores para o advento dessa
lei, que promoveu grandes e fundamentais alterações no desporto brasileiro.
Recentemente, em 16 de março de 2011,foi aprovada a Lei n. 12.395/2011,
que alterou a ‟Lei Pele‟ e revogou a Lei n. 6354/76, que tratava do contrato de
trabalho de do atleta profissional de futebol.
Um dos pontos chaves que ensejou a mudança é o problema do jovem
jogador de futebol, entretanto, esse é um assunto que ainda vem gerando muitas
discussões.
O art.29 do referido diploma assim assevera:
A entidade de prática desportiva formadora do atleta terá o direito de assinar com esse, a partir de dezesseis anos de idade, o primeiro contrato de trabalho profissional, cujo prazo não poderá ser superior a cinco anos.
Em seu caput, deixa clara a intenção de não profissionalizar menores de 16
anos, ou seja, o contrato de trabalho profissional só poderá ser realizado a partir dos
dezesseis anos de idade. O art.44 da mesma lei ratifica essa intenção:
Art. 44. É vedada a prática do profissionalismo, em qualquer modalidade, quando se tratar de:
(...)
III - menores até a idade de dezesseis anos completos.
Para os atletas não profissionais, ou seja, para aqueles que não possuem um
contrato de trabalho devidamente assinado, há regulamentação no §4 do art.29.
§ 4o O atleta não profissional em formação, maior de quatorze e menor de vinte anos de idade, poderá receber auxílio financeiro da entidade de prática desportiva formadora, sob a forma de bolsa de aprendizagem livremente pactuada mediante contrato formal, sem que seja gerado vínculo empregatício entre as partes.
39
Conforme referido, a lei possibilita que dos 14 aos 20 anos o atleta possa
receber auxílio financeiro da entidade de prática desportiva formadora, sob a forma
de bolsa aprendizagem livremente pactuada mediante contrato formal, sem que seja
gerado vínculo empregatício entre as partes. É o chamado “contrato de
aprendizagem esportiva”.
O aspecto principal que diferencia a aprendizagem esportiva da
aprendizagem profissional instituída pela Lei nº 10.097/00, que incentiva as
empresas a contratarem jovens que tenham entre 14 e 24 anos, é justamente a não
geração do vínculo empregatício.
Nos termos do art. 428 da CLT (com a redação dada pela Lei nº 11.180/05), o
contrato de aprendizagem é um contrato de trabalho especial, ajustado por escrito e
por prazo determinado, em que o empregador se compromete a assegurar ao maior
de 14 (quatorze) e menor de 24 (vinte e quatro) anos inscrito em programa de
aprendizagem, formação técnico-profissional metódica compatível com o seu
desenvolvimento físico, moral e psicológico, e o aprendiz se compromete a executar
com zelo e diligência as tarefas necessárias a essa formação.
Assim, embora especial, o contrato de aprendizagem profissional é um
contrato de trabalho, gerando algumas conseqüências no âmbito do Direito Laboral,
como recolhimento de FGTS, ainda que com alíquota mais favorável (2%).
Dessa forma, entendemos que a inclusão no diploma o trecho “sem que seja
gerado vínculo empregatício entre as partes” pode ser considerado inconstitucional.
Colacionamos o entendimento de Lutiana Nacur Lorentz e Rubia Carneiro Neves a
respeito dessa inconstitucionalidade:
Para os menores de quatorze até dezesseis anos, a inconstitucionalidade apontada implica que eles têm direito, desde que trabalhem com onerosidade, não eventualidade e subordinação (art. 2º e 3º, CLT) ao contrato especial de emprego de aprendizagem e a todos os consectários legais que vão muito além da concessão de mera “bolsa de aprendizagem” prevista no artigo e da concessão de assistência médica, odontológica e psicológica, bem como contratação de seguro de vida e ajuda de custo para transporte. Na verdade, pelo Princípio da Proteção do Empregado, somado a todos os princípios constitucionais e regras já citadas, estes adolescentes deveriam ter aplicação dos seguintes direitos básicos assegurados pela Lei n. 10.097/00, combinada com Decreto n. 5.598/05, Portaria n. 702/01 e Instrução Normativa SIT n. 26, de 20 de dezembro de 2001, do Ministério do Trabalho e Emprego, todos estes dispositivos
40
combinados com os direitos específicos ditados pela Lei n. 9.615/98, ou seja: assinatura de CTPS, contrato especial de aprendizagem (com todas as conseqüências), remuneração ampla, incluindo o direito de arena, direito a imagem, luvas, “bicho” e até 26 de março de 2001, o direito ao “passe” (e extinto após 26 de março de 1998, nos casos de resolução contratual, falta de pagamento de salários por mais de três meses), FGTS (com 2% de recolhimento ao mês, Lei n. 8.036/90), férias, 13º salário, RSR, etc.41
A partir dos 14 anos, embora o menor não possa firmar um contrato
profissional, ele já cumpre todos os deveres inerentes a um profissional do esporte.
Cumpre ressaltar que não há a obrigatoriedade de ser firmado um contrato de
trabalho aos 16 anos, conforme o parágrafo citado, o atleta não profissional em
formação pode estender seu vinculo até os 21 anos.
Ao retirar o vínculo empregatício, estaríamos retirando todas as garantias de
um trabalhador, o que é inviável somente pelo fato de se tratar de um atleta em
formação. Lembramo-nos que mesmo o contrato de aprendizagem é considerado
um contrato de trabalho, gerando conseqüências trabalhistas. Dessa forma, é ilegal
a diferença de tratamento entre as duas formas de aprendizagem (a prevista na CLT
e a desportiva).
No mesmo sentido, há uma Orientação do Ministério Público do Trabalho:
ORIENTAÇÃO N.08. EMENTA: Atletas. Aprendizagem. Relação de Trabalho. Legitimidade do MPT. Ainda que a Lei Pelé mencione que a aprendizagem profissional no futebol do atleta se dará sem vínculo empregatício, está preservada a legitimidade do MPT, pois a natureza jurídica entre atleta e entidade formadora é de trabalho. (Orientação elaborada e aprovada à unanimidade com base em estudo da Coordinfância).42
O valor da bolsa aprendizagem será utilizado para efeitos de ressarcimento
dos custos de formação. Entretanto, para ser considerada formadora do atleta e
fazer jus a tal ressarcimento, o clube deverá cumprir certos requisitos previstos no
§6º, do artigo 29 da Lei Pelé, como:
41
LORENTZ, Lutiana Nacur; NEVES, Rubia Carneiro. A intervenção do Ministério Público do Trabalho na Justiça Desportiva e do Trabalho para Proteção dos Atletas Desportivos Adolescentes. Revista do Ministério Público do Trabalho, Ano XX, n. 40, setembro 2010;pg.141 42
MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. Orientações. Disponibilidade restrita a membros do MPT em <HTTP://www.pgt.mpt.gov.br/atuacao/trabalho-infantil/orientacoes.html em 23/03/2011>. Acesso em 23 de março de 2011.
41
I – forneça aos atletas programas de treinamento nas categorias de base e complementação educacional; e
II – satisfaça cumulativamente os seguintes requisitos:
a) estar o atleta em formação inscrito por ela na respectiva entidade regional de administração do desporto há, pelo menos, 1 (um) ano;
b) comprovar que, efetivamente, o atleta em formação está inscrito em competições oficiais;
c) garantir assistência educacional, psicológica, médica e odontológica, assim como alimentação, transporte e convivência familiar;
d) manter alojamento e instalações desportivas adequados, sobretudo em matéria de alimentação, higiene, segurança e salubridade;
e) manter corpo de profissionais especializados em formação técnico-desportiva;
f) ajustar o tempo destinado à efetiva atividade de formação do atleta, não superior a 4 (quatro) horas por dia, aos horários do currículo escolar ou de curso profissionalizante, além de propiciar-lhe a matrícula escolar, com exigência de freqüência e satisfatório aproveitamento;
g) ser a formação do atleta gratuita e a expensas da entidade de prática desportiva;
h) comprovar que participa anualmente de competições organizadas por entidade de administração do desporto em, pelo menos, 2 (duas) categorias da respectiva modalidade desportiva; e
i) garantir que o período de seleção não coincida com os horários escolares.
Assim, se observa que para ter direito ao ressarcimento dos custos de
formação não basta aos clubes simplesmente formarem o atleta; devem fornecer
uma série de benefícios e condições apropriadas para poderem cobrar por seu
investimento nas categorias de base.
Observa-se que a intenção do legislador foi criar mecanismos de proteger o
menor, para que sejam assegurados todos os direitos a ele inerentes.
Conforme Paulo Sérgio Marques dos Reis43, a visão da grande maioria da
população brasileira é a de que os clubes de futebol visam, exclusivamente, lucros
com a chamada divisão de base.
43
REI, Paulo Sérgio Marques dos. Dos clubes formadores: mecanismos de solidariedade. Revista do II Encontro Nacional sobre Legislação Esportivo-Trabalhista, Coordenação: Ministro Guilherme Augusto Caputo Bastos. Brasília: TST, 2010. Pg.254.
42
Entretanto, para obter esse lucro, não basta possuir uma categoria de base,
alojando crianças de qualquer maneira, é necessário o preenchimento dos critérios
acima elencados. Não preenchendo, o clube jamais irá alcançar o lucro desejado.
