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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE TECNOLOGIA DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA QUÍMICA ESTUDO DE VIABILIDADE DA IMPLANTAÇÃO DE UM BIODIGESTOR SERTANEJO NO ASSENTAMENTO TRANGOLA EM CURRAIS NOVOS (RN). IAN MACEDO SILVA NATAL RN, 2019

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE TECNOLOGIA

DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA QUÍMICA

ESTUDO DE VIABILIDADE DA IMPLANTAÇÃO DE UM BIODIGESTOR

SERTANEJO NO ASSENTAMENTO TRANGOLA EM CURRAIS NOVOS (RN).

IAN MACEDO SILVA

NATAL – RN, 2019

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE TECNOLOGIA

DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA QUÍMICA

ESTUDO DE VIABILIDADE DA IMPLANTAÇÃO DE UM BIODIGESTOR

SERTANEJO NO ASSENTAMENTO TRANGOLA EM CURRAIS NOVOS (RN).

IAN MACEDO SILVA

NATAL – RN

2019

Trabalho de Conclusão de Curso

apresentado ao curso de Engenharia

Química da Universidade Federal do

Rio Grande do Norte como parte dos

requisitos para a obtenção do título de

Engenheiro Químico, orientado pelo

Prof. Dr. André Luis Lopes Moriyama.

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AGRADECIMENTOS

A minha família, pelo amor e incentivo diário durante toda a jornada de minha

graduação, em especial aos meus pais, por terem me mostrado o caminho correto a se

seguir.

A esta universidade e aos docentes do Departamento de Engenharia Química,

por terem me proporcionado excelente formação.

A ONG Engenheiros sem fronteira, especialmente ao núcleo Natal, que me

fizeram enxergar mais longe, sem eles esse trabalho não existiria.

A todos que fizeram parte da minha formação como engenheiro, indireta ou

diretamente, o meu muito obrigado.

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RESUMO

Na região nordeste, principalmente no sertão nordestino, existem muitas

comunidades que se localizam afastadas das cidades, e por isso, têm condições de vida

um pouco mais complicadas. Muitas vezes essas comunidades se sustentam através da

agropecuária familiar, sem nenhuma renda fixa, o que pode gerar muitas dificuldades.

No entanto existem diversas tecnologias sociais que buscam mitigar algumas das

dificuldades pelas quais essas pessoas passam. O exemplo mais conhecido de uma

tecnologia para esse fim é a cisterna, que acumula a água das chuvas para que essas

famílias possam passar pela época de seca.

O biodigestor sertanejo é uma tecnologia social que utilizando os conhecimentos

da engenharia desenvolvidos, traz uma forma que é possível gerar gás inflamável, que

pode ser utilizado para atividades como cocção, iluminação, ou até mesmo geração

energética, através de um motor gerador.

Para que ocorra a instalação do equipamento, é sempre desejável analisar a

viabilidade do empreendimento, tanto técnica quanto financeira, verificando se as

características geográficas do local onde a instalação é prevista estão de acordo com o

esperado para o funcionamento sem problemas do equipamento e se o que será

produzido é viável para se recuperar tudo o que foi investido para que o equipamento

fosse construído e entrasse em funcionamento em um tempo que esteja de acordo com o

período pelo qual o equipamento vai funcionar.

Com a análise dessas informações é então possível, antes mesmo da instalação

do equipamento, saber qual é o melhor uso para o biogás e para o biofertilizante

produzido, de acordo com as caraterísticas do local, da produção agrícola e criação de

animais, das principais necessidades das famílias e dos custos de vida da família.

Palavras-chaves: Biodigestor, tecnologia social, viabilidade, agropecuária

familiar, biogás, biofertilizante.

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ABSTRACT

In the northeastern region, mainly in the northeastern sertão region, there are

many communities that are located a little far from the cities, and therefore have a little

more complicated living conditions. Often these communities sustain themselves

through family agriculture, with no fixed income, which can generate many difficulties.

However, there are a number of social technologies that seek to mitigate some of the

difficulties these people face. The best known example of a technology for this purpose

is the cistern, which accumulates rainwater so that these families can go through the dry

season.

The sertanejo biodigestor is a social technology that uses the developed

engineering knowledge brings a way that it is possible to generate flammable gas,

which can be used for activities such as cooking, lighting, or even power generation,

through a motor generator.

In order for the installation of the equipment to take place, it is always

desirable to analyze the viability of the undertaking, both technical and financial,

verifying that the geographical characteristics of the place where the installation is

planned are in line with what is expected for the equipment to operate without

problems, and if the that will be produced is feasible to recover everything that was

invested so that the equipment was constructed and put into operation in a time that is

according to the period by which the equipment will work.

By analyzing this information, it is then possible, even before the installation

of the equipment, to know what is the best use for the biogas and for the biofertilizer

produced, according to the characteristics of the site, the agricultural production and

livestock, the main needs of the families and of the costs of life of the family.

Key-Words: Biodigestor, social technology, viability, family farming, biogas,

biofertilizer.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Biodigestor modelo Batelada. .......................................................................... 7

Figura 2 - Representação tridimensional de um corte do biodigestor modelo Batelada. . 8

Figura 3 - Biodigestor modelo indiano.. ......................................................................... 10

Figura 4 - Esquema de um biodigestor modelo Indiano. ................................................ 11

Figura 5 - Representação tridimensional de um corte de um biodigestor modelo

Indiano.. .......................................................................................................................... 12

Figura 6 - Biodigestor modelo Chinês. ........................................................................... 13

Figura 7 - Esquema de um biodigestor modelo Chinês. ................................................. 14

Figura 8 - Representação tridimensional de um corte de um biodigestor modelo Chinês

........................................................................................................................................ 15

Figura 9 - (a) Vista superior de um biodigestor sertanejo (b) Vista lateral de um

biodigestor sertanejo. ...................................................................................................... 16

Figura 10 - Etapas de produção do biogás ...................................................................... 19

Figura 11 - Localização do assentamento Trangola ....................................................... 28

Figura 12 - Dados climáticos da região onde fica o assentamento Trangola ................ 30

Figura 13 - Custos anuais do biodigestor ....................................................................... 41

Figura 14 - Custos anuais do motor-gerador .................................................................. 44

Figura 15 - Comparação entre os tempos de retorno para cada um dos cenários .......... 45

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Dejetos animais produzidos por dia em propriedades rurais. .......................... 3

Tabela 2 - Composição dos dejetos de gado..................................................................... 3

Tabela 3 - Produção de biogás de acordo com o tipo de gado. ........................................ 4

Tabela 4 - Produção de esterco fresco diário. ................................................................. 32

Tabela 5 - Custo do biogás por m³ de acordo com o tempo de amortização. ................. 37

Tabela 6 - Dados de consumo e gasto anual do assentamento. ...................................... 38

Tabela 7 - Produção anual do assentamento para o biodigestor. .................................... 38

Tabela 8 - Investimento em manutenção ........................................................................ 39

Tabela 9 - Custo anual do biodigestor de acordo com o tempo de amortização ........... 40

Tabela 10 - Custo do kW de acordo com o tempo de amortização ............................... 42

Tabela 11 - Consumo e gasto anual com energia elétrica no assentamento. .................. 42

Tabela 12 - Produção anual de biogás, energia e biofertilizante .................................... 43

Tabela 13 - Custo anual do motor-gerador de acordo com o tempo de amortização. .... 43

Tabela 14 - Produção anual do assentamento com duas utilizações para o biogás ........ 44

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LISTA DE EQUAÇÕES

Equação 1 - Reação de formação do biogás ................................................................... 18

Equação 2 - Equação estequiométrica da formação do biogás ....................................... 18

Equação 3 - Reação de hidrólise..................................................................................... 10

Equação 4 - Reação das metanogênicas hidrogenotróficas ............................................ 11

Equação 5 - Reação das metanogênicas acetoclásticas .................................................. 12

Equação 6 - Custo do biogás. ......................................................................................... 13

Equação 7 - Custo anual do biodigestor ......................................................................... 14

Equação 8 - Fator de recuperação do capital. ................................................................. 15

Equação 9 - Tempo de retorno do investimento no biodigestor ..................................... 16

Equação 10 - Custo da energia ....................................................................................... 19

Equação 11 - Produção da eletricidade........................................................................... 25

Equação 12 - Custo anual com biogás ............................................................................ 26

Equação 13 - Custo anual do motor gerador. ................................................................. 26

Equação 14 - Tempo de retorno do investimento com cogeração .................................. 26

Equação 15 - Volume do biodigestor. ............................................................................ 33

Equação 16 - Densidade do esterco. ............................................................................... 33

Equação 17 - Volume do cilindro ................................................................................... 34

Equação 18 - Carga diária .............................................................................................. 34

Equação 19 - Volume da caixa de descarga ................................................................... 35