Outro artigo inserido pela Lei 12.395 de 2011 de importância para o atleta em
formação foi o art.27-C que assim estipula:
Art. 27-C. São nulos de pleno direito os contratos firmados elo atleta ou por seu representante legal com agente desportivo, pessoa física ou jurídica, bem como as cláusulas contratuais ou de instrumentos procuratórios que:
(...)
VI - versem sobre o gerenciamento de carreira de atleta em formação com idade inferior a 18 (dezoito) anos.
O gerenciamento de carreiras normalmente é feita pelos chamados “agentes
de futebol” ou “empresários”. Até a edição dessa lei, não havia nenhuma restrição.
Entretanto, esse assunto causa polêmica no meio futebolístico.
Para alguns, essa é uma maneira de impedir que os menores sejam aliciados
por empresários que só visam ao lucro. Outros acreditam que essa medida não irá
alterar a realidade brasileira, pois há a possibilidade de menores assinarem
contratos representados por seus pais junto com advogados, que poderão
substabelecer o poder a esses agentes.
Os agentes sentiram-se prejudicados com a edição desse artigo, visto que a
FIFA não impõe nenhuma restrição ao agenciamento de jogadores.
Apesar de ainda não restar muito clara as conseqüências desse dispositivo, a
certeza que se tem é que o legislador pretende proteger o menor, propiciando a ele
uma formação adequada, sem a interferência de terceiros no seu rendimento e na
sua profissionalização.
43
2. A REALIDADE E A CONCREÇÃO DAS NORMAS NO FUTEBOL
2.1. A idade mínima e a formalização do contrato.
Ao longo do capítulo anterior, abordamos o permitido pela legislação
constitucional e infraconstitucional no tocante à idade mínima para o trabalho infantil.
Se tais legislações fossem devidamente cumpridas, não haveria razão para
despendermos um item sobre esse assunto na presente parte. Entretanto,
infelizmente, abordaremos aqui a realidade do futebol, que muitas vezes vai de
encontro com a legislação em vigor.
Nas legislações mencionadas, a permissão para o trabalho é possível a partir
dos 14 anos. Por essa razão, relembramos a regulamentação da Lei Pelé :
Art. 29. A entidade de prática desportiva formadora do atleta terá o direito de assinar com ele, a partir de 16 (dezesseis) anos de idade, o primeiro contrato especial de trabalho desportivo, cujo prazo não poderá ser superior a 5 (cinco) anos
§ 4o O atleta não profissional em formação, maior de quatorze e menor de vinte anos de idade, poderá receber auxílio financeiro da entidade de prática desportiva formadora, sob a forma de bolsa de aprendizagem livremente pactuada mediante contrato formal, sem que seja gerado vínculo empregatício entre as partes.
Dessa forma, depreende-se que a idade mínima para o atleta é 14 anos,
quando não profissional, e 16 anos, quando profissional.
Entretanto, a FIFA estabelece, no anexo 4 do Regulamento sobre o Status e a
Transferência de Jogadores, que a formação e a educação de um jogador ocorre a
partir dos 12 anos até os 23. Ou seja, a FIFA permite que atletas menores de 14
anos sejam atletas em formação, o que acaba contrariando a legislação nacional.
Há quem entenda que
A lei (Pelé) deveria ser reformulada, tendo como início da formação, a idade de 12 anos. A realidade brasileira demonstra que os clubes formadores investem nos menores, em regra, a partir desta idade, de forma que a indenização a partir dos 14 anos retira o direito do clube pequeno, onde o atleta realmente foi descoberto, além de
44
deixar sem indenização, em média, dois anos de investimento do clube formador. 44
Essa formulação desejada foi objeto de projeto de lei, dizia a proposta de
alteração da Lei Pelé, em seu artigo 29-C que “o atleta em formação é aquele com
idade entre 12 e 21 anos”. Não havendo previsão de nenhum pagamento, mas
apenas de ensinamentos necessários à formação do atleta. Dessa forma, passaria o
atleta a receber remuneração na forma de auxílio financeiro, apenas a partir dos 14
anos. Com o intuito de proteger os menores, essa disposição não foi incluída na
ordem jurídica.
Ousamos discordar do entendimento supra de diminuição da idade mínima,
concordando com a não inclusão do artigo supramencionado. Entendemos que a
ordem jurídica não permite aos menores de 14 anos de idade a prática de qualquer
tipo de trabalho, tampouco a prática de esporte marcado pela seletividade e
hipercompetitividade.
O esporte por menores dessa idade deve ser encarado apenas como uma
ferramenta pedagógica, destinada ao desenvolvimento físico e social da criança e do
adolescente em formação, sem nenhum caráter trabalhista. Permitir na legislação
que crianças a partir de 12 anos sejam consideradas “em formação” seria estimular
os clubes a utilizar crianças em idades cada vez mais tenras, ocasionando diversos
problemas na formação desses menores.
Sabe-se que muitos clubes não respeitam a legislação, visto que “há
contratos de atletas com menos de 12 anos, inclusive, mas firmados de forma
escamoteada” 45
Conforme entendimento de Paulo Sérgio Marques:
Não podemos olvidar que, na verdade, a vida do atleta se inicia antes mesmos dos 12 anos de idade na categoria conhecida como fraldinha, o que gera um contra-senso na legislação em vigor, além
44
MACIEL, Mariju Ramos. O direito de formação e o êxodo de menores. Atualidades sobre direito esportivo no Brasil e no mundo. In: Revista do II Encontro Nacional sobre Legislação Esportivo-Trabalhista, Coordenação: Ministro Guilherme Augusto Caputo Bastos. Brasilia.TST, 2010. pg.225. 45
MIGUEL, Ricardo Georges Affonso. A possibilidade de contratação do atleta menor de futebol e a utilização do instituto da antecipação de tutela para transferência do atleta de futebol.Revista do Tribunal Regional do Trabalho 1ª Região. V.21. n.47. Jan/Jun 2010. Pg.109.
45
do que, a referida legislação é omissão em relação a quem compete a fiscalização. 46
Dessa forma, é evidente que os clubes utilizam cada vez mais o trabalho
infantil de atletas, até mesmo menores de 12 anos, sob o argumento de que estão
apenas na escolinha, mas sabemos que na verdade está sendo formado mais um
atleta para ressarcir o clube de todo o investimento.
Corrobora esse entendimento a declaração de um diretor de futebol
entrevistado pela equipe da Sportv:
O objetivo é garimpar talento, formar e vender jogadores. cerca de 140 garotos vivem nas instalações, encaram como vitrine. muitos vêm de longe deixando a família e mergulhando em mercado selvagem. Com 12, 13, já tem vida profissional, tem que assimilar esse caminho, deixam de fazer muitas coisas. sexta, sábado e domingo eles estão concentrados, tem que sacrificar para vencer.
Esse entendimento do diretor demonstra sensivelmente qual o objetivo dos
clubes “formar e vender jogadores”. Não estão preocupados com crianças que vêem
a infância passar longe das brincadeiras, longe da família, mas sim com atletas que
podem proporcionar lucros.
Há autores que entendem a possibilidade de contratação de atletas menores
de 12 anos através de contrato de natureza civil, respeitados os limites do ECA, com
autorizações pertinentes e representação para o suprimento da capacidade do
menor pelos pais ou responsáveis. O entendimento é que isso permitiria o
pagamento da remuneração, sem a caracterização de vínculo empregatício e sem
afronta à norma constitucional.
A finalidade da constituição, ao proibir o trabalho do menor, é impedir a exploração. Se este trabalho representa uma oportunidade formalizada através de um contrato chancelado pela autoridade judiciária competente, fica afastada a violação ao preceito constitucional. 47
46
REIS, Paulo Sérgio Marques dos. Dos clubes formadores: mecanismos de solidariedade. In: Revista do II Encontro Nacional sobre Legislação Esportivo-Trabalhista, Coordenação: Ministro Guilherme Augusto Caputo Bastos. Brasilia.TST, 2010. Pg. 255 47
MIGUEL, Ricardo Georges Affonso. A possibilidade de contratação do atleta menor de futebol e a utilização do instituto da antecipação de tutela para transferência do atleta de futebol.Revista do Tribunal Regional do Trabalho 1ª Região. V.21. n.47. Jan/Jun 2010. pg.111
46
Entretanto, entendemos que para a utilização dessa proposta, seria
necessária uma maior proteção ao menor, assegurando a ele a educação, a
convivência familiar, o lazer, e todos os diversos direitos protegidos pela nossa carta
magna, bem como direito previdenciário e trabalhista.
Os atletas mirins mostram suas aptidões muito antes de o direito permitir a sua efetiva proteção, o que pode dar margem a exploração dessas crianças, eis que aos clubes interessa serem os precursores na descoberta de um talento.48
Concordamos com a orientação do MPT:
ORIENTAÇÃO N. 14. Aprendizagem. Idade mínima: 14 anos. A idade mínima admissível para a aprendizagem profissional de atletas é 14 anos, de acordo com a interpretação sistemática do art.29, §§3º e 4º da Lei Pelé com os art.227, caput, e 7º, inciso XXXIII, da Constituição Federal. Antes dessa idade o atleta pode praticar esportes apenas sob a modalidade de desporto educacional, prevista no art.3º, inciso I, da LP, sem quaisquer restrições à liberdade de prática desportiva. 49
A partir de 14 anos, portanto, é obrigatória a formalização de contrato com os
atletas não profissionais em formação, com o respectivo pagamento da bolsa de
aprendizagem, conforme orientação da Lei Pelé citada.