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 1

2. REFERENCIAL TEÓRICO .................................................................................. 2

2.1. Resíduos da agropecuária familiar ................................................................. 2

2.2. Benefícios dos biodigestores ......................................................................... 5

2.3. Modelos de Biodigestores .............................................................................. 5

2.3.1. Biodigestor de batelada ........................................................................ 6

2.3.2. Biodigestor contínuo ............................................................................ 8

2.3.2.1. Modelo indiano ........................................................................... 9

2.3.2.2. Modelo chinês ........................................................................... 12

2.3.2.3. Modelo sertanejo ...................................................................... 15

2.4. Biomassa ..................................................................................................... 17

2.5. Fermentação anaeróbica ............................................................................. 17

2.6. Formação do biogás .................................................................................... 18

2.6.1. Hidrólise ............................................................................................. 19

2.6.2. Acidogênese ....................................................................................... 20

2.6.3. Acetogênese ....................................................................................... 20

2.6.4. Metanogênese .................................................................................... 20

2.7. Condições operacionais .............................................................................. 20

2.7.1. Concentração de nutrientes ................................................................ 21

2.7.2. Condições de pH ............................................................................... 21

2.7.3. Temperatura ....................................................................................... 21

2.7.4. Tempo de retenção hidráulica ............................................................ 22

2.8. Cogeração energética .................................................................................. 22

2.9. Eficiência da conversão do biogás em energia elétrica .............................. 23

2.10. Análise econômica da produção de biogás .............................................. 23

2.11. Análise econômica da produção de energia elétrica ............................... 24

2.12. Utilização do biofertilizante ..................................................................... 25

3. VIABILIDADE DA REGIÃO ............................................................................ 28

4. DIMENSIONAMENTO DE UM BIODIGESTOR PARA O ASSENTAMENTO

TRANGOLA ....................................................................................................... 32

5. VIABILIDADE ECONÔMICA DA OPERAÇÃO ............................................. 36

6. CONCLUSÃO ..................................................................................................... 46

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1. INTRODUÇÃO

O desenvolvimento da agricultura familiar no Brasil está diretamente associado

aos investimentos recebidos, esses investimentos sem sombra de dúvidas trazerem

tecnologias que atuam nas necessidades da população rural. O aproveitamento da maior

parte do que é produzido se torna um ponto chave para a sobrevivência de muitas

comunidades rurais, as quais estão geralmente bem distantes dos centros urbanos e tem

pouca possibilidade de locomoção até esses centros, fazendo com que tenham que

procurar os meios de sobreviver através de sua produção. A grande maioria das famílias

que vivem nessas comunidades não tem meio de renda fixa.

Em regiões como o sertão nordestino, esse cenário pode tornar-se ainda um

pouco mais complicado, a pouca quantidade de chuvas dificulta ainda mais qualquer

atividade rural, assim é necessário que comunidades nesse tipo de situação recebam um

pouco mais de investimento. Na atual realidade de comunidades do sertão nordestino

não possuir uma cisterna faz com que seja extremamente difícil sobreviver da

agricultura e da criação de animais.

Essa realidade faz com que seja difícil para essas famílias sustentar os custos de

vida em uma região como essa, onde as pessoas acabam dependendo da agricultura

familiar, o que pode se tornar inviável para que essas pessoas continuem vivendo nessa

região. Para reduzir o custo de vida, essas comunidades utilizam algumas alternativas,

como ao invés de cozinhar utilizando um fogão a gás, cozinha-se utilizando lenha para

reduzir o custo, assim algo simples como cozinhar em um fogão a gás, como a maioria

das pessoas faz no seu dia a dia, torna-se certo luxo para esse pessoal.

A ideia de uma tecnologia que possa dar a essas famílias um meio de obter gás

inflamável, para que eles possam ou cozinhar ou gerar energia para as suas residências,

utilizando algo que geralmente é descartado, que são os dejetos dos animais, tem o

potencial de mudar o panorama da vida dessas pessoas, e assim como a cisterna se

tornou um artigo essencial para quem vive nesse tipo de região, um biodigestor tem o

potencial para fazer o mesmo. Há potencial para tornar essas comunidades mais

independentes, diminuir os custos de vida que acabam levando boa parte do pouco

capital financeiro que eles têm.

O sertão nordestino, com as suas características climáticas, se mostra um local

bem apropriado para a implantação dessa tecnologia, tendo um enorme potencial de ser

algo que realmente tenha impacto positivo na qualidade de vida dessas pessoas.

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2. REFERENCIAL TEÓRICO

A qualidade de vida que o ser humano tem é diretamente relacionada com o

acesso que ele possui a serviços fundamentais, entre eles está o saneamento básico e o

tratamento de esgotos. No Brasil existe um grande déficit em relação ao saneamento

básico, o esgotamento sanitário chega apenas a 1% dos municípios, com a maioria

utilizando fossas, as quais apenas 15% realmente cumprem sua função e tem o efeito

despoluitivo (MARQUES et al., 2012).

Assim o saneamento em áreas rurais também é problema a ser enfrentado,

existem várias tecnologias que se propõe a atuar sobre esse problema no ambiente rural,

mas a utilização de biodigestores tem como agregar valor às atividades desenvolvidas,

além de ser uma correta destinação para os resíduos que são gerados na atividade

agrícola. Pode ser uma solução também para o manejo dos dejetos vindos da criação de

animais, dispondo-os de uma maneira correta, o que promove ainda a sustentabilidade a

partir do aproveitamento do biogás e biofertilizante como os produtos da operação.

2.1 Resíduos da Agropecuária Familiar

A forma que se faz o manejo dos resíduos gerados a partir da criação de animais

é de grande preocupação, feito de forma errada podem trazer grandes problemas quanto

à degradação ambiental, poluindo mananciais, solo, ar e, desse modo, trazer

consideráveis prejuízos à qualidade de vida das populações rurais, bem como

comprometem a sobrevivência da flora e fauna (BARICHELLO et al. 2015). A

gravidade do problema ficou exposta quando passou a ser mais comum a criação de

animais em regime de confinamento, em que os dejetos que antes ficavam distribuídos

pelo pasto agora ficam restritos a pequenos lugares com manejo inadequado (Bosco et

al. 2016). A destinação dos resíduos agrícolas e dejetos animais é um grande problema

enfrentado pelos agricultores, pelo efeito contaminante do solo e das águas de rios e

lençóis freáticos e a biodigestão constitui uma alternativa viável para atender os

requisitos ambientais e de saúde pública (Nogueira et al. 2015). Na Tabela 1 encontra-se

o potencial gerador da quantidade diária de dejetos, produzidos por espécie animal em

áreas rurais.

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Tabela 1 - Dejetos animais produzidos por dia em propriedades rurais.

Animal Kg de Dejeto/Dia

Bovino 10 a 50

Equino 10 a 12

Ovino 2,80

Suíno 2,25

Galinha 0,18

Fonte: Adaptado de Silva (1987), Pereira (1986) e Santos (2000).

O emprego dos resíduos gerados na criação animal é hoje em dia amplamente

utilizado nos processos de biodigestão anaeróbia por sua elevada degradabilidade na

ausência de ar. Esses resíduos possuem uma grande quantidade de matéria orgânica e

costumam ser bem concentrados

Quando o foco é na atividade pecuária pode-se encontrar resíduos que

apresentam diferentes degradabilidades e concentrações, pois eles estão diretamente

ligados a tudo que envolve o animal, desde a sua alimentação até o manejo desse

resíduo. Na Tabela 2 podemos ver a composição dos dejetos do gado de diferentes

portes.

Tabela 2 – Composição dos dejetos de gado.

Animal Quantidade

diária de

resíduo (l)

Concentração (g/l)

Sólidos

totais

Sólidos

voláteis

Nitrogênio Fósforo Potássio

Vaca leiteira

de até 600 kg

10 - 50 90 70 4,5 1,7 5,4

Bezerro de até

150 kg

5 - 15 90 70 3,7 2,1 5,0

Bovino de

engorda de até

520 kg

10 - 20 90 70 3,7 2,1 5,0

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Fonte: Adaptado de Santos (2000) e Farret (2010).

O tempo que a biodigestão leva varia de resíduo para resíduo, em função da sua

degradabilidade, o que é um fator determinante na produção do biogás.

Em boas condições para o desenvolvimento das bactérias anaeróbias, tendo

matéria orgânica haverá a fermentação e terá como produto principal o biogás, a

depender da matéria orgânica utilizada a produção de biogás poderá ser maior ou

menor, para resíduos da pecuária, há o potencial da seguinte produção. Podemos ver na

Tabela 3 a produção de biogás para animais de diferentes portes.

Tabela 3 – Produção de biogás de acordo com o tipo de gado.

Animal Produção específica de

biogás (m³/kg de sólidos

totais)

Produção diária mínima

(m³/Animal/Dia)

Vaca leiteira de 600 kg 0,40 – 0,49 0,980

Bezerro de até 150 kg 0,28 0,294

Bovino de engorda de até

520 kg

0,40 0,400

Fonte: Adaptado de Santos (2000) e Farret(2010).

Considerando o número de animais existente em cada comunidade, partindo dos

dados da literatura, já é possível obter uma boa estimativa do potencial de produção de

biogás que a comunidade possui, para verificar qual a melhor uso para o biodigestor

dentro da comunidade.

Segundo Smith et al. (2013) a quantidade de insumos que seria necessária para

fazer com que um biodigestor com capacidade de armazenamento para atender uma

família seria de apenas 20kg de esterco bovino e 20 litros de água por dia, o que seria a

produção de um ou dois animais, o que mostra o quão acessível essa tecnologia se torna,

mesmo em uma localidade bem afastada, com poucos animais, pode ser aplicada. Além

dos biodigestores atuarem como uma solução do manejo dos dejetos nessas localidades,

o equipamento trás como produtos o biogás e o biofertilizante.

O biogás pode ser utilizado como uma fonte energética e o biofertilizante

melhorando o nível de nitrogênio do solo. O equipamento tem um grande potencial de

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geração de renda, principalmente em áreas como o nordeste brasileiro onde há muito

descaso governamental e essas comunidades isoladas acabam ficando desprotegidas.

2.2 Benefícios dos biodigestores

A utilização de biodigestores é uma das alternativas para a destinação correta

dos dejetos gerados na criação de animais, e também uma alternativa para o saneamento

básico da população rural, com o equipamento realizando a biodigestão do efluente,

decompondo os resíduos orgânicos e dejetos em um ambiente de anaeróbico, com

ausência de oxigênio, resultando em biogás e biofertilizante, ricos em minerais como

potássio e fósforo (SANTOS et al., 2017).

Embora o processo de biodigestão de resíduos orgânicos seja já conhecido há

bastante tempo, com relatos da primeira unidade instalada em Bombaim na India em

1819, o primeiro biodigestor, que atuava em regime de batelada, só foi colocado em

funcionamento em 1950 (SILVA, 1987). Desde então a tecnologia passou por vários

aprimoramentos e diversos países acabaram criando as suas próprias versões, Barros et

al. (2016) propuseram um estudo sobre a análise de viabilidade de um modelo de

biodigestor de baixo custo, que atenderia às condições e realidades de pequenos

agricultores familiares. Mattos e Farias (2011) apresentam um modelo sertanejo de

biodigestor como tecnologia social, como alternativa de baixo custo e construído a

partir de materiais disponíveis em lojas de materiais para construção e de simples

manutenção. O modelo de biodigestor sertanejo foi implantado nos estados do nordeste

brasileiro e visava atender a população rural carente principalmente na produção de

biogás para cozinhar, em substituição ao fogão a lenha e ao gás GLP (CARVALHO et

al., 2017).

De acordo com Carvalho et al. (2017), a instalação de biodigestores em

propriedades de pequenos agricultores incentiva a sustentabilidade, podendo fazer uso

de energias renováveis, biofertilizantes e ainda fazer uma correta destinação dos

resíduos gerados pela atividade agrícola. Ainda segundo os autores, o biodigestor não

tem uma utilização específica, as diversas formas que as pequenas famílias rurais

utilizam o mesmo.

A biodigestão funciona melhor com a adição de dejetos em proporções tais que

deem uma relação entre Carbono e Nitrogênio (C/N) próximo a 30:1 (MATOS et al.

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1998). A proporção C/N do esterco de animais varia entre 15:1 a 29:1 e que, segundo

Silva (1987), esta relação é satisfatória para a maioria dos biodigestores.

2.3 Modelos de biodigestores

O equipamento biodigestor consiste em câmaras hermeticamente fechadas, onde,

através de digestão anaeróbia, os resíduos são decompostos oferecendo como produto o

biogás e biofertilizante (MIRKO, 2003). Dessa forma, eles são equipamentos capazes de

serem eficazes para o tratamento de esgoto, ainda são capazes de diversificar a matriz

energética através da utilização do biogás e, melhorar o desempenho de pequenas hortas

ou até mesmo agricultura em maior escala, com a utilização dos biofertilizantes.

Diversos materiais podem servir como matéria-prima em biodigestores, o que

permite utilizar várias fontes para alimentar o biodigestor, podendo ser adicionado ao

processo esterco de gado, de porcos, de cavalos, de galinhas e excrementos humanos

assim como restos vegetais de cultura como palha, grama e folhas (SEIXAS et al.,

1981). Entretanto é necessário ter cuidado com a adição de restos vegetais, pois por

possuírem baixa densidade, podem se acumular no topo do material dentro do

biodigestor provocando a interrupção da produção de gás. Para adicionar a matéria para

dentro do biodigestor é necessário que todos os materiais orgânicos sejam diluídos em

água. A quantidade de água a ser adicionada depende do substrato inserido. Segundo

Comastri (1981), a determinação do tipo adequado do biodigestor a ser utilizado vai

depender de alguns fatores como as condições do local, disponibilidade de substrato,

entre outros.

2.3.1 Biodigestor de Batelada

No modelo de biodigestor de batelada o material é todo inserido no interior do

equipamento de uma só vez, e é mantido lá dentro pelo tempo que é necessário para que

o processo de fermentação anaeróbia ocorra (BONTURI e DIJK, 2012). O gás

produzido permanece armazenado no próprio local da digestão ou em um gasômetro

acoplado (COMASTRI, 1981).

Uma vez que o processo foi finalizado, a câmara de digestão é aberta, os

materiais residuais são retirados, é realizada a limpeza e uma nova leva de substrato

pode ser inserida (COMASTRI, 1981). Sendo assim, trata-se de um sistema com pouca

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dificuldade operacional além de ser bastante simples. Na Figura 1, encontra-se um

esquema desse modelo de biodigestor com a representação dos elementos principais

necessários para sua construção.

Figura 1 - Biodigestor modelo Batelada. Fonte: Agência Embrapa de Informação

Tecnológica, (2016).

Onde,

D1 – diâmetro interno do biodigestor;

Ds – diâmetro interno da parede superior;

Dx – diâmetro do gasômetro;

h1 – altura ociosa do gasômetro;

D2 – altura útil do gasômetro;

h3 – altura útil para deslocamento do gasômetro;

b – altura da parede do biodigestor acima do nível do substrato;

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c – altura do gasômetro acima da parede do biodigestor.

Na Figura 2, está ilustrada a representação tridimensional de um corte de um

biodigestor modelo Batelada.

Figura 2 - Representação tridimensional de um corte do biodigestor modelo Batelada.

Fonte: Adaptado de Deganutti et al., (2002).

2.3.2 Biodigestor Contínuo

Neste tipo de digestor, ao contrário do tipo batelada, ocorre à alimentação

contínua de matéria-prima e a produção de biogás e biofertilizante acontece conforme a

inserção dos rejeitos. É necessária a utilização de uma matéria-prima de fácil

degradação e prioritariamente líquida. Além disso, para que o fornecimento seja

contínuo, deve haver abundância da matéria-prima e condução da mesma através de

dutos até o digestor (COMASTRI, 1981).

De acordo com o posicionamento no solo, dois modelos de digestores contínuos podem

ser citados:

Digestor Contínuo Vertical: Nesse tipo o tanque cilíndrico é feito de alvenaria,

concreto ou outros materiais, ficando na maioria das vezes submerso no solo. A

biomassa é descarregada na parte inferior e, devido à diferença de densidade, o

biogás produzido se acumula na parte superior. A câmara de gás pode ser

simples ou dupla (COMASTRI, 1981).

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Digestor Contínuo Horizontal: Nesse tipo as dimensões de altura são menores

que as de comprimento e largura, sendo indicada a utilização quando se encontra

dificuldade para escavar poços mais profundos. A biomassa alimenta o

biodigestor por um dos lados e do outro é por onde é retirado o biofertilizante

(COMASTRI, 1981).

Dentro os tipos de biodigestores contínuos, os mais conhecidos e utilizados são

os do tipo indiano e o chinês, o tipo sertanejo também é do tipo contínuo, podendo ele

ser considerado um variante do tipo indiano.

2.3.2.1 Modelo Indiano

No biodigestor do modelo indiano existe uma câmara de armazenamento de gás,

também chamada de gasômetro, que é móvel e mantém a pressão de operação

constante. Quando não há consumo imediato do gás produzido, o gasômetro desloca-se

para cima fazendo com que o volume interno aumente e a pressão interna permaneça

constante (BONTURI e DIJK, 2012). O modo de selar o gasômetro pode ser utilizando

um selo externo de água ou a própria biomassa no interior do tanque, como é feito no

tipo sertanejo. Em ambos os casos, há minimização das perdas do biogás justamente

pelo fato do gasômetro estar sobre água ou biomassa.

A Figura 3 ilustra um biodigestor modelo indiano com a construção de sua

câmara de gás sobre a biomassa e com uma parede divisória.

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10

Figura 3 - Biodigestor modelo indiano. Fonte: Adaptado de Junqueira, (2014).

Os principais componentes dos biodigestores indianos podem ser definidos

como:

Caixa de carga – local de diluição dos rejeitos;

Tubo de carga – conduz a matéria-prima da caixa de carga até o interior do

biodigestor.

Câmara de biodigestão cilíndrica – local onde ocorre o processo de fermentação

anaeróbia propriamente dita e a produção de biogás;

Gasômetro – formado por uma campânula, é capaz de armazenar o gás

produzido

Tubo guia – guia o gasômetro quando este se movimentar para cima e para

baixo;

Tubo de descarga – conduz para a saída o material fermentado sólido e líquido;

Caneleta de descarga – local de recebimento do material fermentado sólido e

líquido;

Saída de biogás – dispositivo que permite a saída do biogás produzido para ser

encaminhado para os pontos de consumo.