Entretanto, essa exigência não vem sendo cumprida por vários clubes, que se
utilizam do sonho do menor, para alojá-lo em locais sem o convívio familiar,
preparando para render e sem oferecer o mínimo necessário.
Considerando que a Lei Pelé não fixa um prazo máximo para o período de
aprendizagem, entende-se que tal lacuna deve ser suprida por dispositivos contidos
na legislação trabalhista (CLT), que limitam o período de aprendizagem ao máximo
de 02 anos.
O MPT ainda orienta no sentido de haver um prazo mínimo do contrato de
aprendizado:
48
MIGUEL, Ricardo Georges Affonso. A possibilidade de contratação do atleta menor de futebol e a utilização do instituto da antecipação de tutela para transferência do atleta de futebol.Revista do Tribunal Regional do Trabalho 1ª Região. V.21. n.47. Jan/Jun 2010. pg.111 49
MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. Orientações. Disponibilidade restrita a membros do MPT em <HTTP://www.pgt.mpt.gov.br/atuacao/trabalho-infantil/orientacoes.html em 23/03/2011>. Acesso em 23 de março de 2011.
47
ORIENTAÇÃO N.10. EMENTA: Atleta. Aprendizagem. Duração mínima do contrato. Na falta de norma específica no bojo da Lei Pelé, deve ser garantida duração mínima ao contrato de formação profissional, pois se trata de uma modalidade de contrato a prazo (analogia a Aprendizagem da CLT). Além disso, a fixação de prazo mínimo é necessária para frear o fenômeno de “descartabilidade” dos atletas, que prejudica seus direitos fundamentais. Seis meses é o tempo mínimo de duração a ser admitido para não prejudicar o desenvolvimento da atividade (nesse período já se pode avaliar o potencial do atleta) e garantir minimamente os direitos dos adolescentes, especialmente o direito à educação.50
Após o período de aprendizagem da pratica desportiva nos clubes deveria ser
exigida a formalização do contrato de trabalho do atleta profissional, indo ao
encontro da norma prevista no art.29, caput, que prevê o contrato formal para atletas
maiores de 16 anos. Da mesma forma, deve o clube propiciar ao adolescente
assistência médica, odontológica e psicológica, contratar seguro e fornecer ajuda de
custo para transporte dos atletas.
Infelizmente os clubes não cumprem adequadamente a legislação em vigor, e
tampouco a fiscalização atua corretamente no cuidado com os menores. Há muitos
casos de exploração de menores, de crianças com idades inferiores já passando por
processos competitivos e de alta seletividade, o que pode ocasionar danos a esses
menores.
2.2. Os agentes de futebol
A relação entre o agente de futebol (ou empresário) e atleta menor de idade
nem sempre é considerada uma maneira benéfica de auxílio ao menor. Por este
motivo, a reforma da Lei Pelé passou a considerar nulos os contratos firmados por
atleta ou seu representante legal com agente desportivo, pessoa física ou jurídica,
bem como cláusulas contratuais ou de instrumentos procuratórios que versem sobre
50
MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. Orientações. Disponibilidade restrita a membros do MPT em <HTTP://www.pgt.mpt.gov.br/atuacao/trabalho-infantil/orientacoes.html em 23/03/2011>. Acesso em 23 de março de 2011.
48
o gerenciamento de carreira de atleta em formação com idade inferior a 18 (dezoito)
anos.51
Em reportagem especial feita pelo canal de televisão SPORTV, os
empresários de futebol foram considerados um dos causadores do chamado “tráfico
de menores”. A reportagem faz uma analogia entre o tráfico dos menores no futebol
e o tráfico de escravos que ocorria em épocas passadas. Muitos acabavam
morrendo no caminho, não dando certo no futebol, mas aqueles que chegavam
vivos, com disposição, acabavam compensando o investimento.
Empresários especializam em garimpar garotos em pequenos times e levar
para longe da família, até mesmo para o exterior, burlando as leis que restringem
esse tipo de atividade, muitas vezes até mesmo apoiado pelos pais, que vêem como
uma possibilidade de seu filho ter um futuro. Entretanto, o futuro do menor não está
assegurado, visto que pode não encontrar um time e acabar sendo abandonado em
outro estado, outro país, com culturas diferentes e longe da família.
Há clubes que tentam proteger os menores desses empresários, conforme
reportagem da Folha de São Paulo,
Em algumas agremiações, o empresário virou persona no grata. Em outras, rusgas entre cartolas e agentes foram parar na Justiça. “Está cheio de gente que não vale nada nesse meio. Por isso, tentamos proibir o ingresso desses olheiros nos treinos da molecada. Mas não adianta muito. Eles estão em todos os lugares”, diz Luis Lucas, coordenador das categorias de base da Portuguesa.52
Entretanto, as técnicas dos empresários para aproximação dos menores, e
sua conseqüente exploração, começa com um invocado par de tênis, talvez um
celular. Passa por uma mesada, aliada a presentes esporádicos. Alcança até uma
oportunidade de trabalho para toda a família, com casa confortável e escola na
Europa. 53
As crianças são vistas como mercadoria, como investimento. Martin Gutierrez,
empresário uruguaio, revela para a reportagem da Folha de São Paulo: “O
51
Lei 9.615/98. Art.27-C, VI. 52
ROSEGUINI, Guilherme. Corrida por teens cresce e abre nova guerra da bola. Folha de São Paulo, página D1. 18 de setembro de 2005. 53
ROSEGUINI, Guilherme. Tênis e celular servem para fisgar garotos. Folha de São Paulo, página D6. 18 de setembro de 2005.
49
investimento é muito pequeno perto do que você pode lucrar.” 54 Hoje em dia, para
esses empresários, é mais lucrativo investir em crianças do que na bolsa de valores.
Um exemplo que retrata bem o tratamento despendido aos menores é a
expressão que um dirigente do time Juventus da Itália utiliza ao falar de um jogador.
Na reportagem da Sportv, Giovanni chama um atacante que se destacou no
campeonato de “um belo animal de Gâmbia, pronto para exportação”.
Esse caso ocorreu em um campeonato Sub-17 no Peru. Era um garoto de 16
anos, natural de Gâmbia, país pobre. Após o jogo, diversos empresários procuraram
o menor oferecendo diversas oportunidades. Eram clubes da maior expressão do
cenário europeu, Chelsea, Juventus. A conseqüência desse assédio foi que, no
momento decisivo do jogo, o atleta perdeu um pênalti e ninguém nunca mais o
procurou. Após isso, o menino deve ter retornado a Gâmbia na pobreza total.
Essa procura incessante por menores de idade com potencial promissor é
vista como um negócio e acaba sendo deixada de lado a infância e os direitos
inerentes às crianças, podendo causar diversos prejuízos.
Esse é o ponto de vista de Luis Scipiao, doutor e livre docente em psicofisiologia. “Um salário mínimo, um agrado, uma roupa nova, tudo parece muito nessa idade. A criança acha que tem um futuro certo. Mas, na verdade, não é nada disso. Ela pode se machucar muito nessa história.55
As crianças são submetidas a um tratamento degradante, em vista de um
lucro para o empresário. Há diversas crianças que são garimpadas por estes
profissionais e levadas a diversos estados, deixando de conviver com sua família,
não tendo nenhuma orientação educacional, assistência médica. Ficando a mercê
de que um clube possa oferecer um alojamento. Caso consiga fazer parte de um
clube, o empresário reaparece para auferir os lucros, caso contrário, abandona o
menor.
Conforme orientação do Ministério Público do Trabalho:
54
ROSEGUINI, Guilherme. Tênis e celular servem para fisgar garotos. Folha de São Paulo, página D6. 18 de setembro de 2005. 55
ROSEGUINI, Guilherme. Especialistas apontam danos irreversíveis. Folha de São Paulo, página D6. 18 de setembro de 2005.
50
ORIENTAÇÃO N.16: EMENTA: ATLETAS. APRENDIZAGEM. REPRESENTAÇÃO. Limites. I- São nulas quaisquer modalidades de contratos de agenciamento esportivo para atletas com idade inferior a 14 anos. II – A partir de 14 anos, é obrigatória a representação ou assistência dos responsáveis legais em todos os atos jurídicos praticados pelos atletas, vedada a transferência contratual de direitos inerentes ao poder familiar a agentes ou terceiros.56
Como se vê, a orientação do MPT coaduna com a recente alteração
promovida na Lei Pelé, que restringe o agenciamento de menores de 18 anos.
Salienta-se que não são todos os empresários que prejudicam a infância e o
desenvolvimento profissional dos atletas, muitos fornecem boas condições de vida,
toda a assistência possível, entretanto, mesmo assim acabam privando os menores
de alguns direitos assegurados pela legislação.
De outro lado, é visível que o trabalho dos menores no futebol é visto como
um produto para os empresários. Os atletas tornam-se escravos da bola com o
intuito de propiciar lucro para os agentes.
Entretanto, alguns empresários garantem estar sendo prejudicados com a
alteração da Lei Pelé.
Na maioria dos casos, a captação dos atletas pelos empresários acontece dos 14 aos 17 anos. “A Argentina não tem essa limitação. A Europa não também não. Isso é uma perda nossa”, afirmou Ribeiro. “Sabe o que vai acontecer? Vai entrar o jeitinho brasileiro. Ele (o jogador) vai assinar com um advogado que trabalha no meu escritório. Não vai ser registrado na CBF (Confederação Brasileira de Futebol), mas terá validade jurídica”, completou.
Ribeiro e outros agentes alegam ainda que a proibição de assinar um contrato de representação com um menor de idade vale apenas para os empresários brasileiros. “É conflitante porque nós não podemos, mas um agente ou empresa estrangeira pode. A FIFA reconhece a procuração em qualquer lugar do mundo”, afirmou Leo Rabelo, que preside a Abaf (Associação Brasileira dos Agentes de jogadores de futebol do Brasil).
Rabelo diz que a entidade estuda medidas para tentar derrubar a nova lei. “É inconstitucional, já que empresários estrangeiros teriam uma vantagem muito grande, podendo assinar contratos com menores de 18 anos”, afirmou.57
56
MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. Orientações. Disponibilidade restrita a membros do MPT em <HTTP://www.pgt.mpt.gov.br/atuacao/trabalho-infantil/orientacoes.html em 23/03/2011>. Acesso em 23 de março de 2011. 57
PASSOS, Paulo. Antes "vilões", agentes de boleiros agora se dizem vítimas. Ig São Paulo. Disponivel em
51
Acreditamos que a inconstitucionalidade reside em aproveitar-se de um sonho
do menor sem limites. A proteção ao menor de 18 anos está em garantir uma
profissionalização sadia e preservar o mesmo de cuidados indevidos por parte
desses profissionais.
Recentemente a polícia prendeu um homem que se passava por
empresário para abusar de meninos que sonhavam ser jogadores de futebol.
Crianças de 12 a15 anos eram as vítimas, sendo retiradas do convívio de seus pais,
levadas para a capital de São Paulo, e lá, abusadas pelo falso empresário. 58
Concordamos com o pensamento de Carlos Alberto Fonte de Lima59 de
que a inexistência de uma fiscalização severa é fato. Deveria existir uma pena que
incidisse exclusiva e diretamente sobre estes empresários disfarçados que trazem
estes sérios problemas.
Apesar das alterações e do cuidado despendido ao menor, ainda é
visível que precisa de uma melhor regulamentação no tocante a profissão dos
agentes. Dessa forma, os bons empresários não são prejudicados pelos prejuízos
causados aos menores. Somente com uma melhor regulamentação, os menores
estarão completamente assegurados para um futuro realmente promissor.
2.3. O alojamento e a concentração
É dever do clube formador manter alojamento e instalações desportivas
adequados, sobretudo em matéria de alimentação, higiene, segurança e
salubridade60 Entretanto, as irregularidades no tocante a esse quesito são mais do
que freqüentes.
<http://esporte.ig.com.br/futebol/antes+viloes+agentes+de+jogadores+de+futebol+se+dizem+vitimas/n1300083088268.html.> Acesso em 15 de maio de 2011. 58
TVIG. Preso falso empresário de futebol que aliciava menores. Disponível em <http://tvig.ig.com.br/noticias/brasil/preso+falso+empresario+de+futebol+que+aliciava+menores-8a4980262f6b9f55012f6dc779200098.html> Acesso em 07 de maio de 2011. 59
Lima, Carlos Alberto Fonte de. Retrospectiva 2007. Futebol infantil: Trabalho ou lazer? Disponível em: http://www.sindinoticias.com/noticias,2194,retrospectiva_2007_futebol_infantil_trabalho_ou.html Acessado em 7 de maio de 2011. 60
. Lei Pelé. Art.29§2, d.
52
O alojamento pode ser considerado o local onde os atletas moram, quando
suas famílias são do interior ou de cidades distantes. A lei Pelé, tampouco outro
legislação infraconstitucional, não regulamenta essa questão, deixando a mercê dos
clubes a forma de vivência desses atletas.
Existem alojamentos perfeitamente adequados, com toda infraestrutura. Um
exemplo recente é o alojamento do Grêmio, inaugurado em 2008. Possui aparelhos
de televisão e computadores conectados à internet. Para convívio geral, os garotos
possuem um salão de jogos, lavanderia, refeitório e uma praça onde o jogador
poderá receber a família e amigos. Além de toda esta estrutura física, os atletas
possuem apoio de assistente social, psicologia, nutricionistas, entre outros
profissionais. Monitores e seguranças foram contratados e estarão à disposição às
24h do dia. 61
Entretanto, trata-se de exceção nesse meio. Obviamente os clubes de maior
expressão procuram dar maior assistência aos menores, proporcionando um
alojamento adequado, com um grande número de profissionais especializados
dando assistência, e mais, quartos com boa ventilação, em boas condições. Ocorre
que a preocupação maior não está nos clubes ditos grandes, que possuem mídia no
cenário brasileiro e mundial, e por isso, fornecem um bom convívio aos seus
menores.
A preocupação maior reside nos clubes pequenos, nos clubes do interior, ou
então nas chamadas “granjas de engorda”. Esses são locais onde recebem os
menores com o intuito de preparar um grande jogador de futebol, entretanto,
esquecem de preparar um cidadão. Acabam retirando a infância e dando-lhe
responsabilidades e atividades incompatíveis com a idade.
Fábio Ribeiro da Silva, 17 anos, em entrevista a Sportv, comentou que tem
certos alojamentos que não parecem um alojamento de verdade, muitas vezes
fazem os meninos até mesmo dormir no chão.
Os alojamentos são inadequados, há falta de higiene, de cuidados, não tem
uma ventilação adequada, não há limpeza, muitas vezes são os próprios jogadores
61
CLICRBS. Clube inaugura alojamento para as categorias de base. Porto Alegre. 04 de agosto de 2008. Disponível em <http://globoesporte.globo.com/Esportes/Noticias/Times/Gremio/0,,MUL711418-9868,00.html>. Acesso em 15 de maio de 2011
53
que são obrigados a fazer os serviços para que consiga conviver em um ambiente
no mínimo suportável, as roupas muitas vezes não são lavadas por empregados,
nem por máquinas, deixar essa tarefa para as crianças é permitir que andem com
roupas sujas. Muitas vezes colocam 7 (sete), 8 (oito), até mesmo 10 (dez) meninos
em um mesmo ambiente, sem janelas, sem camas necessárias, submetendo as
crianças a um tratamento totalmente desumano.
Todos chegam diferentes nos alojamentos, verdadeiros potenciais jogadores de futebol (e quantos não existem no Brasil!), porém o convívio em alojamentos e o sistema que exige a passividade, a não reflexão e a submissão aos costumes alienantes, castradores e galináceos, simplesmente os alojamentos/granjas transformam filhotes de águias em pobres galinhas ciscantes.62
Esse é o retrato geral dos alojamentos no Brasil. São ambientes propícios
para a formação de jogadores de futebol, mas deixam de levar em conta que se trata
de crianças retiradas do convívio familiar, obrigadas a convivência com jovens
estranhos, de diferentes classes, diferentes culturas.
São condições que se impõem aos jovens jogadores de futebol que, movidos
pelo sonho, sujeitam-se a tudo, como morar em um alojamento distante da família e
de seu mundo.
Alcides Scaglia descreve o sentimento de quem viveu 5 anos em um
alojamento: “tenho certo de que este espaço se configura, na maioria das vezes, em
local de confinamento e engorda, para posterior abate”.63
São crianças submetidas à pressão de ser jogador de futebol, convivendo
com tantos outros menores com o mesmo sonho, o mesmo ideal, procurando chegar
ao mesmo objetivo. São crianças submetendo-se aos piores tratamentos possíveis.
O menino deixou de jogar, apenas treinava (muitas vezes mais sem bola, preparando o físico – mais gordo, ou melhor, mais forte, mais lucro para a granja e seus granjeiros) e repetia o que lhe
62
Scaglia, Alcides. Alojamento para jovens futebolistas, ou como transformar águias em galinhas. Disponivel em http://www.universidadedofutebol.com.br/Jornal/Colunas/3,11219,ALOJAMENTO+PARA+JOVENS+FUTEBOLISTAS++OU+COMO+TRANSFORMAR+AGUIAS+EM+GALINHAS.aspx. Acesso em 15 de maio de 2011. 63
Scaglia, Alcides. Alojamento para jovens futebolistas, ou como transformar águias em galinhas. Disponivel em http://www.universidadedofutebol.com.br/Jornal/Colunas/3,11219,ALOJAMENTO+PARA+JOVENS+FUTEBOLISTAS++OU+COMO+TRANSFORMAR+AGUIAS+EM+GALINHAS.aspx. Acesso em 15 de maio de 2011.
54
mandavam fazer. Deixou de criar, deixou de brincar, pois tinha que ver pornografia, precisava aprender sobre mulheres, noitada, balada, pois convivia em um mesmo ambiente com jovens e “adultos” de outras categorias (infantis, juvenis e juniores, para não falar de alguns profissionais), sem um responsável competente e preparado para assumir as responsabilidades de formação que toda criança precisa.64
São alojamentos repletos de garotos, afastados das famílias, em um
ambiente de total liberdade, de vestiário conjunto, trocam de roupa, tomam banho
com outros meninos, de diversas idades, proporcionando uma total liberdade, muitas
vezes acabam sendo presas fáceis para a pedofilia. E o que era um sonho, acaba se
transformando em um pesadelo.