Já na Figura 4, é possível observar o esquema de um biodigestor modelo indiano

com os principais elementos para sua construção.

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11

Figura 4 - Esquema de um biodigestor modelo Indiano. Fonte: Adaptado de Junqueira,

(2014).

Onde,

Di - diâmetro interno do biodigestor;

Ds - diâmetro interno da parede superior;

Dg - diâmetro do gasômetro;

H - altura do nível do substrato;

h1 - altura ociosa (reservatório do biogás);

h2 - altura útil do gasômetro;

a - altura da caixa de entrada;

e - altura da parede do biodigestor acima do nível do substrato.

A Figura 5 ilustra uma representação tridimensional de um corte de um

biodigestor modelo Indiano, evidenciando as características de seu interior.

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12

Figura 5 - Representação tridimensional de um corte de um biodigestor modelo Indiano.

Fonte: Adaptado de Deganutti et al., (2002).

2.3.2.2 Modelo Chinês

O modelo chinês tem algumas semelhanças com o modelo indiano, a construção

também é feita em alvenaria, acima do cilindro onde ocorre a fermentação, há uma

espécie de cúpula fixa impermeável que tem a função de armazenar o biogás gerado. O

mecanismo de retirada do biogás se baseia no princípio de prensa hidráulica. Quando o

gás se acumula no interior do digestor, há aumento da pressão e dessa forma, o fluido se

desloca para a caixa de saída. Já na situação de descompressão, o gás desloca-se no

sentido contrário (DEAGANUTTI et al., 2002).

Na Figura 6, pode-se observar um biodigestor modelo Chinês com seus

elementos principais.

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13

Figura 6 - Biodigestor modelo Chinês. Fonte: Junqueira, (2014).

Por causa de o gasômetro ser fixo nesse modelo de biodigestor, a pressão do gás

não é constante porque varia de acordo com a fermentação da matéria-prima, por isso é

essencial instalar manômetros que sejam capazes de medir a pressão do gás e assim

obter o controle mais eficaz da produção (SEIXAS et al., 1981).

Na Figura 7 abaixo, está representado um esquema de um biodigestor com as

representações de suas principais medidas.

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14

Figura 7 - Esquema de um biodigestor modelo Chinês. Fonte: Adaptado de Portes,

(2005).

Onde,

Dc - diâmetro do corpo cilíndrico;

Hc - altura do corpo cilíndrico;

hg - altura da calota do gasômetro;

hf - altura da calota do fundo;

Rg - Raio da calota do gasômetro;

Rf - Raio da calota do fundo;

he - altura da caixa de entrada;

De - diâmetro da caixa de entrada;

hs - altura da caixa de saída;

Ds - diâmetro da caixa de saída;

af - afundamento da cúpula no solo;

a - altura do fundo da caixa de entrada;

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15

E, na Figura 8, está representado tridimensionalmente um corte do biodigestor

modelo Chinês.

Figura 8 - Representação tridimensional de um corte de um biodigestor modelo Chinês.

Fonte: Deganutti et al., (2002).

2.3.2.3 Modelo sertanejo

O modelo sertanejo de biodigestor é extremamente semelhante ao indiano, só

que utilizando materiais e fazendo adaptações para a realidade do sertão nordestino.

Esse modelo também utiliza o gasômetro móvel para manter a pressão do gás constante.

Uma das principais adaptações é a utilização da tecnologia de construção por placas,

que já é utilizada em cisternas e bem conhecida pelas pessoas que vivem nessa região, o

que facilita muito a construção, uma vez que elas passam a trabalhar com algo que já

lhes é familiar.

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16

Figura 9 - (a) Vista superior de um biodigestor sertanejo (b) Vista lateral de um

biodigestor sertanejo.

De forma muito semelhante ao modelo indiano, o modelo sertanejo é composto

por:

● Caixa de carga: É o local onde o esterco diluído com água deve ser colocado

diariamente;

● Tubo de carga: Por gravidade a matéria orgânica diluída vai ser conduzida até

o interior do biodigestor;

● Câmera de biodigestão: Local onde a biomassa será fermentada sem a

presença de ar. Essa câmera é uma espécie de tanque que possui uma divisão

para poder separar o dejeto mais novo, daquele mais antigo que já foi

fermentado.

● Gasômetro: Esse elemento é responsável por armazenar o gás produzido e

manter a pressão constante do sistema. Quando o biodigestor se enche de

biogás, o gasômetro sobe em volta do tubo-guia, e quando o volume de gás

diminui consequentemente o gasômetro desce. Isso ocorre para manter a

pressão do sistema constante.

● Tubo-guia: Este componente é muito importante, pois ele tem a função de

regular o gasômetro, guiando-o para cima ou para baixo.

(a)

(b)

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17

● Saída do Biogás: Uma tubulação vai canalizar o biogás até o ponto de

consumo desse combustível (fogão), essa tubulação sairá da parte superior do

gasômetro;

● Caixa de Saída: Onde vai ser conduzido o material já degradado, ou seja, o

biofertilizante que vai ser retirado da caixa de saída e aplicado nas áreas de

cultivo.

2.4 Biomassa

A definição de biomassa é quaisquer materiais que possam ser decompostos por

ação de variados microrganismos, mas em caso específico que essa decomposição

acontece pela ação de bactérias metanogênicas ocorre à produção do biogás. A

quantidade de biogás produzida vai depender de inúmeros parâmetros, como pH, a

relação C/N, umidade e a quantidade de bactérias por volume de biomassa.

É sempre importante conhecer a disponibilidade da biomassa que será utilizada,

para assim fazer uma estimativa inicial da quantidade de biogás que será produzida para

dimensionar o equipamento.

Com a digestão da biomassa obtém-se o biogás que é uma mistura de gases

produzidos a partir da decomposição anaeróbia de materiais orgânicos, a composição

habitual do biogás é de 55-70% de metano (CH4) e 30-45% dióxido de carbono (CO2),

com pequenas quantidades de ácido sulfídrico (H2S) e amônia (NH3), traços de

hidrogênio (H2), nitrogênio (N2), monóxido de carbono (CO), carboidratos e oxigênio

(O2) (DEUBLEIN e STEINNHAUSER, 2008).

O biogás é um gás combustível com a queima de forma limpa e renovável. Seu

poder calorífico varia de 5000 a 7000 kcal/m3. Pode-se comparar a relação de 1m³ de

biogás com outras fontes de energia, segundo Oliver et al. (2008) o poder energético de

um litro de biogás é equivalente a 0,61 litros gasolina, 0,45 litros de gás de cozinha,

0,58 litros de querosene, 1,5 quilos de lenha, 0,55 litros óleo diesel e 0,79 litros de

álcool hidratado.

2.5 Fermentação anaeróbica

A biodigestão anaeróbica se dá a partir da degradação e estabilização da matéria

orgânica, o que leva a formação dos gases, que são em sua maioria o metano e dióxido

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de carbono, e um resido líquido, que é rico em minerais. Esse resíduo líquido que já é

estabilizado pode ser utilizado como o biofertilizante, em função da sua riqueza em

minerais. A representação da digestão anaeróbia pode ser feita pela Equação 1

(KELLEHER et al., 2002).

(1)

2.6 Formação do biogás

A biodigestão anaeróbica pode ocorre de forma espontânea quando a biomassa

ou matéria ou matéria orgânica é composta por carboidratos, lipídeos e outros

nutrientes, contudo, na presença de bactérias, esses componentes se decompõem

formando metano e impurezas. Os principais produtos da biodigestão que acontecem

naturalmente são o metano e o dióxido de carbono, sendo esses dois compostos

responsáveis por aproximadamente 71% e 21% da composição do biogás. Também

entre os compostos formados está o enxofre, que dá um odor bastante característico à

mistura de gás que é formada. A formação do biogás segue a seguinte equação

estequiométrica:

→ ( ) (2)

A biodigestão anaeróbica passa por quatro principais fases a nível bacteriano,

que são a hidrólise, acidogênse, acetogênese e metanogênese, sendo a última etapa a

qual o biogás é produzido, mas isso não diminui a importância das outras etapas, que

são fundamentais para que se chegue a enfim na produção do biogás na última etapa,

sendo as fases 1-2 e 3-4 etapas que possuem uma profunda ligação, sendo indispensável

que as suas reação ocorram de forma sinérgica. A Figura 10 apresenta as etapas da

formação do biogás.

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19

Figura 10 - Etapas de produção do biogás. Fonte: Adaptado de Karlsson, (2014).

2.6.1 Hidrólise

A etapa de hidrólise é a qual as ligações complexas como carboidratos, proteínas

e gorduras são quebradas por enzimas em um processo bioquímico, sendo essa etapa a

qual ocorre a formação de compostos orgânicos simples como aminoácidos, ácidos

graxos e açucares de acordo com a reação abaixo. Esses compostos são formados de

acordo com a quebra das ligações moleculares complexas por enzimas liberadas por um

grupo específico de bactérias.

→ (3)

A quebra desses polímeros maiores é o que dá início ao processo de biodigestão.