Os jovens muitas vezes são submetidos a maus tratos. No Rio de Janeiro foi
investigado um suposto “alojamento”, que na verdade era uma clínica usufruída por
um falso empresário. Ele arrecadava jovens de diversas idades e diversos lugares
do país que sonham em se tornar jogador de futebol e colocava em um ambiente
totalmente degradante, aguardando apenas contato de algum clube para que
fossem transferidos.
Os meninos viviam em condições precárias. Bebiam água direto da bica, bem ao lado da lixeira, e faziam apenas uma refeição por dia, em um restaurante popular.65
Muitas vezes os jovens são retirados do convívio familiar e “jogados” nesses
alojamentos, sem a autorização dos pais devidamente formalizada e sem o mínimo
de cuidado.
Como decorrência natural da informalidade, nenhuma responsabilidade em
relação ao adolescente é assumida, seja no que diz respeito a seus direitos
trabalhistas e previdenciários, seja quanto ao exercício de seus direitos
fundamentais básicos, não havendo preocupação em assegurar sua matrícula,
64 Scaglia, Alcides. Alojamento para jovens futebolistas, ou como transformar águias em galinhas. Disponivel em http://www.universidadedofutebol.com.br/Jornal/Colunas/3,11219,ALOJAMENTO+PARA+JOVENS+FUTEBOLISTAS++OU+COMO+TRANSFORMAR+AGUIAS+EM+GALINHAS.aspx. Acesso em 15 de maio de 2011. 65AGENCIA GLOBO. Denúncias revelam maus-tratos em quem sonha se tornar jogador de futebol. Disponível em http://www.fnpeti.org.br/destaque/denuncias-revelam-maus-tratos-em-quem-sonha-se-tornar-jogador-de-futebol/. Acesso em 10 de maio de 2011.
55
freqüência e adequado aproveitamento no sistema de ensino, assistência médica
(inclusive sob o ponto de vista psicológico) e, muito menos, de estimular e promover
a manutenção e/ou fortalecimento dos vínculos familiares.
As próprias "repúblicas" e alojamentos teriam de regularizar sua situação,,
pois, na prática, trata-se de verdadeiras entidades de abrigo que, como tal, precisam
ser legalmente constituídas (ainda que vinculadas a algum clube de futebol),
elaborar e executar um programa de atendimento e submeterem-se ao registro junto
ao Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, estando sujeitas à
fiscalização do Conselho Tutelar, do Ministério Público e do Poder Judiciário (cf.
art.95, da Lei n° 8.069/90).
É ainda imprescindível a formalização do vínculo com tais adolescentes,
respeitadas as regras e parâmetros estabelecidos pela Lei n° 9.615/98 (a chamada
"Lei Pelé"), que deve ser interpretada e aplicada em conjunto com o disposto no
Decreto-Lei n° 5.452/43 (Consolidação das Leis do Trabalho), Lei n° 8.069/90
(Estatuto da Criança e do Adolescente), além, é claro, do contido nos arts.5°, 7° e
227, da Constituição Federal.
O MPT tem agido para que não ocorra esse tipo de situação degradante com
os menores, orientando no sentido de que as instalações sejam adequadas,
sobretudo em matéria de alimentação, higiene, segurança e salubridade; os
alojamentos devem observar as regras da NR 31 e possuir armários individuais.
Bem como manter limpas e higienizadas as dependências utilizadas pelos
adolescentes.
Entretanto, infelizmente como se vê, as crianças ainda estão sujeitas a
tratamentos incompatíveis com a idade e com o sonho. Deve haver uma maior
regulamentação, uma fiscalização mais adequada, caso contrário, não se estará
formando atletas, mas sim, formando cidadãos fracassados e com um histórico
lamentável.
56
2.4. Educação e Saúde dos atletas
É fato notório que o Brasil não é nenhum exemplo no tocante a educação,
entretanto, no que se refere à educação de jogadores de futebol esse dado é muito
mais escasso.
É difícil definir os jogadores do Brasil, pois eles já nascem com a bola nos pés. Por outro lado, quando eu era criança, precisava estudar das 7h às 17h. Pedia ao meu pai para jogar bola, e ele dizia que antes vinham os estudos. Já eles (brasileiros) jogam futebol das 8h às 18h.66
Essa frase foi pronunciada pelo jogador francês Thierry Henry, na véspera de
um confronto com a seleção brasileira na copa do mundo de 2006, demonstrando
sensivelmente o descaso do “país do futebol” com a educação de seus jovens.
É evidente que a maior parte das crianças e jovens do nosso país deseja
seguir a carreira de jogador de futebol. Indagados entre o futebol e o estudo,
nenhum trocaria a bola pelos livros. Entretanto, as categorias de base dos clubes
deveriam aliar os dois, preservando o atleta de uma possível situação de
incapacidade no futebol e desamparo pelo resto da vida.
Muitas das crianças e adolescentes que buscam realizar o sonho de ser
jogador de futebol acabam ficando fora das escolas e, o pior, muitas vezes não por
vontade própria.
A Lei Pelé, na nova redação do art.29, §2º, f, regulamenta que, para fazer jus
a indenização destinada aos clubes formadores, os clubes são obrigados a ajustar o
tempo destinado à efetiva atividade de formação do atleta, não superior a 4 (quatro)
horas por dia, aos horários do currículo escolar ou de curso profissionalizante, além
de propiciar-lhe a matrícula escolar, com exigência de freqüência e satisfatório
aproveitamento.
Infelizmente, falta fiscalização nesse quesito. A intenção da lei foi
proporcionar ao atleta um estudo além das quatro linhas. Essa proteção advém do
66 CHAHAD, Allen. Brasileiros jogam bem porque não estudam, insuna Henry. Hannover. 29 de junho de 2006. Disponível em <http://esportes.terra.com.br/futebol/copa2006/selecoes/interna/0,,OI1056503-EI5720,00.html> acesso em 24 de maio de 2011.
57
altíssimo índice de insucesso nesta profissão. Além disso, resta em evidência que a
carreira de jogador de futebol é efêmera.
Esse entendimento também vai ao encontro do órgão máximo do futebol, a
FIFA, que regulamenta no art.19, incisos 2.b I e II, que o clube deve cumprir com as
seguintes obrigações mínimas:
i. prestar ao jogador a educação e/ou formação futebolística correspondente aos mais elevados padrões nacionais.
ii. garantir ao jogador uma educação e/ou formação acadêmica e/ou escolar e/ou profissional, além da educação e/ou formação futebolística, que lhe permita seguir uma carreira que não o futebol, caso cesse a sua atividade no futebol profissional.
Em nenhum momento a lei autoriza o atleta a abandonar os estudos após
concluir o ensino fundamental. O que se extrai dos excertos comentados é que
enquanto o atleta estiver em formação, ou seja, enquanto o menor não tiver um
contrato de trabalho adequado, ele deve estar estudando.
Alias, tal preocupação com o estudo dos jovens também está perfeitamente
regulamentado no ECA, em seu artigo 63.
Art. 63. A formação técnico-profissional obedecerá aos seguintes princípios:
I - garantia de acesso e freqüência obrigatória ao ensino regular;
II - atividade compatível com o desenvolvimento do adolescente;
III - horário especial para o exercício das atividades.
Ocorre que tais regulamentações não são suficientes para garantir o acesso
dos jovens às escolas. Muitos clubes desrespeitam tais regras, ou então, propiciam,
mas não fiscalizam os estudos de seus atletas, que, muitas vezes por preguiça ou
por acharem que não podem estudar e ser atleta ao mesmo tempo, abandonam a
escola.
Configura-se ai um total despreparo e desinteresse por parte dos atletas, de
suas famílias, bem como dos dirigentes com relação à educação.
Os garotos abandonam a escola pela chance de vencer no futebol, deixando
em situação de marginalidade aqueles que não se prepararam ou não atingiram o
esperado.
58
Para Isa Oliveira, secretária executiva do Fórum Nacional de Prevenção e
Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI):
Isso é uma realidade inaceitável, mas o problema é que a formação de jogadores ainda não é vista como um trabalho. Nossa preocupação são as milhares de crianças invisíveis, não identificadas, que deixam a família e os estudos e que, depois, são descartadas como objetos.67
O descaso com a educação encontra-se visível até mesmo nas categorias
profissionais. São muito poucos os atletas que possuem algum estudo.
Normalmente abandonam a escola e a faculdade por falta de tempo para conciliar.
Alguns clubes submetem os atletas a treinamentos pesado durante 8 horas
do dia, e a noite ainda matriculam os jovens em supletivos ou escolas. Evidente que
o estudo não rende. Cansados e não tendo tempo para estudo durante o dia, os
jovens deixam de comparecer às aulas, e esquecem a necessidade de se educar.
Entretanto, há jogadores que entendem imprescindível o estudo. Um exemplo
é o zagueiro Marcus Vinicius, das categorias de base do Grêmio que escolheu fazer
faculdade administração.
Hoje eu acho que fiz a escolha certa, me abriu olhos para outras coisas, e isso pode me ajudar a ficar menos dependente dos outros. Minha família teve uma cultura de estudar muito, e eu segui isso. Gosto e acho importante para o futuro, depois que eu terminar a carreira no futebol, tenho que ter algum conhecimento, em alguma outra área ou até no futebol, mas fora do campo.68
Esse deveria ser o pensamento de todos os jovens, preparar-se para o futuro,
independente da profissão de jogador de futebol.
Infelizmente, o país do futebol acaba relegando os estudos. Difícil encontrar
clubes que proporcionam condições de se aprimorar e, aqueles que proporcionam,
acabam proporcionando como opção e não como obrigatoriedade.
67 ARRAIS, Cesar Henrique. Entre o sonho e o pesadelo. Revista Anamatra. Ano XXII nº59. 1ª edição de 2010.Pg 16. 68LOPES, Tatiana. GUICHARD, Diego. Estudo e Futebol. Conheça jogadores que fazem essa combinação render. 31 de outubro de 2010. Disponível em <http://www.clicrbs.com.br/esportes/rs/noticias/default,3092203,Estudo-e-futebol-Conheca-jogadores-que-fazem-essa-combinacao-render.html.> Acesso em 10 de abril de 2011.
59
Deixar nas mãos de um jovem menor de 18 anos a decisão de estudar ou de
seguir focado na carreira de futebol é dar chance para o insucesso em ambas
tentativas.
No tocante a saúde, a Lei Pelé determina em seu art.29, §2º, c, a
necessidade de garantir assistência psicológica, médica e odontológica para os
menores das categorias de base.
Entretanto, tal enxerto não vem sendo cumprido sistematicamente pelos
clubes. O excesso de carga de treinamento e o constante abuso de exercícios
físicos acabam ocasionando lesões à saúde dos jovens que, em busca de seu
sonho de ser jogadores de futebol, não se importam com o excesso de trabalho
despendido.
Os clubes não têm um tratamento adequado, não há realização de exames
periódicos, nem individualização do treinamento. A Lei Pelé apenas cita a garantia,
mas não especifica métodos, nem maiores controle sobre esses cuidados que
devem ser despendidos ao menor. Importante frisar ainda que a Lei Pelé não prevê
direitos previdenciários para os atletas em formação.
2.5. Convivência familiar e comunitária
Um dos problemas mais graves enfrentado pela profissão de atleta de futebol
precocemente é o afastamento do lar familiar e de seus amigos.
José Afonso Silva assevera que
A família é uma comunidade natural composta, em regra, de pais e filhos, aos quais a Constituição, agora, imputa direito e deveres recíprocos, nos termos do art.229, pelo qual os pais tem o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, havidos ou não da relação do casamento (art.227,§6º), ao passo que os filhos maiores tem o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade.69
69
SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 28ª Edição. São Paulo. Malheiros, 2007. Pg.850.
60
Infelizmente, para os menores que sonham em se tornar jogador de futebol o
trecho citado de José Afonso Silva só tem importância na parte que cita o dever dos
filhos de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade.
É apenas esse o pensamento dos jovens. Tornar-se jogador de futebol,
ganhar dinheiro para assegurar a seus pais (comumente de famílias humildes) uma
vida digna, com boa infraestrutura. Entretanto, esquecem-se da importância que a
família possui para o menor na fase de desenvolvimento.
A reportagem de Guilherme Roseguini á Folha de São Paulo retrata essa
situação:
Marcos Antonio Silva Gonçalves é brasileiro, joga futebol, vem de família humilde e conseguiu espaço em um clube europeu. Ganhou dinheiro. Presenteou a mãe com um fogão de seis bocas, deu uma TV ao pai e bancou parte da reforma da casa onde vivem os quatro irmãos. Agora sonha ser o melhor do mundo.70
Constata-se que se tem tornado prática comum no mundo do futebol o
afastamento de crianças e adolescentes de suas famílias, que passam a morar em
alojamentos fornecidos pelos clubes, ou até mesmo em casas ou apartamentos
alugados por seus empresários.
Essa conduta acaba contrariando o texto constitucional e o Estatuto da
Criança e do Adolescente que asseguram ao adolescente o direito à convivência
familiar e comunitária.
Em que pese tais preceitos basilares, existem situações em que a violação de tal direito se dá com o conhecimento, quando não com o consentimento expresso daqueles que deveriam zelar por sua efetivação, sem que medida alguma seja tomada para reverter à situação, colocando crianças e adolescentes em situação de sério risco pessoal, familiar e social. 71
Os clubes deveriam impedir que os adolescentes (e principalmente as
crianças), a pretexto da realização de "testes", "treinos" e/ou "estágios", sejam
70
ROSEGUINI, Guilherme. Corrida por teens cresce e abre nova guerra da bola. Folha de São Paulo, página D1. 18 de setembro de 2005. 71
DIGIÁCOMO, José Murillo. Adolescentes jogadores de futebol: da necessidade de coibir os abusos de que são vítimas. Disponível em <http://www.crianca.caop.mp.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=1043>. Acesso em 07 de maio de 2011.
61
privados do regular exercício do direito à convivência familiar junto a seus pais ou
responsáveis e demais parentes.
Sem prejuízo da realização de "testes" ou "jogos-treino" nas suas sedes ou
em locais designados, os clubes devem zelar para que os adolescentes
permaneçam residindo na companhia de seus pais ou responsável e, se tiverem
que, por determinado período, de permanecer em alojamento, ou casa, sem a
presença dos familiares, deveriam fornecer passagens para que, ao menos uma vez
por semana, os mesmos possam se deslocar até o local de residência de seus pais
ou que estes possam vir até onde aqueles se encontram (garantindo-se, em tal
caso, alojamento gratuito também para os mesmos).
Entretanto, sabemos que a realidade está longe de ser a ideal.
Crianças são retiradas do seio familiar e submetidas a uma rotina cansativa.
São poucos os atletas que conseguem retornar a família com o objetivo alcançado.
Apenas 1% das crianças que começam em categorias de base dos clubes
virá profissional. Ou seja, de 100 crianças, apenas 1 irá tornar-se jogador
profissional de futebol. Salienta-se que essa criança não necessariamente será um
craque, ou ganhará muito dinheiro. Muitas vezes esse profissionalismo faz com que
o atual adulto, afastado do convívio familiar quando menor, passe a trabalhar em um
clube pequeno, recebendo um salário miserável, sem ter como sustentar a família.
Existem atletas, agora maiores, contratados por clubes de países distantes e
de cultura muito diferente da vivida por eles no Brasil, que não mais trocariam o seio
familiar por dinheiro algum72.
Muitas vezes os menores voltam pra casa frustrados, fracassados, sabendo
que a família investiu na ilusão de que iriam mudar de vida, e então, se vêem
voltando de mãos vazias, numa situação pior do que foram.
Esse é o mesmo pensamento do Juiz do Trabalho Ricardo Georges Affonso
Miguel:
Normalmente só nos chega a informação do sucesso. Mas certamente esses casos são minoria. A maioria é de fracassos, percalços e decepções. Não queremos isso para crianças e adolescentes, mesmo porque não é o que está insculpido na
72
COURA, Kalleo. Chuteiras que valem ouro. Revisa Veja. 2112. ed., ano 42, n.19, 13 maio 2009, p. 81.
62
Constituição. De nada adianta termos uma legislação interna forte se ela não é observada dentro ou fora do país. 73
Na reportagem especial feita pela Sportv encontramos garotos que vivem
longe da família e que sentem falta da mesma.
Fábio Ribeiro da Silva tinha 17 anos na época da matéria, os 3 anos
anteriores ele passou fora de casa, sem estudo, fazendo teste e indo onde o
empresário mandava. Saiu de casa com o sonho de que tudo iria dar certo, mas
depois desses anos, percebe que talvez não consiga realizá-lo. O menor afirma que
sente falta da família, dos amigos e que já pensou diversas vezes em abandonar a
profissão sonhada, mas entende que depois do que passou não compensa
abandonar tudo. O mesmo afirma que diversas vezes chora e pensa em voltar pra
casa, mas acaba pensando mais na família do que nele e continua.
Ou seja, esses menores estão sendo privados da convivência familiar e
assumindo um papel incongruente com a idade. Estão tendo responsabilidades de
chefes de família. Já não conseguem mais pensar neles próprios, no seu sonho, na
sua vida. Submetem-se a situações degradantes com o objetivo voltado à família.
A gente é muito cobrado. É muita pressão para jogar bem, melhorar. É difícil, não vejo minha família desde o Natal. Mas, pelo sonho de ser jogador, eu me sujeito a tudo", diz Victor Paiva Torres, de 15 anos, nascido em Apodi, no Rio Grande do Norte.74
Esse é o mesmo sentimento do menor chamado de “Romarinho”, 13 anos.
Nasceu no interior de São Paulo e sempre jogou futebol em escolinhas da cidade, foi
descoberto em um torneio em Santa Catarina. Optou, com o apoio da família, em
tentar a sorte longe de casa. Sente o peso do mundo nas costas e diz ser difícil de
suportar. Em 4 meses viu a família 1 vez só. Perguntado pelo repórter se sentia
saudades da família, afirmou que sim, e que a maneira de amenizar é olhar a foto da
mãe, confessando que já chorara diversas vezes. Pensava em abandonar, voltar pra
casa, mas acabou agüentando por ser seu sonho.
73
MIGUEL, Ricardo Georges Affonso. A possibilidade de contratação do atleta menor de futebol e a utilização do instituto da antecipação de tutela para transferência do atleta de futebol.Revista do Tribunal Regional do Trabalho 1ª Região. V.21. n.47. Jan/Jun 2010. Pg.107 74
COURA, Kalleo. Chuteiras que valem ouro. Revista Veja. 2112. ed. Ano 42, n.19. 13 de maio de 2009.