2.6.2 Acidogênese

A segunda etapa fundamental para o processo de biodigestão é chamada de

acidogênese, é nela que as substâncias formadas na etapa de hidrólise são transformadas

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20

pelas bactérias acidogênicas em ácido propanóico, ácido butanóico, ácido lático e

álcoois, também são formados nessa etapa hidrogênio e gás carbônico. Um dos

principais fatores para a formação dos produtos nessa etapa é a quantidade de

hidrogênio dissolvido que existe nessa mistura, se há muito hidrogênio dissolvido na

mistura acontece uma interferência negativa no processo, o que provoca um acúmulo de

ácidos orgânicos fazendo com que o pH da mistura tenda a ser um poucos mais ácido,

afetando diretamente o processo.

2.6.3 Acetogênese

A acetogênese é a fase na qual os materiais resultantes da acidogênese são

transformados em ácido etanoico, hidrogênio e gás carbônico por bactérias

acetogênicas. Essa é uma das fases mais delicadas do processo, considerando que é

necessário manter o equilíbrio para que a quantidade de hidrogênio gerado seja

consumida pelas bactérias Arqueas responsáveis pela metanogênese.

2.6.4 Metanogênese

Durante a metanogênese na biodigestão anaeróbia, o ácido acético, o hidrogênio

e dióxido de carbono são finalmente convertidos em metano e gás carbônico através da

ação de microrganismos metanogênicos classificados no domínio das Archeas,

conhecido como distinto das bactérias devido a suas características genéticas. As

Archeas possuem características únicas e particulares que as permitem viver em

ambientes específicos onde aceptores de elétrons como, por exemplo, oxigênio (O2) e

Nitrato (NO3-) são ausentes ou existentes em baixas concentrações. Desta forma, a

metanogênese pode ser considerada como sendo uma respiração anaeróbia onde o gás

carbônico ou o grupo metil de compostos C-1, ou carbono do grupo metil do acetato é o

aceptor de elétrons. As Archeas são divididas em dois grupos principais em função de

sua fisiologia. Enquanto os microrganismos metanogênicos hidrogenotróficos utilizam o

hidrogênio e dióxido de carbono, os metanogênicos acetoclásticos utilizam basicamente

o ácido acético e metanol para a geração de metano e gás carbônico. As reações 4 e 5

representam respectivamente a ação de cada um dos tipos das Arqueas mencionadas.

→ (4)

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21

→ (5)

2.7 Condições operacionais

Por se tratar de um processo bioquímico realizado por milhares de bactérias, a

eficiência da digestão anaeróbia pode ser seriamente afetada por fatores que estão

relacionados com o meio ideal para sua atuação, considerando o tipo de substrato, as

características do digestor e as condições de operação.

2.7.1 Concentração de nutrientes

A presença de alguns macroelementos na matéria prima, tais como o carbono,

nitrogênio, potássio, fósforo e enxofre, alguns micronutrientes minerais, vitaminas e

aminoácidos são necessários para o desenvolvimento das bactérias, dessa forma é

necessário que se tenha um bom conhecimento sobre a composição química e o tipo de

biomassa utilizada. Se for necessário, pode ser feita a dosagem de nutrientes e

ativadores químicos para que ocorra uma boa fermentação da biomassa (COMASTRI,

1981).

2.7.2 Condições de pH

As variações de acidez são extremamente importantes, na qual cada grupo de bactérias

possui seu ponto ideal de acidez. Nas fases da hidrólise e da acidogênese, o pH ideal

fica em torno de 5,2 a 6,3. Já na acetogênese e metanogênese o pH ideal fica entre 6,5 à

8. Abaixo do pH crítico pode haver precipitação dos íons metálicos, bem como inibição

da ação bacteriana, devido à produção de ácidos, visto que a parede celular bacteriana é

mais permeável às moléculas não dissociadas em comparação com suas formas

ionizadas. Acima do pH crítico, a partir do qual a concentração de íons carbonato

disponíveis é elevada, os metais pesados passam a ser precipitados na forma de

carbonatos, e neste caso é acentuada a influência do pH.

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2.7.3 Temperatura

Um fator extremamente importante é a temperatura, a fermentação anaeróbica é

influenciada diretamente por ela, sendo uma das responsáveis pela velocidade do

processo e, consequentemente, redução do tempo de retenção da massa no interior do

biodigestor. Além disso, a porcentagem de metano na constituição do biogás é maior

quando o processo de fermentação ocorre em temperaturas mais elevadas, o que garante

um maior poder calorífico à mistura, já que o metano é o principal gás na mistura de

gases que forma o biogás. Em um processo anaeróbio, o mais importante é manter uma

temperatura constante dentro do reator, devido à sensibilidade das bactérias a

temperatura (BARRERA, 2003). O processo de digestão e gaseificação é altamente

acelerado à temperaturas entre 35 e 37°C. Para temperaturas inferiores a 35°C o

processo de digestão é de menor extensão e para temperaturas inferiores a 15°C é quase

inexistente.

2.7.4 Tempo de detenção hidráulica

O tempo que o material irá permanecer no interior do biodigestor, chamado de

tempo de retenção, que é o tempo contabilizado desde a entrada do efluente até a sua

saída, é imprescindível para que o processo de digestão ocorra por completo. De acordo

com os diferentes substratos utilizados para a alimentação do biodigestor, e dos demais

fatores, o tempo de retenção pode variar de 4 a 60 dias (MAZZUCCHI, 1980;

COMASTRI, 1981). Para o substrato composto de resíduos de matéria orgânica o

tempo de detenção situa na faixa de 20 a 30 dias, sendo que com 30 dias a carga

orgânica já sofreu grande redução e devido a isso, a produção de biogás já atingiu seu

máximo e a partir desse ponto passa a decair (BEUX, 2005). O tempo de retenção

hidráulica pode ser obtido pela relação entre o volume de mistura liquida do biodigestor

e a carga diária.

2.8 Cogeração energética

O biogás gerado pode ter vários fins, entre eles a cogeração energética, que é

definida como a geração de eletricidade e calor por meio de um processo ou

equipamento, que pode ser uma caldeira com geração a vapor, uma turbina e diversos

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outros equipamentos. Em especial pode-se utilizar um motor-gerador como o

equipamento para essa cogeração, e embora esses equipamentos tenham uma eficiência

de conversão em energia elétrica relativamente baixa, variando entre 15% a 38%,

dependendo de qual a fonte de alimentação de combustível desse motor, como esse

combustível foi obtido e o lugar e função desse motor-gerador.

Com o meio-ambiente tomando cada vez mais importância, principalmente

quando o tema é energia, atualmente muitas pesquisas buscam novas formas de

aproveitar rejeitos e com isso gerar energia, com isso a alternativa de utilizar biogás

gerado pelos rejeitos da criação de animais em comunidades rurais passa a ser vista

como uma promissora atividade (FACCENDA E SOUZA, 2001). A cogeração já é algo

bem conhecido no meio industrial, sendo muito comum em indústrias que realizam o

processamento de cana.

A depender da localização da comunidade rural a cogeração energética a partir

do biogás pode fazer com que a energia elétrica chegue a lugares em que os órgãos

governamentais ainda não conseguiram fazer com que a energia elétrica chegasse.

2.9 Eficiência da conversão do biogás em energia elétrica

Existe uma diversa gama de opções para escolher o motor gerador a ser utilizado

quando a ideia é gerar energia elétrica a partir do biogás produzido pela biodigestão

anaeróbica de matéria orgânica. O modelo pode ser escolhido de acordo com o capital

financeiro disponível e a logística para a compra do equipamento.

Segundo Santos (2000), 1 m³ de biogás é o equivalente 6,5 kW, com esse dado

podemos estimar a eficiência da transformação do biogás produzido em energia elétrica

mediante a razão de equivalência de 1 m² de biogás.

( )

2.10 Análise econômica da produção de biogás

Para determinar qual é o custo da produção de biogás temos que determinar

antes algumas informações. Inicialmente deve ser contabilizado qual é o custo de

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construção e manutenção do biodigestor (SOUZA et al., 2004). Também se deve levar

em conta como se dará essa operação, em que condições ela acontece.

Para determinar o custo de produção do biogás, podemos calcular da seguinte

forma. O custo do biogás é calculado através da seguinte equação

(6)

Onde:

CAB = Custo anual do biodigestor (R$/ano);

PAB = Produção anual de biogás (m³/ano).

Por sua vez o custo anual do biodigestor vai ser dado pela seguinte equação

(7)

Onde:

CIB = Custo de investimento no biodigestor (R$);

OM = Custo de operação e manutenção (%/ano).

Por sua vez o fator de recuperação do capital é dado pela equação

( )

( ) (8)

Onde:

j = Taxa de desconto (% ano);

n = Anos para a amortização do investimento.

Todos esses cálculos são essenciais, mas também é necessário verificar se é

viável economicamente a produção desse biogás de acordo com o ganho financeiro

gerado, para isso devemos determinar o tempo de retorno do investimento (TRI) através

da seguinte equação.