63
Margareth Matos de Carvalho, Procuradora do Trabalho, afirma que a
convivência familiar ainda é um drama. Afirma que o afastamento é regra, não
exceção. Para ela, essa seria a maior violação do direito dos menores.
Há quem entenda que esse afastamento do convívio familiar muitas vezes é
benéfico às crianças. Argumentam que, vindo de famílias pobres, muitas vezes o
relacionamento familiar não dá a estabilidade e o desenvolvimento adequado a
criança, muitas vezes acabando se submetendo às drogas ou a outros problemas
emocionais.
Entretanto, entendemos que a possibilidade de estar afastado do convívio
familiar, mesmo com uma boa assistência do clube, é prejudicial à criança. Muitas
vezes a criança sai com sonhos e depois retorna com problemas maiores, uma vez
que ficou a infância afastada da família e não terá mais tempo para recuperar a
infância perdida. A criança precisa de uma referência familiar, o que não vai ter no
clube.
A solução que deve ser dada a esse impasse é um maior cuidado dos clubes
com essa convivência familiar e comunitária. Adotando programas visando à
socialização, com uma maior convivência comunitária. Propiciando aos menores o
mínimo de 30 dias de férias por ano, a serem integralmente gozadas pelo
adolescente junto a seus amigos e familiares. Bem como assegurar que os
responsáveis legais visitem o alojamento onde esteja residindo o filho, custeando as
despesas do deslocamento.
Esse é um assunto longe do esgotamento, em que deveria ser feito um
estudo junto com psicólogas e assistentes sociais, a fim de verificar a importância da
convivência familiar. Esse é um direito constitucionalmente previsto aos menores,
sendo descabida sua violação.
2.6. O Êxodo e a Transferência de menores
A transferência de menores para o exterior, bem como o êxodo precoce, são
assuntos corriqueiros na mídia e na realidade do futebol. Cada vez mais os clubes
estrangeiros, principalmente os europeus, investem em atletas vindos de outros
64
países, principalmente da América do Sul, procuram atletas cada vez com menos
idade.
Conforme visto no capítulo apropriado, o artigo 19 do regulamento de
transferência de atletas da FIFA permite apenas a atletas maiores de 18 anos a
transferência internacional, excepcionando três situações: mudança dos pais do
jogador para o trabalho não relacionado ao futebol, mudança entre países da União
Européia e distância não superior a 50 km entre a residência do atleta e a fronteira
dos países e também entre esta e o clube.
Portanto, no Brasil o atleta só se profissionaliza a partir dos 16 anos, porém a
transferência só ocorrerá, salvo as exceções, aos 18 anos75.
Apesar de a legislação proibir tal prática, essas transferências têm acontecido
cada vez mais cedo, em total burla ao legislado. Esse êxodo de atletas mirins, ainda
que financeiramente vantajoso para suas famílias, está desprovido de proteção e é
contrário a todo arcabouço jurídico constitucional e infraconstitucional de proteção
ao menor76.
Tendo em vista que os contratos podem ser firmados a partir dos 16 anos, a
partir dos 15 anos já se espera do atleta o profissionalismo e o sucesso no mundo
competitivo.
Em razão disso, tem-se buscado promessas de idades cada vez menores, fazendo-se o investimento. Em alguns casos, são firmados contratos que aguardam o atleta completar 18 anos para que haja transferência oficial pelos critério regulamentares da FIFA. Porém, em outros existem subterfúgios para que haja a transferência a curto prazo, a fim de garantir o retorno financeiro rapidamente.77
Conforme visto, os clubes que preenchem os requisitos estabelecidos pela Lei
Pelé, acabam lucrando com a venda dos menores. Pelo fato de o Brasil ser um país
de pouca instrução e pouco desenvolvimento, os clubes utilizam os menores como
fonte de renda.
75
Abidão Neto, Bichara; Motta, Marcos. O êxodo dos jogadores menores e a necessidade de maior proteção a sua formação e transferência. In: Atualidades sobre direito esportivo no Brasil e no mundo. Basto, Guilherme Augusto Caputo, coordenador. Dourados, MS. Seriema. 2009, p.85 76
Coura, Kalleo. Chuteiras que valem ouro. Revista Veja. 2112.ed. ano 42. N.19. 13 maio 2009. P.81. 77
MIGUEL, Ricardo Georges Affonso. A possibilidade de contratação do atleta menor de futebol e a utilização do instituto da antecipação de tutela para transferência do atleta de futebol. Revista do Tribunal Regional do Trabalho 1ª Região. V.21. n.47. Jan/Jun 2010. Pg.105/106
65
Em razão disso, alguns clubes que não pretendem esperar e se sujeitas às regras normais da FIFA para transferência (mínimo de 18 anos) utilizam as exceções do artigo 19, ou fazem praticamente o mesmo, mas sem formalizar a transferência do atleta. 78
Nesse ultimo caso citado por Miguel, o jogador menor de 18 anos não pode
disputar partidas oficiais, mas pode treinar nas divisões de base de seu novo clube e
pode disputar amistosos pela equipe profissional, aguardando completar a
maioridade para participar de partidas oficiais.
Percebe-se que as exceções apresentadas pela FIFA são um convite a burlar
a legislação. Vejamos o art.19:
a) se os pais do jogador menor se mudarem para outro país por razões de trabalho não relacionadas com o futebol;
A maioria dos atletas vem de famílias pobres, de baixa renda, diante desse
quadro, os clubes usam o artifício de prometer emprego aos pais do atleta para que
possam levar o menor para jogar futebol em seu país. Muitas vezes o emprego é
proporcionado com a ajuda de investidores e empresários que tem interessa na
transferência do atleta. Os cargos oferecidos para os pais muitas vezes são de
porteiro, faxineiro, cozinheira, até mesmo na sede do clube. Entre a dúvida de deixar
o menor no Brasil, correndo o risco de não se tornar um profissional e ir para o
exterior, com um emprego até mesmo para os pais garantido, é evidente que a
família não fará outra escolha, atraída pelos euros e dólares oferecidos.
Coaduna a esse entendimento, Emile Boundes.
Trata-se de garotos de origem humilde, que sonham com uma vida melhor, buscam o sucesso e a fortuna, tem vontade de fazer a independência financeira e de dar uma condição digna à família. A situação de carência em que vivem no Brasil e a falta de oportunidades de trabalho aqui facilmente os tornam vítimas de empresários inescrupulosos 79.
78
MIGUEL, Ricardo Georges Affonso. A possibilidade de contratação do atleta menor de futebol e a utilização do instituto da antecipação de tutela para transferência do atleta de futebol. Revista do Tribunal Regional do Trabalho 1ª Região. V.21. n.47. Jan/Jun 2010. Pg.105/106 79
BOUDENS, E. (CPI CBF/NIKE: Textos e Contexto IV). Medidas de Prevenção á Saída do país de atletas menores de idade. Estudo, Consultoria Legislativa. Brasília: Câmara dos Deputados, fevereiro de 2002.
66
Outro artifício utilizado pelos clubes estrangeiros é fornecer estudo para os
menores, dessa forma, entram no país através de visto de estudante e começam a
jornada esportiva.
Obviamente, essa não é apenas uma preocupação formal ou técnico-jurídica, mas também social: há casos de abandono de jovens africanos na Europa, pois, após uma tentativa malsucedida, não compensa financeiramente o retorno ou qualquer outro investimento.80
São crianças que acabam sendo abandonadas em um país com cultura
extremamente diferente a de sua criação, passando dificuldades, muitas vezes sem
a presença dos pais. Acabam tendo que se tornar adultos, adquirindo
responsabilidades, do dia para a noite, enfrentando dificuldades até mesmo com a
língua local.
A corte de arbitragem do esporte- CAS, instância revisora das decisões do
Comitê de Resoluções e Disputas – DRC e da Comissão do Estatuto do Jogador –
PSC tem decidido invalidar os registros de atletas menores quando a transferência é
efetivada em burla à legislação, no que concerne às exceções mencionadas. Com
isso, há a proibição de o atleta atuar pelo clube.81
Preocupadas com esse êxodo de atletas, as autoridades desportivas
internacionais resolveram agir efetiva e preventivamente, ao contrário de apenas
julgar questões surgidas.
Entenderam por bem alterar o Regulamento de Transferência da FIFA:
a) aumentando o valor da compensação por formação dos atletas entre 12 e
15 anos (art. 20);
b) integrando academias e escolas de futebol ao Sistema do Futebol, com
seus atletas relacionados nas associações nacionais;
c) sujeitando transferências internacionais e registros de atleta estrangeiro
menor à autorização de um órgão dentro do Comitê do Estatuto do Jogador; e
80
Abidão Neto, Bichara; Motta, Marcos. O êxodo dos jogadores menores e a necessidade de maior proteção a sua formação e transferência. In: Atualidades sobre direito esportivo no Brasil e no mundo. Basto, Guilherme Augusto Caputo, coordenador. Dourados, MS. Seriema. 2009, Pg.86. 81
Abidão Neto, Bichara; Motta, Marcos. O êxodo dos jogadores menores e a necessidade de maior proteção a sua formação e transferência. In: Atualidades sobre direito esportivo no Brasil e no mundo. Basto, Guilherme Augusto Caputo, coordenador. Dourados, MS. Seriema. 2009, p.86
67
d) fazendo constar as transferências do Sistema Eletrônico de Transferências
da FIFA, com certificados internacionais de transferência emitidos eletronicamente,
logo, com maior publicidade.82
Outra solução para atletas a partir de 16 anos seria a aquiescência dos
atletas para a transferência ocorrer antes dos 18 anos. Isso ocorreria devido às
disposições do direito civil acerca da emancipação do menor entre 16 e 18 anos que
tenha relação de emprego com economia própria (artigo 5º, parágrafo único, do
código civil).