(

) (9)

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25

Onde:

CI = Custo do investimento no biodigestor (R$);

CGF = Ganho anual com gás gerado e biofertilizante (se utilizado);

TRI = Tempo de retorno (anos).

2.11 Análise econômica da produção de energia elétrica

Para determinar qual é o custo desta cogeração de energia utilizando o biogás

temos que determinar algumas informações primeiro. Inicialmente deve ser

contabilizado qual é o custo de construção e manutenção do biodigestor como também

do sistema motor-gerador (SOUZA et al., 2004). Também deve-se levar em conta como

se dará essa operação, em que condições ela acontece. Pela localização do assentamento

e sua realidade climática é de se esperar que a produção acorra sem problemas durante

todo o ano, fazendo com que o gerador também possa ser utilizado durante todo o ano,

o que é um bom sinal, pois quanto menor é o tempo de operação, mais cara essa

operação tende a ser, dessa forma, o tempo de retorno do investimento será afetado, o

que pode fazer com que a ideia de se implantar um projeto como esse não seja mais tão

atrativa. Por mais que seja possível que o equipamento tenha capacidade para operar

também é necessário verificar a necessidade do assentamento.

Para determinar o custo de produção da energia elétrica através da cogeração

pelo biogás, podemos calcular da seguinte forma.

(10)

Onde:

C = Custo de energia elétrica produzida pelo biogás (R$/kWh);

CAB = Custo anual com biogás (R$/ano);

CAG = Custo anual do conjunto motor-gerador (R$/ano);

PE = Produção de eletricidade pelo biogás (kWh/ano).

O valor de produção de eletricidade (PE) pode ser calculado pela equação abaixo

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(11)

Onde:

Pot = Potência nominal da planta (kW);

T = Tempo de utilização da planta (horas/ano).

Os valores de custo anual com o biogás (CABG) e custo anual do conjunto

motor-gerador (CAG) são dados pelas seguintes equações respectivamente.

(12)

Onde:

CB = Custo do biogás (R$/m³);

CNB = Consumo de biogás pelo motor-gerador (m³/ano).

(13)

Onde:

CIG = Custo do motor-gerador (R$);

OM = Custo de operação e manutenção (%/ano);

FRC = Fator de recuperação do capital.

Todos esses cálculos são essenciais, mas também é necessário verificar se é

viável economicamente a produção dessa energia elétrica através do biogás, para isso

devemos determinar o tempo de retorno do investimento (TRI) através da seguinte

equação.

(14)

Onde:

CI = Custo do investimento no sistema biodigestor/motor-gerador (R$);

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27

GEF = Ganho anual com energia gerada e fertilizante;

TRI = Tempo de retorno (anos).

2.12 Utilização do biofertilizante

Além do biogás como produto da biodigestão realizada, também temos o

biofertilizante como produto. Pela sua composição é possível que ele realmente seja

utilizado substituindo o uso de fertilizantes comerciais, e como um dos principais

aspectos da instalação de biodigestores em comunidades rurais é dá aos seus moradores

uma maior independência financeira, a possibilidade de substituir o uso de fertilizantes

comerciais nas suas plantações por um que é obtido através da biodigestão anaeróbica

dos rejeitos da criação de animais da comunidade é um grande alívio financeiro que

pode ser passado a essas comunidades.

É possível então calcular a quantidade de biofertilizante que será produzida de

acordo com a realidade de comunidade e a alimentação que será feita no biodigestor e

também qual a área que será necessária para absorver a quantidade de biofertilizante

que será produzida.

A área necessária será uma função da quantidade de nutrientes NPK que podem

ser incorporados ao solo, principalmente a quantidade de N que pode ser incorporada,

que segundo Tumelero (1998), tem o limite de incorporação de 160 kg/ha/ano.

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3. VIABILIDADE DA REGIÃO

O local onde o biodigestor será instalado é extremamente importante, pois os

fatores climáticos são essenciais para um bom funcionamento do equipamento, ainda

mais se tratando de uma proposta de construir o equipamento a um custo reduzido, tem

que se ter em mente que não haverá recursos para proteger o equipamento das

intempéries da natureza, então locais com clima quente e poucas chuvas é ideal para a

instalação do biodigestor, o que é de fato o que se encontra no sertão do nordeste. A

Figura 11 mostra a localização do assentamento.

Figura 11 – Localização do assentamento Trangola. Fonte: Google Maps.

A região onde fica o assentamento Trangola é um pouco afastada de qualquer

centro mais urbano, sendo o município de Currais Novos, o município ao qual o

assentamento Trangola pertence. Há uma considerável distância até o centro urbano de

maior porte mais próximo, isso faz com que seja necessária alguma logística para

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29

construir qualquer coisa no assentamento, mas por outro lado é o tipo de comunidade

que a tecnologia traz mais benefícios.

A região do Seridó do Rio Grande do Norte é conhecidamente uma região que

possui longos períodos do ano sem chuva, o que para o biodigestor é vantajoso, pois é

possível manter por longos períodos durante o ano uma temperatura que é favorável ao

desenvolvimento das bactérias, visto que na série histórica desse século a temperatura

média na região se mantém entre 30°C e 35°C. É de conhecimento que para o

desenvolvimento bacteriano essa é uma média de temperatura ideal, onde é

proporcionado o melhor clima que se tenha a melhor produção de biogás possível. Esses

dados estão apresentados na Figura 12.

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Figura 12 – (a) Dados de precipitação de chuva de 2017-2018. (b) Dados de insolação

de 2010-2018. (c) Dados de temperatura de 2010-2018. Fonte: Instituto Nacional de

Meteorologia, (2019).

(a)

(b)

(c)

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31

Embora os últimos dados do ano de 2018 tenham mostrado uma leve flutuação

nos dados de forma a impactar negativamente os fatores que proporcionariam uma

melhor produção de gás, é de se esperar que seja apenas uma flutuação natural da

temperatura, que com o tempo voltará a sua média histórica. Mesmo a produção por

causa da influência desses fatores não sendo o esperado, com a normalização desses

fatores com o tempo, é de se esperar que o biodigestor tenha a produção esperada em

função das boas condições climáticas da região para essa atividade.

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4. DIMENSIONAMENTO DE UM BIODIGESTOR PARA O

ASSENTAMENTO TRANGOLA

Para realizar o dimensionamento de um biodigestor para o assentamento

Trangola utilizam-se algumas informações do assentamento, combinando com dados da

literatura. Podemos fazer a comparação do gás produzido com a sua equivalência

energética em GLP para ter uma melhor ideia de quanto de energia é possível ter na

produção diária. A produção de esterco diária para diferentes animais se encontra na

Tabela 4.

Tabela 4 – Produção de esterco fresco diário.

Animal Dejeto

(kg/dia)

Biogás

(m³/kgesterco)

GLP

(kg/dia)

Suíno 2,5 0,075 – 0,089 0,084

Bovino de corte 10 - 20 0,040 0,180

Bovino de leite 10- 50 0,040 – 0,049 0,221

Caprino/Ovino 0,5 0,040 – 0,061 0,014

Equino 10 0,048 0,216

Fonte: Adaptado de Oliver et al., (2008) e Farret (2010) e Santos (2000).

Para o assentamento, há criação de bovino de leite, então considerando que a

produção mínima diária de esterco é 10 kg por animal, com 10 animais na comunidade

então:

entretanto os animais passam o dia pastando e só são recolhidos ao final do dia, assim,

só é coletado 1/3 do esterco diário produzido, dessa forma temos que

.

Para o cálculo da produção do biogás, de acordo com a Tabela 4, temos que:

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Que é equivalente e a produção de GLP de:

Com a quantidade de biogás diariamente produzida, podemos calcular o volume

do biodigestor, que pode ser obtido através do produto do tempo de retenção hidráulica

pela carga diária, conforme a fórmula:

(15)

A carga diária (VC) consiste na soma do volume de esterco diluído em água que será

inserido no biodigestor. Para o volume do esterco, temos que sua densidade é dada por:

(16)

Se a densidade do esterco é em média 600kg/m³ (FREITAS, 2008), o volume de

esterco será:

Além disso, biomassa deverá ser misturada na proporção de 1:1 com água,

segundo Faustino et al. (2009), logo, VC será 0,111 m³/dia. O tempo de retenção

hidráulica (TRH) adotado foi e 30 dias (AMARAL et al., 2004; QUADROS et.al.,

2007). Aplicando na equação, teremos:

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Para o tanque, é considerando que ele tem a forma cilíndrica, dessa forma para

encontrar as duas dimensões

(17)

Adotando h=1,5 m, o diâmetro do tanque de fermentação será:

As dimensões da caixa de entrada devem ser suficientes para que seu volume

suporte o volume de carga diária. Logo, o volume tanque de alimentação será calculado

por:

(18)

Adotando uma altura de 0,5m para a caixa de carga, teremos:

A caixa de carga deverá ser construída com o piso a 20 centímetros de altura

acima do nível da borda do tanque de fermentação.