Porém, parte da doutrina jus trabalhista entende que a emancipação
não revogaria os dispositivos de proteção ao menor quando seu fundamento for a
idade, aplicando-se os artigos 406 e seguintes da CLT. 83
Assim como Ricardo Georges, entendemos da mesma forma que a
maioria da doutrina, ressalvando que devem ser resguardadas as proporções
relacionadas à especificidade do atleta menor do futebol, na análise de eventual
problema que venha a surgir para a manifestação das autoridades judiciárias da
infância e da juventude e da Justiça do Trabalho.
Também há casos em que o menor não é vinculado a nenhum clube.
Quando isso acontece e olheiros e empresários percebem que o garoto possui
potencial desportivo, esses entram em contato com a família do menor, oferecendo
dinheiro em troca de uma procuração para viajar com o menor e assinar contrato
com clubes estrangeiros. Após a assinatura do contrato, e o recebimento de valores,
o empresário acaba deixando o menino abandonado a própria sorte.
Como bem lembra Boudens:
As condições de trabalho são tão miseráveis (salário de fome, comida ruim, inexistência de plano de saúde, comunicação difícil) que não há como viver fora do alojamento do clube. Se, porém, assim mesmo resolver sair, para tentar a sorte em outro clube ou
82
Abidão Neto, Bichara; Motta, Marcos. O êxodo dos jogadores menores e a necessidade de maior proteção a sua formação e transferência. In: Atualidades sobre direito esportivo no Brasil e no mundo. Basto, Guilherme Augusto Caputo, coordenador. Dourados, MS. Seriema. 2009, p.87. 83
CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. 2. ed. Niterói: Impetus, 2008, p. 550.citado em MIGUEL, Ricardo Georges Affonso. A possibilidade de contratação do atleta menor de futebol e a utilização do instituto da antecipação de tutela para transferência do atleta de futebol.Revista do Tribunal Regional do Trabalho 1ª Região. V.21. n.47. Jan/Jun 2010.
68
outro emprego, ou, ainda, se resolver voltar para casa, não adianta: o prazo do contrato (que assinou sem ler) é de longo prazo, podendo chegar a dez anos, e, assim, ele está contratualmente preso ao clube em razão da “lei do passe”. A não ser, claro, que pague a indenização por rescisão unilateral de contrato, cujo valor pode chegar a U$ 15 mil.84
A prevenção nesses casos acaba sendo mais difícil do que quando o atleta
está vinculado a um time, pois, nesses casos, são os pais quem autorizam a saída
do menor para o exterior. E quanto a isso, nada há o que fazer, visto que os pais são
quem detém o poder pátrio sobre o menor.
Percebe-se que a saída dos menores do país para jogar futebol não está
perfeitamente legislada, tanto no ordenamento nacional, quanto internacional.
Apesar de a FIFA possuir os cuidados adequados, os fatos muitas vezes são
distorcidos pelas partes interessadas para que a transação seja enquadrada em
uma das hipóteses de exceção.
Entendemos que uma mudança legislativa não é suficiente para preservar o
menor do êxodo. É necessário ainda mudanças comportamentais efetivas nos
países de origem, para os menores sintam-se estimulados a continuar no país, e
não se submeter a situações degradantes só por um sonho.
84
BOUDENS, E. (CPI CBF/NIKE: Textos e Contexto IV). Medidas de Prevenção á Saída do país de atletas menores de idade. Estudo, Consultoria Legislativa. Brasília: Câmara dos Deputados, fevereiro de 2002. Pg.4.
69
Conclusões
O que se depreende do presente estudo é que as questões que envolvem o
trabalho do menor no futebol estão mal reguladas e carentes de fiscalização.
Ao longo da pesquisa, pudemos constatar que tal profissão é vista com outros
olhos perante a sociedade, os atletas, seus pais e até mesmo pelos legisladores e
profissionais da área do esporte. Por se tratar de uma profissão almejada e que,
aparentemente, gera status, dinheiro e fama, parece que todo sacrifício é válido para
alcançar os objetivos: formar novos craques.
Infelizmente, a realidade brasileira está longe de ter uma solução ideal.
Vivemos em um país no qual o futebol é mais importante que o estudo, a
profissionalização é mais importante que o convívio familiar e o sacrifício é mais
importante que uma vida digna.
Antes de chegar a essa conclusão, analisamos toda a legislação de proteção
ao menor, para, após, depreender os aspectos concretos da realidade do menor no
futebol.
Após realizar o estudo, concluímos que essa profissão muitas vezes é mais
danosa ao menor do que um trabalho na roça, um trabalho em uma indústria.
Nesses casos, o menor continua tendo um convívio familiar ao menos, por mais que
seja explorado profissionalmente. Muitas vezes trabalham na indústria durante o dia,
mas a noite jantam com os pais, brincam na rua com os amigos, e até mesmo
estudam. Já no caso do futebol, do menor é retirada toda a infância, todo o convívio
familiar, todo o estudo, toda a formação de um cidadão.
É claro que não podemos generalizar, há clubes que fornecem todo
tratamento adequado, procuram manter os menores em escolas, proporcionam
convivência comunitária e familiar, dando toda assistência médica e psicológica para
preparar o atleta para vida, e não somente para o futebol. Entretanto, infelizmente
essa não é a regra, mas sim exceção.
Os menores chegam aos clubes com o sonho de ser um atleta profissional, de
dar uma grande assistência financeira a seus familiares e de retornar para o lar com
uma vida repleta de realizações, obstante, retornam de uma forma mais miserável
70
ainda. Voltam sentindo-se fracassados, vendo seu sonho terminar sem ter uma vida
digna.
O Ministério Público do Trabalho, através de suas Orientações, tem tentado
fiscalizar a atuação dos clubes no que se refere ao trabalho infantil, mas não é o
suficiente. É tarefa do direito do trabalho, de suas instituições e de seus operadores
tentarem distanciar o menor de qualquer tipo de trabalho degradante e prejudicial.
Há necessidade de uma maior atenção a esse tipo de profissão, de uma fiscalização
mais exacerbada, de uma atuação mais incisiva, capaz de conter os clubes da
destruição de valores e direitos assegurados pela nossa Constituição apenas em
prol de benefícios financeiros.
Essa profissão é encarada como uma diversão, entretanto, não é assim que
deveria ser visto. Ser atleta profissional de futebol é uma profissão que deve ser
devidamente regulamentada, e, quando se trata de menores, deve ser dada uma
atenção especial. As crianças são o futuro do país, devemos prepará-las para a
vida, para serem cidadãos e construírem um futuro melhor e não privá-las de seus
direitos em prol de uma “seleção mais forte nas próximas copas”.
A partir do momento em que o Direito do Trabalho se sobrepor ao esporte, em
que a regulamentação profissional e protetiva dos atletas menores se transforme em
dever do nosso país, ai sim conseguiremos transformar cidadãos em atletas, e
atletas em bons cidadãos, sem comprometer o bonito futebol do nosso país e sem
retirar das crianças a infância e os direitos a elas inerentes e que hoje restam
perdidos em sonhos.
71
Referências ABIDÃO Neto, Bichara; Motta, Marcos. O êxodo dos jogadores menores e a necessidade de maior proteção a sua formação e transferência. In: Atualidades sobre direito esportivo no Brasil e no mundo. Basto, Guilherme Augusto Caputo, coordenador. Dourados, MS. Seriema. 2009. AGENCIA GLOBO. Denúncias revelam maus-tratos em quem sonha se tornar jogador de futebol. Disponível em http://www.fnpeti.org.br/destaque/denuncias-revelam-maus-tratos-em-quem-sonha-se-tornar-jogador-de-futebol/. Acesso em 10 de maio de 2011. ARRAIS, Cesar Henrique. Entre o sonho e o pesadelo. Revista Anamatra. Ano XXII nº59. 1ª edição de 2010. BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo. LTR, 2005. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 05 de outubro de 1988. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitucao.htm BOUDENS, E. (CPI CBF/NIKE: Textos e Contexto IV). Medidas de Prevenção á Saída do país de atletas menores de idade. Estudo, Consultoria Legislativa. Brasília: Câmara dos Deputados,fevereiro de 2002. CARRION, Valentin. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho legislação complementar jurisprudência. 26. ed. São Paulo: Saraiva, 2001. CHAHAD, Allen. Brasileiros jogam bem porque não estudam, insuna Henry. Hannover. 29 de junho de 2006. Disponível em <http://esportes.terra.com.br/futebol/copa2006/selecoes/interna/0,,OI1056503-EI5720,00.html> acesso em 24 de maio de 2011. CHAVES, Antonio. Comentários ao estatuto da criança e do adolescente. 2ª Ed. São Paulo: LTr, 1997. CLICRBS. Clube inaugura alojamento para as categorias de base. Porto Alegre. 04 de agosto de 2008. Disponível em <http://globoesporte.globo.com/Esportes/Noticias/Times/Gremio/0,,MUL711418-9868,00.html>. Acesso em 15 de maio de 2011.
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