Diferentemente do tanque de digestão e da caixa de carga, que possuem formato

cilíndrico, a caixa e descarga apresenta formato retangular e será divida em dois

compartimentos. De acordo com Valladares et al. (2008), ela deve ser dimensionada

com no mínimo três vezes o volume da carga diária para permitir armazenamento do

biofertilizante. De modo que,

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(19)

Adotando uma altura de 0,5 m e uma largura de 0,6 m, obtemos um comprimento de:

A borda da caixa de descarga deve ficar 20 cm de altura abaixo do nível da

borda do tanque de fermentação. A caixa de descarga será divida em dois

compartimentos.

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5. VIABILIDADE ECONÔMICA DA OPERAÇÃO

Como já citado, existem vários fatores que devem ser levados em conta na hora

em que avaliamos a viabilidade tanto técnica quanto econômica de um projeto. A

construção do equipamento biodigestor possibilita e existência de outra dinâmica tanto

na residência mais próxima do equipamento, quanto de toda a comunidade local.

Alguns cenários podem ser pensados na utilização do biogás e do biofertilizante

gerados pelo equipamento. Em um primeiro cenário podemos considerar algo mais

simples, como a utilização do biogás apenas como substituto de GLP utilizado para

cozinhar, e o biofertilizante substituindo o fertilizante de índice NPK que poderia ser

nas plantações do local, mas na realidade eles não utilizam fertilizante pelo alto custo do

produto. Outro cenário requer um maior investimento, em um motor-gerador para a

geração de energia elétrica, com todo o biogás gerado sendo convertido em energia

elétrica através do motor-gerador, e o biofertilizante sendo utilizado nas plantações. O

último cenário leva em conta a utilização do biogás tanto substituindo o gás de cozinha

como gerando energia elétrica com o que não for utilizado como gás de cozinha, o

biofertilizante novamente será utilizado substituindo o fertilizante comercial que

geralmente são utilizados. Podemos nomear esses cenários 1, 2 e 3 respectivamente,

para os quais vamos analisar a viabilidade econômica das operações, simulando os

potenciais usos do biogás descritos, tanto considerando uso do biofertilizante como um

produto que agrega valor, como sem considera-lo, para obter um resultado mais fiel a

realidade do assentamento e também mostrar o potencial para a aplicação em outras

comunidades.

O primeiro cenário leva em conta os custos para a construção do equipamento

biodigestor e a instalação para levar o gás gerado para o fogão para ser utilizado

substituindo o GLP. O investimento necessário é de R$ 1.796,00 para realizar todas

essas operações. Podemos considerar diferentes condições para amortização dessa

dívida, assim conseguimos observar alguns cenários de qual seria o custo de produção

de cada metro cúbico de biogás de acordo com o tempo de amortização da dívida, para a

produção diária do equipamento de 1,33 m³. Na Tabela 5 encontram-se os dados de

custo do biogás de acordo com o tempo de amortização.

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Tabela 5 – Custo do biogás por m³ de acordo com o tempo de amortização.

Amortização (anos) Biogás (R$/m³)

3 1,233

5 0,740

8 0,462

10 0,370

Os valores de custo revelam qual deve o investimento por m³ de biogás

considerando a amortização. Eles nos mostram que para um empreendimento desse

tipo, em que é esperado que o equipamento tenha uma grande durabilidade,

principalmente por ser construído de alvenaria, é muito indicado que se pense em um

maior prazo para a amortização do investimento, o que traz o investimento na produção

menor, relativo ao aumento do tempo de funcionamento do equipamento ao longo dos

anos.

Sabendo o investimento necessário é possível então calcular com seria o tempo

de retorno do investimento, considerando a produção de biogás obtida do equipamento

o retorno financeiro gerado e os gastos com manutenção, para manter o equipamento

funcionando de formar perfeita ao longo do tempo que ele foi planejado para funcionar.

Diariamente será gerado pelo biodigestor 1,33 m³ de biogás e 11,5 kg de

biofertilizante, ao longo de ano será totalizada a produção de 485,45 m³ de biogás e

4.197,5 kg de biofertilizante, a produção de biogás é o suficiente para substituir o

consumo de 17 botijões de gás de cozinha durante o ano, já o biofertilizante é o

suficiente para fertilizar 2,15 ha de solo. Foi considerado o preço do botijão de gás de

cozinha vendido na região, por conta da sua localização e quantidade de habitante no

local, pelo valor de R$ 80 e o preço para fertilizar um hectare de solo é de cerca de R$

330,00.

No assentamento Trangola não há gastos com fertilizante, mas a utilização do

biofertilizante tem a capacidade de melhorar a sua produção agrícola se for utilizado.

Nesse trabalho foi estudado o caso em que não há gasto com fertilizante, mas também

foi analisado o caso supondo o uso de fertilizante de acordo com a área de plantio

existente na comunidade, por isso foi considerado um suposto dado de consumo anual e

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gasto anual de fertilizante. Nas Tabelas 6 e 7 encontram-se os dados de consumo e

produção do assentamento.

Tabela 6 – Dados de consumo e gasto anual do assentamento.

Consumo anual de

gás de cozinha

(botijões)

Gasto anual com

gás de cozinha

(R$)

Consumo anual de

fertilizante (kg)

Gasto anual com

fertilizante (R$)

12 960,0 132,0 630,0

Tabela 7 – Produção anual do assentamento para o biodigestor.

Produção anual de biogás (m³) Produção anual de biofertilizante (kg)

485,45 4.197,0

Considerando que as produções de gás e de biofertilizante excedem a

necessidade do assentamento, devemos calcular o tempo de retorno com base no que

será utilizado da produção para ter o tempo real em que o investimento será pago, não

um valor baseado em um caso ideal em que tudo o que foi produzido será utilizado.

Para o cálculo, devemos ter os valores de manutenção do equipamento ao longo do ano.

Pelo fato de ser de alvenaria, não será necessário um grande valor com manutenção,

mas deve-se perceber que esse valor deve ter um crescimento gradativo em relação ao

tempo de operação do equipamento, visto que a corrosão na alvenaria é um processo

lento, que demora alguns anos para se apresentar, bem como toda a exposição do

equipamento ao sol. Dessa forma, nos primeiros anos o investimento em manutenção

será muito menor do que nos últimos anos de operação do equipamento. Considerando

todos esses fatores, os valores gastos com manutenção do maquinário devem obedecer a

seguinte progressão ao longo dos anos, esses valores são encontrados na Tabela 8.

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Tabela 8 – Investimento em manutenção.

Anos em operação Investimento em manutenção (% do

investimento)

1 5%

2 6%

3 7%

4 9%

5 11%

6 13%

7 15%

8 15%

Após 8 anos de funcionamento em diante, o investimento em manutenção deve

continuar em 15%. Podemos utilizar os mesmos valores para os gastos com a

manutenção do motor gerador.

Com uma taxa de desconto de 7% ao ano, podemos calcular o fator de

recuperação do capital (FRC), em seguida o custo anual do biodigestor (CAB), que leva

em conta o pagamento da dívida, seguindo o tempo de amortização, e o investimento

necessário para a manutenção do biodigestor em pleno funcionamento. Os resultados se

encontram na Tabela 9. Com essas informações podemos calcular o tempo de retorno do

investimento (TRI).

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Tabela 9 – Custo anual do biodigestor de acordo com o tempo de amortização.

Custo anual do biodigestor (R$)

Amortização 10 anos 7 anos 5 anos 3 anos

1° ano 344,83 423,86 528,02 774,08

2° ano 362,79 441,82 545,98 792,04

3° ano 380,75 459,78 563,94 810,00

4° ano 416,67 495,70 599,86 161,64

5° ano 452,59 531,62 635,78 197,56

6° ano 488,51 567,54 233,48 233,48

7° ano 524,43 603,46 269,4 269,4

8° ano 524,43 269,4 269,4 269,4

9° ano 524,43 269,4 269,4 269,4

10° ano 524,43 269,4 269,4 269,4

É importante visualizar que de acordo com o tempo de amortização do

investimento, o gasto anual pode se tornar inicialmente mais alto, entretanto, ele não

deve permanecer dessa forma, por mais que com o passar do tempo seja necessário

investimentos anuais maiores para a manutenção do equipamento, isso se deve ao

encerramento do pagamento da dívida, tirando esse encargo do custo anual calculado

para o equipamento. Na Figura 13 são apresentados os dados de custo anual de

produção de acordo com o tempo de amortização.

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Figura 13 – Custos anuais do biodigestor. Fonte: Autor.

Para esse cenário o tempo de retorno do investimento será de 1,2 anos se

considerarmos economia financeira no custo de fertilizante e de 2,08 anos se

desconsiderarmos essa economia, que é a realidade do assentamento Trangola.

Se a gente considerar então que todo o biogás produzido seja então destinado

para produção energética temos o cenário 2, o qual exige um investimento maior, de R$

4.911,00. O aumento no investimento é relativo à compra e instalação de um motor

gerador de 2 kWh. De acordo com a produção de gás, utilizando esse motor seria

possível gerar mensalmente 44,55 kW. Com isso podemos calcular qual é o

investimento necessário para a produção de cada kW. Na Tabela 10 encontram-se os

dados de custo da energia produzida de acordo com o tempo de amortização.

0,00

100,00

200,00

300,00

400,00

500,00

600,00

700,00

800,00

900,00

1 3 5 7 9

Cu

sto

an

ual

de

op

era

ção

(R

$)

Tempo de operação (anos)

10 anos de amortização

7 anos de amortização

5 anos de amortização

3 anos de amortização

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Tabela 10 – Custo do kW de acordo com o tempo de amortização.

Amortização Energia (R$/kW)

3 3,062

5 1,837

8 1,148

10 0,919

Novamente verificamos que pelas caraterísticas do projeto, devemos ter um

tempo de amortização do investimento mais prolongado. Vemos que com esse longo

tempo de amortização começamos a aproximar o valor de investimento necessário para

gerar 1 kW, de um valor que possa ser mais atrativo para o investimento. Sabendo o

investimento necessário, é possível então calcular com seria o tempo de retorno do

investimento, considerando que a produção de biogás obtida do equipamento terá seu o

retorno financeiro gerado a partir da produção energética. Também serão considerados

os gastos com manutenção tanto do biodigestor, quanto do motor gerados, para manter o

equipamento funcionando de formar perfeita ao longo do tempo que ele foi planejado

para funcionar.

Diariamente serão gerado pelo biodigestor 1,33 m³ de biogás e 11,5 kg de

biofertilizante, ao longo de ano será totalizada a produção de 485,45 m³ de biogás e

4.197,5 kg de biofertilizante. A produção de biogás é o suficiente para utilizando o

motor gerador produzir 534,6 kW durante o ano, já o biofertilizante é o suficiente para

fertilizar 2,15 ha de solo. Considerando a tarifa média cobrada pelas distribuidoras de

energia como R$ 0,67 e o preço para fertilizar um hectare de solo é de cerca de R$

330,00. Podemos então calcular o custo anual da operação do motor gerador e tempo de

retorno do investimento. Nas Tabelas 11 e 12 encontram-se os dados de consumo e

produção do assentamento.

Tabela 11 – Consumo e gasto anual com energia elétrica no assentamento.

Consumo anual de

energia elétrica

(kW)

Gasto anual com

energia elétrica

(R$)

3.600,0 2.412,0

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Tabela 12 – Produção anual de biogás, energia e biofertilizante.

Produção anual de biogás

(m³)

Produção anual de

energia (kW)

Produção anual de

biofertilizante (kg)

485,45 534,6 4.197,0

Da mesma forma como foi realizado para o cenário em que a produção de gás

era utilizada substituindo o gás de cozinha, podemos calcular os custos anuais do

biodigestor e do gerador e o tempo de retorno desse investimento. Os custos do

biodigestor serão os mesmos que foram calculados para o cenário 1. Os resultados se

encontram na Tabela 13.

Tabela 13 – Custo anual do motor-gerador de acordo com o tempo de amortização.

Custo anual do motor-gerador (R$)

Amortização 10 anos 7 anos 5 anos 3 anos

1° ano 598,08 735,14 915,81 1.342,56

2° ano 629,23 766,29 946,96 1.373,71

3° ano 660,38 797,44 978,11 1.404,86

4° ano 722,38 859,74 1.040,41 161,64

5° ano 784,98 922,04 1.102,71 197,56

6° ano 847,28 984,34 233,48 233,48

7° ano 909,58 1.046,64 269,4 269,4

8° ano 909,58 269,4 269,4 269,4

9° ano 909,58 269,4 269,4 269,4

10° ano 909,58 269,4 269,4 269,4

Novamente, tempo de amortização menores implicam em custos anuais mais

altos no início da operação. Na Figura 14 são apresentados os dados de custo anual de

produção de acordo com o tempo de amortização.

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Figura 14 – Custos anuais do motor-gerador. Fonte: Autor.

Para esse cenário o tempo de retorno do investimento considerando o

biofertilizante é de 5,86 anos e sem considerar é de 48,7 anos. Esse alto valor quando

não consideramos ganho financeiro a partir do biofertilizante se deve a baixa produção

de energia. Os motores geradores tem um rendimento muito baixo nesse, nesse caso de

17%, o que torna a aplicação inviável se for apenas para a produção energética.

No cenário 3, o gás é utilizado substituindo o GLP, mas também existe a

cogeração energética, com o excedente de gás que não seria utilizado e acabaria sendo

liberado na atmosfera se não houve o sistema de geração energética, tem-se a seguinte

produção. Os dados de produção anual para o terceiro cenário se encontram na Tabela

14.

Tabela 14 – Produção anual do assentamento com duas utilizações para o biogás.

Produção anual de biogás

(m³)

Produção anual de

energia (kW)

Produção anual de

biofertilizante (kg)

485,45 144,6 4,197,0

0,000

200,000

400,000

600,000

800,000

1000,000

1200,000

1400,000

1600,000

1 3 5 7 9

Cu

sto

an

ual

de

op

era

ção

(R

$)

Tempo de operação (anos)

10 anos de amortização

7 anos de amortização

5 anos de amortização

3 anos de amortização

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Os custos para a operação serão os mesmos quer foram anteriormente nos

cenários 1 e 2, o que se altera será o tempo de retorno do investimento, pois nesse

cenário, há um aproveitamento total dos recursos gerados, mas com um maior

direcionamento a atividades que geram o melhor retorno financeiro, que seria o uso do

biogás como um substituto do GLP para cozinhar.

Por mais que a quantidade de energia gerada não seja muito grande,

diferentemente de como ocorre no cenário 1, não será necessário liberar para a

atmosfera o excedente de produção, ele poderá ser aproveitado, dando a comunidade

uma maior possibilidade de alternativas, podendo utilizar essa energia para uma bomba

que realiza a irrigação por exemplo, que por mais que não seja um valor tão

significativo, ao final de um ano faz bastante diferença na vida dessas famílias.

Para esse cenário teremos um tempo de retorno do investimento de 3,1 anos

considerando o ganho do biofertilizante e de 5,47 anos desconsiderando o ganho com

biofertilizante. Na Figura 15 são apresentados os dados de tempo de retorno do

investimento para cada um dos cenários.

Figura 15 – Comparação entre os tempos de retorno para cada um dos cenários. Fonte:

Autor

0 10 20 30 40 50 60

Cenário 1 com biofertilizante

Cenário 1 sem biofertilizante

Cenário 3 com biofertilizante

Cenário 3 sem biofertilizante

Cenário 2 com biofertilizante

Cenário 2 sem biofertilizante

Tempo de retorno do investimento (anos)

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6. CONCLUSÃO

Entre os cenários que foram analisados os melhores resultados foram

encontrados quando o uso do biogás foi considerado prioritariamente para a substituição

do gás de cozinha, mas quando ao invés, esse gás foi totalmente direcionado para a

produção energética, os resultados mostraram essa atividade como inviável de acordo

com o que seria produzido para um biodigestor dimensionado, de acordo com as

características da comunidade. A produção muito baixa culmina em um tempo de

retorno do investimento muito longo, o que foi mascarado no cenário 2 que considerou

o retorno financeiro do biofertilizante. A grande discrepância em relação ao tempo

necessário para recuperar o investimento, quando é considerada a utilização do gás para

geração energética, se deve a baixa eficiência que os motores geradores têm. Com a

baixa eficiência, a produção energética é muito baixa, o que não gera o retorno

financeiro suficiente para fazer com que a operação seja realmente economicamente

viável. Um fator que pode mitigar essa baixa eficiência é uma maior produção de

biogás, fazer com que o motor tenha a capacidade de funcionar por períodos mais

longos. Com uma maior produção, o preço do kW produzido tende a cair, o que faz com

que cada vez mais a operação possa ser economicamente viável.

A utilização do excedente de produção de biogás, o qual a comunidade não tem

capacidade de absorver por sua demanda de gás já ter sido preenchida, para a geração

energética, se mostrou como uma opção viável, o que pode ser uma excelente

alternativa para comunidades que sofrem com o abastecimento de energia, em que há

uma constate falta de energia. Por mais que utilizar todo o gás para a produção

energética não seja uma boa alternativa, para momentos de necessidade, ter

independência energética, mesmo que não seja total, pode ser uma boa alternativa para

melhorar a qualidade de vida dessas famílias.

A melhor opção encontrada em relação a um retorno rápido do investimento é a

utilização do gás para cozinhar, sem adicionar o custo que ter cogeração energética no

projeto adicionaria. O retorno financeiro acaba sendo muito bom pela localização da

comunidade o que torna o acesso ao GLP em botijão mais difícil, e consequentemente,

mais caro, fazendo com que a sua substituição traga uma grande economia para a

família.

O biofertilizante pode ser um dos diferenciais na economia gerada, não só o

biogás, foi verificado o menor tempo de recuperação nos cenários em que foi

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considerado o biofertilizante como um dos produtos com valor, pelos altos índices de

nitrogênio, fósforo e potássio que estão presentes nesse biofertilizante.

Um dos pontos que fica claro nessa análise é o potencial da tecnologia para

trazer muita independência a comunidades mais afastadas, principalmente se houver

evolução no rendimento dos motores geradores a gás. O que faria a tecnologia que já é

muito positiva hoje, ser ainda mais atrativa, se fosse possível gerar algo perto do 6,5 kW

utilizando cada m³ de biogás que for gerado.

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